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Universidade de São Paulo

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS


Departamento de Linguística Graduação em Letras
Curso: Elementos de Linguística 1 2022/1 01/09/2022
Professora: Ana Paula Scher Monitores: Beatrice Nascimento Monteiro; César E. Marangoni Jr e Fernando V. Yoshida

ESTUDO DIRIGIDO – FIGUEIREDO SILVA

Questões relativas a Figueiredo Silva (2009). Elaborada por Fernando Valls Yoshida, sob supervisão
da prof.ª Dr.ª Ana Paula Scher, no contexto da disciplina Morfologia (FLL0435).

Exercício 1 Ao contrário do que imagina o senso comum, a aquisição de uma língua materna não é
um mero processo de imitação, em que a criança simplesmente estoca as estruturas de sua língua que
recebe da fala de seus cuidadores. Um tipo de evidência levantada contra a hipótese da imitação são
as chamadas sobregeneralizações. Considere, a esse respeito, os dados apresentados no Quadro 1.

Quadro 1 Dados de crianças adquirindo o paradigma verbal do português brasileiro.


Forma adulta Forma infantis Idade da(o) informante
(eu) faço [‘fazo] 3 anos e 6 meses
(eu) trago [‘tazo] 3 anos e 4 meses
(eu) trouxe [ta’zi] 3 anos e 1 mês
(ele) trouxe [ta’zew] 2 anos e 3 meses
(eu) sei [‘sabo] 2 anos e 10 meses
Fonte: Elaborada e adaptada de Lorandi (2007, p. 101–2)1.

Com base nesses dados e na abordagem estruturalista de Camara Jr. (1970), apresentada na seção
§2.3 de Figueiredo Silva (2009), considere as seguintes perguntas:
(a) Apresente uma análise estruturalista das formas verbais (eu) como, (eu) bebi, (ele) escreveu,
tidos como verbos regulares do paradigma verbal do português brasileiro.
(b) Apresente uma análise estruturalista das formas infantis, presentes na Tabela 1.
(c) O tipo das representações para as formas verbais é o mesmo em (a) e em (b)? Ainda, essa
análise pode ser usada para as formas adultas, na Tabela 1?
Para entender como crianças chegam a produzir essas estruturas (que, perceba, não são produzidas
por adultos e, portanto, não constituem o input a que a criança tem acesso), considere a seguinte
hipótese para a aquisição de formas irregulares (GROLLA; FIGUEIREDO SILVA, 2018, p. 39–43).

Hipótese A aquisição de formas irregulares se dá em três estágios.


 Estágio 1 (imitação): a criança produz formas idênticas às formas adultas (e.g., sang,
mice), sem acessar sua estrutura interna;
 Estágio 2 (sobregeneralização): a criança analisa a estrutura interna das formas
irregulares de acordo com os padrões das formas regulares e, assim, produz formas
diferentes das formas adultas (e.g., singed, mouses);
 Estágio 3 (formas irregulares adquiridas): a criança adquire e incorpora as formas
irregulares e então produz formas idênticas às formas adultas, que bloqueiam as
formas sobregeneralizadas (e.g., sang bloqueia singed, mice bloqueia mouses).

1LORANDI, Aline. Formas morfológicas variantes na gramática infantil: um estudo à luz da teoria da otimidade. 2007. 185 f.
Dissertação (Mestrado em Letras) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007.
Universidade de São Paulo
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
Departamento de Linguística Graduação em Letras
Curso: Elementos de Linguística 1 2022/1 01/09/2022
Professora: Ana Paula Scher Monitores: Beatrice Nascimento Monteiro; César E. Marangoni Jr e Fernando V. Yoshida

(d) Levando em conta as suas análises em (a) e em (b), seus resultados são compatíveis com as
predições da hipótese apresentada? Se sim, em que estágio de aquisição estão as crianças que
produziram as formas da Tabela 1? Comente suas conclusões.

Exercício 2 Figueiredo Silva (2009, p. 60), em sua discussão sobre a natureza dos processos
derivacionais, discute a regra de formação de palavras (RFP) apresentada em (2b), aqui retomada
como (1).

(1) [base]V → [[base]V -vel]A


Além de fazer restrições quanto à categoria da base (explicitada pelo subscrito “V”), a autora propõe
restrições argumentais, isto é, que dizem respeito ao tipo de argumento que os verbos das bases
exigem. Com isso em mente, responda:

(a) Qual é a principal restrição argumental proposta pela autora?


(b) Com base na restrição proposta em (a), a autora argumenta que são impossíveis as formações
*chegável e *corrível. Porém, essas formas são atestadas, como indica o pequeno corpus
apresentado no Quadro 2. Como você poderia explicar esses dados? Confronte a sua
explicação com as restrições enunciadas pela autora e verifique em que medida elas são
compatíveis (ou não).

Quadro 2 Dados de corrível e comível.


(a) (b)

(c) (d)

Fonte: Elaboração própria com dados retirados do Twitter.


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Exercício 3 Estude os exemplos do corpus apresentado no Quadro 3.

Quadro 3 Dados de palavras com o formante cherno


(a) (b) (c)

Fonte: Elaboração própria com dados retirados do Twitter.

Considere as seguintes perguntas.


(a) Retome a discussão de Figueiredo Silva (2009), em §3.2, sobre os diferentes processos de
formação de palavras. Com base nos critérios distintivos da derivação, elencados pela autora,
nos dados do corpus apresentado na Tabela 3, e na sua intuição como falante de português
brasileiro, é possível tratar cherno como um afixo derivacional? Justifique sua resposta.
(b) Considere as discussões acerca do estatuto do morfema enquanto pareamento mínimo de
forma e sentido. É possível tratar cherno como um morfema, no sentido tradicional do termo?
Justifique sua resposta, articulando as discussões trazidas por Figueiredo Silva (2009) e pelos
problemas abordados em aula. (Dica: procure avaliar como a sua resposta se relaciona com a
morfologia da palavra Chernobyl).

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