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Ministério da Educação

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ


Setor de Ciências Humanas
Departamento de História
Disciplina: História Moderna I
Docente: Ana Paula Vosne Martins
Discente: Fernanda Yumi Raddi Okamoto
GRR: 20190913

O Príncipe
Nicolau Maquiavel foi uma das principais figuras de destaque do período
moderno. Nascido em Florença, em 1469, o autor foi responsável pela produção de
diversas obras muito significativas tanto para o contexto em que escreveu como para os
dias atuais, propagando, dessa maneira, os traços de sua educação humanista. Atuou como
funcionário da Signoria de Florença na Segunda Chancelaria, que tratava de questões
militares e de política externa, e efetuou viagens políticas para lugares como França e
Roma, ampliando ainda mais seus conhecimentos. Dessa maneira, a obra em evidência O
Príncipe, publicada postumamente em 1532, foi o resultado de muito tempo de
acumulação de saberes teóricos e práticos que possibilitaram a formulação de um manual
dirigido a todo e qualquer príncipe que possua a ambição de manter seu principado.
A estrutura da obra é dividida em vinte e seis capítulos: os primeiros treze dizem
respeito à conquista do poder e os 14 seguintes discorrem sobre as qualidades necessárias
para que o príncipe consiga mantê-lo. Apesar de dedicar o livro para Lourenço de Médici
II, Maquiavel não escreve sua reflexão sobre o poder político para ninguém específico,
pelo contrário, constrói sua argumentação citando os mais diversos exemplos e
abrangendo diferentes tipos de situações. O contexto do período em que o manual foi
produzido estava pautado em uma discussão de longa data, conduzida ao longo do tardo-
medievo, marcada pela oposição entre os defensores da libertas e os defensores do
imperium, ou seja, as cidades medievais ainda livres que iam de encontro com as
pretensões de anexação por parte do Sacro Império Romano-Germânico. Os guelfos
lutavam contra os guibelinos, contribuindo para a conjuntura caótica que se encontrava a
Itália naquele momento.
Nesse sentido, o lugar que Maquiavel conquista no cenário é singular. Perante o
humanismo cívico, restrito à produção florentina, em que estudiosos também exerciam
poder como chanceleres, o autor cria sua posição própria dentro dessa tradição uma vez
que continua tratando de virtudes principescas, mas de uma maneira diferente. A virtude
deixa de ser um conceito idealizado e passa a ser retratada a partir de qualidades
pragmáticas, inaugurando o racionalismo político. A ação se torna o ponto central e
fundamental para o erudito, que configura sua tese direcionada a políticas e estados novos
que estão sendo reorganizados, além de explicitar seu anseio por uma organização política
italiana em que vigorassem a paz e a ordem.

E deve ser lembrado que não há nada mais difícil


de controlar, mais perigoso de conduzir, ou mais incerto
de alcançar sucesso do que liderar a introdução de uma
nova ordem. (p. 51)

Em muitos momentos o filósofo político ressalta a valorização do conhecimento


histórico sobre os grandes governantes cuja ação é exemplar e digna de análises. Esse
saber essencial é capaz de auxiliar o príncipe a sustentar-se no presente, conhecendo o
passado, e prever o futuro, podendo, assim, preparar-se para futuras adversidades ou
transtornos. Nessa dinâmica temporal de relação entre passado, presente e futuro é
possível inferir a ambiguidade maquiaveliânica, assim como no retrato do conceito de
liberdade. Ele justifica a necessidade de arrasar terras e povos que demonstrem muito
forte a memória da liberdade permitindo duas interpretações: a de que são oferecidas
direções para a conquista de uma cidade livre ou a da importância de manter essa
liberdade de maneira limitada. Não somente, comenta sobre a importância de uma forte
autoridade em locais recém conquistados e muitas vezes a presença imprescindível do
príncipe no local que apresenta potencialidade de revoltas.
Diferentemente de Erasmo de Rotterdã, Nicolau Maquiavel não orientou a
modelação de um príncipe perfeito, mas elaborou um conjunto de características
essenciais para a manutenção da república, como no capítulo VI de seus escritos, em que
traz à tona os conceitos de atitude e destino (fortuna). Contrasta o equilíbrio necessário
entre as duas disposições fundamentais para o sucesso do governante: as qualidades e as
virtudes adquiridas devem caminhar juntas, para que assim a ação prevaleça sob os traços
pessoais. Já no capítulo XVIII disserta sobre o exercício do poder de uma maneira
benevolente e esclarece que para um bom governo é importante saber fazer o mal e dosá-
lo, porque ele é necessário.
Bem usadas, pode-se dizer daquelas (se do mal for lícito
falar bem) às quais se recorre instantaneamente, pela
necessidade de manter a própria segurança e que não são
utilizadas com persistência, a menos que possam vir a ser
favoráveis para os súditos. Crueldades mal usadas são
aquelas que, mesmo poucas a principio, com o decorrer do
tempo aumentam ao invés de se extinguirem. (p. 74)

Não se deixa tomar pela ingenuidade e comenta sobre a perversidade engendrada


na natureza humana. Ressalta a importância da maleabilidade da virtude, que não deve
ser tomada a priori justamente por correr o risco de sofrer adaptações frente às mutações
das circunstâncias. No capítulo XV, Maquiavel comenta sobre a lacuna entre os ideais
morais universais e as contingências incontroláveis de um certo contexto e a partir disso
levanta o argumento da preferência entre ser temido e ser amado. O problema do amor,
como é apontado, é que ele depende de cada individuo e pode se tornar facilmente hostil.
Já o temor depende única e exclusivamente do príncipe, sendo muito mais naturalmente
controlado. Ele também defende que apesar do fator supracitado, é preferível que o
príncipe se preocupe em manter relações com seu povo do que com outros príncipes:
(...) Pois homens, quando recebem o bem de
quem esperavam somente o mal, tornam-se mais ligados
ao seu benfeitor, e assim o povo se torna rapidamente mais
devoto a ele do que se o tivesse levado ao principado. (p.
80)
Comenta sobre a religião como instrumento de poder e perpassa rapidamente
sobre o os principados eclesiásticos e suas alianças e ferramentas para a manutenção da
ordem, sendo um deles a fé, que nem sempre poderá ser utilizada por um príncipe caso
este se encontre frente a uma diversidade cultural.
Retorna à questão sobre ser temido ou ser amado algumas vezes durante o decorrer
da obra e enfatiza a arte da guerra como principal alicerce no capítulo XIV.

Voltando à questão de ser temido ou amado, concluo que


os homens amam como querem e temem de acordo com o
desejo do príncipe; um príncipe sábio deve se apoiar
naquilo que pode controlar, e não nos outros. Como já foi
dito, deve apenas se empenhar para evitar o ódio. (p. 135)
Por fim, é possível compreender a esperança do autor de alcançar uma nova
ordem, não necessariamente o Absolutismo Monárquico, mas uma forma de poder que
seja regulamentada por todas as qualidades citadas de homens de ação que visam a
manutenção de seu poder, podendo conquistar seus objetivos através da prosperidade no
alcance de todas as orientações.

Comentário: Eu nunca havia ficado tão encantada em ler uma obra como fiquei lendo O
Príncipe. Acredito que por vários motivos, mas um dos principais, a ingênua crença do
Ensino Médio de que Nicolau Maquiavel defendeu um regime monárquico despótico e
que pregou a violência e a perseguição sem medida. Fui muito surpreendida durante a
leitura pela elegância e pela sabedoria com que Maquiavel trata das orientações. Ele
justifica impecavelmente a necessidade de cada atitude e ainda desenrola exemplos e
cenários que expõe sua consciência sobre a variância de cenários. Um comentário pessoal
é que meu pai havia comentado comigo que ler esse livro mudou a vida dele e posso dizer
que também mudou a minha. Obrigada pela oportunidade e pela admirável aula,
Professora. Foram 3 horas muitos proveitosas.

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