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No Brasil a discussão sobre a formação de jovens e adultos, com um viés mais cidadão,
foi impulsionada na década de sessenta do século XX por Paulo Freire.
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Professora no curso de Educação Física da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – Campus do
Pantanal – (UFMS/CPAN)
2
Professora no curso de Pedagogia da Universidade Estadual de Maringá – (UEM).
Professavam a necessidade de realizar uma educação de adultos crítica,
voltada à transformação social e não apenas à adaptação da população a
processos de modernização conduzidos por forças exógenas (PIERRO; JOIA;
RIBEIRO, 2001, p. 60).
Paulo Freire é quem consegue, engajado nas lutas do Brasil nos anos de
1960, fazer a leitura da realidade brasileira e latino americana e iniciar o
processo de formulação de uma pedagogia que se nutre de diferentes
abordagens filosóficas (Torres, 1981) e de práticas educativas populares
concretas que ocorriam em diferentes contextos e situações: da alfabetização
de adultos, passando pelas escolas, organização operária e lutas camponesas
por terra, estando presentes em processos revolucionários, como as
experiências da Nicarágua e de Cuba. Nos anos 1960, no Brasil, foram os
movimentos de cultura popular os grandes sementeiros de ideias e de
implementação de experiências (Fávero, 2001).
A educação visa à ação. Ora, a ação humana tem três requisitos essenciais. Em
primeiro lugar, o homem age diante de um fato que é real para ele; é, portanto,
imprescindível que ele tome consciência da realidade sobre a qual ele vai agir.
Ao lado disso, o homem assume uma atitude diante dessa realidade. Para que a
atitude se concretize em ação, o homem parte sempre dos meios que lhe
oferece a cultura (sejam por meios instrumentos físicos, verbais, etc..). A
organização didática de uma ação educativa não pode, portanto, deixar de
situar-se nesses três planos: conscientizar, motivar atitudes, proporcionais
instrumentos de ação.
Nesta mesma sequência de dar voz aos oprimidos e questionar as suas condições de vida
e de classe, outra lição descrita por Fávero (2006, p.183) demonstra a intencionalidade e a opção
política para conscientização e busca da transformação social: “6ª Lição – O povo tem fome e
doença. Por que tanta doença no povo? O povo precisa de escola. Precisa de casa e comida. O
povo precisa de trabalho. É dura a vida do povo. O povo pode mudar de vida?.“
Essas perspectivas educacionais vão contra a “educação bancária” e mecânica ainda
reproduzida em muitas escolas no Brasil e em diferentes países. Para Freire (2001, p 16), a
educação é um ato político e de engajamento constante:
Outras lições das cartilhas propostas na década de 1960 são atuais e necessárias para as
escolas, para a educação e para a sociedade brasileira que tem assistido ao desmonte da
democracia em nosso país. Podemos encontrar os seguintes questionamentos nas 16ª e 17ª
Lições (Fávero, 2006, p. 188):
Outro fator importante que deu destaque para esta modalidade de ensino nos ano 90 do
século XX foi a declaração de Jonthien que apontou como proposta para a EJA uma visão de
“Educação para Todos” ampliando o conceito de educação básica. Porém mesmo com o
indicativo desta declaração nos finais da década de 1990 as agencias multilaterais passaram a
não mais considerar importante os investimentos na educação de jovens e adultos.
Embora os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE de 2015
apresentem a queda de analfabetismo no Brasil, estima-se que 13,2 milhões de pessoas são
analfabetas:
A EJA deve ter uma estrutura flexível e ser capaz de contemplar inovações
que tenham conteúdos significativos. Nesta perspectiva, há um tempo
diferenciado de aprendizagem e não um tempo único para todos. Os limites e
possibilidades de cada educando devem ser respeitados; portanto, é desafio
destas Diretrizes apresentar propostas viáveis para que o acesso, a
permanência e o sucesso do educando nos estudos estejam assegurados.
(PARANÁ, 2006, p. 28)
Diferentemente da educação regular a EJA não está para a preparação dos alunos para o
um “futuro” e sim ao que se vive e tem como experiência no hoje, no presente. O sujeito da EJA
precisa conhecer o contexto histórico e político em que esteve e está inserido, reconhecer as
consequencias dele em seu presente para contribuir na transformação de seu contexto no
presente e para o futuro.
Ter como base a Educação Popular dá a EJA um importante marco em sua história, pois
por mais que em seu percurso isso foi se transformando e por vezes trazendo consequencias
radicais ao seu perfil foi possível também ir percebendo como resgatar na Educação de Jovens e
Adultos seu perfil político, histórico, cultural. É emergencial e a característica de ter a Educação
Popular como base, aproxima a EJA da Educação Social.
É preciso destacar que a Educação Social no Brasil é mais voltada para crianças e
adolescentes. A Educação de Jovens e Adultos ainda é um desafio para e a área da Educação
Social.
Na Educação Social, a prática de educadores sociais implicados tem como uma de suas
referências principais, as ideias de Paulo Freire e dos posicionamentos políticos nos processos
educacionais. Como afirmava Paulo Freire (2001, p.16) o papel do educador é imprescindível na
tradução das informações aos educandos. Para eles, os educadores precisam promover a
curiosidade epistemológica nos alunos a partir de suas vivências:
Dessa forma são tão importantes para a formação dos grupos populares certos
conteúdos que o educador lhes deve ensinar, quanto a análise que eles façam
de sua realidade concreta. E, ao fazê-lo, devem ir, com a indispensável ajuda
do educador, superando o seu saber anterior, de pura experiência feito, por
um saber mais crítico, menos ingênuo. O senso comum só se supera a partir
dele e não com o desprezo arrogante dos elitistas por ele.
Embora as ações de Paulo Freire ainda sejam incompreensíveis para muitas escolas
formais e educadores no Brasil, na Educação Social, esses princípios são mais adotados pelo
fato dos educadores sociais, em sua maioria, trabalharem com pessoas em vulnerabilidade
social.
O Brasil até hoje sofre os prejuízos por não se pautar nos fundamentos teóricos da
perspectiva emancipatória de Paulo Freira na Educação de Jovens e Adultos.
3. Algumas considerações
Ao entendermos que a Educação Social é uma ação pedagógica que atua em contextos
educativos distintos e com o ser humano, na busca por ‘sonhos possíveis’, por justiça social e
legitimação de direitos podemos assumir que esta Educação que defendemos, a Social, pode
contribuir com a EJA. Ao partirmos do ponto central da Educação Social que é a defesa de
direitos e de justiça social contemplamos diretamente os sujeitos da Educação de Jovens e
Adultos, sujeitos que em certo momento tiveram negligenciada de suas vidas a educação.
Assim, a Educação Social pode servir de base para a EJA, contribuindo no processo de
formação dos sujeitos. A EJA no contexto brasileiro está posta no âmbito da escola, já a
Educação Social ainda não ocupa este espaço de maneira oficial, mas pode servir de referencial
para esta modalidade de ensino na e da escola. Assim como pode contribuir na formação destes
sujeitos em contextos educativos diversos.
É um desafio poder pensar a Educação Social como referencial para a EJA no contexto
escolar, assim como um dia foi a Educação Popular. Esta relação complexa e desafiadora é uma
tarefa árdua no contexto da Educação como um todo, pois como a EJA ainda está limitada ao
espaço da escola, os impeditivos numa relação mais subjetiva, mais coletiva e autônoma são
vários, como por exemplo: o currículo escolar, a burocracia, entre outros.
Cabe a Educação Social construir possibilidades de relação com a EJA no espaço em
que ela está posta, mas é papel fundamental também promover em outros contextos ações de
formação deste público de jovens e adultos.
Referências
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ZITKOSKI, Jaime José (orgs). Dicionário Paulo Freire. 2ª Edição Revista e Ampliada, Belo
Horizonte: Autêntica, 2010, p. 136-137
FREIRE, Paulo, 1921 – 1997. Política e educação : ensaios / Paulo Freire. – 5. ed - São Paulo,
Cortez, 2001. (Coleção Questões de Nossa Época ; v.23)
MAIA, Antonia Lucy Lima. Educação de jovens e adultos : políticas públicas no município de
Pinhais (2009-2012). Curitiba, 2013. 109 f.
PALUDO, Conceição. Educação Popular. In: STRECK, Danilo R.; REDIN; Euclides;
ZITKOSKI, Jaime José (orgs). Dicionário Paulo Freire. 2ª Edição Revista e Ampliada, Belo
Horizonte: Autêntica, 2010, p. 139-140
PIERRO, Maria Clara Di; JOIA, Orlando; RIBEIRO, Vera Maraga. Visões da Educação de
Jovens e adultos no Brasil. Cadernos Cedes, ano XXI, nº 55, 2001.
São PAULO, Taxa de analfabetismo cai 4,3 pontos percentuais em 14 anos, diz IBGE.
Disponivel em http://g1.globo.com/educacao/noticia/2015/11/taxa-de-analfabetismo-cai-43-
pontos-percentuais-em-14-anos-diz-ibge.html. Acesso em 16 de maio de 2016
STRECK, Danilo R.; SANTOS, Karine. Educação de Jovens e Adultos: diálogos com
a Pedagogia Social e Educação Popular. EccoS Revista Científica, núm. 25, enero-
junio, 2011, pp. 19-3