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Especialização em

NONO
MÓDULO 9 TEOLOGIA
PENTECOSTAL

BATISMO NO ESPÍRITO SANTO


DONS E FRUTO DO ESPÍRITO

FACULDADE
CRISTÃ DECURITIBA
Esequias
Soares

Esequias Soares é pastor da Assembleia de Deus de Jundiaí-SP,


presidente do Conselho Deliberativo da Sociedade Bíblica do Brasil
(SBB) e da Comissão Apologética da CGADB. É graduado em Hebraico
pela Universidade de São Paulo e Mestre em Ciências da Religião pela
Universidade Presbiteriana Mackenzie. Autor de diversos livros como O
pentecostalismo brasileiro e O verdadeiro pentecostalismo.

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BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO 9
NONO
MÓDULO

INTRODUÇÃO

O objetivo da presente disciplina é duplo, primeiro, mostrar e explicar os


fundamentos bíblicos dos principais pontos da teologia pentecostal,
conforme lista a Declaração de Fé das Assembleias de Deus no Brasil: o
batismo no Espírito Santo, os dons espirituais e o fruto do Espírito.
Segundo, responder aos questionamentos dos teólogos cessacionistas e dos
críticos à doutrina pentecostal, usando as mesmas ferramentas da
erudição crítica de sua hermenêutica. Assim, ao final do curso, o aluno será
capaz de entender as crenças pentecostais e responder aos
questionamentos relacionados a elas. A resposta às críticas contra a
doutrina pentecostal é essencial porque, desde a década de 1960, se dizia
que a nossa hermenêutica era pragmática e não científica e, por isso, que
ser batizado no Espírito Santo, conforme doutrina pentecostal, não teria
sustentação bíblica. Hoje já está confirmada a falácia desse pensamento
oposto à nossa doutrina.

A teologia pentecostal não se restringe ao batismo no Espírito Santo, vai


tratar também dos dons e do fruto do Espírito. Por essa razão, há na
presente disciplina um estudo sobre a realidade dos dons espirituais e a sua
função na vida da igreja ontem e hoje para demonstração do poder de Deus
perante o mundo, a edificação interna da vida da Igreja e o conforto e
crescimento espiritual. O fruto do Espírito é o resultado de uma vida cristã
abundante e manifestada no relacionamento entre os irmãos e irmãs na
igreja e no lar, na convivência com os descrentes no trabalho e na
sociedade. Ponto que ressalta a necessidade de entender o conflito entre a
carne e o Espírito e a função do fruto do Espírito.

Mesmo entre os pentecostais e carismáticos há interpretações diferentes


no que diz respeito ao conceito do batismo no Espírito Santo e as suas
manifestações. O que é comum em todas essas igrejas e comunidades é a 1. MENZIES, P. Robert.
crença na atualidade dessas manifestações, todos elas discordam do Pentecostes – Essa história é
cessacionismo. O pensamento pentecostal descrito na Declaração de Fé a nossa história. Rio de
das Assembleias de Deus é o que se chama de “pentecostalismo clássico”. O Janeiro: CPAD, 2016, p. 14.
pentecostal clássico nessa disciplina é a perspectiva teológica “que as 2. SOARES, Esequias. O
experiências descritas em Atos servem de modelo para a experiência cristã pentecostalismo brasileiro –
contemporânea, que o batismo no Espírito Santo (At 2.4) é uma Um guia histórico e teológico
capacitação pós-conversão para a missão e que o falar em línguas marca para compreender o
Pentecostes no Brasil. Rio de
essa experiência” . Mas, nem sempre esse é o significado do termo que Janeiro; CPAD, 2021, p. 140.
surgiu posteriormente e que “foi aplicado aos pentecostais da primeira
geração, provenientes do avivamento da Rua Azusa. Os carismáticos 3. SOARES, Esequias. O
adotaram essa expressão, em 1970 para se distinguirem dos verdadeiro pentecostalismo –
pentecostais” . Essa expressão é usada também para “aquelas A Atualidade da Doutrina
Bíblica sobre a Atuação do
denominações que começaram nos primeiros 25 anos do século 20” . Antes Espíito Santo. Rio de Janeiro;
de 1960, para aquelas pessoas das igrejas protestantes que recebiam o CPAD, 2020, p. 10.
batismo no Espírito Santo e falavam em línguas restavam duas opções,
guardar silêncio ou ser expulso, mas, isso foi mudado a partir da

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experiência de um bispo episcopal, Dennis Bennet, que iniciou o


movimento carismático em Olympia, nos arredores de Seattle, no estado
de Washington na década de 1960. Ele teve uma experiência com o Espírito
Santo, falou línguas, e procurou pregar essa doutrina em sua paróquia, foi
rejeitado, além disso, foi aconselhado pelo bispo a se exonerar da Igreja
Episcopal por causa do seu batismo no Espírito Santo.

PRIMEIRA PARTE - O BATISMO NO ESPÍRITO SANTO

CREMOS, professamos e ensinamos que o batismo


no Espírito Santo é um revestimento de poder do
alto. . . Trata-se de uma experiência espiritual
que ocorre após ou junto à regeneração, sendo
acompanhada da evidência física inicial do falar
em outras línguas. . . O batismo no Espírito
Santo é algo distinto do novo nascimento;
significa o recebimento de poder espiritual para
realizar a obra da expansão do Evangelho em
todo o mundo (Declaração de fé das Assembleias
de Deus, capítulo XIX, introdução; 1).
São dois pontos fundamentais sobre o batismo no Espírito Santo na
confissão de fé das Assembleias de Deus: é distinto da salvação, uma
capacitação carismática distinta da regeneração sendo sua evidência física
inicial o falar em línguas, a glossolalia. Esses “são os dois princípios básicos
que caracterizam o batismo no Espírito Santo no conceito do
pentecostalismo clássico”⁴ e parte das crenças e práticas da Assembleias
de Deus conforme a sua Declaração de Fé.

O movimento pentecostal moderno teve início em 1º. de janeiro de 1901 na


cidade de Topeka, no estado de Kansas, nos Estados Unidos, na Escola
Bíblica Betel, fundada em 1898 por Charles Fox Parham, mas a construção
teológica dessa doutrina vem desde João Wesley (1703-1784). Na verdade,
a expressão “cristão pentecostal”, ou “cristianismo pentecostal” é uma
redundância, pois a jornada histórica da igreja se iniciou no dia de
Pentecostes, Atos 2, as manifestações do Espírito eram rotina na vida dos
primeiros cristãos.

4. SOARES, Esequias. O
pentecostalismo brasileiro,
p. 167.

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O QUE É O BATISMO NO ESPÍRITO SANTO

O Evangelho de Lucas e Atos identificam o batismo no Espírito Santo como a


“promessa do Pai” (At 1.4) ou “do meu Pai” e o “revestimento de poder” ou
“poder do alto” (Lc 24.49), e ainda “dom do Espírito Santo” (At 2.38;
10.45), e “virtude do Espírito Santo” (At 1.8). A promessa da vinda do
Espírito Santo vem desde o Antigo Testamento (Is 44.3; Ez 36.24-28; 37.14;
39.28; Jl 2.28-31). João Batista anunciou que o cumprimento dessa
promessa se aproximava (Mt 3.10; Mc 1.8; Lc 3.16; Jo 1.33) e o Senhor Jesus
ratificou a mensagem diversas vezes (Lc 24.49; Jo 7.37-39; 14.16, 17, 26;
15.26; 16.7-11; At 1.4, 5). Isso se cumpriu no dia de Pentecostes, Atos 2.

Convém deixar claro que a construção com o substantivo “batismo no


Espírito Santo” não aparece no Novo Testamento, mas sim com o verbo
“batizar no Espírito Santo”. A expressão “batizado no Espírito Santo” e
fraseologia similar aparecem sete vezes no Novo Testamento, quatro vezes
nos Evangelhos (Mt 3.11; Mc 1.8; Lc 3.16; Jo 1.33), duas em Atos (At 1.5;
11.16) e uma em Paulo (1 Co 12.13). É um termo conhecido dos cristãos,
usual desde a antiguidade, e ainda hoje faz parte da linguagem dos
seguidores de Jesus, leigos e teólogos, pentecostais e não pentecostais. O
importante é saber de que as Escrituras estão falando e qual o significado
dessa promessa, ponto em que muitos têm tropeçado.

Ser batizado no Espírito Santo é identificado como receber poder do alto e


a “promessa de meu Pai” (Lc 24.49). Os discípulos deveriam esperar o seu
cumprimento em Jerusalém (At 1.4, 5). Não há dúvida de que a descida do
Espírito no dia de Pentecostes é uma referência a esse batismo (At 2.2-4). A
maioria dos expositores do Novo Testamento, pentecostais e não
pentecostais, chega a essa conclusão também pela explicação do apóstolo
Pedro aos demais apóstolos (At 11.15, 16). Isso reforça a ideia de que
“cheios do Espírito Santo” em Atos 2.4 se refere ao ser batizado conforme
João Batista havia anunciado⁵.

O livro de Atos usa outros termos para o batismo no Espírito Santo e o


descrevem de diversas maneiras: “E todos foram cheios do Espírito Santo”
(At 2.4), “derramarei o meu Espírito” (Jl 2.28) ou “derramarei do meu
Espírito” (At 2.17), “caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a
palavra” (At 10.44), “E, quando comecei a falar, caiu sobre eles o Espírito
Santo” (At 11.15); “veio sobre eles o Espírito Santo; e falavam línguas e
profetizavam” (At 19.6). São as várias maneiras que Lucas usa para 5. Essa verdade não pode ser
descrever como os discípulos eram batizados no Espírito. contrabalançada com outras
partes do Novo Testamento,
num contexto diferente,
onde indica uma vida na
plenitude e no fervor do
Espírito (At 4.8, 31; 7.55;
13.52; Ef 5.18).

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A DOUTRINA DA SEPARABILIDADE

Há teólogos pentecostais e carismáticos, além dos não pentecostais, que


confundem batismo no Espírito Santo com regeneração, cujas ideias serão
analisadas mais adiante. Cinco passagens em Atos descrevem o batismo no
Espírito Santo e mostram ser essa uma experiência subsequente à
salvação, distinta da conversão (At 2.4; 8.15-17; 9.17; 10.44-48; 19.1-7).

1. Atos 2.4. No Pentecostes, “Todos ficaram cheios do Espírito Santo e


começaram a falar em outras línguas, segundo o Espírito lhes concedia que
falassem” (At 2.4). Todos os presentes, quase 120 pessoas, eram crentes
em Jesus. Para ser verdadeira a afirmação de que o batismo no Espírito
Santo seja salvação, seríamos obrigados a admitir que nenhum deles era
crente. Tal ideia é inaceitável à luz da Bíblia. Todos já eram discípulos de
Jesus antes dessa experiência de serem cheios do Espírito Santo e falarem
línguas. Dentre eles estavam os apóstolos (At 1.12-14), os quais já estavam
com seus nomes escritos no céu (Lc 10.20), limpos pela palavra (Jo 15.3) e
haviam recebido o Espírito Santo (Jo 20.22). Jesus disse que a promessa do
Espírito era para revestir os seus discípulos de poder como capacitação
para testificar de Cristo (At 1.8) e não para ser uma experiência iniciática.
O profeta Ezequiel anunciou um derramamento do Espírito Santo para a
purificação (Ez 36.25, 33) e capacitação dos purificados (Ez 36.27). A vinda
do Espírito Santo tem essas duas funções, de modo que, no Pentecostes,
veio o revestimento de poder conforme prometido pelo Senhor Jesus (Lc
24.49; At 1.8).

2. Atos 8.15-17. Em Samaria, muitos se converteram e foram batizados:


“como cressem em Filipe, que lhes pregava acerca do Reino de Deus e do
nome de Jesus Cristo, se batizavam, tanto homens como mulheres” (At
8.12). A manifestação do poder de Deus tomou conta da cidade: “E as
multidões unanimemente prestavam atenção ao que Filipe dizia, porque
ouviam e viam os sinais que ele fazia pois que os espíritos imundos saíam de
muitos que os tinham, clamando em alta voz; e muitos paralíticos e coxos
eram curados” (8.6,7). E, assim, o Evangelho era divulgado em Samaria
como determinou o Senhor (At 1.8). A igreja de Jerusalém soube “que
Samaria recebera a palavra de Deus” (8.14-17) e envio os apóstolos para lá.
Quando Pedro e João chegaram em Samaria já havia uma comunidade de
cristãos fundada por Filipe, eram crentes e haviam sido batizados nas
águas. Os apóstolos oraram para que os samaritanos recebessem o Espírito
Santo (v. 15) e quando lhes impuseram as mãos, “receberam o Espírito
Santo” (8.17). Os samaritanos já eram crentes quando receberam o
batismo o Espírito Santo (At 8.6-17). Dizer que esses samaritanos não eram
crentes se baseia numa exegese ruim e viola os mais rudimentares
princípios da hermenêutica. Assim, fica claro que o batismo é uma
experiência pós-conversão.

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3. Atos 9.17. Se é verdade que batismo no Espírito Santo é a mesma coisa


que conversão, então, Saulo de Tarso teria se convertido durante a visita de
6. A expressão «ser cheio do
Ananias. Isso não faz sentido. Sua conversão aconteceu no seu encontro Espírito Santo» deve ser
com o Senhor (At 9.5) e não três dias depois quando Ananias o visitou. entendida à luz do seu
Vencido e alvejado pela graça de Deus, Saulo foi conduzido cego para contexto. Nem sempre
Damasco já como discípulo de Jesus. O Senhor Jesus encarregou um significa o batismo no
Espírito (At 4.8; 13.9; Ef
discípulo, chamado Ananias, para orar a fim de que Saulo recuperasse as 5.18). Pode indicar outros
vistas e fosse cheio do Espírito Santo: “E Ananias foi, e entrou na casa, e, fenômenos como ministério
impondo-lhe as mãos, disse: Irmão Saulo, o Senhor Jesus, que te apareceu profético (Lc 1.15), profecia
no caminho por onde vinhas, me enviou, para que tornes a ver e sejas cheio (1.41, 67), testemunho (At
do Espírito Santo” (At 9.17)⁶. Foram pelo menos três dias entre o encontro 4.8, 31), realização de
milagres (Rm 15.19) entre
de Saulo com Jesus e o seu contato com Ananias. Isso mostra que ele foi outros. Mas, em Atos 2.4 se
batizado no Espírito Santo depois de sua conversão. refere ao batismo, pois o
contexto confirma isso, como
4. Atos 10.44-48. O testemunho de Cornélio é um exemplo do batismo no foi demonstrado acima (cp At
1.4, 5; 10.44-48; 11.15, 16).
Espírito Santo imediatamente após a conversão, ou simultaneamente, Na experiência de Paulo é
como esclarece a Declaração de Fé das Assembleias de Deus no Brasil. visto como o batismo no
Enquanto Pedro se pronunciava, “caiu o Espírito Santo sobre todos os que Espírito Santo visto que ele
ouviam a palavra” (At 10.44). Isso é o que chamamos de batismo no Espírito mesmo afirma que fala
Santo. Todos reconheceram se tratar da mesma experiência do línguas (1 Co 14.18).
Pentecostes: “Pode alguém, porventura, recusar a água, para que não 7. «O particípio construído
sejam batizados estes que também receberam, como nós, o Espírito sobre o tema do aoristo n‹o
Santo?” (At 9.47), argumentou o apóstolo Pedro. Curiosamente, este é o exprime uma ideia de tempo
único caso da concessão do Espírito Santo antes do batismo em águas. absoluto, mas um tempo
relativo, isto, a
anterioridade em relação ao
5. Atos 19.1-7. Os teólogos que discordam do nosso pentecostalismo verbo principal, qualquer
insistem em afirmar que os doze discípulos encontrados por Paulo em Éfeso que seja o tempo deste» - O
não eram cristãos, mas membros de alguma seita. Com essa interpretação, grifo é original -
a vinda do Espírito Santo sobre os efésios seria a conversão e não o (MURACHCO, Henrique.
Língua Grega – Visão
revestimento de poder, capacitando-os para testemunhar de Jesus. Tal Semântica, Lógica, orgânica
interpretação nos parece forçada, pois o texto sagrado é claro ao e Funcional. Discurso
descrever que havia ali “alguns discípulos” (19.1). Se eram discípulos, essa Editorial/Editora Vozes: São
linguagem esclarece que eram crentes em Jesus. Em outras passagens, o Paulo/Petrópolis, 2001, 276);
«O particípio aoristo
termo “discípulos” refere-se a “cristãos” (At 9.10, 36; 16.10). normalmente, ainda que
nem sempre, é anterior ao
a) Os efésios já eram crentes quando Paulo os encontrou? Os críticos tempo da ação do verbo
baseiam a sua teoria na resposta à pergunta do apóstolo Paulo: “Vocês principal. Mas quando o
receberam o Espírito Santo quando creram? Ao que eles responderam:— particípio aoristo estiver
relacionado a um verbo
Pelo contrário, nem mesmo ouvimos que existe o Espírito Santo” (19.2). A principal aoristo, o particípio
construção grega aqui é elábete pistéusantes, literalmente, “tendo crido, será frequentemente
recebestes?”. A pergunta é se eles receberam o Espírito Santo depois que contemporâneo (ou
creram, como traduz a Bíblia do Peregrino: “e lhes perguntou se haviam simultâneo) à ação do verbo
principal» (WALLACE, Daniel.
recebido o Espírito Santo depois de abraçar a fé”. O verbo grego para Gramática Grega -Uma
“crestes”, usado na construção “quando vocês creram”, é pistéusantes, sintaxe exegética do Novo
particípio aoristo, cujo tempo é anterior ao tempo da ação do verbo Testamento. Editora Batista
principal ou simultâneo⁷. Paulo não perguntou se eles creram, visto que Regular do Brasil: São Paulo,
eram crentes, mas se haviam sido batizados no Espírito Santo. “Pode ser 2009, p. 624).

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(no entendimento de Lucas sobre a questão) que não houve manifestações


carismáticas tais como falar em línguas e profecias, contraste com v. 6.
Lucas (embora não Paulo) deve pensar isto como um sinal de que o Espírito
Santo não estava presente”⁸. Como a construção grega permite tanto a
anterioridade como a simultaneidade temporal, a maioria das versões deu
preferência à segunda opção. Por isso, as nossas Bíblias empregam a
expressão “quando crestes?”, evidenciando o abandono de avaliar a outra
possibilidade. Stanley M. Horton questiona James Dunn, teólogo não
pentecostal, que defende o batismo no Espírito Santo como conversão e
com isso afirma a ideia de que os doze efésios não eram ainda cristãos. Em
sua obra O Espírito Santo na Bíblia, páginas 172-175, responde às objeções
de Dunn⁹.

b) Sectários ou discípulos incipientes? O argumento dos críticos se baseia


na resposta desses efésios: “nem mesmo ouvimos que existe o Espírito
Santo” (v. 2). Muitos expositores de renome do Novo Testamento, como C.
K. Barret e F. F. Bruce, estão de acordo de que a resposta desses efésios não
era de quem não soubessem nada a respeito do Espírito Santo: “A resposta
(v. 2) não indica que os discípulos não sabiam nada a respeito do Espírito
Santo (claramente apresenta no AT e no ensino de João Batista), mas que
não tinham ouvido da vinda do Espírito Santo por meio Messias como
prometido por João” ⁰. Na verdade, eles ainda desconheciam o
derramamento do Espírito Santo no dia de Pentecostes. Por que Paulo não
perguntou se eles eram salvos? Não se pergunta a um descrente se ele tem
o Espírito Santo. Eles haviam sido batizados “no batismo de João” (v. 3).
João Batista anunciou que Jesus é aquele que batiza no Espírito Santo e
veio depois dele (v. 4). É natural admitir que se trata de um grupo de
incipientes e imaturos, que não conheciam os fundamentos da verdade de
forma adequada, como acontece ainda hoje com muitos novos
convertidos. Pelo fato de crerem em Jesus, não apresentaram objeção
alguma: “os que ouviram foram batizados em nome do Senhor Jesus” (v. 5).
Apolo também era um discípulo que só conhecia o batismo de João (At
18.5), a diferença estava no seu preparo teológico, pois era profundo
conhecedor das Escrituras Hebraicas, mas não do ensino dos apóstolos (At
18.1-5).
8. BARRET, C. K. The Acts of
the Apostles. Edinburg,
Scotland: T&T Clark, 1998,
AS LÍNGUAS EM ATOS
p. 894.
O fenômeno “falar em outras línguas” aparece explicitamente três vezes
9. A edição anterior é associado diretamente com a ação divina de batizar no Espírito Santo (At
intitulada, A doutrina do
Espírito Santo, publicada
2.4; 10.44-48; 19.1-7). Isso tem levado os pentecostais clássicos, desde a
pela CPAD. primeira geração do pentecostalismo moderno, a sustentarem a doutrina
evidencial, ou seja, as línguas como “evidência física inicial”, que se
10. BRUCE, F. F. Comentário tornou uma fórmula teológica pentecostal.
Bíblico NVI Antigo e Novo
Testamento. São Paulo:
Editora Vida, 2009, p. 1801.

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1. As línguas do Pentecostes. A glossolalia, que se distingue das línguas


humanas reais, é ininteligível. Lucas emprega dois termos para “línguas”
em Atos 2: glossa (vv. 3, 4, 11) e dialektos (vv. 6, 8). Glossa significa
“língua”, como fala, linguagem, “idioma”, também como membro ou
órgão físico da boca (Tg 3.5) que aparece metaforicamente no relato de
Lucas: “E apareceram, distribuídas entre eles, línguas, como de fogo, as
quais pousaram sobre cada um deles” (v. 3). Ao serem cheios do Espírito
Santo, “Todos ficaram cheios do Espírito Santo e começaram a falar em
outras línguas, segundo o Espírito lhes concedia que falassem” (v. 4). A
exegese das línguas permite os pentecostais clássicos interpretarem o
falar em línguas como um dom do Espírito e de natureza ininteligível. A
palavra “outras” em grego é heteros, assim, lalein heterais glossais
significa “falar em outras línguas”. Segundo o Dicionário Vine, o adjetivo
heteros “expressa uma diferença qualitativa e denota 'outro' de tipo
diferente”. Lucas está falando de uma língua não humana que só pode ser
compreendida por um milagre.

a) O milagre das línguas. O falar em línguas revela as grandezas de Deus:


“Como os ouvimos falar sobre as grandezas de Deus em nossas próprias
línguas?” (v. 11). Nessas glossai, plural de glossa, eles magnificam a Deus
como em Pentecostes eles falavam das grandezas de Deus. O milagre em
Pentecostes foi duplo: os discípulos falaram línguas desconhecidas, a
glossa, e cada representante dessas 17 nações os ouvia cada um em sua
própria língua, dialektos. Deus capacitou a cada um para que entendesse
em sua própria língua, mas a língua que os discípulos falavam era
ininteligível.

b) Que são as línguas? Quando os peregrinos de Jerusalém se dirigiram ao


cenáculo, encontraram os discípulos magnificando a Deus e ficaram
perplexos: “quando se fez ouvir aquela voz, afluiu a multidão, que foi
tomada de perplexidade, porque cada um os ouvia falar na sua própria
língua” (v. 6). Nisto fica-se sabendo que o falar línguas é um sinal da
presença de Deus. Esses peregrinos presenciaram as línguas e o apóstolo
Pedro explica que “isto é o que foi dito pelo profeta Joel” (At 2.16 - ARC).
Isto o quê? O derramamento do Espírito com todos os sinais e dentre eles a
glossolalia. Isso mostra que as línguas são palavras inspiradas de profecias,
pois o apóstolo Pedro, no seu discurso, ao citar o profeta Joel, 2.28-32,
acrescentou a expressão: “e profetizarão” (v. 18), que não aparece na
profecia de Joel. Isso quer dizer que as línguas do Pentecostes são
profecias (At 19.6).

c) Um equívoco corrigido. Charles Fox Parham, com quem o


pentecostalismo moderno se iniciou em 1901, “até o fim de sua vida ele
sustentou a ideia de que as línguas eram para o uso missionário, que o 11. SOARES, Esequias. O
Espírito Santo capacitaria de forma milagrosa a falar qualquer idioma pentecostalismo brasileiro.
desde que necessário. Mas, os pioneiros do avivamento da Rua Azusa p. 34.
desistiram dessa ideia ainda muito cedo” .

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d) Função. Dos três sinais sobrenaturais manifestos no dia de Pentecostes


com a descida do Espírito Santo, somente o “falar em outras línguas” (At
2.4) veio para ficar, ele se repete (At 10.44-47; 19.6). Mas os outros dois:
“um som, como de um vento veemente e impetuoso” (At 2.2) e “línguas
repartidas, como que de fogo” (v. 3) ocorreram uma só vez, e eles não se
repetem nunca mais. As línguas em Lucas-Atos são um sinal de
empoderamento transcultural e hoje também para mostrar que as nossas
experiências são as mesmas dos primeiros cristãos, além de servir como
sinal e elo de ligação com os crentes do primeiro século.

2. Na casa de Cornélio. A experiência de Cornélio é a passagem de Atos mais


convincente em relação aos outros dois. Note a pergunta do apóstolo
Pedro: “Será que alguém poderia recusar a água e impedir que sejam
batizados estes que, assim como nós, receberam o Espírito Santo?” (At
10.47). Ele está se referindo à experiência do dia de Pentecostes. Como ele
e a sua comitiva souberam que Cornélio com os familiares e amigos
receberam o Espírito Santo? Resposta: “Pois eles os ouviam falando em
línguas e engrandecendo a Deus” (v. 46). O “pois”, gar, em grego, é uma
partícula causal, a ideia é de “por causa de”. Pedro e a sua comitiva
souberam que o Espírito Santo veio sobre os gentios porque “os ouviam
falando em línguas”.

3. Os discípulos de Éfeso. Esta é a quinta descrição do batismo no Espírito


Santo em Atos e a terceira que mostra a manifestação das línguas como no
Pentecostes e na casa de Cornélio. Lucas registrou: “E, quando Paulo lhes
impôs as mãos, o Espírito Santo veio sobre eles, e tanto falavam em línguas
como profetizavam” (At 19.6). Como foi possível saber que o Espírito
desceu sobre esses discípulos? Pela manifestação das línguas.

QUESTIONAMENTOS SOBRE A SEPARABILIDADE

Há sete referências bíblicas que mencionam diretamente a promessa


divina de batizar os crentes no Espírito Santo (Mt 3.11; Mc 1.8; Lc 3.16; Jo
1.33; At 1.5; 11.16; 1 Co 12.13). Os críticos encontraram uma única
passagem entre elas que parece favorecer a sua interpretação: “Pois, em
um só Espírito, todos nós fomos batizados em um só corpo, quer judeus,
quer gregos, quer escravos, quer livres. E a todos nós foi dado beber de um
só Espírito” (1 Co 12.13). O Espírito nessa passagem paulina é o sujeito,
mas nesse caso a melhor tradução seria “pelo único Espírito”, ou “por um
só Espírito” e não “em um só Espírito”. Considerando as descrições do
batismo no Espírito Santo em Atos, é coerente afirmar que as outras seis
passagens não sejam iniciáticas.

A expressão que introduz 1 Coríntios 12.13 é kai gar en eni pneumati, “pois,
em um só Espírito”, ou: “por um só Espírito”. Essa diferença muda tudo.
Outras versões da Bíblia adotam a segunda opção ou fraseologia similar:
“pelo mesmo Espírito” (NTLH); “pelo único Espírito” (NVT); a NVI e a TNIV

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têm esta nota: “Ou com ou ainda por”; mas na NVI em inglês há uma
inversão, “por um Espírito” está no texto e, “em um Espírito”, aparece
no rodapé indicando tradução alternativa. O mesmo acontece com as
versões inglesas que usam: “por um Espírito”. Os textos interlineares do
Novo Testamento Grego-Português de Valdyr Carvalho Luz e de Zane C.
Hodges & Arthur Farstad também empregam “por um só Espírito”.

Os contrários à separabilidade costumam alegar que a preposição grega ν,


en, significa tão somente “em”. É natural o uso dessa preposição no caso
instrumental, en parabolais elegen autois, “disse, por meio de parábolas”
(Mc 3.23); en pery apokalyptetai, “será revelada pelo fogo” (1 Co 3.13).
Acontece que en frequentemente significa “por” como “movido pelo
Espírito” (Lc 2.27); “ninguém que fala pelo Espírito de Deus” (1 Co 12.3)”.
Stanley Horton escreveu num artigo: “É claro que não é apenas preferência
hermenêutica pentecostal que faz uma distinção entre o batismo pelo
Espírito, que incorpora os crentes no corpo de Cristo, e o batismo no
Espírito Santo, no qual Cristo é aquEle que batiza” . O batismo paulino em
1 Coríntios 12.13 não é o mesmo do batismo de Pentecostes, portanto,
afirmar ser o batismo no Espírito Santo termo alternativo para salvação se
baseia numa exegese ruim, por essa razão os pentecostais clássicos, desde
a Rua Azusa defendem a separabilidade.

QUESTÕES HERMENÊUTICAS

O questionamento da hermenêutica pentecostal se acentuou a partir da 12. Common English Bible,


década de 1960. John W. Stott escreveu o livro, Batismo e Plenitude do King James Version, James
Espírito Santo: o mover sobrenatural de Deus, publicado em 1966, onde Moffatt A translation of the
declara “o cristão recebe primeiro 'o dom' ou “batismo' do Espírito, no Bible, New American
começo da nova vida” ⁴, ele sequer distinguiu “a virtude do Espírito Santo, Standard Bible.
que há de vir sobre vós” da experiência salvífica dos discípulos que já 13. HORTON, Stanley M. I & II
estavam com o “nome escrito no céu” (Lc 10.20), que já tinham o Espírito Coríntios – Os Problemas da
Santo (Jo 20.22). Todos os crentes têm o Espírito, não existe cristão sem o Igreja e Suas Soluções. Rio
Espírito Santo (Rm 8.9; Gl 3.3-5). Portanto, ter o Espírito Santo não é a de Janeiro: CPAD, 2003, p.
119; citação: Stanley M.
mesma coisa que ser batizado no Espírito.
Horton, «The Pentecostal
Perspective», in: Melvin E.
A hermenêutica de Stott é equivocada, pois diz: “a revelação do propósito Dieter et ali. Five Views on
de Deus na Bíblia deve ser buscada preferencialmente nas suas passagens Sanctification. Grand Rapid,
didáticas, e nas descritivas. Para ser mais preciso, devemos procurá-la nos Zondervan Publishing House,
1987, pp. 129, 130.
ensinos de Jesus e nos sermões e escritos dos apóstolos, e não nas seções
puramente narrativas de Atos” ⁵. Ele está afirmando que os pentecostais 14. STOTT, John. Batismo e
estão errados em basear a doutrina do batismo no Espírito Santo em Atos, plenitude do Espírito Santo:
logo, com isso nega os fundamentos do pentecostalismo. Torna sem valor o mover sobrenatural de
Deus. Sáo Paulo: Vida Nova,
teológico todas as passagens mencionadas e comentadas acima sobre o
2017, p. 91.
batismo no Espírito e a glossolalia.
15. STOTT, John. Op. cit.
p.17.

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DONS E FRUTO DO ESPÍRITO

MÓDULO

Gordon Fee seguiu nesse mesmo diapasão de Stott. Num encontro anual da
Sociedade para Estudos Pentecostais na cidade Oklahoma em 1972, Fee
surpreendeu o auditório ao expor as deficiências da hermenêutica
pentecostal. No seu discurso ele disse: “Em vez da hermenêutica
científica, desenvolveu-se uma espécie de hermenêutica pragmática”, e
outra crítica nessa fala foi “num certo sentido, o pentecostal tende a fazer
exegese com base em sua experiência” ⁶. John Stott nunca foi
pentecostal, antes critica os pentecostais e os carismáticos ⁷, mas Fee, um
pentecostal, ordenado pelas Assembleias de Deus em 1959, se posicionar
dessa maneira? Mas, até aí, sua fala podia fazer sentido, um exemplo disso
pode ser visto em Brumback.
16. HOLLENWEGER, J.
Walter. Pentecostalism: O pensamento de Carl Brumback, um dos principais defensores da obra
Origins and Developments
Worldwide. Peabody, MS: pentecostal nas décadas de 1940 e 1950, expressa o pensamento dos
Hendrickson Publishers, pioneiros do movimento da Rua Azusa: “Em outras palavras, nós cremos
1997, pp. 312, 313. que a experiência dos cento e vinte em Atos 2:4 - 'E todos foram cheios do
Espírito Santo e começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito
17. STOTT, John. Crer é
também pensar. São Paulo:
Santo lhes concedia que falassem' – é o modelo bíblico para os crentes de
ABU Editora, 2012, pp. 23, todos os tempos da Igreja” ⁸. Outras fraseologias similares parecem em
24 seu livro como “e é nossa convicção que o batismo ou plenitude com o
Espírito Santo, conforme o registro em Atos, devem ser da mesma maneira
18. BRUMBACK, Carl. “O Que o padrão para os crentes hoje” ⁹. Essas declarações são verdadeiras, a
Quer Isto Dizer?” – Uma
resposta pentecostal a uma questão, segundo Roger Stronstad, é que Brumback “não analisa nem
pergunta pentecostal. explica essa hermenêutica, simplesmente a declara [. . .] ele precisa
Tradução de Orlando Boyer e analisar, defender e justificar sua base hermenêutica para desenvolver
Joaquim Luiz dos Santos. Rio 'uma resposta pentecostal contemporânea para essa pergunta pentecostal
de Janeiro: Livros
Evangélicos, 1960, p. 169.
antiga” ⁰. Nesse contexto, a fala de Fee talvez pudesse ser considerada
compreensível.
19. Ibidem, p. 166. Ver
também pp. 176, 177. Em sua obra em coautoria com Douglas Stuart intitulada Entendes o que
lês?, Fee declara: “Nossa suposição, compartilhada por muitas outras
20. STRONSTAD, Roger.
Hermenêutica pentecostal: pessoas, é esta: sem que a Escritura nos mande fazer alguma coisa de
espírito, escritura e teologia. forma explícita, aquilo que é apenas narrado ou descrito não funciona de
Natal, RN: Carisma, 2020, modo normativo” (O grifo é original) . Essa estrutura questiona tanto a
pp. 31, 32. separabilidade como também as línguas evidenciais. Fee ensina que as
21. FEE, Gordon D. Entendes
línguas são normais, mas não normativas, acredita na atualidade dos dons,
o que lês? Um guia para mas não como evidência física inicial. Ele nega também a separabilidade.
entender a Bíblia com auxílio Stott nega a separabilidade, confunde batismo com conversão e afirma que
da exegese e da não se deve buscar o propósito da revelação divina “nas seções puramente
hermenêutica. São Paulo: narrativas de Atos”. Dessa forma, ela nega ser o batismo no Espírito Santo
Vida Nova, 2017, p. 145.
uma experiência subsequente.
22. DUNN, James D. G.
Baptism in the Holy Spirit. James Dunn foi outro a negar a separabilidade . Apesar de sua
Philadelphia, PN: The discordância, Dunn foi respeitoso com os pentecostais e de certo modo até
Westminster Press, 1970, p.
22.
contribuiu ao afirmar sobre a necessidade de uma revisão da hermenêutica
pentecostal. Sua posição era que a teologia bíblica verdadeira deve tomar
cada autor bíblico separadamente, analisar suas experiências, contexto

12
BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO 9
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teológico, forma de pensamento, uma vez feito isso o teólogo bíblico pode
se sentir livre para interagir com textos de outros livros . Isso representou
“um desafio para os pentecostais clássicos, pois é possível demonstrar de
maneira acadêmica com uso das ferramentas da erudição bíblica a 23. Ibidem, p. 39.
doutrina da separabilidade com a glossolalia” ⁴. 24. SOARES, Esequias. O
pentecostalismo brasileiro.
Com base em sua estrutura, Fee questiona tanto a separabilidade como as p. 171.
línguas evidenciais. William e Robert Menzies analisam: “Deve-se observar
25. MENZIES, William &
que a posição de Fee é teologicamente indistinguível da posição dos muitos Robert. No poder do Espírito
outros estudiosos evangélicos tradicionais, James Dunn em particular” ⁵. – fundamentos da
Stronstad afirma: “embora Fee permaneça pentecostal em sua experiência pentecostal: um
experiência, e até defenda a probabilidade de falar em línguas quando se chamado ao diálogo. Natal,
recebe o Espírito Santo, sua hermenêutica deixa de ser pentecostal em RN: Carisma, 2020, p. 157.
qualquer sentido normativo, por ele ter posicionado o batismo no Espírito 26. STRONSTAD, Roger.
Santo ao lado da conversão em vez de colocá-la junto à vocação” ⁶. Hermenêutica pentecostal:
espírito, escritura e teologia.
RESPOSTA Natal, RN: Carisma, 2020, p.
40.

Para alguns teólogos da década de 1970, o que faltava aos pentecostais era 27. MENZIES, William &
uma exegese mais profunda e James Dunn “demonstrou que os Robert. Op. cit., p. 93.
pentecostais não podiam mais continuar confiando nos métodos
28. Para estudo amplo sobre
interpretativos do movimento Holiness do século XIX e esperar serem a construção da teologia
ouvidos no mundo eclesiástico contemporâneo” ⁷. pentecostal com base na
hermenêutica cientifica ver:
1. Lucas-Atos. Já foi mostrado acima a base bíblica dos dois pilares dos MARSHALL, I. Howard.
Fundamentos da narrativa
pentecostais clássicos, separabilidade e glossolalia, no livro de Atos. teológica de São Lucas.
Convém deixar claro que Atos é o segundo volume de Lucas (Lc 1.1-4; At Natal, RN: Carisma, 2019;
1.1-3), uma continuação do evangelho, é que o evangelho de João ficou McGEE, Gary (ed. geral).
entre Lucas e Atos por questão de organização, que permite os quatro Evidência inicial –
evangelhos ficarem agrupados numa mesma coleção. Isso vem desde muito perspectivas históricas e
bíblicas sobre a doutrina
cedo na história da transmissão do texto. O Papiro 75, por exemplo, datado pentecostal do batismo no
entre 175-225 d.C., contém os evangelhos de Lucas e João; na mesma Espírito Santo. Natal, RN:
página que termina Lucas começa João, isso mostra já naquela época a Carisma, 2019; MENZIES,
sequência que se mantém ainda hoje. Essa informação é importante Robert P. Pentecostes – Essa
história é a nossa história.
porque ajuda a demonstrar a fragilidade dos argumentos dos críticos Rio de Janeiro: CPAD, 2016;
contra os dois pilares dos pentecostais, como será analisado mais adiante. STRONSTAD, Roger. A teologia
carismática de Lucas -
2. Paulo e Lucas-Atos. William e Robert Menzies mostraram que a Trajetórias do Antigo
perspectiva de Paulo nas epístolas apresenta uma descrição mais plena da Testamento a Lucas -Atos.
Rio de Janeiro: CPAD, 2018.
obra do Espírito do que Lucas ⁸. A vida cristã em sua inteireza é uma
realização do Espírito nos escritos paulinos. Os autores Menzies lembram 29. MENZIES, William &
que o “Espírito é a fonte de purificação (Rm 15.16; 1 Co 6.11), de justiça Robert. No poder do Espírito
(Rm 2.29; 8.1-17; 14, 17; Gl 5.5, 16-26), de comunhão íntima com Deus (Rm – fundamentos da
experiência pentecostal: um
8.14-17; Gl 4.6), de conhecimento de Deus (1 Co 2.6-16; 2 Co 3.3-18) e, chamado ao diálogo. Natal,
finalmente, de vida eterna por meio da ressurreição (Rm 8.11; 1 Co 15.44- RN: Carisma, 2020, p. 273.
49; Gl 6.8)” ⁹. Em outras palavras, Paulo apresenta o aspecto soteriológico
da obra do Espírito.

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BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO

MÓDULO

Lucas, por outro lado, traz uma perspectiva bastante diferente, pois
retrata com consistência o Espírito como a fonte de inspiração profética.
Lucas, na avaliação dos autores Menzies, esclarecem que o paralelismo
literário “entre o relato de Jesus no Jordão e os discípulos no Pentecostes
dão a entender que Lucas interpretou o último acontecimento à luz do
primeiro: o Espírito veio sobre os discípulos no Pentecostes para prepará-
los para a sua vocação profética” ⁰.

A descrição do evento do Pentecostes (At 2.1-13) na interpretação de Lucas


à luz de Joel 2.28-32, com base na LXX, ou seja, “o Espírito vem sobre eles
todos com uma fonte de inspiração profética, concedendo discernimento
especial e discurso proféticos discípulo” , é diferente do Espírito Santo
em Paulo, pois em Lucas, “os discípulos recebem o Espírito como unção
profética que os capacita a participar eficazmente do empreendimento
missionário da igreja”. E, concluem os autores: “A narrativa de Lucas é
cheia de referências à profecia a ao falar em línguas” .

3. Reação dos pentecostais. O primeiro a responder a Stott e Fee com


relação à hermenêutica narrativa foi I. Howard Marshall na obra
Fundamentos da Narrativa Teológica de São Lucas, publicada em 1970, que
teve repercussão nos meios acadêmicos: “Essas conclusões produziram
uma revolução importante na hermenêutica tradicional. A posição mais
antiga, que ocasionava o orgulho teológico de determinar porções
didáticas da escritura, foi em grande parte, se não universalmente,
rejeitada” . Um grande número se dispôs a investigar o assunto como
Roger Stronstad, William W. Menzies e seu filho, Robert P. Menzies, Gary
McGee, Donald Johns, I. Howard Marshall, Donald Johns.
30. Ibidem.

31. Ibidem, p. 275. 4. William e Robert Menzies e Roger Stronstad. “Stronstad e Robert Menzies
responderam a contento a todos esses argumentos. Uma exegese
32. Ibidem, PP. 275, 276. aprofundada entre a narrativa de Lucas no Evangelho e em Atos e a visão
paulina ⁴ sobre o tema faz a diferença. Para os pentecostais clássicos, a
33. MENZIES, William &
Robert. No poder do Espírito teologia lucana difere da do pensamento paulino”. Isso não significa
– fundamentos da contradição, mas complementação. A obra No poder do Espírito, de
experiência pentecostal: um William e Robert Menzies, analisa cada aspecto da exegese desses críticos,
chamado ao diálogo. Natal, principalmente John Stott e Fee.
RN: Carisma, 2020, p. 57.

34. SOARES, Esequias. O Muitos estudiosos pentecostais responderam a essa questão na


pentecostalismo brasileiro. hermenêutica de gênero literário de Fee com as mesmas ferramentas da
pp. 174, 175. erudição bíblica de modo que John Stott precisou se explicar depois na
introdução do livro A Mensagem de Atos ⁵, em resposta a Stronstad. A
35. STOTT, John R. W. A
mensagem de Atos. São conclusão de Stronstad é que a hermenêutica de John Stott que reduz a
Paulo: Editora ABU, 1994. “revelação do propósito de Deus nas Escrituras [...] em suas passagens
didáticas, e não em suas partes históricas” ou de Gordon Fee que afirma “o
36. STRONSTAD, op. cit., p. que está simplesmente narrado ou descrito nunca pode funcionar como
169.
doutrina” “é vista como uma espécie de argumentação especial e precisa
ser rejeitada por ser um princípio arbitrário”. ⁶

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BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO 9
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Muitos consideraram essas posições dos críticos como desafios saudáveis


para um aprofundamento na hermenêutica contemporânea com o uso das
ferramentas da erudição bíblica. O que estava acontecendo com a teologia
pentecostal? O método pragmático ou tradicional dos primeiros
pentecostais clássicos era uma abordagem vulnerável proveniente do
Movimento de Santidade bem como o de Vida Superior do século 19. O
desafio estava lançado. O pensamento dos pioneiros pentecostais clássicos
continua o mesmo, batismo no Espírito Santo como experiência
subsequente à conversão e a evidência física inicial o falar línguas. A
diferença está na forma de apresentar esta doutrina, a hermenêutica
pragmática não é apologética. A hermenêutica pentecostal assumiu a
forma acadêmica que resiste à exegese dos tradicionais. Isso prova a
falácia de que as experiências pessoais são os fundamentos da doutrina
pentecostal.

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9 BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO

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SEGUNDA PARTE - OS DONS ESPIRITUAIS

A Declaração de Fé das Assembleias de Deus no Brasil afirma na introdução


do capítulo XX: “CREMOS, professamos e ensinamos que os dons do Espírito
Santo são atuais e presentes na vida da Igreja”. Ao se referir ao batismo no
Espírito Santo e a glossolalia afirma: “O falar em línguas é a evidência
inicial desse batismo, mas somente a evidência inicial, pois há evidência
contínua da presença especial do Espírito como o “fruto do Espírito” (Gl
5.22) e a manifestação dos dons” (O grifo é original).

O QUE SÃO OS DONS ESPIRITUAIS?

O apóstolo Paulo emprega pneumatikós e chárisma que são os dois termos


gregos básicos usados para “dons espirituais” nessa seção em que trata
sobre o assunto em 1 Coríntios 12.1-11, quando apresenta nove dons (vv. 8-
10). É importante lembrar que o apóstolo apresenta outras listas, uma com
oito dons (1 Co 12.28) e outra com sete, sendo alguns deles repetidos em
relação à primeira lista (12.29, 30). Em outras ocasiões aparecem mais
listas desses dons espirituais (Rm 12.6-8; Ef 4.11). Dadas essas
informações, voltemos aos termos paulinos. O adjetivo pneumatikós,
“espiritual”, Paulo emprega de forma substantivada, tōn pneumatikōn,
literalmente, “das coisas espirituais” (1 Co 12.1); o contexto mostra que
ele se refere aos dons espirituais. O substantivo chárisma, “dom”, um
cognato de cháris, “graça”, cuja ideia é o que foi dado pela graça, aparece
duas vezes: charismátōn, “de dons” (12.4); “dons” (v. 9). Raramente
alguém questiona a legitimidade da tradução de tōn pneumatikōn como
“dons espirituais”, em várias versões da Bíblia, pois é disso que o apóstolo
está tratando. Paulo usa a mesma construção mais adiante (1 Co 14.1).

Segundo a mesma confissão de fé, os dons espirituais “são capacitações


especiais e sobrenaturais concedidas pelo Espírito de Deus ao crente para
serviço especial na execução dos propósitos divinos por meio da Igreja”.
Esses recursos são operados por meio dos crentes em Jesus (2 Co 4.7; Cl
1.27), enquanto a Igreja estiver na terra (1 Co 13.8-10). Isso envolve todo o
aspecto da vida cristã como adoração (1 Co 14.6, 26; Fp 3.3),
evangelização, operações de milagres (At 13.9-12) e o exercício do
ministério (1 Tm 4.14). São manifestações do poder de Deus que capacitam
os cristãos a continuar a missão de Cristo no mundo e as demonstrações
desse poder na vida da Igreja. A Igreja não se sustenta sozinha, por isso o
Senhor Jesus enviou o Espírito Santo. A função dos dons espirituais é tornar
a manifestação do poder de Deus cada vez mais real e dinâmica para a
edificação do corpo de Cristo, e, antes de tudo, autenticar a obra de Cristo
(At 2.33).

O Espírito Santo distribui os dons aos crentes “a cada um para o que for
útil” (1 Co 12.7), ou seja, é proveitoso para edificação espiritual e
crescimento numérico da igreja.

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BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO 9
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O tema é muito importante e, por essa razão, o apóstolo introduz a seção


explicando que todos devem se inteirar melhor sobre os dons espirituais. É
necessário ensinar na igreja sobre eles para que ninguém fique
desinformado sobre o assunto. Por meio deles os crentes confessam o nome
de Jesus e são edificados. Paulo mostra que o ensino sobre os dons
espirituais é importante e afirma: “não quero, irmãos, que sejais
ignorantes”. Isso não quer dizer desinformação sobre o assunto, pois
“nenhum dom vos falta” (1 Co 1.7). O que o apóstolo quer dizer com essa
declaração introdutória é que esperava dos coríntios, e essa é também a
vontade do Espírito ainda na atualidade, que todos os crentes conheçam
melhor os dons e a sua finalidade.

Essas manifestações do Espírito nunca desapareceram ao longo da história


da igreja: “Há inúmeras evidências da manifestação dos dons espirituais ao
longo da história da igreja. Evidências históricas e as próprias experiências
de milhões de pessoas em todo o mundo, experiências à luz das Escrituras.
A presença de milagres é conhecida nos escritos da patrística, nos autores
cristãos da Idade Média e na Reforma Protestante” ⁷. O uso dos dons
espirituais é essencial nas reuniões cristãs e na vida pessoal e no serviço da
evangelização. Isso era uma realidade na época dos apóstolos e continua
um fato na atualidade.

CLASSIFICAÇÃO 37. SOARES, Esequias. O


verdadeiro pentecostalismo.
p. 55.
O Novo Testamento não revela quantos dons espirituais existem. Como bem
ensinou Stanley M. Horton: “O propósito de Paulo, porém, não é oferecer 38. HORTON, Stanley M. A
uma lista abrangente, nem descrever os dons” ⁸. Na lista de Romanos 12.6- Doutrina do Espírito Santo no
8, aparecem sete dons espirituais, quais são eles? Profecia, ministério, Antigo e Novo Testamento.
ensino, exortação, contribuição, presidência e misericórdia. Podemos Rio de Janeiro: CPAD, 2018,
p. 207.
considerar os dons de Profecia e de ensino como sobrenaturais. Uma
peculiaridade dessa lista é que cada dom é seguido de uma explicação, 39. SOARES, Esequias. O
ainda que com uma simples frase. O dom de profecia é o único que aparece verdadeiro pentecostalismo.
em todas as listas e é o que aparece com maior frequência nas epístolas p. 59.
paulinas, principalmente em 1 Coríntios nos capítulos 12 a 14. ⁹
40. Ver: SOARES, Esequias. O
verdadeiro pentecostalismo.
O objetivo da presente disciplina não é explicar cada um dos dons pp. 58-70; descrição e
espirituais⁴⁰, mas esclarecer a importância e a atualidade deles. A lista de explicação e comentário
1 Coríntios 12.8-10 contém nove dons e é a mais conhecida e disputada sobre os dons espirituais das
listas apresentadas pelo
porque eles “pertencem a uma categoria exclusiva que demanda uma ação apóstolo Paulo.
direta do Espírito Santo, independentemente da contribuição humana,
embora se utilize do ser humano para se expressar”⁴ . A Declaração de Fé 41. BRUNELLI, Walter.
das Assembleias de Deus traz uma breve explicação sobre cada um desses Teologia para Pentecostais –
Uma Teologia Sistemática
nove dons no capítulo XX, intitulado: “Sobre os Dons do Espírito Santo”. O
Expandida. Volume 2. Rio de
propósito do apóstolo Paulo não é fazer uma exposição doutrinária sobre o Janeiro: Central Gospel,
assunto. O que ele está fazendo é uma correção de abusos desses dons na 2016, p. 249.
comunidade cristã de Corinto e, dessa forma, esses dons vêm à tona, essa é
a razão do tema carismático aparecer na epístola. Há quem acredite que

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NONO
9 BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO

MÓDULO

existam apenas nove dons espirituais, pois interpreta a lista de 1 Coríntios


12.8-10 como única. Outra interpretação é que a lista completa é a de 1
Coríntios 12.8-10 e os demais dons como expressões ou explicações desses
nove dons. Em nenhum lugar o apóstolo limita o número de dons. Essa
verdade pentecostal está de acordo com a Declaração de Fé das
Assembleias de Deus.

As classificações são geralmente teológicas ou didáticas e não existe um


padrão, o que é comum é todas elas dividirem os dons em três grupos.
Stanley M. Horton concorda com uma divisão funcional feita pelo próprio
apóstolo, que duas vezes o adjetivo grego, héteros, “outro de tipo
diferente” como “e a outro, pelo mesmo Espírito, a fé” (v.9); “e a outro, a
variedade de línguas” (v. 10b). Nas outras vezes, o termo usado para
“outros” é állos, “outro de mesmo tipo”⁴ . Se isso significa uma
classificação ou divisão, em três grupos, dois, cinco, dois, assim: a) dons do
ensino ou pregação, palavra da sabedoria e palavra da ciência; b) dons de
ministério, fé, dons de curar, operação de maravilhas, a profecia, dom de
discernir os espíritos; c) dons de adoração, variedade de línguas e
interpretação de línguas⁴ .

Na classificação didática ou teológica os dons ficam divididos em três


grupos de três, segue um exemplo muito conhecido: a) dons de revelação,
palavra da sabedoria, palavra da ciência e o discernimento dos espíritos; b)
dons de poder, fé, dons de curar e operações de maravilhas; c) dons de
inspiração, profecia, variedade de línguas e interpretação. Essa é uma das
várias classificações, todas elas são didáticas.

A manifestação dos dons espirituais vai continuar durante todo o tempo em


que a igreja peregrinar na terra, isso é, até a vinda de Cristo (1 Co 13.8-10).
Essa é uma verdade pentecostal. A igreja atual necessita tanto do poder de
Deus como nos dias apostólicos. A missão da igreja de hoje em nada difere
de sua missão no passado. Hoje não é diferente, todos os crentes em Jesus
dependem do poder do Espírito (Rm 15.19).

42. HORTON, Stanley M. I & II Romanos 12.6-8 1Coríntios 12.8-10 1Coríntios 12.28 1Coríntios 12.29,30 Efésios 4.11
Coríntios – Os Problemas da
Profecia Palavra da sabedoria Apóstolos Apóstolos Apóstolos
Igreja e Suas Soluções. Rio
de Janeiro: CPAD, 2003, p. Ministério Palavra da ciência Profetas Profetas Profetas
119;
Ensino Fé Doutores Doutores Evangelistas
43. SOARES, Esequias. O
verdadeiro pentecostalismo. Exortação Dons de curar Milagres Operadores Pastores
.pp. 61, 62; Lições Bíblicas, de Milagres
adulto, 1º. Trimestre 2021,
Contribuição Operação de maravilhas Dons de curar Línguas Doutores
lição 4. Rio de Janeiro:
CPAD. Presidência Profecia Socorros Interpretação

44. Ibidem. Misericórdia Discernir os espíritos Governos


Variedade de línguas
Interpretação Variedade de línguas

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BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO 9
NONO
MÓDULO

Batismo no Espírito Santo e dons espirituais são temas intimamente


ligados, os primeiros pentecostais descreviam esse batismo como a “porta
de entrada” para os dons, mas esse assunto não recebeu muita atenção. O
artigo 7 da primeira edição da Declaração de Verdades Fundamentais, das
Assembleias de Deus americanas, 1916, dizia que com o batismo no Espírito
Santo vem a concessão dos dons espirituais:

Todos os crentes têm o direito de, e devem


esperar ardentemente, e buscar fervorosamente,
a promessa do Pai, o Batismo no Espírito Santo e
fogo, de acordo com a ordem de nosso Senhor
Jesus Cristo. Esta foi a experiência normal de
todos na Igreja Cristã primitiva. Com ele vem o
revestimento de poder para a vida e o serviço, a
concessão dos dons e seus usos na obra do
ministério (Lc 24.49; At 1.4,8; 1Co 12.1–31). Esta
experiência maravilhosa é distinta e subsequente
à experiência do novo nascimento (At 10.44–6;
11.14–16; 15.7 –9). ⁵
Anthony D. Palma diz em seu livro O batismo no Espírito Santo e com fogo,
“o batismo no Espírito Santo abre os receptores para a ampla gama de dons
espirituais. Uma olhada na lista principal de dons espirituais (Rm 12.6-8; 1
Co 12.8-10, 28-30; Rm 4.11) revela que a maioria daqueles dons já tinham
sido manifestado de algum modo tanto no Antigo Testamento quanto nos
evangelhos”⁴⁶. Cabe ressaltar que Declaração de Verdades Fundamentais
foi revisada posteriormente e a ideia de o batismo no Espírito Santo ser “a
porta de entrada” dos dons foi revista e que o Dr. Palma reconhece a
manifestação desses dons antes do Pentecostes. Eles já eram manifestos
desde o Antigo Testamento também pelos discípulos de Jesus antes do
Pentecostes, exemplos: os dons de curar e de maravilhas (Mc 6.13; Êx 4.2- 45. SOARES, Esequias. O
7; 17.5-7; 2 Rs 5.14; 20.9-11). pentecostalismo brasileiro,
p. 185.
Se os dons já eram manifestos desde o Antigo Testamento e muito mais nos
46. PALMA, Anthony D. O
evangelhos, não há como sustentar a doutrina da “porta de entrada” para batismo no Espírito Santo e
todos os dons. Como concluem William e Robert Menzies: “Embora não se com fogo. Rio de Janeiro:
possa sustentar que o batismo no Espírito é a 'porta de entrada' para cada CPAD, 2002, p. 92.
dom espiritual, às evidências bíblicas indicam que o batismo no Espírito é a
47. MENZIES, William &
'porta de entrada' para um grupo de dons especiais descritos por Paulo: os Robert. No poder do Espírito,
dons proféticos associados com a revelação especial e o discurso p. 280.
inspirado”⁴⁷.

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NONO
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DONS E FRUTO DO ESPÍRITO

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TERCEIRA PARTE - O FRUTO DO ESPÍRITO

Segundo a Declaração de Fé das Assembleias de Deus, “o falar em línguas é


a evidência inicial desse batismo, mas somente a evidência inicial, pois há
evidência contínua da presença especial do Espírito como o “fruto do
Espírito” (Gl 5.22) e a manifestação dos dons” (Capítulo XIX). Convém
ressaltar que os dons espirituais e o fruto do Espírito têm a sua origem
numa mesma fonte e ambos glorificam a Cristo, mas se trata de coisas
distintas. O fruto do Espírito é um dos temas mais vibrantes da ética cristã,
pois mostra para o mundo o que Espírito Santo colocou dentro de cada
cristão e cristã.

DEFINIÇÃO E IMPORTÂNCIA DO FRUTO DO ESPÍRITO

O fruto do Espírito é o resultado de um processo de amadurecimento e a


consequência de um processo natural de crescimento espiritual. Ele surge
gradativamente dentro dos crentes em Jesus como resultado da
regeneração do Espírito Santo, de forma instantânea e, também, gradativa
por meio do crescimento na graça de nosso Senhor Jesus Cristo, como
acontece com a santificação.

O apóstolo apresenta nove modalidades do fruto: Mas o fruto do Espírito é:


amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade,
48. SOARES, Esequias. O
mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei” (Gl 5.22, 23 -
verdadeiro pentecostalismo. ARA). Não se trata de uma lista exaustiva. Essas nove virtudes contrapõem
p. 76. as obras da carne mencionadas em Gálatas 5.19-21, de modo que tanto as
virtudes como as “obras da carne” são representativas. As expressões “e
49. GILBERTO, Antonio. O
coisas semelhantes a estas” (Gl 5.21) e “contra tais coisas não há lei” (v. 23
Fruto do Espírito – A
Plenitude de Cristo na Vida - TB) indicam a existência de outros pecados e outras virtudes. “Há outras
do Crente. Rio de Janeiro: listas do fruto do Espírito (Rm 12.9-21; Cl 3.12, 13). Assim como cada lista
CPAD, 2004, p. 10. Essa obra dos dons espirituais foram para situações específicas para aplicação
é uma das mais completas conforme o contexto (Gl 5.15, 26), da mesma forma, a lista do fruto do
sobre o fruto do Esp’rito,
publicada originalmente em
Espírito segue essa mesma estrutura”⁴⁸.
inglês, nos Estados Unidos
em 1984, sob o título, Alguns expositores bíblicos estranham o fato de Paulo contrapor “as obras
Abundant Living. da carne” (Gl 5.19) com o “fruto do Espírito” (v. 22), singular, quando era
de se esperar “frutos”. Mas, há diversas explicações sobre esse detalhe: “O
50. BERGSTƒN, Eurico.
Teologia Sistemática. Rio de uso da forma singular fruto em Gálatas 5.22 sugere a unidade e harmonia
Janeiro: CPAD, 2019, p. 92. do caráter do Senhor Jesus Cristo, as quais são reproduzidas no crente
mediante as nove qualidades do fruto do Espírito Santo vistas na citada
51. GEE, Donald. Como referência”⁴⁹. O missionário Eurico Bergstén explica esse singular
Receber o Batismo no
Espírito Santo – Vivendo e
ilustrando esse fruto como uma laranja e seus gomos. O “fruto” que
Testemunhando com Poder. aparece logo em seguida é o amor (“caridade”, na ARC), diz o missionário,
Rio de Janeiro: CPAD, 2001, as oito virtudes seguintes são os reflexos do amor”⁵⁰. Donald Gee chama
p. 57. essas graças ou virtudes de modalidades do fruto⁵ . A forma singular sugere
que nessas virtudes se produz a unidade de caráter de Cristo, as nove
graças mencionadas em Gálatas 5.22, todas elas em contraste com as

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BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO 9
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das obras da carne. É o fruto individualizado. Para Gordon Fee, Paulo


“imaginava o fruto como um ramalhete com flores de características
diversas formando um conjunto”⁵ .

As funções básicas dos dons são para a adoração e o serviço do ministério,


ao passo que o fruto revela o caráter de Cristo no crente. O Espírito
continua atuando na vida dos crentes por meio do fruto do Espírito (Gl
5.22) e das manifestações dos dons espirituais (1 Co 12.4-11). O fruto
presente no testemunho cristão revela nove graças, a partir do amor: gozo,
paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão,
domínio próprio. É, na verdade, a ética do Espírito.

O apóstolo Paulo usa o amor como representante do fruto do Espírito ao


comparar o fruto com os dons do Espírito. O amor é superior aos dons, é o
“caminho ainda mais excelente” (1 Co 12.31). Por essa razão, o amor
encabeça essa lista (Gl 5.22); mas em outras passagens prevalece a
supremacia do amor (1 Co 13.13; Gl 5.13; 6.1, 2). Paulo afirma ainda que os
dons sem o amor não são “nada” (1 Co 13.1-3) e são passageiros (1 Co 13.8-
10), mas o amor é para sempre, e não é um dom (1 Co 14.1). Trata-se do
resultado de uma vida cristã abundante e manifestada no relacionamento
entre os irmãos e irmãs na igreja e no lar, na convivência com os descrentes
no trabalho e na sociedade. Assim, é importante entender o conflito entre
a carne e o Espírito e a função do fruto do Espírito.

O que levou o apóstolo ao assunto foi o contexto das igrejas da Galácia. O


abuso da liberdade cristã, a antinomia, de um lado, e o legalismo, de
outro, e essas atitudes estavam dando ocasião à carne, levando à falta de
amor e à desunião (Gl 5.13-15). Não se trata, pois, de um conjunto de
regras de conduta com o objetivo de regulamentar a vida cristã, a ética
paulina não é uma nova lei (Gl 5.23). O crente em Jesus é uma pessoa que
vive sob os domínios do Espírito, é liberta da lei e dos rudimentos deste
mundo, mas isso não significa uma vida passiva. O fruto do Espírito é a
expressão do Espírito na vida do crente.

CONCLUSÃO

A ideia de que os pentecostais baseiam suas crenças nas emoções é


equivocada. O que acontece é que a nossa proximidade com Deus é mais
estreita, a nossa comunhão com o Senhor não é artificial. Para os
pentecostais Deus é mais real. Religião sem milagres é mera filosofia. Esses
milagres são fatos, para desacreditá-los os cessacionistas terão que
desafiar as testemunhas oculares, e não se basear simplesmente em alguns
casos isolados de exageros ou até mesmo meninices. 52. FEE, Gordon D. Paulo, o
Espírito e o Povo de Deus.
São Paulo: Vida Nova, 2015,
p. 147.

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DONS E FRUTO DO ESPÍRITO

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BATISMO NO ESPÍRITO SANTO,
DONS E FRUTO DO ESPÍRITO 9
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23
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