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INSTITUTO BRASILEIRO DE ENSINO, DESENVOLVIMENTO E PESQUISA


CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
Disciplina: Direito e Gênero
Professor: Gabriela Rondon
Estudante: Marta Cristina Feliciano Rodrigues

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA DE:


GOMES, Juliana. O Supremo Tribunal Federal em uma perspectiva de gênero: mérito,
acesso, representatividade e discurso. Disponível em: http://www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/25237; DINIZ, Debora; PAIVA,
Juliana. Mulheres e prisão no Distrito Federal: itinerário carcerário e precariedade da
vida. Revista Brasileira de Ciências Criminais, v. 111, p. 313-328, 2014.

O texto em comento trata-se de artigo científico publicado pela Revista


Brasileira de Ciências Criminais pelo IBCCRIM, tem como objeto análise do perfil das
mulheres presas no regime fechado no Presídio Feminino do Distrito Federal (PFDF,
vulgarmente conhecido como colmeia. Trás a pauta, características que demonstram os
indicadores de precariedade de vida, muitas vezes o divisor de água para estarem no
sistema penitenciário, assim como ênfase em suas próprias trajetórias de vidas
distintamente do que normalmente acontece, as custodiadas pela perspectiva de gênero
são anuladas pelas suas funcionalidades do lar, família e filhos.

Nesse sentido, coaduna-se com o perfil dos homens em reclusão os


indicadores femininos, jovens, com pouco estudo, desempregados ou em empregos
informais, responsáveis pelo sustento de seus lares, em contexto de vulnerabilidades,
todavia, há para as mulheres o adicional de perspectiva de gênero o qual em grande
medida intensifica a vulnerabilidade dessas mulheres. Conforme exposto pela autora:
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A pergunta “qual é o custo para a sociedade e para cada


família quando uma mulher é enviada para a prisão?”,
apesar de correta, encobre um passado de opressão a essas
mesmas mulheres que visa proteger. Talvez a pergunta justa
seja “quais domínios de precariedade foram vividos pelas
mulheres antes de chegarem ao presídio na vida adulta?” A
precariedade da vida se expressa de maneira desigual entre
homens e mulheres. Ser uma mulher pobre, negra, pouco
escolarizada e com trabalho informal resulta em uma
corporificação distinta daquela de seus companheiros
homens. (p.14)

O perfil sociodemográfico apresentado pelas autoras demonstra a


seletividade para com as mulheres reclusas na capital federal, haja vista que se trata
jovens (51%), pretas e pardas (67%), com pouco estudo (71% com ensino
fundamental incompleto), trabalhadoras domésticas e informais (70%) e etc. Na
perspectiva de gênero, observa-se que 80% delas tem filhos fora da prisão e
declaram ter companheiros ou familiares no sistema carcerário. Sobre essa questão,
trabalha o artigo sob a hipótese de que há uma circulação familiar afetiva na
economia da ilegalidade, ou seja, não são apenas mulheres envolvidas com o tráfico
de drogas, mas, famílias inteiras que tem como fonte de subsistência o comércio
ilegal de drogas. Outro fator debruçado pelas autoras, é o fato de que a permanência
de adolescentes no sistema socioeducativo culmina num futuro marcado por
vulnerabilidades e com mais chances de permanência no cárcere, desenvolvendo na
tese o que foi chamado de itinerário carcerário, uma em cada quatro:

A mulher com itinerário carcerário na adolescência é mais


jovem e menos escolarizada, é uma trabalhadora informal
ou doméstica, tem filhos mais novos que os das demais (na
faixa etária entre zero e sete anos) e recebe menos visitas
dos familiares. Metade dessas mulheres com itinerário
carcerário na adolescência tem algum membro familiar
preso, em geral, os companheiros. (p.23)

A partir desses dados, é possível dizer que a seletividade penal masculina não
é semelhante da seletividade feminina eis que a perspectiva de gênero muda o cenário de
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encarceramento, primeiramente na própria trajetória da reclusa, assim como no local em


que esta se encontrava antes do cárcere, muitas vezes responsável por gerir toda a
estrutura econômica, familiar, organizacional da residência.

Sob esse viés, analisa as autoras Ana Flauzina e Thula Pires, nos votos dos
ministros do Supremo Tribunal Federal – STF na ocasião do julgamento do habeas corpus
coletivos para as mães. Expondo tal qual no artigo da Débora Diniz, que as mulheres
reclusas são “confundidas” com suas funcionalidades exercidas extramuros, anulando sua
própria liberdade e a existência:

[…], defiro a ordem de habeas corpus coletivo


exclusivamente para dar interpretação conforme aos incisos
IV, V e VI do art. 318 do Código de Processo Penal, a fim
de reconhecer, como única interpretação
constitucionalmente adequada, a que condicione a
substituição da prisão preventiva pela domiciliar à análise
concreta, justificada e individualizada, do melhor interesse
da criança, sem revogação automática das prisões
preventivas já decretadas (STF, HC 143641 SP, p. 140).

Por fim, cumpre mencionar que por vezes, há a criminalização das mulheres
pelo fato da estrutura social que está inserida, imputando-a uma tipificação penal por estar
num contexto de vulnerabilidades. No julgamento da reclamação 32.5211, expôs o
Ministro Gilmar Mendes que “Não se pode ser tomada como suspeita uma mulher apenas
por estar acompanhada de seu marido. O direito ainda não impõe à mulher o dever de
evitar a companhia de seu esposo, se, porventura, dedicado a atividades criminosas”. O
trecho desta decisão reconhece o tráfico privilegiado ao caso de uma paciente presa com
o companheiro após a polícia encontrar 37 quilos de entorpecentes no carro em que eles
estavam. O corréu confessou à polícia que a paciente desconhecia a carga, mas não
adiantou. Tal dinâmica vale ressaltar, marca vários processos criminais no Brasil.
Inúmeras são as mulheres que acabam condenadas apenas por estarem com os

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Agravo regimental na reclamação. 2. Reclamante mãe. Requerimento de prisão domiciliar. Ordem
concedida de ofício. 3. Caso concreto que autoriza a concessão da prisão domiciliar. 4. Agravo desprovido.
(Rcl 32521 AgR, Relator (a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 22/02/2019, PROCESSO
ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG XXXXX-04-2019 PUBLIC XXXXX-04-2019)
(STF - AgR Rcl: 32521 GO - GOIÁS XXXXX-46.2018.1.00.0000, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de
Julgamento: 22/02/2019, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-072 09-04-2019)
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companheiros/maridos no momento da abordagem tendo em vista o tipo penal aberto da


Lei 11.343/2006.

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