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O Contexto

 “Para os hispano-americanos o século XVIII foi o tempo da prata [...]. Em


contraste, o século XIX foi o tempo das independências, de esperança nos
desígnios do progresso e da razão. Foi também, entretanto, época de entropia
política e institucional que levou, em muitos sentidos, a retrocessos.” (p. 387).
 “O problema não se limitava à dificuldade dos regimes pós-independência em
estabelecer monopólio sobre os meios de coerção em seus próprios territórios,
abrangendo também a dificuldade para definir precisamente a extensão desses
mesmos territórios, que permanecia indeterminada para grande parte de seus
habitantes.” (p. 388).
 “A incerteza sobre o futuro imediato tornava muito difícil o estabelecimento de
relações diplomáticas regulares entre o Brasil e as repúblicas vizinhas” (p. 388).

O Drama Paraguaio
 “A identidade nacional paraguaia foi cristalizada na segunda década do século
XIX, a partir de vários fatores, entre eles a sua precária posição na bacia do
Prata, sua exposição permanente à instabilidade das províncias unidas argentinas
e seu isolamento em razão das rivalidades entre portenhos e brasileiros.
Finalmente, a composição étnica do povo paraguaio, a maior parte do qual
descendia da mestiçagem entre espanhóis e índios, e o uso massivo do guarani
como língua franca, facilitaram a percepção de sua identidade nacional como
distinta da identidade de Buenos Aires.” (p. 389).
 “Uma consequência da forma como o Paraguai obteve sua independência foi a
interrupção dos contatos regulares com o exterior.” (p. 390).
 “O excepcionalismo paraguaio não seria, portanto, fruto de um protos-
socialismo ou capitalismo de Estado, mas a consequência de um conjunto de
fatores locais que teriam levado a liderança daquele país a aprofundar práticas
protecionistas.” (p. 390).
 “No que se refere às relações com o Brasil, os contatos foram sempre
inconstantes, marcados por aproximações e recuos [...] As alianças ocasionais,
entretanto, não aproximaram os governos de forma permanente, e os dois
vizinhos mantiveram-se divididos, tanto pelos contenciosos de fronteira, como
também em relação à navegação do rio Paraguai.” (p. 391).

As Causas da Guerra
 “Durante a década de 1860 os paraguaios foram vítimas de ambos: mudanças na
estrutura política da região e transformações na formulação da política externa
guarani.” (p. 391).
 “O principal foco de tensão para o Brasil na região era a situação uruguaia.” (p.
392).
 “Com a ascensão do partido Blanco ao poder, em 1892, os conflitos entre
brasileiros e uruguaios tornaram-se mais intensos.” (p. 392).
 “Em 1863 teve início outra guerra civil no Uruguai. Os partidos Blanco e
Colorado eram os grandes protagonistas [...]. Essa guerra civil, como sempre,
também envolvia interesses brasileiros e argentinos, só que, ao contrário do que
geralmente acontecia, os interesses dos dois países convergiram no apoio aos
colorados.” (p. 392).
 “A ação brasileira e o apoio dado aos colorados no Uruguai irritaram o
governador paraguaio que se havia oferecido para mediar diplomaticamente a
situação. O desdém pela oferta paraguaia foi considerado uma afronta pelo
ditador López, que anteriormente havia mediado com sucesso a guerra civil
argentina.” (p. 393)
 “A ascensão de Bartolomeu Mitre (1821 – 1906) como presidente da República
Argentina unificada permitiu a implementação de programa de modernização”.
(p. 393)
 “Paralelamente, do outro lado da fronteira, a reintegração da província do Rio
Grande do Sul ao império (em 1845) restaurou a capacidade interventora
brasileira no rio da Prata.” (p. 393).
 “Mesmo levando em conta que os processos de construção do Estado nacional
no Brasil e na Argentina estivessem ainda bem longe de completa integração,
ambos os países eram nações muito mais estáveis na metade da década de 1860
do que haviam sido até então.” (p. 393/394).
 “O governo paraguaio preconizava o respeito ao equilíbrio de poder na bacia do
Prata. O desprezo brasileiro foi visto como afronta a esse equilíbrio, só passível
de ser respondida pela guerra. Nesse cálculo, o governo paraguaio contava com
o apoio de alguns caudilhos e também com o suporte de oligarquias dissidentes
que se opunham a Buenos Aires. [...] O problema com esses cálculos é que
estavam baseados na situação internacional anterior, não levando em
consideração as modificações ocorridas na região, que diminuíram as
possibilidades de apoio dos paraguaios em caso de guerra.” (p. 394).

A Ofensiva Paraguaia, Dezembro de 1864 – Junho de 1865


 “uma expedição fluvial paraguaia desembarcou na cidade de Coimbra, atual
Mato Grosso do Sul, iniciando a invasão daquela província.” (p. 395).
 “Em abril de 1865, quatro meses após o início das hostilidades, o governo
paraguaio solicitou autorização ao governo argentino para cruzar a província de
Missiones na tentativa de alcançar o Uruguai a tempo de mudar o destino da
guerra civil daquele país. O presidente argentino, Bartolomeu Mitre, recusou
essa permissão. Os unitários argentinos apoiavam os colorados e pretendiam
manter a neutralidade no conflito entre o Brasil e o Paraguai.” (p. 395).
 “A invasão custou caro aos paraguaios que, rompendo com os argentinos,
perderam importante fonte de suprimentos, especialmente de armas.” (p. 396).
 “Nessa fase, o principal obstáculo anteposto à invasão foi a vastidão do território
a ser conquistado, aliada à péssima preparação militar dos comandantes
paraguaios e às decisões equivocadas de López” (p. 396).

Repercussões
 “O regime ditatorial de López, sai economia dirigida de forma centralizada e a
composição racial predominantemente indígena daquele país eram contrastadas
à imagem do sistema político imperial (simbolizada pela monarquia
constitucional existente no império), a sua economia baseada na agricultura de
exportação e as suas potencialidades demográficas. Tal visão reforçava a missão
civilizatória do governo imperial” (p. 396/397).
 “Nesse páthos enraizavam-se tanto a repulsa pela invasão sem declaração prévia
de guerra quanto o senso de pertencimento a um recorte territorial cuja
consolidação datava de apenas duas décadas.” (p. 397).

Recrutando Voluntários
 “Mesmo considerando-se as exceções a essa perspectiva, parece correto dizer
que o recrutamento recaía sobre aqueles indivíduos que figuravam no grupo dos
pobres desprotegidos.” (p. 398).
 “Durante a maior parte do século XIX o serviço militar era considerado
atividade brutal e perigosa, adequada apenas aos indivíduos vistos como
socialmente indesejáveis. Esse serviço possuía implicações penais, dado o
caráter disciplinar de sua ação sobre os indivíduos considerados
desclassificados, apartando-os do restante da sociedade por longos períodos.” (p.
398).
 “Percebendo o clima propício criado pela invasão paraguaia, as autoridades
procuraram tirar proveito da situação, criando estruturas que facilitassem a
rápida ampliação do Exército.” (p. 399).
 “Motivava-os também a promessa de terras, empregos públicos e pensões, feita
aos Voluntários da Pátria.” (p. 399).
 “Por volta de junho de 1865 as condições operacionais eram precárias, pois os
soldados paraguaios encontravam-se pessimamente uniformizados, não havia
casacos, nem linhas regulares de suprimentos.” (p. 399).

A Invasão do Paraguai

 “A assinatura do Tratado da Tríplice Aliança, em maio de 1865, praticamente


selou a sorte do Paraguai na guerra.” (p. 400).
 “Dado o isolamento, seria natural que os paraguaios se rendessem, mas assim
não pensou López. Esperando que os aliados se desentendessem no decorrer da
campanha, o ditador ordenou o recuo de suas forças para o próprio território,
contando que os paraguaios oferecessem resistência encarniçada às tropas
invasoras.” (p. 400).

Resistindo ao Recrutamento
 “A campanha mostrava-se longa e difícil. [...] o aumento do número de
justificativas para as isenções e a diminuição do contingente voluntário.” (p.
401).
 “O problema surgiu quando o governo imperial designou guardas de províncias
não fronteiriças para atuar fora do país por período dilatado.” (p. 403).
 “Ao transferir corpos da Guarda para o front externo e subordiná-los ao
Exército, o governo imperial interferia diretamente na autoridade desses
homens” (p. 403).
 “Se a intenção inicial era transformar o Exército, pelo voluntariado, em espaço
mais digno, a massificação operada pelo recrutamento teve efeito muito
diferente do esperado, denegrindo a posição dos trabalhadores pobres e livres,
que viam crescentemente seu status igualado ao dos demais recrutas,
considerados ralé.” (p. 404).
 “Para aqueles obrigados a servir, uma primeira opção era a oferta de substitutos,
livres ou libertos. Logo um mercado de substitutos começou a operar em
diferentes províncias, recurso, porém, que só servia para quem pudesse pagar,
reforçando a visão da guerra do homem rico sustentada pela luta do homem
pobre.” (p. 405).

Libertando Escravos Para o Serviço Militar


 “A decisão de libertar número mais significativo de escravos para lutar contra o
Paraguai foi oficialmente tomada pelo imperador d. Pedro II em novembro de
1866.” (p. 406).
 “O governo imperial não tinha a intenção de desapropriar os escravos, Também
não pretendia manter um exército de escravos, como afirmam alguns
historiadores. [...] O que o governo buscava era a cooperação dos senhores e dos
religiosos, dispondo-se para isso a pagar preços de mercado.” (p. 406).
 “Sobretudo a dificuldade para obter novos recrutas mediante a libertação de
escravos demonstra a fraqueza do Estado imperial para extrair recursos dos
setores privados, mesmo em tempos de crise internacional.” (p. 407).

Caxias
 “Com o afastamento de Bartolomeu Mitre, o comando das tropas da Tríplice
Aliança passaria para o marquês de Caxias (1803 – 1880).” (p. 408).
 “Era um general político, capaz de coordenar as operações entre os três exércitos
da Aliança; mas era também um problema para o funcionamento do sistema
político do império, sendo adversário do gabinete no poder.” (p. 408).
 “O que se pretendia era a reorganização do Exército como espaço apartado das
influências proporcionadas pelas lutas políticas da sociedade.” (p. 409).

Drenando Recursos
 “A necessidade de ampliação dos gastos públicos comprometia a capacidade do
governo de planejar e controlar com adequação as despesas.” (p. 410).
 “Fato é, no entanto, que a guerra não dinamizou a capacidade industrial do país
nem melhorou sua infraestrutura de transportes, adicionando muito pouco ao
desenvolvimento da economia.” (p. 410).
 “Caxias utilizou-se de sua posição como comandante em período excepcional
para forçar a queda do gabinete progressista e a ascensão de um governo
conservador mais afinado com suas ideias e preferências.” (p. 411).

A Conquista do Paraguai
 “O próprio Caxias propôs isso ao imperador, afirmando que seria perda de
tempo e de dinheiro insistir no que chamava de “uma guerra de postos”. O
imperador, entretanto, insistiu na tomada de Assunção e na deposição definitiva
do ditador.” (p. 412).

A Dezembrada
 “Entre agosto e dezembro de 1868 o Exército brasileiro contornou as trincheiras
paraguaias pelo processo conhecido como “marcha de flanco”. [...] Esse
movimento permitiu que no final de 1868 um conjunto de batalhas fosse travado
perto de Assunção, desimpedindo o acesso por terra à capital paraguaia.” (p.
412).
 “Apesar das derrotas, Solano López escapara dos brasileiros e continuava no
comando de tropas sobreviventes. Contrariando as expectativas do comando
aliado, o ditador paraguaio decidiu prosseguir a guerra, apesar de todas as
evidências de que sua causa estava perdida.” (p. 413).

A Campanha da Cordilheira e o Fim da Guerra


 “a presença de López nas montanhas criava um problema para o império. [...]
Capturá-lo tornou-se a obsessão do Imperador, que nomeou seu genro, o Conde
d’Eu (1842-1922), comandante-em-chefe.” (p. 413).
 “Em meio ao caos com os salários atrasados, o desconhecimento do terreno e a
profusão de refugiados, o conde ainda agravou o problema permanente do
abastecimento.” (p. 414).
 “A morte do ditador transformou-o em mártir, imagem que seria utilizada no
futuro por políticos e historiadores revisionistas como símbolo de heroísmo” (p.
415).
A Ocupação do Paraguai e as Questões Diplomáticas
 “Dois problemas assombraram o gabinete conservador brasileiro nos anos
seguintes: o retorno dos veteranos e o acerto dos contenciosos com os governos
da Aliança, principalmente o da Argentina.” (p. 416).
 “Muitos líderes civis do império, porém, viam com desconfiança essas
homenagens, temendo que as festas e celebrações organizadas para receber os
soldados acabassem fortalecendo politicamente o Exército como instituição,
num momento em que o regime ainda se recuperava dos efeitos da derrubada do
gabinete progressista. Para esses observadores, era necessário desmobilizar
rapidamente as tropas vitoriosas, reconduzindo o Exército de linha às dimensões
do início da década de 1860.” (p. 417).

Conclusões
 “A partir de então, a memória do conflito seria manipulada de várias formas,
atendendo aos interesses imediatos de uma historiografia patriótica (que
prevaleceu até o final dos anos 1950), quanto a visões alternativas, construídas
por intelectuais críticos da forma como o poder político era exercido durante a
ditadura militar.” (p. 419).

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