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Crianças no Antigo Egito

A relação entre os egípcios adultos e suas crianças, especialmente aquelas de fora da


enseada da realeza, ainda nos é nebulosa. Dentre algumas características gerais é
determinado que na estatuária ou iconografia elas usualmente fossem representadas
pondo o indicador na boca ou menor que as demais figuras, embora pareçam
representar pessoas mais maduras.

Do lado mais espiritual, a crença ditava que era a deusa da escrita Seshat quem definia
por quantos meses ou anos a criança viveria, mas que existiam vários males que
estariam na espreita esperando uma brecha dos pais (STROUHAL, 2007). Por outro
lado, havia varias rezas e amuletos que poderiam servir para proteger a criança tanto
de doenças como de mortes trágicas.

Além destas informações temos conhecimento, também gerais, de outros aspectos da


vida infantil e que envolvem desde o lado lúdico mais a vivência no âmbito familiar e até
a morte.

Brinquedos:

O arqueólogo inglês Flinders Petrie durante suas pesquisas descreveu artefatos que
julgou serem brinquedos, tais como bonecas representando mulheres segurando seus
bebês, animais comuns na antiga paisagem egípcia, barquinhos, bolas (feitas de tecido,
papiro ou couro, recheadas com palha) e até pequeninas múmias em seus ataúdes
(STROUHAL, 2007), mas as brincadeiras poderiam ser diversas e contavam muito com
a criatividade e a imaginação infantil. Madeira, pedras e até plantas podiam
proporcionar muito divertimento, fruto da engenhosidade que podemos notar até nas
crianças da atualidade.

Além dos brinquedos, elas se distraiam com jogos frívolos como testar seu equilíbrio
(sobre tábuas ou sobre os ombros dos seus próprios amigos), corrida, brigas, danças,
natação e o conhecido “pisar nas uvas” que consistia em se dar as mãos fazendo um
círculo, como em uma ciranda, e girar: enquanto algumas crianças ficavam de pé outras
eram levadas ao chão, mas sem tocá-lo totalmente.

Trabalhos e obrigações:

A partir dos cinco anos as crianças já começavam a ser treinadas para o trabalho,
exercendo diferentes funções, dependendo do que se esperava dela, indo das mais
simples até as mais complexas com a passagem dos anos. Entretanto, uma carta da
18ª Dinastia (Novo Império) nos alerta que crianças deveriam ser tratadas de fato como
crianças ao reprimir uma família que tomou uma menina jovem como funcionária
(FROOD, 2010). Não era incomum também que as crianças herdam as atividades dos
pais, por exemplo, filhos de sacerdotes tendiam a assumir postos semelhantes, ou em
caso de oferendas familiares que eram levadas adiante pelos filhos (FROOD, 2010;
SPENCER, 2010).

Vestimenta:

As crianças egípcias raramente eram representadas vestidas. O normal, tanto entre as


classes comuns como entre a realeza, eram os infantes viverem nus e descalços
(FROOD, 2010). Como uma assinatura de sua infância, tanto meninas como meninos
usavam um corte de cabelo específico, constituído por uma cabeça praticamente
raspada, exceto por uma mecha lateral comprida (usada normalmente até os dez anos).
Em casos especiais, como os das princesas ou príncipes que eram obrigados a chegar
à maioridade devido à acessão ao trono, estes eram representados como adultos, ou
seja, totalmente carecas, usando perucas ou com os cabelos integralmente crescidos.

Alimentação:

Durante o século I a.E.C, o historiador grego Diodoro Sículo escreveu que “(…) até o
momento de seu completo crescimento, a criança não custa aos pais mais que vinte
dracmas” (STROUHAL, 2007, 25) e este talvez seja um quadro semelhante para os
tempos mais pretéritos.

Após o seu nascimento esperava-se que a criança fosse alimentada com o leite
materno o máximo quanto fosse possível. A literatura indica que em alguns casos elas
poderiam ser alimentadas até os três anos. Durante este período algumas crianças
estavam livres de morrer por infecções, contudo, em alguns casos, a morte vinha a
ocorrer devido a uma falta de adaptação durante a troca do leite materno para outro tipo
de alimentação que usualmente era constituída por talos de papiro, pão e cerveja
(STROUHAL, 2007).

Morte:

Observando os registros arqueológicos vemos que aparentemente as crianças que


tinham mortes prematuras, especialmente as natimortas ou falecidas ligeiramente após
o evento do parto, não possuíam um túmulo exclusivo para elas, sendo sepultadas com
a mãe ou o pai, dependendo de quem falecia primeiro. Contudo, ao menos fora da
realeza, existem situações em que o corpo era posto em um recipiente de barro e
sepultado ao lado da casa ou dentro dela. Supostamente em casos particulares, quando
a família não conseguia estabelecer uma ligação fraternal com a criança falecida, o
corpo era deixado nos limites do deserto ou jogado no Nilo, para ser devorado pelos
animais (STROUHAL, 2007).

Observando algumas múmias remanescentes é possível notar que o zelo no


embalsamamento que foi dado para os adultos foi transmitido para os infantes
(STROUHAL, 2007), mas isto para aqueles cuja família tinha condições de pagar. Para
as crianças mais pobres nos restam somente alguns ossos frágeis. A diferença é
notada também no involucro: as abastardas eram sepultadas em pequenos ataúdes de
madeira ou de ouro (como foi o caso das filhas de Tutankhamon), já as carentes tinham
como proteção ou já citados potes de barro, tecidos ou esteiras de palmeiras. Já o
espólio funerário era composto de amuletos, jarros e brinquedos (STROUHAL, 2007).
No lado direito está uma caixa destampada com os dois pequenos ataúdes que
guardavam os corpos dos dois bebês (provavelmente filhas de Tutankhamon)
encontrados na KV-62. Foto disponível em <
http://www.vazyvite.com/html/egypte/egypte_luxor3.htm >. Acesso em 12 de outubro de
2014.

Referências:

Frood, Elizabeth. Social Structure and Daily Life: Pharaonic. In: LLOYD, Alan, B (Ed). A
Companion to Ancient Egypt. England: Blackwell Publishing, 2010.

Spencer, Neal. Priests and Temples: Pharaonic. In: LLOYD, Alan, B (Ed). A
Companion to Ancient Egypt. England: Blackwell Publishing, 2010.

STROUHAL, Eugen. A vida no Antigo Egito (Tradução de Iara Freiberg, Francisco


Manhães, Marcelo Neves). Barcelona: Folio, 2007.

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