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Revista Teias do Conhecimento

Ano 1, Numero 1, 2021

A NOVA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL


(2020) E A DESCONSTRUÇÃO DE UMA PROPOSTA
EDUCACIONAL INCLUSIVA:

Os impactos conceituais e estruturais no processo de inclusão do


aluno público-alvo da Educação Especial.

ISSN 2763-6739
http://doi.org/10.5212/RevTeiasConhecimento.v1i1.20210110

Gemma Galganni Pacheco da Silva*


https://orcid.org/0000-0002-9942-9979

http://lattes.cnpq.br/3466630299088354

Márcia Raika e Silva Lima**


https://orcid.org/0000-0003-3396-3236

http://lattes.cnpq.br/4189856431934940

*Mestranda pela Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) e Professora da


Rede Municipal de Ensino de Codó – MA (SEMECTI).
galgannigemma7@gmail.com

**Doutora pela Universidade Federal do Piauí (UFPI) e Professora do Mestrado


Profissional em Educação Inclusiva em Rede (PROFEI) da Universidade Estadual
do Maranhão (UEMA), Professora da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA),
campus Caxias. marciaraika@hotmail.com
A nova política nacional de educação especial (2020)
e a desconstrução de uma proposta educacional inclusiva
Gemma Galgani Pacheco da Silva e Márcia Raika e Silva Lima

A NOVA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO


ESPECIAL (2020) E A DESCONSTRUÇÃO DE UMA
PROPOSTA EDUCACIONAL INCLUSIVA:
Os impactos conceituais e estruturais no processo de
inclusão do aluno público-alvo da Educação Especial.
RESUMO: As discussões em torno da inclusão de alunos público-alvo da Educação
Especial (PAEE) é tema polêmico para o cenário educacional. No ano de 2020,
surge no contexto educacional brasileiro a apresentação de um documento legal
que versa sobre a implantação de uma nova política para a Educação Especial, a
Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, inclusiva e com aprendizado ao
longo da vida (PNEE). Fundamentada em uma abordagem que promove nova
ênfase à inclusão radical e amparada no discurso de que essa inclusão não vem
proporcionando benefícios a todos os alunos PAEE, a PNEE (2020) traz consigo
uma proposta de adequação ao delineado pela política educacional vigente
(BRASIL, 2008), no que concerne ao conceito e estruturação da Educação Especial
e da Educação Inclusiva. A nova política amplia as possibilidades de inclusão,
assegurando que dessa forma garante o direito a permanência e aprendizagem dos
alunos PAEE. Diante deste fato, e, considerando a perspectiva inclusiva adotada
em sua formulação, é pertinente a reflexão acerca do que realmente se evidencia
nessa proposta, assim como dos impactos dessa política no processo de inclusão
da pessoa com deficiência nas classes comuns do ensino regular. A metodologia
eleita para esta pesquisa é de natureza qualitativa, do tipo bibliográfica e
documental, e abordagem descritiva e explicativa. Para subsídio teórico deste
estudo, teve-se como base autores como Plestch (2020), Glat (2018), Kassar e
Rebelo (2018) Mantoan (2015), Mendes (2010), Heredero (2010), entre outros, que
pesquisam sobre a Educação Especial e a Educação Inclusiva. Como objetivo
buscou-se analisar a proposta educacional delineada na PNEE (2020) e os
impactos gerados frente ao atual paradigma da Educação Inclusiva que ampara a
inclusão de alunos PAEE. Como resultado desta pesquisa, conclui-se que a
proposta descrita na PNEE (2020) se mostra antagônica ao preceituado na
PNEEPEI (2008), que garante a equidade e propicia a igualdade de oportunidades
no espaço escolar. Ao consolidar a Educação Especial como uma nova modalidade
escolar, que agrega espaços educacionais especializados, a PNEE (2020) causa o
esmaecimento do direito da pessoa com deficiência à educação na escola regular
e o fortalecimento de atitudes discriminatórias.

PALAVRAS – CHAVE: Políticas Educacionais. Educação Especial.


Educação Inclusiva.

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e a desconstrução de uma proposta educacional inclusiva.
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THE NEW NATIONAL POLICY ON SPECIAL


EDUCATION (2020) AND THE DECONSTRUCTION OF
AN INCLUSIVE EDUCATIONAL PROPOSAL:
The conceptual and structural impacts on the inclusion
process of the target-public student of Special Education.

ABSTRACT: Discussions around the inclusion of students who are the target
audience of Special Education (PAEE) is a controversial issue for the educational
scenario. In the year 2020, the presentation of a legal document in the Brazilian
educational context that addresses the implementation of a new policy for Special
Education, the National Policy for Special Education: Equitable, inclusive and with
lifelong learning (PNEE) . Based on an approach that promotes a new emphasis on
radical inclusion and supported by the discourse that this inclusion has not been
providing benefits to all PAEE students, the PNEE (2020) brings with it a proposal
for adapting to what is outlined by the current educational policy (BRASIL, 2008 ),
regarding the concept and structuring of Special Education and Inclusive Education.
The new policy expands the possibilities of inclusion, ensuring that in this way it
guarantees the right to permanence and learning of PAEE students. Given this fact,
and considering the inclusive perspective adopted in its formulation, it is pertinent to
reflect on what is really evidenced in this proposal, as well as the impacts of this
policy on the process of inclusion of people with disabilities in regular classes of
regular education. The methodology chosen for this research is qualitative,
bibliographic and documental in nature, and has a descriptive and explanatory
approach. For the theoretical support of this study, authors such as Plestch (2020),
Glat (2018), Kassar and Rebelo (2018) Mantoan (2015), Mendes (2010), Heredero
(2010), among others, who research on Special Education and Inclusive Education.
The objective was to analyze the educational proposal outlined in the PNEE (2020)
and the impacts generated against the current paradigm of Inclusive Education that
supports the inclusion of PAEE students. As a result of this research, it is concluded
that the proposal described in PNEE (2020) is antagonistic to the precepts in
PNEEPEI (2008), which guarantees equity and provides equal opportunities in the
school space. By consolidating Special Education as a new school modality, which
brings together specialized educational spaces, the PNEE (2020) causes the fading
of the right of people with disabilities to education in regular schools and the
strengthening of discriminatory attitudes.

KEYWORDS: Educational Policies. Special education. Inclusive education.

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LA NUEVA POLÍTICA NACIONAL DE EDUCACIÓN


ESPECIAL (2020) Y LA DESCONSTRUCCIÓN DE UNA
PROPUESTA EDUCATIVA INCLUSIVA:
Los impactos conceptuales y estructurales en el proceso
de inclusión del público meta alumno de Educación
Especial.

RESUMEN: Las discusiones en torno a la inclusión de estudiantes que son el


público objetivo de Educación Especial (PAEE) es un tema controvertido para el
escenario educativo. En el año 2020, la presentación de un documento legal en el
contexto educativo brasileño que aborda la implementación de una nueva política
de Educación Especial, la Política Nacional de Educación Especial: Equitativa,
inclusiva y con aprendizaje permanente (PNEE). Partiendo de un enfoque que
promueve un nuevo énfasis en la inclusión radical y apoyado en el discurso de que
esta inclusión no ha estado brindando beneficios a todos los estudiantes del PAEE,
el PNEE (2020) trae consigo una propuesta de adaptación a lo planteado por la
actual educación. política (BRASIL, 2008), sobre el concepto y estructuración de
la Educación Especial y la Educación Integrada. La nueva política amplía las
posibilidades de inclusión, asegurando que de esta forma se garantiza el derecho
a la permanencia y el aprendizaje de los estudiantes del PAEE. Ante este hecho,
y considerando la perspectiva inclusiva adoptada en su formulación, es pertinente
reflexionar sobre lo que realmente se evidencia en esta propuesta, así como los
impactos de esta política en el proceso de inclusión de las personas con
discapacidad en las clases regulares de regularidad. educación. La metodología
elegida para esta investigación es de carácter cualitativo, bibliográfico y
documental, y tiene un enfoque descriptivo y explicativo. Para el sustento teórico
de este estudio, autores como Plestch (2020), Glat (2018), Kassar y Rebelo (2018)
Mantoan (2015), Mendes (2010), Heredero (2010), entre otros, que investigan en
Educación Especial y educación inclusiva. El objetivo fue analizar la propuesta
educativa esbozada en el PNEE (2020) y los impactos generados frente al
paradigma actual de Educación Integrada que apoya la inclusión de los
estudiantes del PAEE. Como resultado de esta investigación, se concluye que la
propuesta descrita en PNEE (2020) es antagónica a los preceptos en PNEEPEI
(2008), que garantiza la equidad y brinda igualdad de oportunidades en el espacio
escolar. Al consolidar la Educación Especial como una nueva modalidad escolar,
que agrega espacios educativos especializados, el PNEE (2020) provoca el
desvanecimiento del derecho de las personas con discapacidad a la educación en
las escuelas regulares y el fortalecimiento de actitudes discriminatorias.

PALABRAS CLAVE: Políticas educativas. Educación especial. Educación


inclusiva.

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1. INTRODUÇÃO

A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação


Inclusiva (PNEEPEI), atualmente em vigor no Brasil, foi elaborada em 2008 pela
Secretaria de Educação Especial (SEESP). Ancorada nos preceitos do paradigma
inclusivo, a PNEEPEI (2008) objetiva assegurar a inclusão escolar de alunos público-
alvo da Educação Especial (PAEE), isto é, aqueles com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação (BRASIL, 2008) nas
classes comuns do ensino regular.

A partir da implementação da PNEEPEI (2008), a Educação Especial deixa de


ser organizada substitutivamente ao ensino regular e se articula à educação básica,
como modalidade de ensino. Integrando, assim, a proposta pedagógica da escola
regular, com fins à inclusão dos alunos PAEE nas atividades escolares, bem como
para o atendimento educacional às suas especificidades. Neste sentido, norteia a
organização de redes de apoio, a formação continuada, a identificação de recursos,
serviços e o desenvolvimento de práticas colaborativas (BRASIL,2008).

Na contramão aos ideais da PNEEPEI (2008), no ano de 2020, com a


justificativa de que muitos alunos não estão sendo beneficiados com a Educação
Inclusiva, surge no cenário educacional brasileiro uma nova política de Educação
Especial. Instituída pelo decreto 10.502 de 30 de setembro de 2020, é intitulada
Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao
Longo da Vida (PNEE). O referido documento é apresentado pelo Ministério da
Educação (MEC), através da Secretaria de Modalidades Especializadas da Educação
(SEMESP), com a justificativa de resposta ao clamor, efetuado por estudantes,
familiares, professores e gestores escolares, por alternativas em relação ao
atendimento educacional para os alunos PAEE (BRASIL, 2020).

Ressalta-se que, apesar de constar em sua denominação a palavra inclusiva,


a PNEE (2020) defende e apresenta para atender mais adequadamente as demandas
dos alunos atendidos pela Educação Especial, a criação e manutenção de classes e

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escolas especializadas e classes bilíngues de surdos. Viabiliza essa diversidade de


possibilidades como opção de escolha do educando e da família, bem como, também,
para o atendimento educacional, ações entendidas por pesquisadores da área como
contrárias aos preceitos da inclusão e às diretrizes dispostas na PNEEPEI (2008).

Diante desse contexto, evidencia-se o problema desta pesquisa: a nova política


de Educação Especial (2020) contempla a perspectiva da Educação Inclusiva ou
evidencia-se como desmonte do cenário da inclusão escolar, para os estudantes
público alvo da Educação Especial?

Este artigo objetiva analisar a proposta educacional delineada na nova política


de Educação Especial e os impactos gerados frente ao atual paradigma da Educação
Inclusiva que ampara a inclusão de alunos PAEE. A relevância desta pesquisa está
em proporcionar aos pesquisadores da Educação Especial e Inclusiva uma reflexão
acerca da proposta educacional defendida por esta nova política e analisar o que de
fato se evidencia de divergência em relação aos propósitos da Educação Inclusiva e
os impactos na obtenção do direito dos estudantes a uma educação equitativa e
inclusiva na escola comum.

A metodologia utilizada é de natureza qualitativa, do tipo bibliográfica e


documental, e abordagem descritiva e explicativa. Para subsídio teórico deste estudo,
teve-se como base autores como Plestch (2020), Glat (2018), Kassar e Rebelo (2018)
Mantoan (2015), Mendes (2010), Heredero (2010), entre outros, que pesquisam sobre
a Educação Especial e a Educação Inclusiva. Na perspectiva de proporcionar
entendimento sobre como a Educação Especial deve ser organizada com vistas a
construção de ambiente educacional inclusivo será abordado na sessão seguinte o
que os estudiosos dizem acerca do referido assunto.

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2. A EDUCAÇÃO ESPECIAL NO CONTEXTO DA POLÍTICA EDUCACIONAL


INCLUSIVA: O QUE DIZEM OS PESQUISADORES.

A constituição da Educação Especial no Brasil ocorreu em um contexto


marcado pelo descaso do poder público com a educação em geral. Sua
institucionalização se deu através da organização de um sistema paralelo de ensino,
geralmente sem nenhuma articulação com a escola regular, caracterizando uma
atuação em âmbito específico e restringida às iniciativas locais e isoladas. Sua
inserção na política educacional ocorreu após a promulgação da Lei n° 4.024 de 20
de dezembro de 1961, que fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(MENDES, 2010; KASSAR, 2011).

Estudos apontam que a justificativa para a atuação segregadora da Educação


Especial, entendida como aquela em que há separação dos alunos em salas e escolas
especializadas, parte do pressuposto de que essa forma de atendimento seria a
melhor resposta às necessidades educacionais dos alunos por ela atendidos. E que
somente a partir da década de 70, deixa de trabalhar nessa perspectiva e opera a
partir da filosofia da normalização e integração, amplamente disseminada no contexto
mundial nessa época e norteada pelo preceito da inserção no ensino comum.

Posteriormente, em meados da década de 90, em virtude da conquista dos


direitos sociais trazidos pela Constituição Federal de 1988 com relação à equidade e
à qualidade do ensino é empreendida no contexto educacional brasileiro uma reforma
com vistas à promoção de uma educação para todos. Essa reforma é implementada
através da adoção de políticas de Educação Inclusiva, fato que influenciou uma
reformulação no que concerne aos serviços e políticas no âmbito da Educação
Especial.

A Educação Especial, até então organizada com base no modelo integrador,


deve ser estruturada na perspectiva da inclusão, que de acordo com Mantoan (2015)
apresenta conceito antagônico ao de integração. A referida autora assegura que,
apesar de apresentarem semelhança em seus significados, essas palavras são
utilizadas para representar situações de inserção divergentes e se baseiam em

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diferentes posicionamentos teórico-metodológicos.

Enquanto a integração concretiza uma distinção prévia dos alunos que se


configuram como não preparados à inserção nas turmas do ensino comum e os
oferece uma gama de possibilidades educacionais, do ensino regular ao
especializado, a inclusão questiona o próprio conceito de integração. Ao contrário do
proposto pela integração, a inclusão pressupõe uma mudança que causa ruptura com
o modelo tradicional de organização da educação escolar, que outorga a classificação
de alunos em normais ou deficientes, as modalidades de ensino em regular e especial,
e os profissionais de área especialistas nisso ou naquilo. Consoante a perspectiva
inclusiva, essa forma de organização é definida como

[...] uma visão determinista, mecanicista, formalista, reducionista, própria do


pensamento científico moderno, que ignora o subjetivo, o afetivo, o criador –
sem os quais é difícil romper com o velho modelo escolar e produzir a
reviravolta que a inclusão impõe (MANTOAN, 2015, p. 19).

O modelo educacional inclusivo, por sua vez, não pressupõe a preparação do


aluno PAEE para acesso ao ensino regular. Tampouco supõe a inalterabilidade com
relação a organização de metodologias e estratégias de ensino, pois entende esta
prerrogativa como sendo própria do modelo educacional integrador. No entanto, se
contrapõe a esta prática e defende que a escola deve adequar-se para o atendimento
aos alunos em sua heterogeneidade, contestando aspectos excludentes nas práticas
educativas (OLIVEIRA, CORREIA E RABELLO, 2011).

Dessa forma, a constituição de um sistema educacional inclusivo considera as


necessidades dos alunos em sua organização e estruturação. A vista disso,
caracteriza-se como modelo educacional que acolhe a todos em suas especificidades
e fundamenta-se na diferença dos seres humanos. Nesse sentido, Mantoan (2015,
p.22) afirma que

As escolas inclusivas atendem a todos os alunos sem discriminar, sem


trabalhar à parte com alguns deles, sem estabelecer regras específicas para
planejar, ensinar e avaliar alguns por meio de currículos adaptados,
atividades diferenciadas, avaliação simplificada em seus objetivos...[...] na
perspectiva da inclusão, o sistema de ensino é provocado, desestabilizado,
pois o objetivo é não excluir ninguém, melhorando a qualidade do ensino das
escolas e atingindo todos os alunos que fracassam nas salas de aula.

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Na perspectiva inclusiva, a Educação Especial não pode ser organizada a partir


de um modelo educacional que a caracterize como meio alternativo para o
desenvolvimento do processo educativo. Assim sendo, não deve constituir sistema
educacional diferenciado, segregado ou substitutivo ao ensino comum. Pensar a
reestruturação da Educação Especial, com base nos princípios inclusivos significa
transformar sua atuação no sentido de propiciar ao educando atendimento às suas
necessidades dentro do processo educativo, e não a sua classificação ou
categorização, fortalecendo situações de exclusão.

Consoante este entendimento, Glat (2018, p.10) destaca que a Educação


Especial

[...] não é mais concebida como um sistema educacional à parte, restrito ao


atendimento especializado de pessoas com deficiências. A Educação
Especial do século XXI configura-se como um conjunto de conhecimentos,
metodologias, recursos (materiais, pedagógicos e humanos) disponibilizados
para as escolas e outros espaços sociais, de forma que possam promover a
aprendizagem e a inclusão de pessoas com deficiências e outras
características atípicas de desenvolvimento.

A estruturação de uma organização paralela e substitutiva da Educação


Especial dificulta muito o atendimento a alunos PAEE na escola regular. Consoante o
preceito inclusivo, a escola é entendida como espaço que acolhe a todos
indistintamente, por isso é pertinente a transformação conceitual no que diz respeito
a esse modelo de escolarização, assim como a organização do ensino para ressaltar
o dever da escola em adaptar-se aos alunos e não o contrário (HEREDERO,2010;
KASSAR e REBELO,2018).

Com o exposto, depreende-se que a elaboração de políticas educacionais que


objetivam a constituição de sistema educacional inclusivo pressupõe deliberação
acerca da estrutura e organização da educação comum e a da Educação Especial.
Para tanto, devem ser considerados em sua definição os preceitos e orientações
inerentes a esta perspectiva e evitadas as propostas que a ela se contrapõem. Por
conseguinte, devem caracterizar ordenações antevistas no modelo integrador, como
é o caso da oferta de atendimento substitutivo à escolarização na classe comum em
escolas especializadas e em classes especiais (PRIETO, ANDRADE e RAIMUNDO,

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2013). Logo, a Educação Especial não deve ser entendida

[...] apenas uma modalidade de ensino com técnicas e recursos


especializados próprios, mas também, uma área de conhecimento científico
necessariamente interdisciplinar. Neste sentido, a Educação Especial não
deveria ser entendida apenas como sinônimo de escola ou classe especial,
como comumente ainda vemos no discurso escolar e científico. Trata-se, na
verdade, de uma área interdisciplinar de pesquisa e de uma modalidade
colaborativa à Educação Básica e à Educação Superior (PLESTCH,2020,
p.68).

É percebido pelos estudiosos que, em um contexto educacional que tem como


base o preceito inclusivo, o conceito de Educação Especial situa-se em transformação
no que diz respeito à sua significação, pois tem importante papel em sua atuação
transversal e complementar ou suplementar aos serviços educacionais comuns.

Isto posto, evidencia-se que em sua atuação, a Educação Especial deve


envidar esforços na busca da superação da interpretação da diversidade como um
transtorno ou dificuldade para o ensino regular. A vista disso deve buscar caracterizá-
la como algo indispensável ao seu exercício, organizando-se institucionalmente no
sentido de garantir o desenvolvimento das potencialidades dos educandos em todas
as etapas e modalidades da educação básica (MARINHO E OMOTE, 2017; MAZERA
ET AL.,2017).

A constituição de ambiente educacional inclusivo é indicada por autores como


Mendes (2010) e Mantoan (2015) como estratégia com potencial para garantir o
avanço necessário na Educação Especial brasileira. Desta maneira, contribuirá para
a promoção da transformação social através da garantia de acesso e participação na
educação, assim como à igualdade de direitos e deveres, minimizando diferenças e
eliminando preconceitos.

Além disso, é citada como menos dispendioso em relação à criação e


manutenção de um sistema múltiplo que abarca diferentes instituições especializadas
para atender diversos grupos de alunos, apontado como investimento que apresenta
ótima relação custo-benefício (BRUSCATO, 2020; MENDES, 2010; SOUZA e
PLESTCH, 2017). Considerando o exposto e pleiteando a consecução dos objetivos
traçados para este estudo apresentam-se as seções seguintes.

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3. CONTEXTO HISTÓRICO DA ELABORAÇÃO DA PNEEPEI (2008) E


ORGANIZAÇÃO DA PNEE (2020)

A defesa por uma educação inclusiva no Estado Brasileiro se intensificou a


partir do ano de 2002. Através de estudos, apoio e contribuição de especialistas da
Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência
(CORDE) e entidades de defesa dos direitos humanos, entre elas o Conselho Nacional
dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (CONADE), foi elaborado um tratado
internacional, mediado pela Organização das Nações Unidas (ONU), que resultou na
Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2007).

A Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência reafirma o delineado


no texto da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que garante o monitoramento
e cumprimento das obrigações do Estado diante dos direitos da pessoa com
deficiência. A Convenção foi adotada pela ONU em dezembro de 2006 e assinada
pelo Brasil no dia 30 de março do ano de 2007. A partir disso, o Estado brasileiro
assume o compromisso de promover a inclusão da pessoa com deficiência em bases
iguais com as demais pessoas e garantir acessibilidade à população em geral,
entendendo a falta desta como discriminação, condenável do ponto de vista moral e
ético, e punível na forma da lei (BRASIL, 2007).

Ainda no ano de 2007, no mês de setembro, a Secretaria Especial dos Direitos


Humanos, da Presidência da República, divulga a Convenção através de um
documento que reúne cinquenta artigos que tratam dos direitos civis, políticos,
econômicos, sociais e culturais das pessoas com deficiência, munidos do
indispensável à emancipação desses cidadãos. Posteriormente, após aprovação do
Congresso Nacional, o referido texto é aprovado pelo Senado Federal através do
Decreto Legislativo nº 186 (BRASIL, 2008) e em 2009 promulgado pela Presidência
da República através do Decreto n° 6.949/2009, garantindo seu cumprimento e
execução (BRASIL, 2009).

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De acordo com o Decreto n° 6.949/2009, a Convenção foi organizada com o


propósito de promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos
os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência.
Bem como promover o respeito pela sua dignidade inerente, determinando como uma
das obrigações gerais dos Estados partes signatários a adoção de todas as medidas
legislativas, administrativas e de qualquer outra natureza, necessárias para a sua
realização.

Entre os direitos assegurados na Convenção está o da educação, descrito no


artigo 24, sendo determinado que sua efetivação ocorra com a garantia de igualdade
de oportunidades e sem discriminação através de sistema educacional inclusivo em
todos os níveis. Para sua concretização, é estabelecido que seja garantido à pessoa
com deficiência a não exclusão do sistema educacional geral sob alegação de
deficiência, oferta de apoio necessário com vistas a facilitar sua efetiva educação e
adoção de medidas de apoio individualizadas e efetivas em ambientes que
maximizem o desenvolvimento acadêmico e social, conforme a meta de inclusão plena
(BRASIL, 2009).

Neste sentido, para instituir políticas públicas que propiciem educação de


qualidade a todos os estudantes e contribuir para o fortalecimento da Educação
Especial na perspectiva da Educação Inclusiva nos sistemas de ensino brasileiros, o
MEC, através da Secretaria de Educação Especial (SEESP), nomeia um grupo de
trabalho estabelecido pela Portaria nº 555/2007 para a elaboração da Política Nacional
de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (PNEEPEI). O referido
documento foi entregue ao Ministro da Educação no dia sete de janeiro de 2008
(BRASIL, 2008) e apresentado pelo MEC/SEESP no ano de 2010 através da
publicação do documento intitulado Marcos Político-Legais da Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva.

Este documento (BRASIL, 2008), surgiu para divulgar aos sistemas de ensino
os novos marcos político-legais e pedagógicos que norteiam a Educação Especial na
perspectiva da Educação Inclusiva. Visou orientar e subsidiar as Secretarias de
Educação, os Conselhos de Educação, a gestão escolar, as organizações da

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sociedade civil, os operadores do direito e demais órgãos envolvidos na promoção da


inclusão educacional (BRASIL, 2010).

A PNEEPEI (2008) permaneceu inalterada até o mês de agosto de 2020.


Porém, no mês seguinte do mesmo ano, é instituída, através do Decreto 10.502, uma
nova Política Nacional de Educação Especial intitulada Política Nacional de Educação
Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida – (PNEE). Essa
nova política é apresentada pelo MEC, através da Secretaria de Modalidades
Especializadas de Educação (SEMESP), como proposta de adequação à ênfase dada
à inclusão total no texto da PNEEPEI (2008) que, segundo a própria PNEE (2020) não
tem proporcionado benefícios a todos os educandos.

No documento da PNEE (2020) consta a informação de que a elaboração de


um texto-base para sua constituição teve início no ano de 2018. Essa elaboração se
deu a partir do resultado de consultorias realizadas nas cinco regiões do Brasil, feitas
por especialistas de várias universidades brasileiras, estudos documentais e escuta
de vários segmentos sociais relacionados ao tema (BRASIL, 2020).

Diz ainda que, foi organizado por "muitas mãos" (BRASIL,2020, p.15) e que se
preocupa em oferecer avanços na área da Educação Especial. Afirma que validam o
indicado pela maioria dos estudantes da Educação Especial, familiares desses
estudantes, professores, gestores escolares, outros profissionais da escola,
secretários de educação, profissionais da educação superior, pesquisadores,
membros de organizações não governamentais, membros de conselhos, cidadãos
interessados e outros.

No entanto, a proposta trazida pela PNEE (2020) não compartilha do mesmo


preceito inclusivo concebido pela PNEEPEI (2008). Isso a faz divergir na organização
da Educação Especial, caracterizando uma reformulação do atual sistema
educacional. Por isso, é pertinente a reflexão acerca dos conceitos que norteiam sua
elaboração e o impacto no processo de inclusão na escola regular inclusiva, como
conduziremos na sessão seguinte.

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e a desconstrução de uma proposta educacional inclusiva
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4. MUDANÇA CONCEITUAL E ESTRUTURAL DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NO


TEXTO DA PNEE (2020) E O IMPACTO NA PERSPECTIVA INCLUSIVA
PRECONIZADA NA PNEEPEI (2008)

A PNEEPEI (2008), documento que embasa e ampara legalmente a Educação


Especial na perspectiva inclusiva, foi elaborada a partir do entendimento de que a
Educação Inclusiva se constitui em

um paradigma educacional fundamentado na concepção de direitos


humanos, que conjuga igualdade e diferença como valores indissociáveis, e
que avança em relação à ideia de equidade formal ao contextualizar as
circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e fora da escola
(BRASIL,2008, p.10).

A partir dessa concepção, o referido documento aponta a relevância da


construção de sistema educacional inclusivo para que a escola exerça seu papel na
superação da exclusão, através do confronto às práticas discriminatórias, e atenda a
todos os alunos de acordo com suas especificidades. Nesta perspectiva, a PNEEPEI
(2008) reestrutura a organização da Educação Especial, antes substitutiva ao ensino
comum e entendida como a forma mais apropriada para o atendimento de alunos que
apresentavam deficiência ou que não se adequassem à estrutura sólida dos sistemas
de ensino, e também da escola regular acarretando uma mudança estrutural e cultural
em seu ambiente.

A PNEEPEI (2008) orienta que a Educação Especial integre a proposta


pedagógica da escola regular, atuando articuladamente ao ensino comum. No âmbito
do processo educacional, direciona ações com vistas à orientação e promoção do
atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos que compõe seu
público e também em casos que implicam em transtornos funcionais específicos. Em
uma perspectiva mais ampla, orienta a organização de redes de apoio, a formação
continuada, a identificação de recursos, serviços e o desenvolvimento de práticas
colaborativas.

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Neste sentido, a Educação Especial no texto da PNEEPEI (2008) é conceituada


como

[...]uma modalidade de ensino que perpassa todos os níveis, etapas e


modalidades, realiza o atendimento educacional especializado, disponibiliza
os recursos e serviços e orienta quanto a sua utilização no processo de
ensino e aprendizagem nas turmas comuns do ensino regular (BRASIL,2008,
p.22).

Esta concepção atribui à modalidade da Educação Especial uma perspectiva


que apresenta consonância com o delineado pelos preceitos da Educação Inclusiva,
que visa à constituição de um ambiente educacional em que todos tenham atendidas
as suas necessidades educativas.

Em contrapartida, a PNEE (2020) traz em seu texto uma crítica em relação às


práticas colaborativas entre professores da Educação Especial e professores do
ensino regular. Ressalta que pesquisas evidenciam que tais práticas não são
melhores que a instrução direta e afirma haver evidências de que a inclusão radical,
entendida como inserção de todos os alunos na sala regular (MANTOAN, 2015), não
proporciona os melhores resultados para todos os alunos, podendo até tornar-se
prejudicial para alguns, que de acordo com o referido documento continuam
vivenciando experiências segregadoras no processo educacional.

Acentua que a "aparente" inclusão na sala de aula comum não representa o


desejo de parte dos educandos ou suas famílias, sendo por eles percebidos como
imposição, oposta à defesa da liberdade, ao respeito à diversidade e aos direitos
humanos entendendo a sua prática como uma conduta contrária à inclusão no período
pós-escolar, e atrela o sucesso desta à garantia do direito ao atendimento precoce em
classe ou escola especializada.

A PNEE (2020) traz o entendimento de que seu objetivo é propiciar avanços na


área da Educação Especial e, para isto, remodela a ênfase dada à inclusão radical,
usando como justificativa para essa modificação que esta sempre foi a estrutura
utilizada no Brasil. E, também, o disposto no artigo n° 58 da Lei de Diretrizes e Bases

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e a desconstrução de uma proposta educacional inclusiva
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da Educação (BRASIL, 1996) em relação ao atendimento educacional para o público


alvo da educação especial ser "preferencialmente" na escola regular.

De acordo com a PNEE (2020), a presença deste termo deixa lacunas em


relação à exclusividade da oferta do atendimento educacional na escola comum, como
preceituado pela PNEEPEI (2008). Além disso, afirma que o uso do adjetivo regular
não deve ser feito para contrastar com especial ou especializada, visto que esse
ambiente educacional não apresenta irregularidades, sendo, portanto, pertencente ao
sistema regular de ensino assim como as comuns.

A PNEE (2020) afirma que todas as escolas devem ser inclusivas, sejam elas
comuns ou especializadas, e que não pode haver contradição entre Educação
Especial e Educação Inclusiva. Ressalta que nunca uma dessas dimensões pode ser
utilizada para anular a outra e que devido a isso sua elaboração consiste em

[...] oferecer avanços na área da educação especial. Poder-se-ia até nomear


“educação especial inclusiva”, visto que o objetivo é oferecer o melhor da
educação especial e o melhor da educação inclusiva [...], porque toda
educação especial deve ser inclusiva e toda prática de inclusão deve ser
compreendida como sendo motivo de atenção especial (BRASIL, 2020, p.
15).

Ao analisar a proposta descrita na PNEE (2020) depreende-se que, em sua


perspectiva, a Educação Especial, antes entendida como modalidade transversal a
todos os níveis, etapas e modalidades e complementar ao ensino regular, passa a
exercer o papel de substitutiva ao ensino comum. Assim, atua restritivamente dentro
da escola regular e amplia as possibilidades de ações fora dela, destoando da
perspectiva inclusiva apresentada na PNEEPEI (2008), passando a ofertar

recursos e serviços para garantir a educação equitativa e inclusiva nas salas


de aulas regulares inclusivas, nas escolas e classes especializadas, nas
escolas bilíngues de surdos, nas escolas-polo, nas salas de recursos
multifuncionais e específicas e nos centros de atendimento educacional
especializado. Oferece também o serviço de atendimento educacional
especializado gratuito ao público-alvo da educação especial, em todos os
níveis, etapas e modalidades, de modo complementar e suplementar, no
contraturno, para que cada estudante tenha assegurada sua aprendizagem
nas escolas regulares inclusivas ou nas escolas bilíngues de surdos, ou,
ainda, nas escolas especializadas quando os educandos não se beneficiarem
dos processos educacionais nas escolas regulares inclusivas (BRASIL, 2020,
p. 36).

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e a desconstrução de uma proposta educacional inclusiva.
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Neste sentido, a PNEE (2020) ressalta que é urgente a necessidade de ofertar


para a população o que há de melhor nas duas possibilidades de atendimento, seja
em escolas regulares ou em classes e escolas especializadas, concedendo aos
educandos e às famílias a decisão sobre de qual desses atendimentos querem se
beneficiar. Como fundamento para justificar a existência das possibilidades de
atendimento apresentadas, o referido documento define abordagem educacional
inclusiva como sendo

a reafirmação do direito não apenas de matrícula, mas de permanência e de


aprendizagem exitosa para todos os educandos nas escolas regulares, caso
seja esta a escolha. Isso quer dizer que a garantia da matrícula nas escolas
regulares continua sendo direito irrevogável dos educandos e das famílias
que por ela optarem e que esse direito deve ser atendido com qualidade. Mas
essa PNEE afirma, também, que a matrícula em classes e escolas
especializadas, ou classes e escolas bilíngues de surdos, é igualmente direito
que deve ser oferecido aos educandos que não se beneficiarem das escolas
regulares, em atenção à opção primeiramente do educando, na medida em
que este é capaz de se expressar, e também à opção de sua família (BRASIL,
2020, p.41).

A abordagem inclusiva adotada na PNEE (2020) causa uma ruptura com o


modelo de Educação Inclusiva delineada na PNEEPEI (2008), que defende o direito
de todos os alunos estarem juntos na escola regular e entende a criação de
instituições especializadas, escolas e classes especiais como modelo tradicional de
educação escolar para os alunos PAEE.

Na perspectiva da Educação Inclusiva, a inclusão dos alunos público-alvo da


Educação Especial nas classes comuns da escola regular não acontece geralmente,
mas na condição de atendimento às peculiaridades de cada educando. Esta
interpretação é entendida pela PNEE (2020) como sendo impedimentos individuais de
longo prazo que em interação com barreiras educacionais e escolares podem
comprometer a efetiva aprendizagem.

Dessa forma, a escola regular que, embasada na PNEEPEI (BRASIL, 2008),


galga a inclusão de todos os alunos indistintamente, e se organiza no sentido de
enfatizar seu aspecto pedagógico em contraste aos aspectos relacionados à
deficiência, valorizando os diversos potenciais de aprendizagem no ensino comum,
assume outra perspectiva. É entendida como instituição de ensino que oferta o AEE

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aos alunos da Educação Especial em classes regulares, classes especializadas ou


salas de recursos e as escolas especializadas, instituições de ensino organizadas
para atendimento aos alunos público-alvo da Educação Especial que não têm seu
desenvolvimento favorecido nas escolas regulares inclusivas (BRASIL, 2020).

A nova configuração trazida pela PNEE (2020) exerce impacto considerável no


que diz respeito ao atendimento educacional dos alunos com deficiência, transtornos
globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação (BRASIL, 2008) nas
classes comuns das escolas regulares inclusivas. Apesar de a PNEE (2020) trazer em
sua proposta uma abordagem inclusiva, entende-se que destoa totalmente do
paradigma inclusivo no qual se baseou a construção da PNEEPEI (2008). Diferente
desta que prega a inserção de todos na escola comum, a nova política (BRASIL,2020)
amplia alternativas de inclusão, evidenciando em seu bojo característica intrínseca do
modelo educacional integrador.

Assim sendo, ressalta-se que a proposta de adequação delineada na PNEE


(2020) não pode ser entendida como medida que propicia avanços na área da
Educação Especial. Da mesma forma, não apresenta consonância com a perspectiva
inclusiva, causando impactos consideráveis no processo de inclusão dos alunos
PAEE. Depreende-se que práticas pensadas para desenvolvimento e avanço da
Educação Especial devem pleitear uma perspectiva de atuação que tenha como foco
a constituição de ambientes que acolham e atendam os alunos em sua diversidade e
não a promoção da sua adaptação às estruturas das instituições educativas,
conservando e reproduzindo o modelo tradicional de educação escolar.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A constituição de um sistema educacional inclusivo é sem dúvidas um avanço


para a construção de uma escola justa e democrática, bem como para a promoção de
uma educação de qualidade para todos. Essa constituição vem sendo desenvolvida
pelo Brasil ao longo de 13 anos, através da execução das orientações previstas no
documento que corresponde à PNEEPEI (2008).

No entanto, com a justificativa de que nem todos os alunos estão sendo


beneficiados com este trabalho, surge em 2020 uma proposta de "adequação" a esta
política através da elaboração da PNEE (2020) e com ela a possibilidade de
implementação de um novo cenário no sistema educacional.

A PNEE (2020) assegura uma política inclusiva, porém, ao analisar sua


proposta de adequação é notória a discrepância em relação ao delineado pela
PNEEPEI (2008), tanto no que concerne à abordagem atribuída à inclusão como no
conceito e organização da Educação Especial. Para a PNEEPEI (2008), a Educação
Especial é entendida a partir do preceito inclusivo como transversal e articulada ao
ensino comum. Já na PNEE (2020), é substitutiva e segregadora, impactando
significativamente no direito inalienável da pessoa com deficiência à educação na
escola regular.

Após a análise das teorias apresentadas nesse estudo, pode-se perceber que
a organização da Educação Especial de forma segregadora apresenta em sua
estrutura uma perspectiva de atuação que se contrapõe à da inclusão. Dessa forma,
reproduz o modelo tradicional de educação, pois não propicia mudanças no ensino
comum, que permanece inerte no que diz respeito a metodologias e estratégias
pedagógicas e não valoriza as diferenças e especificidades dos alunos.

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Concorda-se que a efetivação de uma educação inclusiva demanda profunda


reflexão no que diz respeito ao conceito que se atribui à Educação Especial, visto que
tal definição interfere diretamente em sua estruturação e consequentemente em suas
práticas. Reitera-se que, se o que se quer é uma educação que seja inclusiva é
necessário romper com o modelo de educação escolar que exclui e segrega.

Isto posto, salienta-se que a proposta de adequação apresentada na PNEE


(2020) não corresponde aos anseios e preceitos da inclusão. Representa uma posição
contrária a esta prerrogativa, característica do modelo educacional integrador, e
retrocede ao direito à educação a todos, garantido em nossa Carta Magna.

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"https://www.scielo.br/pdf/ensaio/v25n97/1809-4465-ensaio%20S0104-40362017002500887.pdf"pdf.
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