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17° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores em Artes Plásticas

Panorama da Pesquisa em Artes Visuais – 19 a 23 de agosto de 2008 – Florianópolis

A INCLUSÃO NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE ARTE

Profa. Dra. Maria Cristina da Rosa Fonseca da Silva –


CEAD e PPGAV/CEART - UDESC
cristina@udesc.br

Trata-se do estudo das diretrizes de inclusão considerando os documentos oficiais


para a formação de professores de Artes Visuais. Investigamos ainda as concepções
de inclusão nas produções teóricas na área de Educação Especial e Arte, bem como,
a proposição de diretrizes inclusivas a serem estimuladas na formação de professores
de artes. Como metodologia de pesquisa utilizou-se o estudo bibliográfico em fontes
primárias, documentos legais e os textos produzidos no GT15 da ANPED. Como
categoria de análise foi enfocada a arte como conhecimento e suas articulações com a
categoria de inclusão na formação de professores de artes. No tocante aos resultados
diagnosticou-se principalmente que existem poucos trabalhos que articulam o tema
arte e inclusão e que o conceito de inclusão é polissêmico.
Palavras Chaves: Formação de Professores – Arte – Inclusão
It regards the study of inclusion policies considering the official documents for the
Visual Arts teacher training. The conceptions of inclusion on theoretical productions
have also been investigated in the fields of Special Education and Arts, as well as the
proposition of inclusive policies to be established in the art teacher training. The
bibliographic study in primary sources, legal documents and texts produced in GT15 of
ANPED were used as research methodology. As analysis category, focus was on art
as knowledge and its articulations with the inclusion category in the training of art
teachers. Where results were concerned, it was mainly diagnosed the few work which
articulate the subject of art and inclusion, and also that the inclusion concept is
polysemic.
Key Words: Teachers Training – Art – Inclusion.

Pretendemos apresentar no presente ensaio o processo de investigação


de diretrizes de inclusão para a formação de professores de Artes Visuais
considerando os documentos oficiais que estabelecem as políticas públicas
para a formação de professores. Sistematizamos, além disso, as concepções
de inclusão existente numa parcela de produções teóricas na área de
educação especial, bem como, elementos para proposição de diretrizes
inclusivas na formação de professores de artes. Silva e Araújo (2007)
enfatizam o papel demarcado nas pesquisas do campo denominado
Arte/Educação”. Para os autores:
(...) a Arte/Educação é epistemologia da arte. É a ciência do ensino
de arte (BARBOSA, 1998b; RIZZI, 2002; SAUNDERS, 2004). Nesse
sentido, a Arte/Educação tem se caracterizado como um campo
amplo de conhecimento que, durante a sua trajetória histórica e
sócio-epistemológica, vem agregando diferentes estudos, os quais
são frutos de pesquisas científicas na área da arte e seu ensino,
pesquisas artísticas e da produção de conhecimentos/saberes,

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através da prática de ensino experimental de arte, na educação


escolar e não-escolar”

As pesquisas na área de “Arte/Educação” consolidam-se como teorias e


práticas que dialogam com outras áreas, sendo de certa forma, uma produção
de conhecimentos multidisciplinar. Este estudo parte de um entrecruzamento
com investigações na área de Educação Especial, faz-se necessário esta
tomada de decisão pelo pequeno número de pesquisas na área de arte que
tomam como tema a inclusão.
Partindo de uma investigação realizada com professores de artes
(FONSECA DA SILVA e BORNELLI, 2007), observamos que na atualidade, os
professores de arte sentem-se despreparados diante do modelo de inclusão
proposto pelas políticas públicas vigentes. Constatamos também que a
formação especifica para inclusão é pouco expressiva, tanto na formação
inicial, quanto na formação continuada no âmbito do trabalho. Ocorre que na
maioria das licenciaturas de artes não são contempladas nas matrizes
curriculares a disciplina de educação especial, ou correlata. Ainda os
conhecimentos da área de arte ampliam os processos de expressão, reflexão e
interação social, das pessoas com necessidades especiais. Quando
comparada a outras áreas de conhecimento na escola, a arte se diferencia pela
sua natureza simbólica, bem como, pela sua não hierarquização ou
padronização de conteúdos.
Dalla Rosa (2004) apresenta uma experiência com sujeitos deficientes
salientando a importância da arte na formação e socialização dos indivíduos
com necessidades especiais. No entanto, este trabalho diferencia-se de muitos
outros, porque na maioria dos casos as experiências dizem respeito muito mais
aos processos de uso da arte como terapia, ou ainda, como elemento de
socialização. É comum também encontrar pessoas propondo ações educativas
com uso da arte, para pessoas com deficiências, que não tem formação na
área de arte. Outro dado percebido a partir de levantamentos em bibliotecas
universitárias, diz respeito à pequena produção de trabalhos acadêmicos que
relacionem deficiência e arte produzidas por professores de arte.
Os aspectos curriculares da formação de professores de artes vão
estruturar as bases da trajetória docente, neste sentido nos interessa investigar
quais as diretrizes legais que propõe a formação de professores de artes.

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1. A inclusão proposta pelos documentos oficiais:


Constatamos a inexistência de diretrizes específicas para a formação de
professores de Artes Visuais, neste caso utilizam-se as diretrizes para
formação de professores das licenciaturas de modo geral. Identificamos que no
corpo do decreto 3276 de 06/12/1999 ficam estabelecidos os parágrafos 61 e
63 da atual LDB que determinam os princípios para a formação de professores.
Complementarmente o decreto 3276/1999 estabelece: “I - Comprometimento
com os valores estéticos, políticos e éticos inspiradores da sociedade
democrática; II - Compreensão do papel social da escola; III-domínio dos
conteúdos a serem socializados, de seus significados em diferentes contextos
e de sua articulação interdisciplinar; IV-domínio do conhecimento pedagógico,
incluindo as novas linguagens e tecnologias, considerando os âmbitos do
ensino e da gestão, de forma a promover a efetiva aprendizagem dos alunos;
V- Conhecimento de processos de investigação que possibilitem o
aperfeiçoamento da prática pedagógica; VI– Gerenciamento do próprio
desenvolvimento profissional”.
Acrescentamos à legislação, a observância dos parâmetros
curriculares nacionais - PCNs. No caso da formação do Professor de Artes
Visuais as diretrizes não existem até o presente momento. Observamos que de
modo geral os PCNs, estão incutidos no ideário pedagógico dos professores da
licenciatura, principalmente os profissionais da área da prática pedagógica. Isto
acontece porque os PCN`s esboçam um modelo de ser professor do ponto de
vista do legislador. Tratam-se os PCNs de um documento oficial, mesmo que
não tenham força de lei.
Barbosa (2003) estabelece uma crítica ao modo como foi coordenado o
processo de construção dos PCN`s. Para a autora: “Os PCNs brasileiros
dirigidos por um educador espanhol, des-historicizam nossa experiência
educacional para se apresentarem como novidade e receita para a salvação da
Educação Nacional”. (BARBOSA, 2003,p 09)
Na Resolução CNE/CP n.1 de 18 de fevereiro de 2002, fica
instituído as Diretrizes Nacionais para a Formação de Professores da
Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena.

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Destacamos no texto da lei os elementos orientadores da formação de


professores. Entre eles, I – o ensino visando à aprendizagem do aluno; II- o
acolhimento e o trato da diversidade, III- o exercício de atividades de
enriquecimento cultural; IV- o aprimoramento em práticas investigativas; V- a
elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento de conteúdos
curriculares; VI- o uso de tecnologias de informação e da comunicação e de
metodologias, estratégias e materiais de apoio inovadores, VII- o
desenvolvimento de hábitos de colaboração e de trabalho em equipe.
Todos os aspectos ressaltados nos tópicos da lei relacionam-se com as
demandas propositivas de inclusão. Destacamos as diferenças na
aprendizagem, na ampliação do conceito de arte, no acesso a produção
artística de grupos diferenciados e a criação de objetos pedagógicos para o
ensino de artes visuais para pessoas cegas. Ainda, o professor de arte como
agente de investigação e um pesquisador de sua própria prática. O uso das
tecnologias assistivas, da Internet e da Educação a Distância também são
metodologias de inclusão possíveis de serem refletidas na formação inicial que
ampliam as experiências com projeto inclusivo do professor de artes visuais.
Complementarmente a formação inicial pode fomentar o ‘espírito’ de
equipes disciplinares e multidisciplinares. No caso do ensino de arte, na
maioria das vezes só existe um professor de artes por escola, faltando neste
caso parcerias para estudos e discussões. A solidarização das práticas
educativas amplia as possibilidades inclusivas, neste aspecto o sujeito
professor tem um papel determinado.
A arte vincula-se às diferenças, à expressividade, às
inquietações humanas e as tensões, e essas são algumas
das razões pelas quais educar com igualdade pessoas
diferentes pode representar uma tarefa muito difícil, até
inacessível para alguns educadores (CUKIER,1996).
(FREITAS, 2007,P.06).
Complementando sua reflexão a autora destaca a importância da
“postura ética e solidária” no trato dos aspectos relativos à educação inclusiva.
A resolução do CNE/CP n. 01, complementa as diretrizes para a formação de
professores destacadas anteriormente, enfatizando também a articulação do
ensino, pesquisa e extensão, bem como, um conjunto de competências para a
sustentação da formação de professores no âmbito da inclusão.

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Destacamos o modelo de formação de professores e a concepção de


ensino de arte na atual LDB, lei 9394/96 e as leis 10639/2003 e 11645/2008,
que complementam a LDB no que diz respeito à inclusão étnica e indígena.
Esta legislação identifica a obrigatoriedade da “Educação Artística” como
disciplina responsável pelo ensino dos conteúdos da história e da cultura
africana e suas raízes no Brasil. Para esta proposição efetivar-se é necessário
que os cursos de formação inicial ampliem o repertório do professor no âmbito
da antropologia e do multiculturalismo crítico. (FONSECA da SILVA, 2004).

2. A inclusão: Um retrato polissêmico:


Focamos nossa análise no conceito de inclusão presente nos textos
publicados no Grupo de Trabalho (GT - 15) da ANPED (Associação Nacional
de Pesquisadores em Educação) das 29ª e 30ª reuniões, que reuniram ao todo
21 textos acadêmicos apresentados por profissionais pesquisadores de
diversas universidades. No conjunto da análise cabe ressaltar a inexistência de
textos que utilizassem a arte ou como área de conhecimento, ou como
estratégia pedagógica. Outro aspecto observado é que no ano de 2006
preponderou o olhar dos pesquisadores para a temática da surdez tema em
destaque na atualidade pela recente legislação formulada para área (Decreto
federal 5626 – 22/12/2005 e lei Estadual SC -8869 – 06/09/2001). Já a 30ª
reunião apresentou uma produção mais variada em termos de diferentes
deficiências.
Observamos nos textos que todos se envolvem com a temática da
inclusão como categoria de análise na atualidade, no entanto, poucos
conceituam o que entendem por inclusão. A análise identificou que o conceito
de inclusão é compreendido como algo adjacente à problemática da área, não
necessitando ser conceituado, como se fosse de domínio público. Desta
postura nasce o conceito polissêmico de inclusão que por sua amplitude não
explicita os matizes que o fundamentam, criando interpretações conflitantes.
Buscando não estigmatizar o professor como responsável pelo fracasso
das crianças e jovens com necessidades especiais, mas ao mesmo tempo
marcando sua participação neste processo, destacamos a fala de um dos
textos investigados:

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Saliento que a inclusão de todos na escola não passa por


frágeis mudanças metodológicas (....) mas passa por uma
virada radical nas formas de ver, entender e posicionar os
alunos. Passa pela compreensão de que é necessário investir
em mudanças pequenas, constantes e produzidas na prática
da reflexão teórica sobre o que se vivi (LOPES, 2007,p. 15).
Esta abordagem vai ao encontro das teorias de Bourdieu acerca da
formação do hábitus. Teive (2008) propõe a utilização do termo proposto por
Bourdieu voltado para os aspectos da educação. Utiliza então o hábitus
pedagógico definindo-o como a ” (...) matriz de percepções, de apreciações e
de ações, a qual orientaria tanto a reprodução dos esquemas e de receitas
como a invenção de novas estratégias de ensino” (TEIVES, 2008,p.31).
Ao utilizarmos o conceito de habitus proposto por Bourdieu enfatizamos
a percepção das necessidades de mudança cultural como forma de consolidar
práticas educativas inclusivas, nas salas de aulas de artes e também nos
espaços de formação de professores de artes visuais. Ampliando a análise
acerca dos conceitos de inclusão identificamos que Mendes (2006), utiliza-se
de uma afirmativa proposta por Odom, onde o autor identifica o conceito de
inclusão como controvertido explicitando também à polissemia presente no
conceito de inclusão.
Analisando outro artigo do GT 15 da Anped, identificamos um relato
bastante singular da pesquisadora que descreveu o trabalho desenvolvido em
uma classe onde participa uma menina com deficiência mental e como se dá a
mediação da professora com o grupo de crianças. Freitas, Camargo e
Monteiro (2007) analisam como a menina é vista pela professora e pelos
colegas. Considera a importância deste modo de ver, porque é a partir dele que
a menina vai constituir sua subjetividade. A autora utiliza-se das formulações
de Bakhtin para abordar a importância das representações dos outros para
compor nossa identidade. Na formulação de Freitas, Camargo e Monteiro
(2007) identificamos o discurso da professora percebendo a criança como
incapaz, ou mesmo reconhecendo que não identifica como ela aprende.
Mesmo que as formulações analisadas neste tópico tenham como
referências as pesquisas na área de Educação revelam uma trajetória onde as
pesquisas sobre inclusão, são pouco observadas como objeto de estudos na
área de arte e seu ensino. É fato que as dificuldades vivenciadas pelos demais
professores também é vivenciada pelo professor de arte.

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3. A inclusão na formação de professores de Artes:


Mapeamos nas partes iniciais do texto, aspectos das políticas públicas e
seus reflexos na formação de professores, a polissemia do conceito de
inclusão e seus desdobramentos para a compreensão da área. Pretendemos
neste tópico apontar as especificidades da formação de professores de arte e
seus reflexos para o ensino de arte em classes regulares inclusivas.
Partimos da afirmativa de Azevedo (2002), que aponta uma história da
Arte/Educação Especial com a participação de Noêmia Varela como uma das
iniciadoras da articulação de uma proposta inclusiva para o ensino de arte, já
nos primeiros contatos com a escolinha de Arte do Brasil, entrelaçando Arte e
Educação Especial. O autor destaca também a importância de reconhecer as
fontes históricas para compreender os fenômenos da atualidade. Destaca o
trabalho de Lowenfeld com cegos na Áustria, (...) desafiando o pensamento
científico da época, que considerava o portador de deficiência visual incapaz de
construir e pensar esteticamente (AZEVEDO, 2002,p100).
Talvez possamos dizer que o fator que mais impacta os professores de
arte recém formados é não encontrar na escola o cenário idealizado durante
sua formação escolar. O professor de arte constrói no seu ideário pedagógico a
noção de que as turmas são homogêneas e neste caso as diferenças
encontradas, colocam-no diante do seu despreparo. (FONSECA DA SILVA,
2005) Este fato também acontece com os outros professores em maior ou
menor grau. No entanto, as demais disciplinas além de possuir uma carga
horária maior, possibilitando um contato aprofundado com os estudantes, não
exigem a infra-estrutura que a aula de artes visuais necessita.
Quando encontramos os professores de arte nas atividades de
educação continuada destacam a necessidade de um maior aprofundamento
nas questões da inclusão e a preocupação em atender um com necessidades
especiais em contraposição a vinte nove outros, que de alguma forma
expressam suas diferenças também. FUSARI e FERRAZ (19992), já
apontavam o desafio de saber arte e saber ser professor de arte. Em dez ou
quinze anos este saber arte foi de certa forma superado, principalmente nos
grandes centros e para os egressos de universidades públicas que tem acesso
a formadores com ampla qualificação. Observa-se na experiência de mais de

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quinze anos como professora nos cursos de licenciatura em artes que esta
realidade modificou se comparada com o início da década de 1990. O mercado
editorial ampliou-se, o número de cursos de pós-graduação, bem como, a
qualidade e a periodicidade dos eventos da área. No entanto a escola como
espaço social elabora novos desafios para a prática docente.
Contribuindo para a reflexão do ensino de artes visuais e para a
ampliação do acesso aos conhecimentos da arte das pessoas com
necessidades especiais, enfatizamos as proposições apontadas por Nunes, et
alli, (2007) que destaca o caráter específico dos conhecimentos artísticos para
a vida dos sujeitos com deficiência. Destaca a autora que: (...) passamos a
caracterizar a inclusão de crianças com o meio simbólico e a pensar nela como
participante dos processos artísticos (2007,p. 63). Para fundamentar sua
pesquisa a autora se fundamenta em Gardner, destacando a “Arte Pictórica”
como, uma inteligência a ser desenvolvida no campo da expressão. Vigotski
(1998) que apresenta alguns diferenciais em relação a Gardner no que diz
respeito ao modo como a criança constrói o conhecimento, também identifica a
importância da arte no processo de socialização e acesso ao conhecimento
social. O autor destaca os processos subjetivos e objetivos que ocorrem no
contexto da produção da arte identificando como o senso comum percebe na
arte uma carga maior de subjetividade do que em outras áreas do
conhecimento. Ao mesmo tempo no imaginário social a arte ainda apresenta-se
como um processo de representação da realidade.
Gombrich (1999) refletindo os processos de representação, cópia e
criação na produção artística enfatiza que “É claro que todo imagem será de
algum modo sintomática de seu criador, mas pensá-la como uma fotografia de
uma realidade preexistente é compreender mal todo o processo de feitura de
imagens”( 1999,p. 04). O processo de ampliação dos saberes artístico das
crianças com deficiência também são produtos de sua relação social com o
mundo, no entanto seu processo de criação reflete outros elementos além da
percepção da realidade. Neste sentido o desenho infantil é uma importante
ferramenta que configura o modo de olhar o outro e as relações que este
estabelece com o contexto social. Está implicado neste processo um conjunto
de reflexões sócio-cognitivas e emocionais.

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Iavelberg, argumenta em relação ao desenho na escola contemporânea


que: “Além do conhecimento de si mesma, que a criança tem ao desenhar,
ganha compreensão do mundo. Ela desenha porque existe desenho no mundo.
Aprende a ver e a executar o que vê” (I 2006,p.24). Considerando os aspectos
apontados pela autora à criança com necessidades especiais também
representam seus modos de perceber o mundo. No entanto, a formação de
professores de artes, de maneira geral, não contempla as experiências
possíveis de desenvolver os processos artísticos com as crianças deficientes.
Cabe destacar que as concepções de educação especial são influenciadas
principalmente pelas características da deficiência mental. Outras deficiências
como a cegueira ou a paralisia cerebral, são tratadas na escola como se não
houvesse a possibilidade de um desenvolvimento cognitivo, ficando a
socialização como único objetivo da escolarização das crianças e jovens com
necessidades especiais.
No ensino de arte a participação das crianças com deficiência é vista
como elemento de terapia. A arte possivelmente pode ser utilizada nos
processos terapêuticos, no entanto este não é o papel da escola. A escola tem
como objetivo ampliar as relações do indivíduo com seu contexto a partir do
acesso ao conhecimento, sua ampliação significativa e a construção de novos
processos de interação social. Nas aulas de artes o professor precisa incluir a
criança com necessidades especiais, afim de que possa ampliar seu acesso ao
conhecimento da realidade social a partir das aprendizagens em arte. “A
criança carrega consigo uma cultura, concebida simbolicamente na imersão
das vivências experimentadas em sua comunidade cognitiva, que lhe fornece
um mapa de navegação do qual fará uso ao longo da vida” (KETZER,2003,p.
13). Assim, cabe ao professor de arte considerar o universo cultural da criança
fazendo dessas experiências culturais parte de seu processo pedagógico.
Duarte e Klug (2005) relatam o trabalho desenvolvido entre 2002 e 2004,
com Manuella, uma menina cega, com o objetivo de construir um método de
desenho para cegos. Nessa experiência o desenho foi utilizado como
estratégia comunicacional. As atividades desenvolvidas com a adolescente
foram fundamentais para que fosse ampliado seu modo de comunicar-se.
Todo cego tem o direito de dizer ‘eu me imagino’. E imaginar-se, é
ter imagens. Mesmo que eu diga, por exemplo, ‘Eu te imagino como
um elefante’. Nós somos todos cegos diante das formas cósmicas

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dos hindus, ou diante do eterno feminino. O que é imaginar,


finalmente? (Evgen Bavcar) (DUARTE e KLUG, 2005,p.506).

Considerando a formação de professores de arte numa abordagem


reflexiva o professor pesquisador pode ampliar o processo pedagógico no
ensino de arte em classes inclusivas, modificando a realidade escolar atual.
Este processo é facilitado se na sua formação inicial esta temática for
considerada.
4. Considerações Finais:
Partimos da análise da legislação constatando onde três documentos
oficiais abordam a formação de professores de artes visuais, os Parâmetros
Curriculares Nacionais e a Lei 10639/2003 e a 11645/2008. Os documentos
oficiais restantes definem uma política nacional de formação docente com
poucos aspectos específicos para a formação de professores de Artes. Fica a
responsabilidade de administrar a formação docente inicial no ensino superior,
para as Universidades. No entanto, mesmo que não haja uma política inclusiva
para o ensino de arte, observa-se que há na proposição da resolução 01 do
CNE farto argumento para pensar a inclusão na formação de professores de
Artes Visuais.
Partindo de um diagnóstico da situação do movimento por inclusão nas
escolas públicas, é necessário desenvolver um substancial grupo de
investigações que problematizem as relações entre o ensino de arte e a
inclusão. Perguntamos então: Qual o papel da Arte nas classes inclusivas?
Como se dá a aprendizagens dos conteúdos de arte para os deficientes
mentais? Como se constitui o olhar na produção artística dos cegos? Como a
arte digital pode ampliar a participação das pessoas com Paralisia Cerebral no
ensino de arte? Como os objetos artísticos representam o diferente? São
algumas indagações que poderão vir a ser desenvolvidas como objetos de
pesquisa para ampliar o repertório de investigações neste tema.
A arte, então, permite ao homem demonstrar como vê e como
se vê no mundo. Permite que outros conheçam essa relação.
Nesse sentido, a arte propicia a inteiração dos deficientes,
integrando-os num processo de desenvolvimento por meio do
fazer, sem levar em conta os aspectos patológicos ou
orgânicos. Não enfatiza os déficits, as deficiências, mas
capacidades e possibilidades reais num processo mental e
sensível de compreensão, abstração, planejamento,
elaboração, relações e associações, que resulta na produção
e criação artística. (BUENO,2005,p.09)

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Construindo uma interlocução com Bueno, (2005) reforçamos as


análises construídas a partir do GT de Educação Especial da Anped acerca da
necessidade de qualificação do professor de artes visuais para que se
constitua um habitus pedagógico inclusivo. Consolidando uma prática
diferenciada na formação de professores que solidifique a compreensão da arte
como ferramenta de ampliação da percepção da produção artística da
humanidade. Consolidando para os estudantes de modo geral também um
processo de reflexão, produção e espaço simbólico de qualificação da
representação de si, do outro e do mundo circundante.

5. Referências Bibliográficas:
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Arte/Educação Especial. In.: BARBOSA, Ana Mae (Org.). Inquietações e mudanças
no ensino da arte. São Paulo: Cortez, 2002.
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In.: Revista Digital Art& - Número 0 - Outubro de 2003.
http://www.revista.art.br/.Consultada em 08 de janeiro de 2008.
BUENO, Roberta Puccetti Polízio . Articulando: arte, ensino e produção para uma
educação especial. Revista Educação Especial, Santa Maria, RS, p. 117-128, 2005.
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construindo uma proposta de ensino multicultural a distância. 187p. Tese
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FREITAS, Ana Paula,CAMARGO, Evani A. A. e MONTEIRO,Maria Inês B. O discurso
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da ANPED, 2007, Caxambú. Anped: 30 anos de pesquisa e compromisso social,


2007.
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Professora do CEAD e do PPGAV do CEART/UDESC. Líder do grupo de Pesquisa


CNPq: Educação, Arte e Inclusão. Membro da equipe do projeto "Informação,
Autonomia e Expressão de crianças Cegas: Protótipos na Imagem e na Linguagem"
do Convênio UDESC/ Universidade de Cádiz - Espanha. Autora do Livro: Formação de
Professores de Artes: diversidade e complexidade pedagógica.

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