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Crítica ao método comunicativo

Antes de mais nada, eu gostaria de dizer que aprende-se línguas através de qualquer método.
É possível aprender línguas seja por um método mecânico (que os proponentes do método
comunicativo tanto inimizam) ou por um método mais conversativo. Aprende-se línguas há
milênios, muito antes da criação do método natural, do comunicativo, do repetitivo, que seja. A
tese que eu vou advogar aqui é simplesmente que sempre que alguém adquiriu fluência ou
quase-perfeição em uma língua — visto que a perfeição é impossível — só foi possível porque
ela seguiu os princípios que estão delineados aqui.

Eu não inventei esses princípios. Esses princípios são tornados explícitos pela teoria de
aquisição de linguagem pelo método natural de Stephen Krashen, e ele próprio afirma não ter
inventado esses princípios, dizendo tê-lo visto difundido por aí em outras teorias pedagógicas.

O método comunicativo é baseado em uma teoria sobre o ensino e o aprendizado chamada


construtivismo. Essa teoria propõe que o indivíduo que aprende, aprende através de uma
construção ativa do próprio conhecimento, e que o faz através da prática, da experimentação, e
do envolvimento com outras pessoas que também estão empenhadas no mesmo processo de
aprendizado. Tudo isso é verdade... até a página 2.

A prática é importante. Mas o que é prática? A experimentação, o erro, o envolvimento com


outras pessoas... tudo isso é importante. Mas qual é o lugar dessas coisas? O erro da
aplicação do construtivismo no aprendizado de línguas é achar que essas coisas são boas em
si mesmas, e que é através delas que o aprendizado é alcançado. Ela é baseada em teorias de
interação e aprendizado social, e colocam em um segundo plano o conhecimento hierárquico,
isto é, do professor.

Na teoria comunicativa, o papel do professor é fornecer para os alunos situações,


necessidades, dinâmicas em que estes alunos vão aprender entre si. Há uma breve explicação
acerca de como uma função funciona; a repetição é mínima, e tudo isso é muito belo. O aluno
de cara já pratica o que quer aprender. Como é focado na interação entre aprendizes, deve-se
ter o mínimo possível de teacher-talking time, ou "tempo em que o professor está falando".
Essa teoria, então, propõe que o professor deva falar menos e o aluno deva falar mais. O bom
professor, de acordo com o método comunicativo, é aquele que falando o mínimo consegue
levar o aluno a fazer o máximo. O bom professor é aquele que é sucinto.

O objetivo disso é tornar o aprendizado divertido! E certamente o método comunicativo é


divertido. Quando bem-feito, ele é cheio de jogos, dinâmicas, etc etc. Há certo ensino de
gramática e um pouco de repetição, mas apenas quando absolutamente necessário; quando é
impossível ensinar através do jogo e da dinâmica.
E esse método funciona! Mas funciona pelo mesmo motivo que qualquer outro método
funciona: ele, apesar de ignorar a aquisição, faz com que ela se torne mais fácil. A diferença
entre aprendizado e aquisição é exposta aqui.

Talvez o método natural seja de mais difícil aplicação em um curso? Ora, claro que não! Nos
pontos em que o método comunicativo acerta, ele o faz justamente porque ele age de acordo
com os princípios do método natural: falar com aquele que aprende na língua alvo de modo
que ele entenda. Existem até mesmo cursos de latim que ensinam através do método natural.
Por quê diabos não um curso de inglês?

Mas o problema do método comunicativo é dar muito maior enfoque na interação entre alunos
do que na interação entre aluno e professor. Para o aluno que entende suficientemente bem as
instruções do material didático o professor se torna desnecessário. Para o benefício do
método comunicativo, esses alunos costumam ser minoria — o professor acaba sendo
necessário, mesmo que de certo modo marginalizado.

No método comunicativo, o professor deve mais reger do que falar. Em sala de aula, o
professor vira um maestro — o que é muito bom e belo! Quando eu trabalho em sala, essa
realmente é uma forma muito eficiente de gerenciar a aula. Mas um maestro rege músicos que
já sabem tocar seus instrumentos. Quando julgamos que alunos interagindo entre si são algo
melhor do que alunos interagindo com o professor estamos colocando maior ênfase na
produção com conhecimento imperfeito, como se prática entre dois ou mais indivíduos de
domínio intermediário de uma língua fosse de alguma forma levá-los ao nível avançado. Isso
não funciona. É necessário um input externo; é necessário que algo venha de fora desse
círculo fechado e se comunique de modo a ser compreendido, e assim também faça
compreender. O método comunicativo cai no mesmo vício dos métodos que ele critica: para
que ele funcione é necessário repetição, repetição e repetição — mas a repetição está um tanto
mais mascarada do que em outras abordagens. Não que não haja repetição no método natural,
mas pelo menos ele assume a repetição.

Não me entenda mal: o método comunicativo tem uma virtude muito interessante: quando
bem-sucedido ele produz muita confiança. Os alunos que aprendem através desse método
obtém ousadia na hora de falar, e isso é muito importante. Mas o que fornece fraquezas para
esse método é justamente o que o torna mais "agradável" (e por agradável eu não quero dizer
eficiente); o que o torna tão facilmente "marketável".

Ora, o marketing desse método é perfeito. O aluno fala desde o primeiro dia. Que pai não ia
gostar de ver isso? Que pessoa que, interessada em aprender uma língua, não ia gostar de ser
capaz de falar, uma coisinha que seja, já no primeiro dia? Mas, novamente, o preço disso é a
redução do teacher-talking time.
Por quê é tão problemática a redução do teacher-talking time? Porque é marginalizado o
recurso mais poderoso do método comunicativo: aquele que de fato sabe falar corretamente.
O método comunicativo funcionaria perfeitamente se ele fosse aplicado de 1 para 1, entre um
aluno e um professor particular. Mas entre dois alunos ele tem uma série de déficits — e a
redução do TTT não é o único entre eles. Mais serão explorados adiante.

Ora, numa sala de aula se só o professor falasse seria muito chato. Certamente seria muito,
muito chato! Entediante! Enjoativo! E se o professor ficasse ensinando gramática, meu Deus,
seria irritante! Não estou advogando em prol de uma sala de aula em que só o professor fale,
mas simplesmente por uma sala de aula em que o teacher-talking time não seja visto como
algo a ser diminuído o máximo possível. E por quê? Eis agora a seguinte parte da crítica: como
a aquisição da língua ocorre.

O método comunicativo faz uso mínimo de gramática na sua prática de ensino. Isso é belo.
Quando ele pode, ele ensina a gramática através do contexto, sem usar aqueles termos
técnicos como subjunctive clause ou oxítona com ditongo oral decrescente. Isso é eficiente.
Ele então ensina uma série de funções, estratégias, "rotinas" que a língua usa, e mostra como
utilizá-las. Numa aula de inglês, por exemplo, eu poderia ensinar que quando eu quero falar de
hipóteses na primeira pessoa eu não uso a conjugação normal. If I were you, I wouldn't try
taming that horse. Numa conjugação normal eu diria If I was you, mas eh, não é assim que
funciona pelo simples motivo de que o inglês é insano.

E então, depois dessa explicação, o aluno deve praticar o que foi ensinado. Ele deve usar essa
estrutura para falar com seus colegas, deve escrever e/ou reescrever algumas frases etc.
Essencialmente, ele deve repetir até fixar. E isso funciona — mas só funciona quando o aluno
ou vê isso sendo muito usado, ou necessita usar com frequência. Como essas técnicas são
baseadas em aprendizado consciente, se o aluno não se depara com falantes nativos ou
avançados da língua usando essas estruturas em um ambiente não-controlado (como num
filme, por exemplo), ele enferruja. E aí ele tem que lembrar, ele tem que calcular. Na hora de
falar ou escrever, ele precisa pensar estrategicamente, precisa fazer pausas para pensar se
está usando a norma gramatical correta.Uma certa parcela dos seus recursos cognitivos, em
vez de estarem voltados para emitir uma verborreia inacabável, estão na verdade pagando
pedágio e, desta forma, estão atrasando a enxurrada de palavras que o aluno gostaria de estar
podendo fazer sair de dentro de si. O aluno não consegue falar automaticamente; sua fluidez
sofre diante da necessidade de ficar calculando e relembrando.

Quando esse método funciona, ele funciona simplesmente porque o aluno já viu isso sendo
usado diversas vezes, ou passa a perceber que isso sendo usado dali pra frente. A imersão é a
parte mais importante da aquisição de línguas, e tudo o que o método natural faz é demonstrar
como alcançar uma imersão progressivamente mais eficiente. Outros métodos, como o
comunicativo, funcionam, mas funcionam porque eles tornam a imersão mais fácil — porém
sem focar nela! Se eles assumissem a importância primária da imersão — mesmo na ausência
da compreensão! — eles seriam mais eficientes. Mas o que acontece é que a imersão acaba
sendo deixada para depois. A escola de inglês se torna como que um casulo: o aluno vai lá,
aprende inglês, termina o curso, para, depois de terminar, imergir-se. O aluno acredita que só
pode ver filmes em inglês se ele entender tudo o que está no filme. Mal sabe ele que é vendo o
que não se entende que se passa a entender! Com certas condições, claro. É necessário
contexto. E quando o método comunicativo tropeça nisso ele acerta belamente. Eu gostaria
que ele vivesse tropeçando! Que tropeçasse e não levantasse mais! Essa pedrinha — a
comunicação compreensível, ou comprehensive input, como queira — é vista como prata, algo
muito útil, pela abordagem comunicativa, enquanto toma a comunicação entre alunos como o
próprio ouro. Isso está às avessas! O ouro é o próprio comprehensive input! Essa pedra de
importância secundária na verdade é a pedra angular.

É necessário maior respeito e consideração pelas formas como a mente age de forma
autônoma! Sabe quando você não tem certeza sobre a forma correta de escrever uma palavra
e você simplesmente escreve as múltiplas formas como você acha que ela pode ser escrita?
Você escreve "eroi", "herói"; "chuveiro", "xuvero"; "beje" e "bege". Aí você simplesmente olha para
a palavra, encara ela, e mentalmente espreme as opções até que elas te digam a resposta?
Ora, esse é um método falho. Mas ele está alavancando um recurso que outros métodos não
usam: a intuição. O método natural fomenta a intuição. Como? Quando você vê milhares de
palavras sendo usadas de forma diferente, quando você se imerge na língua sem medo, você
inevitavelmente pega alguns padrões, alguns dos quais você nem sequer sabe que captou. E
então você, mesmo sem ninguém ter te ensinado, sabe que "beje" é feio, e que "bege" parece o
correto; sem conhecer a regra, entende que "alternatively" é a forma adverbial de "alternative".
O método comunicativo procuraria te mostrar como tais radicais, sufixos e prefixos se
comportam e que efeitos eles provocam — e isso funciona mas, novamente, deveria ser
secundário. O ideal é que de tanto ver tanta gente falando o tempo todo, o aluno simplesmente
entenda que uma pessoa que imagina muitas coisas, que tem facilidade para imaginar, é
imaginativa. A person who imagines a lot is an imaginative person. E isso pode ser ensinado,
mas o problema é... em quanto tempo?

Uma língua não é uma escada. Eu não aprendo primeiro A e depois B. Cursos são
padronizados e eles ajudam as pessoas a aprenderem. Mas como a língua não é uma escada,
eu não necessito aprender horse, cat, mouse para aprender alternatively. Eu talvez vá, mas não
preciso passar pelo básico, intermediário, pré-avançado, avançado e master — o que pode levar
anos — para aprender a construir um advérbio através de um adjetivo. Diabos, eu nem preciso
aprender o que é um advérbio para poder usá-lo! De forma alguma eu recomendaria que você
saísse de um curso ou tirasse o seu filho ou filha de um curso. O curso tem o seu lugar, mas
infelizmente, por conta do marketing maravilhoso que o método comunicativo possibilita, os
cursos propõe-se como ouro quando eles na verdade são prata. O curso é um auxiliar, mas ele
se vende como o bastante. Um professor particular que usa o método natural ou comunicativo
— desde que ele converse muito com o seu aluno — é uma amálgama de prata e ouro. O ouro,
o ouro puro, é a imersão, o tempo que se passa com a língua. Um curso, um professor, vai
tornar o processo mais fácil em alguns pontos — principalmente no início — mas se você for
capaz de se divertir na língua que você quer aprender, mesmo que você não esteja entendendo
tudo — mesmo que você esteja entendo apenas 10%! —, você estará fazendo o melhor que
pode ser feito para poder chegar onde você quer.

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