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09/11/2017 Ciência, Tecnologia e Inovação Africana e Afrodescendente | Das Lutas

Das Lutas

Coletivo

Ciência, Tecnologia e Inovação Africana


e Afrodescendente

Por Ana Paula Martins.


[Sugestão: para ler ouvindo isso e se apaixonar pela História Antiga da África e dos povos africanos.]

Está acontecendo no Espaço Cultural Sarau Elo da Corrente, em Pirituba, zona norte de São Paulo,
uma série de palestras, debates, oficinas e atividades reunidas no evento chamado “Mostra Negra
Consciência”. No dia 15 de setembro pude ter a sorte e o contentamento de ver o pesquisador Carlos
Machado, da USP, falar sobre seu livro, um trabalho de pesquisa monumental, que mostra a grande
RAPINA e o enorme EMBUSTE MATERIAL, INTELECTUAL E EPISTEMOLÓGICO que formaram a
Europa e a civilização ocidental.

Carlos Eduardo Machado, historiador, professor e pesquisador da USP.

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09/11/2017 Ciência, Tecnologia e Inovação Africana e Afrodescendente | Das Lutas

Carlos aponta como a civilização ocidental, branca e eurocêntrica, escondeu, omitiu, mentiu, silenciou
e aniquilou diversos indícios e provas de que a maior parte das grandes descobertas matemáticas,
arquitetônicas, biológicas, médicas, químicas e muitas outras, que permitiram e impulsionaram
nossos avanços científicos e tecnológicos até hoje e, até mesmo, a própria organização do que
entendemos por ocidente, têm origem nas sociedades africanas. Carlos explicou como nos casos em
que essa origem não podia ser apagada de nenhuma forma, as descobertas, os fatos e as informações
foram omitidos, distorcidos e manipulados de todas as maneiras possíveis para negar as capacidades
do povo negro, para que o povo negro fosse/seja mantido no lugar em que o ocidente branco deseja
mantê-lo: de inferior, incapaz, não dotado de inteligência e capacidades. Ele desvela diversos
discursos e estratégias da narrativa branca ocidental para isso, como, por exemplo, atribuir, então,
tudo aquilo que não pode ser roubado dos povos africanos a feitos e descobertas pertencentes a uma
África branca (embranquecida pelas narrativas e representações dos dominadores) e, até mesmo,
atribuídas a extraterrestres! – quem nunca viu filmes e outras representações sobre o Egito só com
pessoas brancas, não é mesmo? Aliás, melhor perguntar: quem sabe que o Egito fica na África e que
sua população é negra? Por outro lado, quem nunca ouviu dizer que as pirâmides do Egito foram
construídas por extraterrestres? Porque no imaginário ocidental, parece claro que povos negros não
seriam capazes de tamanha sabedoria e engenho, não é mesmo?

Engenho, conhecimento e tecnologia dos antigos povos negros? Pro ocidente branco não.

Carlos desvela como essas manipulações e omissões formam uma imagem não só sobre a África, mas,
sobretudo, sobre o próprio ocidente, num discurso que remonta ao processo de
escravidão/colonização e ao neocolonialismo até os dias de hoje, e que associa inteligência aos povos
brancos europeus e desatrela as noções de inteligência/intelectualidade/capacidade da ideia de
negritude e do próprio povo e culturas africanas. Tudo isso no movimento perverso de reiterar e
perpetuar o racismo pela noção de que os povos africanos seriam intelectualmente inferiores, para,
em nome de um projeto de poder branco, designar a esse povo e a essas pessoas seus lugares de
inferioridade no mundo e assim seguir dominando, explorando, expropriando e se reafirmando
enquanto civilização e em seu projeto civilizador/explorador, como fazem até hoje, ainda depois da
diáspora que promoveram na África.

Antiga cidade de Loango, ou Lovango, no século 16, na região conhecida hoje como Congo.

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Imagem recente da cidade de Timbuktu ou Tumbuctu, fundada no século 5, onde foi criada a PRIMEIRA UNIVERSIDADE DO
MUNDO, construída, segundo historiadores, antes do século 12.

Na palestra, eu pude ver o que escola nenhuma nunca me mostrou: o povo africano antigo
desenvolvendo saberes e tecnologias muito antes de quaisquer outros povos, inclusive dos povos
gregos e romanos, a quem é atribuída, embusteiramente, a “origem da civilização”. Pude ver que,
posteriormente, essas tecnologias e saberes foram absorvidos inclusive pela própria cultura grega e
que estes faziam, frequentemente, diversas referências explícitas, em seus ritos, registros e tradições,
aos deuses e personalidades africanas e aos conhecimentos e saberes herdados ou compartilhados
com esses povos, e que esse dado é frequentemente – e propositalmente! – apagado pelas
comunidades cientificas modernas e suas narrativas sobre o desenvolvimento das sociedades e do
conhecimento e da tecnologia; pude ver a rigorosa organização de cidades imensas nos impérios e
reinos africanos (sim, cidades! com toda arquitetura e organização de uma cidade como as que são
mostradas nos livros de História como engenhos exclusivos das sociedades europeias ao final do
feudalismo – dado que também foi apagado pelas narrativas modernas sobre África!); pude saber da
existência de várias comunidades africanas antigas com desenvolvimento de escrita, contrariando a
informação comumente e convenientemente divulgada sobre a predominância da oralidade na África
(e a gente sabe que o desenvolvimento da escrita ainda é considerado uma prova de “evolução” de
uma sociedade e seus indivíduos, assim como a negação ou o apagamento de uma tradição de escrita
é uma importante forma de dominar e aniquilar um povo e uma cultura), assim como soube de um
monte de outras informações que contrariam aquela imagem amplamente difundida dos povos
africanos como “bárbaros”, “incultos”, “incivilizados” e “desorganizados” que viviam em tribos se
matando e comendo uns aos outros o tempo todo.

Tradicionais penteados afros: conhecimento antigo de geometria fractal desenvolvido pelos antigos e sábios povos
africanos.

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Assistir as palestras de Carlos Machado, ler seu livro, conhecer sua pesquisa, divulgá-la, é de extrema
necessidade e urgência! Porque o mais importante de tudo, o que há de mais significativo e de uma
potência transformadora incrível nesse trabalho, é o caminho que alguns pesquisadores negros (assim
como as mulheres) já estão trilhando de reconstrução das narrativas, mitos fundantes, memórias,
histórias e sociogêneses (e da própria realidade) do mundo contemporâneo ao nos mostrar que, ao
contrário do imaginário que nos foi imposto sobre as populações africanas suas civilizações,
tecnologias e costumes (que eram, sempre foram, de uma organização e complexidade tremendas), a
cultura e as sociedades africanas não compõem apenas uma CONTRIBUIÇÃO a instituição das
sociedades modernas ocidentais, mas são elementos FUNDANTES de tudo, ABSOLUTAMENTE
TUDO, que produzimos e que nos identifica hoje como sociedade e como ocidente.

Um trabalho fundamental de reescrita da História e de descolonização radical que está apenas


começando.

Que em breve a África se levante em todo seu poder e força e que a farsa violenta da Civilização se
lasque todinha e caia morta!

Representação de guerreiros do Reino Zulu, que lutaram e resistiram bravamente contra as invasões holandesas e inglesas
a seus territórios durante o neocolonialismo do século 19.

Links pra saber mais:

Artigo “Ciência negra: uma proposta para a descolonização do conhecimento”, de Carlos Machado,
pro site Mundo Negro:
h p://www.mundonegro.inf.br/portal/2014/02/ciencia-negra-uma-proposta-para-a-descolonizacao-
do-conhecimento/

Curso de Carlos Machado na Universidade São Judas:


h ps://www.facebook.com/events/614041262050610/?ref=ts&fref=ts

E-book Ciência, Tecnologia e Inovação Africana e Afrodescendente à venda:


h p://www.bookess.com/read/19840-ciencia-tecnologia-e-inovacao-africana-e-afrodescendente/

Matéria sobre Carlos Machado e sua pesquisa no portal Geledés:


h p://arquivo.geledes.org.br/areas-de-atuacao/questao-racial/afrobrasileiros-e-suas-lutas/19478-
ciencia-tecnologia-e-inovacao-afrodescendente

Espaço Sarau Elo da Corrente em Pirituba-SP:


h p://elo-da-corrente.blogspot.com.br/

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5 comentários em “Ciência, Tecnologia e Inovação Africana


e Afrodescendente”

Kátia Flávia
18 de setembro de 2014

Ótimo artigo sobre o brilhante trabalho do pesquisador Carlos Machado! Esse coletivo Das Lutas
só produz e divulga coisas boas, parabéns!

Responder
Carlos Machado
3 de novembro de 2014

Excelente síntese da palestra Ana! Agradecido de coração pelo presente de alma! Vamos
trabalhando para descolonizar as mentes do nosso povo! Desejo sucesso hoje e sempre!

Responder
anapesilva
11 de novembro de 2014

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Seu trabalho é encantador! Fico feliz em poder divulgá-lo! Sucesso pra nós!

Responder
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ivo martins maia


4 de agosto de 2017

O brasil que sempre citou como não racista, nunca falou ou citou algum documentário de
inventores negros, afim de incentivar os mais pobres e negros a, estudar mais e mais a ciência.
Nunca foi de interesse deste pais ver os negros: Engenheiros, médicos e etc.

Responder

Publicado em 18 de setembro de 2014 por anapesilva em Resistências Estéticas.


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