Você está na página 1de 10

DOI: 10.1590/1413-81232022275.

08012021 1929

Das consultas terapêuticas à consulta conjunta:

temas livres free themes


contribuições de Winnicott à prática do apoio matricial

From therapeutic consultations to joint consultation:


Winnicott’s contributions to matrix support practice

Gustavo Vieira (https://orcid.org/0000-0002-4416-757X) 1


Pablo Castanho (https://orcid.org/0000-0002-5830-925X) 1

Abstract The scope of this article is to revisit Resumo O artigo tem como objetivo revisitar as
the Therapeutic Consultations of psychoanalyst Consultas Terapêuticas do psicanalista Donald
Donald Winnicott, seeking to identify technical Winnicott, buscando identificar nesta estratégia
and ethical contributions which can strengthen clínica subsídios para a sustentação técnica e éti-
the “matrix support” and joint consultations in ca do apoio matricial e das consultas conjuntas
the Unified Health System (SUS). A rereading no Sistema Único de Saúde (SUS). Para tanto,
of Winnicott’s texts and those of commentators is realiza-se uma releitura de textos de Winnicott e
conducted, presenting a debate between the au- comentadores, colocando-os em debate com as-
thor’s ideas and the work in mental health in pri- pectos do trabalho em saúde mental na atenção
mary care. Based on detailed case analysis, the ar- básica. A partir da análise detalhada de uma das
ticle addresses some implications for the practice consultas descritas pelo psicanalista, abordam-se
of matrix support, both in the intervention by the implicações para a prática do apoio matricial,
team, and in listening to the patient and family tanto na intervenção junto à equipe, como na es-
members. In addition, based on a contextualized cuta do paciente e sua família. Além disso, com
study of Winnicott’s consultation reports, the work base no estudo dos relatos de consultas de Win-
presents contributions for joint consultations in nicott, apresentam-se contribuições para as con-
the SUS, both in its care and in its formative axis. sultas conjuntas no SUS, considerando seus eixos
The following stand out in terms of technical and assistencial e formativo. Como resultados técnicos
ethical results: (a) the priority of listening directly e éticos, destacam-se: (a) a prioridade da escuta
to the person who gave rise to the complaint; (b) direta da pessoa sobre quem advém a queixa; (b)
the importance of sustaining “space and time” to a importância de sustentar o “espaço e tempo” que
allow a meaningful experience for the patient; (c) possibilite uma experiência significativa ao pa-
the use of interview instruments in the light of ciente; (c) o uso de instrumentos de entrevista à
“shared playing”; (d) the patient as an active sub- luz do “brincar partilhado”; (d) o paciente como
ject in the construction of his therapeutic project; sujeito ativo na construção de seu projeto terapêu-
1
Departamento de (e) the importance of the local team in supporting tico; (e) a importância da equipe local no suporte
Psicologia Clínica, Instituto and “translating” the patient’s experience. e “tradução” da experiência do paciente.
de Psicologia, Universidade
de São Paulo. Av. Professor Key words Public health, Matrix support, Psy- Palavras-chave Saúde Coletiva, Apoio Matricial,
Mello Moraes 1721, choanalysis Psicanálise
Butantã. 05508-030 São
Paulo SP Brasil. gustavovs.
psicologia@gmail.com
1930
Vieira G, Castanho P

Introdução matriciamento e (b) a falta de conhecimentos,


habilidades ou formação específicos para o de-
A proposição do apoio matricial no campo da senvolvimento do trabalho.
saúde coletiva e políticas públicas brasileiras Consideramos que alguns destes obstáculos
advém de um rico debate sobre a ampliação da epistemológicos estão relacionados à carência de
clínica. Segundo o médico sanitarista Gastão referenciais para a prática do matriciamento na
Campos1, várias racionalidades na saúde são fun- interface com diferentes abordagens teórico-clí-
dadas em uma clínica “degradada” (restrita à ló- nicas. Neste mesmo sentido, Onocko-Campos5
gica queixa-conduta) ou em uma clínica “oficial” nos alerta que a ênfase política na saúde coletiva
(limitada ao biologicismo e aos “especialismos”). pode produzir, por vezes, uma “negação” da di-
Como contraponto a estas perspectivas, o autor mensão clínica do cuidado. Assim, compreende-
propõe uma “clínica ampliada”, que possibili- mos que a psicanálise é uma das abordagens que
te incluir também o sujeito e o seu contexto no pode contribuir para a dimensão clínica do apoio
processo saúde/doença. Segundo Campos, esta matricial.
ampliação da clínica seria facilitada pelo trabalho O presente trabalho propõe revisitar as Con-
cooperativo e conjunto entre profissionais e, para sultas Terapêuticas do psicanalista inglês Donald
tanto, o autor apresenta duas noções fundamen- Winnicott, buscando identificar nesta estratégia
tais: a equipe de referência e o apoio especializa- clínica subsídios para a sustentação técnica e éti-
do matricial. ca do apoio matricial e das consultas conjuntas
Conforme Campos2, a equipe de referência no Sistema Único de Saúde (SUS). Este artigo
consiste no grupo de profissionais que acom- é resultado de pesquisa de Doutorado em Psi-
panham longitudinalmente uma determinada cologia Clínica, e as questões que motivaram a
adstrição de usuários, o que possibilitaria maior realização deste estudo são igualmente advindas
vinculação destes últimos com o serviço de saúde da prática de um dos autores do artigo como psi-
– a exemplo das equipes de saúde da família na cólogo no apoio matricial na Atenção Básica. O
atenção básica do SUS3. O apoio matricial, por presente artigo consiste em uma pesquisa teórica,
sua vez, foi concebido por Campos2 como uma na interação entre psicanálise e saúde coletiva.
retaguarda especializada que desenvolve inter- Tal interação é tributária de uma abordagem
venções conjuntas e/ou articuladas com as equi- metodológica de leitura teórica que valoriza o
pes de referência, estendendo as possibilidades de contexto histórico-biográfico de Winnicott6-9 e
atuação destas últimas e permitindo maior efeti- a experiência profissional dos próprios autores
vidade e vinculação dos usuários de saúde com com o SUS. Seguimos a proposta de Mezan10 de
os serviços. Neste arranjo de trabalho, segundo uma leitura-escuta flutuante atenta ao contexto
o autor, busca-se superar a fragmentação do cui- dos artigos analisados e marcada de modo inde-
dado e a lógica de encaminhamentos de usuários lével pelo “pensamento clínico”11 do pesquisador.
entre serviços de saúde. Enquanto um matricia- Deste modo, entendemos que o conhecimento de
dor pode atuar conjuntamente com diferentes dados histórico-biográficos, bem como o contato
equipes/serviços, uma equipe de referência “ge- profissional com questões clínicas semelhantes
neralista” seguiria sendo a principal responsável às do autor, deslocam possibilidades de leitura,
pelo acompanhamento longitudinal dos usuários permitindo novas problematizações e entendi-
de sua adstrição. mentos dos textos originais sem, contudo, re-
Desde o ano de 2008, o apoio matricial foi dundarem em um relativismo na interpretação.
implantado como política pública de saúde por Nas palavras de André Green12, face aos escritos,
meio dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família. ocorreria um “espaço potencial”, sendo nele que
Segundo revisão bibliográfica integrativa sobre propomos encontrar e criar releituras teórico-
o apoio matricial em saúde mental na atenção clínicas para a prática no apoio matricial.
básica realizada por Treichel et al.4, os impasses Para tanto, abordamos inicialmente alguns
e desafios para a consolidação e efetividade do aspectos das consultas terapêuticas de Winnicott,
apoio matricial se dariam não somente devido enfatizando seu interesse para a saúde coletiva.
a questões estruturais ou políticas, visto terem Na sequência, analisamos um dos casos clínicos
identificado também “forte prevalência de obstá- descritos pelo psicanalista, apresentando inter-
culos epistemológicos para [sua] consolidação e faces entre os elementos éticos e técnicos das
efetividade”4(p.12). Sobre este aspecto, os autores consultas terapêuticas e o apoio matricial. Por
destacam dois fatores: (a) a falta de delineamen- fim, tomamos o contexto e conjunto de relatos
tos claros sobre as estratégias para a prática do de consultas de Winnicott, a fim de estabelecer
1931

Ciência & Saúde Coletiva, 27(5):1929-1938, 2022


algumas correlações com as intervenções con- ção de um ambiente de suporte entre as consultas
juntas no apoio matricial, tanto no que tange ao (ou após a última entrevista). Além disso, con-
eixo assistencial (ou de cuidado), como no eixo forme Winnicott16 indica em seus relatos de caso,
de formação interprofissional. a escola e outras agências sociais constituíam
elementos importantes na sustentação ambien-
As consultas terapêuticas de Winnicott tal em vários casos. Logo, assim como as inter-
e seu interesse para a Saúde Coletiva venções no SUS, as consultas terapêuticas eram
pensadas em conexão com a família e o contexto
Donald Winnicott se tornou psicanalista sociocomunitário.
pela Sociedade Britânica de Psicanálise em 1935, O segundo elemento refere-se à “potencial
mas desde o início da década de 1920 iniciou continuidade de contato” entre Winnicott16 e o
sua prática profissional em instituições voltadas paciente, visto que o profissional estava dispo-
principalmente à saúde infanto-juvenil6. Neste nível para realizar outras entrevistas (conforme
contexto de atuação, o autor sublinha ter desen- a demanda ou necessidade), assim como man-
volvido uma estratégia clínica fundamentada na tinha comunicação à distância com vários dos
psicanálise – embora distinta da “análise padrão” pacientes e/ou famílias (p.ex. por telefone ou car-
–, que mais tarde passou a denominar “consultas ta). Logo, podemos compreender que, embora a
terapêuticas”13. consulta terapêutica se configurasse como uma
Foi ao longo de 40 anos de atuação no Hos- intervenção pontual, a “presença em potencial”
pital Paddington Green que Winnicott exerceu de de Winnicott operava uma função clínica impor-
forma mais extensa esta prática clínica6,14, aco- tante na condução dos casos. Este elemento pos-
lhendo aproximadamente sessenta mil famílias sui afinidade com o papel do matriciador que,
e lidando com casos de grande vulnerabilidade embora não faça parte da equipe de referência,
social9,15. Este hospital passou a integrar o Na- mantém-se como retaguarda clínica e pode ser
tional Health Service na década de 19409, sistema acessado quando isso se faz necessário.
universal de saúde que serviu de referência para O terceiro elemento é o horizonte de coope-
a organização do SUS. Winnicott justifica a pro- ração interprofissional nas consultas terapêuti-
posição das consultas terapêuticas na ampliação cas. Sobre este tema, Winnicott afirma:
do valor social da psicanálise, assim como enfa- [...] é necessário efetuar este trabalho em um
tiza o caráter público desta prática clínica, aberta setting mais amplo em que haja a oportunidade
para toda família que pudesse comparecer no dia para que um caso deslize para outro tipo de cate-
e horário disponibilizados13,14. Logo, podemos goria de psiquiatria infantil [...]. Se a entrevista
perceber um contexto clínico-institucional com psicoterapêutica mostrar-se insatisfatória mesmo
diversas afinidades com a saúde coletiva. A par- quando se pergunta “Qual é o mínimo que precisa-
tir desse cenário, a fim de propor interfaces com mos fazer neste caso?”, então um mecanismo mais
o apoio matricial, abordaremos três elementos complexo pode ser colocado em ação13(p.247).
constitutivos das consultas terapêuticas. É interessante notar que na citação acima o
O primeiro consiste na definição de Winni- autor utiliza o termo setting, considerado por ele
cott de “consulta terapêutica”: a exploração mais em outro artigo19 como o contexto no qual a clí-
completa o possível da primeira ou de poucas nica seria praticada, incluindo dimensões como
entrevistas13,16. Assim, a lógica desta prática pre- o horário, local e relação analítica. Deste modo,
conizava a intervenção clínica o mais breve pos- podemos considerar que a possibilidade de ou-
sível, direcionada especialmente para crianças e tro profissional de saúde mental ser incluído no
adolescentes, embora Winnicott e pesquisadores cuidado era constituinte do setting das consultas
indiquem que ele também realizava consultas te- terapêuticas, em conjunto com os dois elementos
rapêuticas com adultos13,17,18. O perfil de paciente apresentados acima.
indicado para esta modalidade de tratamento era Em uma leitura atenta dos relatos de entre-
aquele que não podia ou não precisava realizar vistas de Winnicott, identificamos que esta prá-
uma “análise tradicional”. Além disso, o autor16,17 tica clínica também era ampliada pela discussão
ressaltava a importância de o paciente contar e/ou acompanhamento conjunto com médicos
com um “ambiente suficientemente bom” que de família (general practitioners), conforme po-
pudesse continuar o trabalho iniciado na(s) en- demos verificar em cinco dos casos apresentados
trevista(s). Neste sentido, destaca-se a atuação do em sua compilação de consultas terapêuticas16.
psicanalista junto aos pais das crianças e adoles- Na perspectiva de Alexander9, a atuação conjunta
centes consultados, o que facilitava a constitui- de Winnicott com médicos de famílias estava ali-
1932
Vieira G, Castanho P

nhada com o preconizado no “Dawson Report” – a potencialidade clínica dos primeiros contatos
matriz discursiva sob a qual foram construídas as entre o profissional e a pessoa que busca ajuda.
políticas do SUS e, além disso, base fundamental Embora tenhamos enumerado possíveis afini-
para a constituição do apoio matricial no Brasil20. dades entre o apoio matricial e as consultas tera-
Além disso, extrapolando os serviços de saúde, pêuticas, uma diferença importante consistia na
podemos também encontrar em diversos regis- disponibilidade de Winnicott ser acessado direta-
tros de Winnicott a cooperação com profissionais mente pelas famílias, sem haver a necessidade da
da educação e da assistência social, o que também mediação de uma equipe de referência. Neste sen-
indica o caráter intersetorial de sua prática7,8,16. tido, consideramos que uma de suas consultas – o
Conforme discutem Vieira et al.21, embora caso Iiro – se distingue devido a demanda ter sido
o cuidado de outro profissional ou serviço nem endereçada a Winnicott por meio de uma equi-
sempre se fizesse necessário, o horizonte poten- pe de saúde, e não primeiramente pela família
cial de cooperação interprofissional era consti- ou pelo paciente. Deste modo, seguiremos anali-
tuinte do “setting ampliado” das consultas tera- sando esta história clínica, aprofundando a partir
pêuticas, sendo assim um dos requisitos para as dela outros aspectos das consultas terapêuticas.
possibilidades da prática. Este elemento é eviden-
ciado no relato de consulta terapêutica da adoles- O caso de Iiro: uma releitura à luz do apoio
cente Hesta em que, nas palavras de Winnicott, matricial
constituiu-se um “trabalho em equipe” entre
ele, o médico de família e uma jovem que atuou A entrevista de Iiro ocorreu em uma visita
como cuidadora local16, assim como no teste- de Winnicott ao Hospital Lastenlinna, em Kupio
munho de sua esposa – a assistente social Clare (Finlândia), realizada em 1964 “sob os auspícios”
Winnicott22 – sobre o psicanalista trabalhar “para da Organização Mundial de Saúde. Embora se tra-
fora” (outwards), buscando apoio tanto dos pais te da consulta de uma criança, consideramos en-
como de outras pessoas significativas na vida dos contrar neste relato diretrizes técnicas e éticas que
pacientes atendidos nas consultas terapêuticas. possibilitam pensar a dimensão clínica do apoio
Logo, os três elementos apresentados acima matricial no SUS para diversas faixas etárias e mo-
configuram um contexto clínico-institucional fe- dalidades de sofrimento. Para tanto, discutiremos
cundo para se pensar possíveis interfaces entre as quatro momentos do caso, que dialogam também
consultas terapêuticas e o apoio matricial. Além com diferentes dimensões do apoio matricial: (a)
disso, é importante considerar mais uma noção a demanda da equipe de saúde; (b) a escuta do pa-
teórico-clínica fundamental: para Winnicott, nas ciente; (c) o contato com a família; (d) a interven-
primeiras entrevistas o profissional ainda equi- ção junto à equipe e os desdobramentos do caso.
valeria ao que ele denomina “objeto subjetivo”13.
Esta concepção era baseada na percepção de um A demanda e participação da equipe
paradoxo: Winnicott identificou que diversas de saúde
crianças – que indicavam alguma esperança em
obter ajuda – relatavam ter sonhado com ele na Logo no início da história clínica verificamos
noite anterior à primeira consulta. O autor rela- uma especial afinidade com o apoio matricial,
ciona ainda esta constatação com a sua perspecti- visto que o objetivo relatado por Winnicott16 na
va igualmente paradoxal sobre os primórdios da visita era o de contribuir com a compreensão
relação mãe-bebê: para ele, o recém-nascido cria e manejo clínico de um caso, para que os pró-
o seio que é oferecido pela mãe23. Deste modo, a prios profissionais do hospital pudessem seguir
ideia de objeto subjetivo consiste em alguém que o acompanhamento do paciente. De acordo com
é, ao mesmo tempo, encontrado e criado. o autor, os participantes da atividade foram mé-
A noção winnicotiana de “objeto subjetivo” dicos, enfermeiros, psicólogo, assistente social,
possui implicações importantes para a relação além da diretora do hospital. Esta equipe selecio-
profissional-paciente: para o autor, assim como nou o caso de Iiro (9 anos), internado na divisão
a mãe precisa se adaptar sensivelmente ao bebê a ortopédica devido ao quadro de sindactilia, con-
fim de sustentar a experiência criadora primor- dição congênita na qual os dedos de suas mãos
dial, o profissional precisaria se ajustar ao lugar e de seus pés apresentavam uma união visível.
de objeto subjetivo nas primeiras entrevistas, Além disso, os integrantes da equipe também re-
permitindo igualmente ser encontrado-criado feriram outros sintomas inespecíficos de Iiro que
pelo paciente. Esta contribuição é de grande va- lhes chamavam a atenção, como confusões, dores
lia para compreender em termos psicodinâmicos de cabeça e no abdômen.
1933

Ciência & Saúde Coletiva, 27(5):1929-1938, 2022


De acordo com Winnicott16, a criança era ao material apresentado, o profissional sustenta
bem conhecida dos profissionais do hospital e, o processo para que a confiança e comunicação
devido à sindactilia, ela era acompanhada “quase possam ser estabelecidas entre eles. Deste modo,
permanentemente” desde o seu nascimento. Se- é interessante notar que, “em sua rodada”, Winni-
gundo Winnicott, devido ao fato de ele não falar cott não faz um rabisco, mas desenha igualmente
finlandês, assim como de a criança não falar in- um pé de pato, a fim de “testar a situação”, o que o
glês, a consulta teve a participação da Assisten- permite certificar-se de que eles estavam “falando
te Social Helka Asikainen, integrante da equipe a mesma língua” e que, assim, ele poderia susten-
hospitalar que já possuía conhecimentos sobre o tar a expressão da criança.
caso. Em seu relato, o autor salienta que Asikai- Podemos verificar que nos primeiros dese-
nen “se mostrou uma ótima intérprete”, facilitan- nhos Winnicott não busca cumprir as regras do
do a comunicação de Winnicott com Iiro e com jogo do rabisco “à risca”, pois seu objetivo pri-
sua mãe. Conforme abordaremos ao longo do mordial é o de viabilizar a comunicação com Iiro.
artigo, consideramos que Asikainen exerceu um Este aspecto levanta um ponto importante: em-
papel amplo de “tradução”, para além da questão bora diversos instrumentos sejam sugeridos no
do idioma. apoio matricial (p.ex. familiograma e ecomapa24)
é fundamental que seu uso sirva prioritariamen-
A escuta do paciente te para a comunicação com o paciente, cuidando
para que não se torne um procedimento rígido,
Apesar de a mãe de Iiro também se encon- que tenha um fim em si mesmo.
trar no hospital, Winnicott16 propõe consultar Na sequência, Winnicott16 e Iiro prosseguem
primeiramente a criança. Esta escolha é compa- no jogo do rabisco, produzindo conjuntamente
tível com sua posição explicitada em um artigo, imagens de patos, cisnes, assim como um rabisco
no qual afirma que “[é] direito do paciente ser que, para o autor, se assemelhava à mão do pa-
o paciente, e se o genitor não consegue cooperar ciente. Além disso, ao longo da primeira sequên-
com este arranjo, precisa-se de fato considerar se cia de desenhos, Winnicott identifica uma hesita-
a pessoa enferma não será de fato o genitor, antes ção de Iiro em olhar para as suas próprias mãos,
da criança”13(p.246). Consideramos encontrar mas o profissional intencionalmente não realiza
neste enunciado uma posição ética de escutar interpretações sobre estes fatos. Depois de uma
primordialmente a pessoa sobre quem advém a série de rabiscos conjuntos, o paciente desenha
queixa, seja criança ou adulto, contribuição de novamente algo semelhante a uma mão defor-
grande valia para o apoio matricial do SUS no mada e, ao ser perguntado por Winnicott sobre
âmbito da estratégia saúde da família. o que estava pensando, a criança se surpreende
Winnicott utiliza com Iiro um recurso que com sua própria produção.
emprega muito amiúde em suas consultas tera- Ao discutir esta história clínica, Tosta25 ressal-
pêuticas. Logo no começo da consulta, o psicana- ta que a consulta de Iiro é perpassada pela espera
lista convida o paciente para o “jogo do rabisco”, e pela surpresa: por um lado, a surpresa de Win-
explicando a ele: “Fecharei os olhos e farei um nicott demonstra que ele não possui uma ideia
risco a esmo no papel; você o transformará em preconcebida sobre a criança ou o processo; por
alguma coisa e depois será sua vez e você fará o outro, a surpresa de Iiro diante de suas próprias
mesmo e eu transformarei seu traço em alguma expressões indica a superação de conteúdos que
coisa”16(p.20). É interessante notar que Winni- estavam dissociados. Estes elementos constituem
cott se aproxima através do brincar, elemento aportes interessantes para a atuação no SUS, pois
relacionado em seu pensamento à sustentação desvelam a importância de que os serviços bus-
de “espaço e tempo”23. Além disso, retomando a quem proporcionar – mesmo diante da grande
importância de o profissional se ajustar ao lugar demanda – o espaço e o tempo necessários para
de “objeto subjetivo”, consideramos que a escolha que o próprio paciente possa vivenciar o proces-
deste jogo na consulta indica para uma adapta- so por meio de settings específicos, como a con-
ção sensível que permita a Iiro encontrar-criar sulta conjunta.
Winnicott – assim como o jogo propõe que o pa- Depois da criação partilhada de uma dezena
ciente crie (n)os rabiscos ofertados. de desenhos e da constatação de estar efetiva-
Ao iniciar seu rabisco, Iiro desenha um pé mente se comunicando com o paciente, Winni-
de pato, referência que surpreende Winnicott16 cott16 expressa identificar em um dos rabiscos da
pela correlação evidente com a sindactilia. Con- criança o formato de sua própria mão. Esta inter-
tudo, ao invés de realizar interpretações diretas venção permite a Iiro verbalizar que passou por
1934
Vieira G, Castanho P

diversas cirurgias, assim como ter consciência de O contato com a família


que enfrentaria novos procedimentos médicos. A
criança também revela seu desejo de tocar flauta A comunicação com a família – considerando
e fazer outras atividades incompatíveis com sua quem e como será feita – é pensada por Winni-
condição, além de declarar que foi ela mesma que cott16 à luz da entrevista com o paciente (sobre
escolheu passar pelas operações, expressão neste quem advém a queixa). Além da entrevista com
momento acolhida e não questionada pelo pro- a criança ter desvelado a pertinência de conver-
fissional. sar com a mãe no mesmo dia, a genitora também
É interessante notar que Winnicott aguarda o manifestou interesse em conversar com o profis-
próprio movimento de Iiro indicar – por meio de sional.
seus desenhos – o momento certo de uma nova De modo semelhante à consulta anterior,
verbalização pelo profissional. Na sequência do Winnicott e Asikainen sustentaram “espaço e
jogo, o autor identifica rabiscos do paciente que tempo” para que mãe de Iiro encontrasse opor-
podem se relacionar a uma representação de si tunidade para se comunicar e, assim, entrar em
no início da vida e declara: contato com aspectos de sua relação com seu
[Você] está me dizendo que gosta de você mes- filho. Segundo o autor16, a mãe pôde expressar
mo com seus pés e mãos ligados e que precisa que as livremente seus sentimentos, verbalizando que
pessoas o amem da maneira como era quando nas- rejeitou a criança quanto esta nasceu. Ela acres-
ceu. Já crescido você quer tocar piano, flauta e fazer centou que, para lidar com sua culpa, tornou Iiro
trabalhos manuais, e assim concorda em continuar seu filho “predileto”, mas passou a tentar “conser-
a ser operado, mas a coisa principal é “ser amado tar os dedos” da criança.
como é e do modo como nasceu”16(p.31). Algumas observações de Winnicott16 sinalizam
Logo, assim como as trocas de rabiscos feitas a existência de um vínculo prévio de Asikainen
no papel, Winnicott faz uso dos elementos comu- com a família do paciente e indicam que o psica-
nicados por Iiro em sua intervenção, permitindo nalista considerou as informações obtidas por esta
então que ele possa se expressar. Como resposta, profissional, salientando que a mãe de Iiro pôde
o paciente revela que sua mãe também vivia com tomar consciência de aspectos “novos” acerca de
sindactilia, o que naquele contexto, significava sua relação com o filho. Em nossa perspectiva, este
para Winnicott que a criança precisava lidar com elemento contribui com a ideia de que o trabalho
essa condição não apenas para si mesma, mas conjunto no apoio matricial possa fazer uso de in-
também no que se referia à sua mãe. É impor- formações já colhidas pelo profissional matrician-
tante salientar que a descoberta do lugar da mãe do, mantendo a abertura para se surpreender com
no caso clínico não fez com que o profissional os novos elementos emergentes na escuta.
interrompesse a consulta de Iiro para entrevis- Por fim, o caso de Iiro também permite refle-
tá-la. Este aspecto, de grande valor para o apoio xões sobre as intervenções feitas junto à equipe de
matricial, indica para a importância de que a in- saúde, tema que abordaremos na seção seguinte.
tervenção com cada integrante da família possa
ser vivida, conforme enfatizado por Safra26, como A intervenção junto à equipe
uma “experiência completa”. e os desdobramentos da consulta
Desta forma, Winnicott prossegue a consulta
com alguns rabiscos até que Iiro desenhou no- Ao final do relato, Winnicott declara que dis-
vamente um pato, figura que o autor considerou cutiu o caso com a equipe do hospital, que estava
ser, naquele contexto, “uma reafirmação de amor “à espera de que [ele] falasse sobre uma criança
[de Iiro] por si mesmo”16(p.33). Além disso, po- que todos já conheciam”16(p.35). De acordo com
demos considerar que o psicanalista aguardou até o autor, um dos elementos que inquietava um
o momento em que o próprio paciente indicou dos médicos locais – a complacência do pacien-
estar preparado para se despedir26. Este elemento te em relação às cirurgias –, não foi inicialmente
parece ser um balizador importante para que as apresentada na demanda inicial. Contudo, pode-
intervenções pontuais e/ou breves no apoio ma- mos entender que Winnicott também sustentou
tricial possam ter maior potência, exigindo por “espaço e tempo” em seu momento com a equi-
sua vez uma flexibilidade tanto do profissional pe, cujo resultado foi, segundo o autor, a adoção
como do serviço em que ele está inserido. de uma atitude mais realística acerca das expec-
A partir dos aspectos aqui discutidos, passe- tativas de “correção dos pés e mãos” de Iiro. Neste
mos para mais um elemento fundamental para sentido, podemos pressupor que houve uma mu-
nosso estudo: a entrevista com a mãe de Iiro. dança, tanto por parte da família como da equi-
1935

Ciência & Saúde Coletiva, 27(5):1929-1938, 2022


pe de saúde, na relação dos cuidadores com Iiro, A discussão do lugar de Asikainen na en-
compreendendo melhor os limites das cirurgias e trevista de Iiro nos conduz a uma questão mais
possíveis fatores iatrogênicos do excesso de inter- abrangente e fundamental para pensar possíveis
venções médicas. interfaces entre a clínica de Winnicott, o apoio
Ao avaliar os desdobramentos da interven- matricial e as intervenções conjuntas: a partici-
ção de Winnicott junto à equipe, consideramos pação de outros profissionais de saúde nas con-
que esta possibilitou a ampliação da perspectiva sultas terapêuticas.
dos profissionais para fatores subjetivos e psíqui-
cos, assim como preconizado no apoio matricial. Reflexões sobre a participação de outros
Além disso, sem a pretensão de que os profissio- profissionais nas consultas de Winnicott
nais da equipe se tornassem “especialistas” em
saúde mental, entendemos que Winnicott partiu Nesta seção, procuraremos tensionar o texto
de um interesse técnico (“mostre-nos o que você winnicotiano, que faz raras menções à presença
faz”) para transmitir uma resposta ética (“como de outros profissionais nas consultas terapêuti-
eu me comunico e me relaciono com os pacien- cas, com relatos de pessoas que testemunharam
tes”), um balizador interessante para o apoio ma- seu trabalho e alguns escritos que contextualizam
tricial junto às equipes. sua prática clínico-institucional. Abordaremos
Nos últimos parágrafos de seu relato, Win- agora algumas dessas referências, pensando suas
nicott declara sobre o status do caso após cinco possíveis relações com atividades conduzidas de
anos da entrevista: “[...]. Talvez seja também de forma partilhada entre o matriciador e um ou
interesse o fato de a entrevista com esse menino mais integrantes das equipes de referência. Para
não ter sido perdida para ele. [Iiro] continuou a tanto, consideraremos dois eixos salientados nas
manter contato comigo por cartas devidamente consultas conjuntas24 no SUS: (a) o assistencial,
traduzidas por Asikainen e me manda fotografias ou seja, o cuidado oferecido pela equipe ao pa-
com seu cachorro ou pescando com seus amigos ciente; (b) o formativo, ou seja, o possível inter-
no lago”16(p.35). Assim, na perspectiva de Winni- câmbio de saberes entre o profissional matricia-
cott, Iiro pôde fazer uso da “potencial presença” dor e o integrante da equipe de referência.
do psicanalista para se manter saudável em seu
cotidiano. Seguindo a interface entre este caso e o A dimensão assistencial e o cuidado
apoio matricial, podemos considerar que Winni- em equipe
cott conciliou uma modalidade de cuidado para
o paciente e sua família com a realização de um Nas compilações de artigos de Winnicott,
trabalho junto à equipe que seguiria o acompa- identificamos brevíssimas alusões sobre a parti-
nhamento do caso. cipação de assistentes sociais e de “visitantes” em
Além dos elementos já discutidos, levanta- quatro de suas consultas terapêuticas16,23 (Rose-
mos ainda dois aspectos sobre o lugar ocupado mary, Ada, Lily, e o “menino dos cordões”). Es-
por Asikainen no caso de Iiro. Em primeiro lu- tas referências são curtas e de pouco destaque no
gar, entendemos que ela se manteve, em alguma texto do autor, o que torna difícil saber qual era o
medida, como referência para Iiro e sua família papel destes profissionais na condução dos casos.
naquele contexto institucional e social, conside- Contudo, alguns de seus escritos oferecem pistas
rando que ela seguiu intermediando a troca de de compreensão.
cartas entre a criança e o psicanalista. Em segun- Em seus textos sobre o funcionamento da
do lugar, à luz do apoio matricial, entendemos Clínica Infantil em Paddington Green, Winni-
que a tradução feita pela assistente social pode ser cott27,28 indica que trabalhava de forma coopera-
compreendida para além do idioma: assim como tiva com assistentes sociais, delegando a estes o
o matriciador, Winnicott é requisitado pela equi- acompanhamento de alguns casos, enquanto se
pe sobre um saber acerca da vida psíquica e emo- mantinha em uma posição de retaguarda e res-
cional, mas não “fala a língua da criança”, o que a ponsabilidade técnica. Deste modo, embora não
nosso ver inclui seu desconhecimento dos códi- seja explicitado pelo autor, podemos levantar
gos sociais, comunitários e institucionais daquele como hipótese que a participação de assistentes
contexto; por outro lado, de forma semelhante ao sociais nas entrevistas acima citadas se dava em
profissional de referência no território, Asikainen um contexto de condução conjunta dos casos, o
tem um conhecimento sobre o contexto e sobre a que permite estabelecer uma nova afinidade com
família, conseguindo “traduzir” muito do mundo o apoio matricial e sua lógica de corresponsabili-
singular de Iiro. zação entre profissionais.
1936
Vieira G, Castanho P

Contudo, o fato de os assistentes sociais ci- de Winnicott, mesmo com a presença de mais de
tados por Winnicott comporem a “equipe de um profissional, o paciente não se tornaria um
referência” dos casos não seria suficiente para objeto de estudo, mas estaria no lugar de sujeito,
compreender a sua presença no próprio setting sendo convocado para o “desenho conjunto” de
da entrevista clínica. Neste sentido, levantamos seu projeto terapêutico. Consideramos este um
como hipótese adicional que a participação des- elemento de fundamental importância, a fim de
tes profissionais nas consultas poderia se dar que a expectativa “formativa” do apoio matricial
também em uma perspectiva formativa, ou seja, não torne o paciente um mero objeto de apren-
de intercâmbio de saberes. Para embasar nossa dizagem.
hipótese, abordaremos alguns relatos de pessoas
que participaram das consultas terapêuticas com
Winnicott. Considerações finais

A dimensão formativa e o intercâmbio O nosso objetivo ao longo do trabalho foi o de


de saberes revisitar as Consultas Terapêuticas do psicanalis-
ta Donald Winnicott, buscando identificar nesta
Embora Winnicott não traga muitos detalhes estratégia clínica subsídios para a sustentação
sobre a razão de outros profissionais se fazerem técnica e ética do apoio matricial e das consultas
presentes no setting das consultas terapêuticas, conjuntas no SUS. Neste contexto, salientamos
identificamos alguns testemunhos dos próprios que o apoio matricial – assim como outras po-
participantes destas entrevistas. Alguns destes líticas de saúde – não devem esposar uma abor-
relatos são de psicanalistas em formação que dagem teórica em detrimento de outra, mas per-
desejavam conhecer o manejo clínico de Win- mitir que cada profissional possa efetivar o que
nicott nestas consultas29,30. Além disso, a médica está preconizado na política pública por meio de
e psicanalista Susanna Isaacs-Elmhirst31 – que seu próprio referencial teórico-clínico. É justa-
trabalhou com Winnicott em Paddington Green mente neste sentido que as consultas terapêuti-
– acrescenta que a participação de profissionais cas de Winnicott – consideradas em seu contex-
de dentro e de fora do hospital nas consultas te- to institucional e histórico – contribuem para a
rapêuticas era bastante frequente. Desta forma, superação dos “obstáculos epistemológicos” dos
podemos presumir que Winnicott considerava profissionais matriciadores, especialmente aque-
que a presença de profissionais em suas entrevis- les com afinidade com a psicanálise.
tas – fossem eles psicanalistas ou não – possuía Contudo, para além dos aportes específicos
uma dimensão formativa. ao profissional psicanalista, é possível identificar
Dentre os exemplos de profissionais que nas contribuições de Winnicott alguns aspectos
atuaram em Paddington Green, o relato de dois técnicos que podem ser transversalizados para
colegas médicos que participam de consultas diferentes abordagens teórico-clínicas. Deste
com Winnicott dialogam de modo especial com modo, destacamos algumas interfaces interessan-
a problemática do apoio matricial. John Davis32 tes para profissionais de diferentes perspectivas
enfatiza ter aprendido com Winnicott a impor- no diálogo com o autor: (a) a prioridade da escu-
tância de ouvir, ao invés de “interrogar” durante ta direta do “paciente”, ou seja, aquele sobre quem
a consulta, o que o possibilitou perceber ainda advém a queixa; (b) a importância de sustentar
que o instrumento mais importante, tanto para o “espaço e tempo” para que o paciente possa se
diagnóstico como para terapêutica, é o próprio comunicar e ter uma experiência significativa;
profissional de saúde. Peter Tizard33, por sua vez, (c) o uso de instrumentos de entrevista à luz do
destaca ter aprendido com Winnicott a impor- “brincar partilhado”, para além de sua aplicação
tância de considerar mais o que as crianças e fa- objetiva para coleta de dados; e (d) a importância
mílias tinham a dizer, incluindo-as como partes da equipe e da rede como parte do “ambiente de
ativas de suas consultas suporte”, que antecede a entrevista e acompanha
É interessante salientar que tanto os relatos longitudinalmente o cuidado do paciente.
de Davis como o de Tizard acerca dos aprendiza- Por fim, consideramos também serem re-
dos advindos da participação em consultas com levantes alguns aspectos éticos presentes nas
Winnicott enfatizam a importância de escutar e Consultas Terapêuticas de Winnicott para pro-
dar lugar ao paciente. A partir deste elemento, fissionais matriciadores de diferentes aborda-
podemos depreender uma consequência ética de gens. Neste sentido, destacamos a importância da
grande valia para nossa discussão: nas consultas abertura para outros saberes da equipe, especial-
1937

Ciência & Saúde Coletiva, 27(5):1929-1938, 2022


mente em relação aos profissionais do território Deste modo, entendemos que, apesar da prá-
que podem “traduzir” de modo especial o mun- tica de Winnicott ter sido realizada em um con-
do do paciente e de suas famílias. Além disso, sa- texto institucional e sócio-histórico que possui
lientamos ser fundamental considerar o paciente diferenças em relação ao SUS, o movimento de
como sujeito (e não como objeto), permitindo “encontrar-criar” interfaces com o seu pensa-
que este seja ativo no “desenho” de seu próprio mento possibilita grandes contribuições para a
diagnóstico e projeto terapêutico. técnica e ética do apoio matricial e das interven-
ções conjuntas na contemporaneidade.

Colaboradores

G Vieira foi o principal responsável pela pesquisa


e redação do artigo. P Castanho foi responsável
pela redação de parte do artigo e pela revisão crí-
tica de todo o texto.

Financiamento

O presente trabalho foi realizado com apoio da


Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Fi-
nanciamento 001.
1938
Vieira G, Castanho P

Referências

1. Campos GWS. Saúde paidéia. 3ª ed. São Paulo: São 20. Castro CP, Campos GWS. Apoio Matricial como ar-
Paulo Hucitec; 2003. ticulador das relações interprofissionais entre servi-
2. Campos GWS. Equipes de referência e apoio especia- ços especializados e atenção primária à saúde. Physis
lizado matricial: um ensaio sobre a reorganização do 2016; 26(3):455-481.
trabalho em saúde. Cien Saude Colet 1999; 4(2):393- 21. Vieira G, Castanho P, Campos EP. Uma ampliação do
403. setting face à exclusão: contribuições de Winnicott
3. Giovanella L, Mendonça MHM. Atenção primária à para o cuidado clínico em equipe. Cad Psican CPRJ
saúde. In: Giovanella L, Escorel S, Lobato LVC, Noro- 2020; 42(43):91-115.
nha JC, Carvalho AI, organizadores. Políticas e Siste- 22. Winnicott C. Letter to the Editor. Int J Psychoanal
mas de Saúde no Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Fiocruz; 1972; 53:559-560.
2014. p. 525-625. 23. Winnicott DW. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro:
4. Treichel CAS, Campos RTO, Campos GWS. Impasses Imago; 1975.
e desafios para consolidação e efetividade do apoio 24. Chiaverini DH, Gonçalves DA, Ballester D, Tófoli LF,
matricial em saúde mental no Brasil. Interface (Botu- Chazan LF, Almeida N, Fortes S. Guia prático de ma-
catu) 2019; 23:1-18. triciamento em saúde mental. Brasília: MS/CEPESC;
5. Onocko-Campos R. Psicanálise e Saúde Coletiva: in- 2011.
terfaces. 2ª ed. São Paulo: Hucitec; 2014. 25. Tosta RM. Consultas terapéuticas: fenómenos cura-
6. Rodman FR. Winnicott: life and work. Cambridge: Da tivos y salud. Rev Latinoam Psicopatol Fundam 2017;
Capo; 2003. 20(4):762-775.
7. James M. Has Winnicott become a Winnicottian? In: 26. Safra G. A clínica em Winnicott. Nat Humana 1999;
Spelman M, Thomson-Salo F, editores. The Winnicott 1(1):91-101.
Tradition. London: Karnac; 2015. p. 7-19. 27. Winnicott DW. Atendimento de caso com crianças
8. Kanter J. “Let’s never ask him what to do”: Clare Brit- mentalmente perturbadas. In: A família e o desenvol-
ton’s transformative impact on Donald Winnicott. vimento individual. São Paulo: Martins Fontes; 2013.
Am Imago 2004; 61(4):457-481. p. 177-193.
9. Alexander S. Primary Maternal Preoccupation: D. W. 28. Winnicott DW. Memorandum on Organizational As-
Winnicott and Social Democracy in Mid-Twentieth- pects of Child Care at Paddington Green Children’s
Century Britain. In: Taylor B, Alexander S, editores. Hospital (Psychology Department). In: The Collected
History and Psyche. New York: Palgrave Macmillan Works of D W Winnicott – Vol. 6, 1960-1963. Oxford:
US; 2012. p. 149-172. Oxford University Press; 2016. p. 179-186.
10. Mezan R. Que significa “pesquisa” em psicanálise? In: 29. Milner M. The Suppressed Madness of Sane Men.
A sombra de Don Juan e outros ensaios. 2ª ed. São Pau- Hove/New York: Brunner-Routledge; 1987.
lo: Casa do Psicólogo; 2005. p. 95-134. 30. Khan MMR. Introdução. In: Winnicott DW. Da pe-
11. Mezan R. Pesquisa em psicanálise: algumas reflexões. diatria à psicanálise. Rio de Janeiro: Imago; 2000. p.
J Psican 2006; 39(70):227-241. 11-54.
12. Green A. La déliaison. Littérature 1971; 3:33-52. 31. Isaacs-Elmhirst S. Foreword. In: Kahr B. D W Winni-
13. Winnicott DW. O valor da consulta terapêutica. In: cott: a bibliographical portrait. London: Karnac; 1996.
Winnicott C, Davis M, Shepherd R, editores. Explo- p. XV-XXII.
rações psicanalíticas. Porto Alegre: Artmed; 1994. p. 32. Davis J. Winnicott as physician. Winnicott Stud 1993;
244-248. 7:95-7.
14. Winnicott DW. Clínica particular. In: Winnicott C, 33. Tizard JPM. Donald Winnicott. The President’s view
Shepherd R, Davis M, editores. Explorações psicanalí- of a Past President. J R Soc Med 1981; 74(4):267-274.
ticas. Porto Alegre: Artmed; 1994. p. 223-229.
15. Winnicott C. Interview with Clare Winnicott. In:
Rudnytsky PL, editor. The Psychoanalytic Vocation.
New Haven/London: Yale Univ.; 1991. p. 180-194.
16. Winnicott DW. Consultas terapêuticas em psiquiatria
infantil. Rio de Janeiro: Imago; 1984.
17. Winnicott DW. O Jogo do Rabisco. In: Winnicott C,
Davis M, Shepherd R, editores. Explorações Psicanalí-
ticas. Porto Alegre: Artmed; 1994. p. 230-243.
18. Gustafson J, Dichter H. Winnicott and Sullivan in the
brief psychotherapy clinic, part I. Contemp Psychoanal Artigo apresentado em 30/06/2020
1983; 19(4):624-637. Aprovado em 05/07/2021
19. Winnicott DW. Aspectos clínicos e metapsicológi- Versão final apresentada em 07/07/2021
cos da regressão no contexto analítico. In: Winnicott
DW. Da pediatria à psicanálise. Rio de Janeiro: Imago; Editores-chefes: Romeu Gomes, Antônio Augusto Moura
2000. p. 374-392. da Silva

CC BY Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons

Você também pode gostar