Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ISSN: 2525-8761
Fabiana Brandão
Departamento de Farmácia, Faculdade de Saúde Universidade de Brasília, Campus
Darcy Ribeiro, Asa Norte, Brasília, Brasil.
RESUMO
Objetivo: Atualizar panorama epidemiológico dos mecanismos de resistência em
Pseudomonas aeruginosa no Brasil, frente a classe de antibióticos carbapenêmicos.
Método: Revisão atualizada de publicações disponíveis na base de dados PUBMED.
Resultados: P. aeruginosa adquire resistência aos carbapenêmicos através dos
mecanismos de transferência horizontal, mediante aquisição de genes que codificam
carbapenemases do tipo MβL (Metalo -β - Lactamases). Os dados analisados apontam
que os genes SPM-1 e IMP-1 são responsáveis pela dispersão dos principais perfis de
resistência a carbapenêmicos, estando distribuídos em vários estados, como: Bahia,
Ceará, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Recife, Rio de
Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo. Conclusão: P. aeruginosa em ambiente
hospitalar é causa recorrente de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde. A
prevalência e disseminação de cepas multirresistentes é um problema de saúde pública,
causa de falhas no tratamento, além de aumentar as taxas de morbidade. Compreender e
discernir os mecanismos de resistência bacteriana, permite a identificação adequada do
agente infeccioso, sendo ponto fundamental para conter o elevado risco de surtos.
ABSTRACT
Aim: To update the epidemiological panorama of the resistance mechanisms in
Pseudomonas aeruginosa in Brazil, against the class of carbapenem antibiotics. Method:
Updated review of publications available in the PUBMED database. Results: P.
aeruginosa acquires resistance to carbapenems through horizontal transfer mechanisms,
through the acquisition of genes that encode carbapenemases of the MβL type (Metalo -
β – Lactamases). The analyzed data show that the SPM-1 and IMP-1 genes are responsible
for the dispersion of the main carbapenem resistance profiles, being distributed in several
states, such as Bahia, Ceará, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais,
Paraná, Recife, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul and São Paulo. Conclusion: P.
aeruginosa in a hospital environment is a recurrent cause of Health Care Related
Infections. The prevalence and spread of multi drug-resistant strains is a public health
problem, a cause of treatment failures, in addition to increased morbidity rates.
Understanding and discerning the mechanisms of antibiotic resistance, allows the proper
identification of the infectious agent, being a fundamental point to contain the high risk
of outbreaks.
1 INTRODUÇÃO
Pseudomonas aeruginosa é um bacilo Gram-negativo aeróbio, móvel e não
fermentador de glicose que pode proliferar em vários ambientes. No Brasil, P. aeruginosa
vem sendo importante causador de infecções nosocomiais, sendo considerado o patógeno
mais prevalente associado a pneumonia nosocomial e o terceiro em infecção primária da
corrente sanguínea em unidades de terapia intensiva (UTI).1 Além disso, é considerado
pela comunidade científica internacional como um patógeno multirresistente.2
Na prática clínica os carbapenêmicos são considerados opções de tratamento para
a erradicação de infecções bacterianas graves causadas por bactérias resistentes às
cefalosporinas e penicilinas.3 Todavia, a resistência aos carbapenêmicos têm sido
observada em espécies da ordem Enterobacterales e em não fermentadores, como P.
aeruginosa.4 A resistência aos carbapenêmicos pode ocorrer devido a baixa de penetração
das substâncias ativas, ou seja, mutações nos genes que sintetizam proteínas de membrana
do tipo porinas e/ou bombas de efluxo,4 além da produção de enzimas carbapenemases,
sendo este último um mecanismo de elevada relevância, devido a exponencial diversidade
dessas enzimas, particularmente as metalo-β-lactamases (MβL).5
Nesse contexto, o Brasil implantou recentemente o Brazilian Committee on
Antimicrobial Susceptibility Testing (BrCAST), um comitê designado para determinar e
rever, periodicamente, pontos de corte para interpretação dos testes de suscetibilidade aos
2 MÉTODOS
Foi realizada uma revisão a partir de leituras sobre a temática de resistência de P.
aeruginosa frente aos carbapenêmicos no Brasil, publicados em periódicos e/ou
documentos de órgãos oficiais. Para a busca dos periódicos foram consultadas as bases
de dados PUBMED, utilizando os seguintes descritores: Drug Resistance, Multiple,
Bacterial; Carbapenems; Pseudomonas; Brazil; Epidemiology; Genes, MDR (Multi
Drug Resistence). Como critérios de inclusão foram adotados estudos originais
publicados nos idiomas português e inglês com enfoque em P. aeruginosa, genes de
resistência, epidemiologia, mortalidade, que foram publicados nos últimos cinco anos.
Documentos com dados epidemiológicos de órgãos oficiais sobre o tema também foram
incluídos.
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Carbapenêmicos
Pertencentes a classe dos beta-lactâmicos, como as penicilinas e as cefalosporinas,
os antimicrobianos carbapenêmicos possuem potente ação inibitória da síntese da parede
bacteriana, ligando as proteínas de ligação de penicilina (PBP-2, PBP-3, PBP-4), que
inibem a etapa final de transpeptidação da síntese peptidoglicana nas paredes celulares
bacterianas. Dessa forma, apresentam ação bactericida e de amplo espectro de ação, com
sua metabolização não é mediada por CYP, o que diminui o risco de interações
medicamentosas.8
Diante disso, os carbapenêmicos constituem a terapia antimicrobiana de escolha
para tratamento de infecções hospitalares graves causadas por Gram-negativos.8
A resistência aos carbapenêmicos em P. aeruginosa aos carbapenêmicos é de até
60% em alguns hospitais brasileiros,22 ocorrendo principalmente pela produção de
carbapenemases do tipo metalo-β-lactamases (MβL).10 Estudos mostram que a
prevalência de MβL como mecanismo de resistência aumentou, principalmente na
América Latina,23 onde tem se mostrado cada vez mais comum. Dentre as classes
conhecidas das enzimas MβL estão IMP (Imipenemase), VIM (Verona Imipenemase),
SPM-1 (São Paulo Imipenemase), GIM (Germany Imipenemase), SIM-1 (Seul
Imipenemase), AIM-1 (Australian Imipenemase),24 KHM (Kyorin University Hospital)16
e NDM-1 (New Delhi Imipenemase).26 Aqui no Brasil, em P. aeruginosa as subclasses
que apresentam mais prevalentes são IMP-1 e SPM-1 16 (Figura 1).
Figura 1 - Esquema representativo ilustrando o papel dos antibióticos da classe carbapenêmicos e o efeito
inativador das enzimas Metalo-𝛃-lactamases, sintetizadas mediante presença dos plasmídeos de resistência
móvel SMP-1 e IMP-1 em P. aeruginosa.
Epidemiologia
Nos últimos anos, a produção de MβLs por isolados de P. aeruginosa assumiu
importância epidemiológica e estão associados a altas taxas de mortalidade.
Rio Grande do Sul: Estudo em dois hospitais universitários de Porto Alegre, sul
brasileiro, demonstrou uma alta prevalência de resistência em isolados de P. aeruginosa
a ceftazidima e/ou imipenem. Foram 35,9% produtores de MBL, dentre os quais, o gene
SPM-1 foi encontrado em 18 isolados e IMP-1 em 5 isolados.20
São Paulo: SPM-1 foi detectado e relatado pela primeira vez em 2001 em São Paulo,16 e
posteriormente em outras cidades do Brasil, além disso, vários estudos têm demonstrado
sua disseminação global e potencial pandêmico, causando importante morbimortalidade
em infecções hospitalares.17,18
Além dos locais descritos anteriormente, há artigos mostrando outros estados
(Distrito Federal, Bahia, Ceará, Goiás e Rio Grande do Sul) que observaram a presença
de cepas multirresistentes de P. aeruginosa com a presença do gene SPM-1. Contudo,
estes estudos carecem de informações, portanto, não foram abordados no texto acima.19-
21
Internações e mortalidade
Há um crescente número de internações causadas por micro-organismos Gram-
positivos ou negativos nos sistemas de saúde. Esses isolados aumentam os gastos em
saúde e dificultam o tratamento, piorando o prognóstico do paciente.7
Estudos com foco em inquéritos epidemiológicos alertam para a importância de
isolados de P. aeruginosa, visto que essas linhagens bacterianas são classificadas como
problema de saúde pública mundial, caracterizada pela expressão de múltipla resistência
a antibacterianos associada a uma difícil erradicação da doença, devido ao perfil
multirresistente, e por apresentar elevadas taxas de morbimortalidade.27 Um conjunto de
características do hospedeiro podem facilitar a infecções por micro-organismos
resistentes como: idade avançada, fibrose cística, câncer, doenças cardiovasculares,
diabetes, uso indiscriminado de antimicrobianos, procedimentos invasivos – hemodiálise,
ventilação mecânica, traqueostomia, cateteres, tubo nasogástrico, etc.5,29 A grande
maioria dos casos de cepas multirresistentes de P. aeruginosa estão relacionadas à
assistência à saúde, em pacientes hospitalizados. Muito embora a P. aeruginosa se adapte
aos mais variados nichos ecológicos, podendo dispersar facilmente em outros ambientes.
4 CONCLUSÃO
P. aeruginosa são bactérias Gram-negativas com uma gama de fatores de
virulência, e uma versatilidade notória em exibir resistência a antibióticos de uso clínico.
Juntos, esses fatores favorecem a colonização e o processo infeccioso.
Há necessidade em alertar para a relevância ímpar na saúde pública, mediante ao
risco elevado de surtos, ainda mais no contexto sanitário atual com a pandemia do SARS-
CoV-2 e surto do fungo multirresistente, C. auris. Dessa forma, a significativa proporção
de infecções causadas por P. aeruginosa e a crescente resistência aos antimicrobianos
disponíveis, ressalta a importância de estudos epidemiológicos para a análise do Brasil,
com ênfase nos estados em que não há nenhum estudo relacionado. Ainda, a atuação das
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a Universidade de Brasília, ao Departamento de Farmácia e ao
corpo docente do curso de Farmácia pelo apoio.
REFERÊNCIAS
1. Winn Jr WC, Allen SD, Janda WM, Koneman E, Procop G, Schreckenberger PC,
et al. Bacilos gram-negativos não fermentadores. In: Toros EF, editor. Koneman
Diagnóstico Microbiológico, Texto e Atlas Colorido, 6th ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan; 2008. p. 302-386.
3. Kroop H, Sundelf JG, Kahan JS, Kahan FM, Birnbaum J. (1985). MK0787 (N-
formimidoyl thienamycin): evolution of in-vitro and in-vivo activities. Antimicrobial
Agents and Chemotherapy 17, 993–1000.
5. Jácome Paula Regina Luna de Araújo, Alves Lílian Rodrigues, Cabral Adriane
Borges, Lopes, Ana Catarina Souza, Maciel Maria Amélia Vieira. Phenotypic and
molecular characterization of antimicrobial resistance and virulence factors in
Pseudomonas aeruginosa clinical isolates from Recife, State of Pernambuco, Brazil. Rev.
Soc. Bras. Med. Trop. https://doi.org/10.1590/S0037-86822012000600010.
8. Bradley, J.S. et al. Carbapenems in clinical practice: a guide to their use in serious
infection. Int. J. Antimicrob. Agents, 11: 93-100, 1999.
10. Mendes, R. E., Castanheira, M., Pignatari, A. C. C., & Gales, A. C. (2006).
Metallo-beta-lactamases. Jornal Brasileiro de Patologia e Medicina Laboratorial, 42(2),
103-113.
11. Sader, H. S., Reis, A. O., Silbert, S., & Gales, A. C. (2005). IMPs, VIMs and
SPMs: the diversity of metallo‐β‐lactamases produced by carbapenem‐resistant
Pseudomonas aeruginosa in a Brazilian hospital. Clinical Microbiology and Infection,
11(1), 73-76.
12. Maciel Wirlaine Glauce, Silva Kesia Esther da, Bampi José Victor Bortolotto, Bet
Graciela Mendonça dos Santos, Ramos Ana Carolina, Gales Ana Cristina et al .
Identification of São Paulo metallo-beta-lactamase-1-producing Pseudomonas
aeruginosa in the Central-West region of Brazil: a case study. Rev. Soc. Bras. Med. Trop.
https://doi.org/10.1590/0037-8682-0284-2016.
13. Kalluf, K. O., Arend, L. N., Wuicik, T. E., Pilonetto, M., & Tuon, F. F. (2017).
Molecular epidemiology of SPM-1-producing Pseudomonas aeruginosa by rep-PCR in
hospitals in Parana, Brazil. Infection, Genetics and Evolution, 49, 130-133.
14. Cavalcanti, F. L. D. S., Mirones, C. R., Paucar, E. R., Montes, L. Á., Leal-Balbino,
T. C., Morais, M. M. C. D., ... & Ocampo-Sosa, A. A. (2015). Mutational and acquired
carbapenem resistance mechanisms in multidrug resistant Pseudomonas aeruginosa
clinical isolates from Recife, Brazil. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, 110(8), 1003-
1009.
15. Cacci LC, Chuster SG, Martins N, Carmo PR, Girão VB, Nouér SA, Freitas WV,
Matos JA, Magalhães AC, Ferreira AL, Picão RC, Moreira BM. Mecanismos de
resistência a carbapenêmicos em isolados endêmicos de Pseudomonas aeruginosa após
cepa produtora de metalo-β-lactamase SPM-1 em unidade de terapia intensiva de um
hospital universitário no Brasil. Mem Inst Oswaldo Cruz. Setembro de 2016; 111 (9):
551-8. doi: 10.1590 / 0074-02760160116.
16. Araujo, B. F., Ferreira, M. L., Campos, P. A. D., Royer, S., Batistão, D. W. D. F.,
Dantas, R. C. C., ... & Gontijo-Filho, P. P. (2016). Clinical and Molecular Epidemiology
of Multidrug-Resistant P. aeruginosa carrying aac (6')-Ib-cr, qnrS1 and bla SPM Genes
in Brazil. PloS one, 11(5), e0155914.
17. Hong DJ, Bae IK, Jang IH, Jeong SH, Kang HK, Lee K. Epidemiology and
Characteristics of Metallo-β-Lactamase-Producing Pseudomonas aeruginosa. Infec
Chemother. 2015; 47 (2): 81-97.
18. Fonseca EL, Marin MA, Encinas F, Vicente ACP. Full characterization of the
integrative and conjugative element carrying the metallo-β-lactamase bla SPM-1 and
bicyclomycin bcr1 resistance genes found in the pandemic Pseudomonas aeruginosa
clone SP/ST277. J Antimicrob Chemother. 70 (9):2547-50. 2015.
19. Gales, A. C., Menezes, L. C., Silbert, S., & Sader, H. S. (2003). Dissemination in
distinct Brazilian regions of an epidemic carbapenem-resistant Pseudomonas aeruginosa
producing SPM metallo-β-lactamase. Journal of Antimicrobial Chemotherapy, 52(4),
699-702
24. Yong D, Toleman MA, Giske GC, et al. Caracterização de um novo gene de
metalo-beta-lactamase, bla (NDM-1), e um novo gene de eritromicina esterase carregado
em uma estrutura genética única na sequência de Klebsiella pneumoniae tipo 14 da Índia.
Antimicrob Agents Chemother. 2009; 53: 5046-5054.
26. El Salabi A., Borra PS, Toleman MA, et al. Caracterização genética e bioquímica
de uma nova metalo-β-lactamase, TMB-1, de uma cepa de Achromobacter xylosoxidans
isolada em Tripoli, Líbia. Antimicrob Agents Chemother . 2012; 56: 2241-2245.
27. Lopes, A. C. C., da Silva, C. A. L., de Oliveira, J. S., & Alves, J. T. C. (2020).
Fatores de risco para infecção por pseudomonas aeruginosa em relação à infecções
hospitalares/Risk factors for pseudomonas aeruginosa infection in relation to hospital
infections. Brazilian Journal of Development, 6(1), 2121-2130.
29. Federico, M. P., & Furtado, G. H. (2018). Immediate and later impacts of
antimicrobial consumption on carbapenem-resistant Acinetobacter spp., Pseudomonas
aeruginosa, and Klebsiella spp. in a teaching hospital in Brazil: a 10-year trend study.
European Journal of Clinical Microbiology & Infectious Diseases, 37(11), 2153-2158.
30. Borges LFA, Rocha LA, Nunes MJ, Gontijo Filho PP. Low Compliance to
Handwashing Program and High Nosocomial Infection in a Brazilian Hospital. Hindawi
Publishing Corporation Interdisciplinary Perspectives on Infectious Diseases 2012: 579–
681. doi: 10.1155/2012/579681.