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CENTRO UNIVERSITÁRIO SÃO CAMILO

Curso de Pedagogia

Ana Paula dos Santos Monteiro


Camila Fernanda de Souza
Iraneide Santos Pereira
Luciane Aprígio Oliveira Perim
Patricia Rodrigues de Salles Prado

O PAPEL DO PROFESSOR
NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
Desafios e Dificuldades

São Paulo
2020
Ana Paula dos Santos Monteiro
Camila Fernanda de Souza
Iraneide Santos Pereira
Luciane Aprígio Oliveira Perim
Patricia Rodrigues de Salles Prado

O PAPEL DO PROFESSOR
NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS:
Desafios e Dificuldades

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao


Curso de Pedagogia do Centro Universitário São
Camilo, orientado pela Profa. Dra. Silmara de
Campos, como requisito parcial para obtenção do
título de Licenciado em Pedagogia.

São Paulo
2020
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Padre Inocente Radrizzani

O papel do professor na educação de jovens e adultos: desafios e dificuldades /


Ana Paula dos Santos Monteiro et al. -- São Paulo: Centro Universitário São
Camilo, 2020.

36 p.

Orientação de Silmara de Campos.

Trabalho de Conclusão de Curso de Pedagogia (Graduação), Centro


Universitário São Camilo – UNICEU Uirapuru, 2020.

1. Educação básica 2. Educação de jovens e adultos 3. Formação de


professores I. Monteiro, Ana Paula dos Santos II. Souza, Camila Fernanda
de III. Pereira, Iraneide Santos IV. Perim, Luciane Aprigio Oliveira V.
Prado, Patricia Rodrigues de Salles VI. Campos, Silmara de VII. Centro
Universitário São Camilo VIII. Título

CDD: 370.71
Agradecimentos
Dedicamos esta monografia a Deus que nos trouxe até aqui com saúde e dignidade,
a todos os familiares e amigos pela paciência, a nós mesmo por toda perseverança
(persistimos com esperança), paciência e o desejo de fazer a diferença na educação do
mundo.
A nossa orientadora Silmara de Campos, por toda dedicação e paciência nosso
muito obrigado.
A todos os tutores que tivemos o prazer de conhecer e conviver, mesmo aqueles que
convivemos por um breve período, nosso muito obrigado, e saibam que de alguma maneira
deixaram sua marca em nossas vidas. São eles:
- Tânia Cristina Boreto
- Camila Alba Cuadrado
- Elisa Vieira
- Louisa Mathieson
- Ricardo Santos Chiquito
MONTEIRO. A.P.S; PEREIRA, I.S.; PERIM, L.A.O.; PRADO, P.R.S.; SOUZA, C.F. O
Papel do professor na Educação de Jovens e Adultos: Desafios e Dificuldades. 2020.
36 p. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Pedagogia) - Centro Universitário
São Camilo, São Paulo, 2020.

O presente trabalho aborda os desafios da docência na Educação de Jovens e Adultos


(EJA), considerando a heterogeneidade de turmas, o crescimento de frequência dos jovens
nesta modalidade de ensino da Educação Básica, à necessidade de formação específica para
este educador ou educadora. A partir da análise qualitativa documental e bibliográfica, à luz
das contribuições da andragogia em interface com a pedagogia, pensando em seu papel
social e político. Este trabalho evidencia que tais abordagens se complementam,
demonstrando a importância deste educador ou educadora, ter conhecimento de diferentes
metodologias para o desenvolvimento do trabalho docente, de forma a conduzir a uma
aprendizagem significativa. Sabendo que nessa modalidade de ensino, os processos de
aprendizagem devem conceber educandos e educandas como sujeitos históricos e sociais,
reconhecendo suas trajetórias de vida, considerando que todos e todas carregam consigo a
natural disposição para o aprender, motivados pelas suas necessidades ou curiosidade,
todos e todas incluindo educadores e educadoras.

Palavras-chave: Educação básica. Educação de jovens e adultos. Formação de professores


LISTA DE SIGLAS

BNCC Base Nacional Comum Curricular.


CEB Câmara de Educação Básica.
CIEJA Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos.
CONFINTEA Conferência Internacional de Educação de Adultos.
CNE Conselho Nacional de Educação.
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais.
EJA Educação de Jovens e Adultos.
FUNDEB Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação.
FUNDEF Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério.
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
MOBRAL Movimento Brasileiro de Alfabetização.
PBA Programa Brasil Alfabetizado.
PMSP Prefeitura Municipal de São Paulo.
PROEJA Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio para
Jovens e Adultos.
PROJOVEM Programa Nacional de Inclusão de Jovens.
SECAD Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade.
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 7
1.1 Objetivo Geral 9
1.2 Objetivos Específicos 9
2. METODOLOGIA 11
3. BREVE HISTÓRICO DA EJA NO BRASIL 14
4. A ANDRAGOGIA EM INTERFACE COM A PEDAGOGIA 20
4.1 Pedagogia 20
4.2 Andragogia 21
5. PERFIS – EDUCADOR E EDUCANDO DA EJA 25
5.1 O Perfil do Educador da EJA 25
5.2 O Perfil do Educando da EJA 25
6. DESAFIOS DO EDUCADOR E EDUCADORA DA EJA 27
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS 32
REFERÊNCIAS 34
7

1. INTRODUÇÃO
estamos convictos de que aprendizagem e
educação de adultos preparam as pessoas com
conhecimentos, capacidades, habilidades e
competências e valores necessários para que
exerçam e ampliem seus direitos e assumam o
controle de seus destinos. Aprendizagem e
educação de adultos são também imperativas
para o alcance da equidade e da inclusão
social, para a redução da pobreza e para a
construção de sociedades justas, solidárias,
sustentáveis e baseadas no conhecimento1.

Esta declaração representa as recomendações dos países que participaram da VI


Conferência Internacional de Educação de Adultos (CONFINTEA), ocorrida na Cidade de
Belém em dezembro de 2009, e representa um dos eventos mais importantes para a
Educação de Jovens e Adultos (EJA), em razão da possibilidade de aprofundar-se no debate
e apontar diretrizes para a implantação de políticas públicas para a EJA.
Discutir a Educação de Jovens e Adultos requer um olhar para além das
recomendações e compromissos internacionais assumidos em eventos da envergadura da
CONFINTEA. Requer um olhar atento para a formação de educadores e educadoras da
EJA; requer um olhar atento para os sujeitos jovens e adultos da EJA; requer um olhar
atento e crítico sobre as normatizações, diretrizes e regulamentações da EJA no cenário da
educação no Brasil.
A problemática que envolve a EJA instiga-nos ao aprofundamento de algumas
questões que permeiam a formação de educadores e educadoras, considerando os desafios e
dificuldades para o exercício de sua prática pedagógica.
Tantas outras indagações envolvem as práticas pedagógicas com jovens e adultos da
EJA e, dentre elas, os recentes estudos acerca da andragogia. Por este ponto de vista, aliar
as contribuições da andragogia na compreensão do fenômeno da aprendizagem de jovens e
adultos pode se mostrar promissor.

1
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade.
Documento Nacional Preparatório à VI Conferência Internacional de Educação de Adultos (VI
CONFINTEA) / Ministério da Educação (MEC). – Brasília: MEC; Goiânia: FUNAPE/UFG, 2009, p.7.
8

Assim, no presente trabalho será analisado o papel do educador e da educadora na


EJA, os seus problemas, suas dificuldades, desafios e comprometimento didático à luz das
contribuições da pedagogia e da andragogia, pensando no seu papel social e político.
Portanto, ao educador e educadora da EJA cabe o desafio de junto com educandos e
educandas, desenvolver práticas pedagógicas que considerem indispensável a formação
crítica e consciente de “ser cidadão”.
O desafio da docência na EJA inicia com uma heterogeneidade de turmas, além das
dificuldades dos estudantes para frequentarem as aulas, em razão do cansaço de quem
trabalha o dia todo, realidade esta vivida pela maioria.
A volta para os bancos escolares nem sempre é tranquila, pois muitos possuem
históricos de conflitos que os afastaram da instituição escolar. É preciso que o professor
tenha amplo envolvimento para restabelecer o vínculo de confiança, possibilitando o espaço
de convivência e expressão destes adultos e jovens.
Desta forma, o papel do educador e educador da EJA envolve um planejamento
comprometido, coerente, com vistas à sua responsabilidade social e política.
Para a realização dos estudos, escolhemos trilhar pelos caminhos da pesquisa
qualitativa porque possibilita a análise dos dados levantados a partir de documentos e do
levantamento bibliográfico de produções acadêmicas já realizadas sobre o tema da
pesquisa, além de favorecer a interpretação dos dados e as possíveis generalizações do
conhecimento produzido.
Assim, verificamos instrumentos legais que resguardam suas especificidades e a
necessidade desta modalidade de ensino no cenário das políticas públicas para a Educação
Básica, tal como expressa a Lei de Diretrizes e Bases nº 9394/96.
Demonstramos a importância do educador e educadora da EJA ter conhecimento de
diferentes metodologias para o desenvolvimento do trabalho docente, para assim,
desenvolver objetivos e propostas a serem alcançados, considerando as diferenças dos
temas, da situação e dos educandos e educandas, de forma a conduzir a uma aprendizagem
significativa.
A questão que nos colocamos e que nos inquieta é como incentivar os jovens e os
adultos a se sentirem motivados e não deixar os problemas rotineiros os afastarem da
escola.
Este é um grande desafio, pois sabemos que a EJA caminha para não mais existir,
por carência de intenção em se propor políticas educacionais para esta modalidade de
ensino da Educação Básica.
9

1.1 Objetivo Geral

O objetivo geral da pesquisa é analisar o papel de educadores e educadoras na


modalidade de Educação de Jovens e Adultos- EJA.

1.2 Objetivos Específicos

Como objetivos específicos, analisamos os problemas e dificuldades que o professor


da EJA encontra no século XXI comparativamente ao século XX. Investigamos os desafios
advindos dos perfis novos e a significância da modalidade da EJA, como uma forma de
entender a alfabetização em sua dimensão política, em um país com cerca de 11,3 milhões
de analfabetos com 15 anos ou mais de idade, segundo o IBGE de 20182. Em termos
comparativos, a cidade de São Paulo tem 12,2 milhões de habitantes.
A docência na EJA envolve uma heterogeneidade de turmas, hoje representada por
um grande número de jovens que evadiram dos cursos regulares, seja para adentrar ao
mercado de trabalho, ou por outras razões sociais.
A volta para os bancos escolares nem sempre é tranquila, muitos possuem históricos
de conflitos que os afastaram da instituição escolar. É preciso que educadoras e educadores
tenham amplo envolvimento para restabelecer o vínculo de confiança, possibilitando o
espaço de convivência e expressão destes adultos e jovens.
Portanto, o papel do educador e educadora da EJA envolve um planejamento
comprometido, coerente, com vistas à sua responsabilidade social e política, sabendo que
nessa modalidade de ensino, os processos de aprendizagem devem conceber educandos e
educandas como sujeitos históricos e sociais, reconhecendo suas trajetórias de vida,
considerando que todos e todas carregam consigo a natural disposição para aprender,
motivados pelas suas necessidades ou curiosidade.
Refletir acerca da história da educação no Brasil, especificamente da EJA, e a
regulação dos instrumentos legais que a viabilizaram e reafirmaram a sua necessidade de
existir, é debruçar-se sobre a história de homens e mulheres obstinados em superar questões
culturais e valores religiosos, e aprofundar-se nas possibilidades de uma transformação
social por meio da educação. Parafraseando Paulo Freire, “se a educação sozinha não
transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda” (2000, p.67).

2
IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Educa IBGE. Rio de Janeiro,
2018. Disponível em: <https://educa.ibge.gov.br/jovens/conheca-o-brasil/populacao/18317-educacao.html>.
Acesso em 24 dez. 2019.
10

Foi este motor, o dos movimentos sociais e culturais, pela transformação da


realidade do analfabetismo nacional acima de 60% da população adulta, que impulsionaram
pesquisas, reflexões e demandas para que políticas públicas fossem consolidadas.
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) representa uma dívida social não reparada
com os que não tiveram acesso e nem domínio da cultura letrada como bem social, na
escola ou fora dela, e foram força de trabalho na constituição de riquezas e na elevação de
obras públicas (Parecer CNE/CEB 11/2000).

Olhar de perto a EJA dos dias de hoje, é também reconhecer os avanços


principalmente vindos da somatória de esforços de seus educadores, que enfrentam a
limitação do espaço físico refletido na falta das mínimas condições de infraestrutura para o
coletivo, mas que ainda assim, buscam dar conta dos conteúdos, sem esquecer sua própria
história e sua relação com a história de vida dos educandos e com o contexto social no qual
todos, educadores, educandos e escola estão inseridos.
11

2. METODOLOGIA

Para esta pesquisa, referendamos nas contribuições teóricas do Professor Moacir


Gadotti, à reflexão trazida pelo Professor Ewerton Fernandes de Souza3, à luz dos
princípios da andragogia, de forma dialógica com a pedagogia, sem dicotomias presentes,
mas sim, a partir de reflexões e contribuições de Paulo Freire, Patrono da Educação
Brasileira4, compreendendo a educação como processo coletivo e dialógico de construção
de conhecimentos.
Nossa pesquisa vem ao encontro com a problematização do Professor Gadotti,
quando reforça os compromissos do educador de jovens e adultos e a importância de seu
perfil sócio histórico, consolidando o que a grande maioria dos estudos acerca desta
modalidade de educação nos traz, demonstrando a importância da formação específica do
educador de EJA.
Dentre as discussões realizadas ao longo do processo de pesquisa, apresentaremos a
partir da análise qualitativa, documental e bibliográfica, que tais abordagens se
complementam como podemos ver a seguir, atravessando as contribuições e reflexões
apresentadas por Gadotti, aos “mandamentos” trazidos pelo Coordenador Geral do Centro
Integrado de Educação de Jovens e Adultos (CIEJA), Prof. Ewerton5.
Sobre a adoção das diferentes abordagens de pesquisa:

Conforme o problema pode-se necessitar, para a sua compreensão, de


vários tipos de aproximação, quando combinamos vários procedimentos
de busca para conseguir elementos relevantes ao estudo. Nessa
perspectiva é que se busca a superação da dicotomização irreconciliável
entre abordagens qualitativas vs. quantitativas, por um olhar mais amplo,
que implica a conjugação de fontes variadas de informação sob uma
determinada perspectiva epistêmica. Também se propunha a superação do
preconceito: tudo o que vem a partir das abordagens “qualitativas” é bom;
o que vem de abordagens “quantitativas” é mau. A dicotomia,
quantitativo-qualitativo, como julgamento de valor científico, não se
sustenta, o que não significa negar que as perspectivas metodológicas em
cada caso são diferentes nas características, métodos e propósitos. Porém,
as exigências de validade e consistência interna e externa valem para as
duas formas de abordagem. (GATTI, 2012, p. 29).

3
SOUZA, Ewerton - Gestão Escolar. Disponível em: <https://gestaoescolar.org.br/conteudo/2147/os-cinco-
mandamentos-do-professor-da-eja>. Acesso em 17 nov. 2019.
4
O educador e filósofo pernambucano Paulo Freire (1921-1997) passa a ser reconhecido como Patrono da
Educação Brasileira. É o que estabelece a Lei nº 12.612/2012.
5
Foi um dos finalistas do Prêmio Educador Nota 10 de 2017.
12

Para a realização deste trabalho, fizemos uso da abordagem qualitativa, buscando


dados acerca das especificidades da docência da EJA e de seus educandos e educandas, e a
execução dos objetivos foi pautada na pesquisa documental, que verificou nos documentos
históricos os marcos regulatórios da Educação de Jovens e Adultos no Brasil, e
bibliográfica parametrizando por estudos de relevância na área. A metodologia foi dividida
em três etapas: a primeira etapa compreendeu levantamento bibliográfico sobre o tema,
definindo os conceitos de andragogia e pedagogia, a segunda etapa consistiu no
levantamento e análise documental para coleta e sistematização dos dados que consistem no
histórico da EJA e a terceira foi análise dos dados coletados e que permitiu traçar as
características da EJA na perspectiva de educadores e educadoras, considerando ainda a
heterogeneidade de educandos e educandas.

Os CIEJAs, uma das formas de atendimento a jovens e adultos na cidade de São


Paulo é, segundo a Secretaria Municipal de São Paulo:
uma Unidade Educacional que atende jovens e adultos em três períodos
(manhã, tarde e noite) em até seis turnos diários, articulando em seu
projeto político pedagógico o Ensino Fundamental e a Qualificação
Profissional Inicial.
Os cursos têm duração de quatro anos e são estruturados em quatro
Módulos: Módulo I (Alfabetização), Módulo II (Básica), Módulo III
(Complementar) e Módulo IV (Final). Cada módulo tem duração de 1 ano
e 200 dias letivos e são desenvolvidos em encontros diários de 2 horas e
15 minutos (3 horas/aula).
A qualificação profissional inicial está organizada em Itinerários
Formativos, definidos a partir das necessidades da comunidade e
características locais, desenvolvidos de forma articulada e integrada ao
Ensino Fundamental.
A matrícula dos jovens e adultos nesta forma de atendimento pode ser
feita nas Unidades Educacionais dos CIEJAs. (Portal da Educação –
PMSP) 6.

Quando o coordenador geral do CIEJA, Prof. Ewerton (2019) inicia suas


observações, lembra-nos algo fundamental para qualquer educador, que é, “respeitar a
trajetória do aluno” (p. 3), trazendo esta vivência para dentro da sala de aula; considerando
que todo ser humano tem em si uma potencialidade natural para aprender e considerar a
troca de saberes a partir da realidade de cada sujeito, é criar conhecimentos significativos.
Segue, nos lembrando sobre o “respeitar o tempo de cada um” (p.3), cada aluno aprende no
seu tempo, conforme seu desenvolvimento, compreendendo que este conhecimento que se

6
Portal da Educação da Prefeitura Municipal de São Paulo. Disponível em:
<http://portal.sme.prefeitura.sp.gov.br/Main/Page/PortalSMESP/Formas-de-Atendimento>. Acesso em 14
mar. 2020.
13

constrói, segundo a ciência da cognição, se dá por processos auto-organizados, aprendemos


na mesma lógica que o corpo.
Reconhecer a faixa etária de cada educando, considerando inclusive o novo perfil da
EJA, com significativo aumento da presença de jovens que evadiram dos cursos regulares e
trazem consigo outra cultura escolar e muitas vezes motivação meramente prática para
seguir com seus estudos.
Este educador ou educadora contemporâneo vive em outro tempo histórico, que
diferente do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), que existiu de 1967 a
1985, onde adultos que procuravam a alfabetização, tinham idades próximas.
Hoje a EJA convive com outra realidade, onde o jovem de 19 anos convive com
pessoas idosas de 70 anos, o educador ou educadora da EJA precisam estar focados no
material que vai levar para esse educando ou educanda, na linguagem que utilizará na sala
de aula, sempre dialogando com o mundo que eles vivem.
Aqui podemos mesclar o respeito à diversidade, que é o ponto para que tudo
caminhe de forma harmoniosa; com a motivação, visto que não há nada mais motivante do
que um ambiente acolhedor, onde a andragogia de fato se concretize na ideia de um pensar
sobre o outro. É neste sentido que entendemos que os estudos sobre a andragogia podem
trazer contribuições valiosas.
O educador ou educadora dentro de uma sala de EJA terá jovens, idosos,
transexuais, negros, brancos, estrangeiros, lembrando que a maioria deles deixou de
frequentar as aulas regulares, muitas vezes por não serem respeitados por suas diferenças.
Então é neste momento que o educador e a educadora precisam trabalhar de forma
respeitosa e fazer, também, com que todos se respeitem sabendo que cada um possui uma
visão de mundo diferente.
O educando e educanda da EJA, na maioria das vezes, já se encontra exausto e
cansado pela sua jornada diária de trabalho, e, além disso, muitas vezes tem sua autoestima
baixa, não acreditando na possibilidade de ascensão social a partir da educação e trabalho.
O educador ou educadora vai ser um dos incentivadores, assim como será motivado pelo
desenvolvimento deste educando e educanda, compreendendo que todos aprendam em
todos os momentos da vida.
Se motivação é uma necessidade para que o educando e educanda da EJA conclua o
curso, para o educador ou educadora não é diferente e, neste sentido, buscamos demonstrar
as especificidades deste educador.
14

3. BREVE HISTÓRICO DA EJA NO BRASIL

Quando olhamos para o histórico da educação no Brasil, percebemos que sempre foi
privilégio exclusivo para a classe de maior poder aquisitivo. Mesmo na contemporaneidade,
quando falamos de educação, percebemos que ainda há atitudes da época da colonização. É
notório que as políticas públicas educacionais ainda não conseguem atender toda
população.
Com a primeira Constituição Brasileira de 1824 houve uma intenção de permitir que
os cidadãos tivessem acesso à educação (primária) gratuita.
São demandatários da educação de jovens e adultos aqueles que não
tiveram acesso à escola na idade própria, os que foram reprovados, os que
evadiram, os que precisavam trabalhar para auxiliar a família. (SOARES,
1996, p. 28).

A Educação de Jovens e Adultos permite que uma parte da população, que por
algum motivo não conseguiu dar continuidade aos seus estudos no ensino fundamental ou
médio durante a idade escolar, o que justifica a relevância desta discussão, que é a
desigualdade social.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o dever do Estado com a EJA
é reconhecido e cresce a busca por esta modalidade de ensino que, para muitos, é a
possibilidade de reaver o tempo perdido por anos, por que não dizer décadas.
Políticas de educação igualitárias respondem por uma escolarização em
que os estudantes possuem os mesmos direitos, sem nenhuma
discriminação, tendo direito ao acesso, a permanência e ao sucesso nas
etapas da educação básica. Trata-se de efetivar a igualdade de
oportunidades e de condições, ante um direito inalienável da pessoa: a
cidadania e os direitos humanos (CURY, 2005, p. 04)

Chega como uma luz no fim do túnel para as pessoas jovens e adultas, a reflexão da
escola e agora de educadores e educadoras sobre sua função social, buscando melhores
soluções para os muitos desafios da EJA. Porém, para que tal fato se concretize, é preciso
comprometimento da comunidade escolar, além da implementação de políticas de Estado
que efetive o direito a educação.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) n. 9394/1996, define a
Educação de Jovens e Adultos-EJA como uma modalidade da educação básica, destinada
àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio
na idade própria.
15

O Parecer do Conselho Nacional de Educação / Câmara de Educação Básica


(CNE/CEB) 11/2000 de 10/05/2000 estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN)
para a EJA, do qual Jamil Cury foi relator enfatizando a importância de considerar os
jovens e adultos:

Nesta linha, a educação de jovens e adultos representa uma promessa de


efetivar um caminho de desenvolvimento de todas as pessoas, de todas as
idades. Nela, adolescentes, jovens, adultos e idosos poderão atualizar
conhecimentos, mostrar habilidades, trocar experiências e ter acesso a
novas regiões do trabalho e da cultura. Talvez seja isto que Comenius
chamava de ensinar tudo a todos. A EJA é uma promessa de qualificação
de vida para todos, inclusive para os idosos, que muito têm a ensinar para
as novas gerações. Por exemplo, o Brasil também vai conhecendo uma
elevação maior da expectativa de vida por parte de segmentos de sua
população. Os brasileiros estão vivendo mais. Segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o número de brasileiros com
mais de 60 anos estará na faixa dos 30 milhões nas primeiras décadas do
milênio. É verdade que são situações não generalizáveis devido à baixa
renda percebida e o pequeno valor de muitas aposentadorias. A esta
realidade promissora e problemática ao mesmo tempo, se acrescenta, por
vezes, a falta de opções para as pessoas da terceira idade poderem
desenvolver seu potencial e suas experiências vividas. A consciência da
importância do idoso para a família e para a sociedade ainda está por se
generalizar (CURY, 2000, p. 10-11).

A história da EJA no Brasil é bem complexa e cheia de desafios, como já


mencionamos, visto que no país há cerca de 11,3 milhões de analfabetos, conforme destaca
dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2018).
Durante o Brasil Colônia, a educação por missionários era específica para adultos.
A constituição de 1824 trouxe uma garantia de uma educação primária e gratuita para
“todos” os cidadãos, com ressalvas, não fazendo parte deste grupo: negros, indígenas e
grande parte das mulheres.
Com o ato adicional de 1834, a responsabilidade pela educação básica passa a ser
das províncias. O governo imperial cuida da educação da elite. Em 1891 descentralizasse a
responsabilidade pública no ensino básico. Chega a Revolução de 1930, e com ela os
interesses da nação são reafirmados. Com isso é criado o Plano Nacional de Educação, que
dita o que a União, Estados e Municípios terão de responsabilidades com a educação da
população.
Na década de 1940 e 1950, alguns programas governamentais são criados. Podemos
mencionar: Fundo Nacional de Ensino Primário em 1942; o Serviço de Educação de
16

Adultos e a Campanha de Educação de Adultos em 1947; a Campanha de Educação Rural


iniciada em 1952 e; a Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo em 1958.
Em 1960, Paulo Freire apresenta uma nova pedagogia de alfabetização de adultos,
sendo os alunos sujeitos de sua própria aprendizagem e produtores de cultura. O filósofo e
educador teve grande importância na construção de uma política de Educação para Jovens e
Adultos no país. Em 1962 foi convidado para um projeto de educação, uma de suas
primeiras experiências de alfabetização, numa cidade chamada Angicos, localizada no Rio
Grande do Norte, onde implantou o projeto conhecido como “Quarenta horas de Angico”.
A primeira aula veio a acontecer em janeiro de 1963 com o tema “Conceito
antropológico de cultura”. Na quadragésima hora de aula, que aconteceu em abril, teve a
presença do presidente da república, João Goulart (1961-1964), demostrando assim como
esse projeto estava em evidência. Esse projeto ocorre com Paulo Freire alfabetizando
trabalhadores adultos dessa cidade (300 trabalhadores). Esse processo de alfabetização
tinha como objetivo alfabetizar e conscientizar, capacitando o oprimido em relação à leitura
e escrita tanto quanto para sua libertação social, tornando-se um cidadão pensante e
participativo na sociedade.
O projeto iniciado em Angicos ganha repercussão e é levado para outras cidades
sendo considerado “projeto-piloto” do Programa Nacional de Alfabetização, iniciado em
1964. Também nesse mesmo ano, o projeto foi interrompido pelo Golpe Militar, o qual
levou Paulo Freire ao exilio, pois foi acusado de subverter a ordem instituída.
Nesse mesmo ano, Paulo Freire exilou-se primeiro no Chile, após ficar preso por 72
dias. No Chile desenvolve trabalhos durante 5 anos voltados para a educação de adultos.
Durante o exilio publica, em 1967, seu primeiro Livro “Educação como prática da
liberdade” e em 1968 sua principal obra “Pedagogia do Oprimido”, sendo publicado no
Brasil somente em 1974, com a liberalização cultural iniciada pelo general Geisel.
O Poder Executivo em 1967 cria a Fundação Mobral, sob a denominação de
Movimento Brasileiro de Alfabetização, com o objetivo de atender adultos analfabetos
entre 15 e 30 anos, com diferentes propostas metodológicas no início dos anos 60, todavia,
desconsiderando o educando e a educanda no processo de aprendizagem, o que nos leva a
crer que, não havia interesse que se tornassem cidadãos críticos dentro da sociedade.
Na década de 70 o Mobral cresce no país, mas começa a ser muito criticado, sendo
encerrado em 1985. Em substituição ao Mobral surge a Fundação Nacional para Educação
de Jovens e Adultos – Fundação Educar.
17

Em 1971, a LDBEN n. 5692/1971 implanta o Ensino Supletivo, que tem como


objetivo, “repor o ensino regular, formar mão de obra e atualizar conhecimentos”.
Art. 24. O ensino supletivo terá por finalidade: suprir a escolarização
regular para os adolescentes e adultos que não a tenham seguido ou
concluído na idade própria; suprir a escolarização regular para os
adolescentes e adultos que não a tenham seguido ou concluído na idade
própria;
Parágrafo único. O ensino supletivo abrangerá cursos e exames a serem
organizados nos vários sistemas de acordo com as normas baixadas pelos
respectivos Conselhos de Educação.
Art. 25. O ensino supletivo abrangerá, conforme as necessidades a
atender, desde a iniciação no ensino de ler, escrever e contar e a formação
profissional definida em lei específica até o estudo intensivo de
disciplinas do ensino regular e a atualização de conhecimentos.

Na década de 1980, com a redemocratização do país, a luta pelos direitos sociais e


ações diretas da sociedade civil e dos movimentos sociais alavanca o crescimento dos
direitos sociais.
A Constituição Federal de 1988 dita que é direito de todos os brasileiros terem
acesso à educação, delegando ao Estado à responsabilidade por sua oferta. Na década de
1990, a Fundação Educar é extinta7 e nenhum outro programa veio a substitui-la.
Representa um marco no processo de descentralização da escolarização
básica de jovens e adultos, que representou a transferência direta de
responsabilidade pública dos programas de alfabetização e pós-
alfabetização de jovens e adultos da União para os municípios. Desde
então, a União já não participa diretamente da prestação de serviços
educativos, enquanto a participação relativa dos municípios na matrícula
do ensino básico de jovens e adultos tendeu ao crescimento contínuo
(HADDAD e DI PIERRO. 2000, p.121)

No governo de Itamar Franco (1992-1995), o documento Plano Decenal de


Educação de 1993, foi a primeira medida realizada após o acordo fixado na Conferência
Mundial de Educação Para Todos (1990, Tailândia), onde uma das metas era aumentar o
oferecimento de oportunidades de educação básica, equivalente ao ensino fundamental para
jovens e adultos.
Foi o Plano Decenal que fundamentou a prática política educacional dos dois
mandatos do governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Até o ano
2004, os estados continuaram responsáveis pela escolarização de jovens e adultos. A EJA
não teve prioridade no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Com a reforma que ocorreu no governo, foi criado o Programa Alfabetização
Solidária (1997), o qual foi idealizado pela Comunidade Solidária8·, com o objeto de

7
No início do governo de Presidente Collor de Mello (1990-1992).
18

diminuir entre os jovens de 12 e 18 anos o analfabetismo. Criado com o objetivo de atender


a camada mais pobre da população aconteceu com a parceria entre o governo e instituições
de Ensino Superior.
Inicialmente priorizando as regiões Norte e Nordeste e em 2001 o programa tem
início no Distrito Federal e em grandes capitais.
Uma das ações prioritárias do governo Fernando Henrique Cardoso (período de
1995-2002) foi o estabelecimento de uma reforma da educação pública, o que levou à
criação da LDBEN n. 9394/1996.
Segundo Di Pierro, durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso
(1995-2002), o Governo Federal não deu atenção à educação básica de jovens e adultos, e
somente a partir de 2003, no governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva (período de
2003-2010) assumiu-se o compromisso de acabar com a fome e o analfabetismo no Brasil.
Durante os oito anos da presidência de FHC, o Governo Federal conferiu
lugar marginal à educação básica de jovens e adultos, cujas ações foram
retomadas a partir de 2003, quando o Presidente Luís Inácio Lula da Silva
passou a governar o país e assumiu o compromisso de acabar com a fome
e o analfabetismo no Brasil, delegando ao Ministério da Educação a
responsabilidade pelo analfabetismo e criando a Secretaria Extraordinária
de Erradicação do Analfabetismo, que posteriormente, vinculou-se à
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade
(SECAD). Neste governo, a EJA tornou-se alvo de iniciativas bem mais
significativas, sendo uma dessas o Programa Brasil Alfabetizado. (DI
PIERRO 2005, p.1127-1128).

No governo do Presidente Lula foi implementada uma série de políticas públicas


educacionais: Programa Brasil Alfabetizado, Programa Nacional de Inclusão de Jovens
(PROJOVEM), Programa de Integração da Educação Profissional ao Ensino Médio para
Jovens e Adultos (PROEJA) e Programa Bolsa Família.
O Programa Brasil Alfabetizado (PBA), instituído pelo decreto de n.º 4.834, de 8 de
setembro de 2003 ficou ativo até 2016. Esse programa foi criado com a finalidade de
erradicar o analfabetismo no país, sendo o público alvo a população jovem e adulta, que por
algum motivo, não tiveram acesso à escola no tempo regular e não sabiam ler nem escrever.
Em 2007, houve a aprovação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB). O FUNDEB
foi instituído pela Emenda Constitucional nº 53, de 19 de dezembro de 2006 e
regulamentado pela Medida Provisória nº 339, de 28 de dezembro do mesmo ano,

8
Comunidade Solidária foi uma parceria entre organizações da sociedade civil e da sociedade política para a
construção e difusão de programas sociais inovadores
19

convertida na Lei nº 11.494, de 20 de junho de 2007, e pelos Decretos nº 6.253 e 6.278, de


13 e 29 de novembro de 2007, respectivamente. Substituiu o FUNDEF, sendo que a
principal diferença é atender, além do ensino fundamental, objeto do antecessor, também
a educação infantil, o ensino médio e a educação de jovens e adultos.
A EJA cresce no cenário educacional, com muitos desafios para serem superados,
tendo como a principal delas, a quase ausência de políticas públicas para a formação
continuada e especializada do educador ou educadora da EJA, conforme suas demandas.
20

4. A ANDRAGOGIA EM INTERFACE COM A PEDAGOGIA

O desenvolvimento do presente trabalho se dá a partir das duas principais vertentes


educacionais que explicam como o ser humano aprende, sendo os princípios da andragogia
e da pedagogia, sem dicotomias presentes, os norteadores desta pesquisa, que compreende
educação como processo coletivo e dialógico de construção de conhecimentos.
As especificidades da EJA se apresentam na necessidade do educador ou educadora
ter conhecimento e se valer de diferentes métodos pedagógicos, técnicas e também de sua
experiência de vida, como sujeito histórico e social, compreendendo a diversidade social e
desigualdades presentes em suas turmas de educandos e educandas, além de considerar a
experiência de vida de cada um destes atores sociais, sabendo ainda que a educação na EJA
evidencia sua função social de forma explícita, considerando que para este público a volta
aos estudos se dá pela necessidade social de ascensão profissional na maioria das vezes.

4.1 Pedagogia

Cuja etimologia vem do grego paidós = criança e agogôs = guiar, conduzir, educar.
O termo originou-se na Europa do século VII, na época que o ensino monástico foi
sistematizado. O termo “Pedagogia” tem referencial no escravizado que conduzia as
crianças ao mestre. Nesta época os monges eram os mestres responsáveis pela formação
individual dos seus discípulos, o ensino era guiado pelo amor ao saber e pela
espiritualidade, com predomínio humanista e intenção de catequização, ou seja, conversão
ao cristianismo, remontando ao pensamento de Foucault, quando na obra “Vigiar e
Punir” (1987), afirma que as sociedades contemporâneas definem-se como disciplinares,
deste modo o nascimento das diferentes instituições; como a escola, a fábrica e a prisão,
dialogam com outra forma de poder. Senso assim, a escola vem funcionando "como a mais
importante instituição capaz de moldar disciplinarmente os indivíduos que ela toma para si"
(VEIGA-NETO, 2008, p. 145).
A Escola a serviço do Estado e não do clero, nasce no final do século XXVI, e
segue através dos tempos com o propósito de formar cidadãos com a capacidade da leitura
e escrita, não necessariamente cidadãos letrados e aptos à leitura de mundo; o ensino
individual e não coletivo centrado na figura do mestre que ao longo dos séculos foi
substituído pelo que hoje chamamos de professor. Esta centralização na figura do professor
21

perpassou séculos e ainda encontra-se na base da educação formal-tradicional


contemporânea, apesar de possuirmos muitas outras abordagens educacionais.
Enquanto a pedagogia nos tempos atuais passa a centralizar suas energias no sujeito
da aprendizagem, a EJA nasce já com a especificidade de que não há como se dizer que ali
estariam “páginas em branco a serem escritas”, mas muitos volumes de conhecimentos, que
articulados às metodologias e práticas pedagógicas, poderiam resultar em um processo de
alfabetização e letramento com significado, que fariam com que sua função social estivesse
ali estabelecida, numa perspectiva do desenvolvimento pleno do indivíduo.
Deste modo, este trabalho pensa pedagogia a partir de suas diferentes práticas,
metodologias e abordagens, considerando o indivíduo como único e sujeito histórico e
social de seu processo de aprendizagem.

4.2 Andragogia

Em 1833 o termo “Andragogia” (do grego andro = homem adulto + agogus =


guiar, conduzir, educar) surge com o professor alemão Alexander Kapp, ao escrever um
livro intitulado Platz’s Erziehungslehre (Teorias Educacionais de Platão).
Durante quase um século o termo Andragogia foi criticado e caiu em desuso, o
principal motivo foram as críticas feitas pelo professor alemão de pedagogia da
Universidade de Konigsberg, chamado Johann Friedrich Herbart. Influenciado pelas ideias
de Immanuel Kant, o qual foi aluno, para Herbart os indivíduos adultos, depois dos 20 anos
de idade, não poderiam ser ensinados, pois não aprenderiam coisas novas. Dada a sua
influência à época, o termo acabou caindo em desuso.
Somente em 1921 que outro alemão, chamado Eugen Rosenstock-Huessy, pensador,
jurista, linguista e filósofo alemão, em seu artigo Andragogik (Andragogia), usou o termo
“Andragogia”, justificando – até pelo fato de ser linguista - que os educadores
equivocavam-se ao aplicar os métodos pedagógicos em adultos, já que o próprio
significado ou origem dos termos informa quem são seus destinatários.
Rosenstock antes mesmo de 1921 já havia escrito sobre educação de adultos e é
considerado o pioneiro na aplicação dos conceitos andragógicos. Participou do grupo de
estudiosos alemães que trabalhavam em favor da educação nacional popular e gratuita,
desenvolvendo teorias e conceitos sobre a educação de adultos (Hohenrodter Bund, 1923-
1930), que resultaram na fundação da Escola Alemã de Pesquisa Pública e Educação de
22

Adultos (Deutsche Schule für Volksforschung und Erwachsenenbildung), que foi a primeira
a aplicar os métodos andragógicos para formação profissional.
Nesta época acreditavam que não deveria haver uma hierarquia entre educador (a) e
educando (a) e que os educandos (as) adultos e trabalhadores aprendiam através de
experiências de trabalho, desta forma o educador (a) deveria utilizar esta experiência para o
processo educativo.
O termo Andragogia passou pelos países europeus, mas sem grande visibilidade, até
que o norte americano Eduard Lindeman (1926) trouxe o termo para a América, sendo
mentor de Malcolm Knowles (1970), considerado o pai da Andragogia e que é figura mais
importante nesta área até hoje. A Andragogia buscou, nesta época, (e ainda busca) a sua
identidade, desvinculando da pedagogia e afastando o professor da figura de um condutor.
Segundo Rossana Barros (2018), para Knowles, não há entre os termos Pedagogia e
Andragogia uma simples paridade de sentidos diversos, pois para ele a Pedagogia é “a arte
e a ciência de ensinar crianças”, já a Andragogia é a “a arte e ciência de ajudar os adultos a
aprender”.
Ainda segundo Rossana Barros (2018) é identificável na linha de pensamento de
Knowles um conjunto de pelo menos seis pressupostos em torno dos quais se estabelece e
estrutura o essencial da comparação entre pedagogia e andragogia. Resumindo, por nossas
palavras, o que Rossana Barros cita de Knowles, os pressupostos seriam:

a) Relaciona-se com a forma como é entendida e a necessidade de saber ou


conhecer – no modelo pedagógico a criança aprende o que é lhe ensinado, já no
modelo andragógico o adulto aprende o que ele avalia que lhe é adequado e útil.
b) Autoconceito ou conceito em si de quem aprende – no modelo pedagógico se
entende que a criança é dependente e o professor decide o que tem que ser
aprendido, sem autonomia. O modelo andragógico se pressupõe autonomia e
independência o trabalho do professor é estimular e alimentar esta autonomia auto
diretiva do estudante. O autoconceito é negado à criança e imposto no adulto.
c) Papel atribuído à experiência de quem aprende – no modelo pedagógico a
experiência da criança não é de muita valorizada, mas sim a do professor com seus
conhecimentos e métodos didáticos. No modelo andragógico esta experiência do
estudante é grande valia podendo ajudar como indicador para que aprendizagem
ocorra através de métodos ativos e de experimentação.
23

d) Disposição ou vontade de aprender – no modelo pedagógico a sociedade define o


que a criança tem que aprender dentro de uma lógica interna escolar. Já no modelo
andragógico a aprendizagem está condicionada ao meio, ou seja, os adultos aprenderão
aquilo que entendem que precisam aprender.
e) Sentido e orientação de dados à aprendizagem – no modelo pedagógico o sentido da
aprendizagem é compreendido a longo prazo, sendo centrado no conteúdo,
compartimentação de disciplinas e níveis. Já no modelo andragógico há uma
fragmentação de conteúdo, pois a necessidade é de curto prazo para ser aplicada em
resolução de problemas e tarefas para sentidos práticos.
f) Motivação para aprender – a criança teria um estímulo externo para aprender,
enquanto o adulto se automotiva, sendo este estímulo interno.

A abordagem dialógica e libertadora de Paulo Freire receberia a influência de todos


os que o antecederam, mas com características próprias. O termo educação bancária 9, onde
evidenciou a forma como o ensino era concebido, a falta de criticidade com a realidade que
os cercava, a falta de educação para a cidadania, pautada na autonomia do ser, convidando
os alunos e profissionais a serem críticos à realidade ao qual estavam inseridos e para os
quais estariam ensinando e aprendendo ao mesmo tempo.
a leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta
implica a continuidade da leitura daquele. [...] podemos ir mais longe e
dizer que a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do
mundo, mas por uma certa forma de “escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”,
quer dizer, de transformá-lo através da nossa prática consciente.
(FREIRE, 2000, p. 20).

Dentre suas críticas à Educação Bancária, está a hierarquização entre o educador e o


educando. O Educador, sendo o que possui todo o saber, é o sujeito da aprendizagem,
aquele que deposita o conhecimento. O educando, então, é o objeto que recebe o
conhecimento. A educação vista por essa ótica tem como meta, intencional ou não, a
formação de indivíduos acomodados, não questionadores e submetidos à estrutura do poder
vigente.
Uma discussão de grande relevância quando pensamos na Educação de Jovens e
Adultos, avaliando que das principais razões que afastam este educando dos estudos, as
desigualdades sociais são presentes na narrativa de faltas; sendo assim a proposta de Freire

9
Modelo de educação parte do pressuposto que o aluno nada sabe e o professor é detentor do saber, voltado
para a manutenção do “status quo”.
24

(2001), de respeito à cultura da comunidade e o avanço gradual de uma postura crítica,


confirmaria sua teoria de que o conhecimento não viria de fora, mas se construiria a partir
da forma como a realidade se apresenta na consciência do educando, em uma escola que
fortaleça e nos possibilite ser, bem como nossa diversidade, sem nos diminuir trabalhando
identidades que nos moldam como iguais.
No decorrer de nossa pesquisa, a Heutagogia10 surgiu como forte caminho nas
discussões da Educação de Jovens e Adultos, bem como os avanços das Neurociências, que
se desenvolveu ao ponto de entender que o cérebro humano é plástico, ou seja, ao longo da
vida o cérebro humano continua a se desenvolver, aprender e a mudar, até a morte ou até a
senilidade. Portanto, o argumento do alemão Johann Friedrich Herbart de que somente
aprendemos coisas novas até os 20 anos, foi provado cientificamente, que não cabe, desta
forma, tais temáticas apesar de não abordadas de forma aprofundada neste trabalho, tem
grande relevância para a construção dos rumos das práticas de Educação para Jovens e
Adultos.

10
Heutagogia cuja etimologia vem do grego heuta = próprio + agogus = guiar, conduzir, educar. Surgida no
início do século XXI a partir da definição de Hase e Kenyon (2000) para autoaprendizagem e conhecimento
compartilhado.
25

5. PERFIS – EDUCADOR E EDUCANDO DA EJA

5.1 O Perfil do Educador da EJA

Para ministrar aulas na EJA, o educador precisa ter um perfil específico, e nos dias
atuais há uma escassez de profissionais preparados para exercer tal função com excelência.
A metodologia e didática do educador da EJA necessitam de um olhar mais
cauteloso e diferenciado, visto que a idade, a bagagem do educando, entre outros fatores,
modifica a estrutura do ambiente escolar. O educador necessita planejar estratégias e um
plano didático para atingir seus objetivos pedagógicos com seus educandos.
O papel do educador na EJA é proporcionar momentos de reflexão sobre o processo
educativo, indagações sobre a realidade, provocar a curiosidade, promover resgate do que
cada um tem como experiência, valorizar as habilidades e dar continuidade a cada
experiência pedagógica, ser ouvinte e estar em constante atenção com cada especificidade
de seus educandos dando-lhes condições de expandir o que já tem como conhecimento.
O educador precisa estar preparado para lidar com as situações prováveis em sala de
aula, tais como, dificuldades socioeconômicas, autoestima baixa, sentimentos de
incapacidade, dificuldades relacionais, diversidade cultural, visões políticas e étnico-raciais
diferenciadas e entre outras.
Sendo assim, o educador precisa de uma bagagem maior, para que desta forma saiba
lidar com todos os desafios que encontrará na Educação de Jovens e Adultos.

5.2 O Perfil do Educando da EJA

A Educação de Jovens e Adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou
continuidade de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade própria e constituirá
instrumento para a educação e a aprendizagem ao longo da vida. (Lei nº 11.741 de 2008,
altera dispositivos originais da LDB n. 9394/96).
Os perfis destes educandos e educandas são jovens e adultos, que por algum motivo
pessoal, financeiro e ou problemas sociais, não conseguiram concluir seus estudos, e desta
forma irão buscar a EJA para dar continuidade aos seus estudos.
26

Cada educando tem consigo mesmo suas dificuldades, sendo elas: autoestima baixa,
preocupações pessoais e profissionais, situações socioeconômicas, fracasso escolar,
dificuldades de aprendizagens, dificuldades de relações interpessoais e de aceitação pessoal
e do outro que lhe ensina algo.
As vivências desse grupo são fundamentais para o processo de aprendizagem. Os
educandos e educandas sentem-se inseguros em relação à aprendizagem, e buscam em sua
história de vida amparo para este aprendizado. E são nestes momentos que o educador (a)
deve estar preparado para tornar esse aluno personagem principal desta história.
Para muitos educandos, o ambiente escolar representa um lugar de esperança para
sonhos interrompidos pela falta de estudo, desta forma algumas pessoas irão à busca dos
estudos para atingir objetivos profissionais.
Faz-se necessário que o ambiente escolar em sentido geral tenha um olhar
cuidadoso com a EJA, para que desta forma o processo pedagógico realize uma
transformação positiva para as vidas de todos os educandos e educandas deste grupo.
27

6. DESAFIOS DO EDUCADOR E EDUCADORA DA EJA

Não é possível ser gente senão por meio de


práticas educativas. Esse processo de
formação perdura ao longo da vida toda, o
homem não para de educar-se, sua formação é
permanente e se funda na dialética entre teoria
e prática.
(FREIRE)11.

O professor da UFMG Leôncio José Gomes Soares, desenvolveu uma pesquisa de


2003 a 2005 buscando compreender a atuação do educador e educadora na Educação de
Jovens e Adultos; suas condições de trabalho e trajetória profissional. Sua pesquisa começa
mostrando que somente nas últimas décadas o olhar na formação de educadores para EJA
ganha força.
Dados do INEP12 de 2002 mostram que das 519 instituições que oferecem o curso
de pedagogia apenas 09 oferece a habilitação para a disciplina EJA. À medida que a EJA
teve sua história gerada dentro dos movimentos populares, pensar num novo currículo para
o curso de pedagogia, faria com que não se perdesse essas ações e, assim, ampliando o
conhecimento do pedagogo.
Soares (1996, p.6), traz a discussão, quando da criação da habilitação na Educação
de Jovens e Adultos, às disciplinas que compunham o currículo eram mais técnicas, tendo
também o pedagogo, uma formação mais de especialista; passando por volta da década de
1980 a preocupar-se em formar educadores vindos das bases dos movimentos sociais,
trazendo o sujeito para centro de seu processo ensino-aprendizagem, não dissociado de sua
cidadania, segundo sua pesquisa.
Em 2000, a habilitação passou a ser denominada Educação de Jovens e
Adultos, como resultado de discussões e estudos realizados sobre o
campo, que evidenciavam a diversificação do público que frequentava os
espaços educativos tradicionalmente vinculados à Educação escolarização
“não regular”. Nessa reforma, as disciplinas de Currículo e de
Fundamentos da Educação de Adultos foram substituídas pelas de
Educação Matemática, Monografia e Tópicos Especiais em EJA. Nesse
momento, as habilitações – Gestão Educacional, Educação Infantil,

11
In: FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP,
2000, p. 40.
12
Disponível em:<www.inep.gov.br> Acesso em 06 nov. 2019.
28

Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos – passaram a ser


denominadas de formação complementar. (SOARES, 2008, p. 7-8).

Neste sentido, podemos observar a importância de que o educador e a educadora,


que pretenda formação para a modalidade da EJA, verifique a proposta curricular
desenvolvida para a modalidade por seu curso de pedagogia. Na atualidade, há vasta oferta
de extensões na área, bem como a volta da discussão acerca da atuação dos educadores e
educadoras sociais agindo com projetos de juventude, cidadania ativa e cursinhos populares
nas periferias. Pensando sobre a formação, a habilitação em EJA está inserida no conjunto
de disciplinas que formam profissionais para atuar na sala de aula, certamente este avanço
se vincula o crescente lugar que a EJA vem ocupando nas redes formais de ensino,
deixando de ter caráter supletivo, compensatório e informal, para firmar-se como direito.
Os projetos com juventude e movimentos sociais conferem visibilidade a outras
possibilidades de atuação no campo da Educação de Jovens e Adultos e vem ao encontro a
este novo e crescente público. Desta forma, não somente o educador ou educadora que está
em seu processo de graduação, bem como manter-se em contínua aprendizagem, é inerente
ao profissional que deseja atuar nesta modalidade, visto que as transformações sociais e
muitas vezes os gargalos das escolas regulares, encerram na EJA a expectativa acerca
daquele sujeito.
A importância de que cada escola tenha clareza quanto ao seu projeto
educativo, para que, de fato, possa se constituir em uma unidade com
maior grau de autonomia e que todos os que dela fazem parte possam
estar comprometidos em atingir as metas a que se propuseram; o fato de
que os jovens e adultos deste país precisam construir diferentes
capacidades e que a apropriação de conhecimentos socialmente
elaborados é base para a construção da cidadania e de sua identidade; a
certeza de que todos são capazes de aprender. (BRASIL, 2002, p.08).

O que podemos perceber, é que a diversidade que se apresenta na sociedade, fica


ainda mais evidente e algumas vezes ruidosa, dada as suas especificidades, na
heterogeneidade da EJA. O educador e a educadora ao iniciar nessa modalidade de ensino,
deve saber que encontrará desafios a serem superados. Ter na instituição e em toda a
comunidade escolar, parcerias na construção do projeto pedagógico e currículo a ser
trabalhado, pode ser definitivo para o bom desenvolvimento de seu trabalho pedagógico.
De forma dialógica, o educador e educadora com princípios de escuta ativa devem
preferir articular os instrumentos oferecidos pela instituição e as demandas trazidas por
educandos e educandas, a fim de amplificar as potencias presentes ali, como bem escreveu
29

Paulo Freire, “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua
produção ou a sua construção” (FREIRE, 2011, p. 24).
Se as pedagogias na contemporaneidade, falam acerca da importância da construção
do conhecimento a partir do conhecimento prévio, considerando o educando e educanda
sujeito histórico social, facilitando percursos autônomos de aprendizagem, o que dizer da
andragogia e de suas aplicações na EJA, considerando que a maioria dos educandos que
estudam nessa modalidade trabalha durante o dia, chegando muitas vezes cansados à aula, o
que compromete a cognição, se fazendo necessário que o educador e educadora lancem
mão de metodologias diversas, que mantenha este educando e educanda estimulados,
buscando que a aula seja agradável, que mantenha seu desejo de vir à aula e que colabore
para sua permanência nos estudos.
A alfabetização e letramento de jovens e adultos é uma ação peculiar, que
não se estabelece da mesma forma que no período de infância, pois o
professor alfabetizador deve partir dos princípios de ação-reflexão-ação e
deve estar aliado à formação continuada. (SOARES, 2012, p.10).

Nesta perspectiva, é correto afirmar que, dentre os desafios principais da educadora


e educador da EJA, estão à formação continuada e manter-se estimulados para o
desenvolvimento de projetos pedagógico inovadores, que busquem ser solução para a
superação de dificuldades enfrentadas em seu cotidiano, acerca das desigualdades sociais.
Se conforme nossa pesquisa avançou, pudemos observar a recorrência de
dificuldades institucionais como a falta de apoio de gestores a projetos pedagógicos mais
inovadores, resistência de instituições a se abrirem a ação dialógica com a comunidade
escolar, falta de material e prédios muitas vezes em total colapso, além das questões dos
educandos e educanda, como vimos; havia uma maioria de fatores positivos diferenciais
para que fosse rompida esta barreira, como os muitos educadores e educadoras que
escolhem a EJA por identificarem suas histórias de vida nos educandos e educandas,
educadores que buscam sozinhos cursos de formação, educadores e educadoras resilientes,
empáticos com seus educandos e com seus colegas. Um desejo de transformação de si, do
outro e do coletivo, que traz à tona a essência da EJA, quando ganha força junto aos
movimentos sociais.
Adotar uma única e exclusiva prática educativa não é o mais adequado quando
pensamos na heterogeneidade da EJA. É necessário que o educador e educadora adotem
uma proposta de trabalho pedagógico que se valha das diferenças como estratégia de
aproximação, facilitando uma aprendizagem significativa.
30

Em relação aos conteúdos, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) indica o


uso da base curricular do ensino fundamental e médio, porém com métodos diferenciados
buscando atender as necessidades desses educandos e educandas. Mas se há um local onde
a questão não está apenas no ato de aprender, mas também no que se aprende, este lugar é a
EJA. Como manter motivados educadores, educandos, responder às instituições e à
sociedade com “resultados”, se não for por meio de uma aprendizagem significativa e,
portanto, transformadora, que amplifique o potencial de cada sujeito deste processo? Desta
forma, manter uma flexibilidade dos conteúdos, considerando temas que sejam parte da
vida dos educandos, é vital para que objetivos apontados coletivamente durante o processo
seja alcançado e dificuldades superadas.
A ação quase heroica do educador ou educadora, quando solitário em uma
instituição, precisa estar alicerçada em um currículo e planejamento elaborados de forma a
buscar o enfrentamento dessas dificuldades que educandos e educandas, educadores e
educadoras se deparam. Ele precisa dialogar com toda a diversidade presente na EJA e
trazer à luz as desigualdades, na busca coletiva por equidade nas condições de ensino-
aprendizagem, fazendo do processo em si –percurso- a construção do conhecimento.
Apesar de conhecidas todas as especificidades que a docência da EJA exige, quando
se busca na BNCC sobre a EJA não existe nada muito concreto, o que o documento sugere
é de que as adaptações devem ser feitas por cada município e instituições. Não tratar a
modalidade separadamente visa não estigmatizar o público da EJA, porém é fato conhecido
que este currículo apesar de conter os mesmos conteúdos da modalidade regular, será
adaptado ao tempo letivo que é reduzido na EJA. Já na LDB essa modalidade está incluída
na educação básica, tornando assim a responsabilidade de todos na instituição de ensino,
quase exclusivamente, desenvolver um projeto político pedagógico de acordo com as suas
necessidades.
A faixa etária desses educandos e educandas é outro desafio enfrentado pelos
educadores e educadoras da EJA, pois a formação da turma se dá pela série em formação e
não pela idade, além de salas multisseriadas, onde educadores e educadoras trabalham na
mesma sala de aula, educandos e educandas com faixas etárias diferentes e, também, séries
diferentes. Há que se considerar aqui, que o educador ou educadora se valha como
vantagem desta diversidade, refletindo a prática acerca do pensamento de Freire “ninguém
educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em
comunhão, mediatizados pelo mundo”, (1987, p. 79). O “conflito” de gerações é presente
na sala da EJA contemporânea e é apontada como uma das causas para a evasão, porém é
31

também uma oportunidade para o enriquecimento nas discussões acerca dos conteúdos
curriculares, além de contribuir para o pleno desenvolvimento humano, numa perspectiva
de cidadania.
Existe na sociedade um preconceito relacionado à educandos e educandas oriundos
da EJA, como se os mesmos não tivessem frequentado a escola regular a seu tempo por
escolha, sem considerar sua trajetória na vida escolar e o que o fez tornar-se um educando e
educanda da educação de jovens e adultos.
Sabemos que os altos índices de analfabetismo no Brasil, (IBGE, 2018) podem ter
impacto real a partir de projetos efetivos na Educação de Jovens e Adultos, com políticas
públicas direcionadas a esta modalidade. Há uma queda referente aos outros anos, mas essa
queda acontece de forma lenta. A EJA pode efetivamente fazer a diferença nesses números
mantendo os educandos e educandas frequentando o curso.
Vemos a necessidade da formação continuada para esses educadores e educadoras,
algo de muita importância, mas pouco oferecido. Estimular esse educador e educadora para
que ele não desanime também, e acabe transmitindo isso para seus alunos, deve ser parte de
políticas públicas efetivas, que tenham como foco a EJA e suas especificidades.
Faz-se necessário uma qualificação dos profissionais envolvidos neste
processo. É fundamental que a equipe docente esteja bem preparada, por
este motivo é extremamente importante uma formação continuada, onde
todos tenham a oportunidade de repensar a sua prática. A formação
continuada é um processo possível para a melhoria da qualidade do
ensino, dentro do contexto educacional contemporâneo. (RIBAS e
SOARES, 2012, p. 5).
32

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir de nossa proposta de análise do papel do educador ou educadora na EJA, os


seus problemas, as dificuldades, desafios e comprometimento didático com o objetivo de ir
além da andragogia, mas pensando o seu papel social e político; observamos que para
Knowles (1970), não há entre os termos Pedagogia e Andragogia uma simples paridade de
sentidos diversos, pois para ele a Pedagogia é “a arte e a ciência de ensinar crianças”, já a
Andragogia é a “a arte e ciência de ajudar os adultos a aprender”. Sem dicotomias
presentes, os norteadores desta pesquisa, compreendem a educação como processo coletivo
e dialógico de construção de conhecimentos.
Em meados de 1960 a Educação de Adultos começa a aparecer no cenário da
educação no Brasil, como uma nova forma de entender a alfabetização de jovens e adultos,
com uma força da consciência de sua dimensão política, visto que nasce e resiste nos
movimentos populares. Com o passar das décadas iniciais, onde a modalidade veio sendo
regulamentada, a diversidade da EJA passa também a ser vista na perspectiva das
necessidades específicas para grupos vulneráveis, também discutido no espectro da
Educação Integral. Em 2010, o IBGE apontava que cerca de 65 milhões de brasileiros, não
completaram o ensino básico, dentre estes mais de 11 milhões de jovens (IBGE, 2018).
Com toda a demanda específica deste diverso universo da EJA cada vez mais
composta por jovens egressos de um sistema regular que não mais os atendia, há que se
ressaltar, que a formação inicial do educador é sua base, entretanto, será com a sua vivência
dentro do ambiente escolar que esse aprendizado será construído de acordo com as
demandas com as quais irá se deparar, diante dos educandos com suas diversidades,
tornando-os os principais sujeitos desse cenário.
Ainda que a BNCC aponte em direção de conteúdos iguais aos da base curricular do
ensino fundamental e médio, currículos emancipatórios se fazem necessários na EJA,
considerando a escola um elemento organizador da vida, um ponto de partida para que o
sujeito pense sua trajetória, traduzindo demandas em iniciativas, construindo canais de
diálogo e escuta. Um arrazoado entre a sabedoria do cotidiano pensado e o conhecimento
da racionalidade científica, a produção coletiva de conhecimento, sem desconsiderar o
indivíduo.
As especificidades da EJA se apresentam na necessidade do educador ou educadora
ter conhecimento e se valer de diferentes métodos pedagógicos, técnicas e também de sua
experiência de vida, como sujeito histórico e social, compreendendo a diversidade social e
33

desigualdades presentes em suas turmas de educandos e educandas, além de considerar a


experiência de vida de cada um destes atores sociais.
A EJA cresce no cenário educacional, com muitos desafios para serem superados,
tendo como principais deles, questão apontada majoritariamente em estudos científicos
sobre o tema, a quase ausência de políticas públicas para a formação continuada e
especializada do educador ou educadora da EJA.
A formação específica para a docência na EJA é ponto essencial para este educador,
de perfil sócio histórico; a formação continuada de quem está na ativa e em universidades, e
sua atualização, visto que o educador e educadora da EJA precisam ter como um dos
objetivos, a emancipação do sujeito, colocando-o como protagonista do seu processo de
aprendizagem, respeitando suas histórias de vida como prática dialógica, despertando sua
consciência social.
A história da EJA no Brasil é complexa e cheia de desafios, numa trajetória que
justifica por sua essencialidade e potencial transformador social, todo o investimento a ser
feito na formação específica da docência da EJA, assumindo seu papel fundamental na
redução do gigantesco número de analfabetos no país.
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