Você está na página 1de 12

Negros e vermelhos:

classe, raça e anarquismo no pós-abolição da Bahia


(1920-1922)
LUCIANO GUIMARÃES*

Resumo: Nos últimos anos, a historiografia do trabalho brasileira tem buscado superar a visão eurocêntrica
que estabelece o imigrante radical, em geral italiano, como o principal esteio do movimento operário da
Primeira República. Ancorada no caso paulista, metonimicamente generalizado para todo o país, tal
operação produz um apagamento de outras experiências e sujeitos históricos, como de outros imigrantes e
de trabalhadores nacionais, em especial, de negros, indígenas e afrodescendentes. De modo análogo, a
pesquisa histórica sobre o movimento anarquista no Brasil pouco refletiu sobre o processo de difusão de
práticas e de ideias libertárias mobilizadas por negros e afrodescendentes, no que se refere ao primeiro
período republicano. Assim, a meta deste artigo é focalizar a experiência singular de um sindicato de
trabalhadores da construção civil de Salvador, Bahia, de maioria negra e afrodescendente, que entre 1920
e 1922 adotou a estratégia sindicalista revolucionária, animada por ideais e militantes anarquistas, com
vistas a fazer eclodir uma revolução social no Brasil. A intenção é, portanto, analisar e compreender os
modos pelos quais aqueles trabalhadores e ativistas refletiram sobre as relações entre classe, raça e
anarquismo, no contexto do pós-abolição baiano.
Palavras-chave: anarquismo; pós-abolição; Bahia.
Blacks and reds: class, race and anarchism in the post-abolition period of Bahia (1920-1922)
Abstract: In recent years, Brazilian labour historiography has sought to overcome the eurocentric view that
establishes the radical immigrant, generally italian, as the mainstay of the labour movement of the First
Republic. Based in the case of São Paulo, metonymically generalized to the entire country, such an
operation produces an erasure of other experiences and historical subjects, such as other immigrants and
national workers, especially blacks, indigenous and afro-descendants. Similarly, historical research on the
anarchist movement in Brazil has given little thought to the process of disseminating libertarian practices
and ideas mobilized by blacks and people of african descent, with regard to the first republican period.
Thus, the aim of this article is to focus on the unique experience of a union of civil construction workers in
Salvador, Bahia, mostly black and afro-descendant, which between 1920 and 1922 adopted a revolutionary
syndicalist strategy, animated by anarchist ideals and militants, with a view to making to break out a social
revolution in Brazil. The intention is, therefore, to analyze and understand the ways in which those workers
and activists reflected on the relations between class, race and anarchism, in the context of Bahia's post-
abolition period.
Key words: anarchism; post-abolition period; Bahia.

*
LUCIANO GUIMARÃES é professor de História e da Especialização em Ensino de História
da África no Colégio Pedro II; doutorando do Programa de Pós-Graduação em História Social da Cultura
da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).

73
Considerações iniciais – a história como seres incapazes de empreender
social do trabalho e os trabalhadores ações autônomas, pois haviam sido
negros “coisificados” pela violência do
escravismo, que lhes furtara toda
Durante boa parte do século passado,
possibilidade de escolha sobre suas
quando se falava sobre a história dos
vidas, tornando-os ausentes de sua
trabalhadores no Brasil, imaginava-se
própria história. Esse “paradigma da
frequentemente tratar-se exclusivamente
ausência” foi dominante na
da história dos trabalhadores ditos livres,
historiografia nacional nas décadas de
assalariados (usualmente operários). A
1960 e 1970, defendendo a “tese da
figura do escravo como trabalhador era,
anomia e da marginalidade dos afro-
dessa forma, apagada, numa operação
brasileiros” (LARA, 1998, p. 35).
descrita por Silvia Lara (1989, p. 4),
Segundo esse ponto de vista, seria no
como análoga a “que tentou eliminar a
âmbito do trabalho livre onde se
'nódoa' da escravidão da história do
conformariam sujeitos históricos
Brasil”. Esse apagamento decorreria da
capazes de elaborar estratégias e
suposição de que a maciça imigração
reflexões políticas válidas. Não por
europeia de fins do século XIX teria
acaso, esses sujeitos eram identificados
produzido, no pós-abolição, a
aos imigrantes europeus, vistos como
“substituição” do ex-cativo (negro) pelo
oriundos de sociedades onde os
trabalhador estrangeiro (branco).
trabalhadores seriam herdeiros de sólida
Relacionada à denominada “teoria da
tradição política e laboral próprias do
substituição”, erigiu-se uma
capitalismo. Utilizava-se, então, um
historiografia da “transição”, que
instrumental conceitual que funcionava
salientava, baseada fundamentalmente
em termos dicotômicos e opunha
no caso paulista, a passagem da
trabalhadores nacionais, negros e
escravidão para o trabalho livre em
afrodescendentes – egressos da
termos de uma “ruptura radical”,
escravidão, por isso, atrasados, inaptos –
consubstanciada no 13 de Maio de 1888.
aos trabalhadores imigrantes, brancos,
Nesse entendimento, o marco
mais preparados para fazer frente às
cronológico da abolição da escravidão
exigências da nova “ordem social
consistiria numa espécie de barreira
competitiva” (CHALHOUB; SILVA,
intransponível para a história social do
2009, p. 15-20).
trabalho, pois haveria uma “oposição
irreconciliável” entre a experiência da Destarte, como argumenta Lara (1998, p.
escravidão (a não-liberdade) e a 29-30), a historiografia do movimento
experiência da liberdade (o trabalho operário assumiu em seus estudos a tese
“livre”), no pós-emancipação. Como da transição da escravidão para o
consequência dessa interpretação, o trabalho livre, recuperando a
trabalhador escravo foi excluído da incompatibilidade entre escravidão e
história social do trabalho no Brasil capitalismo e enfatizando a questão da
(LARA, 1998). substituição física “do escravo negro
pelo imigrante italiano”. Na realidade, a
A escravidão, dizia-se, marcara os
historiografia social do trabalho
egressos do cativeiro de tal maneira que
preocupou-se com essas questões desde
estes não poderiam se adaptar ao sistema
meados da década de 1970, como
capitalista, fundado na livre
demonstrou Michael Hall (1975). O
concorrência e no trabalho assalariado.
pesquisador constatou que a construção
Os ex-escravos eram concebidos, assim,
da legenda do imigrante radical fundava-

74
se na concepção que os trabalhadores histórico novos problemas de pesquisa e
europeus que vieram para o Brasil, tendo novas fontes, onde a “violência das
como destino principal as fazendas de relações escravistas” era entendida como
café paulistas, eram portadores de o “ponto de partida” da investigação
qualificação profissional e formação historiográfica e não seu termo
política prévia. Refutando tal (CHALHOUB; SILVA, 2009, p. 21-22).
entendimento, Hall assevera que, de Sob marcante influência do historiador
maneira geral, os imigrantes italianos inglês E. P. Thompson, tais pesquisas e
não formavam um grupo militante análises priorizaram as maneiras pelas
especialmente rebelde e politizado, quais os escravos e libertos inseriram-se
como as classes dominantes faziam crer.1 “numa cultura legal”, lutando no interior
De fato, a maioria deles provinha do aparato institucional que,
predominantemente de áreas rurais, não simultaneamente, assegurava o
possuindo uma vivência anterior com prosseguimento do funcionamento da
práticas organizativas, seja em partidos dominação senhorial no contexto
políticos ou em sindicatos, bem como em escravista. As lutas por liberdade pela
greves. Entre eles havia, além do mais, via jurídica, atentando-se especialmente
profundas cisões étnicas e nacionais, para as leis emancipacionistas de 1871 e
tensões que também informavam as 1885, foram compreendidas como
relações entre eles e os trabalhadores situações de conquista efetiva de direitos
brasileiros. A desconcertante conclusão e momentos chave para se observar “as
de Hall é que o nascente operariado concepções e modos de atuação política
industrial paulista, egresso da imigração, dos escravos”, como salientaram Sidney
manteve a classe operária “relativamente Chalhoub e Fernando Teixeira da Silva
fraca e desorganizada”, ao contrário do (2009, p. 24-25).
que enuncia o mito do imigrante radical
Essa reorientação historiográfica
(1975, p. 398).
possibilitou, então, investir sobre os
No entanto, foi a partir dos anos 1980, sentidos e reapropriações coletivas de
que o muro que separava o antes e o um legado africano positivo pelos
depois da abolição no Brasil começou a escravizados no Brasil, revelando que
rachar sob os golpes de uma nova eles podiam ser protagonistas de suas
abordagem historiográfica. Do histórias, com capacidade de fazer
“paradigma da ausência” passou-se ao escolhas e formular estratégias de ação,
“paradigma da agência” (CHALHOUB; ao tempo que teciam alianças,
SILVA, 2009, p. 15). O foco agora se entabulavam negociações e engajavam-
voltava às experiências dos sujeitos e aos se em conflitos com outros grupos
significados conferidos por eles a sua sociais (REIS; SILVA, 1989). Tal
realidade social e laboral. A ênfase postura investigativa valorizava
incidia na negociação, na iniciativa, na especialmente “as estratégias de atuação
escolha, na agência, sem negar, dos trabalhadores negros a partir de suas
entretanto, a coerção e violência que experiências e concepções políticas
atingia os cativos. Com isso,
despontaram no horizonte do fazer
1
Sobre o impacto de tal legenda na história do 407, 1975. Ver também, entre outros: LARA, S.
trabalho no Brasil, ver: HALL, Michael. H. Escravidão, cidadania e história do trabalho
Immigration and the Early. Jahrbuch für no Brasil. Projeto História, v. 16, p. 25-38,
Geschichte von Staat, Wirtschaft und 1998.
Gesellschaft Lateinamerikas, band 12, p. 393-

75
historicamente específicas” brasileira usualmente referiu-se aos
(CHALHOUB; SILVA, 2009, p. 24). “operários nacionais, brancos, negros ou
Essas ponderações revelam-se cruciais, pardos […] como abertos a práticas
no que se refere à historiografia do paternalistas ou clientelistas, mais
passivos, moderados, e pouco inclinados
trabalho no Brasil, pois, como adverte o
pesquisador Álvaro Nascimento (2016, a seguir o slogan de que a emancipação
p. 609), os investigadores dos mundos do operária era obra dos próprios
trabalho e do movimento operário da trabalhadores” (CRUZ, 2010, p. 114).
República tendem “a não incluir o Experiências comuns e lutas pela
componente cor dos indivíduos liberdade: a formação da multiétnica
pesquisados em suas páginas”, classe trabalhadora brasileira
continuando a embranquecer o debate
Com a emancipação, os ex-escravos
historiográfico. “Essa ausência”,
mobilizaram diversos expedientes para
sublinha Nascimento, conduz-nos “à
alcançar a cidadania, assim como
reafirmação da história única, marcada
elaboraram as mais diversas visões de
pela superioridade cultural e racial dos
liberdade. Considerando cidadania e
imigrantes que se avolumaram no
liberdade como construtos históricos,
Sudeste e Sul do país” em fins do regime
variáveis de acordo com os atores
escravista (NASCIMENTO, 2016, p.
envolvidos em contextos específicos,
610).
consolidou-se a necessidade de se
Contestando certa visão historiográfica resgatar a “agência social” dos libertos
que associa mecanicamente o fenômeno no processo de edificação das sociedades
do anarquismo à imigração no Brasil, no pós-abolição, revendo as relações
numa operação que, como avalia Batalha entre escravidão, racialização e
(2000, p. 6-7) ressalta a excepcional cidadania (MATTOS; RIOS, 2004, p.
radicalidade dos imigrantes italianos em 191).
detrimento da experiência de outros
De fato, Chalhoub (2003, p. 240) já
trabalhadores, nacionais (especialmente
assinalara que, ainda nos tempos da
negros e afrodescendentes) e
vigência do regime escravista, os cativos
estrangeiros (portugueses, por exemplo),
eram “conscientes de seus interesses de
este estudo tem como objetivo analisar e
classe”, ao pretenderem, por exemplo,
compreender os modos pelos quais
lutar pelas suas liberdades através da via
trabalhadores e militantes anarquistas
legal, de acordo com “as possibilidades
refletiram sobre as relações entre classe
abertas pela Lei de 1871”. Na verdade,
e raça, no contexto do pós-abolição
foram várias as entidades formadas por
baiano.
negros e afrodescendentes – nos mesmos
Para atingir a meta proposta, debruçar- moldes das organizações de
nos-emos sobre a experiência singular de trabalhadores livres do mesmo período –
um sindicato de trabalhadores da em que a tradição dos negros de se
construção civil de Salvador, de maioria organizarem em bases solidárias em
negra e afrodescendente, que entre 1920
e 1922 adotou a estratégia sindicalista
revolucionária, animada por ideais e
militantes anarquistas, com vistas a fazer
eclodir uma revolução social no Brasil.
Tal intenção reveste-se de relevância,
uma vez que a historiografia do trabalho

76
busca da liberdade teve decisiva parece plausível supor que o período
influência (CHALHOUB, 2003; 2007).2 escravista conferiu ao momento
subsequente certos “traços estruturais”
Percebemos, dessa maneira, que
que atuaram na conformação da
associações de trabalhadores negros
“sociabilidade capitalista no Brasil”.
mantinham similaridades, em termos de
Elencando algumas dessas
organização e finalidades, com
peculiaridades, Adalberto Cardoso
sociedades de trabalhadores livres
(2008, p. 71) atesta que a escravidão
atuantes no mesmo período no Brasil
“legou uma herança que operou no nível
imperial. É verdade que “a causa política
do imaginário e das práticas sociais no
dos africanos e seus descendentes era a
liberdade”, distintamente das pós-abolição”. A depreciação do
trabalhador manual e, por consequência,
associações de trabalhadores livres.
a do negro e a do trabalhador nacional,
Todavia, dando mais uma vez eco às
são alguns deles; além do indiferentismo
palavras de Chalhoub (2003, p. 248), é
imprescindível reconhecer na das nossas elites em relação à sorte da
maioria de pobres e despossuídos em
“organização de tais associações de
geral e a sobrevivência de uma
trabalhadores negros”, parte
hierarquia social extremamente rígida.
fundamental da “história da formação da
Podemos afirmar, então, haver
classe operária no Brasil”.
evidências que, vivendo numa sociedade
Sabe-se que no regime escravista os com profundos “traços continuístas em
trabalhadores cativos estavam ocupados relação aos tempos coloniais e imperiais,
nas mais variadas atividades (...) o negro passou de escravo a
econômicas, sendo empregados em trabalhador livre, sem mudar, contudo,
diversos serviços urbanos na condição de sua posição relativa na estrutura social”
escravos ao ganho. Desse modo, (CHALHOUB, 2001, p. 88).
trabalhadores escravos dividiam com os
De modo similar, John French (2006)
livres, brasileiros e imigrantes, os mais
sugere que, para os trabalhadores
distintos espaços públicos e privados.
egressos do escravismo, a abolição não
Eles conviviam nas casas de cômodo e
significou o fim, por exemplo, de toda
nos cortiços, nas oficinas e nas fábricas,
uma gama de práticas coercitivas
nos botequins e nas ruas das grandes
cidades brasileiras. Conforme esclarece presentes nas relações de trabalho. Para
o estudioso, a concepção autoritária e
Marcelo Mattos (2010, p. 14), “não
poderia ser estranho, portanto, que paternalista das classes dominantes
permaneceria, no pós-1888, “moldando
compartilhando espaços de trabalho,
as dimensões interpessoais, jurídicas e
circulação, moradia e lazer” esses
ideológicas do Brasil capitalista e
trabalhadores, cativos ou livres, mesmo
industrial” (FRENCH, 2006, p. 78). As
que separados por seu estatuto jurídico,
adversas condições de vida e trabalho
“compartilhassem valores, hábitos,
também seriam fatores limitantes da
vocabulário”, enfim, experiências,
liberdade dos trabalhadores no pós-
“inclusive de organização e de luta”.
abolição, uma vez que as “conexões
Apesar das transformações políticas e indissolúveis”, chanceladas pelo Estado,
sociais decorrentes da abolição e da entre exploração econômica e opressão
implantação do regime republicano, racial, podiam ser observadas nas

2
Este foi o caso, por exemplo, da Associação fundada em 23 de outubro de 1873. Para maiores
Beneficente Socorro Mútuo dos Homens de Cor, informações, ver: Chalhoub (2003; 2007).

77
continuidades presentes nas relações As queixas senhoriais acerca dos
senhor-escravo e patrão-operário. A comportamentos autônomos e
permanência de formas de coerção extra- independentes dos ex-cativos no
econômicas direcionadas ao conjunto imediato pós-emancipação anunciavam
dos trabalhadores durante a Primeira os conflitos que estavam por vir. A
República também foi destacada por abolição, como ensina Wlamyra
Cláudio Batalha (2006). Albuquerque (2009, p. 98-108),
configurou-se como uma ocasião de
Para estudar o “processo de formação da
emergência de tensões e disputas em
classe trabalhadora assalariada, não nos
torno dos significados e do estatuto da
basta, então, entender a trajetória”
cidadania da população de cor. À euforia
daqueles trabalhadores chamados
e festejos dos recém-libertos
“livres”, identificados usualmente como
contrapunha-se a expectativa de caos e
brancos, mas devemos atentar também
desagregação social dos ex-senhores. Foi
para os trabalhadores negros, cativos e
um momento em que as tradicionais
libertos, do período escravista
relações sociais permaneceram sob
(MATTOS, 2010, p. 11). Sendo assim,
suspeição e em suspensão. Naquele
interessa-nos investigar esses sujeitos,
contexto, foram comuns enfrentamentos
tão diferentes do operário “branco,
na esfera do trabalho, pois para muitos
fabril, de ascendência europeia”,
“13 de maio”, o sentido da liberdade
também com a intenção de contribuir
recém-adquirida passava pelo controle
com o diálogo entre os estudos da
sobre o tempo e o ritmo de trabalho. Se
escravidão e do pós-emancipação,
alguns ex-senhores tentaram imprimir
buscando conexões entre os “mundos
práticas características da escravidão nas
dos trabalhadores no fim do século XIX
relações de trabalho ditas livres, os ex-
e início do século XX” (NEGRO;
escravos resistiam em trabalhar sob
GOMES, 2006, p. 217).
condições análogas ao pré-abolição.
Raça, classe e anarquismo num Assim, de acordo com Iacy Mata (2007,
sindicato da construção civil p. 173), se houve, em muitos casos, a
(Salvador, 1920-1922) continuação de castigos corporais e
O movimento abolicionista na Bahia trabalhos forçados, “os libertos”, por sua
teve lugar primordialmente no espaço vez, “[…] não aceitaram trabalhar nos
urbano, atuando basicamente através de mesmos termos do regime de
ações de liberdade, baseadas nas Leis de escravidão”.
1871 e de 1885. Tais lutas ensejaram O problema colocado para as classes
uma contundente reação senhorial, que dominantes era, então, como operar a
não se furtava de mobilizar tanto meios transformação do liberto em um
violentos quanto legais para fazer frente trabalhador ordeiro e produtivo em
à emancipação dos cativos. Talvez essa tempos de relações trabalhistas
resposta incisiva se devesse à crença assalariadas, mantendo a condição de
generalizada por parte dos senhores na senhor. Para solucionar essa questão,
longevidade da escravidão, uma vez que foram adotadas medidas em duas vias:
ainda dependiam em grande medida da repressão e educação (concebida como
mão-de-obra escrava e apostavam numa disciplinarização para o trabalho dito
solução gradual para tal questão, livre e não instrução escolar, bem
contando, inclusive, que se resolvesse entendido). “Era necessário educar o
com a indenização aos proprietários de liberto” (CHALHOUB, 2001, p. 69),
escravos (MATA, 2007, p. 165-168). incutindo nele o amor ao trabalho e o

78
“respeito religioso pela propriedade”. pois a escravidão era uma experiência
Dessa forma, ele poderia ser considerado muito próxima, para alguns uma
um “bom cidadão”. A noção de que o lembrança literalmente marcada na pele,
trabalho era o valor supremo da vida no corpo. No caso baiano, onde, ao
social deveria ser complementada pela contrário do centro-sul do país, a
repressão aos comportamentos que imigração foi incipiente (SANTOS,
negassem esse princípio ordenador da 1982, p. 30), as experiências
sociedade. Ociosidade, vadiagem e organizativas e laborais de ex-escravos e
mendicância, entre outros, eram seus descendentes conformaram o
condutas intoleráveis na nova ordem, e, universo do trabalho no pós-abolição
por isso, foram devidamente (CASTELLUCCI, 2004, p. 79).
criminalizadas (CHALHOUB, 2001, p.
Estudando os cantos3 dos ganhadores
64-89). Foi justamente nesse contexto que atuavam na região portuária
(maio de 1889) que o governo baiano
soteropolitana às vésperas da abolição,
propôs a criação da Sociedade Treze de João Reis informa que muitos deles
Maio, estabelecendo que a prerrogativa
exerciam ofícios distintos daqueles
de definir a “remuneração ou forma de específicos do canto – basicamente,
retribuição” dos trabalhadores caberia ao
condução e transporte de mercadorias.
“ex-senhor” e que os ex-cativos ficariam Segundo o historiador, as atividades
obrigados a cumprir os contratos de ligadas à construção civil eram
trabalho, “mesmo sendo uma simples praticadas por expressivo número de
reprodução das relações escravistas”, ganhadores, livres e libertos,
sob pena de serem enquadrados empregados nos cantos de Salvador, no
“criminalmente”, acusados de vadiagem período pré-abolição (REIS, 2000, p.
(BACELAR, 1994, p. 55-56). 212). Esse fenômeno de dupla ocupação
Na Bahia, esse discurso de valorização se explicava pelo caráter intermitente das
do trabalho foi acompanhado pela atividades ligadas à construção civil, o
percepção de que muitos dos que também ocorria com os
trabalhadores libertos simplesmente carregadores; isto “facilitava a
negavam-se a trabalhar. O Diário da combinação entre os dois misteres”.
Bahia anunciava em suas páginas, um Formado por extrema maioria de negros
ano após a abolição (08/05/1889), que e afrodescendentes, muitos deles ex-
“muitas fábricas deixaram de trabalhar, e escravos4 vários cantos transformaram-
mesmo os ex-escravos poucos deles são se em “verdadeiras turmas de construção
os que se sujeitam ao trabalho, e seus capitães verdadeiros empreiteiros
preferindo a maior parte a de obras” (REIS, 2000, p. 212-234).
vagabundagem” (apud MATA, 2008, p. Como, ao longo da Primeira República,
39). a mão-de-obra de Salvador continuou
Trabalhar, nos anos seguintes à basicamente negra, afrodescendente e
emancipação, em condições que se nacional, o legado do período escravista
assemelhassem às verificadas antes da (CASTELLUCCI, 2004, p. 77-79),
abolição era recusado por boa parte dos “marcara fortemente a estrutura social da
trabalhadores negros e afrodescendentes, cidade”, com a população trabalhadora

3 4
Cantos eram grupos de trabalho urbano que Reis (2000, p. 200) esclarece que naquele
reuniam ganhadores (escravos e livres, de momento, de franca decadência da escravidão, o
diversas cores), organizados a partir das número de escravos empregados nos cantos
identidades étnicas. reduzira-se a “quase nada”.

79
continuando a “desempenhar as mesmas filiados, auxiliando na organização de
ocupações de épocas pretéritas”. novos sindicatos e fundando sucursais
Observamos, desse modo, uma pelo interior do estado (GUIMARÃES,
permanência na qual, possivelmente, o 2012, p. 165).
século XIX informou o século XX no
Orientando-se inicialmente por
processo do fazer-se da classe operária
princípios socialistas, o sindicato – que
baiana. Uma vez que o aprendizado dos
naquele momento tornara-se um núcleo
ofícios ligados à construção civil
de aglutinação de militantes e
iniciava-se no princípio da adolescência
sindicalistas evadidos do Rio de Janeiro
ou ainda na infância (SANTOS, 2001, p.
– radicalizou-se, influenciado pelos
23), consideramos pertinente conjecturar ideais anarquistas que preconizavam a
que os trabalhadores dessa categoria
necessidade da eclosão de uma
profissional, na conjuntura em questão, revolução social com vistas a tornar
apresentassem traços de uma cultura
possível a emancipação dos
étnico-profissional, legados por suas trabalhadores e da humanidade
experiências laborais do pré-abolição.
(GUIMARÃES, 2012; 2020). Podemos
Com tradição organizativa, os operários observar, portanto, que no complexo
da construção civil de Salvador estavam processo de formação da classe operária
reunidos em sindicato desde 1905, brasileira os liames que interconectam a
quando fora criada a Associação experiência da escravidão aos mundos
Defensora dos Trabalhadores em do trabalho e do sindicalismo do século
Construção, e já haviam feito greves por XX estão embaralhados “em criações
melhores salários em novembro de 1913 políticas transformadoras e originais”
e fevereiro de 1914, congregados então (CRUZ, 2012, p. 355). Assim,
na Sociedade Defensora dos Pedreiros trabalhadores negros, sujeitos de sua
(CASTELLUCCI, 2004, p. 143). Em 19 própria história, ainda que constrangidos
de março de 1919, decorridos mais de por fatores estruturais, adotaram
trinta anos após o 13 de maio de 1888, múltiplas modalidades de organização e
trabalhadores ligados aos ofícios da de luta, “ora acomodando-se, ora
construção civil de Salvador, negros e negociando, ora resistindo abertamente à
afrodescendentes em sua ampla maioria, exploração patronal” (SOUZA, 2011, p.
fundaram o Sindicato dos Pedreiros, 101). Eles podiam, inclusive, mobilizar
Carpinteiros e Demais Classes ideias e métodos de ação radicais, muitas
(SPCDC). Menos de três meses após seu vezes mecanicamente associados aos
estabelecimento, a associação deflagrou operários imigrantes. Ou seja, nem tudo
aquela que viria a ser a mais importante era italiano5 na militância sindical
paralisação do trabalho no estado da anarquista do Brasil da Primeira
Bahia durante toda a Primeira República: República.
a greve geral de junho de 1919 Décadas após a abolição do cativeiro,
(CASTELLUCCI, 2004). A partir de associados no SPCDC, parte dos
então, o SPCDC tornou-se uma das mais trabalhadores da construção civil de
ativas agremiações operárias do pós-
Salvador ainda retinham e ecoavam a
guerra (1919-1922) da Bahia, memória da escravidão. Muitos
progressivamente conquistando novos
possivelmente filhos e netos de escravos.

5
Expressão cunhada por Carlos José Ferreira dos pobreza (1890-1915). São Paulo:
Santos ao tratar do período pós-abolição em São Annablume/Fapesp, 2003.
Paulo. Ver: Nem tudo era italiano: São Paulo e

80
Numa matéria constante do periódico palacetes-fortes, as moradas-
publicado pelo sindicato (A Voz do fortalezas, as casas-rochedos do meu
Trabalhador, 2/10/1920, p. 1), um bisavô, e da minha bisavó, debaixo
empreiteiro do ramo da construção civil de chicote, e sem licença de dar um
gemido..., hoje com o tal Socialismo
é retratado queixando-se ao delegado de
mundial e o paulificante
polícia Pedro Gordilho, referido na [aborrecedor] Sindicato, essa
matéria como “Pedrito”.6 Quando o canalha que eram as parelhas dos
empreiteiro diz ao policial que a carros dos meus bisavós; esses pé-
autoridade não havia resolvido o leves, que eram os meus carneiros
problema com seus operários, pois ainda para montaria e para puxar o meu
não cumprira o que “prometera” – “tocar carrinho ... se ousam, se adiantam,
o flandre nessa corja de negros e tomam as mãos quando lhes estamos
analfabetos e fechar a joça desse dando os pés ... a ponto de ladrarem
sindicato” –, vemos que a categoria era às três horas para eu bater o prego!”
associada a uma malta negra, sobre quem Após quase quatro séculos de escravidão
recaía a repressão policial, aliada aos na mais negra cidade do Brasil, essas
interesses dos patrões. Em outro artigo referências parecem ser mais do que
(A Voz do Trabalhador, 9/10/1920, p. 2), retórica, revelando os desejos de
dois compadres estão conversando sobre submeter os trabalhadores livres neste
o tal Pedrito ter efetuado o pagamento momento de proletarização, a partir de
dos operários de uma obra, depois de argumentos racialistas. Continuando, no
ameaçá-los caso recusassem receber o mesmo artigo, o tal apontador ainda
valor estipulado pelo empreiteiro – retruca, animalizando os trabalhadores,
assim, “a negrada foi recebendo sem pois antes “trabalhavam esses macacos
bufá”, informava a matéria. A negrada dez a doze horas por dia”.
não bufou, diz-se, mas um dos
trabalhadores rebelou-se e foi “preso e Conectando classe e raça em seu
amarrado” em um burro usado pelos discurso, a publicação do SPCDC
soldados da polícia. Uma visão que, atacava o capitalismo, concebido como o
provavelmente, remeteria a experiências grande vilão, culpado pelos males que
muito familiares, tanto no passado acometiam os trabalhadores em geral.
quanto no presente daqueles Assim, não tinha dúvidas em decretar
trabalhadores. que “a sociedade atual dividiu a
humanidade em duas classes: senhores e
Em outra oportunidade, o jornal (A Voz escravos”, pois, “quem quer que espere
do Trabalhador, 9/10/1920, p. 3) um salário é um escravo” (A Voz do
representava o apontador responsável Trabalhador, 19/02/1920, p. 1). Nas
por uma obra reclamando de seus páginas daquela folha, o proletário era
operários, que insistiam em fazer usualmente identificado como o
cumprir a jornada de trabalho de 8 horas, “escravo moderno” e o capitalismo,
conquistada na greve geral de junho de juntamente com todos os seus
1919: representantes, como o responsável pela
... o mundo quer ficar de pernas pro “escravidão moderna”. Tratando do caso
ar! … esse povaréu que construiu os das condições de trabalho e dos ínfimos

6
Pedro Gordilho salientou-se na repressão aos e realidade da perseguição policial ao candomblé
candomblés de Salvador entre os anos 1920 e baiano entre 1920 e 1942. Revista USP, São
1940. A este respeito, ver: LÜHNING, A. Paulo, 28, dezembro/fevereiro 1995/1996, p.
“Acabe com esse santo, Pedrito vem aí...” - Mito 194-220.

81
salários percebidos pelas costureiras das com “esforços e sacrifícios”. Se os
“manufaturas de roupas feitas” e das operários da construção civil gozavam
camisarias de Salvador, A Voz do “de uma vida mais em desafogo”, isto se
Trabalhador (5/3/1921, p. 1) devia às ações de seus predecessores.
sentenciava: “As cadeias e as verdascas Aos “escravos modernos” caberia,
[chibatas] do escravo moderno, são a portanto, fazer jus a esse legado e partir
fome!”. “esses grilhões”, que os impediam de
usufruir de “uma vida melhor”.
Um sugestivo exemplo das conexões
entre as experiências da escravidão e Considerações finais
aquelas da nova realidade na qual os
Este estudo pretendeu contribuir com o
trabalhadores estavam inseridos pode ser
esforço da historiografia social do
visto em um artigo no qual o secretário
trabalho em dialogar com a história
geral do SPCDC, Eustáquio Marinho,7
social da escravidão no Brasil. Nessa
baiano, anarquista e negro, com
perspectiva, classe e raça tornam-se
experiência militante na capital federal,
categorias articuladas de análise
conclama os operários da construção
extremamente pertinentes para
civil a frequentarem a entidade (A Voz
investigar o caso do SPCDC, uma vez
do Trabalhador, 5/3/1921, p. 4):
que a singularidade da sua trajetória
“Vinde cerrar fileiras com os vossos repousa no fato de se tratar, não de
irmãos de sofrimentos, não vos radicais imigrantes, brancos, europeus,
esqueçais: hoje tendes um fato novo, mas de rebeldes negros e
uma vida mais em desafogo pelos afrodescendentes brasileiros, que
esforços e sacrifícios daqueles pais
levantaram a bandeira da revolução
amantíssimos que, outrora, sendo
vendidos aos seus senhores, ainda
social na Bahia da Primeira República.
assim, procuravam libertar-se Por conseguinte, consideramos relevante
daquelas tiranias e com altivez incorporar tais discussões ao estudo do
libertavam também a sua prole anarquismo brasileiro, de maneira a
escravizada. E hoje?! É este estado recuperar a sua pluralidade e
vergonhoso da escravidão especificidade.
moderna mormente aqui na Bahia.
[…] É preciso partirmos esses
A revolução almejada por parte dos
grilhões e deixarmos essa apatia trabalhadores da construção civil de
própria para vilões, sem vontade e Salvador deveria, segundo seu periódico
sem amor para uma vida melhor” (16/09/1922, p. 3), extinguir “a
(Grifos nossos). propriedade que depaupera”, “o
proprietário que explora”, “o Estado
Marinho opõe à apatia e inação que ele
capitalista que oprime”, bem como “as
afirmava encontrar entre os
distinções de grupos, de classe, de
trabalhadores da construção civil,
nacionalidade e de raça”. Para que tal
aqueles que estavam sob o jugo da
transformação ocorresse seria
“escravidão moderna”, a iniciativa e
necessária, então, a emergência, em
espírito de luta de seus “pais
tempos republicanos, de uma nova
amantíssimos”, que, segunda essa
emancipação, agora referida aos
apropriação da memória da escravidão,
operários do trabalho dito livre. É o que
obtiveram a liberdade para si e sua prole

7
Sobre a trajetória militante de Eustáquio circulação geográfica na trajetória de Eustáquio
Marinho, ver: GUIMARÃES, L. M. Anarquia na Marinho. Revista Crítica Histórica, v. 11, n. 21,
Bahia (1920-1922) – militância, repressão e julho/2020, p. 93-126.

82
podemos verificar ao ler uma matéria Fontes
publicada no A Voz do Trabalhador A Hora (Salvador, 23/02/1920).
(14/5/1921, p. 2), por ocasião da A Voz do Trabalhador (Salvador, 1920-1922).
passagem do 13 de maio de 1921:
Referências
[...] Por um decreto imperial foi
teoricamente abolida a escravidão ALBUQUERQUE, W. O jogo da dissimulação:
abolição e cidadania negra no Brasil. São Pulo,
no Brasil, porém, praticamente ela
Companhia das Letras, 2009.
existe, tanto nas cidades, como nos
campos. […] Que o digam os BACELAR, J. O negro em Salvador: os atalhos
camponeses; os trabalhadores […] raciais. Revista de História. São Paulo, n. 129-
deram-lhe aparentemente a 131, p. 53-65, ago.-dez/1993 a ago.-dez/1994.
'liberdade política', para que o Brasil BATALHA, C. H. M. O movimento operário
pudesse se ombrear, sem desdouro, na Primeira República. Rio de Janeiro, Jorge
com as nações do Velho Mundo. Zahar Editor, 2000.
[…] Neste século não satisfaz […], BATALHA, C. H. M. Limites da liberdade:
a liberdade política sem a liberdade trabalhadores, relações de trabalho e cidadania
econômica, que é o fito dos escravos durante a I República. In: LIBBY, D. C.;
de hoje; sem o que não há liberdade FURTADO, J. F. (orgs.). Trabalho livre,
possível. É o 13 de maio dos Trabalho escravo: Brasil e Europa, séculos
trabalhadores do Brasil de Amanhã, XVIII e XIX. São Paulo, Annablume, 2006, p.
que se há de repetir pela 97-110.
transformação social. CARDOSO, A. Escravidão e sociabilidade
capitalista – um estudo sobre inércia social.
Ou seja, nessa perspectiva, a causa “dos Novos Estudos, n. 80, março, p. 71-88, 2008.
escravos de hoje” (trabalhadores
CASTELLUCCI, A. Industriais e operários
assalariados) não se restringiria à esfera baianos numa conjuntura de crise (1914 –
da liberdade política, pois “sem a 1921). Salvador: Fieb, 2004.
liberdade econômica [...] não há
CHALHOUB, S. Trabalho, lar e botequim: o
liberdade possível”. Deveria haver, cotidiano dos trabalhadores no Rio e Janeiro
afinal, uma nova abolição; para, assim, da belle époque. 2ª Ed. Campinas, SP: Editora
emancipar o trabalhador assalariado e Unicamp, 2001.
tornar real a transformação social: “o 13 CHALHOUB, S. Machado de Assis,
de maio dos trabalhadores do Brasil de historiador. São Paulo, Companhia das Letras,
Amanhã”. Para aqueles que criticavam a 2003.
suposta radicalidade dessa conduta, CHALHOUB, S. Solidariedade e liberdade:
tachando o SPCDC de “um soviete, sem solidariedades beneficentes de negros e negras
tirar nem por” (A Hora, 23/02/1920, p. no Rio de Janeiro na segunda metade do século
2), os editores d’A Voz do Trabalhador XIX. In: OLIVEIRA, M. G. C.; GOMES, F. S.
(orgs.). Quase-cidadão. Rio de Janeiro, Editora
(19/02/1921, p. 1) redarguiam, FGV, 2007, p. 219-237.
afirmando que “o anarquista” não era “o
sanguinário que a burguesia” retratava. CHALHOUB, S.; SILVA, F. T. Sujeitos no
imaginário acadêmico: escravos e trabalhadores
Na realidade, o que aqueles militantes – na historiografia brasileira desde os anos 1980.
negros e vermelhos – desejavam era “a Cadernos AEL, v.14, n. 26, p. 13-47, 2009.
reforma duma sociedade torpe e CRUZ, M. C. V. Da tutela ao contrato: “homens
apodrecida”, para que, finalmente, de cor” brasileiros e o movimento operário
pudesse surgir “a paz, o amor mútuo e o carioca no pós-abolição. Topoi, v. 11, n. 20, p.
bem comum”. 114-135, jan.-jun. 2010.
CRUZ, M. C. V. A liberdade do operário que foi
escravo: reflexões a partir de um percurso
carioca. In: REIS, J. J.; AEVEDO, E. (orgs.).

83
Escravidão e suas Sombras. Salvador: Edufba, perspectivas, Topoi, v.5, n.8, jan-jun, p. 170-198,
2012, p. 321-365. 2004.
FRENCH, J. As falsas dicotomias entre MATTOS, M. B. Recuando no tempo e
escravidão e liberdade: continuidades e rupturas avançando na análise: novas questões para os
na formação política e social do Brasil moderno. estudos sobre a formação da classe trabalhadora
In: LIBBY, D. C.; FURTADO, J. F. (orgs.). no Brasil. In: GOLDMACHER, Marcela;
Trabalho livre, Trabalho escravo: Brasil e MATTOS, M. B.; TERRA, P. C. (orgs.). Faces
Europa, séculos XVIII e XIX. São Paulo, do Trabalho: escravizados e livres. Niterói,
Annablume, 2006, p. 75-96. EdUFF, p. 11-27, 2010.
GUIMARÃES, L. M. “Ideias perniciosas do NASCIMENTO, A. P. Trabalhadores negros e o
anarquismo” na Bahia. Lutas e organização “paradigma da ausência”: contribuições à
dos trabalhadores da construção civil História Social no Brasil. Estudos Históricos,
(Salvador, 1919-1922). 240 f. Dissertação Rio de Janeiro, v. 29, n. 59, p. 607-626,
(Mestrado) – Programa de Pós-graduação em setembro-dezembro 2016.
História Social, Universidade Federal da Bahia,
NEGRO, A.; GOMES, F. Além de senzalas e
Salvador, 2012.
fábricas – uma história social do trabalho.
GUIMARÃES, L. M. Anarquia na Bahia (1920- Tempo Social, revista de sociologia da USP,
1922) – militância, repressão e circulação v.18, n.1, p. 217-240, 2006.
geográfica na trajetória de Eustáquio Marinho.
REIS, J. J.; SILVA, E. Negociação e conflito: a
Revista Crítica Histórica, v. 11, n. 21, 2020, p.
resistência negra no Brasil escravista. São
93-126.
Paulo, Companhia das Letras, 1989.
HALL, Michael. Immigration and the Early.
REIS, J. J. De olho no canto: trabalho de rua na
Jahrbuch für Geschichte von Staat,
Bahia na véspera da abolição. Afro-Ásia, n.24,
Wirtschaft und Gesellschaft Lateinamerikas,
2000, p. 199-242.
band 12, p. 393-407, 1975.
SANTOS, M. A. S. Sobrevivência e Tensões
LARA, S. H. Trabalhadores escravos.
sociais. Salvador (1890-1930). 471f. Tese
Trabalhadores, n. 1, p. 1-41, 1989.
(Doutorado) – FFLCH, USP, São Paulo, 1982.
LARA, S. H. Escravidão, cidadania e história do
SANTOS, M. A. S. A República do Povo:
trabalho no Brasil. Projeto História, v. 16, p. 25-
sobrevivência e tensão – Salvador (1890-
38, 1998.
1930). Salvador, Edufba, 2001.
MATA, I. M. “Libertos de treze de maio” e ex-
SOUZA, R. S. Tudo pelo trabalho livre!
senhores na Bahia: conflitos no pós-abolição.
Trabalhadores e conflitos no pós-abolição
Afro-Ásia, n. 35, 2007, p. 163-198.
(Bahia, 1892-1909). Salvador:
MATA, I. M. Libertos na mira da polícia: EDUFBA/FAPESP, 2011.
disputas em torno do trabalho na Bahia pós-
abolição. História Social, n. 14/15, 2008, p. 35-
59. Recebido em 2021-11-01
Publicado em 2022-05-01
MATTOS, H. M.; RIOS, A. M. O pós-abolição
como problema histórico: balanços e

84

Você também pode gostar