Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Jean-Paul Valabrega
ou inconfessável, que recobre não somente a noção (o que seria Acreditamos, além disso, que os problemas do controle (e di
um mal menor) mas a situação, a instituição e a prática do con remos, igualmente, os da análise dita didática) seriam os mesmos
trole. se as normas ou standards• da formação não tivessem sido pro
As implicações são as de uma relação hierárquica, autoritá gressivamente adotados, codificados e prescritos pela Associação
ria, normativa, escolar, paternalista, por vezes sedutora e por ve Internacional (I.P A.) e seguidos pelas sociedades locais que a ela
zes repressiva, da qual se encontram alguns modelos na relação aderem? Certamente não.
pai-filho, na relação mestre-a/uno, na relação desobjetivada admi Observamos, aliás, que na nomenclatura clássica a categoria
nistraçtl<nubordinados, até na relação juiz-testemunha ou inquisi dos analistas "didatas" é também a dos "analistas de controle".
dor-suspeito. Não se poderia dizer melhor. Por conseqüência, neste sistema, o
Seria um eufemismo dizer que este tipo de relação já não é que marca a didática bem como o controle com um selo institu
bem analítico. De fato, é essencialmente antianalítico, porque es cional impossível de desconhecer é justamente a homologação da
ta prática introduz., postula, favorece e institui uma relação alie qual primeiro a análise (pela admissão ao controle) e depois os
nante. Ora, a alienação é - ou deveria ser - o contrário mesmo próprios tratamentos controlados são o objeto e o motivo perante
da análise. a instituição.
O problema paradoxal até a aporia e o absurdo é que seja Querer negar uma implicação não é suprimi-la, bem ao con
precisamente este termo - com as práticas que ele homologa - trário. Os psicanalistas deveriam ser os primeiros a sabê-lo.
que se tenha imposto com o uso, a ponto de daqui em diante pa Do mesmo modo, a propósito de nossa crítica terminológica,
recer muito difícil, talvez mesmo impossíve� substituí-lo por ou os analistas deveriam ser os mais bem posicionados (e os mais
tros, mais bem fundamentados na teoria e mais rigorosos. É pre bem pagos) para conhecer a importância das palavras que se uti
ciso observar, aliás, que uma teoria analítica do controle nunca liza, já que toda análise é baseada na expressão verbal, quer dizer,
tinha sido esboçada até os últimos anos. na nomeação e, nesta circunstância, nas ligações ou pontes de
Assim continuamos todos a utilizar o termo - senão sentido que aparecem, se preenchem, entre as representações
tambtm a coisa - em causa. e o título mesmo destas Jornadas de de coisas e representações de palavras, revelando assim os con
estudos o comprovam. Expressões usuais entre os "alunos", como te6dos latentes. O que evidentemente não postula que tudo seja
"solicitar seus controles", "ser admitido em controle", "fazer seus exprimido nem exprimíve� nem que o conjunto de representações
controles", ratificam cotidianamente certas práticas formado e representantes chegue a esgotar a matéria, o sentido, em uma
ras - não as melhores - no seio das sociedades e institutos psi palavra o ser ou essência (eidos), seja do objeto, seja do sujeito.
canalíticos. Todavia, existem duas modalidades, dois tratamentos da ope
Nestas condições, é artificial e mesmo falacioso, separar as ração nominativa, que se podem - mesmo de modo provisório -
práticas de controle de seu bastidor institucional - como o.os designar assim: as palavras de uns e as palavras de outros. De fato,
convida o programa - e uma das provas disso é que a comuni enquanto os analistas concedem a maior atenção às palavras de
cação de nosso amigo Conrad Stcin versa sobre a oferta de con seus pacientes - com bons motivos, mas às vezes também até
trole (estando o termo, como foi dito, mantido) enquanto outras excessos aberrantes: evoque-se aqui o de/Jrio do significante -
contribuições se voltam à demanda. todos os que têm a experiência da observação de caso Gustamen
Entre esta oferta e esta demanda, sob uma forma ou outra, te no controle) puderam notar ao contrário, a que ponto as pala-
mais direta ou mais discreta, constrangedora ou tolerante, no
meada ou tacitamente designada e definida cm seu papel - e seu
controle - 116 sempre rcfcr8ncia à instituição interposta. • Standards cm inglês no original.
44 A SUPERVISÃO NA PSICANÁLISE A ANÁLISE QUARTA 45
vras do próprio analista, os termos de suas intervenções e inter De imediato, a identificação mimética ao analista... ou ao su
pretações aparecem freqüentemente difusos, incertos, vagos, até pervisor. Nós já observamos em outro lugar que nesta identifi
simplesmente esquecidos. O analista nos diz: "Foi mais ou menos cação mimética, imitativa ou psitasfdea, não era o melhor - afi
isso, era este o sentido da minha intervenção, mas as palavras nal poderia havê-lo - mas o pior do personagem da identificação,
exatas eu já não me lembro". que era retido e copiado: são os tiques, os ridículos, os traços sin
De onde pode provir esta disjunção, esta disparidade entre as tomáticos e patológicos que são religiosamente reunidos e arre
palavras de uns e as palavras de outros, uma vez que a insinceri medados. Este é, aliás, o princípio da caricatura. Aí está, então,
dade, a culpa, a censura ou o medo do policial (supervisor) não um efeito do inconsciente pernicioso. Sem dúvida, trata-se de
seria o bastante para dar conta de explicar todos os casos? uma identificação secundária, por vezes mesmo consciente, mas
Não se pode, no momento, encontrar outra explicação para nem sempre. Mas o que isto significa e implica no inconsciente e
este fenômeno que não a hipótese de um fator pernicioso do in na identificação primária e na própria identidade, desde que tudo
consciente, revelado aqui por um tipo de inconsciente pernicioso é inconscientemente agenciado para favorecer, manter e pereni
da llngua a respeito do qual Esopo já havia bem dito que era o zar tais resultados? Para lhes outorgar o satisfecit, reconhecimen
melhor e o pior das coisas. to e diplomas com a menção "muito honrosa" e as felicitações do
Freud repetiu muitas vezes que o inconsciente não conhecia a júri?
contradição, a negação - nem portanto a afirmação - o tempo, O mesmo ocorria - viu-se - com o controle. Palavra perni-
nem a morte. Apenas a referência ao último termo (é a palavra ciosa que se impôs e manteve, o que deve bem indicar que se liga
que convém) fica, na nossa opinião, muito discutível. Hoje não é de alguma maneira à coisa. Controle, na origem, significava du
o lugar nem a ocasião de mostrá-lo. Em todo caso, o elemento plicado do papel• (do rolo), ou seja, em linguagem moderna, fo
designado como "pernicioso" contém justamente a raiz: nex; ne tocópia. Toda a questão é, de fato, saber se se pode - e deve -
cis, a morte. fazer a fotocópia de uma análise e da análise uma fotocópia.
t> que é certo é que o inconsciente ignora o bem e o mal, o
verdadeiro e o falso, a nuance, o mau e o bom uso (a este respei
to veja-se de preferência Grévisse): dito de outro modo, o incons
ciente ignora o juízo (no sentido filosófico e lógico deste concei
to). E nestas condições, a tendência perniciosa é uma tendência 2
ao pior. É a política do pior, porque todas as categorias de juízo
se encontram misturadas, em um caos.
O pior é o pulsional em estado puro. Se houvesse apenas Há alguns anos propusemos a denominação de análise quarta
pulsões puras, desligadas, o mundo humano nada seria além de para substituir a de controle. À parte as críticas que acabam de
ódio, assassínio e devastação; "ruína e luto". evocá-lo, vejamos brevemente as razões principais que fundamen
Além disso, a clínica analítica das neuroses, e sobretudo das tam e justificam este novo conceito, tanto na teoria como na prá
psicoses, nos abre muitas janelas - e cada vez mais, diríamos - tica.
sobre este universo individual e coletivo aterrorizante, que pulsa,
que "impulsa" irresistivelmente rumo à destruição do outro e
de si. • Rôle. papel (do ator, do personagem); Rouleau: rolo, cilindro, roto
Em vista destes cataclismas, vejam-se exemplos menores do do papel (como pergaminho); Cont-rôle: originalmente relativo à duplicação do
inconsciente pernicioso. Menores, mas inquietantes assim mes que t apresentado no papel, segunda via, ou, como sugere o autor, fotocópia.
(N.da T.)
mo, em relação ao objeto deste colóquio.
46 A SUPERVISÃO NA PSICANÁLISE A ANÁLISE QUARTA 47
A primeira razão se liga à matéria analítica mesma, a saber, sentido latente, sendo este objeto de interpretação para quem
o inconsciente. Pode-se dizer que o enquadre, a técnica e a teoria sabe ouvi-lo e se encontra, desde que na função de intérprete,
psicanalítica, quanto à sua participação mais importante, foram devolvendo a mensagem - em uma certa tradução - a seu emis
inventados para apreender este conte6do. Ora esta materia analy sor.
tica é sutil, escondida, disfarçada e quer apenas subtrair-se. Outro exemplo, a tríade fundamental constituída pela trans
A experiência do controle na sua prática clássica, codificada e ferência, a contratransferência e o transferido. Por muito tempo
particularmente institucional, experiência feita como se deve, dos alguns aspectos da contratransferência ficaram desconhecidos ou
dois lados da ribalta, analista controlado e analista de contro negligenciados e neste caso, reexaminada, ela contém os elemen
le (bem como a experiência analítica do psicanalista requer os tos essenciais da interpretaçdo latente. Quanto ao transferido, ele é
dois lados, pátio e jardim, divã e poltrona), esta experiência mos freqüentemente passado sob silêncio, por "lucros e perdas" po
tra repetidamente que, não somente o controle se presta mal à de-se dizer. É por isso que propusemos uma conceituação e uma
apreensão da matéria analítica, mas que até engendra as con teorização deste conjunto segundo a tridimensionalidade que de
dições de sua eliminação, de seu ocultamento, de seu recalcamen ve ser tida, mantida e a cada instante restabelecida na situação
to na zona do "setor reservado", segundo a precisa expressão de analítica, em particular sob o ângulo das interações.
Conrad Stein. Para continuar analítica, com efeito, a posição do analista de
Conclusão: convém mudar a prática do controle e, para co-
ve ser ao longo de todo o processo não a do alter ego ou ego awci
meçar, lhe construir a teoria. É rumo à situação e à teorização in
liar, como na relação de assistência, por exemplo (se bem que
teranaJftica que nos voltamos para fazê-lo. "Análise quarta" nada
efeitos deste tipo, não necessariamente desfavoráveis, se produ
designa além da experiência e - se se pode dizer - da unidade
de base, reduzida a seus componentes elementares, irredutíveis, zam e sejam utilizáveis - como dizia Freud - pela via da "trans
da situação interanalítica. Esta 61tima tem especificações diversas. ferência enquanto sugestão"), mas essencialmente a do terceiro.
Como seu nome indi ca, ela re<me vários analistas (três parece ser A dois só é possível fazer duetos ou duelos, um não sendo
um número que é melhor não ultrapassar). A análise quarta re6- muitas vezes muito distinto do outro. Contando e incluindo o ter
ne o mínimo, ou seja, dois (primitivamente o controlado e o ana ceiro ausente - simbólico - e, melhor ainda, ocupando-lhe o lu
lista de controle), aquém do que não há situação interanalítica. gar, abrem-se já outras perspectivas. A análise é o enquadre para
Assim, em primeiro lugar entre as modalidades da situação tal. A análise quarta permite reencontrar e re-situar as coordena
interanalítica se encontra a análise quarta. Em segundo lugar se das tópicas e temporais, especialmente inconscientes, não perce
situam as sessões interanalíticas (abreviadas como sessões-inter) bidas ou omitidas, em numerosos casos onde elas se esfumaçam e
que, sob forma livre e não institucional, deveriam, na nossa opi tendem a se apagar.
nião, constituir a prática de base da formação continua (unend/i Pois esta posição simbólica terceira não é de modo algum
che) do psicanalista. evidente por si própria. Basta enunciá-la para perceber: como se
O segundo ponto de vista considera e - é o caso de dizê-lo pode ser e permanecer um símbolo, sem ser, contudo, uma está
- leva em conta a estrutura não dual, mas temário que é necessá tua sobre seu pedestal, um surdo-mudo? Situação instáve� precá
ria à apreensão da "matéria" inconsciente, à constituição e à ma ria, difícil e então sempre a buscar e restabelecer.
nutenção do campo analítico. Em particular esta posição - analítica - não é jamais adqui
A interpretação, por exemplo, repousa sobre urna estrutura rida de uma vez por todas, por um reconhecimento, uma adesão
ternária, já que, além dos dois interlocutores - o que fala e o ou uma nomeação para um grau. Nós lembramos aqui a bem co
que escuta - há a mensagem transmitida, a qual tem, por sua nhecida hierarquia: analista estagiário, associado, titular, didata,
vez, urna função comunicante, então um sentido manifesto e um supervisor.
48 A SUPERVISÃO NA PSICANÁLISE A ANÁLISE QUARTA 49
Não. A política analítica é sempre posta em questão, sempre Assim, vocês vêem, nós utilizamos ao mesmo tempo o cardi
a ser reposta em questão. E é para isso que serve precisamente a nal e o ordinal. É preciso dois para fazer o terceiro, e assim por
sessão intcranalítica, da qual a análise quarta - como se disse - diante. É então neste sentido, algorítmico, que se fala do quarto
é a forma mais simples, a fase inicial, se poderia dizer, ela mesma como limite tetrádico do terceiro.
segunda em relação à própria análise. Antes de concluir, devo acrescentar uma precisão a respeito
Percebe-se por af como somos levados a teorizar a situação de uma compreensão falsa que encontrei em diversos dos meus
analítica, bem como a formação requerida para seu exercício, em leitores e ouvintes, para meu espanto, já que me esforço sempre
termos ordinais. E a primeira justificativa para tal é ela ser fun para ser da maior clareza possível. Ainda um efeito imprevisível
damentada sobre o conceito de terceiro, ou tríade, ou trilogia, ou como são todos - do inconsciente pernicioso: da língua, da pa
ternaridade; fazemos uso da categoria ordinal para percebê-lo. lavra, do pensamento, da passagem ao ato, da distância entre as
Ordinal é: primeiro, segundo, terceiro, quarto etc. causas e o efeito, entre a intenção e a ação, entre o dizer e o fa
Quanto à segunda justificativa, ela é - como se poderia es zer.
perar - cardinal. Quer dizer que se vai contar, enunciar os agen É evidente que jamais imaginamos reunir nossos quatro pro
tes, ou antes os referentes em causa. E se vai encontrar quatro. tagonistas (o grupo dos quatro, se vocês querem) em um mesmo
Cardinal significa charneira (espécie de gonzo, como diz uma lugar, em carne e osso, em nossas sessões interanalíticas e nossas
agradável história judaica) e, conforme a definição exata - e es análises quartas. Como também não reunimos - em análise -
piritual sem intenção - de Emille Littré: "Os cardinais são as os três atores principais do conflito, do drama e do mito edipiano.
charneiras em tomo dos quais giram os ordinais". Reunidas, estas diversas dramatis personae estão ou estiveram o
Nossa enumeração dá então - no mínimo - o número 4, ou bastante até nossa intervenção, como terceiro ou quarto simbóli
seja: um paciente e seu analista (2); o analista ou referente prin co, como já foi dito e repetido.
cipal deste analista (3); o supervisor (4). Aí estão os protagonistas Aqui, trata-se essencialmente de fantasias, de seu surgimen
que é preciso levar em conta na análise quarta, assim chamada to, sua transmissão, de seus agenciamentos, de suas sintomati
justamente por isso, a fim de sempre situar as interações transfe zações e suas modificações possíveis. A empreitada já é com isto
renciais, de restabelecer a cada vez a situação terceira e a posição complicada e árdua o bastante.
do terceiro e, além disso, de estudar de perto a concepção, a for Como é possível tal desvio de compreensão? Talvez por con
mulação e os efeitos da interpretação. Esta "quadra de ases" (se taminação de uma prática chamada controle coletivo, de que nada
se pode dizê-lo) nada tem de surpreendente, visto que para defi falamos aqui, mas a qual nos lembraremos, a este propósito, nos
nir o terceiro é preciso situá-lo bem entre o 2 e o 4. parece muito desfavorável para ó estudo aprofundado do proces
Enfim, convém sublinhar que esta numeração não constitui so e das práticas analíticas, porque, é o caso de dizê-lo, intro
uma seqüência.finita. Ela é um modelo, ou uma forma simbólica, duz no campo um número de variáveis incontroláveis. Talvez
um axioma, um algoritmo. Na prática isso pode significar que ca igualmente, por referência a diversos tipos de psicoterapias: psi
da número de ordem pode comportar diversas unidades ou subu coterapia de grupo, institucional, psicodrama, terapia familiar, as
nidades. Diz-se um paciente, mas isto pode implicar diversos. quais procedem todas em sua origem da teoria psicanalítica -
Como um exemplo não se referiria a outros em uma metodologia mais ou menos bem compreendida e adaptada - mas que mar
experimental e comparativa? Diz-se um analista, mas isto pode cam também, em suas aplicações, suas multiplicações anárquicas,
indicar outros. E é mesmo o caso geral. Em psicanálise teórica e seus transbordamentos, uma degradação certa e contínua da aná
prática (teórico-clínica) só se pode ser pluralista. A expressão lise que as gerou.
"plurirreferencial" vem daí. Repitamos então que este não é de modo algum o caso. Salvo,
talvez, cm um enquadre onde o objeto fosse abarcável. Ou seja,
50 A SUPERVISÃO NA PSICANÁLISE A ANÁLISE QUARTA 51
não temos intenção de nos prestar - diretamente ou não - a Wilfrid Sebaoun - Apreciei muito as observações feitas por
qualquer transformação do processo analítico em um processo
Jean-Paul Valabrega, particularmente sobre o uso e mesmo a
com registro em atas e audiências de tribunal•.
persistência do termo controle. O que quero dizer não visa
Para concluir agora em poucas palavras: o "tratamento con
esgotar o assunto, longe disso. Trata-se de uma observação
trolado" - segundo o título mantido por estas Jornadas - a aná
do tipo estritamente psicanalítico, ou seja, de uma interpre
lise quarta e a situação interaoalítica - segundo nossos próprios
tação. �da, minha interpretação não pretende ser univer
conceitos - devem sua importância ao fato de se encontrarem no
sal; talvez, se ela valer alguma coisa, seja apenas para um pe
cruzamento de duas vias: primeiro, a prática analítica, em seguida
queno número de casos dos quais tenho experiência. Aí está.
a formação para esta prática; a entrada na instituição analítica,
Por que este termo controle é tão persistente? Creio que é
enfim, ou seja, na situação de relação dos analistas entre si e com
porque é a palavra justa para designar um certo fenômeno, a
a sociedade.
saber, que o controle é uma demanda do psicanalista em con
Como exprimir mais claramente que seus interesses não são
trole. De fato, é ele que controla alguma coisa. E o que ele
nada menos que a aoálisc de hoje e de amanhã?
quer controlar? Na minha opinião, ele quer controlar dois
pontos. Um, que ele é digno. É claro que no texto manifesto
DISCUSSÃO do que ele poderia dizer ele quer se certificar de que é digno
de manter o ofício de psicanalista, de que ele é reconhecido
Pierre Lembeye - Quero primeiro responder a Coorad Steio. como tal pelos personagens delegados para isso. De fato é
muito mais profundo, e creio que convém reconhecer que o
Se de certa forma o controle pode ser subsumido dentro da
p�icanalista em controle deseja, ele, controlar o fato 4e que é
própria aoálisc, eu não vejo que interesse haveria em fazer a
digno do amor de uma mãe ideal por quem aspira ser amado.
distinção entre aoálisc pessoal e análise didática. Em relação
O segundo ponto que ele quer controlar na mesma situação e
à formulação que você propôs, ao mesmo tempo, de certo
no próprio exercício do ofício que ele professa é que ele é
modo eu concordo, mas tenho também a impressão de um
eventualmente ele mesmo esta mãe ideal por quem aspira ser
grande desuso: são coisas que será preciso dizer de outro
amado. Esta observação é muito geral e suponho que vocês
modo. O controle põe em jogo uma relação de mestre a
me dirão que ela sublinha uma situação que se encontra por
discípulo e, de certo modo, se constitui como um memorial
freudiano, como um dispositivo que tem relação com o nome toda parte, particularmente entre os psicanalistas. A este res
de Freud, ou o nome de Lacan. É, de certa maneira, uma en peito, creio que Coorad Stein adiantou um ponto que cabe
cenação que privilegia a genealogia psicanalítica, a rede psi para o meu sentido. Ele contou um pequeno episódio um
canalítica, de alto e baixo, do pai fundador até os discípulos; pouco misterioso de uma de suas análises: uma pessoa lhe
se poderia mesmo dizer a linhagem confraternal, mas fazen comunica suas dificuldades com um paciente que quer deixá
do a diferença entre o que é um colega que tem um nome, la, pede-lhe com insistência uma intervenção. Coorad Stein
um renome, e aquele que não tem nome dentro do jogo psi finalmente concorda e lhe dá um conselho. O conselho não
canalítico. serve, a pessoa perde assim mesmo seu paciente; contudo ela
está bem contente. Como Coorad Stein diz de bom grado, há
possibilidade de interpretar o que se passou. A pessoa que
pedia a intervenção obteve a resposta de que, com efeito, não
• O autor utiliza o, termos prousnu (processo, no sentido de como algo se é bom que um paciente deixe seu psicanalista. Então, indire
desenvolve) e proc� (no sentido jurídico, de processar e julgar). (N. da T.) tamente, Coorad Stein lhe dizia que é desejável que a relação
52 A SUPERVISÃO NA PSICANÁLISE A ANÁLISE QUARTA 53
entre paciente e analista perdure, ou seja, que não há qual b) ele quereria controlar que é digno de uma mãe ideal, e
quer raz.ão para que tal idéia semelhante se aplique à relação digno de ser - no exercício da análise - esta mãe ideal.
que ele, Conrad, tinha com sua paciente. No fim das contas Além de esta referência unicamente maternal me parecer
ele a assegurou enfaticamente de seu apego a ela. Como ele discutível, eu responderia o seguinte: o que especifica a po
mesmo escreveu, com muita raz.ão, a preocupação constante sição do analista - posição terceira, como eu disse, posição
de cada paciente é de se certificar permanentemente da con do terceiro simbólico - é precisamente que ela não é nunca
tratransferência de seu psicanalista, quer dizer, do amor que certificada e adquirida de uma vez por todas. Ela é constan
lhe dedica seu psicanalista. temente reposta em questão e retomada pela via interana/fti
ca: análise quarta ou sessões inter. Em conseqüência, em nos
sa matéria, o dignus est intrare ou a prova do amor ideal ou
Mau.d Mannoni - Concordo com Valabrega por dizer que a
idealizado são os engodos dos quais, sob o pretexto do con
denominação controle é criticável, porque este termo se refe
trole, não podemos ser servidores ou cwnplices. Como já
re ao lugar ocupado pelo analista de controle e à escolha de
mencionei também, a relação a dois - dual - não pode ser
um método. O termo supervisão foi adotado com a preocu
pação de introduzir a idéia de um trabalho prático referido a
senão sedutora ou agressiva e é freqüentemente ambos de
uma vez.
um terceiro, um analista que não se situa como responsável
pelo paciente, o que inflete em sentido diferente a direção
do trabalho empreendido. É importante lembrar que um sa
ber está lá, no paciente certamente, mas também no analista
Conrad Stein - Parece-me que a questão da necessidade, ou
mais, da exigibilidade do controle, tal como a levantei - e
em formação, saber presente nas falsas teorias que consti
que não se pode confundir com a do interesse que pode ha
tuem, num momento da análise, uma preparação para a
ver quando ele é empreendido em boas condições - foi um
compreensão. Há um tipo de saber presente nas falsas teo
pouco escamoteada. Valabrega sem díivida me fez justiça su
rias das crianças, mas também na ideologia que governa, sem
blinhando a importância que reveste a meus olhos uma se
que ele saiba, o analista em formação, um tipo de saber que
_ gunda análise, mas daí a afirmar que minha posição exigiria
foi sujeito ao recalcamento. O que se encontra na análise e
que eu aceite promulgar a necessidade desta segunda análise
na condução de um tratamento é o rejeitado do saber e for
no lugar do controle, há um passo que eu não daria, pois,
mas diversas de ocultamento. Do mesmo modo, o analista
precisamente, eu me recuso a promulgar qualquer lei que se
em formação funciona com referências por ele ignoradas que
ja.
vale a pena pôr em evidência, pois fu.em parte do que o go
verna sem que ele saiba. Há uma verdade nas falsas teorias e
resgatá-las faz parte do trabalho a ser continuado pelo candi
dato para que ele permaneça, após sua análise e graças a seus
pacientes, exposto ao inconsciente.