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Captar sons, gravá-los e reproduzi-los é uma das invenções mais
extraordinárias do Homem com imensas repercussões a vários níveis.
Paralelamente a essa invenção, a tecnologia do século 20
revolucionou o papel cultural da música. Anteriormente à existência
da rádio, televisão, comunicações por satélite e sistemas de gravação
só era possível ouvir música ao vivo estando presente no local de uma
determinada execução musical. A possibilidade de ouvir música assim
como o tipo de música eram fortemente condicionadas pela
localização geográfica e nível social (Hall, 1991).

22.1 PRIMORDIOS DO REGISTO SONORO


O fonógrafo é a primeira realização verdadeiramente conseguida
de um sistema de gravação e reprodução sonora. Inventado por
Thomas Alva Edison (1847-1931) em 18771, o fonógrafo permitia
registar sons e ouvi-los posteriormente. O dispositivo era totalmente
mecânico: consistia num cilindro horizontal, tendo como eixo um
parafuso-sem-fim movimentado manualmente através de uma
manivela. O fonógrafo tinha junto ao cilindro um pequeno pavilhão
(concha acústica), na extremidade do qual existia uma membrana
(diafragma elástico). As ondas eram canalizadas para o pavilhão e
1
Etimologicamente a palavra fonógrafo deriva do grego e significa "escrita do som". O
fonógrafo foi inventado um ano após o aparecimento do telefone.
deformavam a membrana, que tinha na parte exterior um estilete. O
cilindro era recoberto com uma folha de estanho sobre a qual se
apoiava o estilete (mais tarde passou a usar-se cilindros de cera).
Cantando para o pavilhão e rodando simultaneamente o cilindro, a
agulha gravava sulcos na superfície do cilindro (gravura vertical), cuja
configuração representava a forma da onda provocada pelo
movimento das partículas do ar. Pensa-se que a primeira mensagem
gravada e reproduzida tenha sido: "Mary had a little lamb" (Chew,
1981).

Curiosamente Edison não previa as imensas potencialidades do


fonógrafo aplicado à música. Para ele, era apenas uma máquina de
ditar que permitia registar mensagens faladas (Lafaurie, 1966).
Embora muito elementar, o fonógrafo continha os princípios básicos
da gravação e reprodução mecânica do som: a vibração do ar é
convertida numa vibração mecânica que se traduz na gravação de um
sulco numa superfície adequada; posteriormente, a "leitura" desse
sulco permite reproduzir o som gravado. O primitivo fonógrafo de
Edison tinha grandes limitações: a voz ou instrumento a gravar
tinham de estar muito perto do diafragma que captava as vibrações e a
duração dos rolos era apenas de dois ou quatro minutos.

Para se realizar as gravações eram necessários grandes pavilhões de


modo a captar a máxima energia sonora. Apesar de se tratar de um
sistema muito rudimentar, era possível "misturar" o som de dois ou
três pavilhões que se orientavam para os músicos, em função da sua
intensidade sonora ou papel de solista. Note que estão já presentes os
conceitos de mistura e equilíbrio sonoro (Hugonnet & Walder, 1995).

O francês Charles Cross (1842-1888) apresentou à Académie


des Scienses um projeto para a construção de um fonógrafo2. Cross
patenteou a sua invenção em 1878, mas não construiu um modelo que
funcionasse. Mesmo assim, alguns consideram que foi ele o inventor
do fonógrafo, por se ter antecipado a Edison (Chew, 1981). Refira-se
que o físico e tipógrafo francês Léon Scott de Martinville construiu
um fonautógrafo (phonautographe) em 1857 que consistia num
megafone invertido tendo uma fina membrana na extremidade estreita
(Lafaurie, 1966; Borwick, 1980).

Em 1888 Emile Berliner (1851-1929), alemão emigrado nos


Estados Unidos inventou um sistema de reprodução alternativo ao
cilindro de Edison, constituído por um disco plano rotativo acionado
manualmente, que se designou gramofone3. O som era radiado por
uma grande campânula com um megafone. Enquanto que no sistema
de Edison as modulações do sulco eram feitas na vertical (em
profundidade) no disco de Berliner a profundidade do sulco era
sempre a mesma e as ondulações eram feitas lateralmente (gravura
lateral) (Strong & Plitnik, 1992). O primeiro disco feito por Berliner

2
O projeto para a construção de um fonógrafo foi publicado num artigo de La Semaine du
Clergé em outubro de 1877, mas o envelope entregue na Academia só foi aberto em
dezembro desse ano (Chew, 1981).
3
Charles Cross já tinha anteriormente a ideia de gravação em disco, mas foi Berliner quem a
pôs em prática (Lafaurie, 1966).
tinha 12.7 cm de diâmetro, rodava a 70 rpm (rotações por minuto) e o
sulco em espiral desenvolvia-se do centro para a periferia (Borwick,
1980). Mais tarde, a velocidade standard passou para 78 rpm. A
grande vantagem deste sistema era a possibilidade de se poderem
produzir várias cópias a partir de uma matriz, facto fundamental para
a difusão do registo.

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Até 1925 todas as gravações eram feitas e reproduzidas por
fonocaptores mecânicos através de pavilhões cónicos (Alexandrovich,
1987). Com a invenção das válvulas passou a ser possível converter
as oscilações do ar em impulsos eléctricos. Os sinais eram captados
por um microfone e depois de amplificados davam origem a sulcos
num disco. Em 1922 foi demonstrado pela primeira vez o registo
sonoro óptico, fundamental para o cinema sonoro. Para
Alexandrovich (1987) os factos mais importantes na história da
gravação sonora foram:

Invenção do fonocaptor (pickup) eléctrico pela Western Electric em 1918. Invenção


do fonocaptor de cristal Rochelle em 1931 por Sawyer. • Invenção da modulação
multicanal por Arthur Keller dos Bell Laboratories em 1929 e for-

mulada mais tarde por Blumlein em 1931.

Dois grupos financeiros dos Estados Unidos tiveram grande importância no desen-
volvimento da electroacústica: Bell Telephone Laboratories e Western Electric, e
Radio Electric Corporation of America (RCA Victor Co.) (Davis & Davis, 1987). Entre
os seus contributos refiram-se: a sonorização do cinema, os microfones de
condensador e cardioide, amplificadores, e a reprodução estereofónica.

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