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Estado e desenvolvimento tecnológico no Brasil: o caso da Embraer 1994-2019

Leonardo Gomes Ribeiro - RG. 15.674.065-5

Resumo

O presente projeto de pesquisa tem como tema, a análise do papel do Estado no


desenvolvimento industrial e tecnológico no país, por meio de estudo de caso da Embraer.
Um dos principais problemas das estruturas produtivas de um país em desenvolvimento
como o Brasil, é a industrialização tardia e o avanço tecnológico retardatário. Neste sentido a
construção de uma empresa nacional que opere em um setor de alta complexidade tecnológica,
configura uma experiência singular.
Por que e como a Embraer ultrapassou as amarras do subdesenvolvimento e logrou êxito
na construção de um experiência nacional de inovação industrial e tecnológica?
A hipótese que norteia essa reflexão é a de que essa experiência pode ser compreendida
levando-se em conta como o Estado foi capaz de dirigir e articular interesses do capital estatal
e do capital privado. Para tanto, o estudo aborda a trajetória de formação e desenvolvimento da
Embraer, concentrando-se no período de consolidação mais recente, que sucede a privatização
da empresa em 1994 e antecede a tentativa de fusão com a Boeing em 2019. Pois trata de
período propício para o confronto dos projetos de financeirização e industrialização que tem
orientado as estratégias da empresa.

Palavras-chave: desenvolvimento, tecnologia, Estado, indústria, estratégia

1. Introdução
O Brasil é um país subdesenvolvido, há um déficit de núcleos endógenos de inovação e
tecnologia. A despeito disso, o país tem uma experiência relativamente exitosa de
desenvolvimento industrial e tecnológico no setor aeroespacial.
Sendo assim, a pergunta que orienta este trabalho é: “Por que e como a Embraer
ultrapassou as amarras do subdesenvolvimento e logrou êxito na construção de uma
experiência nacional de inovação industrial e tecnológica?
2

A hipótese que norteia essa reflexão é a de que essa experiência pode ser compreendida
levando-se em conta como o Estado foi capaz de dirigir e articular interesses do capital estatal
e do capital privado. Para tanto, o estudo aborda a trajetória de formação e desenvolvimento
da Embraer, concentrando-se no período de consolidação mais recente, que sucede a
privatização da empresa em 1994 e antecede a tentativa de fusão com a Boeing em 2019. Pois
trata de período propício para o confronto dos projetos de financeirização e industrialização
que tem orientado as estratégias da empresa.
Analisar o quanto estratégico para o país é o Estado se manter atuante em um setor de
alta tecnologia como o aeronáutico. Setor este que vivencia uma constante transformação
tecnológica, uma internacionalização junto aos mercados financeiros e ainda, através do
conjunto de suas políticas, o Estado consegue manter os interesses industriais, bem como os
benefícios relacionados a um projeto de desenvolvimento tecnológico nacional.
Compreender os movimentos pendulares que o Estado efetuou ao longo da história, seja
como formador, sócio, controlador, financiador, parceiro, acionista, etc, e de como liderou a
construção de uma industrialização tecnológica em determinados momentos será essencial para
este trabalho. Analisar os cenários no quais se dão estes processos, buscando a substituição de
importações no Brasil, desembocam numa crescente e forte industrialização e avanço
tecnológico, na segunda metade do século XX, no segmento aeronáutico.
Delimitando o período, a pesquisa buscará concentrar a análise no período pós-
privatização da Embraer, ocorrido em 19941 até 2018, período que antecede os movimentos
mais evidentes da empresa para a construção de uma "joint-venture"2 com a Boeing3. O período
o qual a pesquisa pretende analisar é marcado por mudanças estruturais na economia brasileira
e no padrão de desenvolvimento, onde cresce o processo desindustrialização e a financeirização
da economia.

1
O governo Fernando Henrique Cardoso(1994-1998), concretiza o processo de privatização da companhia.
Deste processo, o banco de investimentos norte-americano Wasserstein Perella, passar a ter o maior acionista,
seguido do Banco Bozano Simonsen (posteriormente incorporado pelo Banco Santander), que funcionou como
intermediário dos interesses de grupos, bancos e fundos de investimentos na consolidação do controle acionário
da companhia. Os planos já em curso de entrada no mercado de aeronaves executivas e de luxo, um mercado
crescente, recebem um grande impulso nesta nova modelagem da empresa.
2
Joint Venture, união de duas ou mais empresas já existentes com o objetivo de iniciar ou realizar uma atividade
econômica comum, por um determinado período de tempo e visando, dentre outras motivações, o lucro.
3
The Boeing Company é uma corporação multinacional norte-americana de desenvolvimento aeroespacial e de
defesa.
3

Desvelar a percepção equivocada sobre a relação capital privado e Estado no


capitalismo, criticada por aqueles que defendem ou uma pura estatização total como a solução
para os problemas da empresa, ou por aqueles que lançam crítica sobre a eficiência da atuação
do Estado, junto à uma empresa aeroespacial de tão complexa estrutura tecnológica e comercial
como a Embraer.
Os interesses nacionais estratégicos, são (ou deveriam ser) os fatores que promovem a
necessidade dessa atuação do Estado junto a uma empresa como a Embraer. A estratégia de
defesa nacional juntamente com a necessidade de desenvolvimento da indústria aeroespacial,
impuseram o papel do Estado na criação e desenvolvimento de um sistema de inovação baseado
em ciência para o país, onde a indústria aeronáutica tornou-se uma peça-chave na inovação e
P&D.
Os desafios e a capacitação tecnológica decorrente de diversos programas e projetos de
aeronaves de treinamento e combate militar ao longo de sua trajetória, ajudaram a dar à Embraer
o domínio e a capacidade para se inserir e competir no setor aeronáutico comercial com bastante
destaque.
O desenvolvimento tecnológico propiciado pelos projetos conduzidos pela Embraer,
contribuíram e seguem contribuindo para alavancar os investimentos em P&D, tanto na
empresa como de uma cadeia de fornecedores. Acordos de transferência tecnológica e a
ampliação do comércio de produtos industrializados brasileiro para o mercado externo, são
outros objetivos a serem analisados no presente trabalho.
O trabalho pretende observar os aspectos das modificações ocorridas na gestão deste a
privatização em 1994, passando pelos sucessos de projetos como o da "família" de jatos ERJ
1454, E170, também pela pulverização das ações da Embraer nas bolsas de valores de São Paulo
e Nova York, quando da entrada no Novo Mercado5 e as etapas para uma gestão baseada em
preceitos de governança corporativa, até chegarmos ao período recente com lançamento do KC-
3906.

4
O programa da família de jatos ERJ 145 no final da década de 1990, é o mais bem sucedido projeto comercial
Embraer até então, constituído com parceiros Gamesa, da Espanha, ENAer, do Chile, SONACA, da Bélgica, e
C&D Interiors, dos EUA. Representou um marco no processo de transformação da empresa.
5
O Novo Mercado é um segmento de listagem destinado à negociação de ações emitidas por companhias que se
comprometam, voluntariamente, com a adoção de práticas de governança adicionais em relação ao que é exigido
pela legislação [...] (BM&F BOVESPA, 2008c).
6
O KC-390 é um avião de transporte multimissão de nova geração, desenvolvido pela Embraer a partir de
encomenda da FAB, tendo suas primeiras unidades entregues em 2019.
4

O interesse por pesquisar o tema se origina do trabalho pesquisa realizado na iniciação


científica7, que buscou compreender a trajetória histórica da Embraer e também na observação
e curiosidade, do porquê poucos países desenvolvidos possuem uma indústria aeroespacial e
porquê o Brasil, um país subdesenvolvido, de industrialização tardia, marcado por tantas
desigualdades e dificuldades, desenvolveu uma empresa de excelência tecnológica tão exitosa.
A importância do Estado na formulação, planejamento e construção de um núcleo de
geração e difusão de inovações, que permitiu a construção de vantagens em um setor industrial
de destaque tecnológico como o aeroespacial, também estimulou a pesquisa, que pretende
auxiliar a compreensão das possibilidades de desenvolvimento industrial e tecnológico
articulados da relação do Estado com o capital privado na empresa.
O objeto deste trabalho se insere na problemática clássica da economia política, que são
os estudos sobre a relação entre Estado e capital privado. Alguns argumentos desenvolvidos
por estudos de autores que analisam o desenvolvimento das nações e as relações com o Estado
(TAVARES,1972; EVANS,2004; CHANG, 2003; MAZZUCATO,2014; MUSACCHIO &
LAZZARINI,2015;), poderão colaborar para elaboração de hipóteses e reflexão desta pesquisa
acerca do papel do Estado no desenvolvimento industrial e tecnológico do país.
Para compreender os movimentos de industrialização que produziram as condições de
surgimento de empresas públicas e/ou estatais, estratégicas para um país, serão utilizados
estudos de autores como Celso Furtado, acerca do déficit de planejamento estatal no início da
industrialização brasileira. Avaliando a ausência de desenvolvimento tecnológico, financeiro,
volatilidade cambial e a tendência ao déficit estrutural na balança comercial, somaram-se a
constatada aversão do capital privado em assumir riscos, tais elementos não contribuíram para
estabelecer um plano de longo prazo para o desenvolvimento de uma industrialização necessária
a modernização do país, impondo assim, as condições e necessidade do Estado tornar-se o
indutor desse desenvolvimento.

7
Este projeto de mestrado para trabalho de conclusão de curso em 2020, desdobra-se do artigo Embraer -
Trajetória e estratégia: o papel do Estado em uma empresa, no projeto de desenvolvimento do país, resultado
da Pesquisa de iniciação Científica realizada com bolsa PIBIC no período 2018-2019, sob orientação do prof.
mestre William Vella Nozaki. Buscará desenvolver mestrado na área de economia de instituição de ensino
superior, que possua departamento e linhas de pesquisas voltadas para análise de temas voltados ao
desenvolvimento industrial e a relação com o Estado.
5

A análise e compreensão da atuação do Estado e do processo de substituição de


importações8, formação da industrialização pesada e o desenvolvimento empresarial, passam
pelos estudos dos autores Maria da Conceição Tavares, Carlos Lessa, Luiz Carlos Bresser
Pereira e outros, conceitualizando a capacidade, necessidade e importância que a presença do
Estado tiveram para a formação e desenvolvimento da industrialização moderna e que
trouxeram reflexos que desembocaram na formação da Embraer.
A ação do Governo foi consubstanciada num programa de metas setoriais que
deu um certo grau de racionalidade à expansão industrial. A entrada de capitais
oficiais foi em parte autônoma, destinando-se ao financiamento de projetos
específicos e em parte maior compensação destinada a cobrir os déficits do
balanço de pagamentos. A entrada de capital estrangeiro privado orientou-se
basicamente para setores da indústria mecânica sob forma de investimento
direto estimulado pelo tratamento preferencial concedido pela Instrução nº113
da Sumoc. (TAVARES, 1972, p. 72)

Os permanentes déficits na balança comercial, de um país sempre orientado para


exportações de commodities e importação de bens de alta e média tecnologia, sempre se
apresentaram como entrave para as grandes iniciativas do Estado, que buscavam acelerar o
crescimento econômico e surgimento de uma indústria relevante no país, objetivando um
desenvolvimento tecnológico mais intenso.
Outra hipótese a ser considerada é o olhar pela inovação teorizado por Joseph
Schumpeter9, trabalhado nos estudos de Peter Evans, Inovação e Parceria que aborda a atuação
do Estado Desenvolvimentista, apoiado no binômio da autonomia e parceria, em que o Estado
deva ser o mais isolado possível da sociedade, a fim de evitar a captura pelo capital privado
rentista.
Representar o demiurgo implica assumir fortes pressuposições sobre a
inadequação do capital privado. O capital local é considerado incapaz de se
tornar uma “burguesia transformadora”, de iniciar novas indústrias e setores.
O capital transnacional é considerado desinteressado no desenvolvimento
local (EVANS, 2004, p. 116-117).

8
A expressão substituição de importações, embora seja conceitual e referir-se ao período da
industrialização restringida e a pesada, ajuda no entendimento da lógica e dimensão da indústria
aeronáutica.
9
Toda introdução de inovação no sistema econômico é chamado por Schumpeter de “ato empreendedor”: Uma
nova matéria-prima, uma introdução de um novo produto no mercado, um novo modo de produção, um novo modo
de comercialização de bens e serviços ou até uma quebra de monopólio.
6

Nas abordagens apontadas por Evans, o Estado desenvolvimentista pode desempenhar


quatro tipos de papéis: custódia; demiurgo; parteiro; e pastor. E frequentemente estes papéis
aparecem combinados, nunca isolados.
No caso Embraer, os papéis de parteiro e pastor do Estado, combinam-se ao longo da
trajetória da empresa, estimulando e apoiando o desenvolvimento tecnológico através dos
diversos instrumentos de incentivo, que vão de investimentos em P&D, financiamentos,
arranjos fiscais, encomendas militares e outros projetos estratégicos que se somam ao papel
primordial exercido na criação e gestão desde 1969 até 1994.
O Estado pastor, por fim, atua em conjunto com o Estado parteiro,
acompanhando o desenvolvimento dos grupos empresariais que foram
estimulados. Este papel é fundamental, pois “uma vez persuadidas a entrar
num setor, as empresas precisam de encorajamento e assistência para ir
adiante à medida que o setor muda” (EVANS, 2004, p. 119).

O chamado "pastoreio" do Estado vai do incentivo, fomento, financiamento e execução


do empreendimento Estatal, apoiando as atividades complementares e as etapas de risco
necessárias à implantação de uma indústria tecnológica de alta complexidade, como no caso da
indústria aeronáutica.
A revisão histórica proposta por Ha-Joon Chang, em Chutando a Escada - A Estratégia
do Desenvolvimento em perspectiva histórica, oferecerá subsídio, como um contraponto, de
que forma as ações do Estado brasileiro, através de suas instituições, foram determinantes para
o caso Embraer, utilizando de mecanismos de proteção para a nascente indústria aeronáutica
brasileira.
Quase todos os países bem sucedidos valeram-se da proteção à indústria
nascente e de políticas ICT10 ativistas quando eram economias em catching-
up11(CHANG, 2003, p.107).

O Estado criou condições de capacitação tecnológica, financeira, mercadológica e


institucional, para criar a empresa, protegê-la e poder colocá-la para a disputa internacional.
Desenhar uma política de desenvolvimento, que crie condições de sucesso e sobrevivência para
a empresa, é a tarefa primordial para um Estado que planeja uma estratégia para o
desenvolvimento.

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Política industrial, comercial e tecnológica
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Catching-up: convergência do processo em que as economias em desenvolvimento avançam e se aproximam do
nível de riqueza acumulada das economias mais desenvolvidas
7

(...) há uma grande multiplicidade de instrumentos políticos usados com esse


propósito, pelos diversos países, em consequência das diferenças em seu
relativo atraso tecnológico, na situação internacional, na disponibilidade de
recursos humanos etc. É ocioso dizer que, até num mesmo país, o foco da
promoção pode - aliás, deve- evoluir com o tempo, de acordo com as
mudanças da situação interna e internacional. Os países bem sucedidos são,
tipicamente, os que se mostraram capazes de adaptar o foco de suas políticas
às mudanças da situação.(CHANG, 2003, p.210)

Seguindo a fórmula, que na obra de Chang é sua crítica sobre como as nações
desenvolvidas não respeitaram a ortodoxia econômica em suas políticas de desenvolvimento, o
Estado brasileiro lançou mão de diversas formas de incentivo e proteção da Embraer, passando
ao largo de acordos, tratados e de arranjos na legislação para que, de forma intensa e segura,
esta indústria pudesse lograr sucesso e estabelecer-se como instrumento estratégicos de
desenvolvimento.
O processo de desenvolvimento institucional, assim como o papel que ele tem
no desenvolvimento econômico em geral, é uma questão ainda pouco
compreendida. Embora seja preciso continuar pesquisando o papel das
instituições no desenvolvimento econômico, a fim de chegar a conclusões
mais inquestionáveis (...) (CHANG, 2003, p.215)

O desmascaramento do mito da rivalidade entre a presença do Estado versus o capital


privado, proposto por Mazzucato (2014), será um dos argumentos para a análise da presença
indispensável do Estado para criação de tecnologias inovadoras e indústrias estratégicas para o
desenvolvimento do país.
Isso requer a compreensão de que o Estado não é nem um "intruso" nem
mero facilitador do crescimento econômico. É um parceiro fundamental do
setor privado - e em geral mais ousado, disposto a assumir riscos que as
empresas não assumem. O Estado não pode e não deve se curvar facilmente a
grupos de interesse que se aproximam dele em busca de doações, rendas e
privilégios desnecessários, como cortes de impostos. Em vez disso deve
procurar aqueles grupos de interesse com os quais possa trabalhar
dinamicamente em busca por crescimento e evolução tecnológica.
(MAZZUCATO,2014)

Contrapondo os argumentos deste pensamento "Keynesiano", a análise complementar


desenvolvida por Musacchio e Lazzarini (2015), será importante para entender o
funcionamento do modelo de economia estatal-privada do Brasil, iluminando a atuação e
impacto do BNDES nas principais empresas públicas brasileiras.
O governo, porém , não estava tão ansioso para intervir na Embraer quanto
estivera na Vale. A lucratividade da Embraer dependia da capacidade de
desenhar novos produtos e de comprar partes e componentes "state-of-
8

arts"(por exemplo, motores). Assim, forçar a Embraer a desenvolver


fornecedores nacionais poderia comprometer substancialmente a
competitividade da empresa no curto prazo. embora o BNDES e o Previ12
fossem acionistas minoritários, os dois em conjunto, em 2009, detinham
apenas 18,8% das ações com direito a voto da empresa. Ainda que se
acumpliciassem, não teriam voz majoritária nas decisões relevantes.
(MUSACCHIO; LAZZARINI 2015)

A ampliação da discussão e da compreensão da relação do Estado como indutor do


desenvolvimento, associado ao capital privado, mas como elemento central na determinação de
condições de proteção e arranjos institucionais, é ainda pouco vista no senso comum. Este
trabalho buscará ser mais uma ferramenta na compreensão desta associação, auxiliando no
debate sobre o assunto que pode em muitos casos, ser benéfica e necessária aos interesses do
país.

2. Objetivos
A pesquisa tem como objetivo analisar a frequente crítica à participação do capital
privado no setor estatal, buscando estabelecer um diálogo com ideias que defendem a
majoritária presença do Estado a qualquer custo, como solução para os problemas de empresa
estratégicas e a hipótese da participação conjunta com o capital privado, para formação e
capacitação da indústria nacional e desenvolvimento tecnológico, observando a preservação
dos interesses e da soberania nacional.
No modelo Leviatã como investidor minoritário, o capitalismo de Estado
renuncia ao controle de suas empresas em favor de investidores privados, mas
continua presente, com participações acionárias minoritárias, por meio de
fundos de pensão, de fundos soberanos e do próprio governo.(MUSACCHIO
A., LAZZARINO S., 2015)

Também pretende investigar a hipótese de que o controle e desígnios da empresa


possam ser coadunados com o do Estado, de forma não permitir com que esta empresa deixe
de ser um instrumento de defesa dos interesses nacionais e do desenvolvimento tecnológico do
país.
Incluindo na pesquisa a questão acerca da capacidade e necessidade do Estado para
induzir e conduzir um projeto nacional de industrialização e desenvolvimento tecnológico em
conjunto com o capital privado, pode ajudar na compreensão desta intrincada relação. Para este

12
PREVI é um fundo de pensão brasileiro que gerencia a previdência complementar dos funcionários do Banco
do Brasil.
9

objetivo, utilizaremos o caso da trajetória da Embraer, buscando analisar as questões relativas


aos interesses estratégicos e da soberania nacional do país, que independem da presença do
capital privado ou o fato de a empresa estratégica ser uma estatal.
Observando a distribuição do capital e a atual composição acionária da Embraer, serão
analisadas as ações derivadas desta participação do Estado que possam demonstrar a
importância de salvaguardar posições decisórias sobre os desígnios da empresa, que possam
garantir o desenvolvimento tecnológico e os interesses estratégicos do país.
A Embraer foi criada sob um novo padrão de industrialização, num novo momento e
modelo de industrialização, uma empresa de capital misto com controle do Estado e presença
do capital privado. Passou por grandes transformações, as quais serão parte da análise deste
trabalho para discutir a presença do Estado e a relação com o capital privado em diversos
momentos da empresa ao longo de sua trajetória.
A perspectiva teórica pretendida para o trabalho é a de uma análise sob um prisma de
política desenvolvimentista13, composta de práticas econômicas empreendidas pelos decisores
políticos que, conscientes da defasagem tecnológica, buscam estratégias para superação dos
obstáculos, trazendo a centralidade do Estado como importante ator no planejamento e
efetivação de ações para o desenvolvimento. Por meio do crescimento da produção e
produtividade, conduzidas a partir do setor industrial, promover mudanças na sociedade para
superar os desafios econômicos e sociais.

3. Procedimento de pesquisa
A primeira etapa deste estudo pretende avaliar o que diversos autores estabeleceram em
importantes estudos e análises, para avaliar a importância da atuação estratégica do Estado na
industrialização e no desenvolvimento tecnológico dos países (MAZZUCATO,2014;
MUSACCHIO & LAZZARINI,2015; EVANS,2004; TAVARES,1972; CHANG, 2003), dos
quais, demonstrando os diversos aspectos e cenários onde a presença do Estado foi determinante
para a consolidação da industrialização e avanço tecnológico, poderão servir de base para as
hipóteses que este estudo pretende levantar.

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Teoria econômica que está centrada no crescimento econômico, baseado na industrialização e na
infraestrutura, com forte intervenção do Estado.
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Avaliações de exemplos da presença e atuação do Estado em empresas estratégicas, nas


dinâmicas e nos diversos fatores e agentes relacionados com a economia e a política, que
tenham sido determinantes para o desenvolvimento da indústria aeronáutica brasileira, poderão
ser considerados para estabelecer comparativos que possam ilustrar e favorecer a compreensão
do tema.
Somando-se a estes, uma análise sobre a complexificação dos mercados internacionais
e em especial o setor financeiro, juntamente com a implantação de uma governança
corporativa14, alteram substancialmente a forma de gestão das grandes empresas, modificando-
as totalmente, o que afetou de forma geral, todas cadeias de produção, importação e exportação,
em especial nas empresas tecnológicas e estratégicas como no caso Embraer.
Uma distinção dos modelos de Governança Corporativa é a sua abrangência.
Eles vão dos menos para os mais abrangentes e suas duas características
básicas levam em conta, essencialmente, os compromissos corporativos com
múltiplas partes interessadas no desempenho da empresa e nos
desdobramentos internos e externos de suas ações. Estas não ficam restritas
ao binômio acionistas gestores. Ampliam-se, admitindo então que outros
interesses internos e externos sejam considerados. (ANDRADE e ROSSETTI
2004, p.34)

O projeto pretende adotar os passos necessários para elaboração da pesquisa, que vão
desde a seleção da bibliográfica e fichamentos das obras, análises de dados institucionais e da
bibliografia, cursar as disciplinas obrigatórias, elaborar cronologia dos diversos momentos da
industrialização do Brasil, levantamento de dados relevantes da industrialização nacional,
seleção de casos a serem detalhados, proposição de fatores determinantes que serão abordados,
estruturação do trabalho, elaboração dos tópicos para introdução, discussão e conclusão para
avaliação, revisões sistemáticas em acordo com a orientação, além disto, a formatação e a
adequação do trabalho aos padrões ABNT e outras atividades que se apresentem necessárias no
desenvolvimento do projeto.
Informações e dados dos diversos atores envolvidos no setor, voltados à análise das
indústrias que compõem o setor aeronáutico, também poderão ser consultadas para ajudar à
pesquisa, na compreensão de detalhes de ações, decisões políticas e estratégicas tomadas pelo
Estado e que refletiram mudanças significativas no setor.

14
Conjunto de mecanismos de gestão através de controles internos e externos visam reduzir a distância entre
acionistas minoritários e o poder de controle da empresa.
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Com relação à pesquisa documental, serão sistematizadas séries de dados e informações


dos relatórios de investidores, disponibilizados publicamente pela Embraer em seu site15 na
internet, que permitam extrair informações das atuações e ações determinantes do Estado que
possam ter influenciado decisivamente nos desígnios da empresa.
Para a compreensão da relação decisória de ações estratégicas dentro do conselho de
administração da Embraer, pretende-se para a pesquisa, a obtenção de entrevistas de ocupantes
de vagas no conselho de administração da Embraer, a fim de aferir de forma qualitativa, relatos
que possam indicar posicionamentos por parte do Estado que se traduziram em impactos
relevantes, do ponto de vista tecnológico e de resultados econômico positivos, nos resultados
da empresa. O desenho dos questionários serão fechados em temas decisórios, de forma que
possam permitir uma visão mais aproximada dos impactos de mudanças na empresa, advindas
do peso decisório e influência dos membros do conselho que representem interesses do governo
brasileiro.
Os estudos, entrevistas e dados estatísticos disponíveis na biblioteca do CPDOC16 da
Fundação Getúlio Vargas, bem como as entrevistas de dirigentes e autoridades relacionadas
com setor industrial e aeronáutico, serão amplamente utilizados para subsidiar a coleta de
informações que possibilitem a análise do papel estratégico do Estado na Embraer e no
desenvolvimento tecnológico vinculado. Dados e comparativos econômicos possíveis e
disponíveis em sites17 na internet, serão utilizados para analisar e subsidiar os estudos acerca
do mercado aeronáutico mundial.
A pesquisa se apoiará na bibliografia detalhada no item 6 e será ampliada, durante o
desenvolvimento dos trabalhos, buscando compreender os ciclos de industrialização, ocorridos
no país no século XX e que trouxeram impactos sobre o período de 1994 até 2019.
A ampliação da discussão e da análise da associação do Estado com o capital privado
em uma empresa estratégica de alta tecnologia, não se mostra frequente ou de ampla divulgação,
este trabalho poderá ser mais uma ferramenta na busca do entendimento desta associação, que
pode em muitos casos, ser benéfica e importante aos interesses do país.

15
https://ri.embraer.com.br/Default.aspx.
16
http://www.fgv.br/cpdoc/acervo.
17
Sites como por ex:https://oec.world/ (Observatório da Complexidade econômica) e https://atlas.cid.harvard.edu/
(Atlas da Complexidade Econômica).
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4. Cronograma

MESES
ATIVIDADES 1 1 1 1 1 1 1 1 1 2 2 2 2 2
1 2 3 4 5 6 7 8 9 11
0 2 3 4 5 6 7 8 9 0 1 2 3 4
Integração na
instituição
Revisão
bibliográfica e
Discussão teórica
Leituras e
fichamentos
Localização e
identificação das
fontes
Sistematização e
análise dos dados
Elaboração do
relatório de
Qualificação
Redação definitiva
da dissertação
Revisão e
adequação do texto
Defesa da
dissertação
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5. Referências Bibliográficas:

ANDRADE, A; ROSSETTI, J.P. Governança corporativa: fundamentos, desenvolvimento e


tendências. São Paulo: Atlas, 2004.

BERNARDES, Roberto. Embraer Elos entre o Estado e o mercado. São Paulo:


Editora Hucitec, 2000

______. O caso Embraer – privatização e transformação da gestão empresarial: dos imperativos


tecnológicos à focalização no mercado / Roberto Bernardes. São Paulo: CYTED: PGT/USP,
2000. p. (Cadernos de Gestão Tecnológica; 46)

BELZUNCES, Renata; CLAROS, Herbert. A Embraer é nossa - Não à venda para a Boeing,
Revista do Sindicato dos Metalúrgicos SJC, Departamento de Comunicação, 2018
BNDES. Consulta financiamentos de exportação. BNDES, 2018. Disponível em:
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MUSACCHIO, Aldo; Lazzarini, Sérgio G. Reinventando o capitalismo de Estado: o Leviatã
nos negócios: Brasil e outros países.1ºEdição, Portfolio-Penguin, 2015
14

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