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AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE LOUSADA

A poesia do ortónimo: temáticas, linguagem e estilo.

Fernando Pessoa conseguiu centrar na sua personalidade e obra


algumas das tendências mais contraditórias do espírito modernista: o
gosto do irracional e a vocação racionalizadora, o espírito de revolta e a
nostalgia da tradição, a fome do absoluto e a fome do relativo.

► Temáticas da poesia ortónima

• O fingimento artístico

O poema é um 'produto intelectual', que não acontece '

no momento da emoção' mas é resultado da


recordação. A emoção tem de 'existir intelectualmente' e só a recordação
o pode fazer. O fingimento poético transforma-se na nova expressão de
arte. A elaboração do poema confunde-se com um 'fingimento' por ser
uma construção mental e não um produto direto da emoção. O poema
Autopsicografia teoriza a arte poética pessoana. Nele é definido o lugar
da inteligência (razão) e do coração (sentimento) na criação artística.
Através da fragmentação do eu (Não sei quantas almas tenho) o poeta
procura a elaboração estética, conciliando a oposição razão/sentimento.
Para Pessoa o ato criativo resulta da harmonização de antíteses
(oposições) entre realidades objetivas e mentais. Por isso, sente
necessidade de intelectualizar o que sente e pensa (fingimento poético).
A realidade é reelaborada através da imaginação criadora
(Autopsicografia, Isto).

• A dor de pensar


AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE LOUSADA

A arte para Pessoa resulta da combinação


entre o sentir e o pensar, a consciência e a inconsciência. Fernando
Pessoa deseja ter a inconsciência das coisas e das pessoas comuns
('Ela canta pobre ceifeira'), mas sente-se condenado a estar lúcido e a ter
de pensar ('Ter a tua alegre inconsciência'). Porém o pensamento e a
imaginação interferem na relação do sujeito poético com o mundo que o
rodeia; assim, tanto aceita a consciência, como sente uma verdadeira dor
de pensar. Por não conseguir conciliar o binómio sentir/pensar põe em
causa a utilidade do pensamento (ex.:'Cansa sentir quando se pensa' e
'Não sei ser triste a valer').

É na interseção das dicotomias sentir/pensar, consciência/inconsciência


que a poesia ortónima responde às inquietações da vida. A dor de
pensar leva à solidão do ser, devido à busca constante da racionalidade,
a querer sentir de forma racional e consequentemente instala-se uma
tragédia íntima que o corrói.
No poema 'Gato que brincas na rua', o sujeito poético expressa bem a
ideia de felicidade de não pensar ('És feliz porque és assim') e a dor que
resulta para ele por não conseguir ser inconsciente e poder brincar sem
pensar em mais nada.
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• A nostalgia da infância

O tempo, na poesia pessoana, é um fator de desagregação, porque tudo


é efémero. Isso leva-o a desejar ser criança de novo. Pessoa sente a
nostalgia da criança que passou ao lado das alegrias e da ternura.
Chora, por isso, uma felicidade passada, para lá da infância.
Há uma nostalgia do bem perdido, do mundo fantástico da infância, único
momento possível de felicidade. Nas palavras do semi-heterónimo
Bernardo Soares: 'O meu passado é tudo quanto não consegui ser'. Para
Fernando Pessoa o passado é um sonho inútil, pois nada se concretizou
antes se traduziu numa desilusão. Daí o constante ceticismo perante a
vida real e de sonho.

Poeta, ficcionista, dramaturgo, filósofo, prosador, Fernando Pessoa


é, inequivocamente, a mais complexa personalidade literária
portuguesa e europeia do século XX.

Na poesia do ortónimo coexistem duas vertentes: a tradicional e a


modernista.
Algumas das suas composições seguem na continuidade do lirismo
tradicional: sensibilidade, suavidade, linguagem simples, ritmo
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melodioso, com marcas do Saudosismo; outras iniciam o processo de


ruptura: experiências modernistas do Simbolismo, do Paulismo e do
Interseccionismo.

► As temáticas:

• a interseção entre o sonho de um tempo em que o poeta diz ter sido


feliz e a realidade (ex.: Chuva Oblíqua);
• a angústia existencial e a nostalgia de um tempo perdido (do Eu, de um
bem perdido, das imagens da infância...);
• a distância entre o idealizado e o realizado — e a consequente
frustração ('Tudo o que faço ou medito');
• a máscara e o fingimento como elaboração mental dos conceitos que
exprimem as emoções ou o que quer comunicar (ex.:Autopsicografía);
• a intelectualização das emoções e dos sentimentos para elaboração da
arte (ex.: 'Eu simplesmente sinto/Com a imaginação/Não uso o coração' -
Isto) ;
• o ocultismo como fonte de explicação da realidade e o hermetismo (ex.:
'Eros' e 'Psique');
• Tentativa de superação da dor através da evocação da infância (idade
de ouro), onde a felicidade ficou perdida e não existia o doloroso sentir
(ex.:Com que ânsia tão raiva/Quero aquele outrora!' - Pobre velha
música);
• tradução dos sentimentos na linguagem do leitor, pois o que se sente é
incomunicável.

► Linguagem e estilo:

• linguagem simples, espontânea, mas sóbria, simbólica e esotérica;


• recorrência frequente a adjetivos, comparações, metáforas e imagens
para traduzir estados de alma, constatações ou reflexões;
• preferência pelo verso curto e pela métrica curta (redondilha);
• aliterações, onomatopeias, musicalidade;
• adjetivação expressiva, pontuação emotiva, frases nominais.

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