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Ricardo Reis

Principais influências filosóficas da cultura clássica em Ricardo Reis:

 Epicurismo
 Estoicismo
 Horacianismo
 Neopaganismo

Epicurismo

 Efemeridade da vida e inevitabilidade da morte.


 Privilégio do prazer de cada momento.
 Busca da felicidade relativa e da ausência de perturbação (ataraxia).
 Altivez e indiferença (egoísmo epicurista) – abdicação voluntária.
 Perceção direta da realidade e do ciclo da Natureza.

Estoicismo

 Aceitação das leis do Destino e do Tempo.


 Supressão do desejo, do prazer, da angústia e do lamento.
 O acaso impossibilita a providência.
 Autodisciplina e despojamento de bens materiais e espirituais.

Neopaganismo

 (Re)aparecimento dos antigos deuses na arte ou na literatura, a partir do


século XVIII.
 Renascimento da essência pagã, pela eliminação da racionalidade abstrata e
pela rejeição da metafísica ocidental.
 Cosmovisão hierárquica ascendente – animais, homens, deuses e Fado.
Horacianismo

 Visão estoico-epicurista da existência.


 Perceção aguda da transitoriedade temporal, da brevidade da vida e
inevitabilidade da morte e do Destino.
 Inutilidade do esforço e da indagação sobre o futuro.
 Apelo ao carpe diem, à entrega moderada ao prazer.
 Culto da aurea mediocritas (preferência por uma vivência calma num local
recatado).
 Presença do locus amoenus (lugar aprazível).
 Autodomínio que evita as paixões e aceitação voluntária do destino.

Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.

Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos

Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.

(Enlacemos as mãos).

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida

Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,

Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,

Mais longe que os deuses.

(…)

Três características da filosofia de vida presentes são:

 fruição contemplativa e serena da Natureza;


 fruição moderada dos prazeres fugazes que são concedidos;
 consciência da efemeridade da vida e da importância de usufruir o momento
Presente.
Reflexão existencial: a consciência e a encenação da mortalidade

Homem = Morte

Momento inevitável de niilismo.

A vida é o adiamento da hora fatal.

Brevidade da vida e a consciência da mortalidade.

Fragilidade humana é diferente de grandiosidade/inexorabilidade do tempo

O Homem deve “encenar”, prevendo do instante final.

Aurea Mediocritas - contemplar a natureza

Ataraxia - procura da tranquilidade, afastando-se de tudo o que causa sofrimento

Carpe Diem - Aproveita o momento

Fatalismo

O fingimento artístico: o poeta “clássico”

Contemplação da natureza e desejo de com ela aprender a viver; afastamento social e


rejeição da práxis (proatividade).

Classicismo como máscara poética.

Reflexão existencial: a consciência e encenação da mortalidade

Consciência da efemeridade da vida; da inexorabilidade do Tempo e da inevitabilidade


da Morte.

Tragicidade da vida humana.

A vida como “encenação” da hora fatal (previsão e preparação da morte):


despojamento de bens materiais, negação de sentimentos excessivos e de
copromissos.
Intelectualização de emoções e contentação de impulsos.

Vivência moderada do momento (o presente como único tempo que nos é concedido).

Preocupação obsessiva com a passagem do Tempo e com a inelutável Morte (apesar


do esforço empreendido na construção da máscara poética).

Linguagem, estilo e estrutura

Linguagem culta, erudita e latinizante.

Estilo e forma complexos espelham o conteúdo.

Tom didático e moralista (conselhos expressos no imperativo ou no conjuntivo com


valor exortativo).

Tom coloquial na presença de um interlocutor.

Preferência pela composição poética ode.

Regularidade estrófica, rítmica e métrica (versos predominantemente decassilábicos e


hexassilábicos).

Ausência de rima.

Predomínio de construções sintáticas subordinadas e com influência da sintaxe latina


(alteração da ordem padrão dos constituintes sintáticos).

Privilégio do presente do indicativo e uso frequente da primeira pessoa do plural;


utilização do gerúndio com valor aspetual imperfeito.

Recursos expressivos predominantes: anástrofe, metáfora, aliteração, apóstrofe.


Álvaro de Campos

Traços da sua poesia:

 poeta modernista;
 poeta sensacionista (odes);
 cantor das cidades e do cosmopolitismo (“Ode Triunfal”);
 cantor da vida marítima em todas as suas dimensões (“Ode Marítima”);
 cultor das sensações sem limite;
 poeta do verso torrencial e livre;
 poeta em que o tema do cansaço se torna fulcral;
 poeta da condição humana partilhada entre o nada da realidade e o tudo dos
sonhos (“Tabacaria”) observador do quotidiano da cidade através do seu
desencanto;
 poeta da angústia existencial e da autoironia.

Álvaro de Campos apresenta três fases distintas em sua poesia

Influências:

 1.ª fase - Decadentismo simbolista;


 2.ª fase – Sensacionismo/Futurismo Whitmaniano;
 3.ª fase – Intimista / abúlica.

1.ª fase (Decadentista)

 exprime o tédio, o enfado, o cansaço, a náusea, o abatimento e a necessidade


de novas sensações;
 traduz a falta de um sentido para a vida e a necessidade de fuga à monotonia;
 marcado pelo romantismo e simbolismo (rebuscamento, preciosismo, símbolos
e imagens).

No poema Opiário, o engenheiro Campos, influenciado pelo simbolismo, ainda


metrifica e rima. Escreve quadras, estrofes de quatro versos, de teor autobiográfico e
já se apresenta amargurado e insatisfeito:

“Eu fingi que estudei engenharia.


Vivi na Escócia. Visitei a Irlanda.

Meu coração é uma avozinha que anda

Pedindo esmolas às portas da alegria.”;

Sujeito cansado de uma civilização velha que todos reconhecem;

Cheio de tédio e à procura de sensações novas, extravagantes e mórbidas;

Opiário revela um Campos…

 enjoado da vida;
 destruído interiormente;
 procura evadir-se através do ópio, da morfina;
 cheio de tristeza marginaliza-se e vê que só lhe resta «fumar a vida».

2.ª fase (Futurismo Whitmaniano)

 Nesta fase, Álvaro de Campos celebra o triunfo da máquina, da energia


mecânica e da civilização moderna.
 Sente-se nos poemas uma atração pelas máquinas, símbolo da vida moderna.
 Campos apresenta a beleza dos “maquinismos em fúria” e da força da máquina
por oposição à beleza tradicionalmente concebida.
 Exalta o progresso técnico, essa “nova revelação metálica e dinâmica de
Deus”.
 A par da paixão pela máquina, há a náusea, a neurastenia provocada pela
poluição física e moral da vida moderna.
 A “Ode Triunfal” ou a “Ode Marítima” são bem o exemplo desta intensidade e
totalização das sensações.

Campos envereda pelo futurismo, adotando um estilo febril, entre as máquinas e a


agitação da cidade, do que resultam poemas como Ode Triunfal:

"À dolorosa luz das lâmpadas elétricas da fábrica


Tenho febre e escrevo.

Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,

Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos."

Outros poemas: Ode Marítima, a Saudação a Walt Whitman e “Passagem das


Horas.

Homenageando o grande escritor norte-americano, Campos revela uma das mais


fortes influências sobre o seu estilo.

Idealização poética industrial, dominada pelo dinâmico, pelo forte e não pelo belo,
como Aristóteles.

Viu o contributo da civilização industrial para o bem e para o mal.

Futurismo

• elogio da civilização industrial e da técnica (“Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r


eterno!”, Ode Triunfal); 

• rutura com o subjetivismo da lírica tradicional;

• atitude escandalosa: transgressão da moral estabelecida.

Sensacionismo

• vivência em excesso das sensações (“Sentir tudo de todas as maneiras” –


afastamento de Caeiro);

• “Afinal a melhor maneira de viajar é sentir. / Sentir tudo de todas as maneiras. /


Sentir tudo excessivamente, / …”

• sadismo e masoquismo (“Rasgar-me todo, abrir-me completamente,/ tornar-me


passento/ A todos os perfumes de óleos e calores e carvões...”, Ode Triunfal);  

• cantor lúcido do mundo moderno.

• De Whitman Campos terá recebido influência no estilo e nos temas.


Temas mais frequente

 o amor pela vida;


 a solidariedade entre os homens (do santo à prostituta, do salteador ao
burguês);
 o tumulto das viagens marítimas;
 a energia mecânica;
 o progresso técnico;
 a epopeia do quotidiano;
 o cosmopolitismo civilizado: redimensiona e liberta o Homem.

3.ª fase (Intimista/abúlica)

 Perante a incapacidade das realizações, traz de volta o abatimento, que


provoca “Um supremíssimo cansaço, /íssimo, íssimo, íssimo, /Cansaço…”.
 Campos sente-se vazio, um marginal, um incompreendido. Sofre fechado em si
mesmo, angustiado e cansado. (“Esta velha angústia”; “Apontamento”; “Lisbon
revisited”).
 Revela, como Pessoa, a mesma inadaptação à existência e a mesma
demissão da personalidade íntegra, o ceticismo, a dor de pensar e a nostalgia
da infância.
 Fase caracterizada pelo sono, cansaço, desilusão, revolta, inadaptação,
dispersão, angústia, desânimo e frustração;
 Frustração total: incapacidade de unificar em si pensamento e sentimento; e
mundo exterior e interior.

Fase em que pontifica o poema Tabacaria

Apresenta um poeta amargurado, refletindo de forma pessimista e desiludida sobre a


existência:

"Não sou nada.

Nunca serei nada.

Não posso querer ser nada.


À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo."

Confessa-se discípulo de Alberto Caeiro (como Ricardo Reis)

Mas…

- Reis envereda pelo neoclassicismo ao tentar imitar o mestre,

- Campos revela-se inquieto e frustrado por não conseguir seguir os preceitos de


Caeiro.

No poema que se inicia pelo verso "Mestre, meu mestre querido", o sujeito dialoga
com Caeiro, revelando toda sua angústia:

"Meu mestre, meu coração não aprendeu a tua serenidade.

Meu coração não aprendeu nada.

(...)
A calma que tinhas, deste-ma, e foi-me inquietação."

 Perante a incapacidade das realizações, traz de volta o abatimento, que


provoca “Um supremíssimo cansaço, /íssimo, íssimo, íssimo, /Cansaço…”.
 Campos sente-se vazio, um marginal, um incompreendido. Sofre fechado em si
mesmo, angustiado e cansado. (“Esta velha angústia”; “Apontamento”; “Lisbon
revisited”).
 Revela, como Pessoa, a mesma inadaptação à existência e a mesma
demissão da personalidade íntegra, o ceticismo, a dor de pensar e a nostalgia
da infância.
 Fase caracterizada pelo sono, cansaço, desilusão, revolta, inadaptação,
dispersão, angústia, desânimo e frustração.

Traços estilísticos

 verso livre, em geral, muito longo;


 assonâncias, onomatopeias (por vezes ousadas), aliterações (por vezes
ousadas);
 grafismos expressivos;
 enumerações excessivas, exclamações, interjeições, pontuação emotiva;
 desvios sintáticos;
 estrangeirismos, neologismos;
 construções nominais, infinitivas e gerundivas;
 metáforas ousadas, oximoros, personificações, hipérboles
 estética não aristotélica na fase futurista

O fingimento artístico: o poeta da modernidade

 Deliberada postura provocatória e transgressora da moral, com o propósito de


escandalizar e chocar.
 Futurismo: apologia da civilização contemporânea moderna, industrial e
tecnológica.
 Sensacionismo: exacerbação e simultaneidade das sensações; a sensação
como método cognitivo da realidade.
 Apologia da vertigem sensorial - «sentir tudo de todas as maneiras» -,
congregando em si toda a complexidade sensitiva.
 Concatenação no momento presente de todos os tempos e de todos os génios
do passado.
 Tensão, insatistação e frustração perante a incapacidade de abarcar a
totalidade das sensações.

O imaginário épico: a exaltação do Moderno e o arrebatamento do canto

Matéria épica: a exaltação do Moderno:

 elogio do cosmopolitismo;
 exaltação eufórica da máquina, da força, da velocidade, da agressividade, do
excesso;
 integração de todos os tempos e de todo o progresso num poema;
 emoção violenta e «pujança da sensação», com pendor épico;
 a nova poesia como expressão da civilização moderna.

O arrebatamento do canto:

 o cântico retlete a grandiosidade da materia épica;


 poema extenso, com versos livres e longos;
 estilo estuziante e torrencial;
 ritmo estonteante;
 éxtase discursivo: abundância de recursos expressivos; onomatopeias,
empréstimos, neologismos, interjeições, pontuação expressiva.

Reflexão existencial: sujeito, consciência e tempo; nostalgia da infância

 Consciência dramática da identidade fragmentada.


 Ceticismo perante a realidade e a passagem do tempo.
 Angústia existencial, solidão, abulia, cansaço e morbidez.
 Introspeção e pessimismo - dor de pensar.
 A náusea, a abjeção e o «sono» da vida quotidiana.
 Evasão para o mundo da infância feliz, irremediavelmente perdido.

Linguagem, estilo e estrutura

 Verso livre e, normalmente, longo.


 Irregularidade estrófica, rítmica e métrica.
 Ausência de rima (versos soltos).
 Linguagem simples, objetiva, prosaica, onomatopeias, neologismos,
empréstimos, topónimos e antropónimos.
 Inclusão de vários registos de língua (do literário ao calão).
 Vocabulário concreto (sobretudo do campo lexical da Mecânica e da Indústria).
 Construções sintáticas nominais, gerundivas, infinitivas e, por vezes, presença
de frases atípicas, experimentais.
 Privilégio do presente do indicativo.
 Recursos expressivos predominantes: aliteração, anáfora, apóstrofe,
enumeração, gradação e metátora.
 Nas composições intimistas, o fôlego modernista e épico decai num estilo
abúlico e deprimido.

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