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“A dor faz arte: o sofrimento psíquico e a arte como ferramenta criativa no

processo psicanalítico”

O surgimento do sofrimento psíquico no sujeito atinge a subjetividade do ser,


nesse sentido, o processo psicanalítico pode se utilizar da manifestação da produção
artística, seja ela expressada na poesia, na pintura ou na produção cinematográfica, por
exemplo. Essa sublimação através da arte e a partir do processo criativo utiliza as
pulsões humanas na expressão do sofrimento psíquico, bem como, reproduz as
subjetividades individuais no ato de “expor” a dor e torna-la parte de outra construção.
A arte em si produz uma linguagem própria sem necessidade da verbalização, já
que verbalizar a dor pode ser um empecilho encontrado em alguns casos, dessa forma, a
capacidade de expressão ganha outros tons, de forma que a potência criativa e artística
tem papel de transformar a sensação de falta, perda ou sofrimento acometido em algo
potencialmente novo. É na ausência e na sensação de falta, com as experiências de
frustação que o ser humano - coloca-se aqui tanto a dor no sentido simbólico como real
- a experiência traumática leva a busca pela satisfação originária e expressão da causa
do sofrimento que pode ser utilizada na potência criativa.
A expressão utilizada aqui como potência criativa remete-se as pulsões
colocadas por Freud, pai da psicanalise, assim, a arte pode indicar as pulsões de vida e
de morte, transformadas em símbolos a partir da subjetividade de cada indivíduo. Desta
forma, o ato de criar partindo, seja do desejo ou do sofrimento psíquico causado por
determinado trauma produz a transformação e reinvenção através da fantasia, tratando-
se assim de uma potência a ser utilizada no processo psicanalítico.
É importante destacar também que a produção de subjetividades através da arte
propicia o sentimento de ser e estar no mundo, construindo sentidos para o self e a
sensação de recriação e não mais somente de angústia pela sensação da falta, ou de
desejo pela expressão do sentimento através do processo de verbalização ou processo
não-verbal da arte. A construção seja verbal ou não-verbal é capaz de construir pontes
entre entre o real, simbólico e o imaginário. Assim, a potência criativa e imaginetica
pode auxiliar no processo de psicanalise, cabendo ao analista indagar as pulsões
expressadas e intervir na análise.

Ausência
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
- Carlos Drummond de Andrade

O poema acima de Carlos Drummond de Andrade denota através da linguagem a


ideia da falta e desta falta assimilada e expressada pela potência de colocar as palavras
como forma de expressão de um sentimento outrora sentido pelo autor e assimilado e
um processo criativo da ausência, transformando-a em algo novo: “(...) que rio e danço
e invento exclamações alegres” a recriação subjetiva do sentido de ausência assimilada
é expressado da linguagem. Assim, a arte expressada em suas mais diversas formas,
pode ser utilizada na intenção psicanalítica por parte do analista e analisado.

Conclusão

O caminho traçado e exposto até aqui com o auxílio dos artigos como base da
literatura necessária, denotam as possibilidades do processo psicanalítico. Assim como
destaca Lacan (1955), o inconsciente é estruturado e tramado em um tecido de
linguagem, sendo esta uma forma de expressão do inconsciente e absorção simbólica. A
arte, em sua generalidade é antecessora a psicanalise, no entanto, estas se intercruzam
pela utilização da linguagem e da potência da subjetividade do ser, entendendo o sujeito
como elemento significante capaz de produzir símbolos e expressar a trama psíquica
através da fantasia, da potência da imaginação.

A literatura dos artigos indicados associados a uma práxis por parte do analista
permite calcar um caminho diferente através do despertar da potência imaginativa do
analisado, assim permitindo a expressão do ser, do eu, do indivíduo através do
simbólico expressado na palavra (ou não-palavra) na criação de algo novo. A partir do
processo de adquirir significância a aquela expressão, o sujeito traduz aquilo que o
acomete no real e que pode escapar ao discurso, utilizando-se da arte como expressão
do inconsciente e de sua subjetividade. Neste processo, o analista também necessita da
ação simbólica de exprimir as possibilidades criativas na intervenção ou guia no
processo de psicanalise e de expressão do sofrimento psíquico do analisado.

Desta forma, o sujeito em analise pode permitir-se expressar e transformar o


sofrimento psíquico recriando-o em uma nova forma, seja no sentido de expor suas
pulsões, bem como, de entende-las. É importante destacar que a utilização de
ferramentas como a arte expressam parte da subjetividade humana intensamente
abordada aqui e utilizada na psicanalise, se intercruzando na produção de significados
para o sujeito. Assim, a partir da produção artística, o analisado produz um novo sentido
significante aquele sofrimento que foi acometido a ele, utilizando-se da arte.

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