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EDUCAÇÃO DE DEOLINDA POR MEIO DA IGREJA METODISTA:

CONTRADIÇÕES E POSSIBILIDADES DE AÇÃO NO CONTEXTO DAS


LUTAS PELA INDEPENDÊNCIA DE ANGOLA

Daélem Maria Rodrigues Pinheiro (PPGEDUC - UFPA)


daelemmaria@gmail.com

Resumo

Este artigo analisa a formação de Angola, a chegada da igreja metodista e sua relação
educacional com membros do Movimento Pela Libertação Nacional Angolano (MPLA)
especialmente, Deolinda Rodrigues, educada pela igreja e membro do movimento MPLA.
Tem como principal objetivo compreender de que forma a educação formal feita pela igreja
Metodista causou impactos na formação de Deolinda Rodrigues e dos movimentos
indenpendencistas em Angola. A documentação utilizada para a elaboração da pesquisa foi
acrescida dos escritos de Deolinda Rodrigues encontrada em seu diário pessoal. O acesso
aos documentos foi viabilizado graças ao uso, como metodologia de pesquisa, de fontes
digitais, disponíveis na internet e fundamentadas em leituras que versem sobre a
importancia das leis federais para se estudar sobre a história afro-brasileira e africana
(GOMES, 2020 ), assim como a discurssão do negro e da linguagem (FANON, 2008) Cujos
resultados consistiram em pensar o papel das missões em Angola, como a educação formal
que por muitas vezes tinha o intuito de “colonização” por meio da língua, foi também
ressignificado e utilizado como formas de resistências, articulações e denúncias no contexto
colonial de intensas repressões

Palavras-chave: Educação formal; Deolinda Rodrigues; Indepência de Angola

Introdução

O projeto identificado por Aníbal Quijano (2005), Enrique Dussel ao lado


de outros autores latino-americanos como Mignolo (2010), Artur Escobar, Edgardo
Lander, Fernando Coronil, acerca da modernidade/colonialidade, foi a base para
pensar a colonialidade inserida dentro do processo da modernidade produzida pelo
Ocidente, vale destacar que a modernidade do ocidente foi construída “como a
época da mais avançada forma de civilização em comparação a outros arranjos
sócioculturais, políticos e econômicos”1 uma tese criada e difundida a partir de uma
suposta superioridade hierárquica ocidental, baseada em conceitos pautados na

1
TORRES, Nelson Maldonado. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico/organizadores Joaze
Bernadinho-Costa, Nelson Maldonato-Torres, Ramón Grosfoguel. –2. ed; 3. reimp. – Belo
Horizonte: Autêntica, 2020. (Coleção Cultura Negra e Identidades). p. 30.
distinção de progresso, soberania, sociedade, subjetividade, gênero e razão2
acrescendo a ideia de raça, com isto, difundiu-se o discurso da superioridade
europeia e a inferioridade dos continentes que passaram pelo bojo da expansão
colonial europeia, desde 1492, Ásia, África e a posteriori a América Latina.
Todavia, neste trabalho o recorte dará a partir de uma perspectiva de educação
decolonial para se pensar o continente africano, com ênfase em Angola.
Constituindo-se, desta forma, a modernidade quase que natural e a
colonialidade mesmo intrínseca a modernidade foi considerada
epistemologicamente quase que invisível. Ao analisar esse tema Walter Mignolo
(2010),enfatiza“La torcida retórica que naturaliza a la modernidad como un proces
o universal, gobal y punto de llegada oculta su lado oscuro, la reproducción const
ante de la colonialidad”3 o autor revela não só o lado obscuro da modernidade, que
foi o processo colonial, como também revela-nos como o processo da
modernidade/colonialidade utilizou da teoria epistemológica da colonialidade do
pensamento de superioridade para produzir e reproduzir narrativas que
justificassem a própria colonização, estabelecendo o conhecimento europeu como
universalista e hegemônico, desconsiderando qualquer outra epistemologia.
Desta forma, a modernidade/colonialidade por intermédio do racismo
produz uma zona do ser e do não ser (FANON, 2008, p. 26) “uma região
extraordinariamente estéril e árida”, vivenciada pelo negro, o homem ocidental
construiu-se como o ser humano e o homem africano como “o negro não é um
homem”4, uma categoria imposta pelo processo colonial. A construção dicotômica
de homens e mulheres do ocidente serem ligados ao humano e ao civilizado
enquanto homens e mulheres africanos foram animalizados, conforme reitera
FANON (1968),

2
TORRES, Nelson Maldonado. Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico/organizadores Joaze
Bernadinho-Costa, Nelson Maldonato-Torres, Ramón Grosfoguel. –2. ed; 3. reimp. – Belo
Horizonte: Autêntica, 2020. (Coleção Cultura Negra e Identidades). p. 30.
3
MIGNOLO, Walter. DESOBEDIENCIA EPISTÉMICA: RETÓRICA DE LA MODERNIDAD,
LÓGICA DE LA COLONIALIDAD, Y GRAMÁTICA DE LA DESCOLONIALIDAD. Colección
Razón Política, Ediciones del Signo. 2010, p. 9. “A retórica distorcida que naturaliza a modernidade
como um processo universal, global, ponto final, esconde seu lado obscuro, a reprodução constante
da colonialidade” (tradução livre, MIGNOLO, 2010, p. 9)
4
FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EdUfba, 2008, p. 26
Por vêzes êste maniqueísmo vai até ao fim de sua lógica e desumaniza o
colonizado. A rigor, animaliza-o. E, de fato, a linguagem do colono,
quando fala do colonizado, é uma linguagem zoológica. Faz alusão aos
movimentos réptis do amarelo, às emanações da cidade indígena, às
hordas, ao fedor, à pululação, ao bulício, à gesticulação. O colono,
quando quer descrever bem e encontrar a palavra exata, recorre
constantemente ao bestiário. O europeu raramente acerta nos têrmos
"figurados” 5

Mesmo com mudanças significativas, ocorridas nos estudos decoloniais e


especificamente sobre o continente Africano, muitos dos estereótipos ainda
refletem o imaginário homogêneo construído por um “olhar imperial”. Conforme
Hernandez (2005), essa visão é criada pela Europa, mas, com consequências, não
só para África, mais também para o Brasil. Pois, Brasil e África tiveram uma relação
direta. Especialmente Brasil e Angola, não só por causa do processo escravocrata
intensificado em meados do século XVI, que constitui parte da sociedade brasileira
também de africanos e afro-brasileiro. Dar-se também pelas trocas comerciais e
ligação política, ocasionada pelos movimentos rebeldes na capital de Angola,
Luanda, na década de 1950, na luta pela independência de Angola.
Deste modo pensar na relação Brasil e Angola é pensar na própria formação
brasileira e sua constituição também a partir de povos africanos. Entretanto, vale
destacar que no Brasil, a questão étnico-racial e os estudos acerca do continente
africano até algumas décadas atrás tinham pouca atenção nas universidades
brasileiras, pensar sobre a história dos negros brasileiros e a própria história da
África era um tema distante de uma História marcada pelo estruturalismo e o
economicismo, daquela época (até 1980), onde o negro era visto apenas como a
mão de obra escravizada, sendo essa história reproduzida e até naturalizante nos
livros didáticos, o negro escravo.
Mas, se por um lado existiu uma história resistente a história de negros
africanos e afro-brasileiros, por outro, não podemos deixar de lado as lutas que vão
contra todos estes estigmas sociais, destaca-se aqui a importância dada às

5
FANON, Frantz. Os Condenados da Terra. Prefacio de JEAN PAUL SARTRE, Tradução' de José
Laurênio de Melo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. p. 31
mobilizações de Abdias Nascimento no contexto da organização do Teatro
Experimental do Negro, no Rio de Janeiro, o qual ressaltava a importância da
história da população negra nas escolas.
Assim, como a importância do movimento negro vale ressaltar a luta dos
movimentos sociais, na luta antirracista, a qual juntos conseguiram “um
reconhecimento oficial do Estado brasileiro. Várias demandas desse movimento
social foram transformadas em políticas públicas6 causando mudança significativas
no curriculo brasileiro o qual causam impactos institucionais em nível federal
conforme GOMES, 2020.
Em nível federal, várias políticas e projetos antirracistas foram
realizados, tais como: a alteração da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação (Lei n. 9.394/1996) pela Lei n. 10.639/2003 ao introduzir a
obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira e africana
nos currículos das escolas da educação básica; o Decreto n. 4.887/2003
que regulamentou o procedimento para identificação, reconhecimento,
delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por
remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o Art. 68 do
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias; a Política Nacional de
Saúde Integral da População Negra, instituída pela Portaria n. 992 de 13
de maio de 2009; o Estatuto da Igualdade Racial (Lei n. 12.288/2010); a
Lei de cotas sociais e raciais nas Instituições Federais de Ensino Superior
(IFES) (Lei n. 12.711/2012); a Lei de cotas raciais nos concursos
públicos federais (Lei n. 12.990/2014) e a Portaria n. 13/2016 do
Ministério da Educação que induziu as cotas raciais na pós-graduação
das IFES7
A proposta desta pesquisa vai de encontro com a referida Lei n. 10.639/2003
a qual introduziu a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileira e
africana nos currículos das escolas da educação básica, aspectos da história e da
cultura que caracterizam a formação da população brasileira. Tal ampliação
permitiu pesquisar não somente a história afro-brasileira mais também a própria
história da África, mas porque estudar a história da África?

Mignolo estabelece que as produções intelectuais dos integrantes da rede


modernidade/colonialidade são herdeiras diretas dos pensamentos de
resistência indígena e afro-caribenho que se desenvolveram na América

6
GOMES, Nilma LinoO. A força educativa e emancipatória do Movimento Negro em tempos de
fragilidade democrática. Teias (Rio de Janeiro), v. 21, p. 361-371, 2020. p. 361
7
Ibidem
Latina. Isto implica considerar que desde a implantação da matriz
colonial de poder tem havido uma fecunda prática epistêmica decolonial,
ainda que uma reflexão mais sistemática sobre o giro decolonial seja
recente8

Estudar sobre a história da África é fazer o que Mignolo chamou de


desobediência epistêmica, pensando como através do colonialismo se implantou um
pensamento colonial também de mentalidades, estudar sobre a educação através de
Deolinda em Angola é também pensar em uma proposta de educação decolonial.
A história do Continente Africano foi forjada por estereótipos pré-
estabelecidos pelo Ocidente. Segundo Fanon (2008, p. 46) “No caso do negro, nada
é parecido. Ele não tem cultura, não tem civilização, nem “um longo passado
histórico””9. Estruturando, desta maneira, como se os povos africanos não tivessem
história nem memória antes da presença portuguesa “embora o colonizador
classifique os nativos como primitivos, admite a existência da educação e do ensino
na sociedade nativa”10. Pensar a educação em Angola é importante, pois:

Por outro lado, dialeticamente, a educação precisa ser vista não apenas
como campo de reprodução de estruturas de dominação colonial, mas
também como um espaço de resistências11

Partindo deste pressuposto e insurgindo a teorias que foram construídas com


bases eurocêntricas, trataremos neste artigo em um recorte a partir do continente
africano, mais especificamente o processo colonial de Angola visando analisar a
chegada da igreja metodista e como isto causou ecos na formação educacional para
as mulheres. Buscando indícios de como essa educação formal causou possibilidade
de lutas e resistências ao mesmo tempo em que encontram- as contradições

8
NETO, João Colares da Mota. Educação intercultural em religião de matriz africana na Amazônia:
contribuições para uma Pedagogia Decolonial. Horizontes, v. 34, n. 1, p. 101-112, jan./jul. 2016. p.
104
9
FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EdUfba, 2008. 46
10
NETO, João Colares da Mota. Educação intercultural em religião de matriz africana na Amazônia:
contribuições para uma Pedagogia Decolonial. Horizontes, v. 34, n. 1, p. 101-112, jan./jul. 2016. p.
104
11
NETO, Teresa José Adelina da Silva. Contribuições a história da educação e cultura de Angola:
Grupos nativos, colonização e a independência. tese de doutorado, UNICAMP/Biblioteca Central,
seção circulante. p. 56, 2005.
existentes imersas na ideia de educação formal. O trabalho visa atribuir,
principalmente, centralidade ao papel da mulher por meio da educação formal na
luta contra a exploração colonial vivenciado por elas em Angola, através
principalmente da figura emblemática de Deolinda Rodrigues.

Formação de Angola e a chegada da Igreja Metodista

O território da atual Angola antes do processo expansionista europeu, era


formado por reinos constituídos que possuíam poderes instituídos, sociedades
organizadas, que ora criavam vinculo de amizade, ora vinculo de inimizade. Era
formado por regiões de grupos étnicos distintos, porém, interligados em sua maioria
pela língua, como ponto em comum, pois, a descendência originária advém do
mesmo tronco étnico-linguístico denominado Bantu.
O qual partilham cultura e valores em comum, os principais grupos étnico-
linguístico em Angola derivados da expansão Bantu antes da colonização
constituía-se, “bacongo, os quimbundos, os ovibundos, os lunda-quico, os
nganguela, os nyaneka-humbe, os herero e os ambo”12. Dentro da cultura Bantu, a
educação era dada através da oralidade, sendo repassada de geração para geração,
cada uma das etnias tinha uma maneira especifica de educar, não seguiam um único
modelo, segundo NETO, 2005 “a educação existia onde não havia escola e por toda
parte existiam grupos sociais estruturados de transmissão do saber de uma geração
para outra”13, baseados também na literatura oral, nos provérbios, contos, fabulas e
a dança.
Sendo assim, até o século XIX havia pouca presença portuguesa em Angola,
pelo fato de Portugal possuir controle apenas em algumas faixas litorâneas. Os
diversos grupos étnicos tinham total controle de seus territórios, nos quais as
relações comerciais e de poder no início do processo colonial baseava-se no
“domínio” do governo Português, mas, com a administração da pequena burguesia

12
WHEELER, Douglas; PELISSIER, René. A História de Angola. Ed. Tinta da China. Lisboa, 2009.
Pág. 32.
13
NETO, Teresa José Adelina da Silva. Contribuições a história da educação e cultura de Angola:
Grupos nativos, colonização e a independência. tese de doutorado, UNICAMP/Biblioteca Central,
seção circulante.2005, p. 56.
angolana, isto, começa a se modificar. Com a expansão Imperialista dos países que
se reuniram na conferência de Berlin (1885), onde foi estabelecido que o direito às
terras na África fosse reconhecido pela ocupação efetiva e não mais pelo direito
histórico.
Deste modo, legitimou-se a divisão territorial do continente africano,
conhecido como a partilha da África, e assim, as potências ocidentais adentram cada
vez mais, com legitimidade o processo de exploração das colônias africanas.
Resultante disto, o Estado português adota políticas de ocupações em territórios
angolanas, dividindo e delimitando em uma serie de distritos e subdistritos,
tornando a região de Luanda a parte central de Angola.

A chegada de colonos brancos, ainda que em números reduzidos,


implicou o afastamento da pequena burguesia africana do funcionalismo
público e dos empregos mais atrativos e a criação de obstáculos à
promoção social dos africanos14

O processo de exploração Portuguesa sob a colônia angolana acarretou em


transformações não só territorial, mas, mudança no contexto social e cultural
ocasionada pela imigração Europeia. Entretanto, com a migração portuguesa para
Angola, muda consequentemente a configuração do poder administrativo, gerando
uma hegemonia do poder público nas mãos de poucos portugueses. Nessa
perspectiva, a mudança reflete em uma nova configuração social, formada pelas
populações nativas (como os quimbundos) derivados dos reinos citados acima, os
colonos europeus e os assimilados. Os centros da cidade de Luanda se tornariam
os bairros europeus, enquanto a população negra era afastada para os bairros
considerados periféricos, chamados de musseques.
Com a efetivação cada vez mais acentuada da presença portuguesa em
Angola, a partir do século XIX, houveram não só mudanças no poder administrativo
como também como o ensino escolar formal em Angola, o qual iniciou-se entre os
séculos XVI e XVII através de missionários católicos que deterem-se não apenas

CASTELO, Claúdia. “Novos Brasis” em África desenvolvimento e colonialismo português tardio.


14

VARIA HISTÓRIA, Belo Horizonte, vol. 30, nº 53, p.507-532, mai/ago 2014. p. 512
ao cristianismo mais também ao ensino da língua portuguesa e da escrita, porém, o
ensino era ínfimo detendo-se apenas a poucas regiões de Angola.

A situação mudou no decorrer do século XIX, quando Portugal passou a


ocupar lentamente o território correspondente ao da Angola de hoje e,
paralelamente à acção militar, e muitas vezes a precedê-la, houve uma
acção missionária cada vez mais extensa, tanto católica como protestante.
Os missionários ligavam sempre a cristianização a uma escolarização
mais ou menos desenvolvida15

Apesar da forte presença missionária cristã em Angola e a mesma ter sido


pioneira nas questões educacional formal, detenhamos a investigação das missões
metodistas pelo fato de que as missões protestantes terem plurifuncionalidade a
evangelização mais também a educação profissionalizante. As missões Protestantes
pregavam uma base ideológica educacional ligada a liberdade de consciência, isto
pode ter influenciado nas ideologias das mulheres militantes que também lutaram
pela independência de Angola
No último quartel do século XIX, tem-se a chegada das missões protestantes
que “significou maiores oportunidades de acesso a religião, educação,
medicamentos e bens materiais do que alguma vez se tinha visto sobre o regime
católico” (WHEELER & PÉLISSIER, 2009), a relação dos missionários
protestantes com o governo português foi conflituosa e tida como ameaça,
concentrando as missões protestantes no interior de Angola. A baixo segue a lista
das primeiras organizações protestantes no território angolano:

SOCIEDADE MISSIONÁRIA BATISTA INGLESA, 1878

- São Salvador, Congo

CONSELHO AMERICANO DE COMISSÕES PARA MISSÕES ESTRANGEIRAS (Congregacionista), 1880

– Bailundo

SOCIEDADE MISSIONÁRIA BAPTISTA AMERICANA NO ESTRANGEIRO, 1882

IGREJA EPISCOPAL METODISTA, 1885 – Luanda

IGREJA UNIDA DO CANADÁ, 1886 – Bailundo

MISSÕES CRISTÃS EM MUITAS TERRAS, 1889

SANTOS, Adilson Ndondji. EDUCAÇÃO EM ANGOLA – ANTES, DURANTE E DEPOIS DA


15

INDEPENDÊNCIA. Publicado em 17 de setembro de 2014, p. 2. BALGIDO QUIAGE o nosso site.


URL: https://balgidoquiage.wordpress.com/2014/09/17/educacao-em-angola-antes-durante-e-
depois-da-independencia/. Acessado em 08 de set. 2021.
OS IRMÃOS DE PLYMOUTH, 1890 – Bié

MISSÃO FILAFRICANA , 1897 – Caluquembe

LIGA EVANGÉLICA DE ANGOLA, 1897

ALIANÇA CRISTÃ E MISSIÓNARIA, 1907

MISSÃO GERAL DA ÁFRICA DO SUL, 1914

ADVENTISTAS DO SÉTIMO DIA, 1924 – Cabinda16

Destaque para a Igreja Episcopal Metodista, ao qual chegou em Angola por


volta de 1885 com o Bispo William Taylor. Entretanto, a missão ficou restrita a
algumas partes de Angola como as regiões de Luanda, Kwanza-Norte e Malange,
devido à política colonial de fronteiras missionárias. Apesar da igreja metodista
unida estar diretamente ligada ao estabelecimento de escolas e a educação de alguns
angolanos, vale destacar que a educação formal era restrita a maioria dos angolanos,
concentrando na burguesia angolana do período colonial e isto, reflete na própria
formação de movimentos independentistas da década de 1950, segundo PAREDES
(2010):

Grande parte da elite nacionalista angolana estudou nas escolas das


igrejas protestantes; no Comité Director do MPLA, saído em Dezembro
de 1962 da Conferência Nacional, o historiador congolês Mabéko-Tali
reconhece a “predominância de dirigentes de filiação religiosa
protestante” (Mabéko-Tali, 2001: 82). Além do presidente Agostinho
Neto, o pastor metodista Domingos da Silva era o 2º vice-presidente e
Deolinda Rodrigues chefe dos Assuntos Sociais, o que leva a pensar que
talvez os dirigentes tenham sido levados a reproduzir modelos e padrões
da cultura religiosa que tiveram um papel importante na estruturação do
MPLA e deixaram marcas profundas na sensibilidade e modus operandi
do movimento de libertação17.

Entretendo, a analise busca compreender a educação formal em Angola feita


pelas missões metodista para mulheres, especialmente aquelas que fizeram parte
das resistências, se articulando por meio dos movimentos independencistas ou não.
Indo de encontro com a história eurocêntrica baseada na perspectiva que o processo
colonial foi de subalternidade. Para isto, usaremos a análise das estudantes que

16
Na versão original a frase igreja episcopal metodista não está em destaque (grifos meus).
WHEELER, Douglas; PELISSIER, René. A História de Angola. Ed. Tinta da China. Lisboa, 2009.
p. 126.
17
PAREDES, Margarida. « Deolinda Rodrigues, da Família Metodista à Família MPLA, o Papel da
Cultura na Política »,Cadernos de Estudos Africanos [Online], 20 | 2010, posto online no dia 22
Julho 2012, p. 12. consultado 17 Dezembro 2014. disponível em URL: http://cea.revues.org/135 ;
DOI : 10.4000/cea.
passaram pela educação Metodista, destaca-se a figura emblemática de Deolinda
Rodrigues, a qual faz denúncias das contradições existentes na educação formal
metodista.

A formação intelectual de Deolinda e as criticas a igreja metodista

Além de guerrilheira, atribuição que geralmente é destacada em suas


biografias, Deolinda foi integrante do Movimento Popular de Libertação de Angola
(MPLA)18 e uma das criadoras da Organização da Mulher Angolana (OMA). Cabe
ressaltar que Deolinda Rodrigues atuou como membro do Comité Diretor do
MPLA, na década de sessenta.
Entretanto, não pretendemos refletir sobre Deolinda apenas como a heroína
nacional, conforme foi divulgado posteriormente através do Movimento Popular de
Libertação de Angola. Deolinda Rodrigues, em seus escritos, aborda diversos
outros temas além da questão das lutas pela independência: questões identitárias,
educação em Angola, lutas anticoloniais em outros países, religiosidade e mesmo o
ser feminino dentro da lógica de um movimento de libertação. É assim que Deolinda
Rodrigues Francisco de Almeida adentra ao movimento pela independência
angolana, mas acabou gerando contribuições que estão bem além do recorte
exclusivo das lutas e políticas restritas ao processo anti-colonial.
Deolinda Rodrigues Francisco de Almeida nasceu em 10 de fevereiro de
1939 catete (Bengo), Angola. Filha de pais professores e integrantes da Igreja
Metodista Unida, quando criança viveu em N’Dalatando (Kwanza-norte),
Caxicane, Catete (Bengo), lugares onde seu pai prestava serviços religiosos.
Durante a juventude morou em Luanda, onde completou os estudos secundários e

18
O MPLA em sua formação deu-se aos poucos, por intelectuais angolanos pertencentes a uma
pequena burguesia mestiça urbana de Luanda. Os principais nomes que viriam compor o movimento
eram de Viriato da Cruz, Mario Pinto de Andrade e Agostinho NETO. Nomes estes, que já faziam
parte de outros pequenos grupos nacionalistas, como PLUAA – Partido de Luta Unida dos Africanos
de Angola, o MIA (Movimento para a Independência de Angola), o MINA (Movimento pela
Independência Nacional de Angola) e o PCA (Partido Comunista de Angola). A junção desses
movimentos dera origem ao MPLA. Após sua consolidação, o movimento e seus membros são
formados por mestiços, assimilados e brancos, assim como o grupo étnico Ovimbundo .
começou a atuar nos movimentos de libertação nacional. Em 1956 tornou-se
membro do movimento nacionalista angolano19.
Sendo filha de professores do ensino primário, ela, como os pais, passou
pelo processo de assimilação e acabou vivenciando “dois mundos”20: o mundo
branco, das estradas pavimentadas e da educação formal colonial, no bairro
Operário, e o mundo dos negros, através dos musseques21. Os primeiros foram
construídos no centro de Angola, para as elites portuguesas que viviam naquela
região. O segundo eram lugares periféricos para onde os angolanos foram
deslocados. Deveriam ser longe dos centros, como a vila Salazar onde viria a residir.

Imagem I – Deolinda Rodrigues

Fonte: http://www.deardeolinda.com/ acessado em: 28/12/2021

19
BARROS, Liliane Batista. As cartas da Langidila: memórias de guerra e escrita da história.
Revista do Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens.Universidade do Estado da
Bahia – UNEB. Departamento de Ciências Humanas – DCH I.NÚMERO 06 – Junho de 2013.ISSN:
2176-5782. S/P
20
PAREDES, Margarida. Women’s History. Online Publication Date: Mar 2019 DOI:
10.1093/acrefore/9780190277734.013.485. acessado em: (PDF) Rodrigues, Deolinda em Oxford
Enciclopédia | Margarida Paredes - Academia.edu
21
“Musseque inicialmente designava os terreiros agrícolas arenoso situados fora da orla marítima,
passando mais tarde a nomear os bairros pobres situados nas franjas da cidade de Luanda”
(MARCEDO, 2008. p. 115)
A educação de Deolinda se dá por meio da igreja Metodista, iniciando os
estudos na escola da missão. Apenas uma minoria de angolanos conseguiam o
acesso à educação formal. O governo Português nunca investiu em escolarização
para todos os angolanos. Temia o surgimento de resistências. Segundo Lúcio Lara,
“em 1948, nos dois liceus existentes em Luanda e no Lubango, não se encontravam
mais de cinco estudantes negros matriculados”22. O pouco que o governo colonial
fazia era com o objetivo de impor seu projeto colonial. Mesmo existindo diversas
línguas nacionais, “como: Kimbundo, Umbundu, Kicongo, Tchokwe, Mbwela,
Mbunda, Yaka e outras”, o “colonizador impôs sua língua para melhor governar e
proibia que os nativos falassem suas línguas de origem”23. O domínio da língua
portuguesa era um dos demarcadores no processo político de assimilação, Fanon,
2008 aponta:

Todo povo colonizado — isto é, todo povo no seio do qual nasceu um


complexo de inferioridade devido ao sepultamento de sua originalidade
cultural — toma posição diante da linguagem da nação civilizadora, isto
é, da cultura metropolitana24

Em 1954, Deolinda, com a mãe e os irmãos, se mudam para Luanda. No


entanto, a mãe voltou em seguida para o interior, visando ajudar o pai. Deolinda e
os irmãos permanecem na capital, sob a responsabilidade de sua tia, Maria da Silva
Neto25. Deolinda, morando na vila Salazar, continuou os estudos em uma escola
secundaria de Luanda, no Liceu Nacional Salvador Correia. Como ela, estavam
matriculados apenas 4 ou 5 alunos negros. O total de estudantes, no Liceu, era de
quase quatro mil alunos. Mas, a maioria era filho de portugueses. Os poucos negros
estudantes sofriam com o racismo promovido pelo Estado Português. Deolinda, em
12 de Janeiro de 1958, descreve um ato de violência contra seus irmãos Roberto e
Zeca, em seu diário pessoal:

22
LARA, Lúcio. Documentos e comentários para a história do MPLA (até Fev. 1961). Publicações
Dom Quixote, Lda. 1999. p. 36
23
SANTOS, Virgínia Inácio dos. A Situação da Mulher Angolana uma Análise Crítica Feminista
Pós-guerra. Mandrágora. Vol. 16, nº. 16 (2010). p.41
24
FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EdUfba, 2008, p. 34
25
Mãe de Agostinho Neto, primeiro presidente de Angola.
Rusga. Perto do chafariz encontrei o Roberto e o Zeca presos, sentados
já no chão. Aproximei-me e expliquei ao polícia que eles eram tão
estudantes do liceu como eu. Diz que não quer saber e mandou-me
embora. Afastei-me um pouco, mas continuei a barafustar. Mandou os
miúdos embora. Parece que houve nada com o Delegado que foi ao
liceu às sete por causa da ginástica. O que é que somos aqui em Luanda?
Tudo, menos seres humanos. Até quando esta merda de vida?26

Desde cedo, a experiência de segregação fez com que Deolinda se revoltasse


contra as imposições coloniais e principalmente com as questões raciais. Isso a
levou a seguir um caminho inverso ao projeto de assimilação, que para Fanon,
(2008, p. 34) “quanto mais assimilar os valores culturais da metrópole, mais o
colonizado escapará da sua selva”, mesmo que de forma escondida, Deolinda é uma
das transgressoras da ideia do negro como o selvagem se não se assemelhassem aos
moldes europeus.
Uma de suas decisões foi buscar suas raízes culturais. Então, passou a se
dedicar mais ao conhecimento da língua quimbundo. Isso foi importante, pois
permitiu a inversão da imposição colonial que priorizava o português em detrimento
da maior parte das línguas africanas. Sempre que possível, Deolinda vestias roupas
coloridas, andava descalça e trançava o cabelo, como os chamados indígenas.
Era assim sua crença na Justiça social através da educação e da cultura.
Sempre que possível, promoveu a alfabetização de pessoas nos bairros mais
periféricos de Luanda e usava a escrita como forma de resistência às imposições
coloniais, Deolinda usava da educação por que acreditava na liberdade de seu povo,
uma educação não depositaria, mas, uma educação problematizadora indo de
encontro com as ideias difundidas. Deolinda já tinha esse ideário de que o povo
precisa entender seu contexto de opressão para que houvesse a liberdade, por si
mesmo, conforme ela relata em seu diário pessoal, vejamos:
O necessário é politizar e mobilizar as massas. Estou cem por cento certa
disto: da mesma maneira que só os angolanos podem garantir para si
mesmo uma vida digna e nunca os portugueses, ainda mesmo que estejam
movidos de toda a sua boa “vontade”, assim também só mesmo as massas
podem garantir honesta e constantemente os seus próprios interesses 27

26
RODRIGUES, Deolinda. Diário de um Exílio sem Regresso. Editorial Nzila, Lda, 2OO3. p. 30
27
RODRIGUES, Deolinda. Diário de um Exílio sem Regresso. Editorial Nzila, Lda, 2OO3.
Deolinda, acreditava que se os angolanos aprendessem a ler e a escrever,
se também tivessem uma educação formal, seriam capazes de compreender e se
rebelar contra o sistema colonial português. Vale ressaltar que a educação tinha que
partir deles e por eles, este é um dos motivos pelo qual Deolinda crítica as missões
metodistas “Por isso é que a lenga lenga dos missionários são palavras vãs; a
realidade prática é outra. Por isso é importante chegar a um acordo digno com os
ianques, os portugas, etc”28. Além dessas crenças educacionais, Deolinda fazia
muitas outras críticas a educação Metodista.
A. Dina disse-me pra não fazer política (não sei como desconfiou ou
descobriu as reuniões passadas) pra não arranjar encrenca aos
missionários, à igreja e ao instituto. Nem lhe respondi. Onde for, vou
sempre falar das condições na terra. Lixem-se lá as missões e o resto. A
minha família, o meu Povo vale mais que todo o resto29

Mesmo Deolinda sendo filha de um pastor e professor da igreja Metodista


Unida, é ter perpassado pela educação formal, que pensava e desenvolvia estudos
para as mulheres, segundo PAREDES (2011) “na Igreja Metodista o estudo e a
escrita eram encarados como um potencial transformador da vida e as mulheres
eram encorajadas a estudar”, Deolinda tecia críticas a religião, mais também
relatava as articulações feitas dentro da própria igreja.

A Missão serve-nos de lugar do movimento clandestino (no escuro e no


1º andar) e com o padre Andrade (“esta batina atrapalha-me”). Até nas
reuniões de oração, nossos olhos falam política, mas a D. Doroteia pensa
que estamos a meditar na “palavra do senhor”. Estes missionários são
bons cachorros e pensam que não vemos nem sabemos a patifaria deles,
filhos da mãe. É fácil ser cristão quando se vive bem como eles: não
passam fome, não andam a pé, não são humilhados. Só depois de
recuperar nossa dignidade é que podemos decidir se viramos ou não
cristãos. Por enquanto o cristianismo não é para nós, mas se o vir à igreja
no domingo ajuda a contactar os outros e fazer o trabalho nacionalista,
então podemos vir a Igreja30

No trecho acima, referente a um dos escritos de seu diário. Percebe-se, a


relação que se articulava por muitos membros das missões em prol do movimento
nacionalista e de que modo a igreja, os institutos e as missões compactuavam com

28
RODRIGUES, Deolinda. Diário de um Exílio sem Regresso. Editorial Nzila, Lda, 2OO3. p. 105
29
IDEM, p. 37
30
RODRIGUES, Deolinda. Diário de um Exílio sem Regresso. Editorial Nzila, Lda, 2OO3. p. 31.
a ideia de uma Angola independente. Por outro lado, Deolinda Rodrigues faz uma
crítica aos próprios missionários, pois, nesse contexto os missionários não sentiam
o peso colonial, não sentiam a pressão do racismo, além da pobreza.
Apesar de muitos estudantes se articularem dentro da igreja, a igreja
metodista nem sempre compactuavam com as ideais defendidas pelos estudantes de
uma Angola independente, Deolinda escreve:
Quando já estou arrasca cá volto. Hoje trouxeram de volta os exemplares
do vocabulário fiote-português porque estão com a linguagem dos padres
e por aí fora “A Voz Missionária” voltou porque cheira a imperialismo.
Reconheço que não devia ter mandado nada disto, mas assim é que
aprendo. Tenho de esforçar-me por fazer todos os trabalhos o melhor
possível, ainda que dê mais trabalho e leve mais tempo. Outra coisa:
tenho de acabar com a correspondência para os Estados Unidos, excepto
os angolanos que lá estão. O resto acabou. Por receber “A Voz
Missionária” sou capaz de estar já ao serviço do imperialismo. Preciso de
corrigir os erros, levantar a cabeça e continuar a marchar, pelo menos
fazer o melhor para a revolução31

Deolinda faz uma reflexão sobre a trabalho dentro de tradutora dentro da


missão Metodista. A mesma chama a atenção para o vocabulário fiote-português
que trazem uma linguagem dos padres que também era uma forma de assimilação,
o qual Deolinda de “A Voz Missionária” como serviço do imperialismo, ou seja,
até ela mesma que lutava pela independência podia estar contribuindo para a
expansão colonial, conforme reitera Fanon, 2008:
A religião cristã que combate no nascedouro as heresias, os instintos" o
mal. O retrocesso da febre amarela e os progressos da evangelização
fazem parte do mesmo balanço. Mas os comunicados triunfantes das
missões informam, na realidade, sôbre a importância dos fermentos de
alienação introduzidos no seio do povo colonizado. Falo da religião cristã
e 'ninguém tem o direito de se espantar. A Igreja nas colônias é uma
Igreja de Brancos, uma igreja de estrangeiros. Não chama o homem
colonizado para a via de Deus mas para a via do Branco, a via do patrão,
a via do opressor. E como sabemos, neste negócio são muitos os
chamados e poucos os escolhidos32

Nesta perspectiva, implica-nos a pensar o papel das missões em Angola,


como a educação formal que por muitas vezes tinha o intuito de “colonização” por

31
RODRIGUES, Deolinda. Diário de um Exílio sem Regresso. Editorial Nzila, Lda, 2OO, p. 90-91)
32
FANON, Frantz. Os Condenados da Terra. Prefacio de JEAN PAUL SARTRE, Tradução' de José
Laurênio de Melo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. p. 31
meio da língua, foi também ressignificado e utilizado como formas de resistências,
articulações e denúncias no contexto colonial de intensas repressões.
A Missão serve-nos de lugar do movimento clandestino (no escuro e no
1º andar) e com o padre Andrade (“esta batina atrapalha-me”). Até nas
reuniões de oração, nossos olhos falam política, mas a D. Doroteia pensa
que estamos a meditar na “palavra do senhor”. Estes missionários são
bons cachorros e pensam que não vemos nem sabemos a patifaria deles,
filhos da mãe. É fácil ser cristão quando se vive bem como eles: não
passam fome, não andam a pé, não são humilhados (...)33

No trecho acima, percebe-se, a crítica feita a missão, uma distinção de classe


referente ao tratamento entre angolanos e não angolanos e o especialmente a relação
que se articulava por muitos membros das missões em prol do movimento
nacionalista e de que modo a igreja, os institutos e as missões compactuavam com
a ideia de uma Angola independente.
Deolinda filha de um pastor e professor da igreja Metodista Unida,
perpassou por essa educação formal o qual tinham a concepção da importância para
dos estudos para as mulheres. Isto, se deu por dois fatos, o primeiro foi que as
Igrejas metodistas criaram escolas para filhos dos pastores e membros da
comunidade, logo Deolinda estudou porque seu pai era Pastor, o segundo ponto é o
fato de que as escolas protestantes tinha uma educação feminina, questão instigante,
pois segundo PAREDES (2011) “na Igreja Metodista o estudo e a escrita eram
encarados como um potencial transformador da vida e as mulheres eram
encorajadas a estudar”, porém, mesmo fazendo parte da “família” Metodista, tido
uma educação formal e sendo membro da igreja, Deolinda tecia críticas a religião.

Metodologia e aporte teórico

Desta forma, tratando-se, da metodologia que utilizaremos para esta


pesquisa, será o uso de fontes digitais. O qual possibilitará a análise documental
sem necessariamente ir até Angola, a internet permite, segundo, Almeida (2011)
“redução no espaço” e a ampliação do historiador na pesquisa. Fontes estas

33
RODRIGUES, Deolinda. Diário de um Exílio sem Regresso. Editorial Nzila, Lda, 2OO3, p.31.
disponíveis em site “virtuais” como Biblioteca digital de Coimbra, Associação
Tchiweka de Documentação (ATD), jornais angolanos, e a fundação Mario Soares.
A Metodologia aplicada posto em pratica através da análise do Diário
pessoal de Deolinda intitulado: “Diário de um exílio se regresso”, o qual
possibilitará compreender a trajetória do dia-a-dia de Deolinda Rodrigues
juntamente do processo de independência de Angola.
Tratar a educação formal em Angola através de mulheres angolanas que
estudaram através da igreja metodista unida e suas influencias na luta anticolonial,
não é tarefa fácil. Para compreendermos de forma mais profunda tal temática,
buscaremos como base teóricas pesquisas que verse sobre como este tema. Para
isto, trabalharei com a seguinte bibliografia: Douglas Wheler e René Pélissier
(1978) que descreve desde os primeiros contatos de europeus e grupos étnicos
africano, perpassando pela formação de Angola e os primeiros ecos pela
independência de Angola, assim como a presença das missões.
Laurindo, Vieira (2007), fazendo um aparato sobre a dimensão ideológica
da educação em Angola buscando compreender a formação educacional em
Angola, antes da independência, assim como a instalações das missões metodistas.
Margarida paredes (2010), analisando a igreja metodista e o movimento MPLA
através dos escritos de Deolinda Rodrigues, o qual a autora faz uma análise da
educação de Deolinda através da igreja, sua entrada no MPLA e as críticas relatada
por Deolinda Rodrigues em seu Diário pessoal.
No aporte teórico para compreender a situação das mulheres negras em
busca de emancipação e se pensar em epistemologias que convergem com isto
usaremos os escritos, assim como a mulher inserida na política e na busca pela
emancipação, Davis (2016); (2017); (2018). Para pensar o processo colonial
desenvolvido pela Europa que subjugou homens e mulheres africanos de forma
animalizada, construindo hierarquias de uma suposta superioridade para poder
legitimar a própria colonização de corpo mais também de mente, usaremos Fanon
(2008); (1968). Neste mesmo seguimento, para com compreender o processo
colonial e a exploração do homem negro usaremos Cesarie (2021).
Considerações Finais
Deolinda Rodrigues através de seu diário íntimo releva uma história contada a partir
das suas vivências, discute a luta econômica presente em Angola, o cotidiano
vivenciado pelo povo angolano, as denúncias sobre o colonialismo português e
como a educação formal juntamente com a Igreja cristãs foram aparatos do Estado
português na política de assimilação, mas que também contraditoriamente serviu
para a luta de angolanos contra o colonialismo a partir da educação formal.
Deolinda estava nas ações práticas da luta armada, por meio de suas ações
tanto no MPLA, como articuladora nacional pela “liberdade” de Angola, através de
suas aulas nos bairros periféricos de Luanda, assim como sua assistência aos
refugiados na Guiné. O diário pessoal analisadas acima dão-nos a possibilidade de
compreendermos que o processo de libertação do continente Africano foi complexo
e diversificado, assim como o processo de libertação das colônias africanas.
Segundo Wheeler (2009) “os acontecimentos colônias exerceram profundas
influências sobre os assuntos internos de Portugal. Da mesma maneira, os
acontecimentos em Portugal influenciaram os acontecimentos nas colônias”. Deste
modo, as decisões de Portugal influenciavam diretamente em Angola e vice e versa.
Por fim, cconsiderando essas questões, a lei 10639/03 possui um caráter não
só político como histórico, já que, o currículo escolar também se constitui
eurocêntrico e excludente com a história da África e afro-brasileiro. Deste modo,
fechamos esta pesquisa destacando que apesar de Deolinda atuar também como
interlocutora na luta pela libertaçãp de Angola, sua história ainda permeia em uma
zona de “anonimato” pelo próprio desconhecimento sobre a história da África, pois,
os currículos foram pautados em uma história branca/européia. O “anonimato” de
certo modo também ocorre em seu próprio país graças a várias versões sobre a
revolução de independência

Referências

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história. Revista do Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens.
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