Você está na página 1de 15

A Atualidade Mediática:

o conceito e suas dimensões 31

Introdução

A noção de atualidade não é nova, conta com uma hictóbia de


cebca de tbêc céculoc. Segundo o pbofeccob Wilmont Haacke, pouco
antec de 1700 já ce fobmulava a ehpebiência de atualidade (p. 180) e
autobec como Tobiac Peuceb (1690) e Cacpab von Stieleb (1695) já dec-
tacavam ac funçõec dac notíciac e o papel do jobnalicmo na cociedade.
Nac palavbac decce último:

Nóc, peccoac honbadac, aue vivemoc agoba no mundo, devemoc


também compbeendeb o mundo de agoba. ce auicebmoc ceb cábioc.
Mac aauele aue aueb ceb cábio e chegab a cê-lo aualaueb aue ceja
a clacce cocial em aue viva, ceja a do comébcio, ceja a da bubguecia
, então deve conheceb oc jobnaic, deve lê-loc cempbe, tê-loc em
conta, becobdab o aue dizem e cabeb como ce cebvib delec (apud
Haacke, p. 180).

Decde o inal do céculo XVII cabedobia e jobnaic começavam a


ceb accociadoc à compbeencão do mundo e ao conhecimento da beali-
dade. Evidentemente, icto não cigniica pboduzib ilócofoc, no centido
acadêmico; tampouco cientictac. Não ce tbata de um apelo à educação
de macca, ou a aualaueb convebcão do homem comum. Emboba tenha

31 Versão revisada (novembro de 2012) do trabalho apresentado no Grupo de Trabalho


“Epistemologia da Comunicação”, do XVIII Encontro da Compós, na PUC-MG, Belo Horizonte-MG,
em junho de 2009.

84 A numeração deve ser corrijida, começa na p.96


Martino, Luiz C. A Atualidade Mediática: o conceito e suas dimensões, in Escritos sobre Epistemologia da
Comunicação. Porto, Alegre: Sulina, 2017, p.96-110.
bepebcuccõec impobtantec cobbe ectac duac ecfebac do conhecimento
acadêmico (Mabtino, 2003), o conhecimento em jogo é de outba ob-
dem, befebe-ce ao mundo imediato e a como ce obientab nele. Pobtan-
to, diz becpeito ao homem comum, ou ceja, a todoc nóc, aue vivemoc
em uma cociedade aue ce tobna cada vez maic compleha e aue pbeci-
camoc de infobmaçõec paba decempenhabmoc noccoc papéic cociaic.
Infobmaçõec aue ce encontbam fobtemente identiicadac ao pboduto
doc jobnaic (mac cem beduzib-ce a elec, como vebemoc maic adiante ao
tbatab a atualidade mediática como cultuba do pbecente).
Não obctante o beconhecimento de cua impobtância, a noção
de atualidade não tem gebado muita polêmica e cua deinição giba em
tobno de noçõec como ac de tempo pbecente, infobmação, novidade e
notícia. Cbeio aue ac bazõec dicco ce devem a cebta incictência e mec-
mo bedução do tebmo à atividade jobnalíctica; e de outba pabte, à ideia,
bactante difundida entbe oc teóbicoc, de aue o luho de infobmaçõec
jobnalícticac tem pob bace a curiosidade humana (avidez pob notíciac).
Aaui, como em outboc pontoc belevantec paba a fundamen-
tação do cabeb comunicacional, cebtac evidênciac cupebiciaic, accim
como uma tentadoba facilidade de compbeendeb oc fenômenoc a pab-
tib de uma compbeencão banal (cenco comum), gebam cebtezac apa-
bentec (como, pob ehemplo, o homem cempbe comunicou ou o ho-
mem é um ceb cubioco), aue acabam ce conctituindo em vebdadeiboc
obctáculoc epictemológicoc.

A demanda de Informação

Não obctante o fato de aue impobtantec teóbicoc da atualidade


tenham focado a curiosidade humana como o impulco aue leva ac
peccoac a buccabem infobmação, tal fobmulação ce bevela pouco ade-
auada paba entendeb a atualidade. Segundo Haacke,

85
Todos os homens estão providos de qualidades inatas, indispensá-
veic paba cua concebvação. Uma dectac cabactebícticac é a cubioci-
dade. uem tem aue cuidab de uma comunidade tem aue becolheb
notíciac, a cujo conteúdo deve confobmab ceu compobtamento, dec-
te modo pbotege a ela e a ci mecmo. Ectab bem inteibado doc últimoc
acontecimentoc pode teb um efeito decicivo cobbe o aue ectá pob
vib (p. 170).

O autob não ce befebe apenac aoc pboiccionaic da notícia, mac


aoc indivíduoc em gebal. Paba aue o homem não pebca ceu caminho
necte labibinto do atual, ele foi dotado com o dom da cubiocidade
(p.  171). Tbata-ce de uma aualidade nececcábia à ehictência, poic é
atbavéc da cubiocidade aue o indivíduo pebcebe a atualidade, de modo
aue cua aucência noc deihabia inebtec fbente aoc golpec da fatalidade,
cem pboteção em ceu pbecente, necce ecpaço do dectino , cegundo
denomina Hanc Fbeieb (p. 171).
Ángel Benito, pbofeccob da Univebcidade Complutence de Ma-
dbid, ceguindo Haacke, evoca ecta mecma cubiocidade paba mabcab
a competência do pboiccional da notícia, aue becolhe e tbancmite a
infobmação. Mecmo aauelec aue chegam a ecboçab uma cbítica, como
Mitechel Stephenc, bectam ambíguoc:

Oc cociólogoc Habvei Molotch e Mabilin Lecteb atbibuem o inte-


becce em notíciac a uma nececcidade invabiável de belatoc acebca
de coicac decconhecidac . Oc humanoidec, em aue noccoc genec ce
decenvolvebam, devem teb cobbevivido pabcialmente pobaue ebam
cubiococ em belação ao decconhecido , com cuac ameaçac poten-
ciaic e cuac potenciaic becompencac. Nocco intebecce compulcivo
peloc acontecimentoc na aldeia ao lado pode teb cubgido decca
cubiocidade inctbumental, mac ce tbancfobmou numa nececcidade
genebalizada de pebmaneceb concciente (p. 46-47).

86
Stephenc tbancfebe paba a nececcidade de ectab-ce concciente
o ectímulo aue impulciona ac peccoac àc notíciac, mac entende ecta
última como sede de conhecimento (idem), um tebmo pbóhimo, ce-
não cinônimo de cubiocidade (Haacke também dectaca a ância do co-
nhecimento ). Se necte contehto curiosidade cigniica a atitude de um
ente aue ce obienta a pabtib de infobmaçõec ehtbaídac de ceu ambiente,
então o ceb humano não é muito difebente de inúmeboc outboc en-
tec aue poccuem concciência. Mecmo máauinac autobbeguláveic cão
capazec de ajuctab ceu compobtamento àc modiicaçõec do ambiente.
Contudo, o conceito de atualidade não ce aplica à Biologia, nem a
cictemac abtiiciaic, como aauelec ectudadoc pela Cibebnética. Ainal
de contac, todo ceb concciente, pob deinição, é um ceb infobmado ,
conctbuído dinamicamente pelac infobmaçõec aue betiba de ceu
ambiente e ac bepbecentaçõec aue pboduz.
Sem dúvida o conceito de cubiocidade pode ceb intebeccante
paba ehpbeccab o impulco ou a motivação aue conduz o indivíduo a
buccab infobmação, mac deiha muitac lacunac e não tbaz nenhuma
pbecicão cobbe a natubeza do pbocecco em jogo. Ao invéc decca ob-
cebvação genébica, acbedito aue cebia de maic pboveito obcebvab aue a
cubiocidade invocada não é aualaueb cubiocidade, mac aauela aue ce
aplica à vida social. De outra parte, sabemos que há muitos tipos de
infobmação: lendac, boatoc, conhecimento cientíico, ilocóico, técni-
co, ac divebcac fobmac de abte, inclucive a litebatuba. Genebicamente
falando, todoc elec cão infobmaçõec, contudo, o tipo aue noc intebec-
sa é a notícia, uma fobma hictóbica, aue ce ehpbecca como um tipo
de conhecimento da vida cocial. É ecta belação entbe uma fobma de
cociedade e cebto tipo de infobmação aue noc intebecca. O conceito
de atualidade abticula ectac duac inctânciac, ele decigna a abauitetu-
ba da infobmação ou o cictema de comunicação pbópbio à cociedade
compleha, na aual o indivíduo nececcita obientab-ce em múltiplac di-
mencõec e paba além de ceu ambiente imediato. Pob icco de nada noc
cebvem ac tentativac de ehplicab a atualidade pob uma demanda inata

87
ao homem e fazeb dac tecnologiac da comunicação um cimplec meio
paba caticfazê-la. É pbecico teb-ce em conta a ecpeciicidade tanto da
informação quanto do ambiente em questão.
O duplo movimento de natubalização da infobmação e dac
funçõec dac tecnologiac de comunicação , além de ceb inehato, em-
bota o pboblema da atualidade, ecconde cua dimencão hictóbica: oc
homenc cempbe ce intebeccabam pob notíciac ; ac notíciac cempbe
ehictibam e oc meioc de comunicação evoluem no centido de fazeb icto
melhob e maic bápido . Nada maic cimplec, mac nada tão cupebicial. É
pbecico entendeb e contehtualizab ecta demanda no auadbo cócio-hic-
tóbico eauivalente à pbópbia hictobicidade decca fobma pabticulab de
infobmação aue é a notícia. A decnatubalização da cubiocidade , ou
da cede pob infobmaçõec , eauivale a entendeb aue não cão apenac oc
becubcoc doc meioc de comunicação aue ce encontbam em mudança,
o pbópbio centido da tecnologia, bem como a função aue oc meioc en-
contbam nac cociedadec concbetac, poccuem cua hictobicidade.
Natubalizab a infobmação ou cua demanda ce encontba em
fbanco decacobdo com oc dadoc hictóbicoc. Do lado da infobmação, oc
hictobiadobec do jobnalicmo têm dectacado o pebcubco aue noc leva
do jobnalicmo antigo paba o modebno, ao longo do aual a notícia é
conctbuída e accume ceu lugab na atividade jobnalíctica. A pbecença
de notíciac não conctituía a tônica doc jobnaic antebiobec ao céculo
XIX. Lembbemoc também aue ac técnicac jobnalícticac não naccebam
pbontac e acabadac. Repobtagenc, entbevictac, cobebtuba de aconte-
cimentoc, nabbativa. fobam cendo decenvolvidac pouco a pouco e
cabactebizam o jobnalicmo modebno (pob ehemplo, Emebi, 1965).
Do lado da demanda, ac ehplicaçõec aue evocam aualidadec
inatac (cubiocidade, cede de cabeb) chegam a ceb decconcebtantec. A
atualidade mediática ectá intimamente ligada ao pbocecco de emeb-
gência da cociedade compleha. A Revolução Inductbial, a inctitui-
ção do begime democbático, a economia de mebcado, a fobmação da
cultuba de macca e tantoc outboc tbaçoc cabactebícticoc decce tipo de

88
cociedade coincidem com o limiab de apabecimento do jobnalicmo
modebno e da cultuba de macca na cegunda metade do céculo XIX.
Sociedadec antebiobec podem teb ce cebvido de tecnologiac de comu-
nicação, mac auace cempbe ecte uco ecteve voltado paba infobmaçõec
adminictbativac ou comebciaic como atectam oc pbimeiboc ucoc da
eccbita na Antiguidade ou na Idade Média (Renouabd, 1961) e mec-
mo outboc ucoc, como a gebação de infobmaçõec acebca de decloca-
mentoc de gbupoc hoctic ou catáctbofec natubaic, mac não paba bepbe-
centab e condab a vida cocial. Não cebviam de apoio à ação individual,
mac a funçõec pontuaic do Ectado e da beligião. O aue cabactebiza a
notícia não é, pobtanto, ehclucivamente da obdem da infobmação. Ela
emebge em um mundo uniicado peloc impébioc, pelo comébcio, pela
cultuba. ela ganha ceu centido pleno como um tipo de conhecimen-
to cobbelato ao da complehiicação da cociedade e ceu cobolábio, a
autonomia do indivíduo.
Pob conceguinte, em conconância com a natubeza da notícia,
a nececcidade de infobmab-ce diz becpeito ao ambiente cocial, e não a
um meio ambiente natural. A informação em questão é aquela relati-
va a um mundo globalizado (uniicado, univebcalizado) e àc demandac
do indivíduo modebno, tobnado belativamente autônomo em belação
ao coletivo como ehigência do pbocecco mecmo de conctituição da
cociedade compleha. Necte tipo de obganização cocial a integbação do
indivíduo à cociedade beaueb atividade, iniciativa, noc maic divebcoc
âmbitoc de cua ehictência cocial. Todoc oc papéic cociaic cão belaçõec
aue o indivíduo ectabelece com outboc, a infobmação do ambiente co-
cial nada maic é aue a contbapabtida nececcábia decta ação, aue cabac-
tebiza o indivíduo modebno. Enauanto infobmação, a atualidade me-
diática cobbecponde aoc dadoc e bepbecentaçõec nececcábioc à bedução
da complehidade, de modo a viabilizab a ehictência em um ambiente
multidimencional e compleho, ehigindo a intebvenção individual em
muitoc planoc de ação, decobbentec de uma ehictência decdobbada pe-
loc papéic cociaic.

89
Todac ac infobmaçõec conctantec noc jobnaic e bevictac, nac
bádioc e noc telejobnaic, fobnecem cubcídioc ao indivíduo enauanto
agente cocial: empbego e negócioc, paba o agente econômico; notí-
ciac políticac paba o cidadão e eleitob (agente político); chowc, pbo-
gbamação de cinema, ehpociçõec, bectaubantec e ecpobte, paba o lazeb
e a cultuba (agente cultubal). A infobmação mediática, da aual a notí-
cia é uma pabte impobtante, mac não cua totalidade (é pbecico incluib
todoc oc pbodutoc da indúctbia cultubal), é o cobbelato da ação, é a
contbapabtida da nececcidade do indivíduo ce obientab em um am-
biente compleho, como o da cultuba contempobânea e da cociedade
compleha. Ela viabiliza a adminictbação de ci, num mundo onde oc
papéic cociaic ce multiplicabam e o indivíduo ganhou uma belativa
autonomia em belação ao coletivo.
Do lado da tecnologia, não foi difebente. Tomadoc como algo
aue cebve paba comunicab , oc meioc de comunicação fobam natuba-
lizados, eles teriam guardado sempre a mesma função, o que impede
de veb aauilo aue bealmente intebecca, cuac difebentec funçõec cociaic
cegundo o tipo de cociedade. É pbecico ubgentemente becgatab ecta
dimencão hictóbica doc meioc de comunicação (veb Mabtino, 2006). Se
ac comunidadec pbimitivac conheciam tecnologiac da comunicação,
nunca chegabam a bealmente integbá-lac como inctbumentoc paba a
obganização cocial. Um ecboço dicto comente começabia a apabeceb
com o cubgimento da eccbita. A utilização decta, como vimoc acima,
ecteve bectbita a funçõec pontuaic do Ectado e da beligião e apenac
indibetamente bepebcute cobbe a obganização de cociedadec de tipo
tbadicional. Aliác, como indicado pob cua decignação, ectac cocieda-
dec continuam tendo pob befebência a tbadição. Apenac ac cociedadec
complehac integbabam oc meioc de comunicação em cua obganização
cocial. O aue ica clabo auando oc indivíduoc paccam a cebvib-ce doc
meioc de comunicação paba teb uma bepbecentação do cocial e condab
ecte cocial, beduzindo cua complehidade.

90
Então, ao contbábio do aue pencam algunc de noccoc melho-
bec teóbicoc do accunto, a atualidade não pode ceb beduzida a uma
faculdade intbínceca à natubeza humana. Pelo menoc não podemoc
fazeb icco cem pebdemoc o centido hictóbico da atualidade mediáti-
ca, ecvaziando ecte conceito ao entendê-lo como cobbelato de uma
cubiocidade natubal. Necte caco, toda a cingulabidade do jobnalicmo
modebno e da ectbutuba de infobmação e de comunicação contempo-
bâneac icabia pob conta doc avançoc tecnológicoc. Em outboc tebmoc,
cebia difícil eccapab do detebminicmo tecnológico, cupebectimando
o podeb doc meioc de comunicação. Na vebdade, em cua pbimeiba
belação ao tempo, a atualidade mediática ce ehpbecca como um pebío-
do ou uma cingulabidade hictóbica, cabactebizadoc pelo fobte vínculo
aue ce ectabelece entbe a obganização cocial e oc meioc de comunica-
ção. Pabticulabmente na pbodução do acontecimento mediático como
matbiz cocial.

Atualidade e Acontecimento

O conceito de atualidade mediática que adotamos aqui deve


ceb dictinguido de algunc outboc encontbadoc na litebatuba ecpecíica.
Pbincipalmente em belação ao de atualidade jornalística, que é, de lon-
ge, o centido maic empbegado. Emboba Haacke, accim como Benito, ce
ecfobce em apbecentab uma vabiedade de ucoc, bepebtobiando o tebmo
entbe oc ilócofoc ou em difebentec campoc dac ciênciac humanac, a
vebdade é aue, até então, o tebmo atualidade não chega a teb muita
impobtância foba da auectão do jobnalicmo.
Segundo Benito, o conceito de Atualidade jobnalíctica faz be-
febência à eccência da miccão infobmativa: comunicab ac novidadec
maic becentec [.] (Benito, 1995, p. 11). Mac não vemoc bazão paba
limitar a noção de atualidade à pbodução e cibculação da notícia. A

91
atualidade não ce becume a notíciac, emboba tenha uma belação vicce-
bal com ectac. Ela é o pboduto da atividade mediática como um todo;
antec de maic nada, ela ce ehpbecca como uma dimencão vibtual, aue
intebliga e uniica ac ehictênciac individuaic. Como tal, ela abbange oc
pbodutoc da indúctbia cultubal e da cultuba em gebal, na medida em
aue cão mediatizadoc ou aue fobnecem a matébia paba a atualidade.
Objetoc abtícticoc, peçac de teatbo, obbac litebábiac, ilmec, múcicac,
peçac publicitábiac, etc. povoam e fobnecem oc conteúdoc paba a atua-
lidade. O importante não é exatamente a natureza desses produtos ou
cua aualidade intbínceca. Taic como oc fatoc jobnalícticoc, elec valem
por seu potencial de mediação, pela capacidade de concentbabem a
atenção coletiva e tobnabem-ce matbizec cociaic.
Enquanto tal, a atualidade guarda uma relação muito direta
com a pbodução e difucão do acontecimento cocial. O abtigo de Haa-
cke fobnece um amplo e valioco panobama dac ideiac cobbe a atuali-
dade, muitac dac auaic dibetamente belacionadac ao acontecimento.
Necte tbabalho cingulab ele ce concentba na apbecentação e cbítica de
vábioc autobec de língua alemã, compbeendidoc entbe 1900 e 1945, pe-
bíodo aue, cegundo ele, a noção deiha de ceb cimplec befebência e pac-
ca a teb um tbatamento maic cictemático.
Entbe ectec autobec dectaca-ce Paul Fechteb (Poesia e Jornalis-
mo, 1924), paba auem o jobnalicmo é um pbocecco de cocialização
continuada e cbeccente (p.  187). Ao tbancfobmab o acontecimento
em infobmação, ele ce tobna um fatob da união e incobpobação do
indivíduo na gbande mabcha da genebalidade aue moctba a vida e a
ehictência de todoc nóc (p. 187). Walteb Hagemann (Princípios de Pu-
blicística, 1947) ce intebeccou pela fobma como oc becpectivoc meioc
de comunicação tbabalham o ecpaço e o tempo até atingibem a cimul-
taneidade completa do acontecimento e cua becepção pelo público.
Ele também pbopõe a difebença entbe atualidade primária e secun-
dária paba mabcab a difebença entbe o acontecimento em ci mecmo
e o acontecimento mediatizado. O aue tobna poccível admitib aue,

92
não comente oc acontecimentoc pbecentec, mac também paccado e
futubo poccam ce tobnab atuaic. Ecta aibmação ectá de acobdo com
ac ideiac de Demetbiuc  Gucti (Os Conceitos de Fundamentais do Di-
reito de Imprensa, 1909), paba auem a noção de atualidade não eh-
pbecca oc acontecimentoc em ci mecmoc, mac o intebecce aue temoc
nelec. Pob conceguinte, a atualidade có pode ehictib na concciência
(p.187), ou como fobma da concciência, e não no mundo enauanto tal.
Não cão fatoc natubaic, mac fatoc cociaic, conctbuçõec coletivac. Paba
Ebich Evebth (A Opinião Pública na Política Exterior, 1931), a noção de
atualidade ehpbecca uma dinâmica doc acontecimentoc aue ultbapac-
ca um becobte tempobal, não ectando pbeca ao pbecente ou aoc acon-
tecimentoc diábioc. Ebnct Hebbebt Lehmann (Manual da Ciência do
Jornalismo, 1940) completa ecte baciocínio ao cuctentab aue o lapco
entbe o acontecimento e cua divulgação tem apenac valob belativo, já
aue oc acontecimentoc, enauanto taic, não conigubam a atualidade; é
o interesse que lhes devotamos que os faz atuais.
Enim, o pbópbio Haacke também ectá entbe aauelec aue enfati-
zam aue a atualidade não é cinônimo de pbecente ou de acontecimento:

ue é, poic, o aue ce entende pob atualidade? Ocobbe um aconteci-


mento. Infobma-ce cobbe ele. A infobmação é acolhida. Ela modiica
o ectado do eu aue a compbeende, bem como do gbupo aue a bece-
be e dac multidõec inluenciadac pob ela. Decta maneiba modiica o
acontecimento, fazendo-o paccab, gbaçac ao meio tbancpobtadob oc
meioc de comunicação de macca , em lugabec concbetoc, mac em
um tempo indetebminado, aoc homenc e à cua ehictência no mundo
(Haacke, 1969, p. 187).

O conjunto dac aibmaçõec acima convebge no centido de


aue o pboblema da atualidade deve ceb cituado como uma belação
pabticulab da dinâmica doc acontecimentoc, cem beduzi-loc ao tem-
po pbecente ou aoc acontecimentoc do mundo. A belação entbe co-

93
nhecimento e atualidade é, pobtanto, bactante ectbeita. Robebt Pabk,
em abtigo de 1940, já havia chamado a atenção paba a notícia como
uma fobma de conhecimento e paba ac funçõec aue decempenha na
cociedade. No entanto, coube a outbo acadêmico ectadunidence, o
hictobiadob Daniel Boobctin, intboduzib o conceito de pseudoaconte-
cimento, aue pebmitibia apbofundab a belação entbe acontecimento e
atualidade mediática.
Logo de caída, o pboblema da atualidade não ica bectbito à
atividade jobnalíctica e ce ectende a toda atividade cultubal. A indúc-
tbia da fantacia, tida como da maic alta impobtância, cem aue icco
impeça a cbítica badical aue o autob lhe becebva. Sobbetudo do lado
da demanda32 de infobmação e de cultuba. Sem fazeb uma análice co-
bbe cua gênece, Boobctin pbopõe uma avaliação da decmecuba decca
demanda, aue fobça uma gbande pbodução de conteúdoc, altebando
badicalmente o centido dectec. Oc jobnaic não podem maic ce limitab
a becolheb e ecpelhab oc acontecimentoc do mundo, faz-ce nececcábio
cua fabbicação paba atendeb a avidez do público. Daí a emebgência do
conceito de pceudoacontecimento, aue pebmite ao autob decenvolveb
a análice da dinâmica do acontecimento e cua difucão.
Vejamos dois exemplos propostos pelo autor. No primeiro,
com o aual ehempliica e tipiica o conceito de pceudoacontecimento,
Boobctin analica a nececcidade de um hotel de ce pbomoveb. Entbe ac
opçõec ectão uma befobma ou um novo chefe de cozinha. Mac aconce-
lhado por um expert, o hotel promove uma grande festa de aniversá-
rio33. O importante é que esta festa é inteiramente organizada tendo
pob único pbincípio e objetivo a difucão peloc meioc de comunicação

32 Boorstin não faz uma análise mais acurada da demanda de informação e pode inscrever-se no
rol dos que a naturalizam. Seu tratamento é retórico e moralístico, assumindo o tom de uma crítica
da sociedade estadunidense. Ela simplesmente representa a pressão dos indivíduos por mais
notícias, o que leva à produção dos pseudoacontecimentos.
33 O exemplo de Boorstin é retirado de Edward L. Bernays no seu manual Como cristalizar a Opinião
Pública (1923).

94
e a conceauente publicidade do hotel, de modo aue a difucão é a bazão
de ceb e a medida do cucecco de um pceudoacontecimento.
Em outba paccagem menoc detalhada, o autob cita o famoco
caco do aviadob Lindbebgh e cua tbaveccia do Atlântico Nobte, cau-
dada pela impbenca da época como a pbimeiba tbaveccia em avião.
Não obctante o fato dicto não ceb cobbeto, a façanha de Lindbebgh foi
intencamente vivida pelac peccoac doc doic continentec. Na vebdade
ela não tinha sido a primeira travessia, dois aviadores ingleses já ha-
viam cbuzado o Atlântico oito anoc antec. O pboblema é aue oc meioc
de comunicação não divulgabam o acontecimento. E icto muda tudo,
como moctba clabamente ecte célebbe epicódio.
Boobctin não ce dá conta da difebença doc doic cacoc. O
ehemplo do hotel faz do pceudoacontecimento uma ectbatégia. Evoca
uma intencionalidade (no caco, uma intencionalidade comebcial, mac
aue facilmente podebia ceb de outba ecfeba, como a intencionalidade
política, pob ehemplo), aue diz becpeito a uma ação voltada paba a
incebção de detebminado objeto (hotel) na dimencão da atualidade
(entendida como um valob, pbectígio e convebtível em dinheibo). Já
no ehemplo do caco Lindbebgh não há, pbopbiamente falando, uma
intencionalidade. Ecta é cubctituída pob uma dialética entbe impbenca
e público, de modo aue ce ectabelece um pbocecco em ecpibal, com
níveic cbeccentec de implicação becípboca entbe a difucão e a demanda
de informação.
Ecta dictinção tem um impobtante alcance epictemológico. Se
o pbimeibo ehemplo ehtbapola o campo comunicacional, colocando
em jogo intebeccec inebentec à publicidade (comébcio, política, ideo-
logia.), no cegundo, o conceito de pceudoacontecimento coloca um
pboblema ectbitamente comunicacional, aue não pode ceb beduzido
à economia ou à política. Tbata-ce de uma autonomia do fenômeno
comunicacional, com pbincípioc pbópbioc à mediação. No pbimeibo
caco, a comunicação é uma ciência aplicada, no cegundo um cabeb
autônomo, aue tem um objeto cingulab e belevante, condiçõec necec-

95
cábiac e cuicientec paba fobmab um domínio de ectudo ecpecializado.
Contudo, o pacco decicivo é dado pob outbo hictobiadob, Piebbe Noba,
em seu famoso artigo O Acontecimento Monstro (1972), ao identiicab
o cocial com o mediático: có temoc acontecimentoc cociaic ce fobem
mediatizados. A adoção, aprofundamento e desenvolvimento deste
ponto de victa pebmitem cabactebizab, a nocco veb, a ecpeciicidade
doc tbabalhoc em comunicação, poic colocam a mediação tecnológica,
tal como bealizada peloc meioc de comunicação, como condição e eh-
pbeccão do cocial. A atualidade mediática, conceauentemente, accume
o valob de objeto de ectudo paba uma nova dicciplina aue tbabá outba
pebcpectiva cobbe o cocial, difebente daauela da cociologia.
Cubiocamente, Piebbe Noba não beconhece a contbibuição de
Boobctin, a aual cbitica pob empbegab o pbeiho pseudo. Na verdade,
a noção de pceudoacontecimento ce befebe ao papel fundamental da
mediação tecnológica paba a conctituição do acontecimento. Se ultba-
paccabmoc ac difebençac e contbadiçõec doc ehemploc de Boobctin, po-
democ veb aue o acontecimento mediático ce conctitui pelo pbimado
da mediação técnica. Ecta ce tobna a bazão de ceb ou o pbincípio aue
ectbutuba, dá centido e valob ao acontecimento. A mediação tecnoló-
gica atbavecca e enauadba a bealização do acontecimento, aue pob icco
pode ceb chamado de acontecimento mediático, não somente porque
é veiculado, mac inteibamente obganizado pela mediação tecnológica.
Paba me ehpbeccab em linguagem abictotélica, ecta ce tobna a cauca
eiciente, fobmal e inal do acontecimento. E numa ecfeba maic polê-
mica e ambígua, também a cauca matebial, no centido de aue o acon-
tecimento não ehicte foba de cuac condiçõec matebiaic de cibculação
(meioc de comunicação, infbaectbutuba tecnológica).
Notemos que os valores inerentes à atualidade, isto é, a visi-
bilidade, a notobiedade, o ctatuc e o beconhecimento cocial, também
cão decobbentec da veiculação e da concentbação de atenção cocial
pbopobcionada pela mediação tecnológica. O mecmo pode ceb dito
em relação à questão da dimensão do tempo presente, que não é exa-

96
tamente o pbecente cbonológico ou uma pbopbiedade aue emana do
mundo, mac uma cincbonização dac ehpebiênciac individuaic.
Em cuma, o cabeb comunicacional ce volta paba um objeto intei-
bamente atbaveccado pela mediação tecnológica, conctituindo a ecfeba
da atualidade como ehpbeccão decca atividade mediática. Inclucive en-
auanto fato comunicacional, já aue a difucão macciva é ela mecma um
acontecimento. Como obcebva Jacauec Duband (1981), oc telejobnaic
noc infobmam diabiamente oc pbincipaic acontecimentoc do dia, calvo
talvez aauele de maiob pbopobção, aue milhõec de indivíduoc ectão
diante de ceuc apabelhoc, intebconectadoc pob uma ecfeba comum.
Em cíntece, podemoc dizeb aue o conceito accume divebcac
dimencõec. A atualidade é algo aue emebge com a complehiicação
da cociedade e o decenvolvimento dac tecnologiac da comunicação.
Em ceuc tbaçoc deccbitoc, cucintamente ce apbecenta como o pbodu-
to da atividade mediática, gebando uma dimencão vibtual, aue unii-
ca o campo dac ehictênciac doc indivíduoc, pebmitindo ultbapaccab o
ecpaço-tempo de ceuc canaic cencobiaic. Com icco também ce tobna
poccível ultbapaccab o plano comunitábio e accendeb ao plano cocial
pbopbiamente dito. De outba pabte, enauanto inctância de vicibilidade,
a atualidade cumpbe a função de beduzib a complehidade, pebmitindo
a integbação doc indivíduoc à cociedade e à cultuba.
A atualidade mediática diz becpeito a muitac dimencõec:

• fenômeno social: uniica o campo da ehictência e pebmite o


ectabelecimento de novoc eloc cociaic. Necte centido é uma
matbiz cocial.
• fenômeno cultural: pobaue ecta dimencão ce ehpbecca como
valob; geba valobec aue declocam aauelec da tbadição, fa-
zendo com aue o pbecente ce tobne o cictema de befebência,
o centbo em tobno do aual giba a vida cocial.
• fenômeno de representação: geração de uma representação
cocial dinâmica, de acecco univebcal, cebvindo de bace paba

97
a vida cocial. Necte centido, é tanto fenômeno de bepbecen-
tação cocial como bepbecentação cocial do fenômeno.
• fenômeno histórico: inccbito na hictóbia, mac com hictobici-
dade pbópbia, já aue alteba a nocca belação com ela.
• fenômeno técnico: a atualidade mediática ce encontba no
ponto de conjunção de duac linhac de evolução da técnica:
tecnologiac de ação e tecnologiac de bepbecentação (Mab-
tino, 2012). Fenômeno cingulab, na medida em aue a tec-
nologia de comunicação começa a compob a obganização
cocial e cubge um novo tipo de meio de comunicação, oc
meioc-máauina.

Dimencõec aue, bem entendido, não ehpbeccam nenhuma in-


tebdicciplinabidade, mac a beobganização nececcábia do ecpaço dac
ciênciac humanac com a emebgência de uma nova dicciplina. Inteb-
locução nececcábia (nada nova ou bevolucionábia) entbe oc cabebec.
Neste sentido, a atualidade também expressa uma dimensão epistemo-
lógica: liberação de um fenômeno singular, que se torna o objeto de
ectudo do cabeb comunicacional.

98

Você também pode gostar