Você está na página 1de 7

História da Língua

Italiana
Semana 15

Leni Ribeiro Leite


Leni Ribeiro Leite História da Língua Semana 15

BREVE RESUMO DO CURSO


Iana Lima Cordeiro
Leni Ribeiro Leite

Chegamos à nossa última semana de curso. Abaixo veremos um apanhado geral


dos principais pontos do que aprendemos ao longo do semestre – no entanto,
lembre-se de que este resumo não substitui as suas próprias anotações e a sua
própria revisão individual dos conteúdos, ok? Então vamos lá.

Variação e mudança linguística

Começamos o nosso curso discutindo alguns pontos sobre o processo de


variação e mudança das línguas, que é natural e inerente a toda e qualquer
língua, e pode ocorrer de forma sincrônica – quando comparamos duas
variações de uma mesma expressão que estejam ocorrendo
contemporaneamente – ou diacrônica – quando analisamos o processo de
evolução de uma palavra ao longo do tempo, por exemplo. Vimos também que
dentre os fatores que influenciam as línguas, e, portanto, podem desencadear
essas variações e mudanças, temos dois tipos: os fatores internos e os fatores
externos. Os fatores internos se referem a variações e mudanças que se
realizam nos níveis gramatical ou fonético da língua, enquanto os externos são
acontecimentos que ocorrem no social, como o contato com outras línguas, por
exemplo, e que se refletem na parte linguística, como por meio da absorção de
palavras estrangeiras no léxico, por exemplo.

O italiano como língua românica


O italiano, bem como outras línguas como o português, o francês e o espanhol,
por exemplo, são o que chamamos de língua românica. Essa denominação
advém do fato de essas línguas serem derivadas do latim, língua falada há muito
séculos atrás na região do Lácio, que hoje chamamos de Roma. Havia algumas
variantes do latim, dentre eles o clássico e o vulgar. O latim clássico era
essencialmente literário, utilizado na escrita, e tinha um tom mais elevado e

Semana 15 2
Leni Ribeiro Leite História da Língua Semana 15

formal. Já o latim vulgar era o latim falado cotidianamente pelos romanos,


portanto menos uniforme que o clássico e menos formal. O latim que
estudamos nos cursos de língua latina é o latim clássico. Embora não existam
tantas fontes do latim vulgar quanto do clássico, quando dizemos que o italiano
é derivado do latim, queremos dizer que ele é derivado do primeiro, não do
segundo. Conseguimos analisar a evolução das palavras do latim para as outras
línguas românicas graças aos estudos da Linguística Românica, que, segundo
regras fonéticas já estabelecidas, conseguem identificar os termos originais a
partir de sua evolução nas diferentes línguas derivadas.

O latim – em todas as suas variantes – organiza-se segundo o sistema de casos


nominais. A função sintática das palavras (sujeito, objeto, etc) é expressa na
própria palavra, que se altera conforme o caso adequado. As palavras se
organizam em famílias de cinco grupos e podem declinar, no singular e no
plural, em seis casos: nominativo, acusativo, genitivo, dativo, ablativo e
vocativo. Quanto ao sistema verbal, no latim os verbos estão divididos em
quatro conjugações e os tempos verbais podem pertencer ao infectum – ações
inconclusas – ou ao perfectum – ações completas.

Roma, o antigo Lácio, tem sua história dividida em três fases principais: a
monarquia, república e império. O período que mais nos interessa é o último, a
fase de império romano, já que a grande expansão de territórios de Roma
favoreceu o contato linguístico entre os diferentes povos, que inevitavelmente
tiveram suas línguas influenciadas por esse grande intercâmbio cultural. À
época da dissolução do império, vários povos diferentes habitavam a Península
Itálica e suas línguas ficavam em contato com o latim, misturando-se a ele.

Formação dos dialetos itálicos


O latim começa a originar os diversos falares itálicos na Idade Média – cujo
início foi demarcado a partir do século V d.C.. A Península Itálica, durante esse
período, foi disputada por diversos povos, como os ostrogodos, os lombardos
e os francos – esses últimos representados na figura de Carlos Magno, que foi
coroado Sacro Imperador Romano-Germânico e Rei dos Lombardos. Quando os
francos chegaram, já estavam em considerável processo de romanização, e o
povo lombardo que já se encontrava na Península era bilíngue. O latim era

Semana 15 3
Leni Ribeiro Leite História da Língua Semana 15

utilizado como língua comum para a comunicação inclusive entre os povos


germânicos, por isso o lombardo e o franco tiveram influência sobre o romanço
itálico apenas no aspecto lexical. A perda de declinações, a modificação
estrutural do futuro e a manutenção das conjugações verbais na língua latina
durante a Idade Média foram aspectos prenunciados no latim vulgar e sem
relação com o contato com o germânico. Além disso, embora em menor
magnitude, houve também influência do grego e do árabe em certas regiões da
Itália em que havia presença dos respectivos povos falantes. Para analisar esses
processos de contato linguístico, utilizamos os termos substrato, superestrato
e adstrato. O substrato é o vestígio que uma língua desaparecida deixa na língua
sobrevivente, o superestrato é a influência da língua do dominador sobre a
língua do dominado e os adstratos são as mútuas influências de línguas que
convivem em pé de igualdade.

Latim cristão
Anteriormente à Idade Média já havia a influência religiosa sobre a língua,
devido às comunidades cristãs nas regiões do império; a partir do século VIII,
no entanto, com a formação dos Estados Papais, regiões independentes
administradas pelo pontífice, esta influência se torna mais sólida, a partir de
uma instituição que se manteve até o final do século XIX. Esse grande poder
político da Igreja inevitavelmente causou impacto na língua latina, e como
consequência houve o desenvolvimento do que chamamos de Latim Cristão. As
primeiras pregações cristãs eram em grego e, com a expansão da religião,
tornou-se necessária sua tradução para o latim. Neste sentido, o latim cristão
tem grande influência lexical do grego, que podemos observar a partir de três
processos: a) formação de neologismos latinos, b) empréstimo puro e c)
transferência de significado. Além disso, há algumas tendências gramaticais
próprias do latim cristão, como a preferência por determinados sufixos e por
palavras extensas, além da predileção por determinados sufixos em
substantivos ou adjetivos.

Semana 15 4
Leni Ribeiro Leite História da Língua Semana 15

Questione della lingua


Ao final do século IX, há a fragmentação do poder sobre a Península Itálica e
determinadas cidades enriquecem e passam a encabeçar o poder político e
econômico da região a que pertencem, como Florença, Veneza, Milão, Gênova
e Pisa. As quatro primeiras tornaram-se as principais cidades-estado italianas
no século XIII. Além disso, à mesma época, houve a ascensão da poesia
trovadoresca siciliana, favorecida pela corte de Frederico II, que leva ao
surgimento, na Toscana, do dolce stil nuovo, movimento literário muito
influenciado pelo trovadorismo. Participou desse movimento o poeta hoje
considerado o maior da Itália, Dante Alighieri. Sua obra foi escrita em latim (pois
o latim permanecia a língua oficial da escrita, mesmo que já não fosse uniforme)
e em vulgar toscano, e, ainda no século XIV, o escritor já propôs a Questione
della lingua, que seria retomada dois séculos depois, com três propostas que
defendiam a adoção de línguas diferentes: a) a corrente cortesã – integravam
esse pensamento os intelectuais que defendiam que o toscano fosse a variante
oficial; b) a corrente florentina – engendrada por Maquiavel, que defendia o
florentino como língua oficial, e c) a corrente arcaizante – que defendia que a
língua florentina, a mesma utilizada por Francesco Petrarca e Giovanni
Boccaccio. Em 1612, foi impresso, em Veneza, um dicionário histórico e
normativo baseado na língua de Alighieri, Petrarca e Boccaccio; a questione
della lingua atravessou os séculos, sendo finalmente resolvida já na Idade
Contemporânea, a partir do processo de unificação política da Itália.

Unificação da Itália
Na segunda metade do século XIX houve a unificação da Itália. Os ideais
nacionalistas que já apontavam pelos reinos e ducados que constituíam a
Pensínsula Itálica foram fortalecidos pelas revoluções liberais que começaram
a correr pela Europa. Vitor Emanuel II, ao assumir o reino de Piemonte-
Sardenha, com Conde de Cavour como primeiro-ministro, teve como uma de
suas propostas a unificação da Itália. Com o apoio francês, e em troca de Nice
e Saboia, o reino então entrou em confronto contra os austríacos que detinham
o poder de certas regiões, como Lombardia e Módena, e saiu vencedor. Além
disso, os reinos de Parma e Toscana aliaram-se a Piemonte-Sardenha. O Reino
das Duas Sicílias foi conquistado com o apoio de Giuseppe Garibaldi, e, em
1861, Vitor Emanuel II autoproclamou-se rei da Itália. Roma tornou-se capital

Semana 15 5
Leni Ribeiro Leite História da Língua Semana 15

apenas em 1871, quando o Reino da Itália invadiu os Estados Papais. Devido a


isso, surge a Questão Romana, quando a Igreja não reconhece a autoridade de
Piemonte-Sardenha sobre a Itália, impasse que só se resolve com o Tratado de
Latrão, em 1929, quando a Igreja firma um acordo com Mussolini para a criação
do Estado do Vaticano, que seria entregue à administração da Igreja. Os demais
territórios que compõem hoje a Itália mas que ainda pertenciam aos austríacos
serão anexados somente ao fim da Primeira Guerra Mundial.

No que diz respeito à língua, os dialetos eram bem aceitos e extremamente


difundidos pela Península Itálica antes da unificação. Após a formação de um
Reino da Itália, porém, a exigência de uma unificação linguística voltou a ser
discutida, surgiu uma aversão ao plurilinguismo e a utilização de dialetos no
cotidiano passou a ver vista de forma negativa. Os primeiros programas
escolares da Itália unificada, inclusive, recomendavam aos professores que
evitassem o uso de dialetos. Entre os séculos XIX e XX, houve a reação
intelectual, apoiada por pedagogos, linguistas e historiadores, que defendia a
importância dos dialetos como representação cultural.

Durante o fascismo de Mussolini, o currículo escolar de italiano nas escolas se


iniciava com o ensino dos dialetos para, então, prosseguir ao ensino do italiano
padrão. Os intelectuais, porém, colocarem-se como oposição, por entenderem
que o ensino de dialetos na escola prejudicaria a unificação linguística nacional.
Com a vitória dos opositores, iniciou-se um movimento da autarquia linguística
em que, novamente, houve aversão aos dialetos, vistos como ameaça à
supramencionada unificação linguística.

Mesmo com o fim do governo autoritário e o retorno à democracia, foi somente


a partir dos anos 1980 que o dialeto voltou a ser uma pauta nos programas
escolares e deixou de ser visto de forma pejorativa, embora o foco das escolas
ainda fosse o ensino de italiano padrão. Neste sentido, as previsões dos
linguistas era que os dialetos eventualmente se enfraquecessem e
terminassem por desaparecer, porém o uso do dialeto nem ao menos diminuiu
como esperado. O que realmente aconteceu foi que os italianos passaram a
adotar um comportamento bilíngue, fazendo uso tanto do dialeto quanto do
italiano padrão tanto em casa quanto fora dela.

Semana 15 6
Leni Ribeiro Leite História da Língua Semana 15

Há, hoje, na Itália, aproximadamente 10.000 dialetos, sem unidade


regional e sem que algum se sobreponha sobre outro. A posição
governamental sobre o assunto não é mais de aversão aos dialetos,
mas de reconhecimento de que a boa competência da língua
materna – seja ela dialeto ou não – é de fundamental importância
para a aprendizagem do italiano padrão.

Semana 15 7

Você também pode gostar