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Escola de História da Igreja – Patrística - Lucas Régis Lancaster

A CARTA DE SÃO CLEMENTE AOS CORÍNTIOS

Sobre a obra

➢ Autor: Trata-se do mais antigo documento papal (desconsiderando-se as duas Epístolas


canônicas de São Pedro), pois escrito pelo quarto ocupante da Sé de Roma, São Clemente I,
que segundo as fontes mais antigas governou a Igreja entre 88 e 97,
sucedendo Santo Anacleto, que sucedera São Lino, que sucedeu São
Pedro. É o mesmo Clemente mencionado por São Paulo na Carta aos
Filipenses (IV,3) e é lembrado como um grande pontífice, cuja ação
e vida a Igreja admirou e abençoou. Preso em 97 por ser cristão, foi
desterrado na Criméia onde, por seu fecundo apostolado entre os
outros presos e entre os carcereiros, foi atirado no mar com uma
âncora amarrada no pescoço. Seu corpo foi recolhido e
posteriormente levado a Roma, e atualmente jaz na igreja a ele
dedicada no bairro lateranense.
➢ A Carta: Apesar de esta carta não trazer o nome de seu autor,
reconhece-se que é do Papa Clemente por testemunho de São
Dionísio de Corinto, de Hegesipo, de Clemente de Alexandria e de
Santo Irineu. O motivo que levou-o a escrever a carta aos coríntios
foi o seguinte: alguém desorientou o povo cristão de Corinto e este
levantou-se em massa contra os seus sacerdotes, chegando a destituir
alguns deles de suas funções. O rumor deste facto insólito chegou a
Roma, onde causou bem desagradável impressão. O Papa Clemente
resolveu intervir para restabelecer a ordem com a sua autoridade,
escrevendo essa epístola à igreja de Corinto. É o mais antigo
São Clemente I, 4º Papa
documento cristão não incluído no Novo Testamento.1
➢ Data: Foi escrita no final do reinado de Domiciano, que governou entre 81 e 96. Muito
provavelmente foi escrita por volta dos anos 95 ou 96.
➢ Importância: A Carta de São Clemente foi muito lida e estimada, a ponto de muitos
considerarem-na um dos livros inspirados. Os Padres dos séculos II, III e IV citam-na com

1
Não se sabe a data exata da Didaquê, podendo ter sido escrita no século II, enquanto a Carta de São Clemente seguramente
foi escrita ainda no século I.

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louvor. Sob o aspecto teológico, tem grande valor: chamam-na “Epístola do Primado Romano”.
Também nela se encontra a primeira afirmação patrística do direito divino da hierarquia
eclesiástica e do respeito que lhe é devido. São Clemente conhecia bem as Escrituras,
mostrando-se um judeu helenista com boa formação literária e filosófica.

(Padre Insuelas. Curso de Patrologia, p. 27-29).

A estrutura do texto

➢ Se trata de uma carta extensa, com 65 capítulos que podem ser agrupados em 2 partes,
antecedidas por um preâmbulo e sucedidas por uma conclusão.:
o No preâmbulo recapitula a situação que o motivou a escrever (1-3).
o Na primeira parte, Clemente lista e explica uma série de virtudes que os coríntios devem
praticar e vícios a evitar (4-21) e como Deus recompensa aqueles que vivem segundo
sua vontade (22-36).
o Na segunda trata de restabelecer a ordem e a disciplina entre os cristãos de Corinto (37-
44) e faz admoestações urgentes em face da situação em que se encontravam (45-58).
o Conclui com uma bela oração (59-61) e com últimos conselhos aos coríntios (62-65)

Preâmbulo – Explicação do que o levou a escrever

➢ Após se desculpar pela demora a escrever, em razão “das desgraças e adversidades imprevistas”
(alude provavelmente à perseguição de Domiciano, que assolava a Igreja de Roma naquela
época), o Papa divide o preâmbulo em duas partes:
o Elogio à santidade de outrora (1-2): Muito habilmente, mas sem faltar com a verdade,
São Clemente elogia a santidade que a igreja de Corinto sempre demonstrara: fé,
piedade, hospitalidade, ciência, submissão aos chefes, boa formação dos jovens,
conduta irrepreensível das mulheres, humildade, abandono em Deus, sinceridade e
simplicidade, aversão a toda briga e divisão, etc. Porém, assim permaneceram enquanto
“toda honra e abundância vos tinham sido concedidas”, veio então a provação e, com
ela, a recalcitrância.
o Descrição do estado atual da igreja de Corinto (3): Surgiram então ciúme e inveja,
rixa e revolta, perseguição e desordem, guerra e cativeiro. Os sem honra se rebelaram
contra os honrados, os obscuros contra os ilutes, os jovens contra os anciãos. Não mais

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se comporta de maneira digna de Cristo e cada qual anda “segundo as paixões de seu
mau coração”. É para corrigir este estado que o Papa escreve essa epístola.

Primeira Parte – As virtudes a praticar e a recompensa de Deus

➢ Na primeira parte, que pode por sua vez ser dividida em outras duas, Clemente exorta os
cristãos de Corinto à prática das virtudes. Não lista virtudes abstratamente, mas aquelas que,
em razão da situação daquele bispado, os coríntios mais deveriam buscar e os vícios que mais
deveriam evitar. Em cada parágrafo cita numerosos exemplos
da Escritura e dos santos para instrui-los e exortá-los:
o Contra a inveja (4-6): Como este parecia ser o
principal vício que corroía a comunidade coríntia (que
levou uns a se rebelarem contra outros), Clemente cita
os exemplos de Abel, José, Moisés e Davi (todos
vítimas de inveja), assim como de São Pedro e São
Paulo, que sofreram muitas perseguições por causa do
ciúme e da inveja, para demonstrar quanta destruição
e injustiça este terrível pecado provoca.
o Arrependimento (7-8): Além de se valer de
testemunhos da Escritura para exortar os coríntios ao
arrependimento (Noé e Jonas), Clemente cita três
passagens dos livros sagrados em que o próprio Deus Caim e Abel

diz que perdoará o pecador arrependimento. Não existem limites para sua misericórdia,
pois “na sua onipotente vontade, ele decidiu que todos os seus amados tenham
possibilidade de arrependimento”.
o Obediência (9-10): Cita os exemplos de Henoc, Noé e Abraão, que obedeceram a Deus
e foram recompensados.
o Fé (10-12): Abraão, Ló e Raab cream em Deus. Ló ter sido salvo da destruição e
Sodoma demonstra que o Senhor “não abandona os que nele esperam e manda
punições e tormentos para aqueles que se rebelam”, ao mesmo tempo que a proverbial
falta de fé da mulher de Ló lhe valeu um castigo que serviria de sinal a todos os
“dúplices de coração e que duvidam do poder de Deus”. Conclui falando de Raab, a
prostituta que se salvou da destruição de Jericó e que, pelo sinal que dependurou em

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sua janela para não ser morta (o tecido escarlate), profetizava “que o sangue do Senhor
resgataria todos aqueles que acreditam e esperam em Deus”.
o Humidade e mansidão (13-19): Parece que a soberba e a ira eram dois dos pecados
que mais atribulavam a Sé de Corinto. São Clemente os exorta lembrando que “é justo
e santo obedecer a Deus, mais do que seguir aqueles
que, por orgulho e revolta, se tornaram chefes de
odiosa inveja” e conclamando-os a se unirem “àqueles
que vivem piedosamente a paz, e não àqueles que
fingem querer a paz”. Para além dos múltiplos
exemplos veterotestamentários que oferece de
personagens que viveram a humildade – Elias, Eliseu,
Ezequiel, Jó, Moisés, Abraão, Davi -, se alonga citando
Cristo como o grande exemplo de humildade e
mansidão, lembrando-os que Ele poderia vir em
majestade, mas veio humilde e pobre. Reproduz a
profecia de Isaías a respeito do “homem das dores” e a
passagem dos Salmos em que Cristo diz-se “verme, e Cristo apresentado por Pilatos à multidão – “Ecce
Homo!”
não homem, opróbio dos homens e desprezo do povo”.
Conclui dizendo: “Vede o modelo que nos foi dado! Se o Senhor se humilhou dessa
maneira, que faremos nós que, por meio dele, fomos colocados sob o jugo de sua
graça?” (16,17).
o Harmonia, paz e concórdia (20-21): Talvez este seja um dos trechos mais
interessantes da parte I, pois demonstra uma clara influência helenística no pensamento
de São Clemente: se para tratar das outras virtudes traz exemplos da Escritura e da
história sagrada, para exortar os coríntios à paz recorre à criação. Outrossim, aplica,
como os gregos, a ordem do cosmos à comunidade humana, a harmonia e a hierarquia
da criação à Igreja: assim como a Criação é harmônica (os céus, o dia e a noite, a terra,
os astros, as feras, o mar, o oceano, as estações), ou seja, “assim como Criador e Senhor
do universo ordenou que todas essas coisas se executem na paz e na concórdia”,
também na Igreja deve ser respeitada a ordem e a hierarquia: respeitar os pastores,
honrar os anciãos, instruir os jovens, ensinar as mulheres, educar os filhos, etc. Porém,
o que diferencia as palavras de São Clemente de uma visão naturalística de vida, é a
forma como ele conclui o capítulo 20: “Ele espalha seus benefícios sobre toda a
criação, mas a nós ele os prodigaliza superabundantemente, quando recorremos à sua

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misericórdia por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo”. Ou seja, existe uma ordem
natural que deve ser modelo para a ordem eclesial, mas existe uma outra ordem da qual
fomos beneficiários – a sobrenatural – que a nenhuma outra criatura foi concedida,
somente ao homem batizado.
➢ Concluindo a explanação a respeito das virtudes a serem buscadas e dos
pecados a serem evitados, São Clemente aborda o modo como Deus
recompensa aqueles que vivem segundo Sua vontade (22-36):
o Necessidade de confiar na Palavra de Deus e esperar o
melhor dos prêmios ou o pior dos castigos (23-28): A
ressurreição futura é o prêmio a ser esperado. O santo usa
exemplos naturais para fundamentar nossa esperança (os ciclos
da natureza e a fênix, que renasce das cinzas) e a própria palavra
de Cristo. Ao mesmo tempo, deve-se destruir “os desejos
impuros e as ações vis, para que sejamos protegidos, pela sua
misericórdia, dos julgamentos futuros”. Assim, do mesmo
modo como Ele recompensa o justo, o injusto não conseguirá esquivar-se de sua justiça.
o Servir a Deus como os anjos (35): Como os anjos reunidos em torno do trono de Deus,
“clamemos com insistência para que tenhamos parte nas suas grandes e magníficas
promessas”.
o Os dons de Deus pelos quais devemos lutar (35): Clemente lista alguns: vida na
imortalidade, esplendor na justiça, verdade na franqueza, fé na confiança, o domínio de
si na santidade. São essas as coisas preparadas para aqueles que esperam. “Nós,
portanto, lutamos para sermos encontrados no número dos que esperam, a fim de
participarmos dos dons prometidos”.
➢ São Clemente I termina essa primeira parte com uma bela exaltação a Jesus Cristo, lembrando
os coríntios “o caminho no qual encontramos a nossa salvação: Jesus Cristo, o sumo sacerdote
de nossas ofertas, o protetor e auxílio da nossa fraqueza” (36,1).

Segunda parte – A sucessão apostólica e conselhos urgentes

➢ Apesar de a primeira parte ser mais longa, o cerne da carta está na segunda, entre os capítulos
37 e 58. Na primeira parcela da segunda parte, Clemente explica como se dá o funcionamento
da Igreja (é o cerne da carta, pois os coríntios haviam, sem razão justa, deposto presbíteros de

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boa conduta). Trata-se do mais antigo escrito cristão não canônico que fala da origem divina
do sacerdócio católico:
o A Igreja enquanto exército (37): Clemente faz uma analogia militar para explicar a
Igreja: “consideremos os soldados que servem sob as ordens de nossos governantes:
com que disciplina, docilidade e submissão eles executam as funções que lhes são
designadas! Nem todos são comandantes. Cada um, porém, no seu próprio posto,
executa aquilo que lhe é prescrito pelo rei e pelos governantes”.
o A Igreja enquanto corpo (38-41): A Igreja é como um corpo com muitíssimos
membros, cada qual com sua função, mas todos concorrendo para o bem comum. Cada
um deve agir, de boa consciência, com dignidade, sem violar as regras que foram
determinadas para sua função.
o A sucessão apostólica (42-44): São Clemente diz em termos claros no que consiste o
sacerdócio católico – uma ordem divinamente instituída: “Os apóstolos vêm de Cristo
e Cristo vem de Deus”, “pregavam pelos campos e cidades, e aí produziam suas
primícias, provando-as pelo Espírito, a fim de instituir com elas bispos e diáconos dos
futuros fiéis”. E evidencia mais adiante: “os apóstolos instituíram aqueles de quem
falávamos antes, e ordenaram que, por ocasião da morte desses, outros homens
provados lhes sucedessem no ministério”. E narra a conduta dos coríntios: “Para nós,
não seria culpa leve se exonerássemos do episcopado aqueles que apresentaram os
dons de maneira irrepreensível e santa”. E quanto aos presbíteros, “vemos que, apesar
da ótima conduta deles, removestes alguns das funções que exerciam de modo
irrepreensível e honrado”.

A Sucessão Apostólica

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➢ Em face de tudo quanto dito, faz uma série de últimas exortações aos coríntios:
o Apegar-se aos homens santos (45): Citando exemplos da Escritura, mostra que os
justos foram perseguidos pelos ímpios e inimigos de Deus, não pelos virtuosos.
Devemos nos apegar aos santos, inocentes e justos, porque eles são os eleitos de Deus.
o Manter a unidade (46-47): Havendo entre eles um só Deus, um só Cristo, um só
Espírito de graça, ou seja, uma só fé, não há por que haver brigas, ódios, disputas,
divisões e guerras. Cita a Carta que São Paulo escreveu aos próprios coríntios,
exortando-os a não fazerem preferências entre os apóstolos. Seu erro agora era maior,
pois eles se levantavam contra o clero motivados por duas pessoas de má conduta.
o Fazer tudo no amor (49-50): “Somos felizes, caríssimos, se praticamos os
mandamentos de Deus na concórdia e no amor, a fim de que, pelo amor, nossos pecados
sejam perdoados”.
o Confessar os pecados (51-53): Os que pecaram, peçam perdão. “Os que foram chefes
da revolta e da divisão devem considerar o que nos é comum na esperança”, devem se
arrepender. “Irmãos”, acrescenta, “o Senhor do universo não tem necessidade de nada.
Ele não pede nada a ninguém, a não ser que se confesse a Ele”.
o Se sacrificar pelo bem da Igreja (55): Aqueles que são causa de distúrbio na Igreja,
que se retirem, e agirão de modo meritório perante Deus.
o Correção fraterna e submissão (56-57): Exortava os coríntios a se corrigirem
mutuamente e a aceitarem a correção fraterna. Ademais, ordenava que os que iniciaram
a revolta, se arrependessem e dobrassem os joelhos de seu coração: “Aprendei a
submeter-vos, depondo a soberba e a orgulhosa arrogância da vossa língua. É melhor
para vós ser encontrados pequenos e dentro do rebanho de Cristo, do que ter
aparências de grandeza e ser rejeitados de sua esperança” (57,2).
➢ Conclui as exortações com uma lembrança da justiça divina (57,3-7) e do castigo aos que não
tiverem cumprido os mandamentos (58).
➢ Encerra com uma frase definitiva: “Se alguns desobedecem ao que nós lhe dissemos da parte
de Deus, saibam eles que estão incorrendo em falta e não poucos perigos” (59).

Conclusão

➢ No encerramento da carta, São Clemente insere uma bela oração a Deus (59-61), no curso da
qual suplica para a Igreja as virtudes das quais os coríntios viam-se necessitados: “Torna-nos
submissos ao teu nome onipotente e virtuosíssimos, e aos nossos chefes e aos que nos governam

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sobre a terra. Tu, Senhor, lhes deste o poder da realeza, pela tua força, magnífica e indizível
para que nós, conhecendo a glória e a honra que lhes foi dada, obedecêssemos a eles, sem nos
opor à tua vontade.” E pede ainda pelos sacerdotes: “Dá-lhes, Senhor, a saúde, a paz, a
concórdia e a constância, para que exerçam com segurança a soberania que lhes deste. Tu,
Senhor celeste, rei dos séculos, concede aos filhos dos homens glória, honra e poder sobre as
coisas da terra. Dirige, Senhor as decisões deles, conforme o que é bom e agradável a ti, para
que, exercendo com paz, mansidão e piedade, o poder que lhes foi dado por ti, possam alcançar
de ti a misericórdia” (61,1-2).
➢ Conclui ordenando que os coríntios cessem definitivamente as divisões e se submetam aos
legítimos pastores: “Convém que nós, com tantos e tantos exemplos, curvemos a fronte e
ocupemos o lugar que nos cabe pela obediência. Desistamos da vã revolta, para alcançarmos
irrepreensivelmente o escopo que nos é proposto na verdade. Vós nos dareis alegria e
contentamento, se obedecerdes ao que escrevemos por meio do Espírito Santo, se acabardes
com a cólera injusta da vossa inveja, segundo o pedido, que vos dirigimos nesta carta, tendo
em vista a paz e a concórdia” (63,1-2).

Outros aspectos notáveis da carta

➢ No decorrer de suas exortações e argumentações, São Clemente aduz algumas informações


importantes e de muito valor a respeito da fé e da prática da Igreja Antiga:
o Seguir a “Tradição”: “Deixemos, portanto, as preocupações vazias e inúteis, e
sigamos a norma gloriosa e veneranda da nossa tradição” (7,2).
o Salvação pela fé e pelas obras: Apesar de a justificação se dar pela fé (32,3), nem por
isso “cessaremos de fazer o bem e abandonaremos a caridade. Ao contrário,
enforcemo-nos com zelo e ardor para praticar toda obra boa” (33,1). E mais: “É
preciso, portanto, que sejamos prestimosos em fazer o bem. Com efeito, é dele que
provêm todas as coisas”. E cita o Provérbio (XXIV,12): “Eis o Senhor, seu salário está
diante dele, para retribuir a cada um segundo a sua obra”. Razão pela qual conclui que
devemos “crer nele de todo o coração, não sendo inoperantes e desleixados em
nenhuma obra” (34,1-4). Repete, portanto, o que dissera São Tiago (II,26): “A fé sem
obras é morta”.
o Preocupação com a formação cristã dos filhos: “Que nossos filhos participem da
educação em Cristo; aprendam qual é o poder da humildade junto de Deus; qual o

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poder do amor casto junto dele; como o temor de Deus é belo, como é grande e como
salva aqueles que vivem santamente nele, de coração puro!” (21,8).
o Reza pelos governantes: Na oração final, São Clemente inclui os governantes terrenos
em sua oração, uma evidente prova de que os cristãos não eram inimigos de César e do
Império como eram acusados de ser: “Tornamo-nos submissos ao teu nome onipotente
e virtuosíssimo, e aos nossos chefes e aos que governam sobre a terra” (60,4).
o O caráter sobrenatural da religião cristã: A mentalidade naturalista que há seis
décadas invadiu a Igreja, confundindo a ordem natural com a sobrenatural, encontra um
estrondoso obstáculo no capítulo 20 da Carta de São Clemente. Com efeito, ele usa a
comparação cosmológica para explicar a ordem que deve existir na Igreja: como tudo
na criação existe de acordo com uma ordem estabelecida por Deus (ordem natural), na
Igreja também há de existir uma ordem semelhante. Porém, ele ressalta que “a nós”, ou
seja, aos membros da Igreja, Deus “prodigaliza superabundantemente” seus benefícios,
“quando recorremos à sua misericórdia por meio de Nosso Senhor Jesus Cristo”
(20,11). Se trata de uma evidente diferenciação da ordem natural, pela qual toda a
criação recebe dons de Deus, da ordem da graça, cujos benefícios, por Jesus Cristo, são
“superabundantemente prodigalizados”.

São Clemente I, Papa e Padre da Igreja, rogai por nós e por vosso sucessor, o
Papa Francisco!
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