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Pereira de Oliveira L.A (1); Ramos M (2); Castro Gomes J.P (3)
Resumo
O artigo apresenta os resultados de um estudo experimental elaborado para o desenvolvimento de uma
metodologia de dosagem de concreto auto-adensável reforçado com fibras de aço (CAARFA) para ser
utilizado no preenchimento de vazados de alvenarias estruturais. O método proposto é simples e baseia-se
na determinação da granulometria óptima dos materiais finos através da observação do teor de argamassa
no concreto fresco. Foram utilizados dois comprimentos de fibras, 30mm e 60mm, adicionadas ao concreto
em volumes de 0,5%, 1,0% e 1,5%. Os resultados obtidos confirmam a viabilidade do uso de uma
metodologia simples para a obtenção de misturas de concreto com fibras cujas propriedades reológicas
caracterizam como auto-adensáveis. A presença de fibras de aço no concreto auto-adensável pode ser
pensada como um aumento da fracção de agregados graúdos sendo portanto necessário um aumento da
fracção fina para volumes de fibras crescentes. As resistências à compressão e a equivalente à flexão
permitem determinar a mistura óptima para uma classe de resistência do concreto desejada.
Palavras-Chave: concreto auto-adensável,dosagem de concreto, fibras de aço, teor de argamassa
Abstract
This paper deals with the mix design and properties of self-compacting steel fiber reinforced concrete
(SCFRC) used to filling the voids of the structural masonry. The SCFRC is designed by application of
different fibers volumes (0 %, 0,5%, 1,0% and 1,5%.) of two fibers lengths, 30mm and 60mm. The optimum
mixture fine grading is determined observing the mortar ratio in the fresh concrete. It turned out that self-
compacting behavior could be obtained at high steel contents. It has also been shown the viability of a
simple mix design method to attain the self-compacting ability of the reinforced steel fibers mixtures. The
compressive and equivalent flexural strengths as parameters to find the optimal mixture for the desired
concrete strength class were studied.
Keywords: concrete mix design, mortar ratio, self-compacting concrete, steel fibers
Introdução
A adição de fibras metálicas nos concretos estruturais tem contribuido signficativamente
na melhoria da durabilidade e das propriedades mecânicas do concreto endurecido,
particularmente na resistência à flexão, ductilidade, resistência ao impacto, resistência à
fadiga e a sua vulnerabilidade à fissuração e lascamento. A adição de fibras de aço, como
constata MIAO B et al. (2003), também influencia negativamente a trabalhabilidade do
concreto fresco, tornando o concreto inadequado para os casos onde se requer elevada
fluidez. Entretanto, a possibilidade de redução da densidade de armaduras ordinárias nas
estruturas e mesmo destas serem, em alguns casos, substituídas pelo concreto reforçado
com fibras metálicas tem interessado muitos pesquisadores. Em analogia ao concreto
auto-adensável, proposto por OKAMURA (2000), o concreto auto-adensável reforçado
com fibras de aço (CAARFA) difere de outros concretos, correntemente utilizados, pela
sua capacidade de no estado fresco preencher todos os espaços no interior da forma sem
o uso de qualquer energia de compactação externa. Este tipo de concreto é capaz de
passar pelos espaços entre as armaduras e de se adensar apenas pela acção do seu
peso próprio. Esta compactação deve ocorrer com a liberação do ar aprisionado durante o
processo de mistura e sem haver segregação dos materiais ou seja o concreto deve
manter a sua homogeneidade.
Nos últimos anos vários métodos de dosagem para o concreto auto-adensável tem sido
propostos, destes os mais conhecidos, segundo NAWA et al. (1998) são o de Okamura -
Ozawa e da Japan Society of Civil Engineering, ambos os métodos limitam a dimensão
máxima dos agregados e o conteúdo de agregados graúdos, impondo assim uma
granulometria fina à mistura. Estas limitações são justificadas, em princípio, pelo facto que
em relação aos agregados, a frequência de colisões e de contacto entre partículas pode
aumentar a medida que a distância relativa entre partículas diminui. Deste modo, as
tensões internas aumentam quando o concreto é deformado, particularmente na
proximidade de obstáculos. Como a energia requerida para fazer fluir o concreto é
consumida pelo aumento da tensão interna, resultando no bloqueio das partículas de
agregados, a limitação do volume de agregados abaixo de um certo nível normal torna-se
efectivamente favorável à minimização desse tipo de bloqueio. Assim o bloqueio pode ser
evitado com o uso de uma pasta altamente viscosa ou seja com o uso de adjuvantes
fluidificantes e com baixos valores de relação água/materiais finos. Neste contexto a
adição de fibras de aço vem representar um incremento fictício da dimensão máxima da
mistura ou seja uma modificação significativa das propriedades reológicas do concreto
pela interacção da forma geométrica das fibras com os agregados, aumentando assim a
resistência interna e diminuindo a fluidez da mistura. Em outras palavras, a composição
do concreto auto-adensável reforçado com fibras requer, a medida em que se aumenta o
volume de fibras ou a sua esbeltez, uma mistura mais rica em materiais finos ou seja um
teor de argamassa mais elevado.
A adição de fibras de aço no concreto auto-adensável é perfeitamente viável como
comprovam vários autores, tais como GROTH P and THUN H (2000), KHAYAT K. H and
ROUSSEL Y (2000), GRUNEWALD S and WALRAVEN J.C (2001), MIAO B et al. (2003),
HWANG C. L. et al. (2003). Não obstante, verifica-se a ausência de parâmetros simples
que possam servir como indicador, em um estudo de dosagem, da adequação da relação
volume de fibras e conteúdo de agregados na mistura.
Tendo em vista os argumentos precedentes, este artigo apresenta os resultados de um
estudo experimental desenvolvido para formular misturas auto-adensáveis reforçadas
com fibras de aço para ser utilizada como concreto de enchimento ou graute (concrete
infill ou grout) de alvenarias estruturais construídas com unidades vazadas. Neste
trabalho foi utilizado o conceito de apropriação do teor de argamassa da mistura em
função do volume e da esbeltez das fibras de aço.
1 Materiais e Métodos
Tendo em vista a aplicação da mistura auto-adensável como concreto de enchimento de
vazados de alvenaria e do particular interesse da incorporação das fibras como agente
incrementador da resistência à flexão e da ductilidade das paredes, definiu-se do ponto de
vista da resistência à compressão uma mistura referência para atender a classe de
resistência C20/25, segundo a ENV 206 – Betão: Comportamento, produção, colocação e
critérios.
1.1 Materiais
Um cimento tipo II/B-L 32,5 e uma cinza volante, proveniente da usina termoeléctrica do
Pego no Concelho de Abrantes, foram utilizadas como ligante e adição, respectivamente,
nas misturas ensaiadas.
Um superplastificante à base de carboxilatos modificados, ViscoCrete 3000 da SIKA, com
massa volúmica 1,05 ± 0,02 kg/l, foi usado para se atingir uma viscosidade plástica
adequada. O ensaio de determinação da saturação de aditivo com o material cimentício
empregue para a execução das misturas, ou seja, cimento e cinza volante indicou que o
teor máximo compatível com o material cimentício utilizado é de 3,0 % de
superplastificante.
Dois tipos de agregados miúdos e de agregados graúdos, cujas características são
apresentadas na Tabela 1, foram utilizados na composição dos concretos. Com base na
obtenção da compacidade ótima com as misturas de agregados, a granulometria dos
agregados miúdos na mistura foi composta com 50% de cada tipo de areia. Da mesma
maneira determinou-se que os agregados graúdos são compostos de 70% dos grãos de
um granito britado com dimensão máxima de 9,5 mm e 30% dos grãos de um granito
britado com dimensão máxima 19 mm.
(mm) (kg/m3)
Para este estudo foram utilizadas dois tipos de fibras de aço com a denominação
comercial DRAMIX ZP 30/0.50 e ZC 60/0.80, com esbeltez lf/df = 50 e 75,
respectivamente. A tensão de escoamento do aço destas fibras é de aproximadamente
1100 MPa.
1.2 Métodos
1.2.1 Verificação da trabalhabilidade do CAARFA
A trabalhabilidade do CAA pode ser verificada através de vários métodos (ver Figura 2),
ainda não normalizados, mas largamente utilizado no domínio da investigação. O método
mais comummente utilizado, pela sua simplicidade, é o “slump flow”, ou seja, o método de
Anais do 47º Congresso Brasileiro do Concreto - CBC2005. © 2005 IBRACON. V.570
.
BARROS, J.A.O et al. (2002) observaram que o concreto normal reforçado com fibras de
aço pode apresentar segregação das fibras, caso não haja compatibilidade entre a sua
consistência e a energia de vibração utilizada para a compactação do mesmo.
Uma vez que a alta fluidez do CAARFA pode ser favorável à segregação de fibras de aço,
durante o processo de colocação do concreto, provocada pela elevada massa específica
do aço, aplicou-se uma metodologia de observação da distribuição das fibras.
Anais do 47º Congresso Brasileiro do Concreto - CBC2005. © 2005 IBRACON. V.571
.
Figura 2 - Secção de rotura dividida em células para avaliar a distribuição das fibras
2 Resultados e Discussão
2.1 Propriedades do CAARFA no estado fresco
O processo de ajustamento do teor de argamassa As (%) no concreto foi realizado durante
o procedimento das misturas numa betoneira de eixo horizontal. O processo de ajuste é
iniciado com um determinado teor de argamassa, em seguida acresce-se o teor até atingir
comportamento adequado do concreto fresco, conferido pelos ensaios Slump-Flow, Caixa
L e Funil V. As misturas soluções para os diferentes teores de fibras de aço são
apresentadas na Tabela 2.
Durante a adequação das misturas com fibras de aço constatou-se que as fibras
modificam substancialmente a fluidez, medida pelo ensaio de espalhamento (Slump-flow),
da mistura de referência. Não obstante, a produção do CAARFA torna-se simples e
possível com a otimização do teor de argamassa, o qual aumenta a medida que mais
fibras são adicionadas à mistura.
A Tabela 3 apresenta os valores de slump-flow que caracterizam o auto-adensamento do
concreto, para os quais foram necessários os valores de teor de argamassa que se
apresentam na Tabela 2. Concluindo-se que o teor de argamassa necessário é
directamente proporcional a relação (lf/df)*Vf , conhecido como índice de fibras.
76
74
70
68
y = 0,0943x + 63,751
66
R2 = 0,9611
64
62
0 20 40 60 80 100 120
Indice de fibras (l/d*Vf)
800
790
780
Slump flow (mm)
770
760 l/d = 50
750 l/d = 75
740
730
720
710
0 20 40 60 80 100 120
Indice de fibras (l/d x Vf)
4,5
Tempo de escoamento Funi V
3,5
(seg)
l/d = 50
l/d =75
3
2,5
2
20 40 60 80 100 120
Indice de fibras (l/d x Vf)
0,80. Não se observou uma correlação satisfatória entre o índice de fibras e a relação
H2/H1. Embora a figura 6 possa ser indicativa de uma forte correlação entre o
espalhamento medido pelo Slump-flow e o tempo de escoamento T40, medido na Caixa L,
para o caso das fibras mais longas ou seja de l/d = 75, este comportamento não é
evidente para as fibras mais curtas l/d = 50. Se por um lado o tempo T40 pode ser difícil de
ser tomado com precisão, pode haver aqui tanto um efeito de massa como de
imbricamento das fibras mais longas o que merece ser melhor observado. Não obstante,
todas as misturas apresentam características de auto-adensamento mesmo com adições
elevadas de fibras de aço, ou seja 120 kg de fibras de aço por metro cúbico de concreto
(Vf =1,5%).
1,9
Ensaio Caixa L - T40 (seg)
y = -0,0157x + 13,025
1,7
R2 = 0,9689
1,5
1,3
1,1
0,9
0,7
0,5
710 720 730 740 750 760 770 780 790 800
Slump flow (mm)
Figura 6 - Influência do volume de fibras com l/d =75 no tempo T40 de escoamento do concreto medido no
ensaio da Caixa L
14
F0,5
12
F1,0
F1,5
10
Carga (kN)
0
0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0
Flecha a 1/2 vão (mm)
Vf = 0,5% Vf = 1,0%
Vf =1,5
Da análise dos resultados verificou-se que a distribuição das fibras segue uma tendência
aleatória. Conclui-se então que a característica da auto-adensamento do CAARFA
promove uma distribuição homogénea das fibras mesmo nos casos em que o volume de
fibras é considerado elevado. Este comportamento é singular deste tipo de concreto,
contrariando as distribuições de fibras que podem resultar nos concretos normais
reforçados com fibras compactados por vibração. Nestes é preciso compatibilizar a
energia de vibração com a consistência do concreto a fim de evitar a segregação das
fibras.
Os resultados obtidos por AMORIM (2002) atestam a necessidade desse compromisso,
energia de vibração x consistência do concreto, caso contrario esta inadequação trará
efeitos nos resultados da resistência à flexão.
A Figura 9 apresenta os valores médios de percentagens de fibras, para os diferentes
volumes de fibras, observados nas colunas, verificando-se que não houve alteração
significativa no conteúdo de fibras no sentido da concretagem.
Direção de concretagem
4ª col
3ª col
2ª col
1ª col
0 5 10 15 20 25 30
% média de fibras
Figura 9 - Distribuição das fibras pelas colunas que caracterizam a secção de fractura
Utilizou-se, também, a técnica de análise de imagens, obtidas por meio digital, para a
apreciação da distribuição das fibras na direção perpendicular a seção de fractura. A
Figura 10 apresenta uma secção transversal cortada após impregnação de resina. Esta
lâmina cortada compreende uma zona equidistante da fissura sob deflexão máxima do
corpo de prova prismático. A Figura 11 apresenta uma secção de leitura do numero de
fibras, que é realizada digitalmente por renderização dos pontos onde se localizam as
fibra. Os valores médios encontrados nas secções confirmaram a distribuição homogênea
das fibras nessa direção.
1+ f + a
As (%) = × 100
1+ f + m
(1)
7,00
4,00
3,00
2,00
1,00
0,00
0,25 0,35 0,45 0,55 0,65 0,75
relação água/cimento (kg/kg)
0,75
relação água/cimento (kg/kg)
0,65
0,55
0,45
y = 0,215x - 0,4342
R2 = 0,9505
0,35
0,25
3 3,5 4 4,5 5 5,5 6
total de agregados m
3 Conclusões
4 Referências
AMORIM, J.A., Betão de custo competitivo reforçado com fibras de aço para
pavimentos industriais. Dissertação de Mestrado. Universidade do Minho, Portugal,
2002
OLIVEIRA, L.A.P. Estudo do desempenho dos grautes com adições para enchimento
de blocos de alvenaria estrutural. Dissertação de mestrado, Escola Politécnica da
Universidade de São Paulo, São Paulo, 1986.
RILEM TC 162-TDF Committee, Test and design methods for steel fiber reinforced
concrete. Recommendations for σ – ε design method,” Materials and Structures, RILEM,
33, pp. 75-81, 2000.