Você está na página 1de 2

Endereço da página:

https://novaescola.org.br/conteudo/8770/saber-ouvir-
e-a-grande-questao

Publicado em NOVA ESCOLA Edição 301, 09 de Abril | 2017

Entre Colegas

Saber ouvir é a grande


questão
NOVA ESCOLA

Felipe Bandoni,
é professor de Ciências na Educação de Jovens e Adultos (EJA) do Colégio
Santa Cruz, em São Paulo

O senso comum diz que um bom professor é aquele que sabe falar. Nas
licenciaturas, nos ensinam a planejar as falas com cuidado e a nos apresentar
bem diante de outras pessoas. Passamos grande parte do tempo estudando
em profundidade uma área do conhecimento para discorrer sobre ela com
clareza e precisão. Pouco aprendemos sobre ouvir os alunos e, no entanto,
essa é uma parte fundamental da nossa atividade por pelo menos três
razões:

Escutar permite entender o que o outro pensa.


A escuta atenta é um dos poucos instrumentos disponíveis para avaliar
se o que estamos propondo faz sentido para a turma.
Ao abrir espaço para que os alunos se coloquem, compartilhamos com
eles a responsabilidade pela aula.

A participação e o engajamento dos estudantes animam as discussões,


tornando a aula muito mais produtiva do que aquelas em que só se ouve a
voz do professor. Mas, para chegar nesse ponto, existem obstáculos a
remover. Para começar, é natural os alunos se expressarem de modo meio
confuso e impreciso. Em meio ao burburinho da classe, só para entender o
que o outro quer dizer, é preciso prestar muita atenção. Além disso, na minha
experiência, os estudantes têm dificuldade em ver utilidade na fala dos
colegas. Na maioria das vezes, a ignoram. Na "era do fone de ouvido" em que
vivemos, essa "surdez" é ainda maior.

Ao abrir espaço para que os alunos se coloquem, compartilhamos


com eles a responsabilidade pela aula.

E não há como negar as questões de ordem prática: em uma sala com trinta
ou quarenta alunos, dá para ouvir quantos? Como fazer para que não sejam
sempre os mesmos? Que estratégias usar para que a escuta gere
aprendizagem para todos?

Um colega professor tem conseguido ótimos resultados com suas turmas e


meu deu uma dica simples e importante. Você deve deixar claro para os
alunos que suas intervenções serão valorizadas e ampliadas para toda a
classe. Assim que o estudante fizer uma colocação, cabe ao professor
reformular a frase e pedir para que ele ou ela confirme se é aquilo mesmo
que tem em mente. Esse docente aponta que, de início, os alunos
imaginavam que o diálogo era restrito a quem fazia a pergunta e o professor.
Mas, depois que tomou a fala dos estudantes como ponto de partida para as
discussões, ele criou, de fato, um ambiente de escuta. Quando os alunos
notam que suas falas são levadas em consideração, elas aumentam de
qualidade e se estabelece um diálogo genuíno.

De um lado, o professor precisa ser mais flexível, pois embarcar na linha de


raciocínio dos estudantes pode gerar mudanças no plano de aula. Por outro,
ele não deve deixar a discussão à deriva, o que o faria perder de vista seus
objetivos. Em outras palavras, é preciso ter clareza de onde se quer chegar,
mas levar a escuta a sério é decisivo para envolver os alunos na
aprendizagem e sinalizar, para todos, qual o melhor caminho a seguir.

Ilustração: Adriana Komura

Você também pode gostar