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Universidade Federal do Rio de Janeiro

Faculdade de Educação
Disciplina: Introdução aos Estudos de História – IHI 111
Docente: André M.
Período: 2022.1
Discentes: Gledson J dos Santos
DRE: 122062215

Questão 3.
Em seu livro O príncipe, Nicolau Maquiavel desenvolve uma doutrina política amplamente
baseada em argumentos extraídos da história. Que características da visão de mundo e da
concepção de história de Maquiavel permitiram que ele tenha construído seus
argumentos sobre a política com base em conhecimentos históricos? Em que medida
essa visão de mundo se aproxima ou se afasta da concepção moderna de história?

Escrito em 1513 em uma Itália ainda não unificada e sob influência renascentista, por
Nicolau Maquiavel (Florença, 1469-1527), O Príncipe somete foi publicado postumamente em
1532, dedicado a Lourenço de Médici II, talvez com um desejo que sua obra fosse um
compêndio de instruções de melhores práticas de um soberano para se manter e aumentar seu
poder ou talvez com o simples intuito de obter vantagens junto ao neto de Lourenço, o
Magnífico, que continuava representando a nobreza da família Médici em Florença, em meio a
outros reinos potências a sua volta, como o Ducado de Milão, a República de Nápoles,
República de Veneza e o crescimento do estado pontífice da igreja católica.
Maquiavel entendia que seu conhecimento ao longo de sua vida, seja através de
dedicados estudos, através de sua experiência quando havia sido chanceler em Florença e pela
sua observação histórica do passado lhe dariam total capacidade de escrever O Príncipe e
oferecê-lo como presente valioso a Médici, pois acreditava ele, ter resumido todas as virtudes
necessárias para um modelo ideal de um monarca, aqui chamado de príncipe.
A famosa frase de que “os fins justificam os meios” embora não esteja descrita em
nenhum momento na sua obra, lhe é atribuída por Maquiavel acreditar principalmente que um
príncipe deve aparentar ter virtudes perante os seus (súditos, povo, militares etc.), mesmo que
não as tenha, sob qualquer custo da continuidade do poder.
Nicolau descreve algumas virtudes, como sendo necessárias aparentar tê-las para um
rei, como ser piedoso, fiel, humano, íntegro e religioso em um reinado de glória, e descreve
principalmente, na condição de estar disposto, quando se fizer necessário, ter talento para agir
de modo contrário, mesmo que fossem necessárias ações radicais, como assassinatos ou quebra
de promessas. Essa virtude seria completa quando o nobre aparentasse tais habilidades em agir
conforme o momento, e para isso, ele usa de exemplos do histórico de várias ações do passado
tomada por reis e suas consequências, como o sucesso no domínio de um povo, sua manutenção
no poder ou a visão do povo para com o nobre de acordo com suas ações.
Essas experiências históricas políticas observadas e estudadas por Maquiavel são
descritas sempre com exemplos, a fim de deixar claro ao leitor presenteado (não se sabe se
Médici chegou a ler O Príncipe) as consequências do bom uso das virtudes, que seria a arte usar
ou aparentar tê-las.
Ele demonstra com o exemplo de Luís XII, rei da França, que conquistar um novo
principado é mais difícil que mantê-lo, quando esse invade Milão, da mesma rapidez que o faz
é a mesma que o perde, pois o povo na esperança de governo melhor não imagina que ao irem
contra seu governo poderiam ir de mal a pior. Aqui o autor ensaia boas práticas para conquista
de um novo principado, que seriam: arruiná-lo, habitá-los ou criar um governo nomeando seus
súditos e suas próprias leis. Luís teria feito o oposto quando eliminou os menos fortes,
engradeceu os grandes poderes, trouxe um estrangeiro, não instalou colônias e não foi habitar
o país.
Ele contrapõe com o exemplo dos romanos, que nos países que anexavam observavam
essas medidas, mantendo relações amigáveis com os nativos e abatendo os grupos locais
poderosos. E nesse ponto exemplifica didaticamente com a tuberculose, que no início é mais
fácil de curar, embora difícil de diagnosticar, que quando é fácil de diagnosticar, quase
impossível de ser curada, analogamente a invasão romana na Grécia e quando esses não
permitem o crescimento do poder dos aqueus e etólios e abatendo seus inimigos desde o início,
prevenindo qualquer motim futuro: “aquele que é a causa do poderio de alguém se arruína” ou
“um príncipe que deseja manter o que é seu, deve saber fazer o mal, e fazê-lo ou não de acordo
com a necessidade”.
Talvez um dos pontos dessa obra que trouxeram o conceito contemporâneo de
maquiavélico ao autor, seja quando esse reforça a prática do crime quando de inteira
necessidade, mas que esse não deve perpetuar para não causar má impressão ao povo, bem
como fazer o mal de uma só vez e a bondade aos poucos, pois isso ira cativar o povo que não
esquecerá seus males, mas fará que seu rei seja temido, ao que o autor embora reconheça que o
melhor seria ser o rei temido e amado, dentre os dois é melhor ser temido. Esse pensamento é
totalmente descabido nos dias de hoje, sendo carregado de imoralidades e crimes, o que
obviamente precisa ser visto com olhar anacrônico do autor, mas o afasta da pretensão de ser
sua obra um compendio histórico de boas práticas que serviriam a todos os tempos.
Por fim, Maquiavel, descreve que os príncipes são vistos fazendo coisas que os
conduzem aos seus objetivos, que são glórias e riquezas, e chegam lá de diversas formas, uns
com cautela outros com ímpeto, uns com violência outros com habilidade, compara que a sorte
é como a mulher que deve ser dominada, como fazem com os jovens amantes, portanto como a
sorte é inconstante é melhor ser impetuoso que cauteloso.
Na concepção moderna de história, a forma narrativa de Maquiavel que descreve que
toda ação teria a mesma consequência, sendo irrelevante o tempo e o horizonte histórico acaba
categoricamente ao longo do século XVIII e principalmente com a Revolução Francesa, que
fugiu totalmente as possibilidades e visão histórica linear de Nicoloau, sem contar com o
improvável, com o avanço de ideias, e porque não de tecnologias, militares ou não a seu tempo,
e aqui posso citar Reinhart Koselleck em sua História Magistra Vitae, que mostra um contra
ponto, onde a história muda com o tempo, onde o curso dos acontecimentos altera o curso
histórico, deixando de lado disposições fixas, mudanças lentas e estabilidade e colocando mais
em voga a natureza humana.
“A nova história adquiriu uma qualidade temporal própria” – (KOSELLECK, Reinhart.
História Magistra Vitae) “a crônica do tempo presente foi para segundo plano” a Historie
passou a ser Geschichte, verbetes em alemão usados por Koselleck em Magistra Vitae, para
reforçar que a história passou a ser uma ciência de reflexão, onde cada exemplo do passado
chega sempre muito tarde.
Esse ponto de vista mais contemporâneo afasta totalmente os pensamentos de
Maquiavel, com uma visão que a história pode se repetir, independente de quem são os atores,
mas ajuda anacronicamente a entender seu tempo e espaço e porque sua obra se tornou célebre
e vive no imaginário popular até hoje.

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