Você está na página 1de 94

Fisiologia DO EXERCÍCIO E DO ESPORTE

A fisiologia do exercício aborda como o corpo


humano se adapta ao estímulo agudo e crô-
nico do treinamento físico, além de procurar
conhecer e entender os mecanismos básicos do
corpo, que estão associados ao funcionamen-
to dos sistemas neuromuscular, cardiovascular,
respiratório e endócrino.
Esta obra apresenta tópicos básicos sobre a
fisiologia do exercício, tendo como objetivo
fomentar conteúdo específico sobre o assunto
para estudantes e interessados por essa área.

DO EXERCÍCIO
Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-6513-4 E DO ESPORTE
Hugo Melo

58770 9 788538 765134


Hugo Melo
Fisiologia do exercício e
do esporte

Hugo Melo

IESDE
2019
© 2019 – IESDE BRASIL S/A.
É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos
direitos autorais.
Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Orla/majcot/Shutterstock

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
M485f
Melo, Hugo
Fisiologia do exercício e do esporte / Hugo Melo. - 1. ed. - Curitiba [PR]: IESDE
Brasil, 2019.
90 p. : il.
Inclui bibliografia
ISBN 978-85-387-6513-4
1. Exercícios físicos - Aspectos fisiológicos. 2. Esporte - Aspectos fisiológicos. I.
Título.
CDD: 612.044
19-60306
CDU: 612.766.1

Todos os direitos reservados.

IESDE BRASIL S/A.


Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200
Batel – Curitiba – PR
0800 708 88 88 – www.iesde.com.br
Hugo Melo
Doutor e mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Sergipe (UFS).
Pós‑graduado em Atividade Física Adaptada e Saúde pela Universidade Estácio de Sá. Licenciado e
bacharel em Educação Física pela Universidade Tiradentes (UNIT-SE). É professor nas modalidades
presencial e a distância, ministrando disciplinas como Morfologia Humana, Anatomia Humana,
Fisiologia Humana, Fisiologia do Exercício e Neuroanatomofisiologia para os cursos de Educação
Física, Nutrição, Farmácia e Psicologia. Atua principalmente com atividade física adaptada e saúde
nas áreas de epidemiologia, planejamento e avaliação em saúde.
Sumário

Apresentação 7

1 Homeostase e estado estável 9


1.1 Conceitos da função celular 9
1.2 Mecanismos homeostáticos 16

2 Fontes energéticas para o exercício físico 27


2.1 Sistema ATP-CP (fosfagênio): metabolismo anaeróbico alático 27
2.2 Sistema glicolítico: metabolismo anaeróbico lático 30
2.3 Sistema oxidativo: metabolismo aeróbico 32

3 Sistema neuromuscular e exercício físico 39


3.1 Mecanismos neuromusculares 39
3.2 Ações musculares 44
3.3 Respostas fisiológicas do exercício físico 48

4 Sistema respiratório e exercício físico  53


4.1 Regulação da ventilação e exercício físico 53
4.2 Limiar anaeróbico (LAn) 58
4.3 Consumo máximo de oxigênio (VO2máx) 59

5 Sistema circulatório e exercício físico 63


5.1 Pressão arterial 63
5.2 Frequência cardíaca 67
5.3 Débito cardíaco 70

6 Sistema endócrino e exercício físico 75


6.1 Respostas hormonais e exercício físico 76
6.2 Regulação hormonal e exercício progressivo, intenso e prolongado 80

Gabarito 85
Apresentação

Esta obra apresenta tópicos básicos sobre a fisiologia do exercício, tendo como objetivo
fomentar conteúdo específico sobre o assunto para estudantes e interessados por essa área.

A fisiologia do exercício aborda como o corpo humano se adapta ao estímulo agudo e


crônico do treinamento físico, além de procurar conhecer e entender os mecanismos básicos
do corpo, que estão associados ao funcionamento dos sistemas neuromuscular, cardiovascular,
respiratório e endócrino.

O estudo da fisiologia do exercício está atrelado aos sistemas responsáveis pela geração
de energia e a um suporte adicional para a execução do movimento esportivo. Portanto, é
especialmente importante que o profissional da área compreenda as fontes energéticas necessárias
para que o exercício físico seja praticado e como o corpo humano consegue sintetizar os nutrientes
dos alimentos ingeridos.

Sendo assim, cada capítulo desta obra é destinado ao estudo funcional dos sistemas
responsáveis pela prática do exercício. Iniciamos com uma abordagem introdutória sobre a
célula e suas organelas citoplasmáticas, para, então, chegarmos à compreensão dos mecanismos
homeostáticos e à diferenciação entre homeostase e estado estável. Em seguida, trataremos das
principais fontes energéticas para o exercício físico, e, depois, dos diferentes sistemas funcionais e
suas respostas fisiológicas acerca do exercício físico. A fim de aplicar os conhecimentos adquiridos,
trazemos, ao fim de cada capítulo, atividades que relacionam os conteúdos estudados a situações
práticas.

Esperamos que este livro contribua de forma significativa para o aprendizado e para a
posterior prática do profissional da área de saúde.

Bons estudos!
1
Homeostase e estado estável

No interior do corpo humano, diversas reações eletroquímicas ocorrem em diferentes


situações: no sono, durante um estresse psicológico e, principalmente, durante a prática de atividades
físicas, por exemplo. Por isso, é de suma importância que compreendamos os mecanismos básicos
para manter o organismo em perfeitas condições para o seu funcionamento. Para compreender todos
esses eventos importantes no controle do corpo humano, no entanto, é necessário, primeiramente,
conhecer e entender o funcionamento das células (menor unidade funcional e estrutural do ser vivo).
Para facilitar o seu entendimento, abordaremos, neste capítulo, desde o nível celular
(microscópico) até o nível de órgãos e sistemas (macroscópico). Estudaremos, portanto, os
conceitos da função celular, bem como os mecanismos homeostáticos, eventos que ocorrem no
corpo humano a fim de manter um funcionamento adequado para as funções fisiológicas.

1.1 Conceitos da função celular


Para entendermos a complexidade do corpo humano, devemos iniciar com o estudo do
nível celular. Nesse sentido, podemos associar a célula a uma fábrica, na qual cada funcionário
desenvolve uma atividade. Cada uma das estruturas em seu interior é responsável por determinada
função, e o conjunto dessas funções representa a menor unidade morfofuncional do organismo. A
união das células resultará nos tecidos, que, agrupados, formarão órgãos, constituindo os sistemas
que permitirão o funcionamento do corpo humano como um todo.
As células eucariontes são mais complexas devido à presença de estruturas membranosas em
seu interior. Mas qual é a real importância dessas estruturas dentro de cada célula? As organelas
celulares são consideradas os órgãos das células e têm funções parecidas com as desempenhadas
pelos nossos órgãos internos, tais como: digestão, quebra de moléculas, excreção do que não for
necessário, entre outras.
Segundo Guyton e Hall (2011), o ser humano é composto por 100 trilhões de células. Elas
podem sobreviver por vários anos, desde que os líquidos que as banham contenham nutrientes
adequados. Para compreendermos as funções dos órgãos e como eles se comportam com relação ao
exercício, é necessário que, primeiramente, entendamos a organização básica e as funções da célula.
Todas as células do corpo humano apresentam uma membrana plasmática ou celular
que controla a entrada e a saída de materiais, funcionando como o portão da célula. Uma vez
ultrapassadas suas barreiras membranosas, deparamo-nos com outra estrutura, denominada
citoplasma, correspondente ao espaço existente entre a membrana plasmática e a membrana
nuclear.
10 Fisiologia do exercício e do esporte

No citoplasma, encontramos o núcleo da célula (correspondente à diretoria da fábrica,


quando fazemos alusão da célula a uma fábrica), onde está o nosso material genético (DNA e/
ou RNA). É no citoplasma também que ocorrem as reações químicas e encontramos as organelas
fundamentais para a vida celular. A seguir, vamos conhecer, de maneira sucinta, as organelas mais
importantes no que se refere à fisiologia do exercício.

1.1.1 Mitocôndria
Não podemos iniciar o estudo do funcionamento de uma célula sem falar de energia, pois
todas as estruturas presentes na célula necessitam dela. E de onde ela vem? Da mitocôndria. O tipo
de energia fornecido é o trifosfato de adenosina (ATP), liberado por meio da respiração celular,
processo que tem início no citosol das células e termina no interior das mitocôndrias (ALBERTS;
JOHNSON; WALTER, 2017).
Figura 1 – Mitocôndria

Designua/ Shutterstock

A Figura 1 ilustra uma mitocôndria, na qual podemos visualizar seu próprio material
genético, o DNA, além de estruturas importantes para a função mitocondrial, como as membranas
(interna e externa) e a crista.
Junqueira e Carneiro (2012) afirmam que as mitocôndrias apresentam seu próprio material
genético, fazendo com que algumas doenças sejam decorrentes de defeitos nesse DNA. Vale
ressaltar que, em doenças como a disfunção muscular, as células musculares apresentam
metabolismo energético intenso, necessitando, assim, de maior disponibilidade energética, o
que as torna muito sensíveis aos defeitos mitocondriais. Um exemplo dos sinais dessa disfunção
é a queda da pálpebra superior, seguida de dificuldades para deglutir e fraqueza dos membros
inferiores (GUYTON; HALL, 2011).
Homeostase e estado estável 11

1.1.2 Ribossomos
Essas organelas são comuns a todos os tipos de células e originam-se no núcleo celular,
por meio da união de proteínas com o RNA ribossomal em um corpúsculo do interior do núcleo
chamado nucléolo. Essa união forma subunidades ribossomais que, unidas, formam o ribossomo.
Figura 2 – Ribossomo

Timonina/ Shutterstock
A função dessa organela é a síntese proteica. Para as células que necessitam de intensa
síntese dessa substância – como é o caso das células embrionárias, dos reticulócitos e das células
cancerígenas, que sintetizam intensa quantidade de proteínas para serem utilizadas internamente
–, os ribossomos se unem a uma molécula de RNA mensageiro, formando os polirribossomos. A
mensagem contida nesse RNA é o código para a sequência de aminoácidos na molécula proteica que
está sendo sintetizada, e os ribossomos exercem um importante papel na tradução da linguagem
genética (RNA mensageiro) para a linguagem proteica.
A Figura 2 mostra uma imagem ilustrativa de um ribossomo. Podemos observar duas
subunidades: uma maior e outra menor. É importante saber que essas subunidades contribuem
primordialmente para a síntese proteica.

1.1.3 Retículo endoplasmático liso e rugoso


O retículo endoplasmático é uma organela formada por um conjunto de vesículas e túbulos
que se originaram por meio da invaginação da membrana. Por sua morfologia apresentar trechos
com ribossomos aderidos à sua superfície e outros trechos sem a presença destes, ela foi classificada
de duas maneiras: retículo endoplasmático rugoso e retículo endoplasmático liso.
12 Fisiologia do exercício e do esporte

Figura 3 – Retículo endoplasmático liso e rugoso

Tefi/ Shuteerstock
A Figura 3 mostra o retículo endoplasmático liso e rugoso. Vale ressaltar aqui que, como
observado na figura, o retículo endoplasmático rugoso possui ribossomos aderidos à sua
membrana. Obviamente, os ribossomos associados irão executar a síntese proteica, como já
discutimos anteriormente.
Alberts, Johnson e Walter (2017) afirmam que o retículo endoplasmático rugoso tem
polirribossomos aderidos à sua membrana e, por isso, apresenta um aspecto granular ou rugoso.
Sua principal função é a síntese de proteínas, tanto para exportação quanto para uso interno
da célula. Células acinosas do pâncreas, fibroblastos e plasmócitos são células especializadas na
secreção de proteínas. As acinosas do pâncreas produzem e secretam enzimas digestivas, como
a amilase pancreática; os fibroblastos produzem o colágeno (proteína que confere resistência aos
tecidos); e os plasmócitos produzem os anticorpos (proteína da família das imunoglobulinas).
Nesses locais, o retículo endoplasmático rugoso se apresenta em grande quantidade.
Já o retículo endoplasmático liso não apresenta ribossomos aderidos à sua membrana. Mas
qual é a função dele, visto que não possui ribossomos aderidos? Sua principal função é a síntese de
lipídios, entre eles os esteroides e os fosfolipídios, que formam a membrana plasmática. As células
do tecido muscular estriado também apresentam excesso dessas organelas, porém, nesse local,
serão denominadas retículo sarcoplasmático e terão como função o armazenamento e a liberação
do íon cálcio, utilizado durante a contração muscular (ALBERTS; JOHNSON; WALTER, 2017).

1.1.4 Complexo de Golgi


Essa organela se apresenta como vesículas ou bolsas membranosas empilhadas umas sob as
outras e dilatadas em suas extremidades. Sua maior concentração ocorre em locais que necessitam
de intensa secreção de proteínas. Mas o que significa secreção? Secreção é a liberação de substâncias
produzidas pelas células para que possam ser utilizadas por outras células, tecidos ou órgãos.
Homeostase e estado estável 13

Figura 4 – Complexo de Golgi

Designua/ Shutterstock
Células glandulares, como glândulas salivares, glândulas mamárias, pâncreas, entre outras,
apresentam excesso dessa organela, que secretará as enzimas e substâncias produzidas pela glândula.
O complexo golgiense também é responsável pela formação de outra organela membranosa,
denominada lisossomos, conforme veremos a seguir.
A Figura 4 é uma imagem ilustrativa do aparelho de Golgi. Nela, conseguimos observar duas
faces (face cis e face trans), além de vesículas e da cisterna. Esse conjunto de estruturas no interior
do complexo de Golgi favorece a secreção e o transporte.

1.1.5 Lisossomos
A principal função dessas organelas é a digestão celular. Elas apresentam, em seu interior,
diversos tipos de enzimas digestivas, entre elas nucleases (enzimas que removem material nuclear,
ou seja, material genético), proteases (enzimas que digerem ou removem proteínas) e fosfatases
(enzimas que removem o fosfato).
Figura 5 – Lisossomo
Designua/ Shutterstock
14 Fisiologia do exercício e do esporte

Os lisossomos estão presentes em todas as células, porém, são mais numerosos nas células
fagocitárias de defesa, como os macrófagos (primeira linha de defesa contra as bactérias) e os
leucócitos, mais especificamente os neutrófilos segmentados, que constituem o maior número das
células sanguíneas de defesa e participam da luta contra bactérias.
A Figura 5 ilustra um lisossomo. Podemos ver claramente a presença de enzimas digestivas
além de proteínas de transporte no interior dessa organela, assumindo, assim, a função de digestão
celular.

1.1.6 Peroxissomos
Alberts, Johnson e Walter (2017) ressaltam que, assim como as mitocôndrias, os peroxissomos
utilizam grandes concentrações de oxigênio, mas não produzem ATP, ou seja, não participam
do metabolismo energético. São assim denominados porque oxidam substâncias orgânicas
específicas. Os peroxissomos contêm enzimas que promovem a reação do oxigênio com algumas
moléculas orgânicas. Nessa reação, a molécula orgânica perde hidrogênio e forma peróxido de
hidrogênio (H2O2), também conhecido como água oxigenada. O H2O2 é tóxico, porém, no interior
do peroxissomo, existe uma enzima denominada catalase, que decompõe o H2O2 em água (H2O)
e oxigênio (O2).
A atividade da catalase no nosso organismo é muito importante, principalmente do ponto
de vista clínico, pois as moléculas tóxicas, inclusive medicamentos que entram em contato com
nosso organismo, serão oxidadas, principalmente nos peroxissomos do fígado e dos rins, e boa
parte do álcool etílico ingerido será transformado em aldeído acético pelos peroxissomos desses
órgãos (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2012).
Figura 6 – Peroxissomo

Bananafish/Shutterstock
Homeostase e estado estável 15

A Figura 6 mostra um peroxissomo. Por meio dela, podemos observar a presença do core
cristaloide e da membrana que possui uma bicamada lipídica. Essas estruturas dão o suporte para
a organela conseguir, de maneira coesa, realizar as suas funções específicas, como, principalmente,
a oxidação de determinadas substâncias.

1.1.7 Centríolos
São organelas não membranosas formadas por microtúbulos proteicos que se organizam
formando um cilindro. Em cada célula eucariótica animal existe um par de centríolos, que participa
do processo de divisão celular duplicando-se durante a mitose (uma das etapas da divisão celular).
Para que as células se renovem, os tecidos se formem e o corpo se desenvolva, faz-se necessária a
duplicação dos centríolos no período que precede a divisão celular, migrando para os polos opostos
da célula, a fim de que as novas células que serão originadas também possuam centríolos.
Figura 7 – Centríolo

Designua/Shutterstock

A Figura 7 mostra a organela chamada de centríolo. Podemos visualizar claramente os


microtúbulos, que serão importantes no processo de divisão celular, duplicando-se. Como já
conhecemos as organelas celulares e suas respectivas funções, chegou a hora de falarmos sobre
homeostase e estado estável, entendendo que todo o funcionamento do nosso corpo deriva do
funcionamento das células e suas organelas.
As funções fisiológicas básicas do corpo humano permitem que, mesmo estando em repouso,
o corpo não perca a sua atividade contínua. É nesse sentido que conceituamos homeostase. Para
Robergs e Roberts (2002), homeostase nada mais é do que funções corporais mantidas inalteradas.
Mais especificamente, refere-se ao equilíbrio dos líquidos e dos tecidos corpóreos em relação às
funções e composições químicas básicas. Podemos dizer, então, que o conceito de homeostase se
refere à habilidade do corpo humano de regular o seu ambiente interno, objetivando manter uma
condição estável. Mas como o corpo humano consegue se adaptar a diversas situações? Por meio
de um mecanismo chamado autorregulação.
16 Fisiologia do exercício e do esporte

Esse processo acontece de várias formas, por exemplo: os ajustes de equilíbrio dinâmico são
controlados por mecanismos de regulação inter-relacionados. De maneira geral, a autorregulação
é o processo que mantém o equilíbrio corporal, que pode ser determinante para a velocidade com
que a homeostase é atingida após o exercício, voltando ao repouso corporal. Ela é responsável pela
redução de consequências fisiológicas do estresse em relação ao exercício.
Ainda nesse sentido, não poderíamos deixar de falar sobre estado estável. Esse é mais um
fenômeno do organismo que se relaciona diretamente com o exercício. Podemos dizer que o estado
estável é um comportamento oposto à homeostase, referindo-se à estabilidade que é provocada em
alguns órgãos e músculos, mantendo o equilíbrio da produção de substratos energéticos, além da
manutenção da frequência cardíaca para a execução do exercício (GUYTON; HALL, 2011).
Baseado nisso, fica claro que o estado estável é atingido de acordo com a duração e a
intensidade do esforço físico. Para resumir e ficar mais fácil de entender, quando se eleva o grau
de dificuldade do esforço físico, o organismo se ajusta, demandando maior custo energético
para a realização do exercício (PEREIRA; SOUZA JÚNIOR, 2005). Com isso, o estado estável
é responsável pela continuidade do exercício em determinada intensidade, até atingir o limite,
ocorrendo, assim, a interrupção do esforço físico.
Agora que já conhecemos algumas das organelas celulares importantes na fisiologia do
exercício, bem como o estado estável e a homeostase, no próximo tópico falaremos sobre alguns
mecanismos para controle da homeostase.

1.2 Mecanismos homeostáticos


Como já aprendemos os conceitos de função celular, homeostase e estado estável, chegou a
hora de nós entendermos um pouco mais a fundo os mecanismos homeostáticos dos principais
sistemas funcionais. Nesta seção, abordaremos como alguns órgãos ou tecidos podem contribuir
para a homeostasia. Para melhorar o seu entendimento, vamos tratar de cada um dos sistemas
funcionais separadamente. São eles: sistema de mistura do líquido extracelular e transporte
(circulação sanguínea); origem dos nutrientes do líquido extracelular; remoção dos produtos
finais do metabolismo; regulação das funções corporais; proteção do corpo humano e sistema de
retroalimentação.

1.2.1 Sistema de mistura do líquido extracelular e transporte: circulação


sanguínea
O líquido extracelular é transportado para todas as partes do nosso corpo e subdivide-se em
dois movimentos básicos: a circulação do sangue no interior dos vasos sanguíneos e o transporte
de líquido entre as células dos tecidos nos espaços intracelulares.
Homeostase e estado estável 17

Figura 8 – Difusão de líquido através dos espaços intersticiais e dos capilares sanguíneos

IESDE Brasil S/A


Arteríola

Vênula

Guyton e Hall (2011) afirmam que, em repouso, o sangue percorre todo o sistema circulatório
uma vez por minuto. Quando realizamos o exercício físico, essa frequência pode chegar a até seis
vezes por minuto. Além disso, quando o sangue percorre os vasos sanguíneos microscópicos,
chamados de capilares sanguíneos, ocorre uma troca continuada entre o plasma sanguíneo e o
líquido intersticial, localizado entre as células nos tecidos.
Com isso, o líquido se difunde em ambas as direções, entre o sangue e os espaços entre as
células, conforme ilustra a Figura 8. Esse processo de difusão é resultado do movimento cinético
das moléculas no líquido intersticial juntamente ao plasma sanguíneo. Portanto, podemos perceber
que o líquido extracelular – tanto no fluido intersticial quanto no plasma sanguíneo – está em
contínua mistura, mantendo-se, assim, em um estado quase que homogêneo.

1.2.2 Origem dos nutrientes do líquido extracelular


Alguns dos nutrientes importantíssimos para a manutenção da vida e o controle da
homeostase são provenientes de diversas vias do corpo humano. Quando nos referimos ao estudo
da fisiologia do exercício, não podemos deixar de falar de alguns nutrientes essenciais para o
movimento humano, tais como: oxigênio, carboidratos, ácidos graxos e aminoácidos. Mas de onde
vêm esses nutrientes? Como eles se tornam imprescindíveis para o exercício?
O sistema respiratório favorece a troca gasosa – oxigênio e dióxido de carbono – entre o
ar atmosférico, o sangue e as células teciduais, contribuindo para a homeostasia (TORTORA;
DERRICKSON, 2018). É sabido que o sangue passa pelo corpo e pelos pulmões. Nos pulmões,
especificamente nos alvéolos pulmonares, o sangue capta o oxigênio necessário para a atividade celular.
18 Fisiologia do exercício e do esporte

Em outra perspectiva, quando o sangue é ejetado pelo coração, também percorre o trato
gastrointestinal. Lá, diferentes nutrientes, como carboidratos, aminoácidos e ácidos graxos, são
absorvidos do alimento ingerido para o líquido extracelular do sangue, tornando-se nutrientes
cruciais para o corpo humano. Porém, nem todas essas substâncias absorvidas pelo trato
gastrointestinal podem ser usadas dessa forma; alguns órgãos têm a capacidade de as metabolizar.
O fígado, por exemplo, possui a capacidade de alterar, quimicamente, algumas substâncias,
transformando-as em formas mais utilizáveis pelo corpo. Outros exemplos incluem: glândulas
endócrinas, mucosa gastrointestinal e os rins, que possuem contribuição direta na modificação de
substâncias absorvidas ou até mesmo no armazenamento.
Quando nos referimos ao sistema musculoesquelético, qual é a sua real importância para o
controle da homeostasia? Sabemos que os músculos são responsáveis pelos movimentos corporais,
e esses movimentos estão diretamente envolvidos na locomoção. Se os músculos não existissem,
não teríamos como nos locomover para a obtenção dos alimentos necessários para nutrir o
organismo; além disso, eles estão diretamente ligados ao processo de mastigação.

1.2.3 Remoção dos produtos finais do metabolismo


Quando nos referimos aos produtos que são removidos do nosso corpo, não podemos deixar
de falar sobre o dióxido de carbono (CO2). No processo de respiração, ele é liberado do sangue para
os alvéolos pulmonares. Os movimentos inspiratório e expiratório do ar, para dentro e fora dos
pulmões, levam o CO2 para a atmosfera. Vale ressaltar que o dióxido de carbono é o principal e
mais abundante produto liberado pelo metabolismo.
Figura 9 – Trocas gasosas no corpo humano

Olga Bolbot/Shutterstock
Homeostase e estado estável 19

Outros produtos extremamente importantes do metabolismo celular, e que valem ser


abordados aqui, são: ácido úrico, íons, ureia, além do excesso de água proveniente dos alimentos
ingeridos, que pode ser acumulado no líquido extracelular. Pois bem, para esses produtos serem
removidos, precisamos da atuação dos rins. Mas como os rins conseguem remover todos esses
produtos do metabolismo celular? A resposta é simples: quando o sangue passa pelos rins, eles têm
a capacidade de remover do próprio plasma sanguíneo esses produtos, juntamente ao dióxido de
carbono, tornando-os inutilizáveis pelas células.
Os rins exercem duas funções primordiais para a manutenção da vida: filtração e reabsorção.
O processo de filtração tem como base filtrar o plasma sanguíneo através dos glomérulos para
os túbulos. Posteriormente à filtração, há o processo de reabsorção, para o sangue, de algumas
substâncias imprescindíveis para o corpo humano, como água, glicose, íons, além de aminoácidos.
Nesse sentido, precisamos falar também dos produtos que não são importantes para o corpo,
como a ureia. Ela é pouco reabsorvida e segue diretamente para a urina através dos túbulos renais.
Já que falamos dos produtos eliminados na urina, é importante ressaltar que alguns resíduos são
eliminados na forma de fezes. São materiais não digeridos que entram no trato gastrointestinal e
originam-se dos resíduos que o metabolismo não aproveita para o organismo.

1.2.4 Regulação das funções corporais


Neste tópico, precisamos entender mais especificamente como alguns dos sistemas funcionais
relacionados à fisiologia do exercício exercem a sua função de controle da homeostase. Nesse caso,
vamos abordar os sistemas nervoso e endócrino.
Segundo Tortora e Derrickson (2018), o sistema nervoso é composto de três partes
Aferência:
principais: o sistema nervoso central, chamado também de parte integrativa; parte de aferência ação que vai

sensorial e parte de eferência motora. Primeiramente, vamos pensar na nossa função sensitiva, isto de fora para
dentro.
é, tudo que parte do sistema nervoso periférico para ser processado no sistema nervoso central. Por
exemplo, nossos olhos nos fornecem a imagem visual do ambiente e, assim como os ouvidos, são Eferência:
ação de que
considerados órgãos sensoriais. Além dos olhos e ouvidos, nós possuímos receptores sensoriais, vai de dentro

localizados na pele, que podem nos ajudar a processar a informação oriunda de um objeto tocando para fora.

o corpo.
O sistema nervoso central é composto por encéfalo e medula espinal. O encéfalo tem a
capacidade de gerar pensamentos, emoções, sentimentos, além de determinar as reações do corpo
humano em resposta às sensações (via sensitiva). Essas respostas, então, são transmitidas através
da parte de eferência motora do sistema nervoso para executar determinadas ações do indivíduo.
Já o sistema nervoso autônomo é uma parte do sistema nervoso com grande importância
para o organismo. Ele tem a função de comandar ações em um nível subconsciente, além de
controlar diversas funções dos nossos órgãos internos. Podemos citar aqui os movimentos do
trato gastrointestinal, a própria atividade do bombeamento de sangue pelo coração e a secreção de
inúmeras glândulas do organismo.
20 Fisiologia do exercício e do esporte

Quando nos referimos ao controle das funções corporais pelo sistema endócrino, fica clara
a necessidade de falarmos dos hormônios e das glândulas endócrinas. No corpo humano, existem
oito glândulas endócrinas capazes de secretar as substâncias químicas chamadas de hormônios.
Essas substâncias químicas são transportadas no líquido extracelular em todas as partes do corpo,
com um objetivo principal: participar da regulação da função celular.
A velocidade das reações químicas das células do nosso corpo é aumentada com o hormônio
da tireoide, por isso, o benefício está relacionado ao ritmo da atividade metabólica do organismo.
Por outro lado, o hormônio paratireoideo tem a capacidade de controlar o fósforo e o cálcio dos
ossos, e os hormônios adrenocorticoides buscam controlar os íons sódio e potássio, contribuindo
para o metabolismo proteico e a insulina, que, por sua vez, controla o metabolismo da glicose.
Com isso, fica claro que os sistemas nervoso e endócrino formam um casamento perfeito
para controle e regulação das nossas funções corporais. O sistema nervoso consegue regular muitas
atividades musculares e secretórias, enquanto o sistema endócrino regula e controla muitas das
nossas funções metabólicas.

1.2.5 Proteção do corpo humano


Diante de tudo que está sendo exposto, você deve estar se perguntando: mas como o corpo
se protege de agentes externos? Há alguma contribuição da defesa do corpo na homeostase?
Chegou a hora de sanarmos essas lacunas. Para isso, obviamente, falaremos um pouco sobre o
nosso sistema imune.
O sistema imunológico humano conta com inúmeros componentes, tais como timo,
linfonodos, glóbulos brancos e vasos linfáticos. Esses componentes assumem uma função
primordial na defesa do nosso organismo: defender o corpo contra patógenos, como bactérias,
parasitos, fungos e vírus. Nesse sentido, o nosso sistema imune assume duas principais funções:
• demolir os invasores mediante um processo chamado de fagocitose ou por meio da
produção de leucócitos sensibilizados; ou, ainda, por anticorpos (proteínas especializadas)
que têm a capacidade de destruir ou neutralizar invasores;
• diferenciar suas células e substâncias estranhas.
A pele, maior órgão do corpo humano, também tem uma importante contribuição na
Fânero: proteção do nosso organismo, juntamente aos seus inúmeros fâneros, que compreendem glândulas,
estruturas
visíveis da unhas, pelos, entre outros. Protegem os tecidos e órgãos do corpo, formando um limite entre o
pele.
mundo externo e o meio interno corpóreo. O sistema tegumentar também controla a regulação
da temperatura corporal. De maneira geral, a pele representa, aproximadamente, 15% do peso
corporal (GUYTON; HALL, 2011).
Homeostase e estado estável 21

Além desses sistemas abordados, o corpo humano possui milhares de sistemas de controle,
como o genético, que trabalha em todas as células objetivando o controle das funções extra e
intracelulares. Porém, o nosso organismo também possui sistemas de controle que realizam as suas
funções dentro dos órgãos, mantendo, assim, comunicação e resposta em todo o corpo.
Para exemplificar, vamos pensar no sistema respiratório, que trabalha em combinação
com o sistema nervoso, com o objetivo de controlar a concentração de dióxido de carbono no
líquido extracelular. Além desse exemplo, podemos perceber também que os rins controlam as
concentrações de sódio, potássio e hidrogênio, além de outros íons no ambiente extracelular. Por
sua vez, o pâncreas e o fígado agem na regulação da glicose no líquido extracelular.

1.2.6 Sistema de retroalimentação


Agora que já conhecemos alguns dos inúmeros mecanismos que ajudam na homeostase,
chegou a hora de falarmos um pouco sobre o sistema de retroalimentação, mais conhecido como
feedback. Para você entender melhor, vale ressaltar que o estado de homeostase do organismo está
sendo perturbado a todo o momento, perturbação essa que pode ser proveniente do ambiente
externo – por exemplo, frio e calor – ou do meio interno do corpo – como o nível de glicose muito
baixo no sangue quando não tomamos café da manhã.
Além disso, a homeostasia pode ser afetada pela saúde mental, incluindo as sobrecargas de
trabalho e estudo, levando a um estilo de vida mais sedentário. Essas perturbações são, geralmente,
temporárias e moderadas, pois as células do organismo restauram o equilíbrio interno do corpo,
quase que instantaneamente. Mas como as células corporais conseguem restabelecer o equilíbrio
de maneira rápida e compensatória?
Neste momento, precisamos aprofundar o conhecimento sobre o sistema endócrino e o
sistema nervoso, pois o casamento entre as atividades desses sistemas promove medidas necessárias
para ajustes do ambiente interno. Você já sabe que o sistema nervoso utiliza uma linguagem única
para se comunicar com os outros sistemas do corpo humano, o potencial de ação. Pois bem,
mediante a emissão de potenciais de ação para órgãos neutralizadores, o sistema nervoso regula o
estado de equilíbrio corpóreo.
Por outro lado, você também já tem conhecimento de que o sistema endócrino é composto
por algumas glândulas que têm a capacidade de secretar substâncias químicas (hormônios) no
sangue. Essa secreção, conjuntamente com a ação dos hormônios na célula-alvo, promove o
controle do estado de homeostase. Vale ressaltar aqui que o sistema nervoso atua muito mais
rápido que o sistema endócrino devido aos sinais elétricos do potencial de ação em comparação
com a mensagem química dos hormônios.
22 Fisiologia do exercício e do esporte

Figura 10 – Atividade do sistema de retroalimentação

IESDE Brasil S/A


Fonte: Elaborada com base em Tortora e Derrickson, 2010.

A Figura 10 é um esquema de um sistema de retroalimentação. Esse sistema sempre


parte de algum estímulo que perturba a homeostasia, mudando a condição controlada. Porém, os
receptores reconhecem essa mudança e emitem mensagens elétricas para o centro de controle, o
qual consegue interpretar essa mensagem e emitir novas mensagens para os efetores, que, por sua
vez, executam a ação a fim de se obter o estado de homeostase novamente.
O sistema de retroalimentação (feedback) é uma das formas que o corpo utiliza para regular
o seu meio interno. Tortora e Derrickson (2018) ressaltam que um sistema de retroalimentação
é um conjunto de eventos que busca monitorar, avaliar, remonitorar e reavaliar uma condição
corporal. Nesse sentido, a variável monitorada é chamada de condição controlada. Os estímulos são
as perturbações da condição controlada. Além disso, o sistema de retroalimentação conta com três
componentes gerais: receptor, centro de integração ou controle e efetor.
Há dois tipos de feedback: o positivo e o negativo. O negativo inverte a condição controlada,
já o positivo tem a característica de intensificar a condição controlada. Mas como isso acontece?
Chegou a hora de se aprofundar em cada tipo de sistema de retroalimentação.

1.2.6.1 Sistema de retroalimentação negativo


Para compreender melhor o feedback negativo, observe a Figura 11, que ilustra o sistema
de retroalimentação negativo. Com base na figura, pensemos na regulação da pressão arterial.
Homeostase e estado estável 23

Digamos que um estímulo externo ou interno fez com que a pressão arterial, nesse caso, a condição
controlada se elevasse. A partir daí, uma série de eventos acontece com o único objetivo de voltar
ao equilíbrio, ou seja, diminuir a pressão arterial.
Você já deve saber que na parede de alguns vasos sanguíneos há barorreceptores (células
nervosas ou receptores). Eles são sensíveis à pressão, ou seja, assim que há uma elevação da pressão,
esses receptores reconhecem o estímulo e enviam impulsos nervosos para o encéfalo (centro de
integração), que, por sua vez, tem a capacidade de interpretar os impulsos que chegam e enviar
outros impulsos nervosos para os efetores, nesse caso, o coração e os vasos sanguíneos.
Como resposta, os vasos sanguíneos aumentam seu diâmetro (vasodilatação), e a frequência
cardíaca diminui. Isso faz com que a pressão arterial diminua, retornando, assim, ao equilíbrio
homeostático. Por isso esse sistema de retroalimentação é chamado de negativo, pois inverte a
condição controlada: o estímulo inicial foi o aumento da pressão arterial e, como resposta, temos
a sua diminuição.
Figura 11 – Regulação da pressão arterial por feedback negativo

IESDE Brasil S/A

Fonte: Elaborada com base em Tortora e Derrickson, 2010.


24 Fisiologia do exercício e do esporte

1.2.6.2 Sistema de retroalimentação positivo


O feedback positivo tem o objetivo de intensificar ou reforçar a condição controlada. Vale
ressaltar que o sistema de retroalimentação positivo trabalha de uma forma similar ao negativo.
Porém, a resposta do efetor não é de inversão da situação controlada, e sim de reforço. Observe a
figura a seguir.
Figura 12 – Contrações uterinas no parto por feedback positivo

IESDE Brasil S/A

Fonte: Elaborada com base em Tortora e Derrickson, 2010.


Homeostase e estado estável 25

A Figura 12 ilustra um sistema de retroalimentação positivo nas contrações uterinas durante o


parto. No início do trabalho de parto, as contrações uterinas (estímulo) deslocam o bebê na direção
do colo do útero, onde existem receptores que monitoram a intensidade do estiramento. Nesse
caso, o estiramento do colo do útero é a condição controlada. Com o aumento do estiramento,
células nervosas enviam impulsos nervosos para o encéfalo, o centro de controle. O encéfalo, por
sua vez, estimula a liberação do hormônio ocitocina na corrente sanguínea, fazendo com que os
músculos da parede uterina, o efetor, contraiam-se cada vez mais, intensificando, assim, a condição
controlada.

Considerações finais
Terminado o estudo deste primeiro capítulo, você já é capaz de relacionar as funções de cada
organela celular importante na fisiologia do exercício com o controle da homeostase e do estado
estável. Além disso, foram discutidos alguns sistemas e mecanismos que o corpo utiliza para o
controle do equilíbrio entre o meio externo e interno, permitindo que você tenha uma noção geral
das estruturas que os compõem e de suas funções, que são o objetivo inicial do estudo da fisiologia
do exercício. Com a leitura deste capítulo foi possível compreender também a importância do
sistema de retroalimentação para controle da homeostase.

Ampliando seus conhecimentos


• A CÉLULA e suas organelas. 24 ago. 2017. 1 vídeo (7 min. 21 seg.). Publicado
pelo canal Luise Andruskevicius. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=y3Ync9KkGmg. Acesso em: 30 set. 2019.
Para compreender de maneira mais didática os conceitos celulares e as funções das
organelas citoplasmáticas, assista ao vídeo disponível no link. Trata-se de uma animação
3D sobre a célula e seus componentes mais importantes.

• AIRES, M. M. Fisiologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2018.


Para te ajudar na visão geral dos mecanismos homeostáticos, bem como na compreensão
de sua importância, sugerimos a leitura do primeiro capítulo do livro de Margarida Aires.

Atividades
1. O organismo humano pode ser comparado a uma cidade com 100 trilhões de habitantes
chamados de células, que são organizados em aglomerados chamados de tecidos até se
tornarem um órgão com função predeterminada. Cada célula ou estrutura funcional
contribui para a manutenção da homeostase do corpo. Diante de tudo o que você aprendeu
no decorrer deste capítulo, responda: como as células e suas organelas podem contribuir
para a homeostase?
26 Fisiologia do exercício e do esporte

2. A homeostase é caracterizada pelo estado de repouso sem nenhum tipo de estresse (interno
ou externo), sendo que o organismo se mantém capaz de responder facilmente a mudanças
do meio externo, ou seja, essa condição não é permanente. Como os exercícios físicos podem
afetar a homeostase?

3. Walter Cannon, em 1932, criou o termo homeostase, definido como a manutenção de


um meio interno inalterável. Além desse termo, os profissionais da fisiologia do exercício
também se referem muito a estado estável, termo relacionado a um ambiente fisiológico
constante. Quais são as diferenças e as semelhanças entre homeostase e estado estável?

Referências
ALBERTS, B.; JOHNSON, A.; WALTER, P. Biologia Molecular da Célula. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017.

GUYTON, A. C.; HALL, J. E. Tratado de fisiologia médica. 12. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.

JUNQUEIRA, L. C. U.; CARNEIRO, J. S. F. Biologia celular e molecular. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan,
2012.

PEREIRA, B.; SOUZA JÚNIOR, T. P. Adaptação e rendimento físico: considerações biológicas e


antropológicas. Revista Brasileira de Ciência e Movimento, v. 13, n. 2, p. 145-152, 2005. Disponível em: https://
portalrevistas.ucb.br/index.php/RBCM/article/download/636/647. Acesso em: 30 set. 2019.

ROBERGS, R. A.; ROBERTS, S. O. Princípios fundamentais de fisiologia do exercício para aptidão, desempenho
e saúde. São Paulo: Phorte, 2002.

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2018.
2
Fontes energéticas para o exercício físico

Para iniciarmos uma conversa sobre as fontes de energia usadas durante o exercício físico,
precisamos entender que o corpo humano é capaz de transformar os componentes absorvidos dos
alimentos em energia para ser utilizada durante a realização do exercício. Sabidamente, essas fontes
energéticas estão disponíveis em forma de proteínas, carboidratos e gorduras. Esses macronutrientes
são armazenados, no corpo humano, em reservas para serem utilizados, renovados e transformados
de energia química para energia mecânica. Essa transformação é de extrema importância, pois
devido a ela, o corpo humano consegue executar os movimentos e, consequentemente, o exercício
físico.
Mas, como isso acontece? Os alimentos que ingerimos, durante o processo de alimentação,
são transformados em um composto de energia chamado de trifosfato de adenosina (ATP). Durante
a síntese dos alimentos, o glicogênio hepático e muscular, juntamente à molécula de glicose, produz glicogênio:
polissacarídeo
esse ATP, que servirá como fonte de energia para as células. considerado a
principal reserva de
Neste capítulo abordaremos as diferentes formas do corpo humano utilizar a energia energia rápida do
organismo.
proveniente de determinada via para a realização dos exercícios físicos.

2.1 Sistema ATP-CP (fosfagênio): metabolismo anaeróbico


alático
Para entendermos o sistema fosfagênio (ATP-CP) precisamos, primeiramente, conhecer os
seus componentes. O trifosfato de adenosina (ATP) é um composto que armazena e libera energia
para todos os processos celulares, incluindo para o mecanismo de contração muscular. O ATP não
é a única molécula de energia nas células, mas podemos dizer que é a mais importante (POWERS;
HOWLEY, 2017).
A estrutura molecular do ATP apresenta três componentes: ribose, adenina e três fosfatos
inorgânicos, como mostra a Figura 1. Vale ressaltar que as moléculas de ribose e adenina são
chamadas de molécula de adenosina.
28 Fisiologia do exercício e do esporte

Figura 1 – Trifosfato de adenosina


Trifosfato de adenosina (ATP)

Designua/Shutterstock
Adenina

Grupo fosfato
Ribose

O trifosfato de adenosina é composto por ribose, adenina e três fosfatos inorgânicos

O ATP pode ser gerado a partir do difosfato de adenosina (ADP). A Figura 2 mostra o ciclo
do ATP-ADP ganhando e perdendo energia. Você deve estar se perguntando: como ocorre esse
processo? É muito simples, a energia necessária para ligar o ADP ao P (fosfato) pode ser obtida
por meio da reação anaeróbica ou aeróbica. Com isso, o ATP é decomposto em ADP e P, liberando
energia para ser utilizada nos processos celulares.
É importante sabermos que as moléculas de P, ADP e ATP não são destruídas nesses eventos.
Pelo contrário, as ligações químicas que mantêm os grupos de fosfato juntos são degradadas
para liberar energia, ou a energia é adicionada para reformar a ligação que une o P aos grupos
remanescentes na molécula de adenosina, formando novamente a molécula de ATP.
Figura 2 – Ciclo ATP-ADP
Adenina

Trifosfato

Fosfato
Energia Ribose
absorvida (dos
alimentos)

Energia liberada
Ciclo ATP-ADP (para célula)
Designua/Shutterstock

Fosfato

Adenina Difosfato
Ribose
Fontes energéticas para o exercício físico 29

O sistema energético do fosfagênio, juntamente ao ADP, resulta diretamente na produção de


ATP. Esse sistema constitui a fonte de ATP a ser disponível em maior velocidade para ser utilizada
pelo sistema muscular. O ATP se regenera mais rapidamente quando associado à fosfocreatina
(CP), daí a sigla ATP-CP (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013). Mas, o que isso significa?
Nada mais do que a associação entre a fosfocreatina e o trifosfato de adenosina para gerar energia.
Vale ressaltar ainda que, devido a esse processo, essa reserva de energia é utilizada na prática de
atividade física de alta intensidade e curta duração, pois o sistema fosfagênio disponibiliza uma
quantidade de ATP entre 5,7 e 6,9 kcal.
Powers e Howley (2017) afirmam que a quantidade intracelular de ATP é relativamente
pequena. Com isso, durante a prática de atividade física, as concentrações de ATP nas fibras
musculares diminuem rapidamente e, se os níveis de ATP não forem repostos com rapidez,
ocorrerá declínio na produção de força muscular. Portanto, a fosfocreatina intramuscular oferece
uma via bioenergética simples e rápida de produzir ATP.
No interior das fibras musculares, a enzima ATPase facilita a quebra da molécula de ATP em
ADP e P, resultando em energia útil para as ações musculares. Vale citar também que ocorre outra
reação molecular separada: a enzima creatinoquinase (CK) facilita a decomposição de CP em P e
creatina, resultando em doação de P para o ADP, a fim de formar o ATP.
Essa forma de gerar energia pode proporcionar uma potência muscular máxima durante,
aproximadamente, 10 segundos. Alguns atos esportivos utilizam bastante esse sistema, como: o
chute a gol no futsal ou futebol, a prova de 100 metros rasos no atletismo, o arremesso de peso,
entre outras atividades de curta duração.
A literatura atual nos mostra que as fibras musculares do tipo II, isto é, as fibras de contração
rápida, armazenam, em média, cinco vezes mais fosfocreatina do que ATP. Com isso, na contração
do músculo esquelético, a CP serve como um armazenamento energético das fibras musculares,
oferecendo, assim, energia rapidamente, ajudando na ressíntese do ATP.
Vale ressaltar aqui que a suplementação com creatina aumenta as concentrações de
fosfocreatinas em até 40%, no que se refere às reservas energéticas (VOLEK; DUNCAN;
MAZZETTI, 1999). Com isso, a fim de evitar a fadiga precoce, a suplementação com creatina pode
ser benéfica, pois tende a aumentar a disponibilidade de fosfato creatina e, consequentemente, a
ressíntese creatina fosfato, reduzindo a acideose muscular.
Baseado no que foi exposto até aqui, fica clara a importância de manter constante concentração
de ATP, entendendo que a maior parte das reações do corpo humano depende desse substrato
energético. Pensando somente nos exercícios físicos, a contração do músculo esquelético depende
do nível da concentração de ATP, pois, para que os filamentos contráteis (actina e miosina) se
deslizem uns sobre os outros, é necessária a presença do ATP.
Para compreendermos esse processo mais profundamente, é importante a informação de
que cada quilograma de músculo esquelético contém de 3 a 8 mmol de ATP e quatro à cinco vezes
mais de CP. Para uma pessoa que pesa 70 kg, com uma massa magra de 30 kg, isso representa entre
570 e 690 mmol de fosfato de alta energia.
30 Fisiologia do exercício e do esporte

Assumindo que 20 kg de músculo se tornam ativos durante uma atividade física, a energia
armazenada na forma de fosfagênio consegue acionar uma caminhada rápida por 60 segundos,
uma corrida com ritmo de maratona por 20 a 30 segundos, ou uma corrida com velocidade máxima
por 5 a 8 segundos. Provavelmente, a quantidade desses compostos de alta energia seja consumida
completamente em 20 a 30 segundos de exercício máximo (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Dados da International Association of Athletics Federations mostram que o jamaicano Usain
Bolt, em agosto de 2009, por exemplo, bateu o recorde mundial na prova dos 100 metros rasos
do atletismo; atingiu um tempo de 9,58 segundos com uma velocidade média de 10,44m/s. Três
anos depois, em agosto de 2012, obteve, também, o recorde olímpico com um tempo de 9,63, em
uma velocidade de 10,38m/s. Com isso, é possível perceber que o corredor não consegue manter
a velocidade máxima durante toda a corrida; frequentemente, no fim da corrida, ele começa a
reduzir sua velocidade (IAAF, 2019).
Você deve estar se perguntando: mas e o processo de fadiga? Como ocorre? Quando esses
substratos energéticos cessam, o que ocorre no nosso corpo? Devemos ter muita calma ao abordar
essas questões, mas vamos tentar clarear as suas ideias. Se os substratos forem insuficientes, não
haverá energia gerada para contrair o músculo; assim, a energia gerada pela fosfocreatina é limitada
em um intervalo de tempo. Mas, a literatura atual ressalta a importância do metabolismo anaeróbico
alático poder ir além de 15 segundos. Além disso, ele continua sendo o sistema de geração de
energia mais importante para exercícios com duração de até 30 segundos (FISIOLOGIA, 2013).
Bogdanis et al. (1995) afirma que é extremamente importante o planejamento do exercício
físico. Essa importância está relacionada ao controle de cada estímulo, em cada sessão de treino,
objetivando a preservação do estoque de ATP. Por isso, todo estímulo de treinamento necessita de
um período de descanso para, posteriormente, iniciar outro estímulo.

2.2 Sistema glicolítico: metabolismo anaeróbico lático


O sistema glicolítico é responsável por gerar energia para o músculo poder se contrair. Da
mesma forma que o sistema ATP-CP ou fosfagênio, o sistema glicolítico não utiliza o oxigênio nas
suas reações, por isso é considerado um sistema anaeróbico. Obviamente, você deve estar pensando
que, devido à nomenclatura, falaremos sobre glicose. Exatamente, mais precisamente sobre a
quebra da molécula de glicose, processo chamado de glicólise.
A glicólise é uma série de reações enzimáticas que metabolizam a glicose (KRAEMER;
FLECK; DESCHENES, 2013). Mesmo sem necessitar do oxigênio, esse sistema produz um
composto chamado acetilcoenzima A (acetil-CoA), que pode penetrar na mitocôndria e participar
da respiração aeróbica. Vale ressaltar que isso só é possível se houver quantidades adequadas de
oxigênio disponíveis na célula.
Para ficar mais claro, pensemos que na glicólise há a degradação parcial dos carboidratos.
Nesse processo, acontece a transformação dos carboidratos em compostos de açúcares simples
(monossacarídeos e glicose), com capacidade de trabalhar na ressíntese do ATP, formando, assim,
Fontes energéticas para o exercício físico 31

energia livre para a realização do mecanismo de contração muscular. A glicose é originada na


digestão e síntese dos carboidratos que, por sua vez, são convertidos na forma de glicogênio
armazenado no músculo e no fígado: o glicogênio muscular e hepático.
A glicólise resulta em produção de ATP a partir da degradação da glicose, por meio de
uma série de dez reações químicas que ocorrem no citoplasma da fibra muscular (sarcoplasma).
Ressaltamos que a glicose pode ser obtida tanto das reservas sanguíneas quanto do glicogênio
muscular.
Glicogênese é o processo de síntese do glicogênio armazenado no fígado a partir da glicose,
sendo que o catabolismo desse glicogênio, para a utilização na via anaeróbica, é denominado
glicogenólise. Para realizar sua função, a glicogenólise precisa de algumas enzimas, entre as quais
a principal é a fosforilase, responsável por liberar a glicose a partir do glicogênio (POWERS;
HOWLEY, 2017).
A glicólise anaeróbica rápida para a ressíntese do ATP é considerada uma fonte energética
de reserva. Esse processo se torna ativo quando uma pessoa acelera no início do movimento ou
durante os últimos quilômetros em uma corrida; quando realiza um esforço máximo do início ao
fim durante uma corrida de 440 m ou uma prova de natação de 100 m, por exemplo. Acúmulos de
lactato sanguíneo ocorrem, principalmente, no músculo agonista, durante movimentos máximos lactato: forma ionizada
do ácido láctico,
de 60 a 180 segundos de duração (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017). fabricada durante a
produção de energia
Segundo Kraemer, Fleck e Deschenes (2013), o sistema glicolítico também pode ser chamado anaeróbica.

agonista: todo
de sistema de energia do ácido lático, pois nesse processo há a formação do lactato. Isso quer dizer músculo que
que, no sistema glicolítico, a produção do trifosfato de adenosina segue uma relação de 1:1 com o dá origem a um
movimento; músculo
ácido lático, ou seja, para cada ATP formado, é necessário 1 ácido lático. principal.

Porém, vale ressaltar que o lactato sanguíneo não se acumula em todos os níveis de atividade
física. Durante a atividade leve e moderada – até 50% da capacidade aeróbica –, a formação de
lactato sanguíneo é igual à sua eliminação. Com isso, a energia gerada proporciona o “combustível”
predominante (ATP) para a atividade muscular.
Todo lactato, formado em uma parte de um músculo ativo, acaba sendo oxidado pelas
células musculares com alta capacidade oxidativa no mesmo músculo ou em músculos adjacentes
menos ativos, como coração e outros tecidos. Quando a oxidação do lactato é igual à sua produção,
o nível sanguíneo de lactato permanece estável, mesmo que ocorram aumentos na intensidade do
movimento e no consumo de oxigênio.
Mcardle, Katch e Katch (2017) ressaltam, ainda, que enquanto o lactato é formado no
músculo em repouso e durante a atividade física moderada, cerca de 70% do lactato é oxidado, 20%
é convertido em glicose no músculo e no fígado, e 10% é convertido em aminoácidos. Portanto,
não há acúmulo efetivo de lactato; o lactato sanguíneo se mantém estável. O acúmulo de lactato
sanguíneo ocorre somente quando sua diminuição por oxidação ou conversão do substrato não
acompanha sua produção. Quando a intensidade do exercício aumenta, o acúmulo e a produção
de lactato também aumentam.
32 Fisiologia do exercício e do esporte

Durante a atividade física máxima, há um aumento na produção de lactato sanguíneo,


principalmente com a atividade aeróbica específica sprint-potência. Por outro lado, ela diminui
quando o exercício termina. Para que você entenda melhor, os atletas de sprint-potência alcançam
níveis sanguíneos de lactato 20 a 30% mais altos do que indivíduos não treinados, durante um
exercício máximo de curta duração.
Quando o indivíduo é submetido a atividades físicas intensas, os aspectos relacionados à
tolerância ao lactato procuram estimular a sua produção, ou seja, o lactato é jogado em grandes
proporções na corrente sanguínea, induzindo ao melhor desempenho. Pode-se dizer, portanto, que
a curva de lactato em relação à intensidade do exercício se altera (ROBERGS; ROBERTS, 2002).

2.3 Sistema oxidativo: metabolismo aeróbico


As reações glicolíticas produzem, relativamente, poucas moléculas de ATP. Consequentemente,
o metabolismo aeróbico fornece quase toda a transferência de energia quando uma atividade
física intensa prossegue por mais de alguns minutos. Com isso, precisamos falar sobre o sistema
oxidativo, o mais complexo sistema de produção de energia.
Para iniciar a nossa conversa sobre esse sistema, precisamos ressaltar que esse é o único
sistema de geração de energia que utiliza o oxigênio como principal elemento para catabolizar os
substratos envolvidos no processo de degradação, por meio da respiração celular. Mas, afinal, o
que significa respiração celular? É a atuação do oxigênio que objetiva a formação, ou ressíntese, de
moléculas de energia envolvidas nos exercícios físicos.
O sistema aeróbico é a principal via para a ressíntese de ATP em exercícios de duração
prolongada (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017). Vale ressaltar aqui que esse processo acontece
nas mitocôndrias, organela que estudamos no Capítulo 1, com a presença do oxigênio.
A literatura científica atual nos mostra que, quando nos referimos aos parâmetros energéticos,
aqueles exercícios de caráter continuado entre 60 e 180 segundos são suportados por dois sistemas
combinados: o sistema oxidativo e o glicolítico. Isso significa que metade do ATP será gerado
no interior da mitocôndria e o restante fora dela. Nesse caso específico, dá-se o nome de glicólise
aeróbica. Por outro lado, quando pensamos em exercícios físicos acima de 180 segundos, a geração
do trifosfato de adenosina é suportada pelas mitocôndrias ressaltando, assim, o metabolismo
oxidativo ou sistema aeróbico.
Com isso, os exercícios físicos superiores a 180 segundos necessitam da utilização do
oxigênio nos músculos responsáveis pela atividade proposta. Cerca de 75% do lactato obtido
pela não presença de oxigênio na via é removido no processo de oxidação, e os 25% restantes
são transformados pela gliconeogênese, em um processo chamado ciclo de Cori. O ciclo de Cori
nada mais é do que a conversão da glicose em lactato, o qual é produzido no músculo durante um
período sem oxigênio.
Fontes energéticas para o exercício físico 33

Figura 3 – Ciclo de Cori

IESDE Brasil S/A


Lactato Glicogênio
ATP

Lactato Glicose
sanguíneo sanguínea

Lactato Glicose
ATP

Fonte: Elaborada pelo autor.

As reações celulares que envolvem o oxigênio, isto é, as reações oxidativas, têm a capacidade
de permitir, principalmente, a continuidade do catabolismo. Essa continuidade é proveniente do
piruvato: composto
piruvato, produzido pelo sistema glicolítico, além dos lipídios e das proteínas. orgânico originado ao
fim da glicólise.
É importante ressaltar que o piruvato é produzido pela combinação entre enzima e o
composto acetil-coenzima A (acetil-coA). Esse composto tem ação direta no ciclo de Krebs, o
qual é uma série completa de 11 reações químicas. A principal função do ciclo de Krebs é remover
hidrogênio e elétrons dos substratos, em um processo chamado de oxidação, além de fabricar
alguns ATPs (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Para exemplificar de maneira mais coesa e compreendermos esses processos na prática, é
importante salientar que a degradação de glicose pode produzir 38 ATPs, e mais de 100 outras
moléculas, pela ressíntese dos ácidos graxos em um ciclo completo (IDE, 2010). Com isso, fica
claro que essa forma de geração de energia suprirá atividades esportivas de longa duração, como
corridas de rua de longa distância. Devido ao avanço científico nessa área específica, é sabido que
a maioria dos atletas que participam dessas provas mostra uma maior predominância de fibras do
tipo I (alta predominância de metabolismo aeróbico).
Ainda nesse sentido, devemos ter claro que o treinamento de atletas é composto de
períodos, e cada período deve ter um objetivo específico acerca da prática esportiva em questão,
sempre levando em consideração os metabolismos glicolítico e anaeróbico; mas, a utilização do
metabolismo aeróbico deve ser estimulada, também, em momentos específicos. O que precisamos
34 Fisiologia do exercício e do esporte

entender mais minuciosamente é que tudo isso objetiva favorecer a recuperação mais enfática e o
cessamento de ATP e das demais substâncias envolvidas durante o esforço, para a realização de um
novo gesto esportivo.
Desde o início da abordagem deste capítulo, com foco nas fontes energéticas para o exercício,
trouxemos explanações individualizadas de cada sistema gerador de energia para a prática de
atividade física. Porém, precisamos entender que os sistemas ATP-CP, glicolítico e oxidativo
trabalham de maneira conjunta na produção de energia, bem como na prática de movimentos
musculares e na interrupção desse movimento, a qual é provocada pela menor disponibilidade de
ATP e relacionada à baixa quantidade dessa molécula ressintetizada.
Por isso, é de extrema importância, no estudo da bioenergética, compreender o funcionamento
conjunto dos sistemas que o corpo utiliza para produzir energia. Esse entendimento será importante
no sentido de planejar e prescrever um treino em diferentes etapas da vida do atleta.
Vamos recapitular para entender melhor. O metabolismo energético é composto pelos
processos de liberação e armazenamento de energia dos nutrientes, eventos realizados por meio de
reações químicas distintas. Para que haja a contração muscular e, consequentemente, a prática de
exercício físico, precisamos hidrolisar a molécula de ATP; porém, a concentração de ATP é muito
baixa nos músculos, sendo suficiente apenas para suprir atividades por poucos segundos.
Sendo assim, quando a duração do exercício aumenta, obrigatoriamente necessitamos mais
da ressíntese do ATP. Com isso, o fornecimento da ressíntese do ATP depende da duração e da
intensidade geral da prática esportiva. Embora exista uma predominância de uma determinada
fonte de energia sobre determinado gesto esportivo, os sistemas energéticos agem simultaneamente.
Vamos exemplificar para facilitar o entendimento: pensemos em provas de atletismo, 100
metros rasos, 800 metros rasos e 1.500 metros rasos. Na corrida de 100 metros rasos, que é uma
corrida de extrema velocidade, a produção de ATP pela degradação da fosfocreatina representa
80%; pela glicólise anaeróbica, 15%; e os 5% restantes referem-se ao sistema oxidativo. Por outro
lado, na corrida de 800 metros há um equilíbrio, cada sistema de geração de energia representa
33,3%. Já na corrida de 1.500 metros, o sistema oxidativo representa 67% da energia gerada, a
glicólise representa 23% e os 10% restantes se referem ao sistema ATP-CP. (FISIOLOGIA, 2013).
Assim, podemos concluir que todos os sistemas estão sendo ativados no início do exercício
físico, sendo que a sua predominância será determinada pela duração e intensidade do exercício.
Observando ainda a contribuição energética dos sistemas estudados, o sistema ATP-CP representa a
principal fonte de energia para exercícios de intensidade máxima em até 10 segundos. Obviamente,
dependente da contribuição da fosfocreatina para gerar energia.
Após esse período, a glicólise assume o protagonismo nos esforços máximos em até 90
segundos, e o sistema oxidativo garante taxas superiores de 70% do gasto energético nas atividades
superiores a 90 segundos.
Fontes energéticas para o exercício físico 35

Considerações finais
Vimos neste capítulo todos os pontos mais importantes no que se refere às fontes de energia
para o exercício. Com isso, esperamos ter esclarecido que as células musculares armazenam
quantidades limitadas de ATP.
Para a realização da atividade física é necessário um suprimento constante do trifosfato
de adenosina para geração de energia celular e, com isso, a promoção da contração muscular.
Logicamente, a célula necessita de uma ou mais vias metabólicas capazes de gerar essa energia
necessária. Essas vias são: geração de ATP pela fosfocreatina; geração do ATP pela degradação
da glicose ou glicogênio (glicólise); e, por último, a geração oxidativa do ATP (com a presença do
oxigênio).
A formação de ATP pelas vias de CP e glicólise não envolve o uso de oxigênio; essas vias são
denominadas vias anaeróbicas. A formação oxidativa de ATP pelo uso de oxigênio é denominada
metabolismo aeróbico.

Ampliando seus conhecimentos


• KRAEMER, W. J.; FLECK, S. J.; DESCHENES, M. R. Bioenergética e satisfação da
demanda metabólica por energia. In: KRAEMER, W. J.; FLECK, S. J.; DESCHENES, M.
R. Fisiologia do exercício: teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.
Para ampliar seus conhecimentos acerca de bioenergética e do metabolismo, sugerimos
a leitura do segundo capítulo do livro. Essa leitura esclarecerá a abordagem do corpo
humano sobre os processos metabólicos inerentes à produção de energia, para suprir a
prática de atividade física.

• POWERS, S. K; HOWLEY, E. T. Fisiologia do exercício. Teoria e aplicação ao condicionamento


e ao desempenho. 9. ed. São Paulo: Manole, 2017.

Como este capítulo remete à bioenergética de modo geral, indicamos a leitura do livro
de Powers e Howley, principalmente no que se refere ao ciclo de Krebs e ao processo
de glicólise, a fim de aprofundarmos o entendimento desses processos importantíssimos
inerentes à bioenergética.

• URSO, R. P. et al. Determinação dos metabolismos lático e alático da capacidade anaeróbica


por meio do consumo de oxigênio. Rev. Bras. de Cineantropometria e Desempenho
Humano, v. 15, n. 5, 2013. p. 616-627. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbcdh/
v15n5/11.pdf. Acesso em: 28 ago. 2019.
Para que possamos compreender de maneira mais coesa o conteúdo abordado, sugerimos
a leitura desse artigo científico, que trata dos metabolismos lático e alático da capacidade
aeróbica, por meio do consumo do oxigênio.
36 Fisiologia do exercício e do esporte

Atividades
1. O sistema fosfagênio, também conhecido como anaeróbio alático ou sistema ATP-CP,
representa uma fonte de energia rápida para o trabalho muscular envolvido na atividade
física. Considerando os conhecimentos adquiridos na leitura deste capítulo, responda: qual
a real importância da fosfocreatina (CP) para essa forma de geração de energia?

2. A imagem a seguir mostra um gráfico da demanda energética dos diferentes tipos de


exercício. Diante do que você aprendeu com o estudo deste capítulo, como poderia explicar
este gráfico?

100 Creatina-fosfato
Porcentagem de contribuição de energia

Glicolítica
75 Respiração mitocondrial

50

25

0
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4

Tempo (min)

Fonte: Robergs e Roberts, 2002, p. 111.

3. A adenosina trifosfatase (ATPase) é uma enzima específica que objetiva a quebra do ATP,
transformando-o em uma molécula de adenosina difosfato (ADP). Essa reação ocorre no
sistema ATP-CP e essa quebra gera uma energia aproximada entre 7,3 e 7,6 kcal/mol. Diante
disso, qual é a importância da quebra do ATP em ADP para o sistema ATP-CP?

Referências
BOGDANIS, G. C. et al. Recovery of power output and muscle metabolites following 30s of maximal sprint
cycling in man. Journal of Physiology, n. 482, pt. 2, p. 467-480, 1995.

FISIOLOGIA do exercício. Brasília: Fundação Vale; Unesco, 2013. Disponível em: https://docplayer.com.
br/7060572-Fisiologia-do-exercicio.html. Acesso em: 30 ago. 2019.

IDE, B. N.; LOPES, C. R.; SARRAIPA, M. F. Fisiologia do treinamento esportivo: força, potência, velocidade,
resistência, periodização e habilidades psicológicas. São Paulo: Phorte, 2010.

IAAF – International Association of Athletics Federations. Usain Bolt: athlete profile. Disponível em: https://
www.iaaf.org/athletes/jamaica/usain-bolt-184599. Acesso em: 19 set. 2019.

KRAEMER, W. J.; FLECK, S. J.; DESCHENES, M. R. Fisiologia do exercício: teoria e prática. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2013.
Fontes energéticas para o exercício físico 37

MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho
humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.

POWERS, S. K.; HOWLEY, E. T. Fisiologia do exercício: teoria e aplicação ao condicionamento e ao


desempenho. 9. ed. São Paulo: Manole, 2017.

ROBERGS, R. A.; ROBERTS, S. O. Princípios fundamentais de fisiologia do exercício para aptidão, desempenho
e saúde. São Paulo: Phorte, 2002.

VOLEK, J. S., DUNCAN, N. D., MAZZETTI, S. A. et al. Performance and muscle fiber adaptations to
creatine supplementation and heavy resistance training. Medicine and Science in Sport and Exercise, v. 31, n.
8, p. 1147-1156, 1999.
3
Sistema neuromuscular e exercício físico

Chegamos a um ponto de extrema importância para os nossos estudos. Obviamente,


o estudo da fisiologia do exercício necessita bastante do entendimento coeso sobre o sistema
neuromuscular, afinal, é o casamento do sistema nervoso com o sistema muscular que gera o
movimento humano e, consequentemente, o gesto esportivo. Mas o que significa esse casamento?
O sistema neuromuscular é um macrossistema que envolve mecanismos tanto do sistema nervoso
quanto do sistema muscular.
Para que você entenda, minuciosamente, o funcionamento do sistema neuromuscular,
precisamos compreender que os movimentos do corpo humano são oriundos do controle e da
regulação do sistema nervoso central (SNC), por meio da liberação de neurotransmissores, que são
produzidos pelos componentes do próprio sistema nervoso. Vale ressaltar ainda que a sinalização
(comunicação) do SNC é realizada pelas células do tecido nervoso, chamadas de neurônios. Cada
célula nervosa se liga a um número de células musculares (fibras musculares); essa combinação é
chamada de unidade motora (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Powers e Howley (2017) ressaltam que, para haver a contração muscular (contração das
fibras musculares), é necessária a combinação entre impulsos nervosos de caráter excitatório
e inibitório. Eles transmitem estímulos continuamente aos neurônios e têm a capacidade de
transmitir o potencial de ação para a excitação. Com isso, os impulsos inibitórios são excedidos
pelos estímulos excitatórios, levando, assim, ao recrutamento das unidades motoras e gerando a
contração das fibras musculares.
Vale citar também que durante o exercício físico há um aumento na solicitação do sistema
muscular, que está relacionado à melhora da sincronização das unidades motoras. Isso acontece,
principalmente, para obtenção da maior velocidade de contração, além do aumento da capacidade
do músculo no processo de contração muscular. No entanto, esse recrutamento depende do tipo de
exercício, porque as unidades motoras são solicitadas separadamente em cada estímulo (STEWART
et al., 2011).

3.1 Mecanismos neuromusculares


Para conhecermos completamente a unidade motora, a fim de entender os mecanismos
neuromusculares, observe a Figura 1. Trata-se de uma ilustração de um neurônio motor com
seus dendritos e axônios. Ao se aproximar das fibras musculares, o axônio do neurônio motor se
ramifica, na intenção de formar sinapses com a fibra muscular. Antes de formar as sinapses, esses
axônios se subdividem em botões sinápticos, que formam a unidade motora.
40 Fisiologia do exercício e do esporte

Figura 1 – Unidade motora (neurônio motor + fibra muscular)

joshya/Shutterstock
dendrito músculo
esquelético
axônio

núcleo

bainha de mielina
junção
neuromuscular

Os neurônios têm a capacidade de receber informações advindas de outras células nervosas.


Essas informações chegam pelos dendritos (porção receptora) e pelo corpo celular, induzindo
a despolarização da membrana plasmática até alcançar o limiar elétrico, a fim de disparar um
potencial de ação. O axônio, por sua vez, é considerado a porção condutora de um neurônio.
Vale relembrar que o axônio de um neurônio tem tamanho variado, dependendo da sua
função e, principalmente, de sua localização. Os botões terminais dos neurônios são constituídos
por vesículas sinápticas que armazenam os neurotransmissores, os quais são os grandes mediadores
da placa motora, pois levam a informação de um neurônio para outro ou para uma fibra muscular
(PITHON-CURI, 2013).
Observe a Figura 2, para que possamos entender, também, os tipos de neurônios. A figura
mostra que, de acordo com as suas propriedades funcionais, os neurônios são classificados em três
tipos; são eles:
• neurônios sensoriais: têm a função de levar informação para o SNC;
• neurônios motores: conduzem a informação do SNC para os órgãos efetores;
• interneurônios: fazem a ligação entre um neurônio sensorial e o neurônio motor.
Sistema neuromuscular e exercício físico 41

Figura 2 – Unidade motora com foco nos tipos de neurônios


Neurônio sensitivo

IESDE Brasil S/A


Substância cinzenta da medula espinal

Neurônio supraespinal
Interneurônio
Neurônio motor

Unidade Unidade motora


motora grande pequena

Fibras
musculares

Quando nos referimos aos mecanismos neuromusculares, precisamos ter ciência de alguns
pontos específicos desse conteúdo. Para que o músculo se contraia por estímulo do SNC, é
necessário que ocorra uma série de eventos a nível neuromuscular. Antes de entendermos esses
eventos, precisamos conhecer dois componentes de extrema importância para a realização de
movimentos: o fuso muscular e o órgão tendinoso de Golgi (OTG).
O fuso muscular é um receptor localizado nos músculos capaz de reconhecer/controlar
o comprimento desse músculo específico. De modo geral, ele monitora qualquer alteração no
comprimento e na flexibilidade, fornecendo uma via de transmissão para a medula espinal,
que responde instantaneamente. Essa resposta advinda da medula é transformada em excitação
das células musculares. Além disso, permite que um músculo no estado de repouso permaneça
contraído. Mas como um músculo em repouso permanece contraído? Essa contração se chama
tônus muscular e representa um leve estado de contração do músculo em repouso (MCARDLE;
KATCH; KATCH, 2017).
Já sabemos que o fuso muscular está localizado no músculo. A partir dessa analogia com a
nomenclatura, podemos dizer que o OTG está localizado nos tendões? Sim, o OTG está localizado
na junção entre as fibras musculares e os tendões. O órgão tendinoso de Golgi é uma terminação
nervosa situada no interior de fibras de colágeno, as quais possuem a capacidade de responder
instantaneamente a estímulos da flexibilidade, comprimento e tensão do músculo (POWERS;
HOWLEY, 2017).
42 Fisiologia do exercício e do esporte

Mas qual é a real necessidade de o corpo humano possuir esses componentes relacionados
ao sistema neuromuscular? Além de outras funções relacionadas ao movimento humano, que
veremos a seguir, esses componentes servem como um fator de proteção para o seu órgão específico
(músculos e tendões). Por exemplo: quando há uma tensão acima do normal, os receptores do órgão
tendinoso de Golgi geram potenciais de ação para as fibras aferentes dos neurônios sensitivos/
sensoriais e daí para a membrana plasmática da fibra muscular (sarcolema). A partir disso, é
gerada uma resposta inibitória nos neurônios motores, que são responsáveis por relaxar o músculo
envolvido, aliviando, assim, a tensão em excesso (KRAEMER, 2013).
Baseado em tudo o que foi exposto, fica evidente que precisamos falar de contração
muscular, pois é um evento primordial do macrossistema neuromuscular. Pois bem, a base da
contração muscular é a unidade motora, e nós já sabemos que a unidade motora é uma junção
neuromuscular, ou seja, uma sinapse entre um neurônio e uma fibra muscular. Mas o que ocorre a
nível celular e molecular para que o músculo se contraia e, consequentemente, haja o movimento
humano e o gesto esportivo?
Para responder a essa pergunta, observemos a Figura 3. A imagem ilustrativa de uma junção
neuromuscular mostra a sinapse entre o botão terminal do axônio e a membrana plasmática da
fibra muscular. Essa sinapse química conta com três componentes: a região pré-sináptica, que
fica na terminação nervosa; a fenda sináptica; e a região pós-sináptica (KRAEMER, 2013). Nós já
sabemos que a fenda sináptica é o espaço entre as membranas pré e pós-sináptica.
A figura também nos mostra a vesícula sináptica, composta por moléculas de acetilcolina
(ACh), o neurotransmissor envolvido na contração muscular. Nesse caso, se a célula pré-sináptica
libera ACh, a célula pós-sináptica necessita de receptores específicos para ACh. A liberação da
ACh acontece quando o potencial de ação chega no botão terminal, ativando, assim, os canais de
cálcio. Vale ressaltar que esses canais são dependentes de voltagem, isto é, abrem-se por estímulos
elétricos de voltagem (POWERS; HOWLEY, 2017).
Com isso, o cálcio do meio extracelular flui para o interior do botão terminal do axônio,
provocando uma afinidade/fusão entre as vesículas sinápticas e a membrana pré-sináptica,
fazendo que a ACh seja liberada por exocitose na fenda sináptica. Logo após, a ACh se liga aos
receptores colinérgicos – tipo de receptores ativados por ligantes –, promovendo a despolarização
do sarcolema da fibra muscular, propagando, assim, o potencial de ação da fibra a fim de gerar a
contração muscular (PITHON-CURI, 2013).
E o que acontece após a ligação da ACh com o seu receptor? Ocorre a ação da acetilcolinesterase
(AChE), enzima que possui a capacidade de finalizar cada ciclo de transmissão sináptica quebrando
a ACh em duas moléculas: ácido acético e colina. Isso é importante, pois promove o início de
um novo ciclo de despolarização. Vale ressaltar ainda que a ação da AChE promove a queda da
concentração de ACh na fenda sináptica, causando o fechamento dos poros dos receptores da ACh
(IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Sistema neuromuscular e exercício físico 43

Figura 3 – Junção neuromuscular no processo de contração muscular

IESDE Brasil S/A


PA Vesícula sináptica
Canal de Ca2+

ACh

Ca2+

Acetilcolinesterase

Canais de Na+ Receptor colinérgico

Como nós já conhecemos os principais componentes de uma unidade motora, bem como
os mecanismos inerentes ao sistema neuromuscular, não poderíamos deixar de reunir essas
informações e exemplificar, facilitando, assim, o entendimento geral dos mecanismos desse
macrossistema. Com isso, precisamos falar de propriocepção. Mas o que seria propriocepção?
Pithon-Curi (2013) afirma que propriocepção objetiva estabelecer a relação do corpo com
o espaço em torno de si, ou seja, é uma modalidade sensorial responsável por captar informações
do aparelho locomotor. Antes de o corpo iniciar um movimento, as aferências proprioceptivas
informam a posição do corpo humano ao SNC, com o objetivo do próprio SNC entender em
que posição deve partir o movimento. Logo, quando está acontecendo o movimento, o músculo
também produz informações a nível de propriocepção que se integram ao SNC, tornando possível
corrigir um erro ou imprevisto na execução do movimento planejado. Por exemplo: pense que
você está caminhando em um terreno com uma falha no nivelamento; normalmente, quando você
percebe a falha, rapidamente corrige o movimento da marcha para evitar a queda. Isso acontece
porque enquanto você está caminhando, o plano motor é executado normalmente, porém, quando
você tropeça, a informação da posição corporal é rapidamente utilizada pelo SNC para restabelecer
o equilíbrio corporal. Esse fato mostra claramente que há o registro proprioceptivo de caráter
involuntário para controle corporal.
44 Fisiologia do exercício e do esporte

O mecanismo de propriocepção é composto por um componente sensorial aferente repleto


de proprioceptores, como o fuso muscular e o órgão tendinoso de Golgi, que já conhecemos no
início deste capítulo. As características morfofuncionais admitem que cada receptor monitore
estímulos diferentes. O fuso muscular detecta o comprimento do músculo, além da velocidade
do movimento gerado. Já o órgão tendinoso de Golgi monitora a força de contração muscular e
amplitude (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Para finalizar esta conversa sobre os mecanismos neuromusculares, vamos entender de uma
forma sucinta a fadiga muscular. Powers e Howley (2017) explicam que a fadiga muscular é um
evento que ocorre devido à incapacidade do músculo de sustentar a força máxima de contração,
mesmo tendo estímulos de contração. O que você precisa entender é que a fadiga muscular tem um
caráter de proteção para o músculo contra lesões musculares.
Mas como ocorre esse fenômeno no músculo? Ocorre devido a alterações do sistema
nervoso, junção neuromuscular e até alterações metabólicas e morfológicas na célula muscular.
Vale ressaltar que a fadiga pode ocorrer por vários fatores, como o estado nutricional do indivíduo,
a duração e intensidade do exercício físico, além dos tipos de unidades (KRAEMER, 2013).
Ainda nesse sentido, Pithon-Curi (2013) afirma que há duas classificações da fadiga
muscular: a fadiga periférica e a central. A fadiga central envolve especificamente o sistema
nervoso, já a fadiga periférica acontece a nível da junção neuromuscular; mas vale ressaltar que o
processo de fadiga é resultado de uma interação entre fatores periféricos e centrais.
A literatura atual mostra que a fadiga central acontece mais em exercícios de longa
duração, como corrida, ciclismo etc. Já a fadiga periférica é mais acometida em exercícios com
intensidade muito maior e de curta duração. Ao iniciar e durante os exercícios de longa duração,
há a predominância da fadiga central, porém, com o término do exercício, os fatores periféricos
da fadiga agem nos níveis morfológicos e metabólicos do músculo, como é o caso da depleção do
glicogênio.

3.2 Ações musculares


Como nós já entendemos os mecanismos neuromusculares, chegou a hora de
compreendermos a complexidade das ações musculares. Obviamente, as bases da ação muscular
são a contração e o relaxamento do músculo esquelético.
Powers e Howley (2017) afirmam que, durante a realização de exercícios físicos, a resistência
do músculo faz com que o sistema nervoso, mais precisamente o encéfalo, recrute as unidades
motoras a fim de produzir a tensão do músculo inerente à atividade proposta. Como consequência
dessa comunicação entre o sistema nervoso e o muscular, há a produção de uma força muscular
sobre as articulações. Essa força pode ser suficiente ou não para gerar o movimento, dependendo
da sobrecarga em destaque.
Antes de aprofundarmos as ações musculares, vamos recapitular alguns pontos
importantíssimos no processo de contração muscular. Na Figura 4, é possível observar o que
Sistema neuromuscular e exercício físico 45

acontece a nível celular no mecanismo de contração do músculo. Sabemos que o neurotransmissor


responsável pela contração do músculo é a acetilcolina (ACh) e que essa molécula está armazenada
nas vesículas sinápticas localizadas no botão terminal do axônio. Pois bem, para facilitar a nossa
revisão, vamos enumerar os eventos que acontecem nesse processo (TORTORA, 2018):
1. Liberação da ACh.
2. Ativação dos receptores de ACh.
3. Geração do potencial de ação muscular.
4. Término da atividade da ACh.
Pithon-Curi (2013) afirma que a chegada do impulso nervoso nos botões terminais
sinápticos faz com que muitas vesículas sinápticas sofram exocitose – liberação do material para
o meio extracelular – e durante esse processo as vesículas sinápticas fundem-se com a membrana
plasmática do neurônio motor, liberando ACh na fenda sináptica. Após ser liberada, a ACh se
difunde através da fenda sináptica, entre o neurônio motor e a placa motora, fixando-se em seus
receptores. Com essa fixação, canais iônicos específicos serão abertos, a fim de que pequenos
cátions, especialmente o cálcio, fluam através da membrana.
Com a entrada de cátions específicos na fibra muscular, a membrana plasmática se
despolariza, gerando o potencial de ação muscular. Vale ressaltar que cada impulso nervoso,
normalmente, produz um potencial de ação muscular que se propaga ao longo do sarcolema pelo
sistema de túbulos T. Além disso, esse evento faz com que o retículo sarcoplasmático libere seu
Ca+ armazenado no sarcoplasma e a fibra muscular, subsequentemente, contraia-se (KRAEMER,
2013).
Mcardle, Katch e Katch (2017) ressaltam, ainda, que o efeito da ligação da ACh é temporário,
porque ela é rapidamente decomposta por uma enzima chamada de acetilcolinesterase (AChE),
que está presa à matriz extracelular da fenda sináptica e tem a função de quebrar a ACh em ácido
acético e colina, produtos que não ativam o receptor da ACh.
Para criar mais coerência na nossa recapitulação sobre contração muscular, vamos abordar os
eventos que acontecem dentro da fibra muscular, enumerando-os (TORTORA, 2018):
1. Hidrólise do ATP.
2. Fixação da miosina à actina, formando as ligações transversas.
3. Movimento de força.
4. Separação da miosina da actina.
É importante ressaltar que na cabeça da miosina há um sítio de ligação de ATP e uma ATPase
(enzima que hidrolisa o ATP em ADP). Essa reação de hidrólise reorienta e energiza a cabeça de
miosina. Tortora (2018) descreve os mecanismos fisiológicos com base nesse ponto de partida.
Assim, nesse sítio de ligação se formarão as ligações transversas, ponto exato do encontro da
cabeça energizada da miosina com a actina. Esse evento faz com que o radical fosfato, previamente
hidrolisado, seja liberado.
46 Fisiologia do exercício e do esporte

Nesse momento específico, o movimento de força é iniciado e tende a girar a ligação


transversa, fazendo com que os filamentos deslizem uns sobre os outros na direção do centro do
sarcômero. Ao final desse movimento, a ligação transversa permanece fixada à actina até fixar
outra molécula de ATP. Com isso, à medida que o ATP se prende ao sítio de ligação de ATP, na
cabeça da miosina, esta se solta da actina (MCARDLE, 2017).
Vale ressaltar, ainda, que o ciclo de contração se repete quando a ATPase hidrolisa a molécula
recém-ligada do ATP e se prorroga enquanto o ATP estiver disponível e o nível de Ca2 próximo do
filamento fino for suficientemente alto (PITHON-CURI, 2013).
Figura 4 – Mecanismo de contração muscular

Studio BKK/Shutterstock
sangue

actina tropomiosina

CA2+
período de contração

miosina
troponina

Impulsos nervosos desencadeiam uma


reação bioquímica que faz com que a
miosina se atenha à actina.

Diante de tudo o que foi exposto em relação às ações musculares, precisamos entender
que elas dependem do grau do estímulo e, principalmente, da força desenvolvida pelo músculo
diante da resistência externa (sobrecarga). Ainda nesse sentido, as ações musculares podem ser
classificadas em três tipos:
1. contração concêntrica;
2. contração excêntrica;
3. contração isométrica.
Para entendermos de uma forma geral as ações musculares do músculo esquelético, observe
a Figura 5. Na imagem ilustrativa, é possível visualizar os três tipos de contração.
Sistema neuromuscular e exercício físico 47

Figura 5 – Tipos de contração muscular

contração contração
contração

VectorMine/Shutterstock
excêntrica isométrica
concêntrica
o músculo se contrai, mas não
diminui seu comprimento

movimento

sem movimento

A ação muscular concêntrica ocorre quando um músculo esquelético produz uma força
maior que do que a sobrecarga (resistência externa), com o objetivo de encurtar o seu comprimento.
Vale ressaltar ainda que esse encurtamento é promovido pelo deslizamento das moléculas de actina
e miosina (KRAEMER, 2013).
Já a contração muscular excêntrica possui uma característica típica. McArdle (2017)
afirma que ela também pode ser designada como alongamento ativo, porque a força produzida
pelo músculo é menor do que a sobrecarga, promovendo, assim, o alongamento do músculo. Em
relação aos filamentos de actina e miosina, eles se deslizam como na contração concêntrica? A
resposta é sim, porém, com uma diferença: o deslizamento ocorre na direção inversa, no sentido
do alongamento do músculo envolvido.
Por fim, mas não menos importante, precisamos falar sobre a contração isométrica. A ação
muscular de caráter isométrico ocorre quando a força produzida pelo músculo é exatamente igual
à sobrecarga. Mas se a força do músculo é igual à sobrecarga, significa que não há movimento?
Sim, a contração isométrica possui essa característica, há uma tensão muscular, porém não há
movimento articular. E com relação aos filamentos de actina e miosina, o que acontece? Nesse
caso, há a formação das ligações transversas, porém não há o deslizamento, o que reforça a ideia de
contração muscular sem movimento (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Pois bem, já entendemos todos os processos relacionados ao sistema neuromuscular. Assim,
chegamos a um ponto de extrema importância para este capítulo, que é a resposta fisiológica acerca
do exercício físico.
48 Fisiologia do exercício e do esporte

3.3 Respostas fisiológicas do exercício físico


Para iniciarmos o diálogo sobre as respostas fisiológicas do exercício físico, precisamos
compreender, de uma forma sucinta, que o exercício promove alterações importantes no sistema
nervoso e muscular, e é nessas alterações que focaremos. Podemos citar que o exercício aumenta
a complexidade e a densidade dendrítica, entendendo que o dendrito é a porção receptora
do neurônio, causando uma melhor atividade neuronal e, consequentemente, uma melhor
comunicação no sistema neuromuscular (POWERS; HOWLEY, 2017). Além disso, Pithon-Curi
(2013) afirma que o treino de velocidade, por exemplo, pode aumentar a velocidade de condução
neuronal.
Podemos dizer também que o atleta treinado possui a capacidade de estimular um maior
número de unidades motoras de um músculo em especial, bem como de gerar a contração muscular
mais bem controlada. McArdle (2017) intitula esse evento coordenação muscular. Além disso, os
neurônios motores, quando estimulados cronicamente, como é o caso de um atleta que treina
regulamente, adaptam-se, fornecendo alguns benefícios à atividade neuronal, como o aumento na
terminação nervosa, que determina o número de fibras musculares inervadas por esse neurônio
em destaque (PITHON-CURI, 2013).
É importante ressaltar que, além das alterações na fibra muscular, o exercício físico crônico
estimula o aumento da atividade da acetilcolinesterase, além da quantidade de receptores pra ACh,
fazendo que com melhore a comunicação neuromuscular, corroborando o rendimento da prática
esportiva (KRAEMER, 2013).
A literatura atual vem se debruçando em estudos científicos, a fim de fortalecer a ideia
dos benefícios da prática de atividades físicas, principalmente a prática regular. As pesquisas
já mostram que o treinamento de resistência provoca adaptações fisiológicas benéficas no que
se refere ao aumento da força muscular. Além disso, evidências mais recentes comprovam que
o treinamento de resistência altera, também, o modo como o músculo é recrutado pelo sistema
nervoso central, sugerindo, assim, que ele também sofra adaptações benéficas relacionadas
ao ganho de força muscular. Isso fortalece cada vez mais a evidência de que o treinamento de
resistência é corroborado com a adaptação neural (PITHON-CURI, 2013).
Por outro lado, nos exercícios que objetivam o ganho de força e potência muscular,
ocorre alteração da ATPase, relacionada com os componentes estruturais da actina e miosina e,
consequentemente, a função de contração das fibras musculares. A principal resposta acerca desse
processo é uma melhora na velocidade da contração muscular, que pode favorecer na demanda de
especificidade de cada gesto esportivo (BOGDANIS, 2012).
Vale citar também que os exercícios de resistência provocam um aumento no número de
vasos sanguíneos que irrigam o músculo envolvido, aumentando, consequentemente, a densidade
desse vaso ao redor da fibra muscular. Esse processo, obviamente, está relacionado a uma melhor
circulação sanguínea, lembrando que no sangue é transportado o oxigênio, que serve como
substrato energético, como já vimos anteriormente, provocando, assim, mais energia para gerar a
contração muscular (POWERS; HOWLEY, 2017).
Sistema neuromuscular e exercício físico 49

Para finalizar nossos estudos sobre as respostas fisiológicas a nível neuromuscular, vamos
tentar expor de uma maneira mais prática a contribuição do exercício físico. Nós já entendemos
que o tipo do exercício ditará o tipo e a quantidade de fibras musculares ativadas e que apenas as
fibras musculares ativadas pelo sistema nervoso podem receber benefícios de um programa de
treinamento.
Precisamos compreender também que as unidades motoras recrutadas no músculo
dependerão das demandas do exercício e das posições biomecânicas utilizadas no exercício em
destaque. Vamos exemplificar, para ficar mais claro: pensemos no exercício do agachamento. Se
posicionarmos os pés em diferentes posições, serão recrutadas diferentes unidades motoras, pois a
ativação das fibras musculares será distinta, de acordo com os princípios da biomecânica.
Sendo assim, Kraemer (2013) afirma que a magnitude do recrutamento de diferentes porções
do músculo quadríceps são biomecanicamente diferentes, mesmo exercitando o mesmo músculo
em questão. Por exemplo: o agachamento e o leg press são dois exercícios em que o motor primário
será o quadríceps, porém, com recrutamento de diferentes unidades motoras.
Esse é um ponto de extrema importância na periodização e no planejamento do treino de
um atleta, pois as variações, tanto na ordem quanto na magnitude do recrutamento, são fatores
cruciais no ganho de força e potência do músculo em destaque. Com isso, pode ocorrer de um
atleta ser um bom velocista e ter um excelente salto vertical, e outro atleta ter um salto vertical
maior e não ser um bom velocista, por exemplo.

Considerações finais
Com base no conteúdo abordado neste capítulo, podemos ter ciência de que o sistema
nervoso interage com cada sistema fisiológico do corpo humano. Isso não é diferente quando nos
referimos ao sistema muscular. Impulsos nervosos são apresentados na forma de atividade elétrica,
que emite informações para os músculos, para que eles se movimentem (contração e relaxamento).
O desempenho de todas as atividades esportivas requer o recrutamento adequado das
unidades motoras, gerando, assim, a força necessária para promover o movimento. As adaptações
do sistema neuromuscular representam o pilar do treinamento físico, visto que essas adaptações
promovem benefícios inerentes à prática do exercício em questão.

Ampliando seus conhecimentos


• LACTATO e fadiga. 8 out. 2015. 1 vídeo (7 min.). Publicado pelo canal Ciência inForma.
Disponível em: https://youtu.be/VPkzZnJ99-8. Acesso em: 23 out. 2019.
Para ampliar seus conhecimentos no que se refere ao lactato e à fadiga muscular, acesse
o vídeo para assistir ao bate papo entre dois cientistas. Quando nos referimos ao termo
fadiga muscular, precisamos compreender três parâmetros relacionados: Como acontece
a fadiga? Por que acontece a fadiga muscular? Onde acontece a fadiga muscular? Para isso,
é necessário entender o papel do lactato no processo de fadiga.
50 Fisiologia do exercício e do esporte

• JUNÇÃO neuromuscular. 29 ago. 2017. 1 vídeo (12 min.). Publicado pelo canal Fisiologia
3D. Disponível em: https://youtu.be/MpFpRIM44zA. Acesso em: 23 out. 2019.
A contração muscular é um evento com inúmeros detalhes e várias especificidades, além
de extremamente importante para o entendimento coeso da fisiologia do exercício. Para
que você entenda cada detalhe e cada peculiaridade dessa atividade, sugerimos que assista
a esse vídeo. Nele, há uma abordagem geral sobre a junção neuromuscular, bem como a
descrição e o detalhamento da contração muscular.

• MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia


e desempenho humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.
Para a compreensão de toda a complexidade do controle do sistema nervoso sobre
o movimento humano, indicamos a leitura do Capítulo 19 – “Controle nervoso do
movimento humano”. Nesse capítulo, você encontrará uma abordagem simples e fácil
sobre como o sistema nervoso controla os movimentos humanos, desde a organização do
sistema nervoso, passando pela placa motora, até chegar aos movimentos dos músculos
esqueléticos.

Atividades
1. Sabemos que, entre inúmeros mecanismos neuromusculares, a fadiga muscular e a
propriocepção são eventos importantes no que se refere ao macrossistema chamado de
sistema neuromuscular. De acordo com o que vimos neste capítulo, conceitue fadiga muscular
e propriocepção e explique como esses eventos corroboram a excelência na contração
muscular.

2. O objetivo principal do músculo é se contrair, a fim de produzir calor para o organismo,


bem como promover a locomoção. Há três formas de contração dos músculos esqueléticos
atrelados ao sistema locomotor. Explique cada uma, com foco nos eventos que acontecem a
nível celular.

3. A placa motora é o ponto de encontro entre um neurônio e uma fibra muscular. Sabendo
que essas duas células promovem a contração muscular, descreva os eventos que acontecem
na placa motora, tanto nos neurônios quanto na fibra muscular.

Referências
BOGDANIS, G. C. Effects of physical activity and inactivity on muscle fatigue. Front Physiol, n. 3, p. 142, 18
maio 2012. [1 Epub].

IDE, B. N.; LOPES, C. R.; SARRAIPA, M. F. Fisiologia do treinamento esportivo: força, potência, velocidade,
resistência, periodização e habilidades psicológicas. São Paulo: Phorte, 2010.
Sistema neuromuscular e exercício físico 51

KRAEMER, W. J.; FLECK, S. J.; DESCHENES, M. R. Fisiologia do exercício: teoria e prática. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan. 2013.

MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho
humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.

PITHON-CURI, T. C. Fisiologia do exercício. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

POWERS, S. K.; HOWLEY, E. T. Fisiologia do exercício: teoria e aplicação ao condicionamento e ao


desempenho. 9. ed. São Paulo: Manole, 2017.

STEWART, D. et al. Muscle fiber conduction velocity during a 30-s Wingate anaerobic test. J Electromyogr
Kinesiol, v. 21, n. 3, p. 418-422, 2011.

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2018.
4
Sistema respiratório e exercício físico

É chegado o momento de abordarmos o sistema respiratório, atrelado ao exercício físico.


Esse é um assunto extremamente importante e é necessário entendê-lo minuciosamente, visto que
os gases que inspiramos e expiramos são cruciais para a produção de energia muscular, quando
nos exercitamos.
Para entendermos melhor esse assunto, precisamos conhecer alguns termos essenciais,
referentes a capacidades e volumes respiratórios, que servirão como base para o desenvolvimento
deste capítulo. Para facilitar a compreensão, vamos classificá-los em dois tipos: estáticos e dinâmicos.
Dentro do conjunto de termos relacionados ao volume e à capacidade pulmonar dinâmica, vale
ressaltar que esses estão associados ao volume de ejeção dos pulmões.
Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) afirmam que o volume de ejeção dos pulmões refere-se
à velocidade e à capacidade com que ele se movimenta, ou seja, à frequência respiratória. Portanto,
os termos são: volume expiratório forçado (VEF) e capacidade vital forçada (CVF). Mas como eles
se relacionam? A relação entre o VEF e CVF apresenta o volume e a capacidade pulmonar, ou seja,
o quanto e como o indivíduo consegue inspirar e expirar durante a atividade física ou em repouso
(POWERS; HOWLEY, 2017).
Já os termos relacionados ao volume e à capacidade pulmonar estática incluem (MCARDLE,
KATCH; KATCH, 2017): volume de reserva expiratório (VRE) (expiração máxima ao final da
expiração corrente); volume de reserva inspiratório (VRI) (inspiração máxima ao final da inspiração
corrente); volume de ar corrente (VAC) (volume inspirado ou expirado por incursão respiratória);
volume pulmonar residual (VPR) (volume nos pulmões após uma expiração máxima; capacidade
vital forçada (CVF) (volume máximo expirado após uma inspiração máxima); capacidade residual
funcional (CRF) (volume nos pulmões após uma expiração corrente); e capacidade pulmonar total
(CPT) (volume nos pulmões após uma inspiração máxima).
Com esses termos relacionados ao sistema respiratório bem esclarecidos, nossos estudos
se tornarão mais claros e coesos. Ao longo deste capítulo, abordaremos cada peculiaridade das
capacidades respiratórias relacionadas ao exercício, bem como as respostas fisiológicas no repouso
e durante o exercício físico.

4.1 Regulação da ventilação e exercício físico


O sistema respiratório é essencial no que se refere ao transporte de oxigênio para os tecidos
corporais no uso do metabolismo aeróbico, além de remover o dióxido de carbono do corpo.
A principal função da respiração é obter oxigênio da atmosfera e livrar o corpo do dióxido
de carbono. Para uma respiração adequada, o sistema respiratório age em combinação com o
sistema circulatório (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
54 Fisiologia do exercício e do esporte

A atividade conjunta entre esses sistemas fornece uma complexidade de eventos que
acontecem a fim de realizar a respiração. O primeiro é a ventilação pulmonar, que, conforme Ide,
Lopes e Sarraipa (2010), é o movimento de ar para dentro e para fora dos pulmões, coloquialmente
chamado de respiração.
Além da ventilação pulmonar, precisamos compreender o mecanismo do movimento do ar
nos pulmões para o sangue, e do dióxido de carbono do sangue para o ar nos pulmões, chamado
de difusão pulmonar. Além disso, precisamos conhecer a troca gasosa capilar, que se refere à troca
de oxigênio e dióxido de carbono entre o sangue e os tecidos corpóreos.
Para finalizar a abordagem sobre esses eventos que compõem a respiração, precisamos
saber diferenciar a respiração pulmonar da respiração celular. A própria nomenclatura nos ajuda
a diferenciar. Powers e Howley (2017) ressaltam que a respiração pulmonar é o resultado da
ventilação e da difusão pulmonar, pois os dois processos acontecem nos pulmões, já a respiração
celular se refere ao uso do oxigênio no metabolismo aeróbico e à produção de dióxido de carbono.
Para melhor compreender, observe a Figura 1. Nela, é possível observar a estrutura de
um alvéolo pulmonar, bem como a troca gasosa que acontece entre ele e o capilar sanguíneo.
Observamos também que o sangue circulante no capilar passa pelo alvéolo pobre em oxigênio e
sai rico em oxigênio.
Figura 1 – Estrutura e troca gasosa de um alvéolo pulmonar
Sangue rico
em oxigênio
Sangue pobre
em oxigênio

O2

CO2
Capilar
sanguíneo

Alvéolo
Alila Medical Media/Shutterstock

O2
CO2
O2
Membrana
respiratória
CO2
Sistema respiratório e exercício físico 55

Durante a prática de exercícios físicos, a troca gasosa capilar nos alvéolos e no tecido
muscular se eleva para alcançar as altas demandas do fornecimento de oxigênio e da remoção de
dióxido de carbono. Para essa troca gasosa capilar se elevar, a ventilação pulmonar aumenta sob o
controle de todos os fatores citados anteriormente, e o fluxo sanguíneo nos capilares dos alvéolos e
dos tecidos também deve aumentar (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Consequentemente, para que o fluxo sanguíneo aumente, devem ocorrer eventos
associados ao sistema cardiovascular, como o débito cardíaco aumentado e a redistribuição
do sangue para fora do tecido inativo e na direção do tecido ativo. Com isso, fica evidente
que, embora estejamos discutindo as respostas do exercício perante o sistema respiratório,
devemos compreender que para que a troca gasosa aumentada ocorra, o fluxo sanguíneo
aumentado, devido aos efeitos agudos do exercício no sistema cardiovascular, também deve
ocorrer (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Além disso, precisamos ter em mente que o exercício físico é um estímulo que gera
desarmonia no sistema respiratório de modo geral. Segundo Powers e Howley (2017), a duração,
a intensidade e o volume do exercício provocam transformações importantes no que se refere às
características basais, tanto da respiração pulmonar, quanto no nível da respiração celular. Esses
fatores tendem a modificar as características da energia aeróbica produzida em repouso.
Tratando-se especificamente da intensidade do estímulo físico, esse tende a aumentar a
atividade das trocas gasosas de oxigênio e dióxido de carbono, com isso, os sistemas responsáveis
por transportar esses gases tendem a aumentar a atividade de funcionamento. Kraemer, Fleck
e Deschenes (2013) afirmam que esse aumento na atividade refere-se ao restabelecimento do
suprimento do oxigênio e do dióxido de carbono nas respirações pulmonar e celular. E se esse
aumento for muito intenso? Nesse caso, haverá a atividade da produção anaeróbica, gerando uma
acidose lática e interrompendo o exercício (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Para que possamos entender a base da respiração e o que acontece com o sistema respiratório
antes, durante e depois do exercício físico, devemos compreender a mecânica da respiração. Ela
pode ser resumida em alguns eventos descritos a seguir.
Observe a Figura 2 para entender a mecânica da respiração relacionada à pressão atmosférica.
O movimento do ar do meio ambiente para dentro dos pulmões é chamado de ventilação pulmonar
e ocorre por meio de um processo conhecido como fluxo de massa (bulk flow). O fluxo de massa
refere-se ao movimento das moléculas ao longo de uma passagem, em decorrência de uma
diferença de pressão entre as duas extremidades dessa via. Na ilustração, observamos claramente
que a inspiração ocorre porque a pressão no interior dos pulmões (intrapulmonar) cai a níveis
inferiores à pressão atmosférica, enquanto a expiração ocorre quando a pressão dentro dos pulmões
ultrapassa a pressão atmosférica (POWERS; HOWLEY, 2017).
56 Fisiologia do exercício e do esporte

Figura 2 – Imagem ilustrativa da mecânica de inspiração e expiração


Em repouso Inspiração
b)
a)
Pressão atmosférica (760 mmHg)

Pressão intrapulmonar
(760 mmHg)
758 mmHg
Pressão intrapleural
(756 mmHg)
754 mmHg

Expiração

c)

Diafragma

763 mmHg

756 mmHg

IESDE Brasil S/A


Quando nos referimos aos músculos envolvidos na respiração, você já deve saber que
quando o diafragma se contrai, força os conteúdos abdominais para baixo e adiante, e as costelas
são erguidas para fora. O resultado dessas duas ações é a diminuição da pressão intrapleural, que,
por sua vez, causa a expansão dos pulmões. Essa expansão acarreta uma diminuição da pressão
intrapulmonar a níveis inferiores à pressão atmosférica, o que possibilita o fluxo de ar para dentro
dos pulmões (TORTORA; DERRICKSON, 2018).
Vale ressaltar ainda que, durante o exercício, os músculos auxiliares da inspiração são
requisitados e passam a auxiliar a respiração. Esses músculos incluem músculos intercostais externos,
peitoral menor, músculos escalenos e o esternocleidomastoideo (POWERS; HOWLEY, 2017).
Em relação à expiração durante o exercício, Tortora e Derrickson (2018) afirmam que os
músculos mais envolvidos são aqueles encontrados na parede abdominal, que incluem o reto do
abdome e o oblíquo interno. Quando eles se contraem, o diafragma é empurrado para cima e as
costelas são puxadas para baixo e para dentro, resultando em uma redução no volume do peito
e na expiração.
Durante a prática de um exercício leve e moderado, a ventilação pulmonar está em atividade
junto ao metabolismo, de modo proporcional ao consumo de oxigênio e à produção do dióxido
de carbono (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017). Além disso, para suprir a nova demanda
metabólica, inúmeras adaptações fisiológicas são necessárias, como ajustes nos sistemas nervoso
autônomo, cardiovascular, pulmonar e metabólico.
Sistema respiratório e exercício físico 57

A transição do repouso para o exercício leve ou moderado é acompanhada de um aumento


na ventilação, que ocorre na primeira respiração e tem duração de aproximadamente 20 segundos,
chamada de fase I. Após um curto platô, a ventilação sobe consideravelmente (fase II), até
alcançar um nível estável ou estado de equilíbrio. Na fase final do controle (fase III), os principais
mecanismos reguladores alcançam valores estáveis sob a influência de mecanismos sensoriais
periféricos (PITHON-CURI, 2013).
Há dois mecanismos neurais responsáveis pela atividade: os reflexos periféricos, originados
pela estimulação de mecanorreceptores e barorreceptores; e o comando central, ativado pelo córtex
cerebral ou pelo hipotálamo. Por conseguinte, devemos ter em mente que as respostas fisiológicas ao
exercício físico, na verdade, formam uma combinação de fatores mecânicos do sistema respiratório,
que inclui peculiaridades intrínsecas aos músculos responsáveis pela respiração combinadas a
reflexos neurais (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
A vasodilatação, por exemplo, é controlada por metabólitos que possuem a capacidade de
alterar pH, temperatura, osmolaridade, além da concentração de potássio. Ela tem uma importância
muito significativa, pois supre a redistribuição do fluxo sanguíneo para as áreas musculares
envolvidas. Nesse caso, obviamente, o débito cardíaco será aumentado, porém, o fluxo sanguíneo
não aumenta para áreas que não estejam sendo estimuladas, pois nessas áreas específicas ocorre
um aumento da resistência local, em consequência de uma descarga simpática difusa (POWERS;
HOWLEY, 2017).
Para que você compreenda melhor, vamos pensar que, durante um exercício, há a elevação
da descarga simpática e, consequentemente, a diminuição do tônus vagal. Como resultado, a
frequência cardíaca tende a se elevar. Pithon-Curi (2013) afirma que essa elevação é proporcional
ao consumo de oxigênio, que pode alcançar seu valor máximo, sendo máxima também a captação
de oxigênio pelo sistema respiratório.
Por outro lado, o balanço ácido-base não sofre alterações durante os primeiros momentos do
exercício físico, porque o transporte de oxigênio para as mitocôndrias (organelas citoplasmáticas
que conhecemos no Capítulo 1) é suficiente para suprir as demandas energéticas. Porém, McArdle,
Katch e Katch (2017) afirmam que quando o exercício tende a aumentar a intensidade, as células
combinam os metabolismos aeróbico e anaeróbico. Nesse caso, o ácido lático formado durante o
processo de glicólise se difunde para o sangue, aumentando, assim, a concentração dos íons H+,
que tendem a proporcionar um estímulo ventilatório adicional.
Os valores médios da pressão parcial de oxigênio e dióxido de carbono nas artérias não se
modificam nesse caso. Porém, a pressão parcial de dióxido de carbono nas veias aumenta por razão
do transporte do excesso de dióxido de carbono produzido pelos músculos que estão em atividade
(POWERS; HOWLEY, 2017).
Quando ocorre a transição da intensidade do exercício de leve para moderada/intensa,
tanto a frequência cardíaca, quanto o volume corrente, tendem a contribuir para um aumento do
volume-minuto (quantidade de ar que é mobilizada nas vias aéreas em 1 minuto). Primeiramente,
o volume corrente pode aumentar mais do que a frequência respiratória, porém, quando a
acidose metabólica se desenvolve, há o predomínio do aumento da frequência respiratória.
58 Fisiologia do exercício e do esporte

Esses eventos estão relacionados à duração do exercício além da atividade de contração dos
músculos respiratórios (PITHON-CURI, 2013).
O aumento imediato da ventilação ocorre rapidamente por ser uma resposta às alterações
metabólicas ou aos gases sanguíneos. Esse componente neural consiste em fibras colaterais ao
centro respiratório de neurônios do córtex motor. Essas células nervosas se ligam aos músculos
esqueléticos que estão sendo excitados ao centro respiratório e são responsáveis por um reflexo
combinado, representando uma resposta ao exercício (POWERS; HOWLEY, 2017).
Durante a prática do exercício, a demanda metabólica tende a aumentar a produção de
dióxido de carbono, o consumo máximo de oxigênio, a pressão intrapleural, a força da musculatura
inspiratória e o fluxo inspiratório (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Além disso, McArdle, Katch e Katch (2017) afirmam que o nível de aptidão para o exercício
físico pode influenciar a variação do padrão respiratório em resposta ao exercício. Atletas e
indivíduos bem treinados mostram valores bem reduzidos de frequência cardíaca em repouso,
a chamada bradicardia, além de menor elevação da frequência cardíaca no início do exercício.
Já no exercício máximo, a ventilação se mostra aumentada com o aprimoramento na captação
máxima de oxigênio.
Essas adaptações relacionadas à ventilação são específicas para cada tipo de exercício; por
exemplo, em exercícios que utilizam os membros superiores, o equivalente metabólico tende a ser
maior do que em exercícios com os membros inferiores, pois o ajuste ventilatório ao treinamento
resulta de adaptações neurais e químicas locais nos músculos específicos (IDE; LOPES; SARRAIPA,
2010).

4.2 Limiar anaeróbico (LAn)


Neste momento, dos nossos estudos sobre o sistema respiratório e o exercício físico,
precisamos falar sobre o limiar anaeróbico (LAn). Esse termo vem sendo utilizado desde o início
dos anos 50 para suprir uma necessidade científica da época, que o torna importante até hoje: a
dosagem do lactato sanguíneo (JAMISON; MEGARRY; RILEY, 2010).
Atualmente existem vários protocolos para se obter esse valor e relacioná-lo à intensidade do
exercício em questão, com predominância do metabolismo aeróbico. Mas o que de fato significa o
limiar anaeróbico? Qual é a sua importância na prática de exercícios?
Segundo Baumann et al. (2011), o termo limiar anaeróbico, ou LAn, remete à intensidade
máxima do exercício e essa variável monitora, principalmente, o estado equilibrado entre a
produção e a remoção do lactato. Para que você entenda melhor, vamos relembrar que a transição
do metabolismo oxidativo para o metabolismo anaeróbico vem associada a um aumento nos
valores de lactato. Com isso, entendemos que quando aumentamos a intensidade de um exercício,
provavelmente deve haver essa transição. O LAn, portanto, é um indicador fisiológico associado a
essa transição (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Mas, de fato, qual é a importância do conhecimento e da adequação do LAn para a
fisiologia do exercício? Pois bem, entender o LAn refere-se à possibilidade de adequação na
Sistema respiratório e exercício físico 59

prescrição de exercícios, tratando-se da composição corporal e da saúde e qualidade de vida.


A prática de atividade física moderada gera uma diminuição de gordura corporal, e essa
gordura serve como substrato energético, principalmente, na recuperação após o exercício
(JAMISON; MEGARRY; RILEY, 2010).
Sabemos que o exercício aeróbico tem como principal característica a manutenção dos
parâmetros funcionais e metabólicos, por exemplo: a estabilidade entre a oferta e demanda de
oxigênio, a produção e remoção do lactato, a captação de oxigênio e a liberação do dióxido de
carbono. McArdle, Katch e Katch (2017) afirmam que essa manutenção faz com que os parâmetros
fisiológicos relacionados – frequência cardíaca, ventilação pulmonar, consumo de oxigênio e
quantidade de ácido lático no sangue – fiquem estáveis.
Então, o limiar anaeróbico nada mais é do que um preditor objetivo da capacidade aeróbica
e, com sua alta aplicabilidade em exercícios de longa duração, vem fornecendo resultados
importantes no que se refere à prescrição de treinamentos estruturados (POWERS; HOWLEY,
2017). Vale ressaltar que a avaliação dessa variável é realizada mediante testes diretos e coletas
sanguíneas, com o objetivo de determinar a quantidade de lactato no sangue.
É importante ressaltar ainda que o acúmulo do lactato é proveniente de uma desarmonia
entre o ácido lático, produzido no músculo envolvido na atividade, e a quantidade que o organismo
consegue metabolizar e remover (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Existem basicamente dois limiares. O limiar 1 refere-se ao ponto onde há um aumento
na produção do lactato, porém, ainda existe um equilíbrio básico na produção e remoção, ou
seja, as fontes aeróbicas de energia seguem sendo protagonistas no processo de fornecimento de
energia para o exercício (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013). Já o limiar 2 está relacionado
ao ponto específico onde há um aumento desproporcional na produção do lactato e, como
consequência, a fonte aeróbica de energia não tem a capacidade de manter esse fornecimento de
energia, necessitando de ajuda das fontes anaeróbicas, que acumulam o lactato, induzindo à fadiga
muscular precoce (PITHON-CURI, 2013).
Para concluir esta seção, podemos afirmar que o limiar anaeróbico é capaz de determinar
o resultado ou desempenho esportivo, e que a capacidade de permanecer em atividades com altos
níveis de intensidade e bom controle de produção e remoção de lactato está diretamente ligada ao
alto nível de performance no exercício em questão.

4.3 Consumo máximo de oxigênio (VO2máx)


Nesta seção, abordaremos um dos aspectos de maior importância quando nos referimos ao
exercício físico e ao sistema respiratório. Falaremos sobre o consumo máximo de oxigênio (ou VO₂
máximo). McArdle, Katch e Katch (2017) afirmam que o VO₂ máximo refere-se a uma medida
avaliativa da potência aeróbica máxima, isto é, uma medida que representa a taxa dos eventos
que acontecem com o oxigênio. Quando nos referimos ao oxigênio, precisamos medir e avaliar a
captação, o transporte e a utilização pelo corpo humano (POWERS; HOWLEY, 2017).
60 Fisiologia do exercício e do esporte

Na literatura científica atual, inúmeros estudos mostram o VO₂ máx como uma das principais,
ou, até mesmo, a principal medida para mostrar a capacidade do sistema cardiorrespiratório. A
união entre o sistema respiratório e circulatório utiliza algumas variáveis importantes, tais como,
diferença arteriovenosa de O₂ (diferença entre a quantidade de oxigênio entre as artérias e veias) e
débito cardíaco (PITHON-CURI, 2013).
Como determinamos o consumo máximo de oxigênio? A ciência atual nos oferece inúmeras
possibilidades de calcular o VO₂ máximo de um indivíduo. Kraeme, Fleck e Deschenes (2013)
ressaltam que esses protocolos variam, podendo ser realizados testes diretos ou indiretos. Os testes
indiretos são compostos de protocolos realizados mediante avaliações máximas ou até submáximas,
e o resultado é gerado por meio de fórmulas matemáticas entre o consumo de oxigênio e a frequência
cardíaca. Já nos testes diretos se faz necessária a avaliação dos gases expirados no momento do
exercício físico.
Vale ressaltar que nos testes diretos as variáveis relacionadas são controladas. Mas quais
são essas variáveis? A capacidade física do indivíduo, o nível de sedentarismo, lesões e limitações
articulares, entre outras (POWERS; HOWLEY, 2017). Ademais, podemos compreender que com o
aumento da intensidade do exercício o consumo de oxigênio também tende a aumentar. Mas existe
um limite para esse aumento, esse limite é chamado de VO2 pico.
Sabemos que cada pessoa difere-se da outra, em todos os parâmetros fisiológicos, conforme
visto na ciência do treinamento desportivo. Mas é importante que saibamos, neste momento, que
as necessidades de cada indivíduo variam consideravelmente de acordo com a sua composição
corporal – quantidade de massa magra, percentual de gordura, entre outros – e que, com essa
oscilação de variáveis, o consumo máximo de oxigênio também tende a mudar. Por isso, o VO2
máximo é definido por uma unidade de ml O2/kg/min (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Quando nos referimos ao consumo máximo de oxigênio, além de levar em consideração o
peso corporal, devemos observar as diferenças de idade e sexo. Por exemplo, os adultos mostram
valores de consumo máximo de oxigênio maiores do que as crianças; porém, os meninos apresentam
valores similares aos dos homens, depois dos valores corrigidos pelo peso corporal. Já no sexo
feminino, as mulheres adultas apresentam valores menores do que as meninas, mesmo depois da
correção pelo peso corporal (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Essa variável importantíssima no entendimento da fisiologia do exercício, obviamente, sofre
uma grande influência da idade e do nível de sedentarismo do indivíduo. Por exemplo, nos adultos
sedentários há um grande decréscimo no consumo máximo de oxigênio. Quando pensamos de
modo geral, o consumo máximo de oxigênio é, aproximadamente, 20% maior nos homens, quando
comparado às mulheres. Essa diferença se deve, basicamente, à composição corporal, visto que os
homens têm massa muscular superior à das mulheres (PITHON-CURI, 2013).
Vale frisar também a importância do débito cardíaco no consumo máximo de oxigênio. Em
exercícios de caráter submáximos, o aumento do VO₂ é dependente por aproximadamente 45% do
débito cardíaco. Os outros 55% se referem à diferença entre a quantidade de oxigênio nas artérias
e nas veias, ou seja, à diferença arteriovenosa.
Sistema respiratório e exercício físico 61

Nessa mesma perspectiva, quando o exercício tem a sua intensidade aumentada, o débito
cardíaco se torna protagonista no aumento do VO2, principalmente pelo aumento da frequência
cardíaca (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017). Em relação aos exercícios de caráter máximo, o
débito cardíaco é extremamente importante, representando aproximadamente 80% do aumento do
consumo de oxigênio (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Com base em tudo o que foi exposto, fica claro que a mensuração do consumo máximo
de oxigênio acarreta uma gama de variáveis acerca do exercício, portanto, elas podem ajudar a
determinar um melhor rendimento esportivo.

Considerações finais
Neste capítulo, compreendemos a importância do sistema respiratório para a ciência da
fisiologia do exercício associada diretamente ao rendimento esportivo do atleta ou indivíduo
normal. Além disso, algumas variáveis que conhecemos aqui são de extrema importância para o
planejamento e o treinamento de qualquer indivíduo, seja ele um atleta ou um indivíduo com alto
nível de sedentarismo, pois remetem, principalmente, à capacidade e à aptidão para a prática de
atividade física. Sendo assim, devemos dar a devida atenção à respiração durante o exercício, pois
ela é uma das principais vias de substrato energético para a prática do gesto esportivo.

Ampliando seus conhecimentos


• POWERS, S. K; HOWLEY, E. T. Respiração durante o exercício. In: Fisiologia do exercício.
Teoria e aplicação ao condicionamento e ao desempenho. 9. ed. São Paulo: Manole, 2017.
Para aprofundar o conhecimento sobre o sistema respiratório relacionado à atividade
física, indicamos a leitura do Capítulo 10 do livro de Powers e Howley.

• AZEVEDO, P. et al. Limiar anaeróbio e bioenergética: uma abordagem didática. Revista


da Educação Física, Maringá, v. 20, n. 3, p. 453-464, 2009. Disponível em: https://www.
researchgate.net/profile/Paulo_Azevedo2/publication/286143245_Limiar_Anaerobio_e_
Bioenergetica_Uma_abordagem_didatica/links/59cbb488a6fdcc451d5cdf30/Limiar-
Anaerobio-e-Bioenergetica-Uma-abordagem-didatica.pdf. Acesso em: 1 out. 2019.
Quando nos referimos ao limiar anaeróbico, é necessário lançar um olhar sobre a
bioenergética. Para sanar todas as dúvidas relacionadas a essa área do conhecimento,
sugerimos a leitura do artigo disponível no link.

• LIRA, F. S. de et al. Consumo de oxigênio pós-exercícios de força e aeróbio: efeito da ordem


de execução. Rev. Bras. Med. Esporte, São Paulo, v. 13, n. 6, nov./dez. 2007. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/rbme/v13n6/09.pdf. Acesso em: 1 out. 2019.
62 Fisiologia do exercício e do esporte

Para a compreensão do consumo máximo de oxigênio durante o exercício, também


precisamos compreender um assunto de suma importância para a fisiologia do exercício:
o excesso do consumo de oxigênio pós-exercício (Epoc). Para a compreensão desse
parâmetro, sugerimos a leitura do artigo científico disponível no link.

Atividades
1. No estudo do sistema respiratório associado ao exercício físico há alguns termos importantes,
que são parâmetros para quantificar, principalmente, a capacidade de inspiração (entrada do
ar nos pulmões) e expiração (saída de ar dos pulmões). Cite e explique esses termos, bem
como a sua importância para o estudo da fisiologia do exercício.

2. Quando nos referimos ao termo VO₂, estamos falando da capacidade do ser humano de usar
oxigênio, absorção, transporte e substrato energético. Porém, a literatura apresenta outro
termo similar, que é o VO₂ pico. O que caracteriza o VO₂ pico?

3. A ciência da fisiologia do exercício envolve alguns termos essenciais, sendo o limiar


anaeróbico (LAn) uma variável de suma importância para o desenvolvimento do gesto
esportivo. Essa variável pode se subdividir em duas: o limiar 1 e o limiar 2. Explique a
diferença entre esses dois limiares.

Referências
BAUMANN, C. W. et al. Anaerobic work capacity contributes to 5-km race performance in female runners.
International Journal of Sports Physiology and Performance, 29 nov. 2011.

IDE, B. N.; LOPES, C. R.; SARRAIPA, M. F. Fisiologia do treinamento esportivo: força, potência, velocidade,
resistência, periodização e habilidades psicológicas. São Paulo: Phorte, 2010.

JAMISON, J. P.; MEGARRY, J.; RILEY, M. Exponential protocols for cardiopulmonary exercise testing on
treadmill and cycle ergometer. European Journal of Applied Physiology, v. 108, n. 1, p. 167-175, 2010.

KRAEMER, W. J.; FLECK, S. J.; DESCHENES, M. R. Fisiologia do exercício: teoria e prática. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2013.

MCARDLE, W. D.; KATCH, F, I.; KATCH, V, L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho
humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.

PITHON-CURI, T. C. Fisiologia do exercício. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

POWERS, S. K; HOWLEY, E. T. Fisiologia do exercício. Teoria e aplicação ao condicionamento e ao desempenho.


9. ed. São Paulo: Manole, 2017.

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2018.
5
Sistema circulatório e exercício físico

O assunto deste capítulo é o sistema circulatório, também chamado de sistema cardiovascular.


Esse sistema possui extrema importância na manutenção da vida e se associa intimamente ao
exercício físico, além disso, serve como suporte para o funcionamento de outros sistemas corporais.
Para tal suporte, o sistema circulatório realiza funções relacionadas a disponibilidade, remoção,
prevenção, transporte e manutenção.
Já vimos no decorrer deste livro, principalmente no capítulo referente ao sistema respiratório,
que o sistema circulatório contribui para o fornecimento de oxigênio a tecidos e órgãos, além
de remover o dióxido de carbono das células do corpo. Vale ressaltar que esse sistema ajuda no
transporte de substâncias químicas chamadas hormônios – conforme veremos no Capítulo 6 – das
suas células secretoras para um órgão-alvo específico.
O sistema circulatório é composto por coração e vasos sanguíneos, sendo que o coração
tem a função de bombear o sangue pelos vasos sanguíneos. A organização do sistema circulatório
e sua capacidade de se adaptar aos estresses agudo e crônico do exercício permitem aumentos
exacerbados do desempenho do exercício. Para que entendamos melhor, quando estamos
praticando um exercício de caráter intenso, a demanda de oxigênio pelo tecido muscular em
atividade tende a aumentar mais de 20 vezes no que se refere aos valores do repouso.
Com isso, é de suma importância que compreendamos a relevância do sistema circulatório
para o exercício com um olhar mais funcional no que se refere às respostas fisiológicas provocadas
pelo exercício em alguns parâmetros que serão abordados em cada seção deste capítulo, são eles:
pressão arterial, frequência cardíaca e débito cardíaco.

5.1 Pressão arterial


Para que compreendamos o termo pressão arterial, devemos saber que o sangue circula no
interior dos vasos sanguíneos de uma área de alta pressão para uma área de menor pressão. A pressão
do sangue dentro de algum vaso específico é primordial para o funcionamento cardiovascular e
esse mecanismo de diferença de pressão é o grande determinante para a natureza da circulação
sanguínea (TORTORA; DERRICKSON, 2018).
Sabemos que o sangue passa pela artéria aorta, ligada ao ventrículo esquerdo, onde a pressão
é maior, através das artérias. Após, segue pela árvore de vasos sanguíneos para os capilares, até
chegar às veias. Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) afirmam que a pressão tende a diminuir ao
longo dessa viagem do sangue pelo conjunto de vasos sanguíneos.
Na Figura 1 conseguimos observar as quatro câmaras cardíacas: dois átrios superiores e
dois ventrículos inferiores. As setas indicam a direção do fluxo sanguíneo, indo sempre dos átrios
para os ventrículos e dos ventrículos na direção das valvas do tronco pulmonar (levando o sangue
64 Fisiologia do exercício e do esporte

para o pulmão) e da aorta (levando o sangue para ser distribuído para todo o organismo). Vale
destacar ainda que o lado direito do coração corresponde ao circuito pulmonar, e o lado esquerdo,
ao circuito sistêmico.
Figura 1 – Fluxo de sangue no coração

veia cava superior


artéria aorta

artéria pulmonar

veia pulmonar

átrio esquerdo

valva mitral
átrio direito

valva da aorta
valva do tronco pulmonar

valva tricúspide
ventrículo esquerdo

ventrículo direito

Mari-Leaf/Shutterstock
Você deve estar se perguntando sobre a diferença de calibre dos vasos sanguíneos, pois
sabemos que há distinções entre veias, artérias e capilares sanguíneos. O diâmetro do vaso gera uma
diferença no transporte de sangue? E na pressão? A resposta é sim. Segundo Tortora e Derrickson
(2018), o diâmetro do vaso interfere diretamente na pressão exercida, e esse princípio remete ao
estudo da física, pois o volume e a pressão são relacionados.
Você já deve ter escutado as expressões pressão sistólica e pressão diastólica. Pois bem,
devemos entender que a pressão é a força exercida pelo sangue contra as extremidades dos vasos
sanguíneos durante um ciclo cardíaco e é determinada pela quantidade de sangue bombeado e
pela intensidade da resistência ao fluxo sanguíneo. Classifica-se em: pressão arterial sistólica (PAS)
e pressão arterial diastólica (PAD). As pressões arteriais sistólica e diastólica se referem à maior
pressão que ocorre durante a sístole e à menor pressão que ocorre durante a diástole (TORTORA;
DERRICKSON, 2018).
esfigmomanômetro: Geralmente a pressão arterial é aferida com o uso de um esfigmomanômetro. Vale citar que
instrumento que
mede a pressão perante a Sociedade Brasileira de Cardiologia (2016), a pressão arterial normal de um homem
sanguínea (arterial).
adulto é de 120/80, e nas mulheres adultas, 110/70. A pressão sistólica é o maior número expresso
em milímetros de mercúrio (mmHg), já a pressão diastólica é o menor número na proporção,
também em mmHg.
Sistema circulatório e exercício físico 65

A pressão arterial sistólica é a pressão reproduzida com a força de ejeção do sangue,


durante a sístole ventricular. Por outro lado, a pressão arterial diastólica se refere ao relaxamento
dos ventrículos no processo de diástole. Vale ressaltar ainda que a diferença entre pressão arterial
sistólica e diastólica é denominada pressão de pulso (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Pois bem, já sabemos os princípios básicos da pressão arterial, agora precisamos relacioná‑los
com a prática do exercício físico, esclarecendo como essa pressão arterial se comporta durante o
exercício e quais são as devidas respostas fisiológicas no sistema circulatório.
De acordo com McArdle, Katch e Katch (2017), a pressão arterial é resultado da multiplicação
do débito cardíaco pela resistência periférica total, visto que tanto a quantidade de sangue quanto
o diâmetro do vaso são fatores imprescindíveis para a pressão arterial.
Quando o corpo está em exercício, a pressão arterial sistólica se difere bem da diastólica.
Por exemplo, nos exercícios que envolvem grupos musculares mais complexos e maiores, a pressão
arterial sistólica aumenta, e esse aumento está relacionado com a intensidade do exercício. Como
dito anteriormente, esse aumento é devido ao débito cardíaco, pois a atividade física promove um
maior trabalho cardíaco e, consequentemente, maior quantidade de sangue sendo ejetado pelo
coração no percurso dos vasos sanguíneos (PITHON-CURI, 2013).
Além disso, conforme falamos anteriormente, quando estamos em exercício, os nossos
músculos precisam de uma quantidade maior de nutrientes e oxigênio. Pois bem, o aumento da
pressão arterial durante o exercício também fornece uma maior disponibilidade de nutrientes e
oxigênio para as células envolvidas no exercício específico. Dessa maneira, fica claro que a pressão
arterial aumentada pode ser considerada um auxílio para a prática de exercício físico (POWERS;
HOWLEY, 2017).
Por outro lado, o exercício não influencia o aumento ou a diminuição da pressão arterial
diastólica. A explicação tende a ser dedutiva, pois a pressão arterial diastólica se refere à pressão
exercida nas paredes das artérias na diástole do ciclo cardíaco e, com isso, não se esperam grandes
alterações. Nesse caso, a aferição da pressão arterial assume um papel de medida de segurança,
pois alterações superiores a 10 mmHg podem ser consideradas anormais (KRAEMER; FLECK;
DESCHENES, 2013).
A literatura atual afirma com convicção que o exercício físico agudo, ou seja, em uma
única sessão, pode ser benéfico no que se refere à resistência vascular periférica e promove uma
diminuição da pressão arterial. Vale ressaltar ainda que esse exercício pode ser de caráter aeróbico
ou de força (ANUNCIAÇÃO; POLITO, 2011).
Além disso, o exercício de caráter crônico tende a promover uma diminuição da pressão
arterial a longo prazo. Mas como o exercício físico e o estímulo promovem essa diminuição? Os
eventos estão relacionados com a manutenção da homeostase pressórica, que, de acordo com Ide,
Lopes e Sarraipa (2010), consiste na capacidade do ambiente corporal interno de manter a pressão
arterial em constante funcionamento, ou inalterada, para responder facilmente a mudanças do
meio externo.
66 Fisiologia do exercício e do esporte

Podemos citar alguns processos que contribuem para isso, tais como: redução da hiper-
reatividade simpática, redução do estado inflamatório crônico, aumento de substâncias
vasodilatadoras (adenosina), melhora da função renal, entre outros (MCARDLE; KATCH;
KATCH, 2017).
Além da pressão arterial sistólica e diastólica, precisamos compreender a pressão arterial
média. Para Tortora e Derrickson (2018), a pressão arterial média é determinada por dois fatores
de extrema importância para o sistema circulatório: o débito cardíaco e a resistência vascular total.
Discutiremos o débito cardíaco no decorrer desta seção, porém, aprofundaremos o assunto
em uma seção específica. De antemão, precisamos saber que o débito cardíaco é a quantidade de
sangue bombeado do coração, e a resistência vascular total se refere à soma da resistência ao fluxo
de sangue exercido por todos os vasos sanguíneos sistêmicos.
Podemos calcular a pressão arterial média por meio da seguinte fórmula:

Pressão arterial média = (débito cardíaco × resistência vascular total)

Observando mais atentamente essa equação, fica evidente que um aumento do débito cardíaco
ou da resistência vascular resultará em um aumento da pressão arterial média. Vale ressaltar que
no organismo humano a pressão arterial média depende de inúmeros fatores fisiológicos, tais
como: volume sanguíneo, viscosidade sanguínea, débito cardíaco e resistência ao fluxo (POWERS;
HOWLEY, 2017).
Da mesma maneira como ocorre a diminuição desses fatores, também tende a diminuir a
pressão arterial. Podemos citar também que alguns processos ajudam a regulá-la, e essa regulação
pode ser aguda ou crônica. A regulação da pressão arterial aguda, a curto prazo, é devida à atividade
do sistema nervoso simpático, enquanto a regulação a longo prazo (crônica) é função primordial
dos rins, que regulam controlando, principalmente, o volume do sangue (PITHON-CURI, 2013).
Nesse mesmo sentido, vamos abordar um pouco sobre as adaptações do sistema cardiovascular
perante o treinamento físico. Para isso, não podemos deixar de falar sobre hipertrofia cardíaca. A
hipertrofia cardíaca se refere ao aumento do tamanho das câmaras cardíacas ou da espessura da
parede muscular, especialmente do ventrículo esquerdo, que tem a função de ejetar o sangue para
a circulação sistêmica, isto é, do corpo todo. Porém, essa hipertrofia não se refere ao tamanho do
órgão em questão e tem a característica de não perder a funcionalidade (MCARDLE; KATCH;
KATCH, 2017).
Vale citar ainda que a hipertrofia cardíaca em resposta ao treinamento físico é diferente da
hipertrofia patológica, por exemplo, causada pela Doença de Chagas e pela hipertensão arterial. Na
hipertrofia relacionada com a hipertensão arterial, há um aumento no tamanho do coração, porém
não há aumento da força de contração, tornando, assim, uma contração insuficiente para ejetar
sangue da maneira adequada para a irrigação de órgãos e tecidos do corpo humano (TORTORA;
DERRICKSON, 2018).
Sistema circulatório e exercício físico 67

Por isso, devemos ter claro que a hipertrofia cardíaca está relacionada ao tipo do treinamento
executado. Por exemplo, o treinamento aeróbico provoca hipertrofia ventricular relacionada à
sobrecarga volêmica. Como em uma prova de longa distância no atletismo. Nesse caso, o aumento
venoso proporciona um maior volume diastólico final (POWERS; HOWLEY, 2017).
Além disso, o estresse mecânico provocado pelo enchimento dos ventrículos com maior
volume de sangue induz a uma sobrecarga de volume, que pode promover um aumento das
câmaras cardíacas se esse estímulo for repetido com caráter crônico. Essa hipertrofia referida
provoca um aumento no volume sistólico e na força de ejeção, pois o ventrículo esquerdo possui
a maior capacidade volumétrica. Diante disso, o volume sistólico de repouso, em valores médios,
ultrapassa 70 e chega a 100 ml em homens e se altera de 60 para 80 ml em mulheres (IDE;
LOPES; SARRAIPA, 2010).
Já a hipertrofia cardíaca promovida por exercícios de caráter resistido, como é o caso da
musculação, por exemplo, ocorre na parede ventricular esquerda. McArdle, Katch e Katch (2017)
afirmam que quando estamos realizando exercícios resistidos, ocorrem picos de pressão arterial.
Com isso, a força de contração ventricular deve ser maior do que a pressão da aorta, objetivando
ejetar o sangue para o corpo. Esse processo gera um espessamento do septo interventricular, além
de um espessamento da parede ventricular.
Diante de tudo o que está sendo exposto, a prática de atividades se faz muito importante no
combate da hipertensão arterial, visto que o exercício físico vem se mostrando um grande aliado
tanto na prevenção quanto no tratamento da doença. Assim, a compreensão dos mecanismos que
controlam a pressão arterial é de suma importância para sua vida acadêmica.

5.2 Frequência cardíaca


A literatura mostra que frequência cardíaca nada mais é do que o número de batimentos
cardíacos em um intervalo de tempo, comumente relacionado a minuto, ou seja, batimentos por
minuto (bpm) (TORTORA; DERRICKSON, 2018).
Vale ressaltar que esses batimentos compõem o ciclo cardíaco, que é subdividido em dois e
organiza um período de relaxamento das câmaras cardíacas, denominado diástole. O segundo ciclo
é chamado de sístole, e tem como característica a contração, ou seja, o momento em que o sangue
é ejetado em direção às artérias.
Com isso, fica evidente que quanto mais o coração bate, maior será a nossa frequência
cardíaca, e esse fato está diretamente associado ao exercício físico. Powers e Howley (2017)
ressaltam que, durante o exercício, o tecido muscular em atividade precisa de nutrientes além do
oxigênio para promover energia e, consequentemente, o ato esportivo.
A literatura atual mostra que a frequência cardíaca em repouso varia entre 60 e 80 bpm.
Porém, esse valor sofre alterações devido a idade, condições ambientais e, principalmente, ao nível
de aptidão física do indivíduo. Vale ressaltar ainda que atletas ou pessoas que estão com nível de
condicionamento físico elevado apresentam valores mais baixos. Essas alterações são provenientes
de respostas fisiológicas que descreveremos no decorrer desta seção (PITHON-CURI, 2013).
68 Fisiologia do exercício e do esporte

Quando nos referimos ao comportamento da frequência cardíaca durante o exercício,


precisamos compreender o que significa a resposta antecipatória ao estímulo. Esse termo se refere
a uma pequena elevação da frequência cardíaca em comparação com os valores de repouso. Mas o
que de fato provoca essa alteração antes mesmo do início do exercício? Para que entendamos esse
processo fisiológico, precisamos falar sobre adrenalina e noradrenalina (POWERS; HOWLEY, 2017).
Tortora e Derrickson (2018) afirmam que a adrenalina é um hormônio secretado pelas
glândulas suprarrenais na corrente sanguínea. Já a noradrenalina é um neurotransmissor secretado
pelo sistema nervoso simpático. Ambos agem em combinação para tal função.
Para que você compreenda melhor esse processo, convém dizer que quando o exercício físico
tem início, a frequência cardíaca se eleva constantemente em função da intensidade do exercício.
Nesse caso também se associa o consumo de oxigênio do indivíduo. Quando esses limites estão
próximos, a tendência é uma estabilização da frequência cardíaca, indicando que a frequência
cardíaca máxima foi alcançada (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Com base nisso, Powers e Howley (2017) afirmam que a frequência cardíaca pode ser
considerada um importante controlador da intensidade do exercício, pois a frequência cardíaca
máxima é proporcional ao consumo máximo de oxigênio, e pode servir como zona-alvo do
exercício, que depende obviamente de uma prescrição adequada com objetivos bem-traçados para
determinado gesto esportivo.
A literatura atual mostra inúmeros cálculos matemáticos para obter o valor da frequência
cardíaca máxima; o mais usado é baseado na idade, conforme a fórmula a seguir.

Frequência cardíaca máxima = 220 - idade

Então, a frequência cardíaca máxima se refere à maior frequência cardíaca alcançada durante
a realização de um exercício de caráter máximo. Vale ressaltar também outra fórmula comumente
utilizada na aferição da frequência cardíaca máxima, que se mostra mais fidedigna e precisa, pois
utiliza um padrão mais fisiológico: a frequência cardíaca de reserva, que diz respeito à diferença
entre a frequência cardíaca máxima e a de repouso (KARVONEN; KENTALA; MUSTALA, 1957).

FC treino = FC de reserva + intensidade × (FC máxima - FC de reserva)

Vale ressaltar aqui que a frequência cardíaca de reserva se refere à frequência cardíaca ao
acordar, porém, antes de se levantar, pois nesse caso o indivíduo permaneceu entre seis e oito horas
em repouso. Essa medida é importante, pois tem a capacidade de detectar inúmeras patologias
associadas ao aparelho cardiovascular. Os valores médios para essa variável estão entre 60 e 65 bpm
(TORTORA; DERRICKSON, 2018).
Sistema circulatório e exercício físico 69

Por outro lado, quando falamos em atletas, vimos que eles possuem valores médios de
frequência cardíaca mais baixos do que os de indivíduos sedentários. Pois bem, nas pessoas
bem‑treinadas fisicamente, essa medição pode chegar a 40 bpm. Com isso, fica cada vez mais
claro que quanto mais baixa for a frequência cardíaca, seja ela em repouso ou no exercício, a o
coração terá menos trabalho para realizar sua atividade (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Nesse sentido, precisamos falar de um parâmetro de suma importância, a variabilidade de
frequência cardíaca. Segundo McArdle, Katch e Katch (2017), ela é regulada pelo sistema nervoso
autônomo em resposta ao equilíbrio entre a divisão simpática e a parassimpática do sistema
nervoso. A variabilidade de frequência cardíaca é a variação do intervalo de tempo decorrido
entre os batimentos cardíacos.
Pithon-Curi (2013) afirma que o intervalo de tempo decorrido entre dois batimentos cardíacos
é expresso em milissegundos e pode ser medido como o intervalo RR no ecocardiograma. Com
isso, a variabilidade de frequência cardíaca é calculada como um desvio-padrão do intervalo de
tempo RR em um período predeterminado. Uma grande variabilidade de frequência cardíaca pode
ser considerada uma variável satisfatória de equilíbrio entre a divisão simpática e parassimpática
do sistema nervoso.
Por outro lado, Powers e Howley (2017) dizem que a baixa variabilidade pode indicar a
existência de um desequilíbrio, principalmente na regulação autônoma do corpo humano. Mas
por que a variabilidade de frequência cardíaca é importante? Essa medida é de suma importância
porque a variação de tempo entre os batimentos cardíacos pode refletir um equilíbrio autônomo
e ser um excelente parâmetro para doenças relacionadas ao sistema cardiovascular. Ainda nesse
sentido, uma baixa variabilidade vem se mostrando preditiva de problemas circulatórios futuros,
como a morte súbita (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Qual pode ser a causa de uma baixa variabilidade de frequência cardíaca? Para Kraemer,
Fleck e Deschenes (2013), o sistema nervoso autônomo possui a função de regular inúmeros
eventos cardiovasculares, como a frequência cardíaca e sua variabilidade. Podemos ressaltar aqui
que a frequência cardíaca pode se elevar devido ao aumento da atividade simpática, ou diminuir,
devido ao aumento da atividade parassimpática.
O equilíbrio entre as divisões simpática e parassimpática reflete alterações nos batimentos
de um ciclo cardíaco. Inúmeros fatores podem influenciar esse equilíbrio e promover impactos
importantes na variabilidade da frequência cardíaca, como o aumento da idade e condições
patológicas relacionadas. Isso resultaria em uma resposta nessa variabilidade. Algumas doenças
se relacionam com a diminuição da variabilidade da frequência cardíaca, tais como: depressão,
cardiopatia, hipertensão arterial, e casos mais graves como um evento de infarto agudo do
miocárdio (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
A literatura atual vem mostrando que o comportamento sedentário associado à inatividade
física é um grande contribuinte para a diminuição da variabilidade de frequência cardíaca. Por
outro lado, a prática regular de atividade física, principalmente do exercício de caráter aeróbico,
vem se mostrando positiva nesse quesito.
70 Fisiologia do exercício e do esporte

5.3 Débito cardíaco


Para finalizar nossa conversa sobre o sistema cardiovascular e o exercício físico, não podemos
deixar de comentar sobre o débito cardíaco. Segundo Kraemer, Fleck e Deschenes (2013), o débito
cardíaco se refere à quantidade de sangue ejetado pelo coração por minuto. Vale ressaltar que a
quantidade de sangue é expressa em litros. Com isso, podemos deduzir claramente que o débito
cardíaco pode ser alterado dependendo da força de contração miocárdica e da frequência cardíaca.
O débito cardíaco é uma variável de extrema importância para a fisiologia do exercício,
conforme veremos no decorrer desta seção. E por ser tão importante, também podemos calculá-lo
utilizando fórmulas matemáticas, nesse caso, a multiplicação da frequência cardíaca pelo volume
de sangue ejetado.

Débito cardíaco = frequência cardíaca × volume sistólico

Como dito anteriormente, o débito cardíaco pode aumentar em decorrência do volume


sistólico ou da frequência cardíaca. Com isso, é possível deduzir que com o aumento da intensidade
do exercício, o débito cardíaco tende a aumentar também, pois haverá aumento do volume
sistólico e da frequência cardíaca, com o intuito de aumentar a oferta de oxigênio para os músculos
esqueléticos envolvidos no exercício (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Entendendo que o valor do débito cardíaco tende a aumentar com o exercício físico, qual é o
valor médio do débito cardíaco em repouso? Segundo Powers e Howley (2017), esse valor é próximo
de 5 litros/minuto, e, com o exercício, pode se elevar até 40 litros/minuto. Obviamente respeitando
a individualidade biológica de cada indivíduo, esses valores podem variar, principalmente, de
acordo com o nível de atividade física e composição corporal.
Ide, Lopes e Sarraipa (2010) afirmam que o fluxo de sangue tende a se modificar quando o
organismo sai da zona de conforto, isto é, do repouso para o exercício. Vale frisar que esse evento
fisiológico é mediado pelo sistema nervoso simpático, que objetiva levar maior fluxo sanguíneo
para áreas envolvidas no exercício em questão.
Pithon-Curi (2013) afirma ainda que o débito cardíaco também pode ser alterado devido a
outros fatores, como as condições climáticas durante o exercício, afinal, temperaturas mais altas podem
afetar o desenvolvimento do exercício, pois a dissipação do calor em ambientes com temperaturas
mais altas depende da evaporação do suor, e o sangue é o grande responsável pelo transporte de calor
dos músculos até a superfície do corpo (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Para que possamos entender mais a fundo a regulação do débito cardíaco em repouso e,
principalmente, durante o exercício, vamos conversar um pouco sobre a regulação do volume
sistólico, que é um dos componentes que fazem com que o débito cardíaco se altere.
Para Powers e Howley (2017), o volume sistólico é regulado pelo volume diastólico final,
pela pressão arterial aórtica média e pela força de contração ventricular. Ressalta-se que volume
diastólico final é o volume sanguíneo contido nos ventrículos no final da diástole do ciclo cardíaco.
Sistema circulatório e exercício físico 71

O volume diastólico final pode ser referido como pré-carga e possui influência direta no volume
sistólico. A chamada Lei Frank-Starling do coração demonstra que a força de contração ventricular
aumenta junto ao volume diastólico final.
Vamos abordar mais minuciosamente o assunto, para que você compreenda melhor. O
aumento do volume diastólico final é resultado do alongamento das fibras musculares cardíacas e,
com isso, há melhora na força de contração, pois as fibras musculares possuem um certo nível de
flexibilidade. Segundo o mecanismo que explica a influência do comprimento das fibras sobre a
contratilidade cardíaca, um aumento do comprimento das fibras cardíacas aumenta o número de
interações de ponte cruzada de miosina com actina, resultando em aumento da produção da força.
Uma elevação da contratilidade cardíaca resulta em aumento da quantidade de sangue bombeado
por batimento (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Powers e Howley (2017) afirmam ainda que a principal variável que consegue influenciar
o volume diastólico final é a taxa de retorno venoso para o coração. Ou seja, um aumento do
retorno venoso pode resultar em uma elevação do volume diastólico final, e, consequentemente,
no aumento do volume sistólico. Mas quais são os fatores que interferem no aumento do retorno
venoso no exercício? Podemos destacar três eventos relacionados: venoconstrição, bomba muscular
e difusão respiratória.
A venoconstrição nada mais é do que a constrição das veias. Ela aumenta o retorno venoso
ao diminuir a capacidade de volume das veias de armazenamento de sangue. Com isso, o resultado
de uma capacidade de volume reduzida nas veias é, exatamente, a movimentação do sangue de
volta para o coração. Ide, Lopes e Sarraipa (2010) afirmam que a venoconstrição ocorre devido a
uma constrição simpática reflexa da musculatura lisa nas veias.
Por outro lado, a bomba muscular é a ação bombeadora da musculatura esquelética em
contração. Ela é resultado da ação mecânica de contrações musculares esqueléticas de caráter
rítmico. Com isso, os músculos contraídos durante o exercício tendem a comprimir as veias, e
essa compressão impulsiona o sangue de volta para o coração. Entre cada conjunto de contração
rítmica, o sangue volta a encher as veias, e isso acontece repetidamente enquanto houver o estímulo
de contração. Vale frisar que durante as contrações isométricas, a bomba muscular fica inoperante
e o retorno venoso para o coração diminui (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Quando nos referimos à difusão respiratória, precisamos entender que ela é a ação
bombeadora do sistema respiratório, ou seja, o padrão rítmico da respiração também tem uma
atuação na bomba mecânica, promovendo o retorno venoso. Vamos relembrar sobre a difusão
respiratória. Quando estamos respirando, há uma diferença de pressão. A pressão do tórax tende
a diminuir e a pressão na região abdominal tende a aumentar. Como resposta, há a criação de
um fluxo sanguíneo proveniente de sangue venoso da região do abdômen na direção do tórax,
contribuindo para o retorno venoso (POWERS; HOWLEY, 2017).
A literatura atual vem mostrando cada vez mais que o papel da difusão respiratória é,
obviamente, exacerbado quando estamos realizando algum exercício físico, sendo resultado da
maior frequência e profundidade respiratória.
72 Fisiologia do exercício e do esporte

Vale ressaltar que o débito cardíaco aumenta durante o exercício proporcionalmente à taxa
metabólica necessária à realização do exercício. Devemos compreender também que, durante a
realização dos exercícios, há um aumento do débito cardíaco, e esse aumento é mediado por um
aumento do volume sistólico, juntamente a um aumento da frequência cardíaca (MCARDLE;
KATCH; KATCH, 2017).

Considerações finais
Chegamos ao fim de mais um capítulo de extrema importância para o nosso entendimento
acerca da ciência da fisiologia do exercício. O que precisa ficar claro no nosso entendimento é
exatamente a repercussão fisiológica do exercício perante o sistema cardiovascular. Esse sistema
possui uma importância direta na qualidade do exercício praticado, pois sabemos que o nosso
organismo precisa de um substrato energético para a realização do gesto esportivo, e o sistema
circulatório contribui de maneira direta para esses substratos.
Além disso, as variáveis que são mais importantes nesse quesito são: pressão arterial,
frequência cardíaca e débito cardíaco. Essas variáveis se associam com a intensidade do exercício e
existem outras variáveis dependentes dessas principais, como volume sistólico, a própria força de
contração miocárdica, viscosidade sanguínea, entre outras.
Portanto, esse é um conteúdo com o qual devemos ter bastante cautela no que se refere à
prescrição de exercício; além disso, pode ser importantíssimo para medidas de segurança durante
o exercício, bem como para o controle da sua intensidade, buscando os objetivos traçados na
periodização.

Ampliando seus conhecimentos


• POLITO, M. D.; FARINATTI, P. de T. V. Considerações sobre a medida da pressão arterial
em exercícios contra-resistência. Rev. Bras. Med. Esporte, Juiz de Fora, v. 9, n. 1, p. 25-33,
jan./fev. 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbme/v9n1/v9n1a05.pdf. Acesso
em: 3 out. 2019.
Para que compreendamos ainda mais sobre a pressão arterial, especificando as formas
de aferição, sugiro a leitura desse artigo. Trata-se de uma revisão dos métodos utilizados
para a aferição da pressão arterial durante o exercício contrarresistência. Ressaltamos
a importância de o profissional da área de saúde ter conhecimento sobre tal conteúdo
específico, visto que a pressão arterial é uma variável importantíssima e sua aferição
durante um exercício contrarresistência se torna crucial.

• GELEILETE, T. J. M.; COELHO, E. B.; NOBRE, E. Medida da pressão arterial. Rev. Bras.
Hipertens., v. 16 n. 2, p. 118-122, 2009. Disponível em: http://departamentos.cardiol.br/
dha/revista/16-2/13-medida.pdf. Acesso em: 3 out. 2019.
Sistema circulatório e exercício físico 73

Tratando-se da pressão arterial, os profissionais da área de saúde precisam ter


conhecimento sobre as medidas, a aferição e os fatores relacionados à vida de determinada
pessoa, a fim de ter uma visão geral do quadro de determinado indivíduo, o que é de suma
importância na elaboração e prescrição do exercício. Para tanto, sugerimos a leitura do
artigo supracitado.

• LAURIA, A. de A. et al. Predição da frequência cardíaca basal de indivíduos com níveis de


atividade física alto e baixo. Rev. Bras. Med. Esporte, Juiz de Fora, v. 19, n. 1, jan./fev. 2013.
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbme/v19n1/04.pdf. Acesso em: 3 out. 2019.
A frequência cardíaca basal é medida ao despertar e apresenta alterações rítmicas
ao longo do dia. Para compreender um pouco mais sobre a frequência cardíaca basal
e correlacioná‑la com o nível de atividade física de cada indivíduo, sugerimos a leitura
desse artigo.

Atividades
1. A pressão arterial é uma variável de extrema importância para o estudo e entendimento da
fisiologia do exercício. Descreva essa importância e, principalmente, como a pressão arterial
se comporta durante o exercício e quais são as devidas respostas fisiológicas no sistema
circulatório.

2. O termo variabilidade da frequência cardíaca é comumente utilizado por fisiologistas ao


redor do mundo, tendo caráter fundamental para relacionar a frequência cardíaca com o
exercício. Qual é a real importância da variabilidade da frequência cardíaca para a fisiologia
do exercício?

3. O volume sistólico é uma variável importantíssima para o débito cardíaco. Por sua vez, ele
pode ser alterado no organismo por meio de três processos. Cite e explique esses processos,
relacionando-os com a fisiologia do exercício.

Referências
ANUNCIAÇÃO, P. G.; POLITO; M. D. A review on post-exercise hypotension in hypertensive individuals.
Arq. Bras. Cardiol., Londrina, v. 96, n. 5, p. 100-109, 4 mar. 2011. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0066-782X2011000500019&lng=pt&nrm=iso&tlng=en. Acesso em: 3 out.
2019.

IDE, B. N.; LOPES, C. R.; SARRAIPA, M. F. Fisiologia do treinamento esportivo: força, potência, velocidade,
resistência, periodização e habilidades psicológicas. São Paulo: Phorte, 2010.

KARVONEN, M. J.; KENTALA, E.; MUSTALA, O. The effects of training on heart rate a longitudinal study.
Ann. Med. Exp. Biol. Fenn., Finland, v. 35, n. 3, p. 307-315, 1957. p. 307-315.
74 Fisiologia do exercício e do esporte

KRAEMER, W. J.; FLECK, S. J.; DESCHENES, M. R. Fisiologia do exercício: teoria e prática. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2013.

MCARDLE, W. D.; KATCH, F. I.; KATCH, V. L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho
humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.

PITHON-CURI, T. C. Fisiologia do exercício. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

POWERS, S. K.; HOWLEY, E. T. Fisiologia do exercício: teoria e aplicação ao condicionamento e ao


desempenho. 9. ed. São Paulo: Manole, 2017.

SBC - Sociedade Brasileira de Cardiologia. VII Diretriz brasileira de hipertensão arterial. v. 107, n. 3, supl. 3,
set. 2016.

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2018.
6
Sistema endócrino e exercício físico

Chegamos ao último capítulo, no qual versaremos sobre o sistema endócrino que, junto
ao sistema nervoso, compõe os principais sistemas de comunicação do organismo humano,
pois ambos enviam sinais ou mensagens para influenciar respostas e adaptações fisiológicas. O
sistema endócrino envia um sinal na forma de hormônio, substância química liberada na corrente
sanguínea por uma glândula endócrina.
Entende-se como glândula um grupo organizado de células que funciona como um órgão
secretando substâncias químicas. Vale frisar que cada hormônio é liberado por uma glândula e
direcionado especificamente para um receptor em uma determinada célula. Logo, o termo receptor-
-alvo está relacionado com o conceito hormonal de um conjunto específico de destinos celulares
para o sinal enviado pela glândula.
Neste momento, é importante sabermos que um hormônio pode afetar muitas células
diferentes, mas apenas aquelas que possuem seu receptor específico. Além disso, o sistema
endócrino modula uma ampla gama de atividades corporais, como a função celular, o metabolismo, os
processos sexuais e reprodutores, o crescimento do tecido, a regulação dos líquidos corpóreos, a
síntese e degradação de proteínas e até os estados de humor.
Quando nos referimos ao comportamento do sistema endócrino relacionado ao exercício
físico, precisamos ressaltar que aumentos nas concentrações hormonais com o exercício são
de suma importância para a modulação das funções fisiológicas, bem como para o reparo e o
remodelamento dos tecidos corpóreos.
Mais especificamente, os hormônios produzidos e secretados pelas glândulas endócrinas
têm a capacidade de ativar os sistemas enzimáticos. Eles conseguem alterar a permeabilidade
das membranas celulares, modificar o transporte através da membrana plasmática e o ritmo da
atividade enzimática, induzindo à secreção.
Mas qual é a contribuição desses eventos para o exercício físico? De uma forma geral,
contribuem para a contração e o relaxamento dos músculos, além de estimular a síntese das
proteínas e gorduras.
Com base nisso, a partir de agora vamos abordar a relação do sistema endócrino no repouso
e no exercício, além de ressaltar as mudanças desse sistema com a indução do exercício físico.
76 Fisiologia do exercício e do esporte

6.1 Respostas hormonais e exercício físico


Para começarmos a entender as respostas hormonais atreladas ao exercício físico, é de suma
importância reconhecermos a resposta do sistema endócrino para o exercício.
Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) afirmam que as respostas agudas ao exercício ajudam o
corpo a funcionar durante a atividade, além de regular o metabolismo. A recuperação do estresse
gerado com o reparo do tecido subsequente também estão ligados às respostas hormonais.
Nessa abordagem inicial, é importante destacar que os hormônios e seus receptores
medeiam as adaptações do exercício físico. Vale ressaltar que adaptações são as mudanças crônicas
das respostas fisiológicas, da anatomia ou da morfologia, por exemplo: o tamanho do coração,
a densidade óssea, a pressão arterial, o tamanho da fibra muscular, entre outras (POWERS;
HOWLEY, 2017).
Ainda nesse sentido, o exercício físico é muito complexo e possui demandas específicas. Ide,
Lopes e Sarraipa (2010) ressaltam, por exemplo, que o estresse físico pode resultar em aumentos
metabólicos de mais de dez vezes, além de requerer uma produção de força de caráter máximo.
Com isso, os gestos esportivos também possuem peculiaridades específicas, como uma
maratona que pode ser percorrida em duas horas de atividade contínua, e o levantamento de
peso, no qual podem ser levantados 450 quilos. É importante que saibamos que os hormônios
medeiam parcialmente tanto o desempenho quanto a recuperação de todos os tipos de exercício
(MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
As respostas hormonais nos exercícios físicos podem servir de estímulo para que
determinados hormônios sejam secretados ou para inibir a própria secreção. Nesse sentido, essas
secreções ou inibições podem ocorrer por feedback positivo ou negativo, conforme discutimos no
Capítulo 1 desta obra.
No que se refere às funções dos hormônios no organismo, cada um exerce atividades
específicas no corpo humano, como a tiroxina, cujos receptores estão presentes em todas as
células. A função desse hormônio está relacionada com a aceleração do metabolismo da glicose,
das proteínas e das gorduras, sendo capaz de regular o crescimento do corpo humano, bem como
desenvolver características relacionadas à fertilidade (POWERS; HOWLEY, 2017).
Nesse sentido, não podemos deixar de conhecer um pouco sobre o hormônio do crescimento
(GH). Ele traz inúmeras contribuições para o corpo humano e para o exercício físico. Entre essas
contribuições estão a síntese proteica, o aumento da utilização dos lipídios, a diminuição da glicose
para a obtenção de energia e o aumento na captação dos aminoácidos. Esse hormônio aumenta a
estimulação da reprodução celular, que representa o crescimento do tecido, dos ossos e cartilagens
(PITHON-CURI, 2013), além de estimular o fígado a secretar proteínas específicas.
Mas como o GH se relaciona com a prática do exercício físico? McArdle, Katch e Katch
(2017) afirmam que a secreção do hormônio do crescimento em resposta ao exercício é
dependente da intensidade e da duração da atividade, bem como do nível de aptidão física de
cada indivíduo. A concentração plasmática de catecolaminas, tanto durante o exercício como em
Sistema endócrino e exercício físico 77

repouso, associa-se positivamente à concentração de GH. Além disso, o exercício físico vigoroso
induz o aumento do íon hidrogênio (H+) na corrente sanguínea e pode estimular a secreção de GH.
Esse mecanismo é suportado pelo fato de que a alcalose induzida durante a prática de
exercício físico tende a reduzir a resposta aguda de GH. Por outro lado, o hormônio do crescimento
também é secretado devido à hipoglicemia. Assim, durante o exercício e sua recuperação, o
hormônio do crescimento consegue estimular a lipólise, ou seja, a oxidação dos ácidos graxos,
aumentando a sensibilidade da ação das catecolaminas e a síntese adicional de receptores beta-
-adrenérgicos no tecido adiposo (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
É de suma importância que entendamos que as concentrações mais altas do hormônio do
crescimento na corrente sanguínea tendem a contribuir para a recuperação pós-exercício. Essa
recuperação se refere à “economia” de glicose, ao glicogênio muscular em níveis mais altos e a um
aumento na quebra de lipídios dos músculos esqueléticos.
Vale relembrar que cada tipo de exercício físico tem uma peculiaridade no que se refere ao
hormônio do crescimento. Por exemplo, um atleta de prova de 100 metros rasos atinge valores
mais altos de secreção de GH do que atletas de maratona. Isso se explica devido às adaptações
necessárias, que envolvem maiores níveis de síntese tecidual em comparação com o atleta de
maratona (POWERS; HOWLEY, 2017).
Nesse mesmo sentido, Pithon-Curi (2013) ressalta que também há uma diferença no que
se refere ao nível de aptidão física do indivíduo. Pessoas com menores níveis de aptidão física
mostram uma secreção maior de GH do que aquelas com maiores níveis de aptidão física. A
literatura mostra que os indivíduos com maior aptidão física necessitam de uma menor síntese
tecidual do que os sedentários, em termos de massa muscular.
De acordo com McArdle, Katch e Katch (2017), a secreção do hormônio do crescimento
também está relacionada com a intensidade e a duração do exercício. Maiores secreções de
GH induzidas pelo exercício ocorrem quando a intensidade da atividade é superior ao limiar
anaeróbico (entre 70% e 90% VO2 máx).
O auge da secreção do hormônio do crescimento durante o exercício tende a ocorrer
mais tardiamente. Uma única sessão de exercício de caráter aeróbico de alta intensidade durante
10 minutos pode prover um aumento na secreção de GH somente no período de recuperação
(MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
Quando esse mesmo estímulo é estendido para 45 minutos, por exemplo, o pico de
secreção do GH ocorre durante a prática do exercício. Esse modelo lento pode promover um
pico de secreção, geralmente no término da atividade física, que coincide com o pico de liberação
e utilização dos ácidos graxos do tecido adiposo (PITHON-CURI, 2013).
Em relação ao treinamento resistido, Ide, Lopes e Sarraipa (2010) ressaltam que esse tipo
de treino promove um aumento na concentração do hormônio do crescimento na corrente
sanguínea, tanto em homens quanto em mulheres. Esse fato está relacionado a: quantidade de
músculo ativo durante o exercício; intensidade do exercício; volume do exercício; intervalo
78 Fisiologia do exercício e do esporte

de repouso entre as séries; tipo de ação muscular; maior resposta observada em protocolos
envolvendo ações concêntricas comparadas às excêntricas; e nível de treinamento.
Outro fator importantíssimo é a secreção de GH durante o sono e em condições climáticas
adversas. No período de sono, a liberação de GH é maior, e em condições climáticas adversas a
secreção desse hormônio também pode passar por modificações (POWERS; HOWLEY, 2017).
Agora precisamos falar sobre outro hormônio: o cortisol. Sabemos que qualquer estímulo
que perturbe a homeostase do corpo, como é o caso do exercício físico, tem uma resposta de
liberação do hormônio cortisol. Tortora e Derrickson (2018) afirmam que esse hormônio é
secretado pelo eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA).
Um exercício físico praticado intensamente ou com um caráter submáximo tende a
promover um aumento na atividade do eixo HHA e, consequentemente, na concentração
plasmática de cortisol (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013). Isso significa que o hormônio
do cortisol tende a estimular a lipólise no tecido adiposo, além da degradação de proteínas nos
tecidos mais periféricos.
No músculo esquelético, por exemplo, o cortisol consegue reduzir a síntese de proteínas,
estimulando o catabolismo proteico no fígado. Como resposta a isso, ocorre um aumento de ácidos
graxos e aminoácidos na circulação durante o exercício físico. Já no período de recuperação, o
cortisol tende a facilitar a ressíntese de glicogênio no fígado, e o aumento na concentração de
lactato é um dos grandes fatores que ativam o eixo HHA durante a prática do exercício (IDE;
LOPES; SARRAIPA, 2010).
Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) ressaltam que a ativação simpática é um estímulo
importante para a elevação da secreção de cortisol no exercício. Alterações no volume plasmático
e osmolaridade induzidas pelo exercício também estimulam a liberação do ACTH (hormônio
adrenocorticotrófico ou corticotrofina) e do cortisol.
É importante ressaltar que, durante a prática de exercício, ocorre um aumento da atividade
adrenérgica, a qual representa a atividade elétrica de nervos simpáticos, além da concentração de
epinefrina e norepinefrina na corrente sanguínea. Entende-se que a epinefrina e norepinefrina
correspondem a catecolaminas (TORTORA; DERRICKSON, 2018), mas o que esse aumento
significa para o exercício físico? O aumento da atividade adrenérgica no exercício pode resultar
em um aumento da frequência cardíaca, do débito cardíaco, além da vasoconstrição da
circulação esplâncnica, formada pelos vasos do sistema gastrointestinal.
Por outro lado, Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) afirmam que as catecolaminas tendem
a atuar no metabolismo energético de algumas formas, tais como: estimulando a atividade de
glicogenólise (degradação de glicogênio por meio da retirada de moléculas de glicose) no músculo
esquelético; aumentando a liberação da glicose hepática; ativando os receptores β para liberação
de ácidos graxos do tecido adiposo; ativando os receptores α no pâncreas endócrino, inibindo
a secreção de insulina; estimulando a liberação de glucagon; aumentando a secreção de GH,
testosterona e cortisol.
Sistema endócrino e exercício físico 79

Nessa mesma linha de raciocínio, não podemos nos esquecer dos hormônios tireoidianos.
Para entender melhor a relação dos hormônios tireoidianos com o exercício físico, precisamos
compreender que o treinamento aeróbico de longa duração, ou seja, o treinamento de endurance,
tende a induzir uma maior produção de T4 e maior taxa de renovação, mantendo a concentração
de T4 em valores estreitos (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2017).
O aumento na taxa de renovação e o subsequente incremento na produção de T4 requerem
maior estimulação da glândula tireoide pela ação do seu hormônio estimulante (TSH). Por sua vez,
as peculiaridades do exercício também produzem alterações importantes nesse aspecto.
Exercícios com intensidade de leve a moderada não produzem alteração nas concentrações de
TSH; porém, quando são praticados em uma intensidade maior que 75% do VO2 máx, há elevação
de concentração de TSH após o exercício. Dessa maneira, fica claro que deve haver uma resposta
coordenada do eixo hipotálamo-hipófise-tireoide para a renovação de T4 nos exercícios intensos. Já
nos exercícios prolongados, os hormônios da tireoide e as catecolaminas atuam concomitantemente
na mobilização e oxidação de ácidos graxos (IDE; LOPES; SARRAIPA, 2010).
Para finalizar nosso estudo sobre as respostas hormonais atreladas ao exercício, precisamos
nos remeter ao glucagon e à insulina. De modo parecido com a ação da insulina, a prática de
exercício físico tende a estimular a captação de glicose, a síntese de proteína, a transcrição de genes,
a hipertrofia e o crescimento celular no músculo esquelético (TORTORA; DERRICKSON, 2018).
No início do exercício físico, a glicemia é mantida, e essa manutenção ocorre por um
aumento na descarga simpática, elevação da concentração de glucagon na corrente sanguínea e
redução da insulinemia (taxa de insulina sanguínea). O decréscimo na concentração de glicose
durante o exercício não é o fator que causa redução da concentração plasmática de insulina;
Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) afirmam que essa resposta é resultado da estimulação alfa-
-adrenérgica nas células-beta pancreáticas.
A redução da concentração de insulina no plasma durante o exercício favorece a
glicogenólise hepática, além da lipólise no tecido adiposo, levando à oxidação de ácidos graxos
no músculo esquelético. O efeito primário do glucagon durante o exercício é a estimulação da
glicogenólise hepática. O sistema nervoso simpático e as catecolaminas estimulam a secreção
de glucagon via receptores beta-adrenérgicos das células-alfa pancreáticas, e essa resposta pode
ocorrer mesmo sem alteração na concentração de glicose no sangue (POWERS; HOWLEY, 2017).
Conforme vimos, a relação dos principais hormônios envolvidos no exercício físico e
a regulação deles depende, entre outros fatores, da intensidade do exercício. Na próxima seção,
abordaremos as principais regulações baseadas na intensidade do exercício.
80 Fisiologia do exercício e do esporte

6.2 Regulação hormonal e exercício progressivo, intenso e


prolongado
A partir de agora, compreenderemos mais a fundo qual é a real diferença da regulação
hormonal nas diversas intensidades do exercício físico. Ide, Lopes e Sarraipa (2010) afirmam
que a regulação hormonal do metabolismo energético depende, principalmente, da duração e da
intensidade do estímulo físico.
Devemos entender também que cada secreção de hormônios na corrente sanguínea
tem uma resposta diferente no que se refere à intensidade do exercício (KRAEMER; FLECK;
DESCHENES, 2013). Vamos pensar nas catecolaminas, por exemplo. A secreção aumentada
desse hormônio gera respostas positivas, entre elas a lipólise do tecido adiposo e no interior dos
músculos esqueléticos.
Esse processo é de suma importância, pois aumenta a ação da fosforilase, a qual tem a
capacidade de degradar o glicogênio no processo de glicogenólise. Vale ressaltar que esse mesmo
processo se refere também a um aumento da secreção de outros hormônios, tais como: cortisol,
hormônio do crescimento, noradrenalina, adrenalina e glucagon (POWERS; HOWLEY, 2017).
Atrelado a isso, McArdle, Katch e Katch (2017) afirmam que esses aumentos nas
concentrações de determinados hormônios se associam às concentrações da glicose sanguínea e
à estimulação da divisão simpática do sistema nervoso autônomo.
Em relação à insulina e ao exercício progressivo, nota-se um comportamento diferente.
Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) ressaltam que esse hormônio se mostra com reduções de
concentrações ou estabilidade dos níveis de secreção. Outro ponto que merece destaque é que, nos
exercícios moderados, os níveis sanguíneos de insulina tendem a diminuir, e o que parece ser mais
interessante é que essa diminuição está associada com o aumento da secreção da adrenalina.
O aumento da concentração de adrenalina na corrente sanguínea tende a diminuir a secreção
pancreática de insulina, e esse processo tem uma grande importância em relação à intensidade do
exercício, pois intensificá-lo induz um aumento no percentual de VO2 máx, como já discutimos em
capítulos anteriores. Esse aumento se deve ao consumo de glicose nos músculos envolvidos com
o exercício, fazendo com que a sensibilidade à insulina tenda a aumentar também. É importante
entendermos a complexidade desse processo, que eleva também as concentrações de lactato
sanguíneo e a acidose, além de associar-se com a inibição da liberação da insulina (PITHON-
CURI, 2013).
Agora pensemos em exercícios de caráter intenso, como uma prova de 100 m rasos no atletismo
ou 50 m livres na natação. Nesses casos, a secreção de catecolaminas aumenta gradativamente, fazendo
com que o metabolismo celular nos músculos, no fígado e no tecido adiposo seja afetado.
Nesse ponto, vale frisar que o aumento de catecolaminas está relacionado ao consumo de
glicose. Ide, Lopes e Sarraipa (2010) afirmam que esse aumento tende a gerar uma dependência do
catabolismo dos carboidratos nos músculos, promovendo o consumo de glicose justamente devido
ao aumento da glicogenólise hepática. Essa ação é mediada pela atividade da adrenalina.
Sistema endócrino e exercício físico 81

Já no exercício de caráter prolongado, as concentrações de glicogênio hepático e muscular


tendem a diminuir. Essas baixas concentrações promovem um aumento na velocidade do
metabolismo da glicose, o que pode provocar uma hipoglicemia, isto é, uma redução do açúcar
do sangue.
Nesse mesmo sentido, Powers e Howley (2017) ressaltam que o exercício físico tende a
estimular a secreção de glucagon. É importante frisar que a ação do glucagon é inversa à da insulina
e o trabalho muscular promove uma secreção diminuída de insulina, com o objetivo de tornar a
glicose mais disponível para o exercício em questão.
Para que a nossa abordagem seja completa, precisamos falar sobre os exercícios de resistência.
Para isso, é preciso que tenhamos ciência de que a remodelagem dos músculos no treinamento de
resistência reflete um complexo processo de interação dos receptores celulares com diferentes
hormônios e a produção mediada pelo DNA de novas proteínas contráteis (PITHON-CURI, 2013).
A resposta específica à sobrecarga muscular está relacionada inicialmente com a
configuração do estímulo do exercício – intensidade, frequência, volume, sequência, modalidade
e intervalo de recuperação. Segundo Pithon-Curi (2013), os fatores hormonais responsáveis pelas
alterações induzidas pelo treinamento no tamanho e na função dos músculos incluem três fatores:
o primeiro se refere às modificações nas taxas de depuração hormonal hepática e extra-hepática;
o segundo é acerca da taxa de diferenciais de secreção hormonal com desvios concomitantes
de líquido nas proximidades dos locais receptores; e, por fim, o terceiro fator está relacionado à
ativação alterada nos locais receptores por meio do controle neuro-humoral.
Em geral, as adaptações na fase inicial ao treinamento de resistência refletem uma
resposta hormonal que medeia as adaptações do sistema neuromuscular que irão aprimorar a
força muscular. Testosterona e GH são dois hormônios primários que afetam as adaptações ao
treinamento de resistência (KRAEMER; FLECK; DESCHENES, 2013).
Para Powers e Howley (2017), a testosterona acelera a liberação do GH e interage com a
função do sistema nervoso para aumentar a produção de força muscular. Esses papéis podem ser
mais importantes do que qualquer efeito anabólico da testosterona propriamente dita. Uma única
sessão de treinamento de resistência em geral induz elevação de curta duração na testosterona
sérica e redução no cortisol, com maior resposta em homens do que em mulheres.
Kraemer, Fleck e Deschenes (2013) afirmam que a liberação de catecolaminas aumenta
com o estresse agudo dos protocolos com exercícios de alta força e de alta potência. Quando nos
referimos ao treinamento resistido, por exemplo, os homens possuem uma resposta hormonal
interessante para esse tipo de treino: tem-se o aumento tanto da amplitude quanto da frequência
de secreção de GH e testosterona. Isso se torna muito importante para a hipertrofia muscular, pois
gera um ambiente hormonal favorável para promover o crescimento do músculo.
Para finalizar nossos estudos acerca do sistema endócrino, vale dizer que a resposta da
testosterona ao exercício de resistência revela vários fatores que fazem aumentar sua secreção.
Os mais efetivos incluem a ativação de grandes grupos musculares com levantamentos de grande
intensidade, elevações e agachamentos de potência e outras formas de exercício pesado de
82 Fisiologia do exercício e do esporte

resistência, ou um treinamento de alto volume (quantidade total) com múltiplas séries e/ou uma
atividade física com pequenos intervalos.
Pithon-Curi (2013) afirma que o aumento dos níveis de testosterona, promovido pelo
treinamento resistido em homens, correlaciona-se positivamente com o aumento da força muscular.

Considerações finais
Com base na leitura e compreensão deste capítulo, fica evidente a importância do sistema
endócrino no que se refere à prática do exercício físico – importância esta que muito se relaciona
com o tipo e a intensidade do exercício praticado. Portanto, é de suma relevância que você
compreenda objetivamente a relação entre quais tipos de hormônios e quais tipos e intensidades
de exercícios podem nos trazer benefícios ou até prejuízos no rendimento esportivo.
Neste capítulo, abordamos de maneira sucinta e objetiva as respostas hormonais inerentes
ao exercício, bem como a regulação do sistema endócrino com o incremento do exercício físico.

Ampliando seus conhecimentos


• MCARDLE, W. D.; KATCH, F., I.; KATCH, V., L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia
e desempenho humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.
Para que compreendamos de uma forma geral o funcionamento do sistema endócrino
associado ao exercício físico, é de grande valia o entendimento do funcionamento desse
sistema. Assim, para ter uma visão geral desse sistema, bem como da sua organização
morfológica e funcional, sugerimos a leitura do Capítulo 20, intitulado “Sistema
endócrino: organização e respostas agudas e crônicas à atividade física”.

• OLIVEIRA, R. J. et al. Respostas hormonais agudas a diferentes intensidades de exercícios


resistidos em mulheres idosas. Rev. Bras. Med. Esporte, v. 14, n. 4, jul./ago. 2008. Disponível
em: http://www.scielo.br/pdf/rbme/v14n4/v14n4a09.pdf. Acesso em: 14 set. 2019.
Com o intuito de trazer todo o conhecimento teórico apresentado neste capítulo para a
prática cotidiana, sugerimos a leitura do artigo de Ricardo Jacó de Oliveira, que tem como
objetivo comparar as respostas hormonais agudas resultantes de diferentes intensidades
de exercícios resistidos realizados por mulheres idosas. Esse artigo tem uma importância
muito grande na nossa área, pois sabemos que o tema envelhecimento está cada vez mais
em alta na ciência. Assim, o material retrata exatamente a relação entre sistema endócrino,
diferentes intensidades do exercício e o envelhecimento.
Sistema endócrino e exercício físico 83

Atividades
1. Sabe-se que o sistema endócrino é responsável pela liberação de determinadas substâncias
químicas na corrente sanguínea por glândulas endócrinas. Essas substâncias são chamadas
de hormônios e têm a função determinada no que se refere ao exercício físico. Explique como
o sistema endócrino pode contribuir para o rendimento do esporte.

2. Alguns hormônios têm atividade essencial para o sistema endócrino e para a manutenção
da vida, enquanto outros se associam também com exercício físico, como é o caso da
testosterona, que possui uma relação primordial no que se refere aos exercícios de resistência.
Explique as relações da testosterona com os exercícios de resistência.

3. Descreva, com suas próprias palavras, a relação do GH com o exercício físico.

Referências
IDE, B. N.; LOPES, C. R.; SARRAIPA, M. F. Fisiologia do treinamento esportivo: força, potência, velocidade,
resistência, periodização e habilidades psicológicas. São Paulo: Phorte, 2010.

KRAEMER, W. J.; FLECK, S. J.; DESCHENES, M. R. Fisiologia do exercício: teoria e prática. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 2013.

MCARDLE, W. D.; KATCH, F., I.; KATCH, V., L. Fisiologia do exercício: nutrição, energia e desempenho
humano. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2017.

PITHON-CURI, T. C. Fisiologia do exercício. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013.

POWERS, S. K.; HOWLEY, E. T. Fisiologia do exercício: teoria e aplicação ao condicionamento e ao


desempenho. 9. ed. São Paulo: Manole, 2017.

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, 2018.
Gabarito

1 Homeostase e estado estável


1. Cada célula se beneficia da homeostasia e contribui para a sua manutenção. Essa in-
teração proporciona a automaticidade continuada do organismo, até que os sistemas
funcionais percam a capacidade de contribuir com a sua parcela da função. Quando isso
acontece, todas as células do corpo humano sofrem. A disfunção moderada pode levar à
doença e, de modo extremo, até à morte.

2. De maneira geral, os exercícios físicos podem afetar a homeostase, causando alterações


cardiorrespiratórias, como aumento dos batimentos cardíacos, elevação da pressão arte-
rial, redistribuição do fluxo cardíaco e maior ventilação nos pulmões.

• Aumento dos batimentos cardíacos: o corpo humano necessita de oxigênio para


realizar as suas funções. Quanto mais intenso é o exercício físico, de mais oxigênio
o corpo vai necessitar, por isso o coração bate mais rápido, para levar mais oxigênio
para os músculos que estão em trabalho contínuo.
• Aumento da pressão arterial: durante os exercícios físicos, há uma elevação da pres-
são arterial; como o coração está batendo mais rápido, a quantidade de sangue bom-
beada também é maior, o que causa esse aumento.
• Redistribuição do fluxo de sangue: quando o corpo está em atividade física, os mús-
culos precisam de mais sangue, que é desviado para suprir essa necessidade. Quando
estamos em repouso, 15% a 20% do sangue vai para os músculos do nosso corpo. Essa
quantidade sobe para 80% a 85% quando estamos fazendo exercício físico.
• Maior ventilação dentro dos pulmões: ventilação pulmonar é a quantidade de ar
trocada entre o corpo e o meio externo por minuto. Quando estamos fazendo exercí-
cio físico, o organismo precisa de mais oxigênio e, com isso, o consumo de oxigênio
também aumenta, fazendo com que o dióxido de carbono seja eliminado com maior
intensidade.
3. A homeostase se caracteriza como um ambiente interno constante, e isso só é possível
devido a inúmeras respostas fisiológicas de caráter compensatório. Por outro lado, o
estado estável significa que o ambiente interno não está se alterando, e isso quer dizer
que o equilíbrio foi obtido entre as demandas impostas pelo organismo e a resposta deste
a elas. Exemplificando, durante um exercício submáximo, com duração de 60 minutos e
com carga controlada, a temperatura corporal chega a atingir um novo nível estável por
volta dos 40 minutos de exercício. Vale ressaltar que essa nova temperatura constante é
superior à temperatura corporal inicial, por isso não representa uma condição homeos-
tática. Com isso, o termo homeostase se refere às condições normais do repouso. Já o
chamado estado estável trata de uma variável do ramo da fisiologia do exercício na qual
não há alteração, porém não é igual ao valor da homeostase em repouso.
86 Fisiologia do exercício e do esporte

2 Fontes energéticas para o exercício físico


1. A fosfocreatina (CP) exerce papel extremamente importante no mecanismo de contração
muscular. Essa importância está relacionada ao fornecimento do fosfato para que o ciclo do
ATP possa se manter por mais tempo. Pode ser considerada como um combustível que fica
armazenado em nossas células, pronto para ser usado quando necessário. Além disso, tem a
capacidade de manter o ATP sempre presente em um nível adequado para a necessidade do
músculo. Por outro lado, a ressíntese do ATP se torna essencial nos primeiros 10 segundos
de atividades físicas de caráter máximo.

2. Para os estímulos de caráter máximo, que ocorrem entre 1 e 10 segundos, o sistema


fosfagênio se mostra como o principal gerador de energia, pois depende, exclusivamente,
da contribuição do sistema creatina fosfato. Passado esse período, há um novo protagonista
na geração de energia, em um período entre 10 e 90 segundos: a glicólise. Para finalizar,
em exercícios superiores a 90 segundos, 80% da energia gerada é proveniente do sistema
oxidativo.

3. A reação das diferentes enzimas ocorre com a liberação de energia durante o processo de
quebra da molécula original. A energia livre liberada nessas reações é responsável pelos
processos de contração muscular e pelos estímulos elétricos neurais que controlam os
movimentos corporais e a regulação hormonal. Portanto, quando se pensa em qualquer
atividade que utilize movimentos, ou mesmo o repouso, é possível compreender que se está
liberando energia pela quebra de moléculas de ATP, as quais estão sendo utilizadas para a
realização de tal atividade.

3 Sistema neuromuscular e exercício físico


1. A chamada fadiga muscular é um evento que ocorre quando, por excesso do trabalho
muscular, o músculo se torna incapaz de sustentar a força máxima de contração, mesmo que
continue sendo estimulado. Já a propriocepção é um evento de caráter sensorial, responsável
por captar informações do aparelho locomotor; está relacionada à sensação que o movimento
cria e ao senso de posição do corpo ou de parte dele. Além disso, admite estabelecer a relação
do corpo com o espaço em torno de si. Tanto a fadiga muscular como a propriocepção
assumem a função de proteger o músculo de lesões, bem como de melhorar e solidificar a
contração muscular.

2. O músculo esquelético possui três formas de se contrair: pode gerar uma contração
concêntrica, excêntrica ou isométrica. Do ponto de vista celular e molecular, a contração
concêntrica promove o encurtamento do músculo, deslizando os filamentos de actina
e miosina na direção do centro do sarcômero. Por outro lado, na contração excêntrica,
ocorre o inverso: o músculo se contrai, aumentando o seu comprimento, fazendo com
que o deslizamento dos filamentos ocorra no sentido inverso, na direção das extremidades
do sarcômero. Por fim, na contração isométrica, o músculo se contrai, porém não gera
deslizamento nos filamentos de actina e miosina.
Gabarito 87

3. A unidade motora ou placa motora é um dos pontos primordiais para entender a


contração muscular, pois os eventos que acontecem na placa motora seguem uma ordem
e um delineamento específico. Primeiramente, o neurônio precisa liberar a ACh que está
armazenada em suas vesículas sinápticas; já na fenda sináptica, a ACh ativará os receptores
de ACh localizados na membrana plasmática da fibra muscular; com isso, há a abertura
de canais iônicos específicos, despolarizando, assim, a membrana plasmática da fibra
muscular, com o intuito de propagar o potencial de ação para a célula muscular. Com isso,
o ATP no interior da fibra muscular deverá ser hidrolisado, gerando energia; assim, logo
após a fixação dos filamentos de actina e miosina, há o movimento de força com a energia
proveniente do ATP hidrolisado. Após o deslizamento, a atividade da acetilcolinesterase
encerra o ciclo de contração, quebrando a molécula de ACh.

4 Sistema respiratório e exercício físico


1. O volume e a capacidade pulmonar podem ser subdivididos em dois grupos: estáticos e
dinâmicos. Dentro da subdivisão estática, destaca-se:

• Volume de reserva expiratório (VRE): refere-se ao volume de ar que consegue sair dos
pulmões depois de uma expiração corrente.
• Volume de reserva inspiratório (VRI): trata-se do volume de ar que consegue entrar nos
pulmões depois de uma inspiração corrente.
• Volume de ar corrente (VAC): aborda o volume de ar que consegue entrar e sair dos pulmões
em um ciclo ventilatório. Entende-se que o ciclo ventilatório é inspiração mais expiração.
• Volume pulmonar residual (VPR): refere-se ao volume de ar que persiste dentro dos
pulmões depois de uma expiração máxima.
• Capacidade vital forçada (CVF): é a soma do volume de ar corrente com o volume de
reserva inspiratório e o volume de reserva expiratório.
• Capacidade residual funcional (CRF): é a soma do volume de reserva expiratório com o
volume pulmonar residual.
• Capacidade pulmonar total (CPT): refere-se à soma dos volumes pulmonares (VRE
+ VRI + VAC + VPR).

Quando nos referimos ao volume e à capacidade dinâmica, os termos são:


• Volume expiratório forçado (VEF): é a quantidade de ar expirado no primeiro segun-
do partindo da inspiração máxima.
• Capacidade vital forçada (CVF): refere-se à quantidade de ar expirado com esforço má-
ximo partindo da inspiração máxima.
É importante sabermos que o volume e a capacidade do grupo estático estão relaciona-
dos à função inspiratória; já o volume e a capacidade do grupo dinâmico se associam à
função expiratória.
88 Fisiologia do exercício e do esporte

2. O VO₂ pico nada mais é do que o ponto mais alto do consumo máximo de oxigênio durante
um teste ergoespirométrico, por exemplo. Com o aumento da intensidade do treino, o VO₂
tende a aumentar também, chegando a um limite, chamado de VO₂ pico. Após o VO₂ pico, o
consumo de oxigênio tende a fazer um gráfico decrescente, interrompendo, assim, o exercício
ou diminuindo as fontes energéticas.

3. O limiar 1 está associado ao ponto onde o lactato aumenta sua produção, mas a grande ca-
racterística é que, mesmo com o aumento na produção, o corpo ainda consegue equilibrar
com o processo de remoção. O limiar 2 se associa especificamente ao ponto onde o lactato
tem a sua produção aumentada e gera uma consequência, relacionada à fonte aeróbica de
produção de energia, fazendo com que outras fontes energéticas sejam ativadas. Esse traba-
lho conjunto faz com que mais lactato seja acumulado, gerando a fadiga precoce do músculo.

5 Sistema circulatório e exercício físico


1. A literatura atual mostra que a pressão arterial é descrita como a multiplicação do débito
cardíaco pela resistência periférica total, pois a quantidade de sangue ejetada, bem como o
tamanho em diâmetro do vaso sanguíneo, é importante nesse sentido. Na prática de exercí-
cios complexos, a pressão arterial sistólica aumenta, e esse aumento está relacionado com a
intensidade do exercício e ocorre, provavelmente, devido ao débito cardíaco, pois a ativida-
de física promove um maior trabalho do coração para ejetar mais sangue pelos vasos san-
guíneos. Por outro lado, os músculos envolvidos no trabalho precisam de uma quantidade
maior de nutrientes e oxigênio, e esse fato evidencia que o aumento da pressão arterial é um
auxílio para a prática de exercício físico. Vale citar também que a pressão arterial diastólica
não é muito afetada pelo exercício físico.

2. A variabilidade de frequência cardíaca é de suma importância para a fisiologia do exercício,


pois é regulada pelo equilíbrio entre a atividade simpática e parassimpática do sistema ner-
voso autônomo. Essa variabilidade é referida como o intervalo de tempo entre os batimentos
cardíacos. Ressaltamos que essa é uma medida de suma importância, pois a variação entre
os batimentos pode refletir em um desequilíbrio do sistema nervoso autônomo e tende a
comprometer o sistema cardiovascular de uma forma geral. Pode ser importante também no
diagnóstico de algumas doenças cardiovasculares que prejudicam o gesto esportivo, além de
comprometer o sistema cardiorrespiratório.

3. O aumento do volume sistólico pode sofrer interferência de três fatores: venoconstrição,


bomba muscular e difusão respiratória. A venoconstrição é a contração do músculo liso nas
paredes das veias, a qual tende a aumentar o retorno venoso e gera uma capacidade reduzida
nas veias. A bomba muscular é o bombeamento do músculo esquelético envolvido no exer-
cício; este é resultado da ação mecânica de contrações musculares esqueléticas de caráter
rítmico. A difusão respiratória se refere à ação bombeadora do sistema respiratório, ou seja,
o padrão rítmico da respiração também tem uma atuação na bomba mecânica, promovendo
o retorno venoso.
Gabarito 89

6 Sistema endócrino e exercício físico


1. O sistema endócrino traz uma grande contribuição para o rendimento no esporte, pois,
de modo geral, a ação dos hormônios nos chamados órgãos-alvo consegue regular o
metabolismo e fornecer uma ajuda para o corpo funcionar durante o estímulo físico. Por
outro lado, os hormônios contribuem para a recuperação do tecido envolvido nessa prática.
Além disso, as adaptações morfológicas de alguns órgãos importantes para o exercício
físico, como músculos, ossos e coração, estão diretamente ligadas às respostas do sistema
endócrino no corpo humano.

2. A testosterona pode ser aumentada na corrente sanguínea devido a alguns estímulos, entre
eles se destaca o exercício de resistência. Mais precisamente, os exercícios que envolvem
grandes agrupamentos musculares promovem um aumento na secreção da testosterona.
Somado a esse processo, o exercício resistido sendo crônico (longo prazo) também consegue
aumentar os níveis de testosterona em repouso.

3. O hormônio do crescimento, ou GH, associa-se bastante com o exercício físico. Nesse


sentido, podemos ressaltar a importância desse hormônio na síntese de proteínas, no
aumento da utilização dos lipídios, na diminuição da glicose como substrato energético
e no aumento/melhora na captação dos carboidratos. Além disso, o GH contribui para o
crescimento e para a reprodução celular, que, em grandes escalas, reflete no crescimento
dos tecidos, especialmente dos ossos, cartilagens e músculos, gerando um grande benefício
para o aparelho locomotor e, consequentemente, para o rendimento do exercício.
Fisiologia DO EXERCÍCIO E DO ESPORTE
A fisiologia do exercício aborda como o corpo
humano se adapta ao estímulo agudo e crô-
nico do treinamento físico, além de procurar
conhecer e entender os mecanismos básicos do
corpo, que estão associados ao funcionamen-
to dos sistemas neuromuscular, cardiovascular,
respiratório e endócrino.
Esta obra apresenta tópicos básicos sobre a
fisiologia do exercício, tendo como objetivo
fomentar conteúdo específico sobre o assunto
para estudantes e interessados por essa área.

DO EXERCÍCIO
Código Logístico Fundação Biblioteca Nacional
ISBN 978-85-387-6513-4 E DO ESPORTE
Hugo Melo

58770 9 788538 765134


Hugo Melo

Você também pode gostar