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Aproximação teórica
à realidade do jogo
JESÚS PAREDES ORTIZ
INTRODUÇÃO
Alguns teóricos (Huizinga, 1938; Gruppe, 1976; Cagigal, 1979; Moor, 1981;
Blanchard e Cheska, 1986) classificam-no como elemento antropológico fun-
damental na educação. Sob este ponto de vista, o jogo potencializa a identida-
de do grupo social. Contribui para fomentar a coesão e a solidariedade do
grupo e, portanto, favorece os sentimentos de comunidade. Aparece como me-
canismo de identificação do indivíduo e do grupo. “Jogar não é estudar nem
trabalhar, mas, jogando, a criança aprende a conhecer e a compreender o mun-
do social que a cerca” (Ortega, 1990).
Dessa forma, a criança aprende valores humanos e éticos destinados à
formação integral de sua personalidade e ao desenvolvimento motor e intelec-
tual. O jogo, portanto, é um caminho para a solução defendida por Einstein
(1981): “A supervalorização do intelectual em nossa educação, dirigida à efi-
cácia e à praticidade, prejudicou os valores éticos”.
O ensino deve favorecer uma participação mais ativa por parte da criança
no processo educativo. Deve-se estimular as atividades lúdicas como meio pe-
dagógico que, junto com outras atividades, como as artísticas e musicais, aju-
dam a enriquecer a personalidade criadora, necessária para enfrentar os desa-
fios na vida. Para qualquer aprendizagem, tão importante como adquirir, é
sentir os conhecimentos. “O verdadeiro valor do jogo reside na quantidade de
oportunidades que oferece para que a educação possa ser levada a cabo”
(Gruppe, 1976). A esse respeito, Giles Ferry (citado por Bandet e Abbadie,
1975) acrescenta que, na escola do futuro, não se tratará de adquirir conheci-
mentos, mas de aprender a transformar-se, a mudar.
As características do jogo fazem com que ele mesmo seja um veículo de
aprendizagem e comunicação ideal para o desenvolvimento da personalida-
de e da inteligência emocional da criança. Divertir-se enquanto aprende e
envolver-se com a aprendizagem fazem com que a criança cresça, mude e
participe ativamente do processo educativo. A importância e a necessidade
do jogo como meio educativo foi além do reconhecimento e se converteu em
um direito inalienável das crianças: “A criança desfrutará plenamente do jogo
e das diversões, que deverão estar orientados para finalidades perseguidas
pela educação; a sociedade e as autoridades públicas se esforçarão para pro-
mover o cumprimento desse direito” (Declaração Universal dos Direitos da
Criança, art. 7o).
O jogo deve cumprir duas funções na escola como conteúdo e como
finalidade: a educação através do jogo e para o jogo. A aprendizagem, neces-
sária para alcançar o desenvolvimento completo, está continuamente presen-
te, tanto na escola quanto na própria vida. É necessário aprender em todas as
etapas da vida para formar de maneira harmônica a personalidade da crian-
ça e com ela desenvolver e manter um fio vital de expressão e de entendi-
mento com o mundo que a cerca. Aprender jogando é o primário, o mais
simples e natural na criança, já que é o menos traumático. O jogo é a primei-
ra expressão da criança, a mais pura e espontânea, logo, a mais natural.
Atendendo a essas duas funções que o jogo deve cumprir, primeiro na vida
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nimento, ou ludicrum –i, jogo público, espetáculo, dando lugar a lúdicro e não-
lúdico, mesmo que aceito em castelhano.
Segundo Huizinga, ludus, ludere abarca o jogo infantil, o recreio, a com-
petição, a representação litúrgica e teatral e os jogos de azar. A expressão lares
ludentes significa dançar. A base etimológica de ludere seguramente se encon-
tra no que não é sério, no simulacro e na trapaça, mais do que no campo do
“mover rápido”. O próprio autor destaca que o termo que abarca o conceito de
jogo e jogar desaparece, não deixando marca nas línguas românicas.
Segundo o dicionário etimológico do latim (Ernout-Meillet), do vocábulo
ludus –i não há apenas palavras indo-européias conhecidas para essa noção;
pode se tratar de um termo criado com a instituição, sem dúvida religiosa, que
designava, possivelmente de origem etrusca.
Seguir historicamente a evolução fonética da palavra jogo é um trabalho
difícil, mas que não impede detectar que todas as línguas românicas amplia-
ram seus vocábulos iocus, iocari, quando utilizados no campo do jogo e de
jogar, permanecendo em um nível menos avançado os termos ludus, ludere. Em
castelhano, juego e jugar; em catalão, joc e jogar; em francês, jeu e jouer; em
italiano, giuoco e giocare; em português, jogo e jogar; em romeno, joc e juca.
Segundo Huizinga, o desaparecimento do termo ludus pode ser devido tanto a
causas fonéticas quanto semânticas. Ao mesmo tempo, ao se referir aos termos
jogo e jogar, manifesta que a abstração do fenômeno jogo teve lugar em algu-
mas culturas de modo secundário, enquanto a própria função de jogar teve
caráter primário.
Em alguns idiomas, designa-se o jogo com apenas um vocábulo; em ou-
tros, usa-se mais de um termo. Por exemplo, em inglês usa-se play para se
referir ao jogo como atividade pouco codificada, espontânea e, por vezes, tur-
bulenta, e game quando se alude ao seguimento de uma prática lúdica que se
caracteriza por regras estritas.
Corominas (1984) assegura que as primeiras documentações da palavra
jogo, com relação às origens idiomáticas, aparecem no Mio Cid e em Gonzalo
de Berceo. No Dicionário da Real Academia Espanhola de 1837, aparece juego
(ludus), entretenimento, diversão e jugar (ludere), entreter-se, divertir-se com
algum jogo, brincar. No Dicionário da Real Academia Espanhola atual, temos
juego (iocus), ação e efeito de jogar, passatempo e diversão; exercício recreati-
vo submetido a regras, em que se ganha ou perde; ação deflagrada espontanea-
mente pela mera satisfação que representa; jugar (iocari), fazer algo com o
único propósito de se entreter ou divertir, participar de um jogo.
Os vocábulos juego e jugar têm muitas acepções e interpretações. A pala-
vra juego é empregada com o significado de entretenimento ou diversão e jugar,
que significa brincar, se divertir, também pode ser utilizada em sentido figura-
do, como falta de responsabilidade, fazer algo de modo arriscado, como se
depreende da expressão “brincar com fogo”; outras vezes, há conotações eróti-
cas, como no alemão spielen, que significa brincar, formando com ela a palavra
spielkin, para se referir aos filhos ilegítimos frutos da brincadeira; como em
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castelhano, el juego del amor; em outras ocasiões, a relação é com a arte, tanto
em inglês quanto em francês: to play the piano, jouer du piano; também se pode
empregar com o sentido de se aproveitar ou zombar de alguém, “brincar com
uma pessoa”, ou como obra de honestidade, “jogar limpo”; ocupar certa posi-
ção, “desempenhar um papel imprescindível”; ser um herói, “jogar-se à vida”;
para investidores, “jogar na bolsa”; para descrever um ato fácil ou inocente,
“brincadeira de crianças”; ajuste de contas, “pôr em jogo”; azucrinação, “era
brincadeirinha”; comportar-se de forma desleal, “jogar”; aventura ou risco,
“jogar com a sorte”; drama semilitúrgico, “jogo de Adão”; obras dramáticas e
novelas, “jogos de emoções”; lugares para o jogo de bola no México e na
Guatemala, “jogo de bola”; juramento do “Jogo de bola”, promessa solene feita
pelos deputados franceses do Terceiro Estado (23-6-1789); competição poéti-
ca, “jogos florais”.
Houve má familiarização com o termo jogo. Como vimos, foi associado a
todo ato de falta de seriedade ou feito de forma leviana; à idéia de luta; tam-
bém há conotações de tipo erótico, em países germânicos; e, em muitas oca-
siões, relaciona-se ao meio artístico e estético.
Como pudemos comprovar, emprega-se o vocábulo tanto no sentido figu-
rado como no direto ou fundamental, o que nos interessa.
Para Petrovski (citado por Elkonin), o significado de “jogo” apresenta al-
gumas diferenças entre povos distintos. Para os gregos antigos, o jogo signifi-
cava as ações próprias das crianças e expressava principalmente o que entre
nós, hoje, se denomina “criancices”. Entre os hebreus, a palavra jogo era em-
pregada com relação a risadas e brincadeiras. Entre os romanos, ludus –i signi-
ficava alegria. Em sânscrito, kliada, jogo, alegria. Entre os germânicos, a anti-
ga palavra spilan definia um movimento rápido e suave como o do pêndulo
que produzia um grande prazer. Posteriormente, a palavra juego (jogo, play,
joc, game, spiel, jeu, gioco, urpa, giuoco, jolas, joko, etc.) começou a significar
em todas as línguas um grande grupo de ações que não requerem trabalho
árduo e proporcionam alegria, satisfação, diversão e que ocupam tanto a vida
central da criança como o tempo de ócio e recreio do adulto, do jogo mais
infantil à mais trágica das encenações no teatro ou à mais divertida comédia
circense; ou da mais inocente criança à mais séria aposta na bolsa de valores
com a finalidade de ganhar dinheiro.
Segundo diferentes estudiosos do tema, é difícil saber em que momento
aparecem e qual o significado dessas locuções e suas conotações, mas o certo é
que elas existem e em diferentes idiomas.
A palavra jugar (do latim iocari) significa fazer algo com espírito de
alegria e com a intenção de se divertir ou de se entreter. A palavra jogo pro-
16 Juan Antonio Moreno Murcia & cols.
O sábio sabe que brinca e saboreia jogar, seriamente, qualquer jogo. Assim, pode
brincar consigo mesmo. A brincadeira, o humor, o sorriso, a ternura brotam com
a compaixão do quebra-cabeças da vida (Delgado e Del Campo, 1993).
Assim, todos os jogos fazem jogo. Traduz-se como espírito, estado emocio-
nal do ser humano e se mostra através do ato motor em movimento, em sua
energia, traduzindo-se em matéria. O jogo é parte do caráter do ser humano
em sua formação, em sua personalidade, na configuração da inteligência, na
própria vida. O adulto também aprende, se realiza, se desafoga, necessita de
distração, precisa de humor, e nem por isso deixa de ser séria a realização
pessoal do humano adulto. O ser humano necessita permanentemente de en-
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– “(...) uma atividade que os seres vivos superiores realizam sem um fim
aparentemente utilitário, como meio de eliminar seu excesso de ener-
gia” (Spencer, 1855).
Aprendizagem através do jogo 19
ORIGEM DO JOGO
CARACTERÍSTICAS DO JOGO
CONCLUSÕES
Talvez este título não seja o adequado, por isso vou apenas mencionar idéias
que podem servir de proposta para encontrar uma definição do tema. Já que a
aprendizagem é infinita, deixemos a porta aberta para continuar aprendendo
com quem sente o desejo de explorar esse maravilhoso e mágico mundo do jogo: