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Resenha - A Morte do Autor, de Roland Barthes

Vitor Luiz Silva Barros

A morte do Autor de Roland Barthes é um tratado sobre a


dessacralização da figura do autor na sua concepção moderna,
questionando de quem a voz que f ala n o texto literário, no prime iro p
parágrafo quando afirma que “a escrita é a destruição de toda a voz, de
toda a origem”, isto é , o corpo que escreve, o sujeito físico perde
completamente a sua identidade. Segundo Barthes, a ideia do autor como
parte da análise da obra é um a concepção da sociedade moderna,
prestando conta ao positivismo, ao qual se deve o privilégio da
importância do autor, depois da Idade Média com o enaltecimento da
“pessoa humana”.
Essa concepção é reforçada ao longo do tempo pelos manuais de
literatura, nas biografias de escritores, nas entrevistas das revistas, na
própria consciência dos literatos, ligando a obra ao autor. Na critica
moderna a conexão entre escritor e texto ganha f orça, explicando a obra
pelos gostos, vícios e ideologias, sempre p reocupada em buscar sentido
para o texto ao lado de quem a produziu, como se a ficção no fundo fosse a
voz confessa do autor. Barthes se apoia em autoridades literárias
renomadas, Mallarmé e Valéry, para abalizar seu discurso de que a
importância da matéria literárias (a linguagem) precede, apaga a do
homem que a escreveu. Não que R. Barthes estivesse negando a
existência do autor, homem físico, m as rejeita a ideia de autor como
uma espécie de chave para decifrar o signo linguístico no texto literário.
A linguagem pronuncia e não o autor, com sua história, seus
gostos e suas paixões. Ele ainda diz que, a escrita se vale d e uma
impessoalidade (o que não tem n ada a ver com a objetividade dos
realistas). Ela é quem age, “performa” e não o escritor. Apaga -se o
autor em proveito da escrita. Para isso é que contribuiu o Surrealismo,
afastando o autor -home e abrindo espaço para o sujeito do discurso.
Ao declarar a morte do autor, R. Barthes institui a figura do
Scriptor que nasce com o texto e morre quando este é posto em
circulação, como se ele fosse mais um instrumento para a realização da
escrita, desprovido de história, ideologia, valores, apenas um corpo que
escreve.
O Scriptor moderno não precede ao livro e nem a obra é o seu
predicado, diferente da ideia de autor que parece e star na mesma linha
de tempo que a obra (o antes e o depois); pelo contrário, o escritor escreve o
texto no aqui e agora, trazendo a tona o caráter performativo do verbo,
no qual a enunciação não possui outro conteúdo para além d o que
proferido. A escrita é inscrição e não expressão, uma ideia que põe em
dúvida a sua origem, pois não é precedida do seu autor.
O texto por assim dizer, é um espaço que contém variadas
inscrições , de multiplicidade cultural; o problema da origem está posto
justamente no fato em que a escrita nunca pode d eixar de imitar
sempre um gesto anterior. O texto é também outros textos. Assim, a voz
perde a sua origem, o auto r entra na sua própria morte, a escritura
começa. Diante dessas implicações, o texto não p ode ser decifrado, se se
procede desta maneira significa "dotá-lo de um significado último" .
Segundo Barthes, o texto deve ser deslindado, deve-se escrutinar o
funcionamento do texto e trazer a ele as peças que ele próprio busca
como partes de um jogo dinâmico: se sociológico, psicológico ou político.
A análise de um texto se percorre em vários níveis. É nesse
interdiscurso que se chega aos vários significados que ele pode conter,
pois o texto é um espaço sem fundo e cheio de possibilidades. Mas
quem atribui significado ao texto?
Com a morte do autor, abrem-se espaços na obra que devem ser
preenchidos. Essas lacunas só podem ser solucionadas com o nascimento
de uma entidade, a qual é d ada o direito de esgotar as possibilidades
do texto livremente. Anuncia-se no contexto barthesiano o lugar onde o
texto se escreve: a leitura. Vai-se, portanto, da obra ao texto.
Portanto, é o leitor que dá ao texto suas múltiplas significações, a partir
de diversas escrituras que dialogam, parodiam-se e contestam-se. É para
ele que converge essa multiplicidade de culturas. É o leitor essa nova figura,
cujo nascimento implica na morte do autor, sintomaticamente.

Referência:
BAERTHES, Roland. A Morte do Autor. Texto p ublicado em: O Rumor d
a
Língua. São Paulo: Martins Fontes, 2004

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