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Linguística II
Disciplina: Linguística II
Professora: Patricia dos Reis
Programa
Feriado: 22/02
1 Introdução
1
É necessário fazer aqui a distinção entre língua padrão, a que é regulada pela chamada “norma
padrão”-“[...]uma codificação relativamente abstrata, uma baliza extraída do uso real para servir
Revista Práticas de Linguagem. v. 4, n. 2, jul./dez. 2014
162
3 O Funcionalismo
2
Ver DASCAL, 1978.
Revista Práticas de Linguagem. v. 4, n. 2, jul./dez. 2014
175
3
Ver MARTELOTTA, Mário Eduardo (2003)
Revista Práticas de Linguagem. v. 4, n. 2, jul./dez. 2014
176
4 A Sociolinguística
sabe, se trate de uso legitimado pela língua culta do português do século XV.
Gomes e Souza (2003, p. 76)) atestam a evidência histórica dessa variante:
4
Sobre a denominação língua culta/língua padrão ver nota n. 1, no início deste trabalho.
Revista Práticas de Linguagem. v. 4, n. 2, jul./dez. 2014
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caráter ideológico. Numa sociedade em que o acesso aos bens culturais exige
o domínio de um só dialeto, o da classe dominante, a língua deixa de ser
instrumento de interação e ação sobre a realidade para ser também um
instrumento de exclusão social.
Para preparar os indivíduos para a vida em sociedade, elegeu-se a
escola como instituição oficial. Cabe a ela, no que se refere ao trabalho com a
língua materna, levar o aluno a desenvolver competências e habilidades para
utilizar adequadamente esse patrimônio comum de sua comunidade.
O que se esperaria é que a escola, adotando uma orientação de base
científica, fizesse o trabalho de levar seus alunos a se apropriarem de
competências linguísticas mais refinadas, sem se preocupar em substituir a
que já tivessem adquirido, qual seja a de se expressar no seu dialeto social.
Se se tratasse de alunos advindos de classes sociais favorecidas nas quais o
uso das variedades cultas é comum e com as quais, portanto, estão mais
familiarizados, caberia à escola apenas levá-los a trabalhar no
desenvolvimento dessa competência, ampliando-a no domínio da leitura e da
utilização dos gêneros textuais que circulam na sociedade, numa palavra,
tornando-os indivíduos letrados.
Se, ao contrário, esse dialeto fosse o das classes desfavorecidas
socioeconomicamente, seria necessário, obviamente, que à competência de
uso de sua variedade linguística fosse acrescentada a do domínio das
variedades cultas, para que o acesso aos bens culturais e sociais não lhes
fosse vedado. Juntamente com isso, o mesmo trabalho de promover-lhes o
letramento, tornando esses alunos familiarizados com os gêneros textuais
necessários a seu intercâmbio social nos vários domínios culturais.
Veja-se o que sobre isso orienta a sociolinguista Rosa Virgínia Mattos e
Silva (2004, p. 114-5):
5 Considerações finais
Referências
SILVA, Rosa Virgínia Mattos e. O português são dois: novas fronteiras, velhos
problemas. São Paulo: Parábola, 2004.
Mas isso não é verdade. A importância de Saussure foi delimitar de modo muito
mais claro várias possibilidades diferentes nos estudos da linguagem. Ele
defendeu certas abordagens ao invés de outras. Muitos linguistas adotaram
posições semelhantes às dele, mas, com o tempo, adaptaram tais posições,
modificaram e, eventualmente, até se opuseram. A importância de Saussure é
que, muitas vezes, até teorias muito diferentes das ideias dele precisaram se
posicionar com relação aos conceitos que ele desenvolveu.
ESTRUTURALISMO(S)
(iv) ênfase nos aspectos internos à língua e não na história social e cultural
externa;
GERATIVISMO
Desenvolvida por Noam Chomsky, essa teoria analisa a língua como objeto
mental, como uma competência linguística ou gramática internalizada, que
explica a criatividade do falante: capacidade de produzir e interpretar todas as
frases da sua língua, mesmo as que nunca ouviu falar.
SOCIOLINGUÍSTICA
FUNCIONALISMO
Tem o foco no uso da língua como meio de interação social, descrevendo uma
competência comunicativa. A fala é que criaria a estrutura linguística (se é que
existe estrutura linguística).
Adota uma abordagem pancrônica, assumindo que fatos sincrônicos podem ter
explicações diacrônicas. Busca explicar universais linguísticos como fruto de
propriedades não linguísticas, como universais comunicativos. Foco nas
motivações pragmáticas para a morfossintaxe.
OUTRAS TEORIAS:
(v) análise do discurso (embora possa ser considerada como uma área diferente
da linguística; influência da linguística, da psicanálise e da teoria marxista).
Etc.
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Letras / Português
Lingüística Geral
personalidade
ARISTÓTELES (384–322 a.C.) foi um filósofo grego
nascido em Estagira, um dos maiores pensadores de
todos os tempos e considerado o criador do pensa-
mento lógico. Suas reflexões filosóficas — por um lado
originais e por outro reformuladoras da tradição grega
— acabaram por configurar um modo de pensar que
se estenderia por séculos. Prestou inigualáveis contri-
buições para o pensamento humano, destacando-se:
ética, política, física, metafísica, lógica, psicologia, poesia, retórica, zoologia,
biologia, história natural e outras áreas de conhecimento humano. É consi-
derado por muitos o filósofo que mais influenciou o pensamento ocidental.
Por ter estudado uma variada gama de assuntos, e por ter sido também um
discípulo que em muitos sentidos ultrapassou seu mestre, Platão, é conhe-
cido também como o Filósofo.
Saiba mais
Chuva: Você já leu o livro Mar-
celo, marmelo, martelo, de Ruth
Rocha (Salamandra, 1976)? O
personagem da história, Mar-
celo, fica muito cismado com
esse problema e resolve que vai
chamar as coisas do seu próprio
modo. Assim, leite entorna ‘suco
de vaca’. Mas sua vida começa
a ficar difícil quando ele inven-
ta palavras novas para todas as
coisas e ninguém mais entende
o que ele fala! Você já pensou
Figura A.1. Você já parou para pensar de onde vêm o nome das coisas? como o personagem da histó-
ria? Se você ainda não leu esta
história, vale a pena conhecê-la.
Para refletir:
Por que computador se chama computador?
Por que temos de chamar a água que cai do céu de chuva?
Saiba mais
Atividade Idade Média: Uma excelente re-
ferência para compreender a vi-
são de mundo predominante na
Os latinos esforçaram-se em adaptar o estudo de sua língua (latim) Idade Média é o filme O nome
às regras formuladas pelos teóricos gregos. Cumpre destacar o trabalho da Rosa, adaptação da obra ho-
de Varrão, que fez grande esforço para definir a gramática ao mesmo mônima de Humberto Eco.
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Letras / Português
Lingüística Geral
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Letras / Português
Lingüística Geral
você sabia
Máquina: O homem desde mui-
to tempo sonha com a possibili-
dade de ter o controle do mun-
do através das máquinas. Esse
ideal, na atualidade, é a língua
metálica, dos computadores,
universal e sem ‘falhas’. Os prin-
cípios que regem a linguagem
dos computadores são os mes-
Figura A. 2. O quadro apresenta exemplos de regularidades ocorridas na pas- mos defendidos pelos estudio-
sagem do latim para o português e para o espanhol. sos do século XVII.
Saiba mais
Descendentes: Os termos famí-
lia, parentesco, língua mãe são
utilizados nos estudos lingüísti-
cos do século XIX por influência
das ciências naturais.
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Letras / Português
Lingüística Geral
Saiba mais
Contexto Histórico do Sécu-
lo XIX: iniciou-se em meio às
guerras napoleônica, sofrendo
influência da Revolução France-
sa e Industrial, que espalhavam
antagonismo entre processo
tecnológico e condições sociais.
Figura A.3. Neste quadro, temos as características das duas tendências dos São destaque, ainda, neste perí-
estudos lingüísticos que iniciaram no século XVII e XIX e que permanecem até odo, a Guerra dos Cem Anos e
os estudos atuais. A doutrina Monroe. Na Europa,
a população, neste período, sal-
tou dos 190 milhões para 423
milhões. Com relação à cultura,
merecem destaque os compo-
sitores Giuseppe Verdi, Frédé-
ric Chopin, Bedrich Smetana e
Richard Wagner. Na Literatura,
predominava o Romantismo,
suplantado mais tarde pelo Re-
alismo. Aproximadamente em
1836, o Romantismo afetou a
Literatura Brasileira e nesse pe-
ríodo, pela primeira vez, a lite-
ratura nacional tomou formas
próprias, adquirindo caracterís-
ticas diferentes da literatura eu-
ropéia. O livro Suspiros poéticos
e saudades, de Gonçalves de
Magalhães, publicado em 1836,
é tido como marco fundador do
Romantismo no Brasil.
Glossário
Indu-europeu: língua apontada
pelos estudiosos do século XIX
como a língua de origem das
línguas européias. O indu-euro-
peu não é uma língua da qual
se tenham documentos. Na ver-
dade, o indu-europeu é uma re-
construção teórica, um conceito.
Esta proposta, atualmente, em
função de descobertas arqueo-
lógicas sobre as línguas, não é
mais aceita.
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Letras / Português
Lingüística Geral
Unidade B
Objetivos:
•• conhecer os principais conceitos da lingüística;
Introdução
Nesta unidade, primeiramente serão abordados conceitos básicos
para o entendimento da Lingüística, como a noção de língua e lingua-
gem. Em segundo momento, trataremos das diferentes áreas ou ramos
que constituem a Lingüística. Por fim, discutiremos a relação que a Lin-
güística – ciência da linguagem – estabelece com as demais ciências.
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Letras / Português
Lingüística Geral
O que é língua?
A língua é o objeto central de estudo das ciências lingüísticas, mas
o termo recobre vários conceitos bastante diferentes.
Você deve ter em mente que o conceito de língua é fundamental
para compreendermos a postura teórica adotada pelas diferentes cor-
rentes dos estudos lingüísticos: estrutural, gerativa, enunciativa, prag-
mática, discursiva, etc. Mais tarde trataremos de cada uma dessas cor-
rentes.
É claro que, como há abordagens teóricas distintas, temos concep-
ções de língua diferentes. Nos estudos lingüísticos não podemos dizer
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Letras / Português
Lingüística Geral
O que é Lingüística?
Lingüística é o estudo científico da linguagem. Essa ciência busca
explicar o funcionamento da linguagem e, especificamente, a organiza-
ção das línguas em particular.
Em função do objetivo da análise lingüística proposta, teremos vá-
rias áreas de interesse, que constituem os chamados ramos da Lingü-
ística.
Fonologia
A fonologia também se preocupa com os sons da língua, mas do
ponto de vista de sua função. O objeto de estudo da fonologia é o fone-
ma – som significativo da língua, isto é, aquele som que, ao ser trocado
por outro fonema, gera uma nova palavra.
Podemos exemplificar o fonema através da seguinte forma: na
palavra PATO, se trocarmos o primeiro som por B, vamos gerar outro
vocábulo da língua portuguesa: BATO. Isso ocorre porque temos dois
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Letras / Português
Lingüística Geral
Morfologia
Morfologia é o ramo lingüístico que estuda a estrutura da palavra.
As palavras têm tipicamente uma estrutura interna e, em particular, são
constituídas por unidades menores chamadas morfemas. Por exemplo,
na palavra casinhas existem três morfemas, veja no quadro a seguir:
Sintaxe
A sintaxe é o ramo lingüístico que estuda a estrutura da sentença. É
ela que vai explicar que na língua portuguesa pode-se usar uma cons-
trução de frase do tipo:
Semântica
A semântica é o ramo lingüístico que se preocupa com o significa-
do. É na semântica, por exemplo, que estudamos os vários significados
da palavra ‘manga’, que podem ser utilizados em contextos diferentes:
manga da camisa, manga (fruta) e manga (mangueira de água).
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Letras / Português
Lingüística Geral
Figura B.4. Podemos observar objetos distintos que são denominados pela
mesma palavra
Pragmática
A pragmática é o ramo lingüístico que estuda o uso da linguagem
ou a linguagem em uso. Em outras palavras, podemos dizer que a prag-
mática volta-se para o que se faz com a linguagem, em que circunstân-
cias e com que finalidades.
Nessa abordagem, analisamos que, ao dizer ‘Prometo ir ao cinema
amanhã’, não só transmito uma informação ao meu interlocutor, como
também faço uma promessa.
Psicolingüística
A psicolingüística é o ramo lingüístico que tem como um dos ob-
jetivos analisar o processo de aquisição da linguagem – oralidade e
escrita, língua materna e língua estrangeira. Interessa-se também pelos
processos mentais relacionados com a produção da linguagem, estu-
dando as relações entre essa e o pensamento.
Sociolingüística
A sociolingüística é o ramo da lingüística que estuda a relação entre
linguagem e sociedade. A sociolingüística mostra os problemas da va-
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Letras / Português
Lingüística Geral
Figura B.5. Na fala do Chico Bento, temos vários processos lingüísticos que
caracterizam a chamada variedade caipira (© Maurício de Souza Produções
Ltda.)
Atividade
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Letras / Português
Lingüística Geral
Estruturalismo europeu
O início do estruturalismo europeu é apontado a partir da publi-
cação do Curso de Lingüística Geral, de Ferdinand de Saussure, em
1916.
O termo estruturalismo, no sentido europeu, refere-se à visão de
que existe uma estrutura relacional abstrata que é subjacente e deve
ser distinguida dos enunciados reais, isto é, um sistema que subjaz
ao comportamento real – e dela é o objeto primordial de estudo do
lingüista.
Como afirmação dessa definição, podemos tomar como exemplo Saiba mais
a definição do objeto da Lingüística para Saussure, como vimos ante-
Romam Jakobson:
riormente: para ele, o que interessa à Lingüística é a língua – sistema http:/pt.wikipedia.org/wik/
abstrato que subjaz a toda e qualquer manifestação real, que é a fala. Estruturalismo
Podemos destacar, dentre as mais importantes escolas de lingüís- Neste link, você terá informa-
ções sobre os principais repre-
tica estrutural da Europa surgidas na primeira metade do século XX, a
sentantes do estruralismo euro-
Escola de Praga, cujos principais representantes são os russos Nikolai peu.
Trubetzkoy (1890-1938) e Romam Jakobson (1896-1982 ; e a Escola
de Copenhague, cujo principal nome é Louis Hjelmslev (1899-1965).
Saiba mais
Estruturalismo americano Louis Hjelmslev:
O estruturalismo americano e o estruturalismo europeu têm muitas htmp.ricondelvago.com./
el-signo-linguistico.html-30k
características comuns. Uma das principais características que aproxi-
Neste link, você terá informa-
mam estas duas vertentes do estruturalismo é a necessidade de tratar ções sobre Louis Hjelmslev, im-
cada língua como um sistema mais ou menos coerente e integrado. portante nome do estruturalis-
Assim, os lingüistas americanos e europeus daquele período enfatiza- mo europeu.
vam, em alguns casos, com exagero, a impossibilidade de comparar
estruturas de línguas diferentes.
No estruturalismo americano, o principal nome é o de Franz Boas
(1858-1942), que desenvolveu o seu trabalho sem a preocupação de
construir uma teoria geral da estrutura da linguagem humana. A sua
preocupação foi a prescrição de princípios metodológicos para a análi-
se de línguas particulares, pouco familiares, no caso, línguas indígenas
americanas.
Além de Franz Boas, temos como destaque do estruturalismo ame-
ricano os estudiosos Edward Sapir (1884-1936), Leonard Bloomfield
(1887-1949) e Benjamin Lee Whorf (1897-1941).
Atividade
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Letras / Português
Lingüística Geral
Unidade D
4. As correntes formalistas
Objetivos:
•• conhecer a principal corrente formalista da Lingüística;
Introdução
Nesta unidade trataremos da abordagem formalista – perspectiva
teórica e principais conceitos - dos estudos lingüísticos a partir da obra Saiba mais
de Noam Chomsky . Nessa perspectiva, trataremos da teoria gerati- Noam Chomsky:
va, principal corrente formalista dos estudos lingüísticos, que tem em http://pt.wikipedia.org/wiki/
Chomsky
Chomsky o seu principal nome e um dos principais lingüistas do nosso Neste link, você obterá mais in-
século. Para tratar dos principais conceitos gerativistas, vamos tomar formações sobre a biografia, o
por base o estudo da aquisição da linguagem, no qual temos uma ex- trabalho, a teoria chomskiana, a
plicação para o desenvolvimento da linguagem nesta teoria. atuação política e demais dados
sobre Noam Chomsky.
personalidade
Noam Chomsky é um ativista político com atuação
bastante significativa no combate à política externa
americana. Em função desse papel político, Chomsky
foi um dos principais nomes do Fórum Social Mundial
realizado em Porto Alegre no ano de 2003.
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Lingüística Geral
LEITURA OBRIGATÓRIA:
conteudo relacionado
-- CHOMSKY, Noam. Linguagem e mente. Brasília: UNB, 1998 (p.17-
Século XIX: Lembre-se das ca-
38)
racterísticas do Estruturalismo
-- RAPOSO, E. Teoria da Gramática: a faculdade da linguagem. Lisboa: americano estudadas na unida-
de anterior.
Caminho, 1992. Capítulo 1 (p.25-40)
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Lingüística Geral
O programa gerativista
Chomsky apresenta o programa de investigação da Gramática Ge-
rativa a partir do desenvolvimento de quatro questões:
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Lingüística Geral
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Lingüística Geral
personalidade
Jean Piaget (1896 – 1980) foi o nome mais fluente
no campo da educação durante a segunda metade do
século XX. Foi considerado gênio pela precocidade de
seu talento intelectual e pela originalidade e importân-
cia das suas pesquisas e teorias sobre o conhecimento
humano. Antes de tudo, Piaget foi biólogo e dedicou a
vida a submeter à observação científica rigorosa o pro-
cesso de aquisição de conhecimento pelo ser humano, particularmente a
criança. Aos 27 anos, escreveu o seu primeiro livro de psicologia: A Lingua-
gem e o Pensamento na Criança. Piaget revolucionou as concepções de in-
teligência e de desenvolvimento cognitivo partindo de pesquisas baseadas
na observação e em entrevisrtas que realizou com crianças. Interessou-se
fundamentalmente pelas relações que se estabelecem entre o sujeito que
conhece e o mundo que tenta conhecer. Considerou-se um epistemólogo
genético porque investigou a natureza e a génese do conhecimento nos
seus processos e estádios de desenvolvimento. Do estudo das concepções
infantis de tempo, espaço, causalidade física, movimento e velocidade, Pia-
get criou um campo de investigação que denominou epistemologia ge-
nética, isto é, uma teoria do conhecimento centrada no desenvolvimento
natural da criança. Além da importância do conteúdo propriamente dito da
sua obra, Piaget simbolizou o pensamento da época em que viveu ao per-
sonificar a crise da filosofia e a ruptura de barreiras ente as ciências.
Competência e ‘performance’
Agora abordaremos dois conceitos fundamentais para a teoria gera-
tiva: competência e performance/desempenho. A questão (3) - Como
é que o sistema de conhecimentos adquirido é utilizado pelo falante
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Lingüística Geral
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Lingüística Geral
Tradição empirista
Para a tradição empirista, o desenvolvimento lingüístico é deter-
minado por causas externas à mente humana, pelas experiências e
interações da criança com o meio ambiente. Lembre-se que meio am-
biente, nesta abordagem, quer dizer a fala das pessoas que convivem
com a criança, isto é, as interações lingüísticas a que a criança está
submetida.
Nessa abordagem, a linguagem é uma questão de aprendizagem
(aquisição pela mente) através de práticas adequadas de um sistema
exterior.
O principal representante desta tradição é o psicólogo americano
B. F. Skinner. Para ele, a aquisição de uma língua consiste numa apren-
dizagem de hábitos de comportamento verbal através de processos de
observação, memorização, generalização indutiva (geral para o particu-
lar), e associação.
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Lingüística Geral
sentido predeterminado.
As referidas estruturas mentais são exclusivas da espécie humana
e são geneticamente determinadas, isto é, têm a ver com organização
biológica da espécie.
Nesta perspectiva, adquirir uma língua é mais uma questão de ma-
turação e desenvolvimento de um órgão mental biológico do que uma
questão de aprendizagem. Chomsky chama de mecanismo de aquisi-
ção da linguagem (LAD - Language Acquisition Device) este conjunto
de princípios e estruturas, especificamente lingüísticos. No gerativismo,
o mecanismo de aquisição da linguagem recebe o nome de Gramática
Universal (GU).
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Letras / Português
Lingüística Geral
O problema da projeção
Saiba mais
Qual a relação entre os dados primários a que a criança tem acesso
Direção: Chomsky dá como
durante a fase de aquisição da linguagem, provenientes do meio am-
exemplo o crescimento de uma
biente lingüístico, e o sistema de conhecimentos final que caracteriza flor, um processo sem dúvida
a competência lingüística do falante? Esta relação é abordada pelos geneticamente determinado. O
racionalistas/gerativistas como o problema da projeção, isto é, há uma desenvolvimento final da flor
depende dos cuidados com
projeção quantitativa e qualitativa dos dados primários (finitos) sobre
que é tratada, entretanto estes
o conjunto infinito de expressões da língua. cuidados não podem mudar o
Dessa forma, o sistema da competência final (gramática do adulto) curso específico do crescimento
é qualitativa e quantitativamente muito mais complexo do que o sis- ou o resultado final em relação
às características da espécie.
tema simples necessário para caracterizar os dados primários a partir
Por exemplo, se plantarmos a
dos quais o sistema final é adquirido. Nesse processo, é o mecanismo semente de uma rosa, não ob-
mental inato – o dispositivo de aquisição da linguagem (LAD) - que teremos um cravo.
medeia entre os dados primários e a gramática final.
Portanto, a gramática final (competência) é o resultado da inte-
ração entre os dados primários e o mecanismo mental de aquisição
(LAD). Para os gerativistas, os estímulos primários são caracterizados
como pobres, enquanto que os conhecimentos finais são considerados
um sistema rico e complexo.
Já para a tradição empirista, a relação entre os dados primários e a
competência final do falante é relativamente direta, e não existem dife-
renças notáveis de natureza qualitativa entre os dois. Para desenvolver
a gramática final são necessários princípios mentais indutivos simples
como analogias e generalizações.
Além disso, para os empiristas, aquisição da linguagem é uma
questão de treino, imitação e memorização (da criança) e de correção,
aprovação/reprovação (pais/adultos).
Para Chomsky (1998), esse modelo empirista/racionalista é irre-
alista, uma vez que ignora (ou nega) o abismo não só quantitativo,
mas essencialmente qualitativo que existe entre os dados lingüísticos
primários e o sistema de conhecimentos final do adulto: sua gramática
internalizada.
Segundo Chomsky, o indivíduo possui uma série de conhecimen-
tos sobre a língua que não provém da aplicação de mecanismos indu-
tivos e muito menos por imitação ou memorização.
Em função disso, um questionamento basilar às investigações ge-
rativistas é o chamado Dilema de Platão: como é que um adulto pos-
sui um sistema de conhecimentos especifico tão complexo e tão rico
sobre a sua língua mesmo tendo iniciais tão pobres durante a fase de
aquisição?
A partir do chamado ‘argumento da pobreza de estímulo’, os ge-
rativistas defendem que, se os dados primários são insuficientes, logo
a mente da criança põe a sua disposição um conjunto de princípios
lingüísticos complexos - LAD - que guia de um modo predeterminado
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Lingüística Geral
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Lingüística Geral
Atividade
Bibliografia básica:
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Bibliografia complementar:
49
3 FUNCIONALISMO
L I N G U ÍS T I C O
71
até as relações de valência verbal. A clava de Anderson é impiedosa: fora
com toda teoria do comportamento humano, da linguística à sociologia,
esqueça a taxonomia, a ontologia e a psicologia.
Na continuação do texto, ele vai defender que a descrição pura e sim-
ples, mas baseada em dados gigantescos (medida e rastreada com fide-
lidade sem precedentes – no seu dizer), é o substituto apropriado para
questões como “por que as pessoas fazem o que fazem”. A retórica em
torno da defesa da importância dos dados não deve diminuir a inquietude
do espírito humano – é possível que qualquer um de nós, inclusive o leitor
deste texto, já se tenha irritado com respostas do tipo “é assim porque é”!
Saber o porquê de as coisas serem como são continua em voga!
A referência ao texto da Wired se coloca neste capítulo para contraba-
lancear o papel que as abordagens linguísticas podem ter na relação com
a capacidade de processamento eletrônico de dados massivos. No cenário
atual, por exemplo, o conhecido potencial dos aplicativos de tradução no
sequenciamento sintático-semântico “com fidelidade sem precedentes”
pode esbarrar na incapacidade de significar em contextos específicos (reme-
temos o leitor ao princípio formalista da clareza máxima, da generalidade
máxima), fazendo repercutir sua importância para uma vida objetiva, mas
sem nada poder fazer pela subjetividade da pessoa.
Qual o real papel dos dados na ciência? Seguramente, os dados não
são uma prova positivista a comprovar ou a refutar uma hipótese – essa
ciência já não existe e/ou dela o que muito se aproveita é traduzido nas
conspirações que recuperam uma noção de terra plana (com minúsculas
mesmo!) e de teocentrismo.
O fato é que todas essas divergências e convergências, que todas essas
representações e incursões, que todas as interações e até mesmo o algoritmo
empregado no processamento ou na construção de uma interface virtual
somente se configura por meio da língua/linguagem. Sem ela, os dados e
suas descrições subsequentes não seriam possíveis porque não existiriam
no sentido mais ontológico e/ou não esboçariam necessidade pragmática.
Funcionalismo Linguístico 72
Ora, se a linguagem é “um dos ‘meios’ mediante o qual pensamentos,
ideias e sentimentos são representados numa cultura” (HALL, 2016, p. 18),
as nossas representações no plano da realização de escolhas lexicograma-
ticais e semântico-discursivas (materializadas em textos) deixam rastros
dos contextos mais amplos e mais restritos, das ideologias, da natureza das
relações e dos movimentos desenvolvidos nos trajetos de interação entre
os sujeitos que constroem a realidade por meio da língua/linguagem, não
apenas como possibilidade do sistema (passível de descrição pormenori-
zada por meio de inteligência artificial), mas como necessidade humana
ancestral e presente.
Este capítulo1, portanto, é uma tentativa de dar algum sentido à discus-
são a respeito de perspectivas linguísticas baseadas em dados, com atenção
às causalidades e às correlações, entendendo que as descrições favorecem
cada vez mais a compreensão/reflexão acerca das razões de certos usos
constituírem o que constituem e de como essa apreensão pode favorecer
práticas sociais de significação e de dar sentidos a essas mesmas práticas.
As situações de uso da língua configuram per se o objeto principal de
qualquer análise funcionalista. Para nós que assistimos ao perigeu do
empreendimento gerativo (cujo expoente principal foi Noam Chomsky),
a possibilidade de compreensão dos diversos fenômenos da linguagem
pela perspectiva do funcionalismo linguístico se revela como oportunidade
necessária para a proposição de pesquisas ocupadas do uso, da mudança e
da variação, entendendo tais mecanismos como constitutivos das línguas
naturais e da cultura em que se inscrevem e constroem.
Funcionalismo Linguístico 73
Como entendemos o funcionalismo em linguística como abordagem
ou perspectiva – e não como um paradigma encapsulado –, vamos aten-
tar de modo mais específico para os conceitos propostos pela Linguística
Sistêmico-Funcional (LSF).
A estrutura de coerência do capítulo se apresenta sob a sequência que
apresenta a origem do modelo, passando pelos princípios teóricos mais
gerais, a fim de indicar a trajetória metodológica que (re)cria esses mesmos
princípios epistemológicos, já que a teoria aqui é entendida como uma
elaboração permanentemente afetada e moldada pelo uso linguístico. Logo
em seguida, apresentamos um exemplo de interpretação/análise construí-
da a partir da perspectiva do funcionalismo linguístico e retomamos as
concepções mais salientes nas considerações finais.
Funcionalismo Linguístico 74
da interação. Mas a visão funcionalista ganha destaque na tradição antro-
pológica americana, a partir dos trabalhos de Sapir e Whorf. É também
nos Estados Unidos que muitas escolas de corrente funcional vão surgir,
tendo como referência Givón, Thompson, Chafe, Hopper – na Califórnia;
Lakoff e Langacker – em Berkeley.
No Brasil (e, de modo mais pontual, na Região Nordeste), os pes-
quisadores das universidades públicas concentraram atenção ao modelo
norte-americano, tendo Furtado da Cunha e Souza (2011, p. 22) apontado
como o paradigma funcionalista compreende a noção de gramática na
realização das línguas:
Funcionalismo Linguístico 75
Design Visual (KRESS; VAN LEEUWEN, 1996), Teoria da Avaliatividade
(MARTIN; WHITE, 2005), entre outras.
Funcionalismo Linguístico 76
metafuncional e estratificada, em que os sentidos interpessoais,
ideacionais e textuais ocorrem simultaneamente para a construção
dos significados no texto e em que, ao mesmo tempo, as escolhas
em um estrato projetam construções no estrato seguinte. As esco-
lhas no estrato grafofonológico são a realização das escolhas do
estrato léxico-gramatical. Estas, por seu turno, estão realizando
escolhas no estrato semântico-discursivo, sendo que tais escolhas
ocorrem em contextos de cultura e de situações distintos. (VIAN
JUNIOR; MENDES, 2015, p. 164).
Figura 1 – Estratificação
Funcionalismo Linguístico 77
A linguagem, na orientação epistemológica da LSF, é uma realidade da
cultura, da vida social de seus agentes, de suas relações consigo mesmos
e, também, da necessidade inseparável da relação com o ambiente físico.
Nesse caso, como bem lembra Halliday (1973), a linguagem é também um
meio central de promoção da cultura nas relações cotidianas, nos mais
diferentes espaços, tanto como condição de representação da experiência
no mundo físico, social e psíquico, quanto como condição de estabelecer
identidades e afinidades grupais, de modo a se construir e transmitir uma
visão específica de mundo, uma cultura, portanto.
Por esse turno, pensar os contextos (desde o mais geral e o imediato da
situação comunicativa até o background mais amplo da cultura), significa
levar em conta que um modelo teórico de estudo da língua baseado nos
usos não pode abstrair os sentidos que são próprios das relações sociais
e das diversas maneiras como essas relações configuram os discursos e
seus efeitos (ideologias) e por eles são também transformadas. É a partir
da tradição dos estudos de Bronisław Kasper Malinowski que Halliday
propõe a configuração de uma realidade linguística que potencializa as
funções da linguagem (os usos, por assim dizer) e que realiza necessidades
humanas: (i) acima dos sistemas funcionais, estariam os contextos de cul-
tura e de situação; (ii) abaixo e partir dos sistemas, estariam as funções de
expressar a experiência, no desempenho de papeis sociais, estabelecendo
relações de significados nos próprios enunciados.
A fim de ilustrar essa discussão, apresentamos o Quadro 1:
Funcionalismo Linguístico 78
Quadro 1 – Contextos e sua relação com as metafunções e sistemas
Nível acima do
Nível do Sistema
sistema
Cultura Situação Metafunção Sistema Atividade
da linguagem lexicogramatical
Campo Ideacional Transitividade Representar a experiência
Funcionalismo Linguístico 79
No nível extralinguístico, as concepções de ideologia e de contexto de
cultura são importantes porque, para uma descrição mais adequada da
língua, necessário se faz agregar algo que esteja além da situação imediata
de interação e da própria instanciação textual, tendo em conta que, no
momento de enunciar qualquer mensagem, os sujeitos também carecem
de conhecimento sociocultural mais amplo que lhes permita interpretar
e dar sentido tanto ao que é verbalizado quanto ao que acontece durante
a situação interativa. Nas situações reais de uso da língua, os contextos
precedem os textos e, desse processo de instanciação, constitui-se também
o sujeito que, por sua sucessão e reciprocamente, cria os contextos em que
a linguagem significa. O discurso, por essa circularidade ininterrupta, pode
ser considerado como um potencial da cultura, da ideologia.
Funcionalismo Linguístico 80
como a pesquisa pode se configurar em LSF. Por esse viés, o paradigma
sistêmico-funcional é também uma proposição de natureza metodológica
por possibilitar a compreensão de certos fenômenos da linguagem, sem
excluir sua conexão com os demais estratos. A título de ilustração, se o
pesquisador estiver analisando um fenômeno que se apresenta no estrato
da fonologia (e até mesmo da fonética), a melhor forma de compreendê-lo
ou de interpretá-lo será pela recorrência ao estrato lexicogramatical (mais
próximo), passando pelo estrato semântico-discursivo, até chegar aos
contextos que o motiva.
A interconexidade de todos os elementos que participam das condi-
ções de construção de sentidos é um fenômeno a que deve estar atento o
pesquisador, sobretudo porque a interpretação deste ou daquele texto vai
depender e muito do modo como a observação dessas relações é criada/
mantida/recuperada ao longo dos episódios comunicativos, com vistas a
seus propósitos particulares.
Mais recentemente, temos chamado esse cuidado epistêmico de pers-
pectiva sistêmico-complexa, como anota Vian Junior (2018, p. 356-357):
Funcionalismo Linguístico 81
a interconexidade que existe nas redes, cuja compreensão deve se pautar na
não linearidade e na dinamicidade dos fenômenos (CAPRA; LUISI, 2014).
Logo, entendemos que pensamento sistêmico-complexo e interco-
nexidade se realizam nas totalidades integradas em redes e em padrões
perceptíveis nos diferentes contextos. Ilustramos a abordagem sistêmi-
co-complexa com o exemplo de interpretação tratado na próxima seção,
em que a totalidade é tomada para se chegar às conclusões, a partir do
sistema-de-interesse2 analisado.
Como defendido em Mendes (2016, 2018), reforçamos que a perspectiva
sistêmico-complexa não se ajusta às ideias de sucessão e hierarquização,
posto que o todo não pode ser reduzido ao conjunto sintético resultante
da soma de elementos e com a propriedade de ser um desenho mais fa-
cilmente apreensível da realidade, justamente pelo fato de os elementos
que se configuram no sistema, mesmo que organizados e dispostos dife-
renciadamente; mesmo que, pelas necessidades e condições de pesquisa,
possam ser tomados num recorte textual “pinçado” para amostra, não são
e não devem ser explicados fora desse sistema.
A metodologia da abordagem da pesquisa, a partir do pensamento
sistêmico-complexo, é representada na Figura 2, composta a partir de
círculos cotangenciais bastante recorrentes nas ilustrações da LSF:
Funcionalismo Linguístico 82
Figura 2 – Perspectiva sistêmico-complexa da pesquisa em linguagem
Funcionalismo Linguístico 83
texto representa a realidade, construções identitárias e/ou demais relações
de poder (VIAN JUNIOR, 2014, p. 441).
Esses movimentos, aqui defendidos, como possibilidade e não como tra-
jetória de obrigação, também foram reanalisados em Mendes (2018), numa
espécie de modelo sinótico da proposta da Figura 2 (apresentada antes):
Funcionalismo Linguístico 84
o leitor possa compreender os movimentos pragmáticos relacionados ao
pensamento sistêmico-complexo a partir da abordagem da LSF.
Funcionalismo Linguístico 85
A partir deste ponto, apresentamos mais detalhadamente a interpre-
tação dessas circunstâncias. Nos exemplos dispostos a seguir, é possível
analisar o comportamento das circunstâncias de extensão nos proces-
sos materiais. Para favorecer a identificação dos papéis do Sistema de
Transitividade, as circunstâncias de extensão destacam-se em negrito, e
os processos, sublinhados:
(01) Mergulhei no caso, e senti uma imediata antipatia pelo policial portu-
guês Gonçalo Amaral, que chefiou as investigações durante cinco meses
e depois foi afastado (B1L224-225).
(02) Jornalista formada pela Universidade de Brasília, Juliana Poletti
sempre dividiu sua atenção entre reportagens sérias, de temas políticos e
questões internacionais, e a música de qualidade. Estudou piano por três
anos. (B2L670-672).
(03) Como vocês se lembram, espalhou-se na semana passada pelo mun-
do um sentimento de perplexidade raivosa depois que foi publicado um
documento de 2.600 páginas que descrevia violências “endêmicas” em
crianças submetidas à guarda da Igreja Católica na Irlanda entre 1930 e
1990 (B1L331-335).
Funcionalismo Linguístico 86
A esses processos se associam as circunstâncias de extensão temporal.
No exemplo de [01], o participante ator “Gonçalo Amaral”, retomado
pelo relativo “que”, conduz investigações numa determinada extensão
temporal que é claramente expressa: “durante cinco meses”. O autor da
postagem, ao demonstrar explicitamente seu descontentamento com o
policial (que tratou, no início das investigações, do desaparecimento da
criança Madeleine, na noite de 3 de maio de 2007), tenta, ao logo do texto,
desqualificar o trabalho empreendido pelo investigador e se vale da cir-
cunstância de extensão temporal possivelmente para sugerir morosidade,
lentidão nas investigações. O emprego desse tipo de circunstância em
[01], mais do que explicitar uma relação de duração temporal, sugere a
necessidade de endossar a opinião (Amaral é um tipo truculento, tem ares
de dono da verdade, fala muito, um fanfarrão–mas não resolveu nada no caso de
Madeleine. – B1L226-228) num dado que tem relevo: a atuação nas inves-
tigações durante cinco meses.
Fenômeno semelhante ocorre em [02]. Para atribuir ao enunciado o fato
de que a jornalista Juliana Poletti tem conhecimento musical um caráter
persuasivo, o autor da postagem se vale do período de tempo em que a
profissional se dedicou ao estudo do piano (três anos). Atentemos, assim,
que o uso da circunstância reforça a ideia por ele defendida no enunciado
anterior, contribuindo para o entendimento de que esse papel do Sistema
de Transitividade tem função importante na construção da opinião.
Já as circunstâncias presentes em [03] estão associadas a um processo
material que denota não uma experiência perceptível no mundo, mas que
pode ser entendida em um plano mais abstrato. O blogueiro faz uso de uma
circunstância de localização temporal, seguida de duas de extensão: uma
espacial e outra temporal. “Pelo mundo” engrandece, num movimento
hiperbólico, o “sentimento de perplexidade raivosa” que o autor demonstra
pelo comportamento da Igreja Católica na Irlanda. Quando se empregou
a circunstância “pelo mundo”, o autor possivelmente pretendia sugerir/
estabelecer o repúdio que todo o mundo deve sentir pelo comportamento
Funcionalismo Linguístico 87
violento da Igreja, no período de 60 anos (expresso pela circunstância entre
1930 e 1960), posto não haver garantia de que o documento de 2.600 páginas
(ou mesmo a notícia sobre ele) tenha chegado ao conhecimento das pes-
soas em todos os lugares do mundo. Logo, ao apresentar as circunstâncias
antepostas ao participante meta “um sentimento de perplexidade raivosa”,
o blogueiro pretendia chamar a atenção do leitor (alcance do problema)
para o assunto apresentado.
Ainda sobre a mesma temática, o exemplo [04] apresenta uma cir-
cunstância de duração temporal que expressa bem o papel das escolhas
no plano da LSF:
Veja aqui um vídeo em que uma mulher relata a (má) expêriencia que
viveu, durante a infância e a adolescência, num abrigo da Igreja.
Soube-se também que o Papa será inteirado dos fatos. (B1 L372-376).
O processo viver está sequenciado por dois tipos de circunstâncias: a
primeira, em negrito, de extensão tempo; a segunda, sem grifos, de loca-
lização espacial. Nesse caso, o uso da circunstância “durante a infância e
a adolescência” apoia o argumento da maldade que envolve a exploração
sexual em fases específicas da vida do agente experienciador de tal abuso.
Ao invés de dizer “durante quinze ou dezesseis anos”, o blogueiro sugere
que a exploração sexual não teve como agravante apenas o fator tempo e
sua duração, mas, principalmente, as etapas de vida da pessoa envolvida,
para sugerir que o crime é ainda mais cruel por ter sido praticado em
crianças ou adolescentes.
Vejamos que a escolha da circunstância, nesse exemplo específico, não
foi de modo algum aleatório, posto que, no desenvolvimento argumenta-
tivo, ela melhor se ajustaria à proposta de enunciar a violência legal, com
características de crime de pedofilia, em que figura como autora a Igreja
Católica na Irlanda. Isso fica mais sensivelmente percebido quando o autor
Funcionalismo Linguístico 88
“ordena” que se assista a um filme sobre essa situação: “Veja aqui um vídeo
[...]”. O vídeo, que poderia ser executado por meio de link disposto no blog,
é como que a prova completa para aquilo que denuncia. A mulher que
“relata a (má) expêriencia [sic.] que viveu” naturalmente vai aludir ao tempo
que passou (infância/adolescência) num abrigo da Igreja, corroborando
para a verdade pretendida pelo autor da postagem.
Ora, se fizesse uso de outras escolhas de circunstâncias para repre-
sentar temporalmente a duração do evento, como se pode ver em (01) e
(02), por exemplo, o autor poderia não lograr êxito na ofensiva contra a
Igreja, a quem são atribuídas as responsabilidades pelos crimes de pedo-
filia e, não somente, pelos atos de exploração sexual menos invasiva em
determinado período.
As circunstâncias de duração temporal menos precisas, ou a referência
a um período convencionalmente sabido pelo leitor, têm valores diferença-
dos dentro do texto do blog. Em (04), é possível compreender a intenção de
melhor representar o tempo de ocorrência do fato/evento, aludindo a certo
período da vida dos sujeitos envolvidos. Em outros casos, circunstâncias
que podem exprimir certa imprecisão temporal apresentam finalidades
diferentes, como se pode ver em (05):
(05) Peter Singer desde muito tempo sonha com um mundo menos errado,
em que não morram 27 000 crianças por dia.
Funcionalismo Linguístico 89
sonha com um mundo melhor, porque, pela mesma lei, não é possível
determinar desde quando o mundo está “errado”.
É preciso que se diga também que a não exatidão circunstancial pode
ter relação direta com o tipo de processo. Como se trata de um processo
mental, cuja representação é frequentemente relacionada a crenças, valores,
desejos e expressam as experiências do “sentir”, a pouca precisão do tempo
talvez sirva ao propósito de não demarcar as fronteiras do início/fim. Se, em
lugar do processo mental, houvesse sido empregado um processo material
(trabalhar, construir etc.), eventualmente poderia ter havido a predileção
por uma circunstância que pudesse expressar duração de tempo com mais
justeza, dado que a ação estaria acontecendo no plano concreto, perceptível.
Essa possibilidade é reforçada por esta outra ocorrência de circuns-
tância de duração temporal em processos mentais:
(06) Já não sei há quantos anos Alencar enfrenta o cancer. Perdi a conta de
quantas cirurgias já fez. A impressão é que um tumor desaparece apenas
para dar lugar a outro. (B2 L777-779).
Funcionalismo Linguístico 90
por sua vez, que o lapso de tempo é “pretexto” para valorizar a forma como
se comporta o vice-presidente diante de seu problema de saúde.
Ainda no mesmo blog, é possível identificar o uso de circunstâncias
que se valem de imprecisão temporal para reforçar determinada tese do
autor. Diferentemente do que ocorre em [06], nos exemplos que seguem,
o blogueiro expressa uma representação de extensão temporal imprecisa
menor para enaltecer, valorizar (ou falsear um desconhecimento com o
propósito de elevar a outrem) e, mais, para afluir com os argumentos que
propõe na defesa de sua opinião.
Na primeira ocorrência, o autor está se posicionando acerca das
cotas nas universidades pública; na segunda, lamenta o fim do jornal
Gazeta Mercantil:
(07) Acho que um país como o Brasil não tem o direito de excluir de suas
melhores universidades, durante várias gerações, aqueles estudantes que,
em exames tecnicamente isentos — sem privilégio de origem, raça ou
gênero — podem demonstrar que tem maior preparo e competência para
frequentar seus cursos. (B2 L812-816).
(08) Precisam de história para encontrar seu lugar, crescer e mostrar o que
tem a dizer para homens e mulheres de seu tempo e, por fim, tornar-se
parte da cultura de um país. Fundada em 1920, a Gazeta fez isso durante
décadas. (B2 L857-859)
Funcionalismo Linguístico 91
se vale do argumento daqueles que são a favor das cotas, de que há uma
dívida de gerações em desfavor das classes mais marginalizadas histori-
camente pela sociedade: os negros/os pobres.
Quando o autor menciona não ser justa a exclusão, nas melhores uni-
versidades, de estudantes preparados, em exames isentos, a circunstância
“durante várias gerações” apresenta duas proposições principais: a pri-
meira é de que o sistema de cotas pode estar privilegiando um grupo em
detrimento de outro – como pode ter ocorrido com a discriminação racial;
segundo, que o sistema de cotas pode perdurar por algumas gerações. Em
outras palavras, o emprego da circunstância estabelece uma hipótese na
defesa da tese do blogueiro, para quem o sistema de cotas não contribui
para a diminuição da exclusão, mas apenas para mantê-la por outro viés.
Antes de passar à análise da ocorrência [08], já anunciada, cabe aqui,
por semelhante valor, a interpretação de outra ocorrência em que figura a
circunstância “por cinco gerações”, no blog 4 – Guilherme Fiuza:
Funcionalismo Linguístico 92
Em comum, as ocorrências (07) e (09) têm a intrínseca correspondência
entre a convenção temporal (por gerações) e o fato a que estão associadas
(dívida social/sucessão no poder). O emprego, portanto, desse tipo de
circunstância sugere que a intenção do autor (persuadir, ironizar, expor)
pode ter no tempo e nas suas convenções (gerações, décadas etc.) uma base
capaz de apoiar a discussão a favor de seu ponto de vista ou de sua opinião.
Depois desse aditamento, em (08) o autor do blog 2 lamenta o fecha-
mento da Gazeta Mercantil, entre os meses de maio de junho de 2009.
“Durante décadas” é a circunstância de que se vale o autor para confirmar
sua apreciação pelo trabalho do jornal em questão. Nesse caso, seria possí-
vel determinar, se fosse esse o caso, o número de anos de atuação da Gazeta
Mercantil, já que o blogueiro situa o leitor quanto à data de fundação do
jornal (1920). Porém, quando preferiu empregar a circunstância em des-
taque, é possível que o escrevente tenha pretendido não se comprometer
acerca da integralidade do tempo para o qual faz suas deferências. Ou seja,
afirmar que a Gazeta Mercantil teve papel relevante no dizer da cultura
de homens e mulheres, “durante décadas”, é, possivelmente, diferente de
dizer que esse jornal teve papel relevante durante 89 anos, ou durante oito
décadas. Ou, contrariando tudo que foi dito até aqui, ao enunciar “durante
décadas”, depois de ter enunciado o ano de fundação do jornal, o blogueiro
já esperava a precisão temporal por parte do leitor e, sendo assim, pouca
relevância poderia ter a configuração morfológica da circunstância.
Porém, do ponto de vista das escolhas (nos planos léxico-gramatical
e semântico), o emprego de “durante décadas” reforça o caráter sério e
competente que o blogueiro atribui ao jornal, durante seus anos de ativi-
dade – razão esta que conduz autor da postagem a lastimar pelo fecha-
mento da Gazeta.
No Blog do Nelito (B3), há exemplo semelhante: neste, todavia,
não há marco temporal inicial que permita estabelecer com precisão a
duração de tempo:
Funcionalismo Linguístico 93
(10) Durante anos, Lula foi a cara do PT. E o PT foi a cara de Lula. Quem
tentou internamente desafiar o barbudo teve que colocar as barbas de
molho. (B3 L1204-1205).
Funcionalismo Linguístico 94
voltaram, já caíram e ressurgiram.). Quando o autor afirma estar envolvido
com esse assunto há mais de seis anos, é possível que esteja pretendendo
sugerir que o tema é ainda muito polêmico e, portanto, carente da opinião
a que se propõe no blog (Aqui é o espaço onde eu teoricamente devo ter uma
opinião). Ora, se num curto espaço de tempo, já ocorrem diversas mudanças
em relação ao entendimento do sistema de cotas, isso pode significar que
o assunto não é caso fechado. O uso da circunstância em questão implica,
portanto, que sua opinião, seus posicionamentos ainda não se esgotaram
([...] já devo ter feito umas 15 matérias sobre isso).
Pelo que foi disposto até aqui, é possível compreender que as circuns-
tâncias de extensão temporal no blog são mais recorrentes que as espaciais.
Isso pode decorrer do fato de que, para conferir certo caráter de verdade a
esta ou àquela opinião, o período de tempo em que se configurou determi-
nada ação é mais relevante que o espaço. Ou ainda, a forma de identificar
esse local físico, em que tais ações ocorrem, pode estar expressa pelas
circunstâncias de localização, bem mais frequentes no corpus, e objeto da
próxima seção. Mencionamos, ainda, que as circunstâncias de extensão
desempenham papel importante na composição argumentativa/persuasiva
dos textos do blog, na medida em que reforçam ideias, confirmam aprecia-
ção, aduzem raciocínios, valorizam características/qualidades de entidades,
pessoas ou temas a que se proponha discutir ou opinar.
Neste capítulo, tivemos por finalidade principal trazer até o leitor as con-
cepções que traduzem o paradigma do funcionalismo linguístico, com
enfoque específico na abordagem da LSF, indicando a possibilidade de
seu emprego como construção teórico-metodológica capaz de explicitar
as razões/motivações dos usos e mudanças pelas quais passam as línguas
naturais, entendendo que os dados desses usos configuram a materialidade
por meio da qual se pode partir para a descrição.
Funcionalismo Linguístico 95
Em qualquer de duas formas, o funcionalismo linguístico está estrei-
tamente vinculado ao uso, sendo esse conceito caro ao empreendimento
de pesquisar a especificidade da língua nas suas mais variadas realiza-
ções na cultura. A concepção de função (tal como para Bronisław Kasper
Malinowski em Argonautas do Pacífico Ocidental) figura como mecanismo
que permite dar sentido, com base em dados aparentemente caóticos, aos
diversos sistemas que configuram e criam a linguagem e, por conseguinte,
ao mundo por ela elaborado.
As concepções centrais foram apresentadas, tomando por base uma
pesquisa realizada com orientação no modelo funcionalista, cujo interes-
se foi ampliar o entendimento acerca das circunstâncias do Sistema de
Transitividade, a fim de compreender os mecanismos mobilizados para a
construção dos significados opinativos em blogs.
Por fim, o capítulo, assim como toda a obra, é mais um convite à
problematização, uma chamada ao movimento de não aceitar como ver-
dadeiro tudo aquilo que “logicamente” tem sido dado como paradigma
dominante, uma provocação para se pensar o papel da Linguística e de
seus cientistas nestes tempos em que as máquinas se propõem fazer, com
fidelidade e precisão ainda não registradas, tudo aquilo que construímos
à maneira da espécie humana.
Funcionalismo Linguístico 96
REFERÊNCIAS
Funcionalismo Linguístico 97
HALLIDAY, Michael Alexander Kirkwood. Language as social
semiotic: the social interpretation of language and meaning. London:
Edward Arnold, 1978.
Funcionalismo Linguístico 98
MENDES, Wellington Vieira; SOUZA, Medianeira. Linguística
Sistêmico-Funcional: contextos, usos e significados. Macabéa – Revista
Eletrônica do Netlli, v. 8, n. 2, p. 603-619, jul./dez 2019.
Funcionalismo Linguístico 99
4 P R A G M ÁT I C A : A N ÁL I S E
D O S AT O S D E FA L A
101
Sabemos que, durante o processo de aquisição de um idioma, para ex-
pressar-se na língua estrangeira, o aprendiz precisa de conhecimentos
linguísticos, gramaticais, fonéticos e fonológicos, culturais, etc. Porém,
nos últimos anos, a competência pragmática vem ganhando destaque no
ensino e na aprendizagem de línguas estrangeiras, visto que, durante os
intercâmbios comunicativos, as intenções dos interlocutores que rodeiam o
enunciado nem sempre são compreendidas. É precisamente nesse ínterim
que os conhecimentos pragmáticos se fazem importantes para decodificar
o que se quer comunicar implicitamente.
Por outro lado, este estudo se fundamenta na Gramática do Designer
Visual, que estuda, entre outros, textos publicitários como veículo de
comunicação. Esse gênero textual está presente no nosso dia a dia, em
forma de representações visuais, que se organizam e se estruturam nos
textos multimodais.
Os textos multimodais são textos formulados a partir de signos linguís-
ticos e são representados por meio de elementos visuais e verbais. Esses
textos são divididos em dois modos, que compõem sua estrutura: o modo
verbal e o modo não verbal.
Propomos, com este estudo, apresentar a análise de algumas peças
publicitárias, sob a ótica da pragmática, com base na teoria dos atos de fala
diretivos propostos por Austin (1962) e Searle (1969). As peças publicitá-
rias serão analisadas na perspectiva da GDV, segundo os autores Kress e
Van Leeuwen (2006), abordando a função composicional nos enunciados.
No que concerne à metodologia, a pesquisa possui caráter descritivo,
qualitativo e interpretativo.
O primeiro tópico apresenta o surgimento da pragmática e sua impor-
tância para os estudos da linguagem, bem como os pressupostos teóricos
da Gramática do Design Visual (GDV); o segundo tópico mostra alguns
principais conceitos necessários à compreensão da Pragmática, dos Atos de
Fala e da GDV; no terceiro tópico, está presente a metodologia empregada
Essas teorias explicam que nós nos comunicamos não somente para
informar, mas também para pedir convidar, saudar. É importante com-
preender que, quando uma pessoa fala algo, ela tem alguma intenção, e
isso vai além do que se vê literalmente em nossas trocas comunicativas e
depende de fatores que influenciam diretamente o locutor e o interlocutor.
Segundo Frías Conde (2001, p. 4), “o enunciado pode ser uma oração ou
uma frase, contanto que esteja contextualizado”. Por isso, a compreensão e
a interpretação também podem variar, pois estão vinculadas ao momento
específico que envolve os falantes.
Todavia, é importante considerar que todo discurso possui um objetivo,
como afirmam Calsamiglia Blancafort e Tusón Valls (2002):
O discurso sempre tem um propósito–muitas vezes, mais de um–em-
bora o grau de controle que a consciência exerce sobre a produção dos
enunciados e sobre a manifestação ou a execução de nossas intenções seja
muito variável² (CALSAMIGLIA BLANCAFORT; TUSÓN VALLS, p. 187,
2002, tradução do autor)6.
Segundo a autora de Las cosas del decir, o propósito do nosso discurso
é algo que varia e de que nós só manifestamos e deixamos aparecer o que
5 Texto original: “Para que haya comunicación es preciso que exista una
transacción de información entre una fuente- la instancia emissora- y
un destino- la instancia receptora-, y eso se reproduce en un contexto
determinado y concreto”.
6 Texto original: “El discurso siempre tiene un propósito-a menudo, más
de uno-, si bien el grado de control que la consciência ejerce sobre la
producción de los enunciados y sobre la manifestación o la ocutación de
nuestras intenciones es muy variable”.
- Feliz aniversário!
- Obrigado!
Figuras 1 e 2–Anúncio 1
Figura 1 Figua 2
Figuras 3 e 4–Anúncio 2
Figura 3
Figura 4
8
Fonte: La Voz del Sur (2018)
Figuras 5 e 6–Anúncio 3
Figura 5
Figura 6
Fonte: 4 Vientos (2017)9.
124
5 A A N ÁL I S E D O D I S C U R S O
D E T R A D I ÇÃO F R A N C E S A :
U M V I ÉS F O U C A U LT I A N O
125
A AD, no Brasil, tem o seu marco nos anos 80, com a figura de Eni
Orlandi, que disponibiliza as traduções das obras de Michel Pêcheux e
começa a consolidar, no país, grupos de pesquisas sobre o discurso. Devido
a isso, no Brasil, diferentemente da França, não se apagou a imagem do
fundador da disciplina. Pêcheux continua a ser retomado e estudado. Aqui,
os analistas do discurso, muitas vezes, são classificados em pecheuxtianos,
foucaultianos ou bakhtinianos e isso não interfere no desenvolvimento
dos trabalhos com as mais diversas materialidades linguísticas, que se
encontram tanto nos discursos institucionalizados quanto nos discursos
do cotidiano. Dessa forma, mesmo trabalhando com a Análise do Discurso
de tradição francesa, fundada por Michel Pêcheux, escolheu-se aqui seguir
as concepções foucaultianas, por ser em Foucault que encontramos maior
respaldo para conduzir as nossas pesquisas.
Para um maior conhecimento sobre a AD francesa, trazemos aqui um
breve relato sobre o seu surgimento e apresentamos, em uma vertente
foucaultiana, alguns conceitos, como sujeito, discurso, poder, vontade
de verdade, memória, sentido, arquivo, formação discursiva, enunciado,
acontecimento, os quais norteiam a nossa análise, que se dará a partir dos
discursos da Comissão Nacional da Verdade–CNV sobre as formas de
violência cometidas contra a mulher na Ditadura Militar Brasileira. Nesse
viés, procuraremos descrever os vestígios de memória e os mecanismos de
poder que permeiam os testemunhos de mulheres violentadas, em época
de Ditadura, e de seus familiares, além de interpretar as relações de saber/
poder nos discursos da CNV sobre a violência contra a mulher, de ordem
psicológica, física, moral e/ou sexual.
A materialidade analisada aqui se compõe de discursos sobre a
Ditadura Militar no Brasil, presentes nos relatórios da CNV, como os tes-
temunhos de mulheres ou de familiares de mulheres que foram presas,
torturadas e violentadas durante esse período da história de nosso país.
Sigamos, então, às discursividades.
A Análise do Discurso, que tem início no final dos anos 60, na França, é
fundada por Jean Dubois, lexicólogo de renome, criador da revista Langages,
e por Michel Pêcheux, filósofo ligado a Althusser e preocupado em discutir
a Epistemologia das Ciências. Esses dois fundadores viam diferenças nos
estudos da Análise do Discurso. Dubois achava que a Análise do Discurso,
doravante AD, seria uma continuidade da Linguística, enquanto Pêcheux
tinha em vista um novo campo de investigação. Para Pêcheux, esses estudos
tratavam de “estabelecer a articulação entre a base linguística e o processo
discursivo, analisando o funcionamento da base linguística em relação
às representações colocadas em jogo nas relações sociais” (PIOVEZANI;
SARGENTINI, 2011, p. 28). Apesar de suas diferenças, esses dois estudiosos
tinham um só objeto de estudo: o discurso.
Quatro nomes estão intimamente ligados à AD: Althusser, autor de
várias releituras marxistas; Foucault, introdutor da noção de Formação
Discursiva na AD; Lacan, com a leitura do inconsciente das teses freudia-
nas, e Bakhtin (via Jackeline Authier-Revuz), sobretudo com os conceitos
de gênero e de dialogismo da linguagem. Cada um deles serviu como
pilar para a articulação entre língua, sujeito, discurso e história. E é com
essa articulação que Pêcheux “constitui o edifício da Análise do Discurso”
(GREGOLIN, 2003, p. 25).
O histórico da Análise do Discurso pode ser visualizado “por meio da
relação que se vai estabelecer entre a linguística e outras disciplinas, na
busca da interdisciplinaridade para a análise de um objeto ‘além da frase’,
que exige a abordagem da articulação entre o lingüístico e o seu ‘exterior”’
(GREGOLIN, 2003, p. 22).
Na França, a AD passa por três épocas distintas, cada qual com os seus
pontos significativos para o engrandecimento das teorias e das pesquisas
relacionadas a essa área. Essas três épocas são marcadas por revisões e
O arquivo é, de início, a lei do que pode ser dito, o sistema que rege
o aparecimento dos enunciados como acontecimentos singulares.
Mas, o arquivo é, também, o que faz com que todas as coisas ditas
não se acumulem indefinidamente em uma massa amorfa, não
se inscrevam, tampouco em uma linearidade sem ruptura e não
desapareçam ao simples acaso de acidentes externos, mas que
se agrupem em figuras distintas, se componham umas com as
outras segundo relações múltiplas, se mantenham ou se esfumem
segundo regularidades específicas [...] é o que, na própria raiz do
enunciado-acontecimento e no corpo em que se dá, define, desde
o início, o sistema de sua enunciabilidade.
O Tibirica repetiu: “Tira a calça. Esqueceu que não pode vir de calça
em uma repartição pública?” Aos berros. Eu: “Não vou tirar a calça
para nada. Estou quebrada, com dor”. [...] ele puxou a perna ras-
gando minha calça, acabando de rasgar minha calça. [Encapuzados]
pegam uma furadeira, que me furou daqui até aqui. Com uma
furadeira. Elétrica. Furadeira. Eu não vi mais nada (Cristina Moraes
Almeida, CNV – relatório – v. 1 – 2014a, p. 421 – Grifos nossos).
Anatália, durante o período em que ficou presa, teria passado por di-
versos tipos de tortura, incluindo a violência sexual. Isso é observado no
discurso do marido, que usa, em seu relato, os verbos torturar, gritar, cha-
mar, estuprar. Essa verdade se confirma pelas vozes de outras testemunhas.
Com isso, a causa de sua morte é retomada, os laudos são reanalisados, a
busca pela verdade se faz.
Um fato chama atenção na análise das fotos retiradas na época: havia
a indicação de que os órgãos genitais da vítima foram queimados. Como
está dito no relatório da CNV:
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RESUMO
Demonstrara o discente, que vai ser um profissional do ensino de línguas, que ele precisar saber a
importância da linguística, além de necessitar conhecer a estrutura e o funcionamento da língua em
questão, tanto âmbito de ensino, quanto no processo de compreensão da mesma. A partir dos
aportes teóricos das elaborações feitas por Ferdinand de Saussure os estudos de José Luiz Fiorin
cogitam-se investigar sua aplicação no cotidiano dentro da sala de aula, onde se objetivou a
realização do presente artigo, no qual, todo traçado teórico foi analítico, com ênfase no método
qualitativo.
ABSTRACT
The student is going to demonstrated, a professional language teaching, he needs to know the
importance of linguistic, and require knowledge of the structure and operation of the language in
question, both within education, and in the process of understanding the same. The theoretical
contributions put of elaborations from made by Ferdinand de Saussure and study José Luiz Fiorin,
is considering to investigate its application in daily life inside the classroom, where to aim the
realization of this article, in which, every stroke was analytical and theoretical with emphasis on
qualitative methodology.
_________________________________
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Acadêmicas do Curso de Licenciatura Plena em Letras pela Faculdade Madre Tereza, sob
condições.
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decorrer de acordo
da história com a nossa
na linguística Política dehouve
enunciativa privacidade. Ao continuar
a dificuldade denavegando,
consenso,você concorda
e até mesmocom
a
estas condições.
existência de certa recusa, entre os linguísticos da época (1966), de aceitar que fossem
considerados os estudos da linguagem. Mas, apesar da desconfiança em relação ao que eram tidos
como vago e indiferentes; várias teorias sugiram no cenário da linguística.
Segundo Benveniste (1995, p.139) o discurso é a manifestação da língua, ou seja, a língua serve
como instrumento de comunicação para o locutor. Como base nisso a enunciação é o processo de
apropriação da língua, sendo que esta se converte em discurso. Contudo, o locutor apropria-se do
aparelho formal da língua e se enuncia.
Pode-se verificar, pela exposição acima, que o autor defende o signo, como unidade semiótica
constituída de um significante e de um significando, devem-se atribuídos forma e sentido. A
significação do mesmo é definida pela comunidade de fala, pelo uso da língua, ou seja, a língua é
vista com sistema orgânico de signos linguísticos. Assim a língua compreender diferentes níveis
hierarquicamente constituídos, tornando-se o sentido a condição fundamental para que uma
unidade de qualquer nível tenha status linguísticos.
Entretanto Saussure se opõe no que diz Benveniste, ele propõe que a língua está diretamente
ligada à enunciação, ou seja, não há como trabalhar a língua e a fala juntas, pois segundo, Saussure
toma-se como norma de todas as manifestações da linguagem a língua, excluindo a fala. Pois, a
relação entre a língua e fala está diretamente ligada ao significado e ao sentido, então, a semiótica
não pode ser construída sem incluir a semântica no contexto.
Para outros autores a linguistica enunciativa, consistia, com efeito, em um conjunto de pesquisas
que se buscava analisa as marcas da enunciação somente na fala, marcas estas que serviriam de
ferramentas para descrever como o locutor utilizar a língua ao se comunica.
Segundo Oswald Ducrot (1970, p.178), a língua e fala pode-se estudada igualmente, mas entende-
se que a língua é objeto teórico construído, e fala como conjunto de dados observáveis. Nesse
ponto ele abrange o mesmo conceito que Saussure. A enunciação, para Ducrot, diferentemente do
que se lê na proposta de Benveniste, é o surgimento do enunciado, e o sentido do mesmo é a
representação de sua enunciação. Sendo assim, a fala tem por si própria os sentidos. Daí, a
importância de estuda-se o locutor, pois este tem um papel fundamental para se entender à
enunciação. Através do mesmo obtêm-se o sentido do enunciado. E tendo-se em vista que o locutor
tem determinadas atitudes: a de assumir, a de concordar e a de se opor a pontos de vista.
Pode-se averiguar, segundo Ducrot (1995, p.603), a enunciação é a ocorrência histórica constituída
pelo fato de que um enunciado foi produzido, isto é, que uma frase foi realizada, contudo pode-se
rematar que a frase é o encaixamento sintagmático virtual, enquanto o enunciado é o segmento
efetivamente produzido pelo locutor.
Porém é necessário mencionar, o nome Bakhtin, que contribuir muitíssimo para que entender o
conceito de enunciação. Segundo Bakhtin (1950 e 1960 p. 175), ele definiu-se como objeto da
linguística, o enunciado, incluído ai o contexto de enunciação, já que este ainda não tinha sido
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estudado fundo. Para de ele
acordo com a nossa
a linguagem Política ser
deveria de privacidade.
estudada de Ao continuar
acordo comnavegando, vocêeconcorda
as formas os tiposcom
de
estas condições.
interação verbal, ou seja, as formas das enunciações distintas, os atos de fala, em ligação estreita
com interação da qual eles constituem os elementos. A partir daí, se atingiria à sua interpretação
linguística habitual.
Na realidade, ele apenas abrevia-se os estudos da linguística da enunciação, se fragmentado de uma
constatação: não se pode determinar o sentido de um enunciado se não se leva em conta a situação
de enunciação. Nesse contexto o autor Jakobson concorda com mesmo, (1970, p. 175) ele expôs
que não se pode definir sua significação geral fora de uma referência à mensagem, ou seja,
Jakobson (1957) propunha que a mensagem e o código podem servir como suporte para a
comunicação do locutor.
Ao trata-se desse tema tão extraordinário, espera-se mostrar e valorizar como é esplêndido a
linguistica enunciativa, dentro do processo ensino aprendizagem. A proposta desse tema tem como
foco principal estimular os educadores a trabalharem a linguística na sala de aula. Já que a mesmo
não é trabalhada no ambiente de ensino.
É formidável que o professor trabalhe com texto referente à linguistica, pois é através dela que se
conhece a origem da língua, e sabendo isso o aluno vai ter em mente a clareza do por que e para quê
aprender a língua em questão. Segundo Bakhtin (1992, p. 279), o professor deve empregar a língua
em forma de enunciados orais e escritos com intuído de preparar o educando para compreender
melhor á linguística. Já que por acaso ele venha precisa no curso de graduação.
Atualmente, há um crescente número de teóricos que problematizam o método tradicional de
ensino de Língua Portuguesa nas escolas do país, pois esse se constitui basicamente por estudos da
gramática. Segundo France (2002, p12) a qualificação é o principal requisito de um docente de
sucesso. Todos nós precisamos evoluir. É uma exigência da contemporaneidade, o educador deve
optar pela linguistica. Dentro da sala de aula a disciplina de Linguística viria para soma com a
disciplina de Língua Portuguesa, porque ambas dão o sustentação que completa o sentido. A
linguística estuda história da língua agregado a abranger o uso da mesma, isto é, a língua tal como
ela é usada pela maior parte da população, e a outra dita: regas do bom uso da língua, esquecendo
sua origem.
Com os avanços dos estudos da área da Linguística e suas diversas vertentes sabe-se que, ao
contrário do que muitas pessoas julgam, não se fala “errado”, o que existem são variações
linguísticas. Segundo Ferdinand Saussure (1995, p. 12), “o tempo altera todas as coisas; não existe
razão para que a língua escape a essa lei universal.” Abrangemos os atributos que a linguística
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proporciona ao ensino deda
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especial, pois com
trabalhado
estas condições.
com ela ira facilitar o processo de aprendizagem, e o ambiente torna-se um espaço para análises da
gramática do ponto de vistas da linguistica e da língua portuguesa, além de proporciona debates,
dinâmicas e reflexões a respeito da própria. E sua realização propicia aos alunos condições de
produzir novos textos que permitam os significados construídos a partir das práticas de leituras das
próprias.
Segundo Soares (1998, p.59) a linguística instaura-se uma concepção que vê a língua como
enunciação, discurso; não apenas como comunicação que inclui as relações da língua com aqueles
que a utilizam, no contexto em que é utilizada, com as condições sociais e históricas de sua
utilização, ou seja, a interação é a palavra chave em sua ideia. A disciplina de língua portuguesa
pode ser trabalhada junto com a enunciação. Pois, a língua e a fala fazem parte do processo da
linguagem.
A linguística compete à tarefa de formular explicações sobre o mecanismo subjacente à linguagem.
Tal tarefa consiste da formalização da gramática de uma determinada língua. Segundo Fiorin (2002,
p.26) a linguística proviria para o aprimoramento de operações didáticas, no ensino da língua
portuguesa, e o objetivo central do ensino da linguística nos níveis fundamental e médio é fazer do
aluno um leitor eficaz e um competente produtor de textos. Isso é a condição necessária para o
desenvolvimento de suas plenas potencialidades humano, para o exercício da cidadania, para o
prosseguimento dos estudos em nível superior; e para a inserção no mercado de trabalho.
É de suma importância que os alunos saibam que nenhuma modalidade é melhor do que a outra, e
que cada situação cotidiana lhes exige uma maneira de falar ou escrever específica, pois a língua é
como a vestimenta que usamos: cada ocasião exige um traje específico. Sabendo disso, e da atual
situação do ensino da língua materna no Brasil, os professores, principalmente, os que ainda estão
em formação, devem contribuir com sua lenta e gradativa mudança.
Mas para que tal mudança aconteça é aconselhável que o mestre que já esta na sala de aula,
trabalhe com a língua, tal como ela é apresentada diariamente, através de meios reais de
informação, como é o caso do jornal e da revista, além de muitos outros textos, com as mais
diferentes funções, que fazem parte do cotidiano dos alunos. Precisa-se, antes de tudo, que os
alunos saibam identificar as intenções do autor ao escrevê-lo, e que saibam formar uma opinião
critica a respeito de tudo que os cerca. Para isso é fundamental a presença e a orientação do
professor, lembrado que, além de ser responsável por construir conhecimento, este deve também
contribuir para a formação da personalidade dos alunos, sendo um mediador entre esses valores
sólidos. Quando o professor adota a metodologia da resolução de problemas, seu papel será de
incentivador, facilitador, mediador das ideias apresentadas pelos alunos, de modo que estas sejam
produtivas, levando os alunos a pensarem e a gerarem seus próprios conhecimentos. Sendo assim, o
professor deve propor situações-problema que possibilitem a produção do conhecimento, onde o
aluno deve participar ativamente compartilhando resultados, analisando reflexões e respostas,
enfim aprendendo a aprender junto com linguística isso torna mais fácil e mais agradável o ensino
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A variação linguística é um tema de contínua preocupação para muitos linguísticos que já vem
sendo estudado e discutido ao longo de muitos anos. Pois, sabemos que toda língua possui
variações linguísticas, ou seja, é o modo pela qual ela se diferencia de acordo com o contexto
histórico, geográfico e sócio-cultural de um país. Tais diferenças de certo grupo social para o outro,
a mudança que pode ocorrer no modo de falar de cada um ou grupo social no discurso enunciativo
referente à sua comunidade e além do que isso em alguns casos a língua-materna que desde criança
o ser humano aprende com os pais ou com outras pessoas e pode levar essa variação consigo.
A enunciação trabalha variação e mudança em vários subsistemas de uma língua um deles é o
processo fonológico que discute a relativização do conceito de erro em linguagem, a questão do
preconceito linguístico no meio da desconstrução de locutores de uma mesma língua. Tais usos na
enunciação fazem reconhecer a importância de diferentes níveis de linguagem tratando da
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diversidade do uso dedeumaacordo com a nossa Política de privacidade. Ao continuar navegando, você concorda com
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Para Marcos Bagno (2002, p.166) reconhecer a importância da língua na construção da identidade
de uma nação é essencial, visto que o poder de uma palavra utilizada pelo falante de uma
determinada região é considerado como preconceito. Bagno ressalta que o sujeito ao utilizar uma
palavra de seu uso cotidiano constitui-se, também, como elemento de construção de cidadania e o
uso dessa palavra é patrimônio lingüístico de um povo.
A língua é elemento preponderante na constituição da identidade cultural de qualquer povo. Não se
constituindo como um sistema único e homogêneo, a língua constrói a identidade de uma nação,
transmitindo e dinamizando sua cultura e não se constitui como sistema único e homogêneo a
língua é também um elemento extraordinário na efetivação das diversidades culturais e lingüísticas
existente em uma nação. Uma nação que pode possuir diversas línguas, consolidando ainda mais
sua diversidade cultural.
Segundo Jean (2002, p.89) as línguas mudam todos os dias, evoluem. A partir disso há uma
mudança que se acrescenta diacrônica e outra a sincrônica, que mostra como perceber uma
continuidade sobre a coexistência de formas diferentes de um mesmo significado dentro de um
estudo atual, seja ele geográfico, social e estilística que abrange as correntes de estudo da língua
que adotam a concepção de linguagem como processo de interação entre as variações enunciadas.
Para Beline (2008, p121) “as línguas variam”, línguas diferentes que existe no mundo que aqui no
Brasil falamos português e do outro lado falam outra língua o espanhol e que dentro do nosso país
existes outros grupos sociais que não falam a nossa língua, que alem disso usam expressões
diferentes. O mesmo fala que tal variação não impede de um ser humano se comunicar com o outro
e que a enunciação estuda esses fatos da fala.
Ele coloca como exemplo a diferença entre o português que falam em São Paulo e o português que
se fala no Rio de Janeiro e nesse ponto vem à questão do léxico ou o vocabulário que as pessoas de
certa região usam. Esse tipo de variação, a lexical é, entretanto, apenas um dos modos como a
língua pode transformar, em outras palavras fazem referência a um elemento do mundo por mais de
um termo linguístico é apenas um dos casos que mostram que de fato as línguas variam, numa
mesma língua, um mesmo vocábulo pode ser pronunciado de formas diferentes conforme o lugar e
a situação mais formal ou mais informal em que se esta falando.
Assim Beline (2008, p.122) afirma diz que podemos perceber dentro desse aspecto geográfico que
há mudanças de ordem, como fonética, morfológica e sintática, além da escolha lexical, uma vez que
se trata de fatores internos da língua, tais elementos podem ser encontrados fazendo-se uma
comparação entre falantes de regiões distintas.
Os linguísticos produzem conceitos sobre as variações linguística, Jean fala que as línguas mudam
todos os dias, evoluem. Já Beline diz que elas as línguas variam e Fiorin (2001, p.24) coloca que a
partir do enunciado, toda língua é viva”, que se modifica e se reinventa ao longo do tempo. Porém,
segundo Saussure a língua é um sistema que reconhece apenas a sua própria ordem.
Reconhecer o fenômeno da variação linguística, despido de preconceito é essencial para o falante
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em sua própria com se
língua a nossa Políticaenquanto
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social, pela capacidade de se adequar às diferentes situações de manifestação da língua. No que se
refere à questão da comunicação na relação ensino aprendizagem a partir do discurso enunciativo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O educador é um agente transformador. O intuído deste artigo foi ressaltar o papel do docente de
língua portuguesa na formação de cidadãos críticos, a ajudando-os a ajustarem-se consigo mesmos,
com o mundo e com os outros. A hipótese que foi levantada nesta pesquisa é verdadeira, pois há
uma necessidade de se trabalhar a linguistica e a língua portuguesa dentro da sala de aula, e como
seria esplêndido trabalha com as duas, pois temos duas visões: a que valoriza regras da norma
padrão e a outra que trabalha a historia da língua, sem preconceito de certo ou errado, ou seja,
ambas dão o sustentáculo que educando precisar para ter uma visão de reflexão a respeito da
língua em questão. Dessa forma são de fundamental importância que o mestre trabalhe a
linguistica enunciativa dentro do ambiente escolar, esse método que é ao mesmo tempo, inovador e
modificador.
Mediante o expositivo dos objetivos verifica-se a sua veracidade. No primeiro objetivo: foram
apresentados métodos a serem alcançado pelo professor e que realmente seja trabalhado a
linguistica enunciativa dentro da disciplina de língua portuguesa, pois a uma grande necessidade de
trabalha com mesma, percebe-se a necessidade de que os alunos obtenham habilidades e
estratégias que lhes proporcionem a apreensão, por si mesmos, de novos conhecimentos e não
apenas a obtenção de conhecimentos prontos e acabados que fazem parte da nossa cultura, ciência
e sociedade. E visando contribuir para o trabalho de professores do ensino fundamental e médio.
No segundo objetivo é que este trabalho nos permitiu aplicar a teoria vista no curso de licenciatura
plena em letras, na disciplina de Língua Portuguesa. Todos esses artifícios de trabalha com a
linguistica na sala de aula são campos de estudos profundamente dinâmicos nos quais vêm
ocorrendo verdadeiras revoluções no processo de ensina aprendizagem que caberá a uma futura
mudança no ensino no país, pois estes têm aspectos positivos e esclarecedores, que ajudaram o
professor a lidar com as varias formas de linguagem. Visando-se uma sociedade mais justa, capaz de
intervir no desenvolvimento da humanidade crítica e criativamente, buscando uma melhoria na
qualidade de vida do aluno, não é suficiente apresentar conhecimentos cristalizados e fora do
contexto moderno. É preciso fazer com que os alunos tornem-se pessoas capazes de enfrentar
situações diferentes dentro de contextos diversificados, que façam com que eles busquem
aprender novos conhecimentos e habilidades. Só assim estarão mais bem preparados para adaptar-
s às mudanças culturais, tecnológicas e profissionais do novo milênio.
A partir dessas novas visões, é preciso reprogramar a mente dos professores, para enxergarem na
língua muito mais elementos do que simplesmente erros e acertos de gramática e trabalharem com
linguística enunciativa, pois é tal ênfase nessa disciplina que, ajudaram a vence os grandes
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de preconceitos dacom a nossa
língua Política
em si, de privacidade.
ou seja, O professor Ao continuar
não devenavegando, você concorda
ser um normativo ao com
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extremo, e nem um linguista ao extremo; deve ser professor, e como tal, aproveitar os recursos e os
resultados de ambos para aplicá-los em sala de aula.
É extraordinário destacar, que todas as informações presentes nesse artigo ampararam o
profissional de língua portuguesa a terem uma visão mais critica a respeito da gramática e o
propósito é que os mesmos trabalhem com linguistica junto com os estudos da língua, fornecendo
evidências aos acadêmicos do curso de licenciatura plena em letras e aos leitores interessados no
trabalho apresentado, do que de mais importante se deve saber a respeito de trabalha a linguistica
dentro da sala de aula. Além do fato de que são exatamente outros mecanismos encontrados para
estudar a língua em questão que instigam a curiosidade do leitor para a busca de informações mais
aprofundadas e cientificas.
REFERÊNCIAS
CAMARA JÚNIOR, Joaquim Mattoso, 1904-1970. Para compreender Mattoso Camara/ Albertina
Cunha, Maria Alice Azeredo Altgott-Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
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Janeiro:
estas condições.
Vozes, 1975.
FRIORIN, José Luiz. Introdução à Linguística. São Paulo: Contexto, 2008.
CALVET, Louis-Jean. Sociolinguística: Uma Introdução Critica. São Paulo: Parábola, 2002.
BAGNO, Marcos. Língua Materna: Letramento, variação e ensino .São Paulo. 2002
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Vitrine
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Anderson Horizonte uma vida vitoriosa SANTO VANDINHO Espirituais & Sonhos
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TEORIAS
LINGÜÍSTICAS
APLICADAS AO ENSINO DO PORTUGUÊS
Todavia,
tal multiplicidade de orientações –
legítimas,
vale lembrar, pois que, em cada uma delas, se examina o objeto sob
diferentes
perspectivas – se, por um lado, permitiu
que a lingüística avançasse
cada vez mais em seu propósito de investigar a
linguagem
verbal em seus diferentes
aspectos,
semântico,
fonológico, morfológico, sintático, por outro, levou o
estudioso da
linguagem,
sobretudo o professor de línguas, a
um estado de
total desorientação diante de tantas propostas de
estudo e de
tanta divergência
acerca de
determinados
temas.
Assim, diante de
pensamentos
tão diversificados no que concerne aos estudos de
língua, o
professor já não encontra
segurança
para discernir acerca do
que deva efetivamente
constituir o objeto de
seu ensino em sala-de-aula. Ademais,
não sabe
em que escola
fundamentar-se, a fim de manter-se atualizado com as últimas
novidades de
sua área e ainda se deve
ou não transmitir a seus alunos
os
conteúdos de
lingüística aprendidos
nos cursos de
Letras, pois já não sabe se deve identificar-se com um professor de língua ou de
lingüística.
Procuraremos tratar aqui de alguns desses questionamentos, selecionando os pontos que mais controvérsia têm suscitado entre
os
que se ocupam do ensino de
língua materna.
Para tanto, tomaremos como ponto de partida as
indagações
mais freqüentemente
apresentadas pelos professores de
língua portuguesa aos professores de
lingüística, verificando,
antes de
tudo, os
fundamentos
subjacentes a
cada uma delas. Nortearemos a discussão e o nosso ponto de vista acerca dos
diferentes
temas, baseando-nos nas
concepções do
lingüista romeno Eugenio Coseriu, em cujas
idéias encontramos sempre a
orientação
segura, fornecida por uma sólida
fundamentação
teórica.
As dúvidas dos
professores de
língua podem
ser sintetizadas nas
seguintes
perguntas:
a)
Que devo
ensinar, na disciplina de
Língua Portuguesa, tendo em vista que o aluno já conhece a
língua, ao
chegar à
escola?
b)
Como tornar o aluno um efetivo produtor/intérprete de textos?
c)
Devo
ensinar gramática?
d)
Caso a resposta à
pergunta anterior seja
negativa, o
que devo,
então, ensinar?
e)
Caso a resposta seja
positiva,
como devo
ensinar gramática?
Já se tornou
fato corriqueiro os
professores de todas as disciplinas, e
não apenas o
professor de língua materna, queixarem-se
de que os alunos não sabem
português, ou escrevem
mal ou apresentam
dificuldades gigantescas no momento em que precisam
interpretar textos. Tais reclamações aparecem com freqüência
não apenas entre os
professores de
ensino médio, mas também entre os
docentes de
terceiro
grau, nas
mais diferentes
áreas. Todavia,
ainda que as deficiências dos aprendizes, traduzidas nessas queixas,
já
tenham
até se transformado num lugar-comum entre aqueles que atuam no
magistério,
não se tem,
até agora, encontrado um caminho
seguro para tentar resolvê-las.
A atividade
lingüística é muito mais complexa do
que parece, à
primeira
vista, em virtude de se manifestarem, em cada um de
seus momentos, as
três modalidades de
saber acima referidas. Inúmeras vezes o professor percebe nos textos de
seus alunos
equívocos,
mas, por não conseguir apontar com precisão
onde se encontram, fica sempre no
terreno vago da mera opinião,
expressa,
via de regra, por frases como as que seguem:
Seu
texto está sem
sentido.
Você precisa
aprender gramática..
Você não sabe escrever.
Você não diz coisa com
coisa.
Sabemos, todavia,
que tal situação
ideal está
longe de se
transformar em realidade, em virtude de
muitos fatores,
entre os
quais
sobressai, a nosso ver, não o fator econômico,
como se pode
imaginar numa avaliação
apressada,
mas a própria mentalidade da
população
como um todo. Na
verdade, mesmo nas
comunidades
mais carentes, é
perfeitamente
possível criar-se, desde cedo, um
modus vivendi cujo cerne seja a valorização da cultura,
com o incentivo à
leitura de
diferentes
sistemas semióticos, concretizada através
de
visitas periódicas a museus e a
bibliotecas,
idas a cinemas,
teatros,
concertos etc.
Naturalmente
que isso só será exeqüível, se houver vontade e
empenho de
todos, sobretudo dos grandes meios de
comunicação
de
massa, particularmente do rádio e da
televisão,
cuja responsabilidade, a esse respeito, deveria ser a maior de todas, uma vez que
constituem uma concessão de
serviço público. É
preciso levar-se sempre em conta que grande parte do
que constitui o saber elocucional
da
criança e do
adolescente é
construído
desde cedo pela televisão e,
por isso, o Estado deveria
ter a obrigação de cuidar
permanentemente de sua programação, obrigando as concessionárias a apresentar uma programação de bom nível. É evidente
que tal
exigência
só será cumprida, se a própria comunidade
tomar para si o dever de cobrar tal comportamento.
Levando-se em conta as carências de
toda sorte próprias de um país subdesenvolvido
como o nosso, parece
que estamos
fazendo uma proposta
educativa
absolutamente utópica, mas tal avaliação
não corresponde à verdade. De fato, há inúmeras atividades
culturais de baixíssimo custo à disposição de todos que, por falta de
interesse, de
costume e de estímulo
não são aproveitadas por
aqueles em que se devia
desde cedo inculcar hábitos culturais: o educando. Posso citar, a título de
ilustração, a
Universidade
Federal
Fluminense,
instituição
onde trabalho, e a Prefeitura de Niterói, ambas costumam apresentar uma programação cultural de excelente
nível, gratuitamente
ou com preços quase que simbólicos
para o público.
Não vemos
outro caminho para que as reivindicações dos professores e dos pais na direção de um melhor desempenho
lingüístico de
nossos jovens possam
ser atendidas e, insistimos, é dever de todos e não apenas dos
professores de
língua materna.
Sem
criar as condições adequadas para que o saber elocucional se amplie em cada educando
paulatina,
mas, ininterruptamente,
não será
possível
contar com um falante/ouvinte
competente
para construir e interpretar textos.
Não queremos
com isso dizer, todavia,
que seja
suficiente,
para tornar alguém competente lingüisticamente, ampliar-se o saber
elocucional. Tal tarefa, a
rigor, é condição sine qua non, mas é necessário ainda que outros conhecimentos sejam considerados, a fim de
que efetivamente o
aluno seja
capaz de expressar-se bem. De fato, como vimos
mais atrás, precisamos ainda tratar dos outros dois
saberes,
indispensáveis
também para a constituição de textos. Comecemos, pois, pelo saber idiomático,
aquele, conforme ficou
visto,
responsável pelas regras e
unidades sígnicas de uma língua determinada.
O conceito
que a comunidade faz da língua leva em consideração os vínculos
históricos e culturais compreendidos no que se
costuma
chamar de tradição e, por tal razão, a
língua existe na consciência do
sujeito como um objeto unitário e
homogêneo.
Só na
condição de
observador é que se pode
perceber a variação apresentada por uma língua. E
em virtude de
tal diversidade é
que se
costuma
fazer uma oposição
entre língua culta ou norma padrão (modo de falar característico de pessoas com alto grau de instrução) e
língua vulgar ou norma subpadrão (modo de falar característico das pessoas analfabetas ou com baixo índice de
escolaridade). A
primeira é a
norma prestigiada pelo conjunto da
sociedade, vale dizer, valorizada tanto por aqueles que utilizam a
norma padrão quanto
por aqueles que utilizam a
norma subpadrão. Por isso, é a
norma padrão aquela considerada como objeto privilegiado do ensino,
condição de
prestígio no
seio da comunidade e
modelo de correção
lingüística.
Embora o
próprio falante costume rejeitar a norma subpadrão (domine ele a norma padrão ou não), do
ponto de vista
estritamente
lingüístico,
isto é, do
ponto de vista da
finalidade do
ato de fala, quer um texto manifeste uma ou outra norma, em
qualquer dos
casos a função cognoscitivo-manifestativa da linguagem será cumprida, se respeitadas as regras do
sistema,
porque
ambas possuem sua própria gramática. É preciso,
todavia,
entender exatamente o
que estamos afirmando, pois o termo gramática, no
âmbito da
metalinguagem e da linguagem
corrente admite acepções
diferentes.
Todas as regras utilizadas para a construção desses enunciados constituem o que estamos denominando de gramática, ou
1
melhor, gramática , e são conhecidas
pelos falantes de
língua portuguesa, pertencendo, assim, a
seu saber idiomático.
São elas,
justamente,
que nos permitem
construir e interpretar a cada momento um novo texto constituindo, por conseguinte,
condição sine qua
non para que o texto se manifeste. Tais regras foram aprendidas por todos segundo a
mesma forma de aprendizado de
qualquer
saber
técnico – e o
saber lingüístico é
um saber técnico,
já que consiste numa capacidade
para executar algo –, através da
própria atividade:
ouvindo os outros falarem e falando.
Os dois falantes, o
que proferiu a
frase a) e o
que proferiu a
frase b),
vale ressaltar, não sabem e
nem precisam
saber, para
desempenhar tal atividade,
justificar as regras que atualizaram para produzirem as respectivas frases, o
que não quer dizer que eles
não conheçam
tais regras, tanto num
caso como no outro. Baseando-nos mais uma
vez nas preciosas lições do
mestre romeno, diremos
que ambos se encontram na dimensão do
conhecimento denominada de conhecimento claro-distinto-inadequado[2].
Em tal dimensão,
o
objeto do
conhecimento é identificado com segurança e não precisa ser justificado. É, por exemplo, o
mesmo conhecimento
que nos
permite
dirigir um carro: sabemos os movimentos
que devemos
executar, aprendidos
durante o
próprio exercício e
não precisamos
refletir sobre sua engrenagem
para fazê-lo mover-se.
O lingüista, por outro lado, encontra-se em outro plano ou num grau mais elevado do
conhecimento,
aquele denominado de
conhecimento
distinto adequado. Neste grau do conhecimento, procura-se justificar o próprio objeto do
conhecimento, fundamentando-
o com razões, teses, princípios, consistindo, por conseguinte, num conhecimento de caráter reflexivo,
especulativo. Tomando ainda a
nossa analogia
com o desempenho do
carro, seria a
justificativa
para o funcionamento de seu motor: é certo que, para dirigir, não é
necessário saber rigorosamente
nada sobre o mecanismo que permite
tal atividade.
O ensino de
língua materna,
tal como é feito habitualmente
em nossas
escolas, consiste, desde as
séries iniciais, de
reflexões
sobre um objeto cujo domínio o
falante possui de forma muito incipiente,
isto é, o
seu saber lingüístico permite-lhe apenas produzir atos
comunicativos
para a satisfação de objetivos
imediatos e,
por conseguinte,
qualquer
possível
reflexão de
caráter metalingüístico é muito
singela também. Trata-se, por isso mesmo, de
um conteúdo programático inteiramente equivocado, com o dispêndio de
um tempo
precioso que poderia ser gasto na
ampliação do
saber sobre o qual se quer refletir.
Os professores de
língua portuguesa costumam constatar consternados
que, habitualmente, ao perguntarem aos alunos se
já
viram
determinado
conteúdo na
série precedente, eles costumam
responder negativamente,
ainda que tal conteúdo tenha sido visto e
revisto pelo professor no ano anterior. Os
alunos, na
verdade, não ficam esquecidos subitamente do que foi exaustivamente ensinado,
nem estão de
má-fé quando dizem
não se lembrar: eles, de
fato, não se lembram, porque não sabem e
não sabem,
porque não podem
refletir sobre algo que ainda não se encontra
bem sedimentado.
2
A pergunta feita inicialmente
sobre o ensino de
gramática refere-se,
portanto, à
gramática
e parece, diante do
que foi exposto
e discutido, já estar respondida, mas, a rigor, só está respondida parcialmente,
pois que ela envolve outras questões
que precisam
ser
bem entendidas, para poder compreender-se
tema de tamanha magnitude na
sua integralidade.
Assim, é
possível afirmar-se que, se por um lado a aquisição de um saber metalingüístico,
através do
que costumeiramente se
entende por ensino de gramática, é absolutamente
dispensável
para a produção de textos nas
situações rotineiras do quotidiano, nas
quais os
enunciados
são produzidos de maneira quase que imediata,
com um mínimo de reflexão e de
consciência,
por outro, pode
ser
muito útil para todos os
que pretendem
fazer uso do instrumento
lingüístico
também naquelas circunstâncias
em que, por muitas
razões, há uma
necessidade
imperiosa de se construir um texto mais elaborado, para cuja produção o conhecimento metalingüístico tem
valor inquestionável.
Não se deve
perder de vista, todavia,
que o saber metalingüístico
não pode,
como tem sido
feito na
maior parte das nossas
escolas – e
nós mesmos podemos
dar o nosso testemunho de
alunos que fomos –
ser utilizado como se tivesse um fim em si mesmo,
desvinculado inteiramente do saber lingüístico
para o qual deve orientar-se. Tal distanciamento costuma ocasionar uma verdadeira
distorção no
ensino do
idioma pátrio, gerando toda sorte de
confusões,
além de determinar a manutenção de
um ensino equivocado e
estéril.
É muito comum as
escolas separarem as aulas de
língua portuguesa em dois diferentes
blocos: no
primeiro, considerado o
núcleo
duro e a própria razão de
ser do ensino de
português, a que se concede uma carga horária maior, concentram-se as aulas de
gramática (saber metalingüístico) e no segundo, relegado a um secundaríssimo plano, contando com uma carga horária mínima,
inserem-se as aulas de
redação (saber
lingüístico).
Ora, como já foi discutido, o saber metalingüístico
só encontra
sua justificativa na
escola de
ensino médio se se
consubstanciar num meio para um melhor desempenho da
atividade
lingüística, de modo que, exposto
desta
forma, como se seu motivo de
existir encontrasse legitimidade
em si mesmo, é
evidente
que se transforma num saber inútil e
inteiramente
dispensável.
O domínio do
saber idiomático,
todavia,
ainda não é suficiente
para fornecer ao aluno a competência de
que ele necessita
para
cumprir as variadas finalidades da
atividade
comunicativa,
pois é necessário ainda o domínio do
saber expressivo,
aquele concernente
ao
nível individual da
fala.
De fato, no
ato verbal concreto, estão sempre presentes
dois sujeitos historicamente determinados:
um eu,
que fala acerca de
algo da realidade (empírica
ou imaginada)
para um tu, num
tempo e num
espaço determinados, numa certa situação
social. Para tal
atividade
lograr êxito, isto é, para que aquilo que está na
intenção do
falante seja alcançado pelo ouvinte, é
necessário que inúmeros
requisitos sejam preenchidos, entre os
quais salientamos os seguintes:
um conhecimento de mundo (saber elocucional) e uma tradição
lingüística (saber
idiomático)
comuns ou parcialmente
comuns, o
esforço conjunto dos
interlocutores
em direção a um sentido
partilhado.
A fragilidade no
conhecimento do saber expressivo pode ser ilustrada com muitos exemplos,
sobretudo em sala-de-aula. Assim,
é
muito comum ouvir de alunos com um pleno domínio da
norma padrão e do
próprio tema de que estamos tratando, queixas de
que
não encontram a forma adequada para se expressar. Fazem muitas
vezes trabalhos primorosos sob determinados
pontos de
vista e,
todavia, sente-se que o texto não está
bom. A razão disso reside justamente na
falta de
conhecimento do saber expressivo
relativo
àquela modalidade de
texto. Ora, o usuário de língua materna sabe,
como dissemos
acima, orientar-se perfeitamente nas múltiplas
situações concretas do ato de fala do quotidiano, mas com certeza não se sente
tão seguro em outras tantas com as quais não está
familiarizado. Para superar tais dificuldades,
só existe
aquele caminho apontado lá atrás: a
exposição a modalidades
diferentes de
texto.
Quando dizemos
que é imperioso
apresentar ao aluno diferentes
tipos textuais, ao
longo de todas as séries escolares, estamos
nos referindo
rigorosamente a todos os
tipos de
texto, tanto àqueles construídos consoante as
regras da
gramática normativa quanto
àqueles construídos de conformidade
com as regras da
norma subpadrão.
Promover a reprodução de
comportamentos
sob todos os
aspectos condenáveis, sobretudo quando feita por quem tem
legitimidade
para funcionar como modelo para um segmento permeável à
incorporação de toda sorte de mundivisões, é, para dizer o
mínimo, uma atitude de total irresponsabilidade. E, vale ressaltar, irresponsabilidade
não só para os que recebem
diretamente
tais
concepções distorcidas, mas também para a nação como um todo, pois se formam, deste
modo, cidadãos
que vão refletir nas mais
diferentes
situações de
sua vida – algumas
cruciais
para todo o país, como o momento da
escolha dos
governantes –
práticas
alimentadas por falsos ensinamentos
ou por ensinamentos equivocados.
A título de
ilustração do
que estamos discutindo acerca da
apresentação das diferentes
normas lingüísticas ao alunado, observe-
se o poema transcrito abaixo[5]:
Seu dotô,
só me parece
Que o Sinhô não me conhece,
Nunca sôbe
quem sou
eu
Nunca viu
minha paioça,
Minha muié,
minha roça
E os fio que Deus me deu.
Se não sabe, escute agora
Que eu vou contá
minha história
Tenha a bondade de uvi:
Eu sou da crasse matuta
Da crasse que não desfruta
Das riqueza do Brasi.
Sou aquele que conhece
As privação
que padece
O mais pobre camponês;
Tenho passado na
vida
De cinco mês em seguida
Sem cumê
carne uma
vez.
Sou o que durante a
semana
Cumprindo a sina tirana,
Na grande labutação
Prá sustentá a famia,
Só tem direito a
dois dia,
O resto é para o patrão.
Sou sertanejo
que cansa
De votá com esperança
Do Brasil ficá mió;
Mas o Brasil continua
Na cantiga da
perua:
Que é – pió, pió, pió...
Sofrendo a merma sentença
Tô quage perdendo a crença
E prá ninguém se enganá
Vou dexá meu nome aqui:
Eu sou fio do Brasi,
E meu nome é Ceará.
Certamente o
poeta não alcançaria os efeitos estilísticos desejados, se tivesse optado pela norma padrão para construir tal texto,
pois é justamente o
emprego da
norma subpadrão que lhe confere o
sabor de uma
fala eminentemente
popular, orientando, assim, a
interpretação do leitor para um sentido determinado.
Por outro lado, o texto que estamos construindo ao longo destas
páginas, exige,
em virtude das
circunstâncias
que envolvem
sua produção, o emprego da
norma padrão. Dizendo de outro modo, ambos estão
corretos,
tendo em vista a finalidade
para a qual foram elaborados.
Esperamos ter deixado claro que não estamos propondo a supressão do ensino da
norma culta dos
currículos
escolares,
pois isso
revelaria a mesma forma, antes condenada, de autoritarismo e de irresponsabilidade
educativa. Sabemos perfeitamente
que a norma
padrão, além de ser o veículo em que se manifestam muitos campos do
conhecimento aos quais o aprendiz deve
ter acesso, é
necessária
para a ascensão sócio-econômica. Assumimos, apenas, a
posição de
que a língua portuguesa deve ser estudada e
apresentada
tal como ela realmente é, na sua complexa
diversidade,
resultado das
variedades diatópicas, diastráticas e diafásicas, e nos
seus múltiplos
aspectos. Cremos que o ensino de
língua nesses
termos, levando em conta todas os diferentes
sentidos
que o
instrumento
lingüístico permite manifestar, longe de
empobrecer a
língua,
conforme
expressão
já gasta, utilizada por aqueles que
tentam
desempenhar o papel de lingüistas
sem que tenham recebido fundamentação
para tanto, só pode servir para enriquecê-la,
ampliando-a com a criação de
novos signos e de
novas construções.
Ademais, o
educando
só tem a
ganhar com essa
atitude do
professor, pois poderá optar, entre as inúmeras possibilidades que lhe são apresentadas, por aquela
que, em cada caso, servir melhor a
seus propósitos
comunicativos, sendo-lhe permitido
ainda conhecer diferentes
sistemas
significativos e ampliar, desta forma, seu saber
elocucional e sua visão crítica sobre a realidade circundante.
BIBLIOGRAFIA
COSERIU, E.
Gramática, semántica, universales: estudios de
lingüística
funcional. Madrid: Gredos, 1978.
––––––. Sobre la enseñanza del idioma nacional: problemas, propuestas y perspectivas. Philologia, II. Salamanca, 1989.
[1]O
saber elocucional a
que Coseriu se refere equivale, aproximadamente, ao que a
lingüística moderna tem denominado de coerência
textual.
Vale lembrar, todavia,
que o
termo começou a circular no âmbito da
literatura especializada recentemente e o texto de Coseriu
acerca do
assunto
remonta aos anos cinqüenta. É lamentável
que a
obra desse
lingüista tão importante
não tenha
ainda alcançado entre
nós a
divulgação que merece.
[5]
O Pasquim 21, RJ, 13/08/2000, n. 22, p.16, Seu Dotô me conhece? (versos de Patativa do Assaré)