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CONCEIÇÃO;

Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de


desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de desigualdades

Eliane Barbosa da Conceição

Introdução

Nós, mulheres negras fazemos parte de um contingente de mulheres, provavelmente majoritário, que
nunca reconhecerem em si mesmas esse mito [o mito da fragilidade feminina] porque nunca fomos
tratadas como frágeis. Fazemos parte de um contingente de mulheres que trabalharam durante séculos
como escravas nas lavouras ou nas ruas, como vendedoras, quituteiras, prostitutas... Mulheres que não
entenderam nada quando as feministas disseram que as mulheres deveriam ganhar as ruas e trabalhar!

Quando falamos em romper com o mito da rainha do lar, da musa idolatrada dos poetas, de que
mulheres estamos falando? As mulheres negras fazem parte de um contingente de mulheres que não são
rainhas de nada, que são retratadas como antimusas da sociedade brasileira, porque o modelo estético
de mulher é a mulher branca. Quando falamos em garantir as mesmas oportunidades para homens e
mulheres no mercado de trabalho, estamos garantindo emprego para que tipo de mulher? (Carneiro,
2003a).

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Este capítulo foi reservado para tratar do tema mulher negra no trabalho, assim como para analisar como
os estudos organizacionais têm abordado esse assunto e apontar caminhos para futuras pesquisas na área.
A própria missão que me coube – abordar a questão da mulher negra no trabalho e nos estudos
organizacionais – revela os principais pressupostos do presente texto: primeiro que a sociedade brasileira,
assim como as demais coletividades humanas, é composta por grupos distintos de pessoas (mulheres
negras e mulheres brancas, por exemplo). Depois, que a fronteiras sexo e raça são limites importantes na
determinação do lugar que os grupos sociais ocuparão no mundo do trabalho e, se considerarmos que este
reproduz valores e comportamentos da ordem social maior, na própria sociedade.
Em estudo intitulado “Diferença, diversidade e diferenciação” Avtar Brah (2006), socióloga britânica,
levanta uma série de questionamentos acerca do como as diferenças entre os diversos grupamentos
humanos são definidas e, a partir daí, como tais diferenças intermediam as relações que entre eles se
estabelecem. A autora se questiona se as percepções da diferença se manifestam como meio de afirmar a
diversidade ou como mecanismo de práticas excludentes e discriminatórias. Essas são questões
importantes para o presente texto, que pretende analisar o lugar da mulher negra no trabalho e na literatura
organizacional. Será que o lugar que ocupa nesses espaços tem a ver com a sua raça e gênero? Ou, se deve
a motivos outros – como falta de instrução ou de meritocracia – como argumentam muitos estudiosos?
Sabemos, como salientou Brah (2006), que a diferença nem sempre é um marcador de hierarquia social e
opressão, mas quando isso acontece, como se dão, no mundo do trabalho, as relações entre os grupos tidos
por diferentes e o grupo dominante?
Quando analisamos a sociedade brasileira, considerando o critério da raça e gênero dos indivíduos, quatro
grandes grupos emergem, aqueles

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desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
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compostos por: mulheres negras (26,54%); mulheres brancas (24,36%); homens negros (26,43%) e
homens brancos (21,86%). Segundo os resultados da última Pesquisa por Amostra de Domicílio
(PNAD/IBGE, 2012), o somatório desses quatro grupos responde por 99,18% dos brasileiros. O restante
da população é composta por aqueles que se declaram indígenas (0,30%) e amarelos (0,52%). Em que
pese a importância de cada grupamento social na construção da nação brasileira, este estudo tratará apenas
daqueles quatro primeiros. Admitindo que para os amarelos (mulheres e homens), os indicadores sociais
que serão mais de perto analisados neste capítulo – os relativos à educação, trabalho e renda – em muito
se aproximam daqueles dos brancos (homens e mulheres), com uma leve vantagem para o primeiro grupo.
Quanto aos indígenas, esses se organizam de modo diverso dos demais grupos humanos brasileiros, e
desse modo os indicadores sociais a eles relativos não deveriam ser comparados de modo direto com os
dos demais. De toda a forma, assumo que para algumas áreas, seus indicadores tenderiam a se aproximar
dos da população negra do País, uma vez que ambos os grupos sofrem com o histórico processo de
discriminação étnico-racial.
Estudos anteriores demonstram que o pertencimento a determinado grupo social não é aspecto periférico
na análise das desigualdades de oportunidade no mundo do trabalho. Pelo contrário, apontam que essa
variável ajuda a explicar a relativa ausência de membros de grupos discriminados nas organizações
produtoras de bens e serviços e/ou a justificar o lugar que ocuparão na hierarquia organizacional
(CONCEIÇÃO, 2013; VARELLA, 2010). Esse argumento sugere que parte significativa da desigualdade
social, como sugeriu Santiago Varella (2009, p. 234), é “causada por mecanismos sócio-organizacionais
típicos do funcionamento do mercado de trabalho”.
Pela relevância que o trabalho assume nas sociedades capitalistas, é correto afirmar que o fato de as
organizações que empregam trabalhadores favorecerem certos grupos sociais em oposição a outros em
muito conta para as desigualdades sociais que afetam o País. Partindo desse entendimento, o governo
brasileiro abraçou, desde 2003, o desafio de implementar

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um modelo de desenvolvimento baseado no enfrentamento da desigualdade social, o qual inclui ações que
buscam reduzir lacunas que separam mulheres de homens e brancos de negros no mundo do trabalho,
como se pode verificar nos três últimos planos plurianuais federais (LEITE; SOUZA, 2010, p. 225). No
âmbito da Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial, a ação afirmativa é proposta como o
principal instrumento para o alcance dessa diretriz, sendo as organizações privadas tidas como
interlocutoras essenciais na condução da política, como, por exemplo, se observa em muitos de seus
objetivos, como os exemplificados a seguir: incentivar o comprometimento de empresas com a igualdade
de oportunidades e de tratamento, mediante processos seletivos transparentes que explicitem os requisitos
e as qualificações exigidas para o preenchimento de cargo ou função vacante; realizar campanha nacional
para estimular a geração de renda e o emprego para mulheres negras; garantir a política de ações
afirmativas para as mulheres em todas as esferas do mercado de trabalho; defender a igualdade salarial e
o estímulo à ascensão profissional das mulheres negras em todas as instâncias do mercado de trabalho
(LEITE; SOUZA, 2010, p. 222).
Diante disso, percebemos que a preocupação dos organizadores desta obra com a questão da mulher negra
no mundo do trabalho não é algo excêntrico, ou fora de propósito. Antes, deriva da identificação de um
problema prático que merece a atenção dos pesquisadores que se dedicam aos estudos organizacionais,
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pois como sugeriu Karl Popper (2004 [1934], p. 14-6), tais problemas podem ser “importantes pontos de
partida para a pesquisa nas ciências sociais”. Como veremos na quinta seção deste capítulo, a questão da
mulher negra e o lugar que ocupa nas organizações começa a ser visto como um problema a ser
considerado pelos estudos organizacionais no Brasil. Assim, seu principal objetivo é contribuir na
construção de uma agenda de pesquisa, dentro dos Estudos Organizacionais, que abarque tanto a questão
do lugar que a mulher negra ocupa nas organizações e nos estudos organizacionais, mas também estenda
o seu olhar e crítica sobre os mecanismos sócio-organizacionais típicos do funcionamento do mercado

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de trabalho que causam e mantêm as desigualdades no interior das organizações e, consequentemente,


relegam às mulheres negras os lugares e posições menos desejadas do mundo do trabalho.
Para alcançar esse objetivo, o presente estudo estabeleceu três objetivos intermediários, que podem ser
assim descritos: identificar o lugar que a mulher negra ocupa na sociedade brasileira e organizações
empregadoras situadas no País, como também, os mecanismos sócio-organizacionais que colaboram para
isso; realizar uma revisão da literatura nacional sobre o tema, a fim de verificar se e como a questão tem
sido abordada nos estudos organizacionais; e finalmente, apontar caminhos para futuras pesquisas na área.
As três seções que seguem a esta introdução se ocuparão com o alcance do primeiro objetivo intermediário
aqui descrito. A seguinte trata do segundo objetivo. Na quinta seção, são apresentadas as considerações
finais e apontados possíveis caminhos para o estudo sobre o tema mulher negra nos Estudos
Organizacionais.

Aspectos metodológicos
Adotei, como ponto de partida para a busca de literatura nacional sobre tema, o levantamento dos artigos
publicados em revistas de administração que são tidas como as principais do País (TONELLI, et al, 2003;
SOUZA; CORVINO; LOPES, 2013), dentre as quais se encontram: Revista de Administração
Contemporânea (RAC), Revista de Administração de Empresas (RAE), Cadernos EBAPE.BR (EBAPE),
Revista Organizações & Sociedade (O&S), Revista de Administração da Universidade de São Paulo
(RAUSP) e Revista de Administração Mackenzie (RAM). As seis revistas selecionadas além de possuírem
site específico, com mecanismo de busca eficiente, disponibilizam seu acervo gratuitamente, por meio de
download, o que facilitou sobremodo a pesquisa. Foram utilizadas como descritores as seguintes
expressões: “mulher negra” e “mulheres negras”. A busca trouxe 23 artigos, 21 na revista RAE; um na
revista O&S e outro nos Cadernos EBAPE. De fato,

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os 21 artigos da RAE tratavam apenas do tema mulher ou mulheres, e foram selecionados porque seu
sistema apenas lê a primeira palavra do descritor utilizado. Por essa razão, foram de plano descartados.
Ao analisar os outros dois artigos, verifiquei que também não tratavam diretamente do tema do presente
capítulo, mas o tangenciavam.

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O artigo da O&S foi publicado em 2013, e se propôs a fazer uma meta-análise da produção científica
brasileira, na área de administração, sobre o tema mulheres, publicada nas principais revistas de
administração do País. Em que pese o fato de não tratar diretamente da questão racial, sinaliza a
necessidade de estudos que relacionem o tema mulher com questões de classe e raça. O artigo do Cadernos
EBAPE, foi publicado em 2012 e trata da questão do gênero em uma organização, tendo por base a teoria
feminista pós-colonial. Ao analisar as múltiplas formas de subordinação que alcança às mulheres, o artigo
discute a concepção de gênero como categoria socialmente construída e reproduzida nas diversas
interações entre outras categorias como raça, classe, religião, etnia e geração.
A esses dois artigos, juntei mais um que foi publicado nos anais do EnAnpad de 2006 e se intitula: “A
Produção Científica sobre Gênero na Administração: Uma Meta-análise”. Como se pode verificar,
nenhum dos três textos selecionados trata diretamente do tema aqui estudado, mas em questões
pertinentes, como a da “mulher”, do gênero e do feminismo.
Assinalei com aspas a categoria mulher para sinalizar que, em que pese o fato de que, em nossa sociedade
(como em outras no mundo), as mulheres negras se constituírem em categoria que não se confunde com
a da mulher branca, nem com a do homem negro, como veremos com mais detalhes na próxima seção, na
maioria das vezes, são incluídas em um desses dois grupos. O resultado é que, uma vez ali inserida, a
mulher negra fica sem posição, sem voz, tem suas necessidades e direitos negligenciados e, pior, como
alertou Kimberlé Crenshaw (2002), a extensão total da sua vulnerabilidade interseccional fica encoberta.
Em 1982, Sarah Hull, Patricia

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Scott e Barbara Smith escreveram um livro intitulado All the women are white, all the blacks are men, but
some of us are brave (todas as mulheres são brancas, todos os negros são homens, mas algumas de nós
somos corajosas). Com esse título, as autoras sugerem que, em regra, as ações públicas e privadas que
visam ampliar as oportunidades das mulheres geralmente favorecem apenas as mulheres brancas. E
aquelas que visam aos negros beneficiam quase que exclusivamente os homens, como já apontaram
diversas estudiosas negras brasileiras. Mas o título do artigo também sugere que nós, mulheres negras,
somos corajosas. E a coragem é algo que se precisa para afirmar que tanto os tomadores e tomadoras de
decisão nas organizações como os pesquisadores e pesquisadoras dos fenômenos organizacionais devem
olhar com mais atenção para os efeitos das práticas e rotinas organizacionais – muitas vezes
fundamentadas na falsa ideia de meritocracia – na experiência profissional de mulheres negras.

Vocabulário e parâmetros empregados


Algumas observações quanto ao vocabulário empregado ao longo do texto parecem-me necessárias,
especialmente porque, embora o texto se direcione a pesquisadores da Administração, está fortemente
ancorado em teóricos de outras das ciências sociais e da história, além de o tema aqui abordado ser ainda
muito pouco explorado em nosso meio. Como já fiz em outras ocasiões, primeiro, gostaria de alertar os
leitores de que, em conformidade com o sistema de classificação de raça e cor do IBGE, o termo negro
(s) é aqui utilizado como uma categoria genérica, que inclui dois elementos: preto (a) e pardo (a). Então
sempre que me refiro às pessoas negras, por exemplo, estarei tratando do conjunto formado pelas pessoas
pardas (ou mestiças) e as pretas.

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Depois, os termos etnia e raça também devem ser introduzidos aos leitores. Segundo Jacques d’Adesky
(2001, p. 39-56), a palavra etnia tem sentido mais amplo e, apesar de não ser facilmente apreendida, refere-
se a um

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conjunto de elementos comuns – como raça, língua, religião, área territorial, consciência de
pertencimento, vontade de viver em conjunto – compartilhado por determinado grupo humano. A presença
desses elementos, no entanto, não define concretamente a noção de grupo étnico. Pois, o que conta na
definição de um grupo étnico é se a existência desses traços diferenciais dá lugar à tomada de consciência
e às reivindicações coletivas de uma determinada identidade. Nesse contexto, a noção de pertencimento é
elemento essencial, visto que possibilita a instalação de uma identidade coletiva. Esse sentimento de
pertencimento alimenta-se de contribuições variadas, podendo fixar-se, de modo diverso de um grupo
para o outro, na religião, ou em noções imprecisas como raça, cor da pele, ou qualquer outro traço físico
visível.
Já o termo raça, remete simbolicamente a uma origem comum, evidenciando a continuidade das
descendências, o parentesco pelo sangue, a hereditariedade das características fisiológicas, psicológicas e
sociais. Sendo que, do ponto de vista da genética, a ideia de raça é desprovida de conteúdo e valor
científico, dado que o século XX viu ser desmantelada a noção de que existiriam diferentes raças humanas
(D’ADESKY, 2001, p. 44-45). Sabe-se, hoje, que, biologicamente, os seres humanos compartilham uma
origem comum (SKIDMORE, 1976). No entanto, como frisa d’Adesky (2001, p. 46-47), a desconstrução
científica da raça biológica não fez desaparecer a evidência da raça simbólica, da raça percebida e
socialmente interpretada, que, no imaginário humano, é identificada pelas semelhanças e diferenças
fenotípicas da cor da pele e demais características morfológicas. Assim, de um ponto de vista simbólico
e, portanto, socialmente construído, a raça associa-se com a classificação tradicional de branco, negro e
amarelo e é neste sentido que o termo é aqui utilizado.

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1. O lugar da mulher negra na sociedade brasileira


Mesmo antes da criação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), em 1938, o Brasil já
fazia levantamentos demográficos, mas nem sempre os analisava a partir do recorte racial, o que tornava
impossível averiguar estatisticamente a situação social e econômica de cada um dos grupos étnico-raciais
que o compõem. Ou porque os dados relativos ao pertencimento racial não eram coletados nos
recenseamentos, ou porque, quando coletados, não eram analisados de modo a evidenciar a existência de
desigualdades. Essa tradição foi quebrada a partir dos primeiros anos da década de 1980, com os trabalhos
de Carlos Hasenbalg e Nelson do Valle Silva (1979). Até aquele, momento as desigualdades raciais do
País eram creditadas a seu passado escravista, Hasenbalg e Valle Silva, ao utilizar intensivamente os
indicadores demográficos do IBGE, demonstraram que, longe de ser apenas uma herança do passado, as
desigualdades raciais do Brasil contemporâneo eram também fruto de comportamentos discriminatórios
fundamentados tanto em valores acalentados pelos indivíduos como nos modos de funcionamento das
instituições e organizações em nossa sociedade. Carlos Hasenbalg foi mais longe, ao sugerir que o
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pertencimento racial determinava a trajetória de vidas de grupos e indivíduos numa sociedade capitalista,
argumentando que a opressão racial favorecia à exploração dos negros, beneficiando não apenas os
capitalistas brancos, mas também os brancos não-capitalistas. Como disse o autor, “em termos simples,
os capitalistas brancos beneficiam-se diretamente da (super) exploração dos negros, ao passo que os outros
brancos obtêm benefícios mais indiretos”. Para o autor, a maioria dos brancos se aproveita do racismo e
da opressão racial, porque isso lhes confere uma vantagem competitiva, ante a população negra, no
preenchimento das posições de estrutura de classes que comportam as recompensas materiais e simbólicas
mais desejadas (HASENBALG, 1979, p.115-116).
Como veremos em detalhes mais abaixo nesta seção, o que os indicadores sociais veem demonstrando ao
longo desses anos é que no Brasil, para

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usar as reflexões de Avtar Brah (2006), as diferenças entre os grupos sociais atuam não como meio de
afirmar a diversidade, mas como mecanismo que impulsiona práticas excludentes e discriminatórias, e se
estabelecem como um marcador de segregação e hierarquia, resultando, assim, em desigualdade,
exploração e opressão.
Charles Tilly (1999), também analisou as diferenças entre os grupos sociais e observou que as relações
intra e intergrupais, estabelecidas no contexto das organizações1 de determinada sociedade podem ser
igualitárias ou não. Para o autor, as relações serão igualitárias quando a condição de pertencer a um ou a
outro grupo em nada influenciar o destino de seus membros, individual ou coletivamente. Quando, porém,
o pertencimento a um grupo específico passa a determinar o sucesso (ou fracasso) dos indivíduos no
acesso a recursos valiosos e posições socialmente desejadas, instala-se o que a autor chamou de
desigualdade categórica, que pode ser definida como a assimetria que se estabelece entre determinado par
categórico – ou seja, entre dois grupos sociais específicos, como, por exemplo, homens e mulheres e,
negros e brancos. Para Tilly, as diferenças intergrupais podem ser mais facilmente compreendidas,
analisadas e enfrentadas a partir do conceito de desigualdade categórica.
A desigualdade categórica pode ser mais bem compreendida quando deciframos o conceito de par
categórico. Um par categórico consiste em uma fronteira socialmente significativa que media a relação
entre os elementos sociais (pessoas, grupos, redes etc.) que se posicionam em cada um dos dois lados da
fronteira. Podemos pensar, por exemplo, em variáveis

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Tilly utiliza um conceito amplo para definir organizações. Para o autor, uma organização é qualquer conjunto
bem delimitado de relações sociais em que pelo menos um dos elementos tem o direito de comprometer os
recursos coletivos em atividades que ultrapassem os limites da fronteira, assim como de estabelecer laços com
estranhos (outsiders) que, poderão, então, passar a se relacionar com os elementos do conjunto. São tipos
específicos de organizações as famílias, as seitas religiosas, os grupos empresariais, os bandos de mercenários,
o Estado, a administração pública direta e indireta, as comunidades locais, dentre outros.

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como sexo, raça, nacionalidade, idade, qualificação profissional, entre outras, como fronteiras
socialmente significativas, uma vez que se estabelecem como limites que contrapõem, em determinadas
sociedades, grupos específicos de pessoas (TILLY, 1999).
Para o autor, a desigualdade categórica pode ser do tipo durável, ou não. Sendo durável aquela que persiste
e se mantém por diversas gerações em dada coletividade. Tomando por base esse preceito, podemos
concluir que as desigualdades que se estabelecem entre negros e brancos, assim como entre mulheres e
homens podem ser consideradas duráveis, uma vez que tratam de fenômenos que se estendem de geração
em geração não apenas em nossa sociedade, mas também em contextos nacionais outros que não o
brasileiro. Há autores que sugerem que o racismo e o sexismo – que nas sociedades capitalista levam às
desigualdades raciais e de gênero – sejam fenômenos atemporais, universais e transversais, ou seja, se
manifestam ou se manifestaram, no conjunto das sociedades passadas e presentes (WEDDERBURN,
2007b).
Ao que parece, nas sociedades antigas, assim como nas contemporâneas, a fronteira sexo, por exemplo,
sempre separou os homens das mulheres, fixando para cada um dos grupos um papel social diferente. No
Brasil, e no mundo, a fronteira etnia separa grupos específicos de pessoas, como, por exemplo, irlandeses
de britânicos e judeus dos chamados arianos, na Europa; e as diferentes tribos indígenas entre si, nas
Américas. No caso do Brasil, e em países da diáspora africana, a barreira raça/cor separa afrodescendentes
de brancos.
A definição de categorias sempre envolve imputar qualidades distintas para os atores de cada um dos
lados das fronteiras, com a distinção entre os grupos se fundamentando na pressuposição de uma
supremacia total de um segmento humano ante o outro. Para os casos aqui analisados, o racismo e o
sexismo, os grupos dominantes são considerados como pertencentes a uma raça superior, ou como
gozando de um status superior ante os outros segmentos. Essa supremacia se expressa por meio de uma
hegemonia irrestrita, tanto no plano material (poder econômico e político), como no plano psicocultural
(sentimento de superioridade), conferindo vantagens

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e privilégios exclusivos a certo grupo, segundo a posição que ocupa na hierarquia de uma ordem
racializada e sexista (WEDDERBURN, 2007, p. 188).
Ao imputar qualidades (incluindo defeitos), os grupos, de cada um dos lados da fronteira, se rotulam
mutuamente. Aos rótulos deletérios, que visam corromper a imagem dos grupos tidos como subordinados,
chamamos estereótipos. O estereótipo deriva do racismo e do sexismo, e consiste na prática ou costume
de rotular ou classificar de forma pejorativa grupos determinados de pessoas em razão do sexo, raça, cor,
origem, religião etc. O estereótipo é introduzido no meio social principalmente sob a forma de anedotas e
piadas que imputam determinados atributos negativos, ou a falta de certos atributos positivos, ou
qualidades reprováveis a certos grupos de indivíduos. Os estereótipos tendem a se agregar de forma
bastante sólida na psique das pessoas, que os tomam como verdades absolutas. Assim, eles assumem plena
capacidade de influir significativamente nas decisões de indivíduos e coletividades, levando-os a agir de
modo preconceituoso.
Raramente, no entanto, tais distinções e rivalidades permearão a vida de um modo tal que venham a
impedir associações categóricas transversais (TILLY, 1999), ou seja, as fronteiras que separam negros
dos brancos e mulheres e homens no Brasil, por exemplo, devem ser compreendidas não como um traço
impermeável ou intransponível, estando mais para traços pontilhados, em que os pontos estão bem
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próximos uns dos outros, admitindo infiltrações de elementos de uma categoria em outra. Isso se dá por,
pelo menos, duas razões: primeiro, porque algumas pessoas (mestiços, transexuais, entre outros) não se
enquadram facilmente de um lado da linha ou do outro, e, segundo, porque em algumas situações as
diferenças entre os membros de qualquer par particular podem não importar ou importam menos, de modo
que não impedem a relação entre indivíduos de cada grupo.
Mas, se é verdade que as fronteiras raça e gênero há séculos dividem grupamentos humanos, conferindo
vantagens a uns e prejuízos a outros, é também verdade que não o fazem de modo inteiramente idêntico.
Guardam certa semelhança no modo de atuação e, mesmo, em alguns de seus efeitos, mas também
guardam traços distintivos, de modo que tanto

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a fronteira do gênero como a da raça alcançará a cada um dos quatro grupamentos de modo distinto. Nesse
sentido, em uma sociedade machista, os resultados da luta antirracista tenderão a ter efeitos mais
significativos para os homens negros que para as mulheres negras. De modo semelhante, nas sociedades
racistas, os resultados da luta feminista se aproveitarão mais para as mulheres brancas, que para as negras.
Fica evidente, assim, que se a nossa sociedade é traspassada por esses dois limites (raça e gênero), então
as mulheres negras pertencem ao mais prejudicados daqueles quatro grupos sociais inicialmente
apresentados.
Podemos dizer, por exemplo, que, embora o movimento feminista seja, como todos os outros,
fragmentado, seu principal objetivo tem sido alterar as relações sociais de poder que se estabelecem em
torno da fronteira do gênero, e confere aos homens posição hierárquica superior à das mulheres. Assim,
as estratégias feministas envolvem um esforço deliberado para alterar a posição de subordinação das
mulheres tanto dentro das instituições do estado, como da sociedade civil e nas organizações privadas. A
força por trás da teoria e da prática feminista no período do pós-guerra tem sido, assim, seu compromisso
de erradicar desigualdades derivadas da noção de diferença sexual e esse objetivo vem sendo aos poucos,
alcançado, embora saibamos que ainda falta muito a fazer (BRAH, 2006, CRENSHAW, 2002). Mas,
dessa análise, não podemos deixar escapar, como alertou Sueli Carneiro, que, no que concerne ao mundo
de trabalho, mesmo que tenham sido, de certo modo, expressivos os ganhos obtidos pela luta feminista,
tais conquistas não conseguiram promover avanços para as mulheres negras e isso ficará muito evidente
na seção seguinte. Por essa razão, as feministas negras concordam que as propostas universalistas da luta
das mulheres são muito frágeis, e não garantem mudanças para as mulheres negras (CARNEIRO, 2003,
p. 120-121). De fato, para que o feminismo incluísse as mulheres negras, ele teria de ser um movimento
feminista antirracista, como sugeriu Brah (2006, p. 356).
Para Tilly são as contingências locais, históricas e organizacionais que contam para que diferentes tipos
de pares categóricos ocupem posições distintas na vida social. Tomando como contrastes extremos o
gênero

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e a raça, o autor argumenta que as desigualdades que se estruturam em torno desses limites atuam de
forma diferente porque as distinções de gênero interceptam as famílias, comunidades e classes, enquanto
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as de raça muitas vezes coincidem com esses limites. Na verdade, para o autor, onde a raça funciona como
uma base importante de desigualdade, isso normalmente se faz por meio da exclusão e segmentação
(TILLY, 1999, p. 240).
Complementando esse raciocínio, Carlos Moore Wedderburn (2007), argumenta que, em que pese o fato
de o racismo e o sexismo se constituírem em formas de consciência historicamente construídas e
determinadas, eles se desenvolvem de modo diverso, existindo diferenças profundas entre suas formas de
atuação. Para o autor, a maior diferença entre ambos reside no fato de o sexismo se desenvolver dentro
de “um nó de relações socialmente simbióticas, biologicamente fusionais, e psicologicamente
complementares entre homem e mulher”. Ou seja, embora as oposições entre eles possam ser conflitantes
no plano da reflexão política ou intelectual, isto não inviabiliza as relações simbióticas, uma vez que se
associam e vivem juntos, beneficiando-se mutuamente. Já no racismo, essa possibilidade de convivência
é inexistente, não havendo espaço para uma relação de aliança, complementar e simbiótica com aquele
que é tido como possuindo uma natureza inferior.
Neste ponto, cabe considerar as reflexões de Avtar Brah acerca das bases de diferenciação entre os grupos
humanos. A autora considera que as diferenças entre tais grupamentos podem ser estabelecidas em
diversas bases, a depender do contexto e da natureza dos atributos levados em consideração, pelo grupo
dominante, para demarcá-las. Brah sugere quatro maneiras por meio das quais a diferença pode ser
conceituada: diferença como experiência, diferença como relação social, diferença como subjetividade e
diferença como identidade (BRAH, 2006, p. 359). Sem desconsiderar esses quatro fundamentos da
diferenciação apresentadas pela autora, aqui enfatizaremos a diferença que toma por base os traços
fenotípicos, ou as características físicas das pessoas (como cor de pele, tipo de cabelo, formato de boca e
nariz etc.), por entendermos que numa sociedade racializada

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estes sejam os traços distintivos que demarcam, para o grupo dominante, o tipo de relação que será
estabelecida com os demais grupos. Para Carlos Moore Wedderburn, a análise da história do racismo e
do arranjo das sociedades contemporâneas demonstra que o racismo corresponde a uma forma específica
de aversão contra toda uma parte da humanidade, identificada a partir de seu fenótipo. Citando o
historiador africano Cheik Anta Diop, Moore, como costuma ser chamado o citado autor, acrescenta que
“o fenótipo determina um papel orientador das ações de violência iniciadas por disputas de recursos e
território entre populações visivelmente diferentes”. Para o autor, com o passar do tempo, “as realidades
fenotípicas - convertidas em realidades de “raça” mediante a construção social - podem se converter numa
relação de inimizade ou de proximidade entre indivíduos e coletividades” (WEDDERBURN, 2007, p.
117).
Então, como se interconectariam o racismo e o sexismo, compreensão necessária para que possamos
identificar o lugar que a mulher negra ocupa na sociedade brasileira e, por extensão, nas organizações
privadas e públicas do País? Para que se aproxime dos debates internacionais acerca do tema, a questão
ora apresentada poderia ser ampliada de modo a incorporar a variável classe social. Como, então, se
interconectariam as fronteiras raça, sexo e classe social e que lugar ocuparia a mulher negra na interseção
desses sistemas múltiplos de subordinação? Ao se referir ao modo como o racismo se interconecta com
as questões de gênero e classe social, Brah (2006, p. 351) argumentou que este “não é nem redutível à
classe social ou ao gênero, nem inteiramente autônomo”. Para a autora, os diferentes tipos de racismo
têm origem diversa, mas dadas as condições históricas, todos, em certa medida, se articulam com
estruturas patriarcais de classe, e também, podemos dizer, de gênero. Brah continua, salientando que, em
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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

que pese o fato de não se constituir em uma “forma independente de dominação”, o racismo pode ter
eficácia independente, a depender do contexto histórico em que se manifesta (BRAH, 2006, p. 351).
Brah (2006) alerta que a busca por grandes teorias que especifiquem as interconexões entre racismo,
gênero e classe não têm trazido ganhos

__________________________________________________________________ página 291

efetivos e que, certamente o melhor seria construí-las como relações historicamente contingentes e
específicas a determinados contextos. Certamente, isso se dá porque, como já havia alertado Kimberlé
Crenshaw (2002), os marcadores de raça e etnia não são universais. Assim, um caminho para buscar
resposta para questão do ‘como se interconectariam as fronteiras raça, sexo e classe social e que lugar
ocuparia a mulher negra na interseção desses sistemas múltiplos de subordinação’, levantada acima, seria
em primeiro lugar atribuir um qualitativo a essa mulher negra, de modo que a possamos analisar a sua
posição de subordinação em dado contexto histórico e cultural.
Dada a dificuldade de articular as múltiplas fronteiras de desigualdade, já apontada por diferentes
estudiosas e estudiosos (BRAH, 2006, CARNEIRO, 2003; CRENSHAW, 2002), optei por considerar na
presente análise apenas a interconexão entre raça e gênero. Embora, considere que a classe social tende a
exercer peso significativo na explicação no modo como hoje se estruturam as desigualdades de gênero e
raça, sustentarei, junto com Carlos Hasenbalg (1979), que no caso do Brasil – e certamente na maioria
dos países da diáspora africana –, a desigualdade social se subordina à desigualdade de raça. O autor torna
essa lógica evidente quando argumenta que o pertencimento racial determina a trajetória de vidas de
grupos e indivíduos. Como vimos acima, para Hasenbalg, a desigualdade racial beneficia tanto os
capitalistas brancos, como também os brancos não-capitalistas. Aos capitalistas brancos, de modo direto,
por meio da (super) exploração dos negros, e aos brancos não-capitalistas, de modo indireto, uma vez que
se aproveitam do racismo e da opressão racial para ganhar vantagem competitiva, ante a população negra,
no preenchimento das posições de estrutura de classes que comportam as recompensas materiais e
simbólicas mais desejadas (HASENBALG, 1979, p. 115-116).
Diante disso, assumi que o racismo seja o principal eixo estruturador das desigualdades no Brasil e que
ele determina a própria hierarquia de gênero em nossa sociedade, como já havia também argumentado
Sueli Carneiro (2003b). Diante disso, inspirada na lógica das desigualdades categóricas duráveis de
Charles Tilly, proponho um modelo para tentar

____________________________________________________________________ página 292

demonstrar de modo simplificado e didático a forma como se relacionam as desigualdades de raça e gênero
na realidade brasileira, além de evidenciar como essa interconexão hierarquiza os quatro grupos sociais
dos quais trato neste capítulo: as mulheres negras, as mulheres brancas, os homens negros e os homens
brancos.

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desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
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Assim, no modelo apresentado abaixo, a raça atua como a primeira fronteira estruturante, ou fronteira
estruturante de primeiro nível, como optei chamar. A variável separa a sociedade em dois grupos
específicos de pessoas: as negras e as brancas. Como argumentaram Tilly e Moore, os pares categóricos
separados pela fronteira racial tendem à segregação. Ou seja, observa-se que existe uma tendência à
segmentação entre os grupos de negros e brancos, que no caso brasileiro é facilmente detectável não
apenas pela análise de indicadores sociais com recorte racial, como veremos abaixo, mas também pela
observação das características fenotípicas daqueles que ocupam as posições mais desejadas da sociedade
e dos que se encontram sobrerrepresentados nos bolsões de pobreza no País.
Seguindo essa lógica, o sexo se apresenta como a fronteira estruturante de segundo nível. O que se observa
no Brasil, dado o modo como aqui se materializou o racismo, é que no interior do grupo dominante, o dos
brancos, homens e mulheres manterão relações hierarquicamente desiguais, mas simbióticas e com
colaboração recíproca. A separação sexual no grupo dos brancos não ensejará a segmentação ou exclusão,
mas a hierarquização. Já, no interior do grupo dos negros parece haver uma tendência menor para as
relações simbióticas entre mulheres e homens. Isso porque, como sinalizou Helio Santos (2001, p. 378-
80), parte significativa de homens pretos e pardos busca relação afetiva com mulheres brancas. O trabalho
de Pedro Jaime Coelho Júnior (2012, p. 257s) sugere que quanto mais bem sucedido economicamente for
o homem negro, maior será a sua preferência pela mulher branca.
Sendo primeiramente apartada pela fronteira racial e depois pela fronteira do sexo, a sociedade brasileira
fica dividida, como já havíamos sugerido, em quatro grandes grupos: das mulheres negras, dos homens
negros,

____________________________________________________________________ página 293

das mulheres brancas e dos homens brancos, cada um dos quais gozará de status diferenciado no interior
das organizações, em função da cor e do sexo. Além disso, cada um desses quatro grupos é também
dividido por diversas outras fronteiras hierarquizantes. O modelo de hierarquização categórica aqui
sugerido foi ilustrado graficamente na Figura 1, abaixo. Nele, o primeiro retângulo simboliza a
distribuição de mulheres negras e brancas e homens brancos e negros, segundo o discurso dominante da
democracia racial, ou da igualdade formal, prevista na Constituição Federal. O segundo retângulo buscar
retratar a sociedade traspassada pela fronteira raça e consequentemente, dividia hierarquicamente em dois
grandes grupos: o de brancos e o de negros. O terceiro retângulo simboliza essa mesma sociedade, agora
traspassada pela fronteira sexo, o que a dividirá em quatro grandes grupos. Por fim, o quarto retângulo
revela que no interior desses quatro últimos grupos não há homogeneidade, mas desigualdade que se
estruturara em função das diferenças de classe social, idade, formação profissional, condição de gênero,
compleição física etc. De modo que no topo desse último retângulo, certamente, estará o tipo preferido
das sociedades capitalistas contemporâneas: o homem branco, adulto, heterossexual, das classes sociais
médias e altas, e que tenha recebido uma educação formal considerada de qualidade.
No que diz respeito ao tema de interesse deste capítulo, a mulher negra, a Figura 1, sugere que o lugar que
a ela cabe na hierarquia social é distinto tanto daquele ocupado pelos homens negros, como também
daquele reservado à mulher branca, estando o seu grupo em posição de maior subordinação que a desses
últimos. Assim, a Figura 1 ilustra graficamente o que já vem sendo discutido por diversas estudiosas que
consideram a questão das interconexões do racismo, do sexismo e da classe social. Neste sentido,

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articulando a relação entre gênero, classe, situação de domicílio e nacionalidade, Avtar Brah, discute a
multiplicidade da categoria mulher, assim se referindo:

Nosso gênero é constituído e representado de maneira diferente segundo nossa localização dentro
de relações globais de poder.

____________________________________________________________________ página 294

Nossa inserção nessas relações globais de poder se realiza através de uma miríade de processos
econômicos, políticos e ideológicos. Dentro dessas estruturas de relações sociais não existimos
simplesmente como mulheres, mas como categorias diferenciadas, tais como “mulheres da classe
trabalhadora”, “mulheres camponesas” ou “mulheres imigrantes”. Cada descrição está referida a
uma condição social específica. Vidas reais são forjadas a partir de articulações complexas dessas
dimensões. É agora axiomático na teoria e prática feministas que “mulher” não é uma categoria
unitária (...). Aqui o foco analítico está colocado na construção social de diferentes categorias de
mulheres dentro dos processos estruturais e ideológicos mais amplos. Não se afirma que uma
categoria individual é internamente homogênea. Mulheres da classe trabalhadora, por exemplo,
compreende grupos muito diferentes de pessoas tanto dentro quanto entre diferentes formações
sociais (BRAH, p. 340-41).

Figura 1. Desigualdades categóricas duráveis: a hierarquização dos grupos sociais no Brasil

Evidentemente, a esse exercício poderia ter sido acrescentada a variável raça, o que, no caso da sociedade
brasileira, resultaria em algo semelhante ao quadro apresentado abaixo, no qual a interconexão da raça e
do gênero

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desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
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com as demais variáveis apresentadas pela autora estaria representado no último retângulo da Figura 1.

2. O que dizem os números?


Uma análise de indicadores sociais recentes colabora com o modelo apresentado acima, além de permitir
compreender, no contexto do País, os efeitos da inter-relação do racismo e do sexismo para a mulher negra
e o como essa interseção determina suas condições de vida, no que diz respeito ao acesso ao trabalho
decente e à remuneração, independentemente do seu grau de instrução. Os dados apresentados nas tabelas
abaixo foram retirados de fontes diversas, os relativos ao trabalho (rendimento médio) foram tabulados a
partir da publicação eletrônica Tempo em Curso, editada pelo Laboratório de Análises Econômicas,
Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais (LAESER-UFRJ), do mês de outubro dos anos de
2010 a 2013. Já os dados referentes à educação foram buscados em duas fontes: os dados do censo de
2010, disponíveis no Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA) e no Relatório Anual
Socioeconômico da Mulher – RASEAM, documento elaborado, pela Secretaria de Políticas para
Mulheres, com base e na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio referente ao ano de 2011. Os dados
foram tabulados de modo a evidenciar as diferenças de rendimento do trabalho e acesso à escolaridade
entre os quatro grupos sociais tratados neste capítulo. O objetivo é demonstrar com números a
sobreposição das desigualdades de gênero e raça, que aberta e indubitavelmente favorece o grupo dos
homens brancos, desfavorecendo de forma mais aguda o grupo das mulheres negras (fronteiras de raça e
sexo), mas também o das mulheres brancas (fronteira do sexo) e finalmente, o dos homens negros
(fronteira da raça). Apesar de não terem sido apresentados abaixo, em função do limite de espaço, outros
indicadores – como os referentes às taxas de desemprego, de subocupação por falta de remuneração e de
tempo de duração da procura por emprego

____________________________________________________________________ página 296

– também apontam para a mesma realidade observada a seguir, especialmente os números referentes aos
dois grupos limítrofes de nossa amostra: mulheres negras e homens brancos.
2.1. Autonomia econômica e igualdade no trabalho
A análise das desigualdades de rendimentos entre esses quatro grupos sociais constitui elemento essencial
quando se considera a influência do mundo do trabalho nas condições socioeconômicas das mulheres
negras, além de evidenciar as diferenças no acesso ao trabalho. A série histórica apresentada na Tabela 1,
a seguir, demonstra que dentre a população economicamente ativa (PEA) ocupada, o grupo das mulheres
negras é o que se encontra na base da pirâmide salarial no mundo do trabalho. Em 2002, recebia em média
menos de um terço dos rendimentos dos homens brancos, diferença que foi reduzida ao longo da última
década, mas que ainda hoje permanece alta, com eles percebendo quase duas vezes e meia mais que elas.

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desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

A observação da Tabela 2 permite aprofundar a análise, uma vez que demonstra que independentemente
dos anos de estudos, o grupo das mulheres negras permanecerá na base da pirâmide do rendimento do
trabalho, o que demonstra que esse grupo social, acompanhando pelo dos homens negros, se constitui
naquele com o menor valor esperado para o investimento em estudo e qualificação profissional. O exame
da Tabela 2 revela ainda que a diferença entre os rendimentos dos homens brancos e das mulheres negras
vai aumentando à medida que se elevam os anos de estudo de cada um dos grupos. Assim, para o ano de
2011, por exemplo, um homem branco com de 0 a 1 ano de estudo percebia uma vez e meia a mais do
que uma mulher negra com o mesmo grau de instrução. Já os homens brancos com mais de 11 anos de
escolaridade recebiam 2,4 vezes mais que

____________________________________________________________________ página 297

a mulher negra com o mesmo grau de instrução, o mesmo sendo verdade para os outros dois anos da série.
Isso indica, como já havíamos apontado, que o retorno do investimento em estudo para a mulher negra é
bem inferior àquele dos demais grupos. A Tabela 2 também sugere que, no quesito rendimento do
trabalho, para os trabalhadores e trabalhadoras com menos de onze anos de escolaridade, a fronteira do
sexo se sobrepõe a da raça, determinando os maiores vencimentos para os homens (brancos e negros) e
os menores para as mulheres (negras e brancas).

É evidente que para que pudéssemos ter uma visão mais apurada sobre a desigualdade de rendimento do
trabalho deveríamos empreender uma análise dos setores econômicos em que cada um dos grupos está
concentrado, da profissão que abraçaram e de suas preferências pessoais, dentre outros. Mas uma simples
análise desses números sugere, no mínimo, a existência de mecanismos sociais e, como veremos com
detalhes mais abaixo neste texto, também organizacionais, que contribuem para que cada um de quatro
grupos aqui tratados ocupe posição distinta na hierarquia social e organizacional no Brasil.

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Tabela 1. Rendimento médio habitualmente recebido pela PEA ocupada residente nas seis maiores
Regiões Metropolitanas, Brasil, ago /2009 – ago /2012(em R$, sem os centavos).
Rendimento médio habitualmente recebido pela PEA ocupada nas seis maiores RMs
Grupos Agosto
sociais, por 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
sexo e raça

Homem 2.047 1.784 1.748 1.831 1.859 1.897 2.013 2.042 2.188 2.493 2.502 2.692
branco
Mulher 1.432 1.211 1.209 1.295 1.261 1.313 1.398 1.436 1.485 1.752 1.825 1.898
branca
Homem 961 828 851 883 922 935 997 1.031 1.121 1.335 1.409 1.534
negro
Mulher negra 675 604 600 613 644 659 714 771 830 950 1.015 1.125
Fonte: IBGE (2010)

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Tabela 2. Rendimento real médio habitualmente recebido pela PEA ocupada residente nas seis maiores
RMs desagregada por faixas de escolaridade, Brasil, ago/2011- ago2013 (em R$).
Rendimento da população ocupada no trabalho principal por grupos de anos de
estudo
Grupos sociais Grupos de anos de estudo
por sexo e
De 0 a 1 De 1 a 3 anos De 4 a 7 De 8 a 10
raça/cor 11 ou mais
(2011)
Homem branco 916,76 976,22 1.196,28 1.309,79 3.178,20
Mulher branca 579,18 598,35 713,88 798,89 2.133,89
Homem negro 738,14 893,12 964,62 1.050,35 1.729,05
2
Mulher negra 642,07 542,86 640,58 696,17 1.224,82
(2012)
Homem branco 1.023,67 1.114,16 1.345,90 1.406,27 3.311,40
Mulher branca 1.065,78 715,35 839,48 891,95 2.309,30
Homem negro 845,75 1.020,96 1.070,82 1.152,05 1.891,72
Mulher negra 649,62 640,71 702,49 782,75 1.335,08
(2013)
Homem branco 1.203,23 1.246,97 1.374,78 1.448,06 3.310,39
Mulher branca 734,39 711,66 848,83 907,83 2.253,13
Homem negro 953,04 1.018,05 1.141,82 1.210,20 1.901,14
Mulher negra 662,52 677,46 762,79 835,18 1.361,37

Fonte: IBGE, micriodados, PME e Tempo em Curso/Laeser (agosto de 2010; 2012,2013). Os valores de 2011 e 2012 foram atualizados
pelo INPC para outubro de 2012 e o de 2013 é o valor nominal para o mês de outubro daquele ano. Dados tabulados pela autora.

____________________________________________________________________ página 299

2.2. A igualdade no acesso à educação


A Tabela 3, a seguir, revela que os grupos de negros e brancos possuem oportunidades desiguais no acesso
à educação no período regular de estudos. Deve-se observar que os estudantes negros em idade de
formação profissional encontravam-se concentrados nos níveis de ensino que antecedem o ensino
universitário (“superior”), enquanto os brancos se concentravam nos níveis do ensino universitário e da
pós-graduação. Evidentemente, esse fato contará para a diferença de rendimentos do trabalho, identificada
acima, mas não o determinará, como é possível verificar a partir da análise da Tabela 4. Esta última tabela
revela que, em que pese o fato de as mulheres brancas integrarem o grupo que mais acesso possui ao
ensino universitário, o retorno pelo seu investimento em educação continua sendo inferior ao dos homens
brancos. O mesmo ocorrendo com as mulheres negras, que também investem mais tempo em educação
que os homens de sua raça/cor, mas mesmo assim, possuem retornos inferiores no mercado de trabalho
formal. Esses casos ilustram o efeito da desigualdade de raça e gênero na trajetória de vida dos indivíduos
e grupos sociais e sugerem, que o pertencimento racial e de gênero não é, como já frisamos, aspecto


2
Esse é o valor que consta da tabela original, mas parece que houve equívoco.
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periférico na explicação das desigualdades tanto de acesso a direitos fundamentais, como é o caso da
educação, mas também de oportunidade no mundo do trabalho.

____________________________________________________________________ página 300

Tabela 3. Pessoas de 15 a 29 anos de idade que frequentavam escola por nível de ensino, cor
ou raça e grupos de idade – 2010.

Pessoas de 15 a 29 anos idadde que frequentavam creche ou escola por


nível de ensino, cor ou raça

Nível de ensino ou curso que Total Negros Brancos Outros


frequentavam
Alfabetização de jovens e adultos 100% 63% 34% 3%
Educação de jovens e adultos do ensino
100% 64% 34% 2%
fundamental
Regular do ensino médio 100% 53% 46% 1%
Educação de jovens e adultos do ensino
100% 55% 43% 2%
médio
Superior de graduação 100% 34% 65% 1%
Especialização de nível superior 100% 29% 69% 2%
Mestrado 100% 25% 73% 2%
Doutorado 100% 24% 73% 3%
Fonte: Elaborado pela autora a partir de dados do IBGE - Censo Demográfico (2010).

Tabela 4. Taxa de frequência líquida das pessoas de 6 a 24 anos de idade, por sexo e cor/raça,
segundo o nível de ensino – 2011.
Taxa de frequência líquida das pessoas de 6 a 24 anos de idade, por sexo
e cor/raça, segundo o nível de ensino
Grupos sociais por Nível de ensino
sexo e raça/cor Fundamental Médio Superior

Homem branco 92,4% 55,4% 18,3%
Mulher branca 92,1% 64,7% 23,6%
Homem negro 91,6% 38,9% 7,4%
Mulher negra 91,8% 52,1% 10,9%

Fonte: IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Rio de Janeiro - RJ, 2011 (RASEAM).
Dados tabulados pela autora.

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____________________________________________________________ página 301-302

3. Mecanismos organizacionais de reprodução de desigualdades e manutenção de privilégios


Para explicar os mecanismos organizacionais que operam para a reprodução e manutenção da
desigualdade categórica tomei por base essencialmente a obra de Charles Tilly (1999). Para o autor, a
desigualdade categórica se instala e mantém por meio de dois mecanismos principais e dois
complementares: a exploração, a monopolização de oportunidade, a emulação (ou mimetismo) e a
adaptação, respectivamente. Do primeiro não trataremos neste capítulo, por se tratar da relação econômica
e laboral que se estabelece entre capitalistas (exploradores) e trabalhadores, determinando o ganho
daqueles primeiros por meio da expropriação da força de trabalho desses últimos. Os outros três
mecanismos são fatores essencialmente organizacionais que incidem sobre a permanência de um sistema
de desigualdade categoricamente demarcado.
A monopolização de oportunidade é o mecanismo por meio do qual o grupo dominante se apropria de
recursos valiosos – como posições nas organizações, cargos, salários, promoções, benefícios –,
impedindo, por múltiplos artifícios e justificativas, que membros dos grupos subordinados sejam
contratados, ascendam profissionalmente e tenham acesso a cargos de níveis hierárquicos destacados e à
remuneração paritária. Ou seja, a monopolização da oportunidade ocorre quando, no caso do Brasil,
pessoas brancas, de modo consciente ou não, aproveitam-se do racismo e da opressão racial, para obter
vantagem competitiva, vis-à-vis a população negra,

____________________________________________________________________ página 302

no preenchimento das posições de estrutura de classes que comportam as recompensas materiais e


simbólicos mais desejados (HASENBALG, 1979, 116). Como Tilly sugere, esse mecanismo não é
necessariamente consciente, mas seu efeito gera a desigualdade não só no âmbito de dada organização,
como no da sociedade mais ampla, visto que, no sistema capitalista, as organizações são as grandes
produtoras e distribuidoras de riqueza e que os salários têm peso, se não determinante, significativo no
conjunto de rendimentos dos indivíduos.
A monopolização de oportunidade opera por meio de diferentes mecanismos. Nas organizações
produtoras de bens e serviços ela, geralmente, se dá pela combinação de categorias internas com categorias
externas amplamente aceitas. Por exemplo, para organizar o seu trabalho, as empresas criam categorias
internas, como posições, divisões, departamentos e diretorias, e, no mais das vezes, fazem com que estas
coincidam com categorias externas, como mulher negra/homem branco ou cidadão/estrangeiro, por
exemplo. Isso significa dizer que, no mais das vezes, as posições hierárquicas das organizações são
distribuídas não somente tomando por base o critério meritocrático, como muitos afirmam, mas também
considerando o grupo social ao qual pertence a pessoa que ocupará o cargo. Isso ocorrerá especialmente
quando o serviço de contratação (que determinará o ingresso de novos trabalhadores) e de treinamento
(que determinará sua trajetória profissional) é realizado apenas por representantes dos grupos dominantes
em dada sociedade.
A combinação, intencional ou não, de tais categorias reforça a desigualdade no interior das organizações.
Ao combinar categorias internas com pares categóricos externos a organização importa compreensões,
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desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

práticas e relações estabelecidas no ambiente externo, o que reduz o custo de manutenção do limite
interno, uma vez que se apropria dos roteiros e conhecimentos amplamente compartilhados e
“naturalmente” aceitos (TILLY, 1999, p. 76). Aqui no País, por exemplo, tal combinação dificulta a
contratação das mulheres negras pelas organizações empregadoras, ou as insula, quando contratadas, em
posições de baixo nível hierárquico.

____________________________________________________________________ página 303

Tal procedimento não costuma ser questionado no nível organizacional, pois, de acordo com os padrões
da sociedade brasileira, é “natural” que a mulher negra ocupe posições subordinadas e de pouca
relevância, dado o lugar que ocupa na própria hierarquia social. Um dos resultados mais perversos desse
processo é que determina para a mulher negra o baixo retorno do seu investimento em qualificação
profissional, confinando-a no lugar que historicamente tem ocupado em nossa sociedade. Aqui cabe
destacar que talvez as mulheres negras não experimentem esse fenômeno de modo uniforme, pois parece
haver uma tendência de as pardas mais claras serem mais bem aceitas no ambiente organizacional que as
pretas. Como o racismo brasileiro é baseado no fenótipo, quanto mais as características físicas da mulher
(cor de pele, tipo de cabelo, traços faciais etc.) se afastar da estética padrão branca, mais difícil poderá ser
para ela ocupar espaços não subordinados nas organizações (CONCEIÇÃO, 2013, p. 239).
Também como resultado da combinação de categorias internas com pares categóricos externos, os cargos
de alta gerência e posições de topo nas empresas tendem a ser ocupados por membros dos grupos
categóricos dominantes. A associação direta que se faz entre o cargo de presidência de uma organização
e um homem branco é justificado por essa lógica. Certamente por essa razão, Alexandra Kalev e Frank
Dobbin (2006) concluíram que, para a realidade estadunidense, quanto mais os processos de contratação,
treinamento, estabilidade e promoção fossem controlados por membros dos grupos privilegiados, menos
mulheres brancas, negros e latinos seriam aceitos para as posições de mais alto nível hierárquico. Como
se pode depreender, tal sistema é mantido, primeiro porque os grupos privilegiados lucram
substancialmente com o arranjo e, depois, porque o recrutamento ocorre principalmente por meio de redes
categoricamente segregadas, o que garante a origem comum dos novos entrantes (TILLY, 1999, p. 166-
7). No Brasil, esse padrão foi identificado pelo Ministério Público do Trabalho que, nas ações civis
públicas contra os, à época, cinco maiores bancos do Brasil, demonstrou a existência de vícios nas rotinas
de seleção e recrutamento adotadas pelas agências

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bancárias, que derivavam na negação de oportunidade de trabalho a pessoas negras, inclusive daquelas
qualificadas para os cargos em questão (CONCEIÇÃO, 2013).
A Organização Internacional do Trabalho também trata deste fenômeno, a partir do conceito de
discriminação estatística. Esta se fundamenta no pressuposto de que, em não sendo possível às
organizações verificar a produtividade individual de cada trabalhador, elas tendem a utilizar características
facilmente observáveis – como, por exemplo, raça e sexo – como um indicador aproximado de
produtividade. Dessa forma, geralmente assumem que membros de determinados categorias sociais
possuam produtividade menor que a média. Esse tipo de discriminação pode também ser chamado de
discriminação baseada no ‘gosto do empregador’ e ocorre quando empregadores preferem não contratar

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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

indivíduos de determinados grupos sociais pelo medo de algum transtorno, dando assim preferência ao
recrutamento de pessoas de uma mesma categoria (OIT, 2003, p. 23).
Por conseguinte, sejam eles universais ou não, os pares categóricos externos ganham importância
organizacional quando se combinam com categoria internas. Categorias externas podem entrar nas
organizações por meio de dois processos complementares. Primeiro, pela emulação, ou mimetismo, como
é mais amplamente tratado nos estudos organizacionais, que ocorre tanto pela imitação de modelos
organizacionais estabelecidos, como pela transferência de relações sociais existentes de um cenário para
outro. Depois pela adaptação, que consiste no ajustamento ao status quo, o que significa que para se
adaptar ao ambiente, as organizações elaboraram suas rotinas diárias, manuais e regras internas com base
em estruturas já observadas em outros contextos (TILLY, 1999, p. 10).
A emulação e a adaptação colaborariam para a manutenção das desigualdades instaladas a partir da
exploração e da monopolização da oportunidade. A primeira pelo mimetismo, uma vez que as
organizações tendem a copiar arranjos, modelos, estruturas e, mesmo protocolos comportamentais, de
outras, sejam elas de sua mesma natureza ou não. Logo, a emulação multiplica a desigualdade categórica.
A adaptação também mantém

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a desigualdade por impulsionar não a sua multiplicação, mas a sua fixação. Por esse mecanismo,
distinções categóricas exteriores são usadas, de modo consciente ou não, para informar as rotinas de uma
organização. Quando isso acontece, tais rotinas categorizadas tendem a permanecer, uma vez que elas se
tornam a base das atividades e comportamentos tidos como certos dentro de determinada organização.
Assim, categorias externas passam a influenciar rotinas, como a divisão do trabalho, a solidariedade que
se estabelece entre os membros da organização e a recreação. No momento em que tais categorias
encontrarem lugar no conjunto de conhecimento compartilhado pelos membros de uma organização não
mais serão facilmente substituídas (TILLY, 1999, p. 190).

4. O lugar da mulher negra nos Estudos Organizacionais


Como vimos na seção dedicada aos aspectos metodológicos, no Brasil, a teoria organizacional ainda não
dedica atenção à questão da mulher negra nas organizações. Alguns fatores concorrem para isso, dentre
os quais podemos, certamente, citar três como os mais relevantes. Primeiro, o fato de a literatura
organizacional tratar-se em essência de algo que foi escrito por homens, para eles e sobre eles, como
pontuaram Marta Calás e Linda Smircich (1998). Além disso, como destacaram Prestes Motta, Alcadipani
e Bresler (2001, p. 61), no geral, os estudiosos da Administração pertencem à elite da sociedade brasileira
e, dessa forma, observam os problemas a partir do topo da pirâmide social, podendo, por essa razão, não
se dar conta de questões importantes do país. O esquema apresentado na Figura 1, acima, sugere que existe
grande distância separando homens brancos e mulheres brancas das mulheres negras em nossa sociedade,
o que ao certo concorre para que as questões relacionadas a essas últimas estejam completamente fora do
conjunto de preocupações daqueles dois grupos.

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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

Segundo, como ressaltaram os três artigos que tratam da questão da mulher, selecionados para análise
nesta seção, a maioria dos estudos sobre o tema produzidos por estudiosos da Administração o abordam
segundo a perspectiva do feminismo liberal e do feminismo radical e, por conseguinte, tratam do sexo e
do gênero como variáveis duais com características universais. Ao considerar o sexo e o gênero como
variáveis universais, negligencia-se que as interconexões entre as diversas fronteiras de diferenças
humanas e sociais fazem emergir não a mulher como categoria unitária e homogênea, mas diversos tipos
de mulheres que, embora guardem algumas características básicas em comum, têm suas identidades
forjadas dentro de relações globais de poder, como alertou Avtar Brah (2006) em trecho já citado neste
capítulo.
Por fim, mas talvez o mais importante fator na explicação da completa ausência, nos principais periódicos
de Administração no País, de estudos sobre a mulher negra nas organizações, temos a questão do modo
como se manifesta o racismo entre nós. Muitos acreditam que no País não existe racismo, ou que, caso
exista, se manifesta de modo muito ameno e que, assim sendo, não seria útil tratar das questões relativas
à raça, incorrendo no risco de importar para o Brasil problemas sociais que não são nossos, mas dos “norte-
americanos”. Infelizmente, essa suposição perece diante das comprovações empíricas apresentadas na
terceira seção deste texto. De fato, a ideia de harmonia racial faz parte de nosso imaginário coletivo, mas
uma rápida observação das pessoas que ocupam os espaços de poder em nossa sociedade já desqualifica
essa visão. O que ocorre é que, por razões históricas, o brasileiro, no geral, não pratica atos diretos de
discriminação. Ao contrário, adota formas mais sutis de exclusão, o que explica duas realidades: a
ausência de conflitos abertos com relação ao problema racial, mas também a ausência de negros nos
espaços de poder (CONCEIÇÃO, 2009).
Como já mencionado, os dois primeiros artigos selecionados para serem analisados nesta seção – de
autoria de Capelle et al. (2006); Souza; Corvino; Lopes (2013) – empreenderam uma meta-análise

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da produção acadêmica sobre a questão da mulher, do gênero e do feminismo nos Estudos


Organizacionais. Tiveram como fonte os artigos publicados nas principais revistas acadêmicas da área,
como também, para o caso do primeiro, aqueles publicados nos anais do EnAnpad e adotaram como marco
temporal o período de 1995 a 2004 e de 2000 a 2010, respectivamente.
Ambos os artigos admitem que os movimentos e teorias feministas não sejam homogêneos e utilizam a
classificação dada por Calás e Smircich (1998), aliada a de outros autores, como a principal fonte para
examinar o material empírico coletado quanto à abordagem teórica feminista utilizada. Como bem
resumiram Rosa, Medeiros e Valadão Jr. (2012, p. 396-397), para Calás e Smircich, as teorias feministas
podem ser classificadas da forma seguinte:

(i) “Liberal: o gênero é socializado em seres humanos sexuados pelo comportamento


adequado a cada sexo; (ii) Radical: o gênero é uma construção social que assegura a
subordinação das mulheres aos homens. (iii) Psicanalítica: o gênero estrutura um
sistema social de dominação masculina que influencia o desenvolvimento psicossexual.
(iv) Marxista: o gênero é parte de relações históricas de classe que constituem sistemas
de opressão sob o regime capitalista. (v) Socialista: o gênero é constituído processual e
socialmente por meio de diversas intersecções de sexo, raça, ideologia e experiências
de opressão sob o patriarcado e o capitalismo (que são distintos). (vi) Pós-estruturalista:
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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

sexo e gênero são práticas discursivas que constituem subjetividades específicas por
meio do poder e resistência na materialidade dos corpos humanos. (vii) Pós-colonialista:
considera a constituição de subjetividades complexas que vão além dos conceitos
ocidentais de sexo e gênero, enfocando aspectos de gênero articulados com classe, raça,
etc., presentes nos processos de globalização”.

Além dessas, Souza; Corvino e Lopes (2013) ainda incluem: (viii) as feministas raciais.
Além da classificação quanto à abordagem feminista utilizada, Capelle et al. (2006), ainda classificaram
os 45 artigos selecionados

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segundo a mais seis dimensões, das quais aqui consideraremos as relacionadas à dimensão “trabalho”,
que são: inserção da mulher no mercado de trabalho, estilo de gestão feminino, conciliação trabalho-
família, influência do sexo no comportamento de homens e mulheres e representações femininas em
veículos de divulgação organizacional.
Para as dimensões da abordagem feminista utilizada, Capelle et al. (2006, p. 9) identificaram uma
predominância da feminista liberal e a ausência de estudos desenvolvidos exclusivamente a partir da teoria
Psicanalítica, bem como das Teorias Radical, Marxista e Pós-colonial. Desse modo, os autores concluem
que a maioria das pesquisas analisadas adotava uma concepção dualista, universal e generalizante de
gênero e não procuravam relacioná-lo a outros aspectos, como especificidades culturais, sociais, locais e
organizacionais de cada caso. Além disso, verificaram que os estudos assumiam como pressupostos
algumas “verdades universais, tais como o papel inferiorizado da mulher diante de seu ‘dominador’, o
homem”. No que diz respeito à temática analisada, foi verificado que os temas, “inserção da mulher no
mercado de trabalho”, “estilo de gestão feminino”, “conciliação trabalho-família” e “influência do sexo
no comportamento de homens e mulheres” foram abordados de uma perspectiva eminentemente Liberal.
Já o tema “representações femininas em veículos de divulgação organizacional” incluia artigos que
adotaram uma abordagem de caráter mais Pós-Estruturalista, enfocando a construção de discursos e
representações em torno do fenômeno gênero nas organizações.
Souza, Corvino e Lopes (2013) selecionaram 16 artigos, que foram analisados a partir de três categorias
temáticas: “competitividade organizacional, gestão e empreendedorismo”; “relações de gênero e poder”;
e “teorias feministas”. Para os autores, os artigos classificados nas duas primeiras categorias estavam
fortemente relacionados com o feminismo liberal e radical, com alguns buscando conclamar a igualdade
ou superioridade das mulheres nas atividades empreendedoras e de gestão, fato que denotava, segundo
eles, uma visão a-histórica de feminino, enquanto outros evidenciaram a masculinidade como uma forma
de dominação e opressão das mulheres. Não foram encontrados nos artigos analisados representantes

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do feminismo racial e marxista, o que indicou que a concepção adotada do feminino se aproximava
fortemente de um feminismo relacionado apenas a mulheres brancas e de classe média. Os achados
levaram os autores a concluir que as questões raciais e de classe ainda não estavam sendo bem

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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

consideradas nos trabalhos sobre gênero conduzidos na área dos Estudos Organizacionais, e a alertar sobre
a necessidade de pesquisas que relacionem o feminino com questões de classe e raça.
No último estudo sobre a questão de gênero, que será analisado nesta seção, o trabalho de Rosa, Medeiros
e Valadão Jr. (2012), foram analisadas as configurações de gênero em uma lavanderia comunitária
localizada no interior do Estado de Minas Gerais, onde trabalhavam apenas mulheres sob a liderança de
uma mulher negra e pobre. Para análise, os autores recorrerem à teoria pós-colonial, especialmente no que
concerne às reflexões sobre a subalternidade feminina, sendo tais reflexões de grande valor para o presente
capítulo, abaixo são apresentadas as duas principais considerações dos autores a esse respeito.
Primeiro, o artigo destaca que o pós-colonialismo se constitui num campo de estudos que critica o conceito
universal de “mulher”, que é fundado em uma perspectiva eurocêntrica e se apresenta como pressuposto
de muitas formas de manifestação do feminismo ocidental. Assim, os autores reafirmam que o pensamento
pós-colonial se insurge contra o feminismo estritamente definido, que insula o gênero das outras formas
de opressão e assume como certo que a erradicação da discriminação de gênero seja o caminho para acabar
com a opressão de todas as mulheres, obscurecendo, assim, as diferenças reais entre mulheres e negando
a possibilidade de heterogeneidade (ROSA; MEDEIROS; VALADÃO JR., 2012, 397-398)
Frisam também que as feministas pós-coloniais resistem à tendência do feminismo ocidental de
caracterizar todas as mulheres como uma categoria essencializada, homogênea e unificada. No caso da
experiência brasileira, o artigo remarca as diferenças entre as mulheres negras e as brancas. Diferenças
que, como frisa, estabelecem-se também pelo fato de

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que, no momento histórico em que se consolidou a luta feminista por autonomia, essas últimas, geralmente
ricas e alfabetizadas, estarem aptas para ingressar nesse longo processo de emancipação. Já, as mulheres
negras – geralmente, analfabetas e pobres –, apesar de habituadas ao trabalho árduo, terem ficaram à
margem desse processo (ROSA; MEDEIROS; VALADÃO JR., 2012, 398), sofrendo ainda hoje pela falta
de acesso a direitos sociais básicos, como educação, saúde, trabalho, além do preconceito de cor, que as
subordina na sociedade e no mundo do trabalho, mesmo quando, por meio de um esforço sobre-humano,
para a maioria dos casos, conseguem ultrapassar a barreira da educação formal.
5. Considerações Finais
Diante do que vimos, fica evidente o não-lugar da mulher negra tanto em posições significativas das
organizações empregadoras, como nos estudos organizacionais. De fato, o lugar que a mulher negra ocupa
nas organizações brasileiras não é muito diferente daquele que ocupa em organizações sediadas em outros
países da América Latina, em países europeus e no próprio Estados Unidos (KING, 1995; BREWER,
1999). Em um mundo em que o discurso predominante é a valorização das competências individuais e a
diferenciação baseada no critério da meritocracia, esse fato que por si só deveria chamar a atenção
daqueles que se dedicam à análise dos fenômenos organizacionais.
Os dados apresentados na segunda seção sugerem que existe uma dissonância entre o discurso da
meritocracia, que prevalece no mundo corporativo e acadêmico, e a realidade no mundo do trabalho. As
salas de aula nos diversos cursos de pós-graduação em Administração, dos quais temos notícias (Grande
São Paulo e Grande Rio), também apontam para isso, uma vez que são espaços acadêmicos

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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

majoritariamente frequentados pelas mulheres brancas. Nem por isso, no entanto, elas se encontram
proporcionalmente representadas nas posições hierárquicas mais altas nas

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organizações. Em que pesem as desigualdades raciais, que limitam para as pessoas negras acesso ao
ensino, nos últimos anos a diferença educacional entre negros e brancos tem caído no País, com as
mulheres negras alcançando nível de escolaridade superior à dos homens negros, mas isso também não as
coloca em situação melhor que a desses últimos. Essas observações evidenciam teoricamente o que já está
dado na análise empírica dos dados: não é apenas a falta de qualificação da mulher negra que a faz ocupar
as posições menos valorizadas nas organizações. De modo diverso, existem mecanismos sócio-
organizacionais que contribuem para isso, o que me leva a argumentar sobre a importância de um a agenda
de pesquisa no campo dos Estudos Organizacionais sobre o tema.
Os três artigos analisados na seção anterior já apontam possíveis caminhos para a construção dessa
agenda. Apresento como primeira sugestão que os estudos sobre gênero/mulher/ feminismo passem a
incluir a variável raça, ou para tratar paralelamente da questão da mulher negra e da branca em sua
proposta de análise, ou para delimitar de que tipo de mulher está tratando, tendo por base, pelo menos, a
essa dimensão, que como vimos divide a nossa sociedade em dois grandes e diferentes grupos sociais.
Também vimos que a mulher negra e a mulher branca se constituem em duas categorias muito distintas
de pessoas, a começar pelos tipos de discriminação aos quais estão subordinadas, mas também pelo tipo
de relação que estabelecem com a categoria dominante, pelo acesso que possuem a direitos sociais básicos,
entre outros; fatores que as levam a ocupar posições muito diferentes tanto na hierarquia social, como na
hierarquia organizacional. Diante dessa realidade, podemos dizer que estudos que tratam da questão da
“mulher” como uma categoria genérica, sem maiores especificações, carecem, no mínimo, de precisão. E
se admitirmos que em sua maioria incluem na categoria “mulher” apenas a mulher branca, poderíamos
também dizer que negam à mulher negra o próprio status de mulher.
Ainda com base nos textos analisados, sugiro, junto com Rosa, Medeiros e Valadão Jr., 2012, que mais
estudos sejam produzidos a partir da teoria pós-colonial, uma vez que tal perspectiva permite ampliar o
foco dos

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estudos de gênero nas organizações, já que discute questões fundamentais para o entendimento do sujeito
pós-colonial feminino, sujeito que é constituído como o “outro”. Nessa lógica, os estudos podem analisar
como esse outro é concebido nos espaços organizacionais, como as grandes empresas. Os discursos
oficiais de empresas e da mídia voltada para negócios também podem ser analisados na perspectiva pós-
colonial.

A pesquisa organizacional também deve se ocupar em construir análises empíricas sobre os mecanismos
que reproduzem as desigualdades categóricas, analisados na terceira seção deste capítulo. Acredito que a
literatura sobre implicit bias (preconceitos implícitos) auxiliará de modo efetivo nessa análise, uma vez
que disponibiliza importantes instrumentos teóricos para o exame das questões referentes às relações que

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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

se estabelecem entre os diferentes grupos sociais no seio das organizações (ABERSON; SHOEMAKER;
TOMOLILLO, 2004; DOVIDIO; KERRY; GAERTNER, SAMUEL, 2000).

O QUE PRETENDI COM ESTE CAPÍTULO:

Pretendi com este capítulo trazer para o debate um tema ainda pouco explorado nos Estudos
Organizacionais: a questão da mulher negra no trabalho, além de tratar do lugar que ela ocupa tanto nas
organizações, como na própria literatura organizacional. Seu principal objetivo é contribuir na construção
de uma agenda de pesquisa, dentro dos Estudos Organizacionais, que não apenas abarque essas duas
questões anteriores, mas também estenda o seu olhar e crítica sobre os mecanismos sócio-organizacionais
típicos do funcionamento do mercado de trabalho que causam e mantêm as desigualdades no interior das
organizações e, consequentemente, relegam às mulheres negras os lugares e posições menos desejadas do
mundo do trabalho. Para alcançar esse objetivo identifiquei, por meio de uma análise teórica e empírica,
o lugar que a mulher negra ocupa na sociedade e nas organizações brasileiras. Em seguida, realizei uma
revisão da literatura

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sobre o tema mulher negra nas organizações, a fim de verificar se e como a questão tem sido abordada
nos estudos organizacionais; e por fim, apresentei caminhos para futuras pesquisas nesse campo.
Duas características do presente tempo me animaram a escrever sobre esse tema: primeiro, o fato de este
se constituir no período histórico em que as empresas são chamadas para se juntar ao Estado e
organizações do terceiro setor na busca de soluções para problemas que assolam a sociedade brasileira.
Depois, o fato de ser esse o momento político em que o Brasil dá passos significativos para a superação
da pobreza, mas ainda figura entre as nações mais desiguais do planeta. Esses dois fatores nos apontam
que é hora de as organizações que empregam trabalhadores e trabalhadoras desempenharem um papel
mais ativo na redução das desigualdades, que, no caso do Brasil, é fortemente ancorada nas diferenças
raciais. Além disso, instam-nas a adotar ações de responsabilidade social vinculadas a um problema cuja
resolução é crucial para o desenvolvimento sustentado do País, que implica ampliar a sua capacidade de
criar condições para que todos os indivíduos – mulheres e homens e negros e brancos – desenvolvam seu
pleno potencial. A identificação de mecanismos que determinam a distribuição de recompensas no interior
das organizações e por meio dos quais se reproduzem as desigualdades se apresenta como elemento
essencial para que, na busca de uma sociedade mais justa e inclusiva, elas revejam não apenas suas práticas
e rotinas internas, mas também aquelas que mediam a relação que estabelecem com stakeholders externos.

ESTABELECENDO UM CONTATO COM A SALA DE AULA:

Em que pese o fato de se fazerem fortemente presentes nas relações que estabelecemos em sociedade,
de um modo geral, e no mundo do trabalho, de modo mais específico, as questões abordadas neste
capítulo recebem pouca atenção de acadêmico e estudiosos da administração. Uma reflexão mais
sistemática sobre o tema em muito contribuirá para o avanço

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CONCEIÇÃO; Eliane B.; Mulher negra em terra de homem branco: mecanismos de reprodução de
desigualdades. In CARRIERI, Alexandre; TEIXEIRA, Juliana (Orgs). Gênero e trabalho: perspectivas,
possibilidades e desafios no campo dos estudos organizacionais. Salvador: EDUFBA, 2016, p. 277-319.

do conhecimento acerca das relações raciais no mundo do trabalho e as perguntas reflexivas


apresentadas abaixo visam oferecer ao aluno essa oportunidade.

PERGUNTAS REFLEXIVAS SOBRE O TEMA E/OU SUJEIT@ DE PESQUISA


ABORDADOS:

1. Que fatores históricos e culturais contribuem para que as mulheres negras ocupem lugares
periféricos nas organizações?
2. Quais são as dificuldades com a utilização da categoria genérica mulher para tratar das questões de
desigualdade social?
3. Que mecanismos organizacionais contribuem para a manutenção das desigualdades categóricas?
4. Qual é o papel de gestores na reprodução dos mecanismos de manutenção das desigualdades?
5. O que as organizações podem fazer para impedir que seus gestores casem categorias internas com
categorias externas?

RECOMENDAÇÃO DE FILMES SOBRE A TEMÁTICA E/OU SUJEIT@ DISCUTID@

(1) A cor púrpura, (2) A história de Rosa Parks, (3) Febre da Selva, (4) Chica da Silva

6. Referências
ABERSON, Christopher L.; SHOEMAKER, Carl; TOMOLILLO, Christina. Implicit bias and contact:
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