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INTRODUÇÃO
O presente texto objetiva discutir como historicamente o currículo oficial vem sendo
pensado no Brasil. Para isto, detemo-nos no estudo de alguns períodos históricos,
consubstanciado em determinados documentos, pois aqueles registram as concepções
decorrentes do contexto social mais amplo.
Tal estudo tem como orientação a periodização proposta por SAVIANI (2001). Não
é nossa intenção realizar uma análise profunda da temática, mas tecer algumas
considerações iniciais que nos auxilem na compreensão de nosso objeto de estudo- as idéias
curriculares propostas nos variados momentos da história educacional brasileira.
Acreditamos que ao recuperar essa história, teremos uma clareza maior para
compreender o processo atual que levou à construção e à definição de um currículo
nacional por meio de diretrizes para toda a educação básica.
Aqui estamos trabalhando com a noção de currículo oficial, ou seja, aquele que foi
planejado oficialmente para ser trabalhado nas diferentes disciplinas e/ou séries de um
curso.
O termo currículo é um vocábulo polissêmico, apresentando conotações diversas de
acordo com sua aplicação e, também, com os teóricos a que nos referimos.
Como nos mostra SILVA ( 2000), as teorias do currículo podem ser analisadas com
base em três grandes eixos: as concepções tradicionais, as concepções críticas e as pós-
críticas, cada uma, a seu modo, evidenciando posicionamentos filosóficos, isto é, a forma
de cada educador ver e pensar o mundo, o homem, a escola, o aluno, a educação, a
sociedade.
Etimologicamente, segundo GOODSON (1995) currículo deriva da palavra latina
scurrere e refere-se a um curso, um percurso que deve ser realizado. Além de expressar os
conteúdos de ensino, também estabelece a ordem de sua distribuição, perpassando uma
concepção de currículo como prescrição.
Em relação ao campo pedagógico, tradicionalmente o currículo significou uma
relação de matérias/ disciplinas com seu corpo de conhecimentos organizados numa
seqüência lógica, conotação que guarda estreita relação com plano de estudos.
Currículo e prescrição apresentam vínculos de ligação desde sua origem, relação
que veio fortalecer-se ao longo do tempo.
Contudo, numa fase posterior às teorias tradicionais, o currículo evolui de plano de
estudos para tornar-se a totalidade das experiências vivenciadas pela criança. Dewey e
Kilpatrick, seus representantes, contribuíram para o desenvolvimento das teorias
progressivistas, influenciando no Brasil o desenvolvimento da concepção escolanovista.
Nessas teorias, o foco do currículo é deslocado do conteúdo para a forma, isto é, a
preocupação é centrada na organização das atividades, com base nas diferenças individuais,
experiências e interesses da criança.
É, contudo, em 1918, com a publicação da obra The Curriculum, de Bobbitt, cuja
ênfase está na construção científica de um currículo que desenvolvesse os aspectos da
personalidade adulta então considerados “desejáveis”, preconizando a especificação de
objetivos e seus respectivos conteúdos, que o currículo firma-se como campo de estudos e
de reflexão.
Essa visão tradicional de currículo foi latente nos Estados Unidos dos anos 1920 a
1960. Em nosso país, a visão escolanovista influencia o pensamento educacional e
curricular a partir dos anos 1920.
Em relação às teorias tradicionais de currículo, seu objetivo é adaptar a escola e o
currículo à ordem capitalista que se consolidava, com base nos princípios de ordem,
racionalidade e eficiência. As questões centrais do currículo foram os processos de seleção
e organização dos conteúdos e das atividades, privilegiando um planejamento rigoroso,
baseado em teorias científicas do processo ensino-aprendizagem, ora numa visão
psicologizante, ora numa visão tradicional.
Nos anos 1970 desenvolvem-se nos Estados Unidos e Inglaterra estudos no campo
do currículo que inauguram as teorias críticas, isto é, a negação das perspectivas
behaviorista e empiritista. O planejamento do currículo, sua implementação e controle não
estavam mais no centro das atenções; buscam-se outras formas de produzir conhecimento.
Duas correntes foram mais divulgadas e influentes no campo da teoria crítica de
currículo no Brasil: a sociologia do currículo, com origem nos Estados Unidos e orientação
neomarxista, cujos maiores expressões entre nós são Michael Apple e Henry Giroux e a
nova sociologia da educação (NSE), com origem na Inglaterra e cujo maior representante é
Michael Young.
A partir dos anos 1990, a teoria curricular vem buscando compreender como o
conhecimento é produzido em diferentes ambientes institucionais, em práticas sociais,
formações culturais e contextos históricos específicos (SANTOS E MOREIRA, 1995).
Grande parte da produção recente no campo curricular tem sido influenciada pelo
pensamento pós-moderno e pós-estruturalista, com ênfase na análise da relação entre
currículo, subjetividades e construção de identidades. Dessa forma, o currículo vem sendo
entendido como artefato cultural e os estudos que se voltam para o entendimento da cultura
escolar, da cultura da escola (FORQUIN,),das diferenças culturais dos grupos sociais
(MCLAREN ;SACRISTÁN; SANTOMÉ; SILVA ) e as relações entre esses elementos
têm sido crescentes no campo curricular.
Pelas considerações iniciais, percebemos o quanto o conceito de currículo é
multifacetado. A análise histórica de seu desenvolvimento nos possibilita entender que ele
se modificou atendendo a realidades sociais distintas, assim como tempos e espaços
específicos e, em conseqüência, precisa ser compreendido no contexto social em que está
inserido.
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