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Introdução
1.1 Cenários
1.2 Objetos
Os objetos nada mais são que a materialização das soluções usuais encontradas pelo
homem para resolver problemas cotidianos. Dessa maneira, recuperá-los e trazê-los à cena é uma
forma eficiente de resgatar atitudes, comportamentos e hábitos populares. A isso, soma-se o fato de
que em cima de cada objeto usual no dia-a-dia o povo elabora um incontável número de crenças e
tradições reveladoras do que é, como age e no que acredita o homem tipicamente brasileiro.
De utensílios domésticos a brinquedos de criança, toda a cenografia de “Hoje é dia de
Maria” baseou-se na cultura popular, neste sentido é que cabe enfocar a boneca de palha. As
bonecas de pano são objetos com os quais a “lúdica infantil se enriquece; feitas por artesãs
anônimas, em todo o Brasil, principalmente onde os governos não puderam oferecer recreação
dirigida para a infância” (ARAÚJO, 1967, p.301). Por serem de produção efetivamente anônima,
Camara Cascudo diz que as bonecas (de pano ou de palha) são documentos expressivos da arte
popular e atestam as tendências e orientações da estética coletiva, além de modificações,
persistências e sobrevivências de aspectos culturais do povo.
Mais alguns passos rumo às “franjas do mar” e Maria revela outro objeto de grande
significado: a chave. A simbologia arraigada à chave pela cultura do povo e resgatada na minissérie
é a de um objeto capaz de abrir grandes tesouros, fechar grandes tristezas e afastar grandes
dificuldades. Ainda hoje, é comum encontrar-se com pessoas que carregam no peito uma pequena
chave amarrada a um cordão, ou portas de casas onde figuram uma chave dourada na qual se vê
estampada uma imagem de santo. Muito embora, o caráter apenas utilitário do objeto venha
suplantando seu significado mítico.
Outro artefato popular presente em “Hoje é dia de Maria” é a rede. A rede é tão brasileira,
tão presente na história e na cultura que esteve até na carta de Pero Vaz de Caminha enviada ao
Império Português na qual ele versava sobre as belezas e características da terra e dos nativos
recém descobertos.
O espelho aparece na minissérie em diversas situações o que evidencia o complexo de
significados existentes em torno dele, criado pela sabedoria do povo. As crenças na vida autônoma
da imagem refletida, no poder defensivo da face brilhante capaz de repelir as forças adversas e,
principalmente, no azar advindo da quebra de espelhos são social e culturalmente difundidas e, até
hoje, regem comportamentos e atitudes das pessoas em todo o Brasil. Este tipo de crendice e
superstição reelaborados na história colaboram de forma efetiva para a criação do panorama
cultural brasileiro e para a identificação do público com a narrativa, os dois objetivos centrais da
obra.
Um outro objeto comum da arte popular com significados variados é a máscara. Desde os
rituais indígenas até os bailes de carnaval, a máscara tem presença na cultura nacional. Vestindo
determinada máscara a pessoa deixaria de ser o que exatamente é e um outro ser se apoderaria do
corpo levando-a a agir de forma irreconhecível.
Essa idéia se baseia nas crenças dos índios e, atualmente, se reflete quando as pessoas
utilizam máscaras para poderem agir de modo transgressor ou reprovável socialmente. Percebe-se,
assim, que a cultura nacional é um todo significativo que deixa marcas ao longo da história do país
e do povo, influencia ações e condiciona comportamentos cotidianos vividos despretensiosamente,
mas que carregam consigo a simbologia histórica que pôde ser recuperada com a minissérie.
A imaginação do povo não tem limites e a cultura do Brasil é recheada por crendices ligadas
aos elementos da natureza, mitos referentes aos animais, além de superstições envolvendo o
tempo, o sonho e a morte. Esse complexo imaginário do brasileiro foi revivificado em “Hoje é dia de
Maria” buscando reconhecimento e identificação entre a cultura revisitada, o público e seu cotidiano.
O que fundamenta e dá sentido à caminhada de Maria é a busca das “franjas do mar”.
Cabe, então, algumas palavras sobre a fé do povo na sacralidade e no poder benfazejo das águas.
Marilena Chauí lembra que a costa litorânea é tida, desde os tempos da colonização, como o lugar
da morada de Deus. Daí, a cultura brasileira arraigou ao pensamento do povo a idéia de que a vida
seria melhor perto do mar. Idéia que, além de impulsionar os passos de Maria, na ficção, justifica,
até hoje, a migração de milhares de pessoas rumo ao litoral, na realidade.
Sem contar que na cultura do Brasil as águas têm um papel purificador. O povo acredita
que os feitiços lançados na água têm efeito decisivo e, para desmanchá-los, é necessário utilizá-la,
também. O poder divino do elemento faz parte da vida de todos; ela lava, purifica; leva embora todo
mal. Tanto é que costuma-se dizer que um banho de chuva “lava a alma”. A utilização da água,
então, como meio para se acabar com o mal e como fim aonde se quer chegar e encontrar uma vida
feliz, tem relação direta com o imaginário e a prática popular.
Uma outra crendice constituidora do conjunto que aqui chamamos de cultura popular
brasileira é a do diabo comprador de sombras. A crença revela que o diabo tentador oferece riqueza
e realiza sonhos (principalmente materiais) em troca da sombra (alma) da pessoa ambiciosa. Esta
situação é extremamente difundida pelo Brasil e não é difícil, ainda hoje, ouvirmos: “‘fulano’ vendeu
a alma ao diabo”, quando alguém enriquece de repente. Assim, com a passagem da negociação
entre Asmodeu e Zé Cangaia, liga-se intrinsecamente o universo mitológico do brasileiro à vida
cotidiana do público que é levado a perceber que também faz parte desse universo.
Na minissérie encontram-se muitas cenas que focalizam pragas, feitiços e maldições.
Asmodeu praguejou e acabou por roubar a infância de Maria. São correntes, entre o povo brasileiro,
histórias e receitas de feitiços para acabar com o inimigo execrado, de mandingas para conquistar
amores, de macumbas para realizar sonhos muitas vezes boicotando os sonhos dos outros, etc.
Com isso, nas maldições de Asmodeu estão implícitas todas estas pragas rotineiras que as pessoas
lançam umas sobre as outras; está implícito, portanto, o caráter místico e, muitas vezes, obscuro de
rituais pertencentes à cultura popular brasileira e relacionados aos desejos do povo e seus métodos
para alcançá-los na vida real.
Outro elemento que carrega consigo muitas crendices e superstições populares é o sonho
e, como tal, não poderia ficar de fora de “Hoje é dia de Maria”. Os significados dos sonhos
intrigaram e ainda intrigam o povo e a interpretação que deles se faz, logicamente, está sempre
baseada em aspectos puramente culturais. Na minissérie, o Pai sonha com uma gralha negra que
representa a morte. Cascudo revela muitas outras interpretações ainda vivas na memória popular
como, por exemplo: “dentes caídos, mau presságio; águas claras, felicidade; fogo, alegria”.
(CASCUDO, 1993, p.719).
A universalidade do sonho é indiscutível e o povo brasileiro continua traduzindo seus
sonhos, obstinado em decodificar a mensagem enviada durante o sono. Deste modo, incluir um
hábito inerente a todas as pessoas (sonhar) e demonstrar que as atitudes decorrentes deste hábito
estão culturalmente ligadas a cada povo, significa querer fazer com que o telespectador reconheça
que ações que parecem individuais são, na verdade, compartilhadas pela coletividade.
Quando se fala em crenças do povo brasileiro não se pode deixar de lado todo o arcabouço
religioso (principalmente, católico) que sustenta muitos aspectos da cultura popular. A fé católica foi
fortemente explorada na minissérie.
Marilena Chauí indica aspectos da religiosidade popular absolutamente concordantes com o
que se observou em “Hoje é dia de Maria”:
Um primeiro aspecto da atitude religiosa popular é a relação intrínseca entre a
crença e a graça, isto é, a fé busca milagres. O que se pede a Deus e aos
santos, ou aos orixás e exus, ou aos espíritos de luz? Pede-se a cura de
doenças, retorno à casa de um membro desaparecido, fim do alcoolismo,
emprego, moradia, regeneração de algum membro da família. O que é patente
neste “sistema de graças”, para usarmos a expressão de Douglas Monteiro, é a
referência às desgraças do cotidiano, e o que se pede é que a vida não seja tal
como é. (CHAUÍ, 1986, p.82)
É, exatamente, o que se observa quando o Pai pede a Deus a volta da mulher e dos filhos
para que a vida se restabeleça. Ou seja, ele nega a vida real e presente, rogando para que tudo
volte a ser “bom”, como antes. Nas religiões populares, portanto, o milagre é rotina simples,
fidelidade mútua entre as divindades e os fiéis, com ou sem a ajuda de uma igreja ou mediadores.
Ele [o milagre] não é a quebra, mas a retomada da ordem natural das coisas na
vida concreta do fiel, da comunidade ou do mundo, por algum tempo quebrada,
aí sim, seja como provação consentida por deuses e santos ao fiel servidor ou
justo, seja como invasão direta das forças do mal sobre a ordem terrena [...]. A
rotina do milagre faz com que, em qualquer área confessional do domínio
popular, uma grande parte dos momentos de oração pessoal, familiar ou
comunitária seja para pedi-lo ou para agradecê-lo (BRANDÃO, 1980, p.131-132)
O que se confirma nas orações do Pai nas quais ele pede a graça do reencontro com a
filha, ou ainda, um sinal de Deus, mostrando-lhe o caminho correto a seguir. Assim como nas
preces de Maria que deseja que sua vida seja reordenada pela ação de Nossa Senhora, já que
seus caminhos foram entortados por Asmodeu, a “invasão direta das forças do mal sobre a ordem
terrena”.
Dentre todos os personagens de “Hoje é dia de Maria” alguns devem ser destacados
porque suas características ajudam a montar o caráter do homem brasileiro imaginado, ou porque
denotam comportamentos tipicamente populares, ou ainda, porque fazem parte de universos muito
particulares e indispensáveis na composição do panorama da cultura popular brasileira.
Os retirantes estão na literatura brasileira desde João Cabral de Melo Neto e, nada mais
são, do que os sertanejos que abandonavam o sertão fugindo da seca carrasca e rumavam em
direção ao litoral. Quando Maria encontra os Retirantes ela, além de perceber que não é a única na
jornada rumo ao mar, enfoca um primeiro problema do Brasil dos vários que aparecerão na obra: a
falta de assistência do governo e da própria sociedade civil aos viventes do sertão nordestino. A
falta de água que impossibilita a lavoura, mata os animais e leva à fome, a falta de assistência
médica e a desinformação caracterizam o completo abandono de milhares de pessoas que também
fazem parte do Brasil e que também contribuem na construção da identidade nacional.
Indicando a mesma deformidade do país, só que agora não mais no sertão, mas nas
grandes cidades, surge o Mendigo que, além de representar o brasileiro pobre, analfabeto, indigente
renegado às ruas, representa a própria desigualdade social que assola a nação. Assim, o público,
que em sua grande maioria vive nas cidades, reconhece neste personagem um pouco de
brasilidade.
Um outro típico brasileiro encontrado em “Hoje é dia de Maria” é o Cangaceiro, o criminoso
que ronda o sertão vivendo de assaltos, e que povoa o imaginário popular desde os lendários
Lampião e Maria Bonita. A figura, imaculada na cultura popular, é reconhecida pelo público como
personagem historicamente nacional e pode, desta forma, relacionar a história do Brasil e de seu
povo com a história contada através da minissérie.
É com a intenção de ligar a história da nação à jornada de Maria que a menina encontrará
os Índios. Os primeiros habitantes do Brasil entram em cena com o poder de recuperar na memória
do telespectador toda a simbologia cultural indígena, fundamental na configuração da cultura
popular e do próprio povo enquanto ser culturalmente construído. O público sabe que deve muito de
sua formação ao índio e, por isso mesmo, entende que sem ele a sua identidade estaria incompleta.
Caráter exatamente igual tem o encontro do Pai com o Português, o colonizador, quem
introduziu no brasileiro os elementos da cultura branca, européia. Sem a influência, a colaboração e
a determinação portuguesa, definitivamente, o povo, ou seja, o telespectador não seria quem é.
Tem-se, portanto, o mito da mistura racial harmoniosa, formador da identidade nacional, sendo
recontado, ao público, em cada cena de “Hoje é dia de Maria”.
E por fim, Maria, o espelho da alma nacional imaginada e reconstruída na minissérie.
Esperta, solidária, sagaz, afetiva, amiga, companheira, perseverante, corajosa, determinada,
trabalhadora, carinhosa, inteligente, vivaz, forte, capaz, religiosa, batalhadora, esperançosa,
confiante, destemida..., incansável..., feliz..., “heroína” a menina reúne em si qualidades do homem
brasileiro idealizado.
Muitas vezes ao longo da história do Brasil, governos, aliados aos meios de comunicação
de massa, determinaram quais deveriam ser as características do brasileiro, ou seja, desenharam
os contornos da identidade nacional. Muitas destas características foram recuperadas por “Hoje é
dia de Maria”, que intencionou, de maneira análoga ao que acontecia no passado, espelhar um ser
idealizado e imbutir na mente do telespectador quais são os traços de personalidade que ele deve
perseguir e, como essas qualidades já povoavam o imaginário popular, levaram-no a uma
(re)identificação. Sendo assim, o povo pôde se ver reconstruído, revivificado, pôde ver Maria e se
ver refletido em pelo menos um pouco daquela menina, a materialização ideal da identidade
nacional.
2. O efeito revigorante de sendo identitário
O presente artigo debruçou-se sobre a minissérie “Hoje é dia de Maria”, uma produção que
marcou a história da televisão nacional, transmitida pela Rede Globo, para entender como a obra
revisitou a cultura popular brasileira, trouxe à cena muitos de seus elementos reelaborados e
conseguiu proporcionar ao telespectador um encontro com sua origem de ser social e cultural.
Quando tomam-se as estratégias representacionais que, segundo Stuart Hall, são
acionadas para construir nosso senso comum sobre o pertencimento e sobre a identidade nacional,
pode-se perceber que a maioria destes métodos discursivos estiveram presentes em “Hoje é dia de
Maria”. Recapitulando, temos:
A minissérie configurou-se como mais uma “estória” a respeito do Brasil e de seu povo,
contada ao próprio povo. Assim, trazendo vivências e características pessoais partilhadas, mesmo
que imaginariamente, por todos os telespectadores, a obra é capaz de uni-los, conectando-os na
formação do espectro de brasilidade. Ou seja, o telespectador vê, nos olhos da mente, como
compartilhando daquela narrativa que revigora símbolos e rituais representantes de experiências
comuns as quais, por sua vez, dão sentido à nação.
A história de Maria, para simbolizar a jornada do brasileiro rumo à sua identidade, além de
reproduzir imagens presentes no imaginário de todo o público, vai enfocar a herança e a
continuidade do caráter brasileiro indicando que a identidade está na verdadeira natureza das
coisas, embora muitas vezes adormecida, mas sempre pronta para ser despertada e reassumir sua
eterna existência. Esta é a segunda estratégia representacional sugerida pelo autor. É, exatamente
nesta direção que vem a minissérie: acordar a identidade sonolenta e devolvê-la ao povo,
revivificando o senso de pertencimento existente no coração de cada um.
No processo de retorno às origens e aos elementos essenciais do caráter nacional
relacionados à rede cultural decorrente do processo de “aculturação harmônica” pelo qual passaram
brancos, negros e índios, em terras brasileiras, “Hoje é dia de Maria” leva o povo a fazer o “caminho
de volta” para se encontrar consigo mesmo.
E a intemporalidade do espectro do ser brasileiro é evidenciada quando se constata o
encantamento do público pela história demonstrando que, apesar de estarmos vivendo a
globalização e homogeneização cultural, a identificação, o reconhecimento e o encanto estiveram,
ainda estão e sempre estarão no que é mais simples e genuinamente brasileiro.
Assim, mesmo que Hall diga que muitas tradições características de uma nação e de um
povo sejam inventadas, e esta “invenção da tradição” seria um terceiro recurso discursivo para
identificar um caráter nacional, a minissérie preocupou-se mais com o poder simbólico e de
encantamento dos elementos reproduzidos do que propriamente se eram inventados e construídos
imaginariamente, ou não. Ou seja, a tradição pode até ser inventada se servir para reinventar o
brasileiro.
A própria despreocupação com a localização temporal da história vem reforçar, além da
intemporalidade da identidade buscada, a intenção de gerar reconhecimento simplesmente por
remontar a história de um povo repleto de maravilhosos costumes e, então, redescobrir esse povo
(inventado).
Uma quarta forma de se construir a narrativa histórica de um povo é, segundo Hall, elaborar
um mito fundacional que localize a origem da nação e seu caráter em acontecimentos do passado.
Renato Ortiz considera como mito de origem do Brasil o encontro (“pacífico”) do branco com o negro
e o índio. Neste sentido, Marilena Chauí diz que o mito é uma narrativa que carrega consigo
soluções imaginárias para tensões reais difíceis de serem resolvidas, como o preconceito racial.
Desta forma, é em cima do mito que se constrói toda uma simbologia capaz de fazer vingar a
unicidade e a identidade de um povo cortado por profundas diferenças.
E é pela capacidade de persuasão dessa simbologia que, de acordo com Chauí, o mito não
para de encontrar novas formas de manifestar-se e quanto mais parece ser outra coisa, tanto mais é
a repetição de si mesmo. Portanto, pode-se considerar “Hoje é dia de Maria” como o próprio mito
fundacional do Brasil sendo recontado, através da televisão, tendo em vista que foram apresentadas
as três origens da cultura brasileira e que Maria – mestiça – encerrando em si todas as
características próprias do ser brasileiro, unificou as partes, materializou a identidade nacional.
Deste modo, quando a minissérie resgata esse “conjunto de significados” culturais responsável por
construir o ser nacional, ela resgata o próprio ser nacional, a própria brasilidade, devolvendo-a ao
telespectador.
Ainda segundo Hall, na pós-modernidade as diferenças regionais foram sendo
subordinadas à idéia de totalidade, ou seja, foram colocadas sob o teto do estado- nação onde
todos os habitantes, por mais diferentes que fossem, pudessem se reconhecer. “Hoje é dia de
Maria” recupera desde o modo de vida caipira, até lendas indígenas, crenças africanas e hábitos
europeus, ou seja, recupera todas as diferenças culturais e étnicas que, hoje, fazem parte da cultura
brasileira. Portanto, mesmo que o telespectador não tenha contato direto e real com os elementos
reelaborados identifica-se neles porque entende que fazem parte do que é ser Brasil. Isto é, o
público se une e se identifica na e pela diferença.
As culturas nacionais são, de acordo com Hall, simbologias que constroem a narrativa da
nação. Se é a cultura que traça os caminhos de um povo levando-o ao reconhecimento, a
minissérie, que referencializou-se na cultura, (re)contou, então, a história do Brasil fazendo com que
o público se reconhecesse nela.
De maneira complementar ao que foi exposto acima, Hall diz que a cultura nacional, além
de produzir a história mítica de um país, define a identidade de seu povo e que quando esta cultura
é trazida à tona revigora-se o senso identitário da população.
Assim, como indiscutivelmente “Hoje é dia de Maria” resgatou a cultura brasileira,
reelaborou muitos aspectos culturais típicos do Brasil e colocou-os em cena; como é indiscutível
que a minissérie construiu-se em cima de simbologias culturais caracteristicamente nacionais é,
também, indiscutível que ela foi capaz, sim, de revivificar a identidade do povo. Assim, constatou-se
que a televisão, meio de comunicação mais importante e poderoso do país, capaz de influenciar e
determinar comportamentos e idéias foi responsável, mais uma vez na história do Brasil, por
redesenhar a identidade do brasileiro e levá-lo a reconhecer-se nela, ou seja, foi responsável por
dizer ao povo o que é o povo.
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