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FUNDAMENTOS DA PSICOLOGIA JUNGUIANA- MITOS

DE CRIAÇÃO

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Sumário

INTRODUÇÃO 3

Biografia de Carl Gustav Jung 4

Fundamentos da Psicologia Junguiana - Estruturas Especializadas 9

Os Mitos: Fontes Simbólicas da Psicologia Analítica de C.G. Jung 17

O estudo dos mitos na Psicologia Analítica 20

CONCLUSÃO 32

REFERENCIAS 33

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NOSSA HISTÓRIA

A NOSSA HISTÓRIA, inicia com a realização do sonho de um grupo de


empresários, em atender a crescente demanda de alunos para cursos de Graduação
e Pós-Graduação. Com isso foi criado a INSTITUIÇÃO, como entidade oferecendo
serviços educacionais em nível superior.

A INSTITUIÇÃO tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de


conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação
no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua.
Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que
constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de
publicação ou outras normas de comunicação.

A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma


confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base
profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições
modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica,
excelência no atendimento e valor do serviço oferecido.

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INTRODUÇÃO

Carl Gustav Jung nasceu na Suíça em 1875. Criado numa atmosfera religiosa
que não compreendia e que custava a sustentar, Jung interessou-se pelo mundo dos
sonhos, da fantasia, da religião e dos mitos. Alguns estudos dizem que a proximidade
com o divino é algo que Jung atribuiu a uma espécie de herança materna, enquanto
que a fé no sentido do ritual cego e inquestionado teria sido algo herdado de seu pai.

Além das questões religiosas, Jung aproximou-se de conhecimentos em


ciências naturais, com um interesse desperto pela possibilidade de compreensão da
realidade através desses estudos. Para Jung, a contrariedade entre ciência e religião
era a base de suas insatisfações. Em meio a esses questionamentos acerca do
mundo, Jung decidiu-se pelos estudos em psiquiatria, como forma de compreender o
biológico e o espiritual cientificamente. Entre os autores que estudou, podemos
destacar as influências filosóficas de Kant, Platão , Goethe e Schopenhauer.

Em seus estudos em psiquiatria e na prática clínica, Jung tentou humanizar o


serviço de atendimento aos pacientes, buscando investigar, para além dos sintomas,
as questões existenciais que cada sujeito lhe trazia, tornando cada sessão clínica um
encontro único, repleto de significados. Dessa forma, evitava rotulações aos
pacientes e padronizações em termos de cuidados e tratamentos, ressaltando os
aspectos individuais de cada caso. Nessa época, Jung já utilizava uma técnica
rudimentar de associação de palavras, que dava grande valor aos relatos de seus
pacientes

A partir de seus estudos, Jung desenvolveu o que mais tarde ficaria conhecido
como “Psicologia Analítica” que investiga sonhos, desenhos e outros materiais como
vias de expressão do inconsciente.

No Brasil, a teoria junguiana teve bastante ressonância. Entre seus estudiosos


mais conhecidos, está a Dra. Nise da Silveira que escreveu um livro chamado “Jung:
Vida e Obra”. Nise é fundadora do Museu de Imagens do Inconsciente, que foi
resultado de seu incansável incentivo às produções artísticas dos internos do hospital
psiquiátrico, analisadas pela abordagem junguiana.

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Biografia de Carl Gustav Jung

Carl Gustav Jung (1875-1961) foi um psiquiatra suíço, fundador da escola da


Psicologia Analítica. Desenvolveu os conceitos da personalidade extrovertida e
introvertida, de arquétipos e do inconsciente coletivo.

Carl Gustav Jung nasceu em Kesswil, na Suíça, no dia 26 de junho de 1875.


Filho de um pastor protestante, com quatro anos, mudou-se com a família para a
Basiléia, na época, um grande centro cultural da Suíça.

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 Formação

Jung desistiu da carreira eclesiástica para estudar filosofia e medicina na


Universidade da Basiléia, onde ingressou em 1895 e logo despertou o interesse pelos
fenômenos psíquicos. Concluiu o curso em 1900.

Interessado nos problemas de transtornos de conduta, seguiu os


ensinamentos do psicólogo e neurologista francês Pierre Janet no hospital de la
Salpêtrière de Paris.

Em seguida, trabalhou como assistente do psiquiatra Eugen Bleuler, na Clínica


Bugholzli, em Zurique, médico que se tornou célebre pelos estudos da esquizofrenia.
Em 1902, Jung obteve o doutorado na Universidade de Zurique, com a dissertação
“Psicologia e Patologia dos Fenômenos Chamados Ocultos”.

 Jung e Freud

Em 1904, Jung montou um laboratório experimental onde iniciou a aplicação


de sua tese para o diagnóstico psiquiátrico, através da associação das palavras.

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Identificou conteúdos psíquicos reprimidos para o qual denominou de “complexo”,
estudo esse muito explorado por Freud.

Em 1905 tornou-se livre docente de Psiquiatria na Universidade de Zurique.


Em 1907 iniciou seu contato com Freud. Em 1908, juntos com Adler, Jones e Stekel,
se reuniram no primeiro Congresso Internacional de Psicanálise.

Dois anos mais tarde, o grupo fundou a Sociedade Psicanalítica Internacional,


da qual Jung se tornou o primeiro presidente e posteriormente criou sucursais em
vários países.

A publicação, em 1912, de seu livro Transformações e símbolos da Libido


significou o início de suas divergências com Freud, que culminariam com o
afastamento de Jung do movimento psicanalítico.

Na obra, Jung contesta os princípios da análise de Freud sobre a grande


influência que os traumas sexuais deixavam na vida humana. Por outro lado, Freud
não admitia que os fenômenos espirituais fossem usados por Jung como fonte de
estudos.

O relacionamento de Jung com Freud acabou de vez quando Jung publicou


Psicologia do Inconsciente (1911) no qual faz alguns argumentos contra as ideias de
Freud.

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 Psicologia Analítica

Carl Gustav Jung procurava entender o significado simbólico dos conteúdos do


inconsciente, a fim de fazer a distinção entre a psicologia individual e a psicanálise,
deu à sua disciplina o nome de “Psicologia Analítica”.

Jung seguiu seu caminho e destacou-se no uso de técnicas de estudos dos


desenhos e dos sonhos. Ambos relacionados ao inconsciente humano.

Em Tipos Psicológicos (1920), Jung observou que conforme a energia vital se


dirigisse para o interior ou para o exterior, resultaria no aparecimento de um dos dois
tipos psicológicos fundamentais: a introversão ou a extroversão.

Outros conceitos centrais da psicologia analítica são os complexos (conjunto


de representações psíquicas cuja influência se manifesta sem nenhum controle do
eu) e o do inconsciente coletivo.

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 Teoria dos arquétipos

Segundo Carl Jung, as sociedades humanas participam de arquétipos comuns


a todas elas, que se expressam através dos mitos, da arte, da religião, dos sonhos e
também da loucura e das doenças psíquicas.

Buscando determinar a natureza dos arquétipos, Jung penetrou numa aventura


espiritual que foi considerada, em algumas ocasiões, próxima do misticismo, como
destacou nos livros: Psicologia e Religião (1939) e Psicologia e Alquimia (1944).

Carl Gustav Jung faleceu em Zurique, na Suíça, no dia 6 de junho de 1961.

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Fundamentos da Psicologia Junguiana - Estruturas
Especializadas

 DIVISÃO BÁSICA DA PSIQUE

Basicamente, divide-se a Psique em: Consciência (Consciência Pessoal) e


Inconsciente, que por sua vez se divide em: Inconsciente Pessoal e Inconsciente
Coletivo, posteriormente denominado Psique Objetiva.

 CONSCIÊNCIA PESSOAL – corresponde à percepção consciente


ordinária;
 INCONSCIENTE PESSOAL – exclusivo de psique individual, mas não
consciente;

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 INCONSCIENTE COLETIVO OU PSIQUE OBJETIVA – possui
estrutura aparentemente universal na humanidade.

Além desses três níveis da Psique, Jung considerava outro pertencente a ela:

 MUNDO EXTERIOR DA CONSCIÊNCIA COLETIVA – o mundo cultural


dos valores e formas compartilhadas.

Dentro dessa divisão básica existem: ESTRUTURAS GERAIS E


ESTRUTURAS ESPECIALIZADAS.

As Estruturas Gerais são de dois tipos: IMAGENS ARQUETÍPICAS; E


COMPLEXOS.

As Estruturas Especializadas são quatro: EGO; PERSONA; SOMBRA; E


SIZÍGIA, grupamento pareado de ANIMUS/ANIMA.

Para melhor entendimento sobre a interação dinâmica entre as várias


estruturas psicológicas especializadas, conceituadas por Jung, convém separá-las
em:

 ESTRUTURAS DE IDENTIDADE;
 ESTRUTURAS DE RELAÇÃO, ou RELACIONAMENTO.

Assim: EGO e SOMBRA são primordialmente estruturas especializadas de


Identidade; e PERSONA e SIZÍGIA (Animus/Anima) estruturas especializadas de
relacionamento.

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 ESTRUTURAS ESPECIALIZADAS DE IDENTIDADE

EGO E SOMBRA

Essas duas estruturas se formam concomitantemente. Enquanto o Ego se


forma, tendências e atividades inatas rejeitadas se agregam para formar a Sombra.

No processo de formação do Ego: uma identidade básica se forma inicialmente


inserida na díade mãe-filho; depois é ampliada dentro da unidade familiar; e mais
tarde expande-se para incluir o meio cultural. Durante a fase inicial desse processo,
certas atividades e tendências inatas serão aceitas pela mãe e família; e outras
atividades e impulsos serão rejeitados.

Essas rejeições não se perdem e tendem a se aglomerar como imagem, logo


abaixo da superfície do Inconsciente Pessoal. Isso é o que Jung denominou Sombra.

O Ego é um Complexo; o “Complexo do Ego” disse Jung e acrescentou: “O


Complexo do Ego, entretanto, é diferente dos outros complexos, porque se impõe
como centro da consciência e atrai para si os demais conteúdos conscientes, visa
também, mais do que outro complexo, a totalidade”. Afirmou ainda que os dois
principais fatores componentes do Ego são: percepção geral de nosso corpo e

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existência; e registros de nossa memória – certa ideia de já ter existido e acúmulo de
longa série de recordações.

O Ego é o centro do campo do Consciente, a parte da Psique onde nossa


consciência reside, o nosso sentido de identidade e existência. O Ego seleciona e
organiza nossos pensamentos, sentimentos, sentidos, e intuição, e regula o acesso
à memória.

A Sombra é o arquétipo receptáculo dos aspectos que foram suprimidos no


desenvolvimento da Persona, e mais que isto, ela contém conteúdos que nem
chegaram a passar pelo crivo do consciente.

A Sombra foi dinamicamente dissociada da identidade do Ego dominante no


decorrer do desenvolvimento inicial. Daí seu possível retorno, para reclamar parcela
de vida consciente.

Muitos atributos naturais da Psique na infância e outros, quando


desenvolvemos a Persona, para a nossa adaptação social, que foram rejeitados, por
serem considerados impróprios, são necessários ao saudável funcionamento, em
outra época de nossas vidas.

Alguns, quiçá muitos, destes aspectos rejeitados, mas que impulsionam o ser
humano para a criatividade e busca de soluções, quando os recursos conscientes se
esgotaram , poderão voltar e ser úteis, uma vez que não serão mais prejudiciais à
nossa adaptação. Até, poderão mudar o rumo de nossa história.

Grande parte do trabalho da psicoterapia e da psicanálise consiste em criar um


lugar onde seja seguro reexaminar o conteúdo da Sombra e, possivelmente, devolver
ao Ego, à vida consciente, parte do que foi rejeitado.

A Sombra, além de ser materializada em sonhos e em fantasias, é, em geral,


projetada em pessoas do mesmo sexo, por ter qualidades que não estão
suficientemente desenvolvidas, na imagem dominante do próprio indivíduo.

A Sombra influirá nas relações com pessoas do mesmo sexo e, quando


trabalha em harmonia com o Ego, deixa a vida mais rica e colorida. Vida sem a
presença da Sombra torna-se sem brilho e sem criatividade.

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 ESTRUTURAS ESPECIALIZADAS DE RELAÇÃO PERSONA

A Persona é a função de relacionamento com o mundo exterior. Muito


importante, na medida em que dependemos dela para os relacionamentos diários
com grupos sociais.

Com o desenvolvimento da consciência, o ser humano, que é gregário por


natureza, necessita desenvolver algumas características básicas, para a adaptação
social. O arquétipo desta adaptação é a Persona.

O nome vem da antiga máscara usada no teatro grego, pelos atores para
representar. Para a psicologia junguiana, Persona tem o mesmo sentido, ou seja: é a
máscara ou fachada aparente do indivíduo exibida de maneira a facilitar a
comunicação com o seu mundo externo, com a sociedade onde vive e de acordo com
os papéis dele exigidos. O objetivo principal é o de ser aceito pelos grupos sociais a
que pertence.

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A Persona auxilia a convivência em sociedade. Também, transmite certa
sensação de segurança, na medida em que cada um desempenha exatamente o
papel dele esperado, da melhor forma possível. A Persona serve, ainda, como
proteção contra nossas características internas, que julgamos como desabonadoras
e, portanto, queremos esconder.

Qualquer cultura contém muitos papéis sociais reconhecidos: pai; mãe;


esposa; marido; médico, sacerdote, advogado...

O Ego saudável pode adotar diferentes papéis de Persona, de acordo com as


necessidades duma situação. Entretanto, existem casos de funcionamento
inadequado da Persona. Três casos se destacam: desenvolvimento excessivo da
Persona; desenvolvimento insuficiente da Persona; e identificação com a Persona.

O desenvolvimento excessivo da Persona pode produzir personalidade, que


preenche com precisão os papéis sociais, mas deixa a impressão de que não existe
pessoa real “dentro”.

O desenvolvimento insuficiente da Persona produz personalidade vulnerável a


rejeições e danos, ou personalidade sujeita a ser arrebatada, eliminada, ou isolada
pelas pessoas com quem se relaciona.

A identificação com a Persona se faz de forma tão exagerada, que o Ego se


sente, equivocadamente, idêntico ao papel social primário. É gravíssimo, pois existe
a indevida percepção de que o Ego é inseparável do papel da Persona. Tudo que
ameace o papel social é vivenciado como ameaça direta ao próprio Ego.

Ilustram essa identificação os exemplos: “síndrome do ninho vazio”, tédio e


depressão quando os filhos se emancipam e abandonam o lar; e o sentimento de
vazio, exceto quando a pessoa está trabalhando.

Como a Persona corresponde à face externa da Psique, que possui dinâmica


de compensação energética entre os seus conteúdos, então ao funcionamento
inadequado da Persona implica em tendência à compensação, ao equilíbrio por meio
dos Arquétipos de sua face interna: Anima e Animus.

 ANIMA E ANIMUS

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O arquétipo da Anima, constitui o lado feminino na Psique do homem, e o
arquétipo do Animus constitui o lado masculino na Psique da mulher. Ambos os sexos
possuem aspectos do sexo oposto, não só biologicamente, através dos hormônios e
genes, como também, psicologicamente através de sentimentos e atitudes.

O homem traz consigo, como herança, a imagem de mulher. Não a imagem de


uma ou de outra mulher especificamente, mas sim imagem arquetípica, ou seja,
formada ao longo da existência humana e sedimentada através das experiências
masculinas com o sexo oposto.

Cada mulher, por sua vez, desenvolveu seu arquétipo de Animus através das
experiências com o homem durante toda a evolução da humanidade.

Embora, Anima e Animus desempenhem funções semelhantes, entretanto


uma não é exatamente o oposto da outra.

A Anima, quando em estado inconsciente pode fazer com que o homem, numa
possessão extrema, tenha comportamento tipicamente feminino, como alterações
repentinas de humor, falta de controle emocional.

Em seu aspecto positivo, a Anima servirá como guia, quando reconhecida e


integrada à consciência, e despertará o desejo masculino de união e de vínculo com
o feminino e com a vida. A Anima será a “mensageira do inconsciente”.

A valorização social do comportamento viril no homem, desde criança, e o


desencorajamento do comportamento mais agressivo nas mulheres, poderá provocar
Anima, ou Animus subdesenvolvidos e potencialmente carregados de energia,
atuando no inconsciente.

O Animus, em estado inconsciente poderá se manifestar de maneira negativa,


provocando alterações no comportamento e sentimentos da mulher. Segundo Jung:
“em sua primeira forma inconsciente o Animus é uma instância que engendra opiniões
espontâneas, não premeditadas; e exerce influência dominante sobre a vida
emocional da mulher.”

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O Animus e a Anima, se devidamente reconhecidos e integrados ao Ego,
contribuirão para a maturidade do psiquismo.

A relação com a Anima é teste de coragem para as forças espirituais e morais


do homem. Em se tratando da Anima, estamos lidando com realidades psíquicas, as
quais até então nunca foram apropriadas pelo homem, uma vez que se mantinham
fora de seu âmbito psíquico, sob a forma de projeções.

Anima e Animus são responsáveis pelas qualidades das relações com pessoas
do sexo oposto. Enquanto inconscientes, o contato com estes arquétipos são feitos
em forma de projeções.

O homem, quando se apaixona, está projetando a imagem da mulher que ele


internalizou. É fato que a pessoa que recebe a projeção é portadora, como dizia Jung,
de um “gancho” que a aceita perfeitamente.

Para o homem a mãe é o primeiro “gancho” a receber a projeção da Anima,


ainda quando menino, o que se dá inconscientemente. Depois, com o crescimento e
sua saída do ninho, o filho vai, aos poucos, retirando esta projeção e lançando-a a
outras mulheres num processo inconsciente.

A qualidade, do relacionamento mãe-filho, será essencial e determinará a


qualidade dos próximos relacionamentos, com outras mulheres. Salienta Jung: “Para
o filho, a Anima oculta-se no poder dominador da mãe e a ligação sentimental com
ela dura às vezes a vida inteira, prejudicando gravemente o destino do homem ou,
inversamente, animando a sua coragem para os atos mais arrojados.”

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Os Mitos: Fontes Simbólicas da Psicologia Analítica de
C.G. Jung

Desde o princípio do pensamento humano, o mito era compreendido como “o


conteúdo próprio de tudo o que se pensava ou sentia e a sua descrição em termos
pré-metafísicos era legein (dando origem à palavra grega mytho-legein = mitologia)”.

O “simbolismo mítico tem sido tem sido amplamente utilizado nas


interpretações da Psicologia Analítica e Psicanálise, constituindo uma das bases dos
conceitos junguianos de inconsciente arcaico (arquétipos, imagem primordial etc.)”.

O símbolo pode ser definido como “sinal, signo ou marca num sistema de
relações significativas, cujas aplicações e operações são governadas por leis e
convenções […]”

Ao comparar o homem arcaico com o homem civilizado, Jung concluiu que,


tanto um quanto outro sente e percebe o mundo da mesma forma. Ou seja, o homem

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primitivo não enxerga o mundo de forma diferente do moderno. Segundo ele, a
diferença entre ambos são suas hipóteses, isto é, a forma como compreendem os
eventos da natureza.

Desta forma, Jung conclui que, para o homem moderno, os eventos podem ser
explicados por meio da percepção de relações causais. Entretanto, o homem
primitivo, que possui uma visão “mágica” do mundo, explica estes mesmos eventos
por meio de termos não-perceptíveis, isto é, sobrenaturais.

Nas sociedades arcaicas, a crença nos poderes sobrenaturais deve-se, de


certa forma e/ou em parte, ao que se projeta do inconsciente sobre o mundo físico,
de tal forma que não existe distinção entre as projeções e o mundo objetivo, pois nas
sociedades tribais os mitos são vivos e cumprem sua função de dar sentido ao mundo.

Enquanto o homem arcaico insere-se física e psiquicamente no seu mundo, o


homem moderno crê estar desassociado da natureza, pois enxerga o mundo de forma
objetiva, o que nega a sua realidade psíquica, em outras palavras, nega o que Jung
concebe por suas projeções arcaicas do inconsciente. Para Jung, a grande relevância
dada à objetividade no mundo moderno em detrimento dos mitos constitui um risco
ao mundo psíquico, pois os mitos fazem parte do inconsciente coletivo e atuam na
mediação entre o consciente e o inconsciente.

Como percebemos, o homem arcaico dava sentido ao mundo por meio dos
mitos. Com o advento da modernidade o homem perdeu a capacidade de produzir
símbolos, passando esta a ter uma relevância psíquica, uma vez que o inconsciente
mantém essa capacidade. Sendo assim, a relação entre os mitos arcaicos e os
símbolos do inconsciente é de grande importância para o trabalho analítico, pois
permite interpretar os símbolos tanto em seu aspecto histórico universal como no
sentido psicológico.

A Psicologia Junguiana foi a que mais contribuiu para o aprofundamento do


conhecimento do material simbólico da humanidade. Ao longo de sua vida, Jung
várias

vezes viajou. Nestas viagens teve a oportunidade de conhecer várias culturas


e, através do sonho e da fantasia é possível o reencontro do homem com a atmosfera

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mítica das imagens arcaicas, herança psicológica que conecta a humanidade como
um todo.

O pensamento junguiano afirma que, é a partir da análise dos sonhos que


temos a possibilidade do acesso ao material arquetípico doinconsciente humano que,
de tão arcaico, não faz, na maioria das vezes, sentido para o homem moderno. Sendo
assim, esta análise constitui-se de grande relevância pararesgatarmos o simbólico,
para compreendermos as imagens dos sonhos (oníricas) e, consequentemente, para
compreendermos, de forma mais profunda a nós mesmos. Paratanto, aquele que
analisa deve possuir um conhecimento ampliado acerca da origem e do sentido dos
símbolos, para, a partir disto, fazer analogias entre os mitos arcaicos e o material dos
sonhos do paciente.

Ao ampliarmos a imagem onírica, a tornamos acessível à interpretação, haja


vista que, possibilita-se com isto, uma visão mais profunda da imagem por meio de
paralelos com toda a produção simbólica do ser humano, presentes na mitologia, na
religião, na arte, etc. Desta forma, para Jung, o mito possibilita a amplificação da
situação vivida pelo paciente, e isto possibilita sua melhor compreensão, pois seus
sonhos e fantasias têm a mesma raiz dos mitos arcaicos.

O pensamento de Jung é de fundamental importância estudar o material


mitológico, presente na história da humanidade para adquirirmos um olhar mais
profundo do ser humano. A causa disso é o fato do mito ter a capacidade de expressar
conteúdos simbólicos que transmitem imagens significativas, que expressam e lidam
com as verdades dos homens de todos os tempos. A partir disso torna-se possível
afirmar que Jung compreende que ao se “mitologizar” a psique, possibilitamos uma
melhor compreensão dos processos psíquicos, pois o mito traz uma ampliação da
situação existencial vivida pelo paciente em análise.

Assim, enfatizaremos o mito do herói e sua relação com a estruturação da


consciência, através do desenvolvimento do ego. Em especial, abordaremos a
imagem arquetípica do herói no mito de Perseu e sua luta contra a Medusa. (Algo
exclusivo da Mitologia Grega).

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O estudo dos mitos na Psicologia Analítica

Os mitos e imagens simbólicas têm ganhado importância histórica por conta


dos estudos arqueológicos que buscam compreendê-los e interpretá-los, transmitindo
um saber simbólico há muito esquecido pelas sociedades ditas civilizadas. Tais
pesquisas foram de suma relevância para desmistificar o pensamento corrente que
concebe os povos antigos como aculturados. (Jung, 1977).

Além disso, a partir dos estudos antropológicos podemos perceber muitos


mitos da sociedade moderna e contemporânea que encontram uma raiz paralela com
as sociedades antigas. Um exemplo disso é o mito do herói que passa por provações
para alcançar um objetivo heróico. Os heróis das mitologias arcaicas muito se
assemelham aos heróis contemporâneos da indústria cinematográfica (Homem de
Ferro, Thor, etc.), o que demonstra que os mitos antigos não deixaram de ter
importância simbólica nos dias atuais.

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A Psicologia Analítica de C.G. Jung foi a psicologia que mais contribuiu para o
estudo do material simbólico da humanidade. Jung fez várias viagens, conheceu
várias culturas e com isso pôde vislumbrar uma conexão universal entre os homens,
uma herança psicológica construída ao longo da evolução humana.

A herança psicológica universal é denominada por Jung de inconsciente


coletivo.

Os conteúdos do inconsciente coletivo são denominados de arquétipos (tipos


arcaicos) que surgem na consciência como imagens simbólicas.

Através da concepção de inconsciente coletivo, Jung concebe que todos os


homens, primitivos ou modernos, compartilham de um conhecimento arquetípico
universal. O inconsciente coletivo rompe com a linearidade espaço-tempo, ampliando
a visão do psiquismo para além da simples causalidade.

A partir da análise onírica é possível o acesso ao material arquetípico do


inconsciente, que de tão arcaico não tem, muitas vezes, sentido para o homem
moderno.

Deste modo, a análise é de grande importância para o resgate simbólico, para


compreensão das imagens oníricas e consequentemente para uma compreensão

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mais profunda de si mesmo. Para tanto o analista deve ter um conhecimento amplo
acerca da origem e do sentido dos símbolos, para assim, fazer analogias entre os
mitos arcaicos e o material onírico do paciente.

A metodologia da análise Junguiana é simbólico-analógica, ou seja, busca


amplificar a imagem simbólica, traçando relações de semelhança com outros
símbolos, para melhor interpretá-los.

A amplificação da imagem onírica a torna acessível à interpretação, uma vez


que promove uma visão mais profunda desta por meio de paralelos com toda a
produção simbólica da humanidade (mitologia, religião, arte, etc). Assim, o mito
possibilita a amplificação da situação vivida pelo paciente, possibilitando sua melhor
compreensão, uma vez que seus sonhos e fantasias têm a mesma raiz dos mitos
arcaicos. (Boechat, 2008).

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 O Homem e a Questão Simbólica

Jung ao estudar o homem arcaico em comparação ao homem civilizado,


concluiu que ambos sentem e percebem o mundo da mesma forma. O homem
primitivo não vê o mundo de maneira diferente do moderno, na verdade o que os
difere são suas hipóteses, a forma como consideram os eventos da natureza.

Para o homem moderno, os eventos podem ser explicados através de relações


causais perceptíveis. Já o homem primitivo, que tem uma visão mágica do mundo,
explica tais eventos através de termos não perceptíveis, sobrenaturais.

A crença nos poderes sobrenaturais, nas sociedades arcaicas, é devida, em


parte, às projeções do inconsciente sobre o mundo físico, de tal maneira que não há
distinção entre as projeções e o mundo objetivo.

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Deste modo, enquanto o homem arcaico está inserido física e psiquicamente
no seu mundo, o homem moderno acredita estar apartado da natureza. O homem
moderno enxerga o mundo de maneira objetiva, negando sua realidade psíquica, ou
seja, negando as projeções arcaicas do inconsciente.

Nas sociedades tribais os mitos são vivos, pois cumprem sua função de dar
sentido ao mundo como nos explica:

“Os trabalhos de Malinowski deixaram clara a noção fundamental do mito vivo


nas sociedades tribais. Há uma importância essencial da mitologia na organização da
vida diária dessas culturas. Sem o mito, essas sociedades simplesmente não se
organizariam. O nascimento, a infância, o casamento, a caça e a guerra, o comércio
e a morte, todas as atividades, enfim, são ritualizadas e mitologizadas para ganharem
sentido.” (Boechat, 2008, p. 19)

A grande importância dada à objetividade no mundo moderno em detrimento


dos mitos constitui, segundo Jung, um perigo ao mundo psíquico, uma vez que
aqueles fazem parte do inconsciente coletivo e agem como mediadores entre o
consciente e o inconsciente:

Sobre a importância do mito como guia e auxilio para lidar com os conflitos,
escreve:

“No mundo pré-moderno, a mitologia era indispensável. Ela ajudava as


pessoas a encontrar sentido em suas vidas, além de revelar regiões da mente
humana que de outro modo permaneceriam inacessíveis. Era uma forma inicial de
psicologia. As histórias de deuses e heróis que descem às profundezas da terra,
lutando contra monstros e atravessando labirintos, trouxeram à luz os mecanismos
misteriosos da psique, mostrando as pessoas como lidar com as crises íntimas.
Quando Freud e Jung iniciaram a moderna investigação da alma, voltaram-se
instintivamente para a mitologia clássica para explicar suas teorias, dando uma nova
interpretação aos velhos mitos.” (Armstrong, p.15, 2005)

O homem antigo dava sentido ao mundo através dos mitos. Com a


modernidade o homem perdeu sua capacidade de produção simbólica, passando esta
a ter uma importância psíquica, uma vez que o inconsciente conserva essa

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capacidade. Deste modo, ligação entre os mitos arcaicos e os símbolos do
inconsciente é de grande valor para o trabalho analítico, uma vez que permite
interpretar os símbolos tanto em seu aspecto histórico–universal como no sentido
psicológico, como veremos na relação simbólica entre a saga do herói e o
desenvolvimento egóico.

 O Desenvolvimento do Ego e o Mito do Herói

O arquétipo do herói é algo muito presente na contemporaneidade. Nos filmes,


novelas, livros, etc., as sagas heróicas são a todo tempo contadas e recontadas, o
que demonstra seu aspecto estruturador da psique. Os desafios do herói representam
a luta do desenvolvimento do ego frente às forças regressivas do inconsciente, como
explica:

“Na luta travada pelo homem primitivo para alcançar a consciência, este
conflito se exprime pela disputa entre o herói arquetípico e os poderes cósmicos do

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mal, personificado por dragões e outros monstros. No decorrer do desenvolvimento
da consciência individual, a figura do herói é o meio simbólico através do qual o ego
emergente vence a inércia do inconsciente, liberando o homem amadurecido do
desejo regressivo de uma volta ao estado de bem-aventurança da infância, em um
mundo dominado por sua mãe.” (Henderson, p. 118, 1977).

Neumann (2000), em seus estudos sobre o desenvolvimento da consciência e


sua emergência, fala da condição primordial da totalidade, que seria o caos
indiferenciado, onde não há diferenciação entre a criança e a mãe, ou seja, o ego está
contido no inconsciente, como a criança, na mãe.

Assim, Neumann aborda a importância do vínculo mãe-filho, principalmente


durante o primeiro ano de vida da criança, pois nesse período, denominado de estado
urobórico pós-uterino, o self (a totalidade psíquica) da criança ainda está
simbolicamente contido na mãe. Qualquer ruptura na relação primal mãe-filho
perturba a separação normal e oportuna do self da criança daquele da mãe e resulta
no desenvolvimento de um ego ferido, frágil e dependente.

O ego frágil, com insuficiente apoio interno da força organizadora e reguladora


do self, é uma presa fácil do narcisismo, da neurose e da psicose. Somente com um
self positivamente ativado é que pode haver suficiente apoio interno para permitir o
desenvolvimento de um ego autêntico, capaz de separar-se psicologicamente da mãe
(e também do pai) e estabelecer um relacionamento adequado e individual, tanto com
o mundo interior quanto com o mundo exterior.

O self (o si mesmo), diferentemente do ego, que é o sujeito da consciência, é


o sujeito de toda a psique inconsciente. É também o arquétipo que representa a
totalidade e o centro regulador da psique, sendo frequentemente simbolizado por uma
mandala ou uma união de opostos (como seria o Tao na filosofia oriental). É do self,
da totalidade psíquica, que emerge a consciência individualizada do ego, à medida
que o indivíduo se desenvolve.

Com isso, Jung define:

“O Self não só é o centro, mas também a circunferência inteira que abraça a


consciência e o inconsciente; é o centro desta totalidade, da mesma maneira que o

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ego é o centro de consciência.” (JUNG, C.W. Vol. XXII, § 44, apud SHARP, 1997, p.
142)

Desse modo, o verdadeiro contato com o self seria obtido através do processo
de individuação, que é único para cada ser humano. O processo de individuação tem
como objetivo desenvolver a personalidade individual, o potencial que cada um tem
dentro de si, a fim de conseguir discernir as mensagens vindas do self que o guiarão
à auto realização.

Segundo Von Franz:

“A experiência dessa extremidade mais elevada, ou centro, traz ao indivíduo


um senso de significado e de realização, na presença do qual ele pode aceitar a si
mesmo e encontrar um caminho intermediário entre os opostos presentes na natureza
interior. Em vez de ser uma pessoa fragmentada, obrigada a apegar-se a apoios
coletivos, o indivíduo torna-se um ser humano inteiro, autoconfiante, que já não
precisa viver como um parasita do seu ambiente coletivo, mas que enriquece e
fortalece esse mesmo ambiente com sua presença.” (Von Franz, 1997, p. 63).

Assim, o ego frágil sente-se pressionado pelo mundo externo e busca meios
de lidar com isso agindo defensivamente, se desvirtuando do processo de
individuação, apegando-se a apoios coletivos. Pode recolher-se num estado
exageradamente introvertido, retirando-se para o mundo da fantasia, como perigo de
ser inundado pelo inconsciente, ou pode perder o senso de interior por um
ajustamento exageradamente extrovertido, cedendo às pressões ambientais no seu
agir. (Weinrib, 1993).

Jung sugere em sua teoria uma relação simbólica entre o arquétipo materno e
o inconsciente, pois, como a mãe é fonte da vida física, também o inconsciente é a
fonte da vida psicológica. Portanto, a mãe e o inconsciente podem ser vistos como
símbolos femininos equivalentes. O impulso de retorno à mãe pode ser visto como
um impulso de volta ao inconsciente. Sob certas circunstâncias, isso pode ser
regressivo, levando à neurose e à psicose; doença psicológica ou morte. Em outras
circunstâncias, ou seja, no processo de individuação, a regressão pode ser

27
temporária e em prol da renovação psicológica e do renascimento simbólico (“recuar
para saltar melhor”).

Sobre a regressão e o processo de cura, Jung diz:

“Parece que o processo de cura mobiliza essas forças para alcançar os seus
objetivos. É que as representações míticas, com seu simbolismo característico,
atingem as profundezas da alma humana, os subterrâneos da história, aonde a razão,
a vontade e a boa intenção nunca chegam. Isso porque elas também provêm
daquelas profundezas e falam uma linguagem, que, na verdade, a razão
contemporânea não entende, mas mobilizam e põem a vibrar no íntimo do homem. A
regressão que poderia assustar-nos à primeira vista é, portanto, muito mais um
‘reculer pour mieux sauter’, um concentrar e integrar forças, que no decorrer da
evolução vão constituir uma nova ordem.” (Jung, C.G. , 2007, p. 13).

Assim, a diferenciação do ego do inconsciente, não se dá de forma absoluta,


uma vez que o ego necessita recuar para restabelecer suas relações com o self, de
modo a preservar sua saúde psíquica. Em alguns mitos o herói deve passar
continuamente pelas trevas, por provações, para posteriormente vencer o monstro.

As provações do herói representam sua morte simbólica para posterior


renascimento, pois permitem ao “ego-herói”, o contato com sua sombra, os aspectos
ocultos, reprimidos da personalidade. Através da morte simbólica (katábase ou rito
iniciático), o herói passa a ter maior conhecimento de suas forças e fraquezas,
alcançando a maturidade necessária para transpor os desafios de sua jornada.

Deste modo, o símbolo do herói representa uma tentativa do inconsciente de


levar a libido regressiva para um ato criativo, mostrando assim o caminho para a
solução do conflito. Assim, o arquétipo do herói está associado aos ritos de
passagem, fundamentais para estruturação da consciência, através do mitologema
do herói que mata o monstro, como veremos no mito de Perseu que mata a Medusa.

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 O Mito de Perseu: Uma Visão Mítica Acerca do Desenvolvimento do
Ego.

Na perspectiva Junguiana, o estudo do material mitológico, presente na história


da humanidade, é fundamental para um olhar mais profundo do ser humano. Isso se
deve ao fato do mito expressar estórias simbólicas que transmitem imagens
significativas, que tratam das verdades dos homens de todos os tempos. (Boechat,
2008).

Jung compreende que ao se “mitologizar” a psique, possibilitamos uma melhor


compreensão dos processos psíquicos, uma vez que o mito traz uma ampliação da
situação existencial vivida pelo paciente em análise.

Assim, seguindo essa proposta analisaremos o mito de Perseu e sua luta


contra a Medusa, que simboliza o desenvolvimento do ego frente os aspectos
regressivos do inconsciente.

29
Neste mito, Perseu é incumbido de trazer para o rei Polidectes, seu padrasto,
a cabeça de Medusa, ser monstruoso com cabelos de serpente. Esta, por transformar
em pedra todos que a olham, representa o arquétipo da mãe devoradora e sua
influência regressiva que aprisiona seus filhos.

O rei Polidectes pretendia se livrar de Perseu enviando-o para tal missão.


Polidectes, com medo de ser destronado por Perseu, propôs um torneio no qual o
vencedor seria quem trouxesse a cabeça da Medusa, e o instinto aventureiro de
Perseu não o deixou recusar.

O herói representa a natureza humana, que muitas vezes em sua imperfeição,


é dominado pela vaidade, pelo orgulho (hybris), lançando-se em missões sobre-
humanas, muito além de sua capacidade. Daí surgir seres superiores, divinos, para
proteger e auxiliar o herói em sua jornada. Esses seres divinos são representações
do self que possibilitam ao ego o alcance de um novo estado de consciência.

No mito em questão, Perseu foi vitorioso graças à ajuda de Atena, Hades e


Hermes, seus deuses tutelares. Atena deu a ele um escudo tão bem polido, que podia
se ver o reflexo ao olhar para ele, Hades lhe deu um capacete que torna invisível
quem o usa, e Hermes deu a ele suas sandálias aladas, objetos que foram definitivos
para a vitória de Perseu.

O escudo de Atena, semelhante a um espelho, foi o instrumento fundamental


no confronto com a Medusa, uma vez que simboliza a reflexão, aspecto necessário a
Perseu.

Atena (Minerva, na mitologia romana) na mitologia grega era filha de Zeus,


nascida de sua cabeça. Ela é conhecida como a deusa da inteligência e sabedoria
(além de ser a deusa que preside as artes e os trabalhos manuais). No mito Atena
representa o arquétipo da anima de Perseu, sua contraparte feminina, sua guia ou
mediadora entre o mundo interior e o self.

Atena representa a mãe superior ou espiritual que auxilia seu filho na


passagem da infância para a vida adulta. Assim, podemos perceber no mito de
Perseu os dois aspectos do arquétipo materno: devorador (Medusa) e o
transformador (Atena). (WOOLGER, 1987).

30
A Medusa representa a mãe terrível, devoradora, que paralisa seus filhos,
permanecendo em estado caótico e inconsciente. Desse modo, a luta contra a
Medusa nos alude ao processo de integração do ego, através da saída do estado
urobórico, onde não há diferenciação entre a consciência e o inconsciente. A
petrificação da Medusa nos remete aos estados psicóticos de extrema regressão
presentes nas formas graves de esquizofrenia (estupor catatônico). (Boechat,W.,
2008).

Por fim, a deusa Atena representa os aspectos transformadores do self, pois


cede o instrumento capaz de vencer a petrificação, através do olhar indireto do reflexo
do espelho.

O escudo de Atena possibilita o movimento, a criatividade, a reflexão, ou seja,


é o instrumento que mobiliza a transformação psíquica, para um novo estado de ser,
mais consciente e diferenciado.

31
CONCLUSÃO

Na perspectiva Junguiana o conhecimento dos mitos é importante para


melhor compreensão do material arquetípico que irrompe ao longo do trabalho
analítico. Assim, o propósito da Psicologia Analítica não é valer-se dos mitos para
explicar a clínica de um paciente, ou pior, de vários pacientes.

Na verdade, a Psicologia Analítica propõe uma amplificação dos símbolos em


análise, através do método simbólico-analógico. Este método orienta-se a partir da
percepção do material que provém do inconsciente do analisando, através de
símbolos oníricos, da expressão plástica ou, por outras técnicas terapêuticas, não se
restringindo as interpretações gerais e deterministas.

Este método orienta-se a partir da percepção do material provindo do


inconsciente daquele que está em análise, através de símbolos oníricos, da
expressão plástica ou, por outras técnicas terapêuticas, não se restringindo as
interpretações gerais e pior, deterministas.

Deste modo, o estudo dos mitos e dos símbolos do inconsciente é, para Jung,
a chave que abre a porta que nos dá acesso a um conhecimento profundo do ser
humano, que vai além do sensível e/ou palpável e do racional, que possibilita o religar
do homem consigo mesmo e com a humanidade como um todo.

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