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6º CURSO – A CANÇÃO POPULAR E O ENSINO DE HISTÓRIA

Maracatu: da tradição à vanguarda


Texto 1

“Em pleno território brasileiro, reis e nobres africanos, vendidos como escravos por motivos
de guerra ou por simples desafetos, desterrados em função do ‘infame tráfico’, buscaram reconstruir
estruturas políticas e religiosas de suas terras distantes. Caso famoso é o de Nan Agotiné, a mãe do
rei do Guezô, do Danxomé, Dangomé, Daomei ou Daomé, que, vendida por traficantes, teria refeito
seus altares e sua corte na Casa das Minas, em São Luís do Maranhão. Outros voltaram à terra,
como o príncipe Fruku, que viveu no Brasil durante 24 anos e retornou a Costa dos Escravos com o
nome de d. Jerônimo. Lá chegando, disputou o trono do Danxomé e só por pouco perdeu para
Agonglo.
Além dos príncipes oriundos de elites dirigentes na África, habitaram no Brasil os reis
alegóricos, das congadas, cavalhadas e batuques, que, no curto espaço das festas, representavam a
autoridade máxima então constituída. Essa convivência entre tantos reis – imaginários ou não –
permitia o surgimento de compreensões diferentes da realeza e mesmo de certa recepção positiva da
monarquia.
Esses reis dialogavam também com os santos. Com efeito, no Brasil religião e realeza estão
ligadas de forma muito peculiar. Os santos no Brasil, quando muito adorados, ganham ar de realeza.
O Divino Espírito Santo recebe um império, o deus Momo vira, anos mais tarde, rei Momo. De
qualquer modo, mantos imperiais convivem com mantos divinos, e o imaginário da realeza acaba
permeando fortemente o catolicismo brasileiro, da mesma maneira que uma série de manifestações
populares, como o Carnaval – com seus impérios, reis, rainhas e enredos -, se nutre de cenas da
monarquia”. (Adaptado de: SCHWARCZ, Lilia Moritz. As barbas do imperador: D. Pedro II, um
monarca nos trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1998).

Como se pode ver no trecho do livro de Lilia M. Schwarcz, a monarquia não foi somente um
sistema político adotado no Brasil durante quase todo o século XIX. Os símbolos da monarquia
também permearam a vida social e cultural da população, inclusive negra, que já estava
familiarizada a este modelo desde África. Deste modo, na festa do Divino Espírito Santo, um garoto
é coroado rei do mundo. Durante o carnaval, o rei Momo é quem governa a cidade, ainda que
simbolicamente. Nas congadas, em lugares tão distante uns dos outros quanto Minas Gerais ou
Pernambuco, é coroado um rei da irmandade. Em certa medida, enquanto D. Pedro II governava
este país de dimensão continental acompanhado de sua corte, muitos outros reis e rainhas
constituíam suas pequenas cortes nos recônditos do Brasil e exerciam um papel de liderança e
afirmação identitária.
Embora a monarquia tenha sido substituída pela República em 1889 (130 anos já se
passaram!), as influências destes símbolos monárquicos ainda estão presentes em inúmeras
manifestações culturais no Brasil. Uma destas manifestações que apresenta um imaginário e uma
série de elementos relacionados ao período monárquico é o Maracatu Rural, também chamado de
Maracatu de Baque Solto, em Pernambuco. Nesta manifestação, além do rei, da rainha e das
princesas, existem personagens ligados ao candomblé e aos indígenas. Assista um trecho (até
6’10’’) da reportagem sobre o Maracatu Rural feita em 2015 pelo programa Globo Rural e observe
os personagens, em especial, o rei e sua corte.

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