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Sociologia do professor global

Apresentação
Na Sociologia do Professor Global a influência da política educacional ocorre pela globalização.

Nesta Unidade de Aprendizagem você vai estudar a ressignificação do papel e do trabalho do


professor em uma sociedade globalizada e como a reconstrução do professor ocorre em face das
políticas públicas.

Bons estudos.

Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

• Comparar os diferentes sistemas de regramento e controle na produção do professor por


meio de reformas do ensino.
• Identificar o que levou a reforma contemporânea da formação de um novo professor para
uma nova ordem mundial.
• Relacionar os motivos da alta rotatividade de professores em diversos países do mundo, dos
menos desenvolvidos economicamente aos países em transição.
Desafio
Para cumprir as metas propostas pela reconstrução global, às vezes os professores precisam
colocar de lado preocupações pedagógicas, como metas de conhecimento, objetivos sociais e
outros e ensinar para a prova, deixando de lado crenças pessoais relativas ao ensino. Recorde-se de
uma situação vivenciada com algum professor ou que você mesmo tenha experienciado, se
professor, em que as suas crenças tiveram que ser deixadas de lado em face da necessidade de
atender a uma política pública em que o professor vira um gerente de sala de aula profissional.
Produza um texto de uma lauda analisando a experiência e como você se sentiu ao realizá-la.
Infográfico
Neste infográfico você vai conhecer os elementos que fazem parte da sociologia do professor
global.
Conteúdo do livro
Como a reconstrução do professor global ocorre em diferentes lugares e contextos em nível
nacional e internacional, as especificidades históricas, locais e políticas moldam a oferta e a procura.
No livro "Sociologia da Educação", leia o capítulo "Sociologia do professor global".
SOCIOLOGIA DA
EDUCAÇÃO

Jocélia Santana Barreto


Sociologia do
professor global
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Explicar como ocorre o controle da produção do professor.


 Identificar as causas da reforma contemporânea da formação do
professor.
 Relacionar os motivos da alta rotatividade de professores.

Introdução
Como você sabe, hoje o mundo é globalizado e grande parte dos países
são adeptos do sistema capitalista. A era tecnológica modificou as relações
interpessoais, de trabalho e de consumo. Além disso, aumentou a quan-
tidade de informações disponíveis. Assim, há muito material circulando
pela internet, mas grande parte dele não é confiável. Além disso, junto
aos benefícios da rede mundial de computadores, apareceram empregos
ilícitos dessa rede, que incluem novos crimes.
Neste capítulo, você vai conhecer melhor esse contexto contempo-
râneo e ver como o professor se insere nele. A ideia é que você reflita
sobre as novas atribuições da educação e sobre o modo como elas se
configuram nos atuais sistemas políticos, econômicos e culturais.

Controle da produção do professor


A docência é em si um desafio. Os percalços do cotidiano da profissão, a rotina
e os problemas com alunos exigem que o professor se reinvente continuamente.
Viver em um mundo globalizado e refletir sobre esse mundo é um grande
desafio. A cada dia, novas mudanças acontecem, com uma rapidez assustadora.
Tudo se torna novo e instável ao mesmo tempo, não é? Nesse contexto, o
conceito de nação já não é mais suficiente para explicar as transformações da
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sociedade global. Se antes se pensava na sociedade relacionada ao Estado, ao


Estado-nação, agora é necessário pensar a sociedade a nível mundial. Contudo,
tal sociedade mundial não é a soma das sociedades nacionais.
Se antes o professor detinha o monopólio do saber e os alunos recebiam
as informações já prontas, sem muito espaço para questionamentos quanto
à maneira de ensinar, atualmente as coisas são diferentes. Com a velocidade
acelerada da transmissão de informações, há mudanças ocorrendo. Assim, o
docente se torna um mediador do conhecimento, visto que, com a internet, os
alunos conseguem acessar informações que estão além dos livros e da aula do
professor. Cabe a este mediar e usar essas informações já adquiridas pelos alunos,
inserindo-as em suas aulas e transformando-as em conhecimento útil e crítico.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem 116
milhões de pessoas conectadas à internet, o que representa 64,7% de toda a população
com idade acima de 10 anos (GOMES, 2018).

Contudo, essa dinâmica nem sempre foi assim. Com o projeto iluminista,
a educação tinha como finalidade desenvolver um cidadão emancipado e
autônomo, adequado às necessidades do capitalismo, que surgiu nos séculos
XVII e XVIII. A educação deveria ser igualitária e democrática, direcionada à
formação de um indivíduo livre e racional e voltada ao mundo do trabalho na
sociedade burguesa. Nesse cenário, o professor era a autoridade máxima, que
detinha o conhecimento. A ele cabia transmitir as informações aos estudantes,
que o viam com confiança e o encaravam como o detentor do saber.
A escola se universalizou, tornando-se pública e laica, baseada na ideia
de progresso da humanidade. Contudo, o século XX pôs em xeque a ideia de
progresso conduzido pela razão. Os valores iluministas entraram em crise e
surgiu uma nova era de incertezas. Hoje, não existem verdades absolutas. Uma
nova revolução tecnológica também entrou em curso. A tecnologia cresceu
em nível assustador. A invenção do computador, o surgimento da internet
conectando as pessoas de forma global e o desenvolvimento de novos aparelhos
tecnológicos (como o smartphone e a TV digital) modificaram profundamente
o cotidiano da humanidade. Eles influenciam comportamentos e interferem
nas formas de se pensar e agir.
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Como todas essas mudanças, como está a educação no século XXI? Qual é
o papel do professor na globalização? O que é ser professor em uma sociedade
globalizada, perpassada por novas tecnologias e diferentes modos de pensar
e fazer história? Pensar a sociologia do professor global é questionar como
o tradicional processo de ensino e aprendizagem se transforma em novas
maneiras de ensinar.
A nova geração de estudantes, que nasceu na era da tecnologia e da ve-
locidade das informações, representa um desafio constante. Para lidar com
esse desafio, o professor precisa se reinventar a cada dia com o objetivo de
construir o conhecimento e socializar o saber. Os estudantes já trazem uma
bagagem de informações que devem ser mediadas pelo professor para que se
transformem em conhecimento útil e relevante para eles.
Qual é a metodologia de ensino do professor global? O que é a nova sala
de aula? Quais são as práticas pedagógicas na sociedade globalizada? Em
primeiro lugar, como você já viu, o professor torna-se mediador do conhe-
cimento. Os métodos e técnicas de ensino e aprendizagem também foram
modificados. Houve uma mudança de modelos e o rompimento de estruturas
que pareciam fixas. A formação de professores está no centro do debate do
mundo da educação. Hoje, se discute muito a necessidade de se realizarem
reformas educacionais.
O discurso da globalização de organismos internacionais prega a necessi-
dade de reformas nas políticas educacionais, que devem se adaptar às exigências
de competitividade política e econômica em nível mundial. A educação, por-
tanto, se torna um meio para o desenvolvimento e a prosperidade econômica,
ficando subordinada a políticas neoliberais. Nesse discurso, se estabelecem
metas para que os países alcancem determinados patamares, respondendo às
demandas do capital internacional.
Exige-se um “novo” professor para uma nova sociedade global. As reformas
atuais da formação de professores pregam que houve um fracasso das escolas
no passado, pois os professores eram incompetentes e ineficazes. Agora, o
governo e os legisladores têm a capacidade de definir o que são um professor
efetivo e uma escola eficiente. As reformas direcionam a ação do professor e
o avaliam de acordo com os objetivos a ele imputados.
Exemplos dessa reforma educacional aconteceram em países como Estados
Unidos, Reino Unido e Nova Zelândia. Neles, os professores são direcionados
a desenvolverem competências estruturadas em habilidades técnicas por meio
de práticas no cotidiano da sala de aula antes de se formarem e poderem le-
cionar. Essas práticas são realizadas no estágio e preparam o professor para a
docência. A prática docente é baseada em métodos já previamente prescritos,
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e o profissional se transforma puramente em um técnico da educação, sendo


que a construção de conhecimento crítico é deixada de lado. Assim, o professor
é um mero transmissor do currículo.
Somado a esse fato, há um enfraquecimento do trabalho docente. Afinal,
também ocorre um processo de flexibilização, modificando contratos e salá-
rios. Nesse sentido, se utiliza força de trabalho menos qualificada e também
estagiários, sendo que o profissional docente se transforma em um mero
contratado, não em um agente de transformação no processo educacional.
A Inglaterra passou por uma reforma profunda baseada nesse tipo de
parâmetro. Lá, há uma produção de currículo para a formação do professor,
e a competência deste é mensurada constantemente, por meio de inspeções.
Há um controle rígido desde o início da formação até os anos finais para o
cumprimento de metas e o desenvolvimento de habilidades práticas, sem o
questionamento crítico sobre a prática docente. Surgem nesse país as figuras
do assistente de ensino e do assistente de ensino de nível superior. Eles traba-
lham para apoiar o professor e podem substituí-lo nas aulas algumas vezes.
Também podem supervisionar e avaliar o desempenho dos alunos. Como você
pode notar, há um desvio e um enfraquecimento da importância da profissão
do docente na sala de aula.
A análise de dados estatísticos sobre os resultados do sistema educacional
de cada país serve como método comparativo e instrumento para medir a
competitividade entre eles. As políticas econômicas, dessa forma, mensuram
o fracasso ou o sucesso escolar por meio de indicadores, com o objetivo de
cobrar padrões ideais e metas. Cria-se um modelo de professor ideal, outro
de aluno ideal e outro ainda de escola ideal, baseados nas performances e nas
realizações que devem ser concretizadas. Quando há resultados negativos
de desempenho escolar, que não atendem às expectativas para a entrada no
mercado de trabalho, a cobrança se intensifica mais.
O discurso da globalização prega que os professores são os responsáveis
pelo fracasso escolar e que os legisladores e os governos têm mais capacidade
de decidir como deve agir um professor com eficiência e eficácia, construído
para uma escola “boa”. O professor é encarado como um ser que tem de seguir
uma receita pronta. Ele deve se basear em parâmetros curriculares prontos,
tecnologias de desempenho e atividades em sala de aula já previamente ela-
boradas, com a finalidade de desenvolver resultados para cumprir as metas
de alta performance exigidas pelos governos e organismos internacionais.
Assim, há a homogeneização: um modelo único do que é ser professor na era
da globalização.
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A reforma do ensino implicou mudanças na formação dos professores


em diversos países. Nesse sentido, uma nova postura passou a ser cobrada
desses profissionais. As reformas como instrumento de regulação social e
ajuste das estruturas, bem como os organismos internacionais e os governos,
determinam as políticas para uma educação que tem a responsabilidade pelo
desenvolvimento econômico.
A formação do professor passa por três vieses: a “universitarização”/
profissionalização, isto é, os professores devem se formar em universidades,
local por si só tido como detentor do saber; a ênfase na formação para a prática
da sala de aula, pois o professor deve assumir a formação continuada; e a
educação a distância e a pedagogia das competências.
Argumenta-se que a formação anterior do professor fracassou pois era muito
teórica, distante da realidade escolar. Por isso é que o desempenho escolar tem
apresentado resultados insatisfatórios segundo diferentes indicadores. Na peda-
gogia das competências, a escola deve ensinar competências direcionadas e de
acordo com o que cobra o mundo do trabalho. A ideia é formar um trabalhador
flexível e polivalente, que saiba fazer as atividades exigidas pelo mercado.
Assim, não sobra espaço para a reflexão sobre a prática no espaço de trabalho.
Contudo, na vida real, no cotidiano, a diferença entre o ideal e o real está
presente. Os professores se veem cerceados por cobranças relativas às metas
estabelecidas. Assim, o professor é direcionado a somente aplicar provas com
conteúdos já determinados pelos currículos nacionais. Ele se torna um técnico,
um gerente na sala de aula.
Mas será que esse professor global existe de fato em todos os lugares? Ora, a
profissão docente é construída por meio da história de vida, dos costumes locais,
da cultura e da política de cada país, assumindo singularidades e diferenças.
Em países do Hemisfério Norte, como os Estados Unidos e o Reino Unido, tem
sido cada vez mais difícil recrutar professores, o que levou à política de licen-
ciamento de emergência. Os baixos salários e a queda de status da profissão são
fatores que explicam essa tendência. Nesses países, a docência tem se tornado
uma atividade de curto prazo, sendo que há uma incoerência entre o discurso
de aprender e ensinar, ou seja, entre a noção de que a educação deve ocorrer
durante toda a vida e a elevada rotatividade dos professores.
Já em países em desenvolvimento, há maior dificuldade para o ingresso dos
professores nas escolas públicas. Isso acontece porque os salários das escolas
particulares costumam ser mais atraentes. As escolas rurais também acabam
enfrentando a falta de professores devido à distância em relação à cidade.
Assim, tais escolas muitas vezes são deixadas em segundo plano.
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No Brasil, as salas de aula são lotadas e há pouca valorização dos professores, se-
gundo o estudo Políticas Eficazes para Professores: Compreensões do PISA, publicado
pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em
2018 (FERNANDES, 2018).
As escolas públicas no País têm 37 alunos por sala de aula no primeiro ano do
ensino médio. Além disso, o Brasil possui um dos mais altos números de alunos por
professor: 22. Como você pode imaginar, esses dados influenciam significativamente
a quantidade de trabalho dos docentes e a qualidade de ensino (FERNANDES, 2018).

Cada país possui suas particularidades no que diz respeito ao seu sistema
de ensino, aos seus parâmetros curriculares nacionais, ao ingresso e à duração
das formações em cada nível de ensino. Também há distinções em relação
ao status dado à função de professor e aos salários a eles direcionados. Isso
costuma depender da rede de ensino (particular ou pública) e do nível escolar
(ensino fundamental, médio ou universitário). Mas, afinal, há um professor
global? Ora, existem os imponderáveis da vida real e é no cotidiano que os
professores se constroem e podem buscar novas formas de ser, pensar, agir e
significar a sua prática docente.

O novo professor exigido pela sociedade global


Atualmente, a educação é encarada pelo mercado como um dos principais
fatores para o desenvolvimento pessoal e profissional. Ela é vista como meio
de ascensão social e democratização das oportunidades. Continuar sempre
estudando: esse é o segredo para o sucesso. Com o mercado cada vez mais
competitivo, é necessário desenvolver novas habilidades e competências para
ter emprego, permanecer e crescer nele.
Nesse sentido, os indivíduos desenvolvem competências, habilidades e
atitudes para se adequarem às necessidades do mercado de trabalho capitalista.
Esse discurso, muitas vezes pregado por economistas e organizações multi-
laterais — como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional (FMI)
e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(Unesco) —, tem como finalidade a adequação do trabalhador à produção e
à reprodução do capital, sem um posicionamento crítico a respeito do modelo
econômico.
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Você deve considerar que educar para o trabalho é fundamental, visto que o
ser humano necessita do trabalho para garantir a sua sobrevivência. Contudo,
sem uma educação voltada para a cidadania, a formação do educando torna-se
parcial. Ao se tornar instrumento do capital, a educação molda o trabalhador
para a reprodução social, com base nos anseios da sociedade capitalista. É
uma educação para a adequação, não para a transformação.
Mas o que originou as cobranças por um novo perfil de professor na socie-
dade global? A partir da década de 1970, ocorreram profundas transformações
na estrutura da sociedade, principalmente no mundo laboral. O processo de
trabalho sofreu grandes transformações com o desenvolvimento e a introdução
de novas tecnologias e com o declínio do modelo fordista de produção, que
predominara por mais de um século. Essas mudanças criaram a necessidade de
um novo perfil de trabalhador. O trabalhador do século XXI deveria possuir
flexibilidade, ser polivalente, aprender por conta própria, gerir sua própria
carreira, ter eficiência, qualificação, competências, habilidades e sobretudo
empregabilidade, isto é, conseguir se manter empregável para o mercado de
trabalho.
O modelo escolar que preparava o trabalhador para o padrão industrial
fordista de produção foi considerado defasado, pois não atendia mais às exi-
gências da nova fase do capitalismo. A escola foi forçada a se reinventar, sendo
apontada como responsável pelo fracasso do ensino, pela falta de preparo dos
estudantes em sua formação e pelo distanciamento entre os currículos escolares
e as demandas surgidas da globalização.
Os professores tornaram-se bodes expiatórios culpados pelo baixo de-
sempenho dos alunos, sofrendo muitas críticas. Sua formação passou a ser
questionada, tida como apegada a teorias, sem muito vínculo com a prática
demandada pela sociedade global. Com a globalização, a educação foi dire-
cionada às necessidades do capital. Diversos países tiveram de se adequar e
reformar seus sistemas de ensino para aumentar os níveis de sucesso escolar.
Surgiram novas políticas públicas de eficácia, eficiência, efetividade e flexi-
bilidade para reformar as ofertas de educação no ensino público.
Os construtores de políticas públicas e os legisladores defendem a ne-
cessidade de um novo professor para uma nova ordem mundial, para que se
alcance o progresso por meio da mudança. Existe um discurso que afirma
que há a necessidade de reformas estruturais e econômicas para que os países
possam competir igualmente entre si os objetivos pregados por organismos
multilaterais e internacionais.
Assim, como você viu, os sistemas de educação em diferentes países pas-
saram por reformas. Essas reformas envolveram diversos aspectos do sistema
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escolar: a estrutura administrativa e pedagógica das instituições, a formação


de professores, o currículo escolar e o conteúdo ensinado. Isso influenciou
significativamente o processo de ensino e aprendizagem. Contemporanea-
mente, ocorre, então, um controle por parte dos organismos internacionais,
que passam a regular os sistemas escolares, ditando suas normas de baixo para
cima em alguns países, direcionando e decidindo as reformas educativas e,
muitas vezes, também as políticas.

Você conhece a situação da educação no Brasil? Segundo o estudo Um olhar sobre a


educação, da OCDE, mais da metade dos adultos (52%) que possuem entre 25 e 64
anos não concluíram o ensino médio (BBC NEWS, 2018).

As reformas no campo da educação tendem a se tornar um meio utilizado


pelo Estado para manter a estrutura do sistema de acumulação capitalista. Além
disso, tendem a ser uma medida para os ajustes exigidos pelos organismos
internacionais aos países em desenvolvimento que possuem dívidas externas,
como maneira de garantir o pagamento dessas dívidas.
A partir da década de 1990, foram realizados fóruns, encontros e confe-
rências com o intuito de elaborar as metas que cada nação deveria alcançar
com relação à educação. Indicadores de qualidade da educação foram cons-
truídos. Na Comunidade Europeia (CE), tais indicadores estão relacionados
às disciplinas de português, matemática e língua estrangeira e principalmente
à formação de professores. Tal formação tem a finalidade de homogeneizar o
nível de educação nos países, que deveriam se tornar competitivos e eficazes
em âmbito global.
Como você viu até aqui, o fenômeno da globalização é amplo, de ordem
mundial, e perpassa diversos aspectos da vida em sociedade. Há diferentes
entendimentos sobre o que é globalização. Em síntese, ela é um processo
histórico e social que tende a enfraquecer o Estado-nação na sua capacidade
de tomar decisões soberanas e agir com autonomia. Com a globalização, há
a internacionalização do capital, principalmente financeiro e especulativo, e
a expansão dos mercados econômicos, gerando um grande fluxo de capital,
assim como o aumento da circulação de mercadorias, pessoas e serviços
ao redor do planeta. A economia mundial baseada no modelo neoliberal é
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desregulamentada. Contudo, os países economicamente mais favorecidos


continuam exercendo o poder econômico, político e financeiro sobre os menos
desenvolvidos.
O neoliberalismo surgiu nos anos posteriores à Segunda Guerra Mundial,
criado por um grupo de pensadores que elaboraram um conjunto de medidas
econômicas. Essas medidas pregam a liberalização do Estado das questões
sociais, tais como educação e economia, a liberação das fronteiras de taxas
que dificultem as relações de comércio internacional e o controle da emissão
da moeda. Além disso, defendem a modificação das leis que controlam o
Estado (como as leis trabalhistas), da previdência, da propriedade intelectual,
dos impostos, das empresas e instituições públicas e de sua relação com o
movimento sindical.
Tais medidas têm como finalidade diminuir os gastos públicos. Esse con-
junto de modificações é chamado de reforma do Estado. Ela foi posta em
prática nos países a partir dos anos 1970, significando a diminuição da presença
do Estado em diversos aspectos: na economia, na cultura, enfim, na sociedade.
A reforma diminui o papel do Estado em relação à saúde pública, ao cuidado
com os aposentados, à infraestrutura — aeroportos, estradas, portos — e ao
setor de educação. A solução proferida pelos defensores do neoliberalismo é
a privatização dos órgãos e serviços públicos.
A política neoliberal se torna uma organização da produção e da vida
econômica. Com ela, o mercado dá as cartas e o Estado deixa de intervir
diretamente na economia, sendo que as relações sociais ficam subordinadas
às demandas do mercado. No contexto dessas políticas neoliberais, ocorre a
interferência direta dos organismos internacionais nos Estados, sobretudo no
campo educacional, com vistas a adequá-lo às novas demandas da globalização.
Exige-se que o trabalhador seja mais qualificado para o mercado de trabalho.
Com isso, os governantes buscam melhorar a estrutura do sistema educacional.
Além disso, incorpora-se a tecnologia ao ensino com o uso da informática e da
educação a distância para que o número de estudantes cresça significativamente.
Assim, a internet se acentua como meio de acesso à informação e ao conhecimento.
Constrói-se uma “nova” sociedade do saber. Tal sociedade tem como objetivo a
competição em âmbito global, adaptando-se aos desejos da globalização.
Nesse cenário, você deve ter em mente que a constituição do professor
sempre depende do contexto, do local onde ele vive, da sua história de vida
e das políticas educacionais do sistema de ensino de cada nação. As políticas
neoliberais enfraquecem o Estado-nação. A política de educação, portanto,
se torna subordinada à política econômica, às necessidades do capital e à
competição em âmbito global.
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O neoliberalismo retoma o liberalismo, ideologia econômica defendida por Jonh


Locke (1632–1704) no século XVII. Locke foi um pensador inglês que pregava que os
homens são livres e iguais entre si e que não há uma desigualdade natural. Sendo
livres e iguais, possuem acesso a tudo, não devendo nada regular o acesso aos bens
materiais. Tanto o trabalhador quanto os capitalistas são proprietários; o trabalhador
possui a sua força de trabalho, e o capitalista, os meios de produção. Dessa forma,
podem trocá-las igualmente e o Estado não deve intervir nessa troca.

Alta rotatividade dos professores


A rotatividade está relacionada à entrada e à saída de funcionários em uma
organização. O problema da alta rotatividade de professores é tema de debate
em nível internacional. A rotatividade intensa dos professores influencia sig-
nificativamente o processo de ensino e aprendizagem, a qualidade do ensino,
o trabalho dos docentes e, consequentemente, o nível educacional do sistema
escolar em nível local, regional ou nacional. Mas quais são as causas da alta
rotatividade de professores?
Você certamente já ouviu frases como estas: “Futuramente, vão faltar
professores” e “Hoje em dia, ninguém mais quer ser professor”. Elas são
comuns hoje em dia. As condições de trabalho são um dos principais fatores
para a alta rotatividade dos professores. Os baixos salários fazem com que
tenham de trabalhar em diferentes turnos em diversas escolas, muitas vezes
utilizando várias conduções. Trabalho longe de casa e escolas superlotadas e
com estrutura inadequada são outros elementos negativos. Além disso, falta
material básico para ensinar, equipamentos e laboratórios. Muitos professores
ainda precisam trocar de local de trabalho com frequência e assinar contratos
temporários.
Como você pode imaginar, a rotatividade intensa atrapalha o vínculo
entre o professor e a turma de alunos. Além disso, provoca a defasagem de
conteúdo. Os contratos temporários acabam deixando os professores inseguros
quanto ao exercício da sua profissão. Eles não têm a possibilidade de elaborar
planos de aulas fixos para as séries que ensinam. Se o professor lecionasse
como efetivo, poderia dar continuidade ao ritmo de ensino. Naturalmente, a
saída do professor no meio do ano interfere no aprendizado dos alunos. Ocorre
prejuízo no projeto pedagógico, já que é preciso tempo de adequação para que
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os conjuntos de professores se adaptem. Também pode acontecer uma quebra


de confiança entre professor e aluno.
No Brasil, estresse, esgotamento e sofrimento mental são fatores que
contribuem para a alta rotatividade de professores. Nas escolas de periferia,
que possuem alto índice de vulnerabilidade socioeconômica (gerada pela
violência, seja por parte dos traficantes de drogas, seja por parte dos próprios
alunos), a rotatividade de professores tende a aumentar. É preciso combater
a violência escolar incentivando a participação da comunidade (pais, funcio-
nários, administração, alunos) para a construção de uma escola cidadã no
que diz respeito à tomada de decisões. Somente dessa forma a escola se torna
um espaço democrático, em que há a construção de currículos em conjunto,
partindo das vivências, culturas e políticas locais.

Para saber mais sobre o tema deste capítulo, leia o artigo As políticas sociais e o neolibera-
lismo: reflexões suscitadas pelas experiências latino-americanas, disponível no link a seguir.

https://goo.gl/hnG2nw

BBC NEWS. Mais da metade dos brasileiros não tem diploma do ensino médio, aponta
OCDE. 2018. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45470956>.
Acesso em: 21 out. 2018.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. 2018. Disponível em:
<http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>. Acesso em: 21 out. 2018.
FERNANDES, D. Salas lotadas e pouca valorização: ranking global mostra desgaste
dos professores no Brasil. 2018. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/
brasil-44436608>. Acesso em: 21 out. 2018.
GOMES, H. S. Brasil tem 116 milhões de pessoas conectadas à internet, diz IBGE. 2018.
Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/tecnologia/noticia/brasil-tem-116-
-milhoes-de-pessoas-conectadas-a-internet-diz-ibge.ghtml>. Acesso em: 21 out.
2018.
12 Sociologia do professor global

Leituras recomendadas
ANDERSON, P. Balanço do neoliberalismo. In: GENTILE, P.; SADER, E. (Org.). Pós-neolibe-
ralismo: as políticas sociais e o Estado democrático. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008.
BIANCHETTI, R. G. Modelo neoliberal e políticas educacionais. São Paulo: Cortez, 1996.
(Questões de Nossa Época, 56).
CHESNAIS, F. La mondialisation du capital. Paris: Syros, 1997.
CURITIBA. Secretaria de Estado da Educação. Sociologia. 2. ed. Curitiba: SEED-PR, 2006.
DRAIBE, S. M. As políticas sociais e o neoliberalismo: reflexões suscitadas pelas expe-
riências latino-americanas. Revista USP, São Paulo, n. 17, p. 86-101, 1993. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/25959/27690>. Acesso em: 21 out. 2018.
FERREIRA, A. O.; MAYCON, J. J. S. A definição do papel da escola e do professor na socie-
dade atual. Revista Vértices, Campos dos Goytacazes, v. 12, n. 3, p. 165-176, set./dez. 2010.
MAUÉS, O. C. Reformas internacionais da educação e formação dos professores. Caderno
de Pesquisa, São Paulo, n. 118, p. 89-117, mar. 2003.
SOUSA JUNIOR, L. Reforma do ensino médio: o que muda com a lei 13.415, de 16/02/2017?
2017. Disponível em: <http://www.sinteppb.com.br/arquivos/reforma_do_ensino_me-
dio_2017.pdf>. Acesso em: 21 out. 2018.
VIEIRA, M. M. Educação e novas tecnologias: o papel do professor nesse cenário de
inovações. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 11, n. 129, p. 95-102, 2012.
Conteúdo:
Dica do professor
Neste vídeo você vai conhecer um pouco mais sobre o professor global.

Aponte a câmera para o código e acesse o link do vídeo ou clique no código para acessar.
Exercícios

1) A reforma contemporânea da formação de professores e concomitantemente a construção


de um professor para a nova ordem mundial baseiam-se em uma série de suposições, entre
elas:

A) Que as escolas fracassaram no passado por culpa dos professores.

B) A falta de competição internacional.

C) À boa competência dos professores.

D) O professor é bem preparado para a prática da sala de aula.

E) O professor não tem autonomia.

2) A fixação de metas e a elevação de padrões internacionalizados pode gerar o chamado


professor inautêntico. O que caracteriza esse conceito?

A) A preocupação que o professor deve ter sempre com os objetivos morais e sociais, guiando-
se por seus princípios.

B) O professor deve ter sempre a preocupação com currículos sensíveis ao desenvolvimento e à


cultura.

C) O professor é medido, monitorado e avaliado no seu desempenho e na maneira como produz,


perdendo a autenticidade e o compromisso na realização de seu trabalho.

D) O professor inautêntico se preocupa com suas aspirações e suas metas buscando fazer o seu
melhor com total independência.

E) A reconstrução do professor não passa pela globalização.

3) O problema de migração dos professores que acontece em algumas nações menos


desenvolvidas ou em transição passa por:

A) Pouca oferta de trabalho para os professores.

B) Problemas que afetam a identidade profissional do professor.


C) Os professores são bem remunerados e valorizados.

D) Em algumas partes do mundo a desregulamentação e a carência de habilidades fazem com


que o professor mude para outro lugar.

E) Alto grau de satisfação com a profissão devido à grande autonomia e independência na


maneira de atuar.

4) Quando falamos em professor global, podemos afirmar que o professor RECONSTRUÍDO é:

A) Um profissional com autonomia para ensinar.

B) Um professor independente que segue suas convicções.

C) Um professor que questiona as regras.

D) Um gerente empresarial.

E) Um profissional soberano e livre.

5) Em muitas nações, uma forma de assegurar a qualidade do professor é:

A) Reformar o ensino na fonte.

B) Reforçar sua autonomia.

C) Permitir ao professor atuar com plena liberdade.

D) Dar ênfase sobre as práticas do professor.

E) Apoiar a livre iniciativa do professor quanto aos métodos de aprendizagem.


Na prática
O professor reconstruído é produzido a partir de conjuntos de receitas para ação, regras sistêmicas,
tecnologias de desempenho e ações de sala de aula rotineiras planejadas (por outros) para entregar
qualidade e garantir altos padrões. No centro disso está o professor, que enfrenta um conjunto de
tensões pessoais e profissionais. Para cumprir as metas, ele pode às vezes ter que ensinar para a
prova e colocar de lado quaisquer outras preocupações pedagógicas, tais como objetivos estéticos,
morais, sociais ou outras metas cognitivas mais amplas.
Saiba +
Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor:

Profissão docente:
Desafios de uma identidade em crise

Aponte a câmera para o código e acesse o link do vídeo ou clique no código para acessar.

SCHAEFER, R. T. Sociologia. 6. ed. São Paulo: McGraw-Hill, 2006.


518p.

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