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Rio de Janeiro
2020
I
C2020ESG
Este trabalho, nos termos de legislação
que resguarda os direitos autorais, é
considerado propriedade da ESCOLA
SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É
permitida a transcrição parcial de textos
do trabalho, ou mencioná-los, para
comentários e citações, desde que sem
propósitos comerciais e que seja feita a
referência bibliográfica completa.
Os conceitos expressos neste trabalho
são de responsabilidade do autor e não
expressam qualquer orientação
institucional da ESG.
_______________________________
GUILHERME ANTÔNIO MATOS RODRIGUES
89 f.
CDD – 355.260981
77 f.
AGRADECIMENTOS
RESUMO
ABSTRACT
This study presents the features of the Brazilian Defense Industrial Base and points
out the main issues to its strengthening based on the current situation of scientific
and technological expression of the National Power and, more specifically, on the
educational policies adopted in recent years, with reflection in the first two decades
of the 21st century. Initially, the Industrial Defense Base will be analyzed through
its history, trade data and military expenditures from 2001 on. In addition, it will be
discussed the main public policies of defense industry, the influence of realistic
theory on the National Defense Policy and the challenge of industrial
denationalization. Then, the scientific and technological expression of the National
Power that supports the Industrial Defense Base will be studied, through natural
resources, from the country's scientific and technological institutions with special
attention to their infrastructures and with emphasis on aspects related to innovation
and human resources, including Science, Technology and Innovation expenditure.
Finally, it will be studied the features of Brazilian education, as the great inducer
and one of the main factors for the development of the Scientific and Technological
Expression of the National Power and, consequently, of the Industrial Defense
Base. These features will be splitted into the current educational policies and the
results obtained through the analysis of quality indicators. Finally, it will be shown
the main causes for the Brazilian educational collapse in the last 20 years.
Keywords: Industrial Defense Base. Scientific and Technological Expression.
Scientific and Technological Institutions. Innovation. Educational Policies.
VI
LISTA DE ACRÔNIMOS
CF Constituição Federal
EB Exército Brasileiro
MD Ministério da Defesa
ON Observatório Nacional
SD Sistema de Defesa
TI Tecnologia da Informação
SUMÁRIO
Sumário
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 13
1.5 METODOLOGIA..................................................................................... 18
5 CONCLUSÃO............................................................................................... 78
REFERÊNCIAS 84
13
1 INTRODUÇÃO
D
urante o século XX, o Brasil, em que pese sua participação na
Segunda Guerra Mundial, se manteve distante dos principais
conflitos que tiveram como pano de fundo as disputas geopolíticas
pela supremacia mundial entre os Estados Unidos e a extinta União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS). A América do Sul como um todo também não foi
abalada pelas guerras de independência que afetaram as colônias africanas e
asiáticas, bem como os países centrais da Europa. Até para resolver seus
problemas fronteiriços e consolidar o seu território, o Brasil preferiu se utilizar de
meios predominantemente diplomáticos.
Nesse ambiente de aparente ausência de ameaças, os assuntos ligados à
defesa nacional deixaram de ter a devida prioridade na agenda política nacional por
cerca de duas décadas. Por isso, as discussões relativas à segurança e à defesa
externa do País ficaram restritas ao estamento militar, no âmbito das Forças
Armadas, especialmente após o fim dos governos militares (1985).
Brick (2016) defende que o Brasil já atingiu um patamar de grandeza e de
inserção na ordem mundial que é incompatível com esse desinteresse e cita Pesce
(2001) para sintetizar essa realidade: “o Brasil é um gigante territorial, demográfico
e econômico e um anão político e militar” (PESCE apud BRICK, 2016, p. 303).
A mudança dessa situação de falta de prioridade nos assuntos de Defesa
só veio a ocorrer com a aprovação da Política Nacional de Defesa (PND), em 1996,
e, depois, com a criação do Ministério da Defesa (MD), em 1999, durante o governo
do Presidente Fernando Henrique Cardoso.
A Política Nacional de Defesa (PND), denominada de “Política de Defesa
Nacional” (PDN) em 1996, tinha o objetivo de voltar os olhos da sociedade brasileira
para a defesa da Pátria, iniciativa que visava fazer frente às ameaças identificadas
no cenário internacional da época (BRASIL, 2016a). Sob esse ponto de vista, a PND
pode ser considerada um marco inicial em relação aos assuntos ligados à Defesa
Nacional do País.
Após a criação do Ministério da Defesa, a PDN sofreu a primeira atualização
(2005) e foi complementada pela Estratégia Nacional de Defesa (END). Em 2012,
ambas foram novamente atualizadas, e a Política passou a ser designada de PND
(BRASIL, 2016a).
14
1.5 METODOLOGIA
S
ão vários os conceitos de Base Industrial de Defesa encontrados
na literatura. Neste capítulo, dois deles serão utilizados. O primeiro,
do Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI), pelo
fato de que esse instituto é a principal fonte de dados sobre o comércio das armas
convencionais, de 1950 até o corrente ano, utilizadas neste trabalho. É um recurso
exclusivo para pesquisadores, formuladores de políticas e analistas, para a mídia e
a sociedade civil interessados em monitorar e medir o comércio internacional das
principais armas convencionais (SIPRI, 2020). Para o SIPRI, a Base Industrial de
Defesa é formada por empresas fornecedoras de bens e serviços militares. Os bens
são definidos como equipamentos especificamente desenvolvidos para fins
militares e as tecnologias relacionadas, e não incluem bens de uso geral, como
gasolina, eletricidade, computadores etc. Os serviços militares são também de uso
militar específico e incluem serviços técnicos e outros relacionados às operações
das forças armadas.
O segundo conceito é proveniente da Política Nacional de Defesa (PND) e
será utilizado na seção 2.2 deste capítulo, em uma pesquisa que identificou algumas
características selecionadas do setor. Desse modo, para a PND, a Base Industrial
de Defesa é composta pelo conjunto de organizações estatais ou privadas, civis e
militares, que executam pesquisas, projetos, desenvolvimento, produção,
conservação, revisão, conversão, modernização ou manutenção de produtos de
defesa, no País (BRASIL, 2016a). É importante notar que essa definição é bem mais
abrangente que aquela adotada pelo SIPRI.
E completa que
“Quando Vargas assumiu o poder, as ideias do movimento tenentista de
reformar o Estado coincidiram com os planos do caudilho gaúcho, que
acreditava que o melhor caminho para reformar o país e garantir os
benefícios que planejava para a sociedade seria através do autoritarismo.
Para ele a democracia era frágil e os interesses políticos e pessoais
travavam o desenvolvimento nacional”.
partir dos anos 50, e a intensificação das atividades de P&D voltadas ao setor de
defesa nos anos 60-70.
Nessa época, a BID cresceu muito nos períodos 74-78 e 81-84, conforme
mostrado na Figura 1, e atingiu o seu ápice no ano de 1984, quando as exportações
de armamentos atingiram o valor de US$ 267 milhões, de acordo com os dados
obtidos do SIPRI (2017a).
300
Exportações brasileiras de armamentos (1971-2000)
250
VALOR (US$ milhões)
200
150
100
50
0
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
Ano
Fig. 1: Exportações brasileiras da BID no período 1971-2000
Obs.: Os valores foram estimados em dólares de 1990.
O valor 0 indica que as exportações foram inferiores a US$ 0,5 M
3 “Teniendo en cuenta que en 1970 Brasil no tenía prácticamente exportación alguna en este sector,
resulta sorprendente, que apenas una década después, este país fuese el quinto mayor exportador
a nivel mundial y el primero entre los países en vías de desarrollo”.
27
Andrade (2016) explica que a dimensão alcançada pela BID não pode ser
precisamente quantificada, devido ao sigilo envolvido no setor e aos números
oficiais pouco confiáveis.
A espinha dorsal dessa indústria de defesa foi formada pelas maiores
empresas do setor (PIM, 2007), localizadas na cidade de São José dos Campos:
a) Engenheiros Especializados S/A (ENGESA), empresa privada voltada
para a produção de blindados; b) Empresa Brasileira de Aeronáutica (EMBRAER),
empresa de controle estatal à época, voltada para a produção de aeronaves; e c)
AVIBRAS Indústria Aeroespacial, empresa privada voltada para a produção de
foguetes de artilharia e veículos de sondagem, atuando em parceria com o CTA.
Considerando-se os dados da Tabela 2, nota-se que 99% das exportações
da BID brasileira nos anos 80 (aeronaves, veículos blindados e foguetes de
artilharia) eram produtos pertencentes à EMBRAER, ENGESA e AVIBRAS,
respectivamente.
Ships 0 0 0 0 0 10 0 0 0 0 10
TOTAL 156 62 122 196 267 197 126 191 183 47 1546
No início dos anos 90, a BID brasileira, que ainda tentava se consolidar,
entrou em uma crise com sérias consequências até os dias atuais. Ao final da
década de 90, no ano de 2000, apenas a EMBRAER conseguiu se manter
competitiva no mercado, após a sua privatização em 1994. A AVIBRAS, apesar de
ter sido a terceira maior exportadora na década de 80, permaneceu por mais de seis
29
15000
VALOR (US$ milhões)
10000
5000
0
1988 1990 1992 1994 1996 1998 2000
Ano
triênio 91-93, no qual os gastos variaram entre 8,6 e 11,8 bilhões de dólares. Na
verdade, a partir de 1992, os gastos militares se elevaram, saindo de 8,6 bilhões
em 1992 e chegando a 17,5 bilhões no ano 2000, o que demonstra que não houve
influência dos orçamentos militares na crise da BID que se iniciou em 1988.
Uma boa explicação para o declínio da BID no Brasil foi o fato de que ela
era extremamente dependente do mercado externo, principalmente do Oriente
Médio, e o mercado de defesa sofreu uma forte contração no mundo após o fim da
Guerra Fria. Segundo dados do SIPRI (2017a), as exportações da BID brasileira
saíram do patamar de US$ 267 milhões em 1984 para o valor de US$ 16 milhões
em 1998 (Fig. 1).
140
120
VALOR (US$ milhões)
100
80
60
40
20
0
2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018 2020
Ano
Missiles
Ships 10 0 0 11
TOTAL 19 46 1 44 53 92 43 143
Missiles 1 5 5 6 5 5 27
Ships 21
4O SIPRI considerou, em 2020, ano da pesquisa para a obtenção dos dados deste trabalho, os
seguintes Sistemas de Armas para os dados relativos ao comércio de armamentos: as aeronaves
militares, os sistemas de defesa antiaérea, os sistemas de artilharia, os veículos blindados, os
motores, os sensores, os mísseis, os satélites de uso militar e os navios de guerra. Por isso, pode
haver discrepâncias entre os seus dados e dados provenientes de fontes que utilizam outras
metodologias, especialmente se forem considerados os produtos exportados pela Base Industrial de
Defesa brasileira.
33
nacional na pauta das políticas públicas dos últimos 20 anos. Como consequência
dessa relevância, o governo federal aprovou a publicação de alguns documentos
de suma importância para o fortalecimento da Base Industrial de Defesa (BID).
Dentre esses documentos podem ser elencadas a Política Nacional de
Indústria de Defesa (PNID), de 2005, a Política Nacional de Defesa (PND), de 2016,
e sua atualização, de 2020, a Estratégia Nacional de Defesa (END), de 2016, e sua
atualização de 2020, e o Livro Branco de Defesa Nacional (LBDN), de 2016, e sua
atualização de 2020.
Outro documento que procura dar importância à Base Industrial de Defesa
(BID) é a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI), a qual
estabelece políticas públicas voltadas à CT&I e à indústria nacional.
5 “Todo bem, serviço, obra ou informação, inclusive armamentos, munições, meios de transporte e
de comunicações, fardamentos e materiais de uso individual e coletivo utilizados nas atividades
finalísticas de defesa, com exceção daqueles de uso administrativo” (BRASIL, 2012).
6 “Todo PRODE que, pelo conteúdo tecnológico, pela dificuldade de obtenção ou pela
imprescindibilidade, seja de interesse estratégico para a defesa nacional, tais como recursos bélicos
navais, terrestres e aeroespaciais; serviços técnicos especializados na área de projetos, pesquisas
e desenvolvimento científico e tecnológico; equipamentos e serviços técnicos especializados para
as áreas de informação e de inteligência” (BRASIL, 2012).
7 “Conjunto inter-relacionado ou interativo de PRODE que atenda a uma finalidade específica”
(BRASIL, 2012).
8 “Toda pessoa jurídica credenciada pelo Ministério da Defesa mediante o atendimento cumulativo
das seguintes condições: a) ter como finalidade, em seu objeto social, a realização ou condução de
atividades de pesquisa, projeto, desenvolvimento, industrialização, prestação dos serviços referidos
no art. 10, produção, reparo, conservação, revisão, conversão, modernização ou manutenção de
PED no País, incluídas a venda e a revenda somente quando integradas às atividades industriais
supracitadas; b) ter no País a sede, a sua administração e o estabelecimento industrial, equiparado
a industrial ou prestador de serviço; c) dispor, no País, de comprovado conhecimento científico ou
tecnológico próprio ou complementado por acordos de parceria com Instituição Científica e
Tecnológica para realização de atividades conjuntas de pesquisa científica e tecnológica e
desenvolvimento de tecnologia, produto ou processo, relacionado à atividade desenvolvida,
observado o disposto no inciso X do caput; d) assegurar, em seus atos constitutivos ou nos atos de
seu controlador direto ou indireto, que o conjunto de sócios ou acionistas e grupos de sócios ou
acionistas estrangeiros não possam exercer em cada assembleia geral número de votos superior a
2/3 (dois terços) do total de votos que puderem ser exercidos pelos acionistas brasileiros presentes;
e e) assegurar a continuidade produtiva no País” (BRASIL, 2012).
40
que compõem a BID, quando elas conseguem entrar com seus produtos no
mercado civil (spin-off) ou quando tecnologias desenvolvidas no meio civil são
aproveitadas no desenvolvimento de seus produtos (spin-on) (ANDRADE, 2015).
Um exemplo de sucesso na dualização da BID é a EMBRAER.
Amarante (2004) defende a ideia de que, mesmo com a utilização de
tecnologias duais, a dependência de um único cliente – o Estado – não é
economicamente viável para a BID brasileira.
Uma quarta alternativa para melhorar a autonomia tecnológica da BID é
considerar a importância das parcerias externas, uma vez que é muito difícil ter uma
indústria de defesa completamente autônoma no cenário atual. Por meio dessas
parcerias, é possível aprimorar o nível tecnológico da BID através de instrumentos
como a “transferência de tecnologia e os “Acordos de offset”. Exemplos bem
sucedidos são o desenvolvimento em conjunto com a África do Sul do Projeto A-
Darter – míssil ar-ar de curto alcance e de 5ª geração, o desenvolvimento do Projeto
F-X2 pela empresa sueca SAAB e o PROSUB, programa de desenvolvimento dos
novos submarinos da Marinha do Brasil.
“Embora já tenha tido um papel ativo como exportador de armas, o Brasil,
mesmo no momento atual de revitalização de sua indústria de defesa,
possui uma estrutura pouca adequada à promoção das exportações de
material de defesa, reduzindo a potencialidade das vendas externas”
(MORAIS apud ANDRADE, 2015).
25
Valor (US$ bilhões)
20
15
10
0
2000 2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016 2018 2020
Ano
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Valor (em % do PIB)
0
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2017
2018
Ano
9Na realidade, os Estados Unidos investem em defesa mais do que dez vezes o valor do 3º colocado,
a Índia, e seu orçamento no setor é mais do que o dobro do orçamento chinês.
48
50000
40000
30000
20000
10000
0
2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020
Ano
Brick (2020) também afirma que a indústria de defesa não existe por
motivações econômicas e, sim, estratégicas, assim como as próprias Forças
Armadas, sendo parte de um sistema que não se confunde com as Forças Armadas
e que contribui tanto para a defesa quanto para o desenvolvimento.
No próximo capítulo, será analisada a Expressão Científica e Tecnológica
do Poder Nacional, um dos tripés de fundamental importância para o fortalecimento
da Base Industrial de Defesa (BID) brasileira.
3 A EXPRESSÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA DO PODER NACIONAL
F
oi discutido, no capítulo anterior, que a Indústria de Defesa, se
competitiva e autônoma, fabrica Materiais de Emprego Militar no
limiar da tecnologia disponível. Por isso, é consenso na literatura
que a Ciência e a Tecnologia nacionais desempenham um papel fundamental e
insubstituível para o fortalecimento da Base Industrial Brasileira (BID).
A expressão Científica e Tecnológica do Poder Nacional é formada pelos
recursos humanos, financeiros e materiais nas atividades relacionadas à criação, à
difusão, à aplicação ao caso concreto dos conhecimentos científicos e tecnológicos,
bem como à gestão desses conhecimentos. Compreende, portanto, a capacitação
nacional em Ciência e Tecnologia.
Segundo a doutrina da Escola Superior de Guerra (ESG), a Expressão
Científica e Tecnológica do Poder Nacional é:
“a manifestação do conjunto de homens e meios de que a Nação dispõe
nos campos da ciência e da tecnologia que contribui para alcançar os
Objetivos Nacionais” (BRASIL, 2019).
Nos dias atuais, são vários os exemplos de spin-in, nos quais inovações
geradas e pensadas para o mercado civil são adaptadas e integradas a sistemas
de defesa para gerar novas capacidades militares (LESKE, 2018).
Devido a esses exemplos, faz-se imperioso haver um aumento de sinergia
entre os institutos civis e militares produtores de tecnologia, por meio da pesquisa
e desenvolvimento (P&D), com a finalidade de fomentar o desenvolvimento
tecnológico autônomo e os índices de inovação, bem como orientar as políticas
públicas no setor de defesa.
Apesar das várias políticas públicas implementadas nas duas últimas
décadas nas áreas de defesa e inovação, a capacidade brasileira para inovar ainda
é muito pequena, segundo os indicadores do Global Innovation Index (GII).11
O Índice Global de Inovação (GII), segundo a metodologia adotada pela
Johnson Cornell University, INSEAD – The Business School for the World e pela
WIPO, World Intellectual Property Organization, é subdividida em dois subitens: os
insumos e os produtos de inovação.
O gráfico da Fig. 9 mostra a evolução do Índice Global de Inovação, bem
como os subitens – insumos e produtos de inovação no período 2015-2020.
Nele pode ser observada a lenta piora do Brasil nos últimos seis anos:
passou de um GII de 34,95 em 2015 para 31,94 em 2020, não obstante a leve
melhora no período 2017-2019. Em termos de colocação no ranking mundial, o
Brasil passou da 70ª posição no ranking mundial (2015) para a 62ª em 2020.
Entre os países com renda média superior, o Brasil saiu da 19ª colocação
em 2015 para a 16ª posição em 2020. Na América Latina, o Brasil era, em 2015, o
8º colocado e, em 2020, assumiu o 4º lugar.
Em relação aos insumos da inovação, o Brasil obteve os melhores
desempenhos: saiu da 65ª colocação mundial e 8ª na América Latina para a 59ª
posição mundial e 4ª posição na América Latina. Já nos produtos da inovação, o
Brasil tem o seu pior desempenho: detinha a 74ª posição mundial em 2015 e passou
a ocupar a 64ª posição em 2020. Esses resultados atestam a condição precária em
11 O Relatório “Global Innovation Index” da Cornell INSEAD WIPO 2020 está disponível em:
https://www.globalinnovationindex.org/Home. Acesso em: 16 ago. 2020.
59
40
30
20
10
0
2015 2016 2017 2018 2019 2020
80430
80000 77885
73821
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70000
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52379
50000 48433
45057
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40000
35552
32953
30000
26247
23446
20894
20000 18829
16295
15242
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0
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Ano 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019
%* 1,2 1,2 1,3 1,4 1,4 1,4 1,7 1,8 1,9 2,0 2,1 2,1 2,2 2,3 2,3 2,4 2,5 2,5 2,6 2,6
Fonte: SCImago. (2007). SJR SCImago Journal & Country Rank. Acesso em 16/07/2020,
https://www.scimagojr.com/countrysearch.php?country=br
Elaboração dos dados: Coordenação-Geral de Gestão Institucional (CGAI) - DGI/SEXEC -
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI)
Notas: 1 - São incluídos documentos passíveis de citação - "Citable Documents"
2 - Dados atualizados em função da indexação de novos documentos na base Scopus
0,06
Farmacologia, toxicologia e farmacêutica Química
0,04
Multidisciplinar Odontologia
Fonte: SCImago. (2007). SJR SCImago Journal & Country Rank. Acesso em 16/07/2020,
https://www.scimagojr.com/countrysearch.php?country=br
Elaboração dos dados: Coordenação-Geral de Gestão Institucional (CGAI) - DGI/SEXEC -
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI)
Notas: 1 - São incluídos documentos passíveis de citação - "Citable Documents"
2 - Dados atualizados em função da indexação de novos documentos na base Scopus
Elaboração do autor
Fonte: Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD), Main Science and
Technology Indicators, 2019/1 e Brasil: Coordenação de Indicadores e Informação (COIND) -
CGGI/DGE/SEXEC - Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC)
Fonte: Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD), Main Science and
Technology Indicators, 2019/1 e Brasil: Coordenação de Indicadores e Informação (COIND) -
CGGI/DGE/SEXEC - Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC)
Fonte: Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD), Main Science and
Technology Indicators, 2019/1 e Brasil: Coordenação de Indicadores e Informação (COIND) -
CGGI/DGE/SEXEC - Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC)
Nota: 1) PPC – Paridade do Poder de Compra
A
origem da palavra educação (ex-ducere) é proveniente da vontade
de descobrir o mundo. Ela é formada pelo prefixo ex, que significa
exterior, e pela palavra ducere, que significa conduzir. Por isso,
essa expressão latina “designa a jornada da nossa vida interior para a descoberta
da realidade que nos cerca”.
Para Paro (2014), “a educação consiste na apropriação da cultura...”,
“envolve conhecimentos, informações, valores, crença, ciência, arte, tecnologia,
filosofia, direito, costumes, tudo enfim que o homem produz em sua transcendência
da natureza”.
Por isso, a educação representa um dos principais fatores e a grande
indutora para o desenvolvimento da Expressão Científica e Tecnológica do Poder
Nacional e, por consequência, da Base Industrial de Defesa.
No Brasil, a educação obrigatória passou a ser lei desde a Constituição de
1934. Na Constituição Federal (CF) de 1988, o artigo 205 estatui:
“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho” (BRASIL, 1988).
13 “A Secretaria de Educação Básica (SEB) do MEC atua na formulação de políticas para a educação
infantil, o ensino fundamental e o ensino médio. Em articulação com os sistemas de ensino e
participação social, também planeja, orienta e coordena a implementação dessas políticas por meio
da cooperação didático-pedagógica, tecnológica, técnica e financeira. As ações desenvolvidas visam
à melhoria da qualidade das aprendizagens e da valorização e qualificação dos docentes, com o
objetivo de garantir a igualdade de condições para acesso e permanência na educação básica em
consonância com o pleno desenvolvimento da pessoa, o exercício da cidadania e a qualificação para
o trabalho. Os programas e ações seguem os objetivos estratégicos do Compromisso Nacional pela
Educação Básica, iniciativa anunciada em julho de 2019 pelo MEC, em parceria com o Conselho
Nacional de Secretários de Educação (Consed) e a União Nacional dos Dirigentes Municipais de
Educação (Udime), com o objetivo de tornar o Brasil referência em educação básica na América
Latina até 2030” (BRASIL, 2020c).
14 Aprovada pela Conferência Mundial sobre Educação para Todos, em Jomtien, Tailândia, de 5 a 9
de março de 1990.
69
7 Chile Mexico
United States
Increasing inequality
1 R² = 0,4106
0
0 10 20 30 40 50 60 70
Population without upper secondary
Fig. 13: Porcentagem de pessoas na faixa 25-64 anos sem ter completado o
ensino médio e a desigualdade de renda (2015)
Obs.: Desigualdade de renda medida como a razão P90/P10
Nota: A proporção do decil P90 / P10 é a proporção do valor do limite superior do nono decil (ou
seja, os 10% das pessoas com renda mais alta) para o valor do limite superior do primeiro decil
(os 10% das pessoas com renda mais baixa). A distribuição de renda é medida em relação ao
rendimento disponível da população de 18 a 65 anos.
Fonte: OECD (2018), Education at a Glance Database and OECD Income Distribution database
(IDD), http://stats.oecd.org. See Source section for more information and Annex 3 for notes
(http://dx.doi.org/10.1787/eag-2018-36-en).
Níveis de Ensino
Ano
Todos os Ensino Fundamental
Níveis de
Educação Educação Ensino Educação
Ensino Da 1ª a 4ª Da 5ª a 8ª
Básica Infantil Médio Superior
séries ou séries ou
Anos Iniciais Anos Finais
2000 4,6 3,7 0,4 1,5 1,2 0,6 0,9
2001 4,7 3,8 0,4 1,4 1,3 0,7 0,9
2002 4,7 3,8 0,3 1,6 1,3 0,5 0,9
2003 4,6 3,7 0,4 1,5 1,2 0,6 0,9
2004 4,5 3,7 0,4 1,5 1,2 0,5 0,8
2005 4,5 3,6 0,4 1,5 1,2 0,5 0,9
2006 4,9 4,1 0,4 1,6 1,5 0,6 0,8
2007 5,1 4,2 0,4 1,6 1,5 0,7 0,9
2008 5,3 4,4 0,4 1,7 1,6 0,7 0,9
2009 5,6 4,7 0,4 1,8 1,7 0,8 0,9
2010 5,6 4,7 0,4 1,8 1,7 0,8 0,9
2011 5,8 4,8 0,5 1,7 1,6 1,0 1,0
2012 5,9 4,9 0,6 1,7 1,5 1,1 1,0
2013 6,0 4,9 0,6 1,6 1,5 1,1 1,1
2014 6,0 4,9 0,7 1,6 1,5 1,1 1,1
2015 6,2 4,9 0,7 1,6 1,4 1,1 1,3
2016 6,3 4,9 0,7 1,6 1,4 1,2 1,4
2017 6,3 4,8 0,7 1,6 1,3 1,2 1,5
Fonte: Inep/MEC
Elaboração: Deed/Inep.
Fonte: Inep/MEC
Elaboração: Deed/Inep.
Por fim, será analisada a terceira causa que também muito contribui para a
baixa qualidade do ensino: a desvalorização dos professores e dos profissionais da
educação. Para reverter essa tendência, é necessário implementar uma política de
remuneração adequada para os profissionais da educação, baseada no mérito e na
produtividade, com ênfase nos resultados.
O Brasil é um dos países cujos professores recebem os piores salários, de
acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE). Em seu relatório divulgado no dia 8 de setembro de 2020, o salário de um
professor do ensino médio é cerca de metade da média dos países ricos e é menor
até do que um professor no Chile. A melhora da remuneração dos professores pode
ser uma estratégia para tornar a carreira mais atrativa para novos profissionais
(FAVERO, 2020).
Entretanto, temos que levar em conta que na maioria dos órgãos públicos,
sejam eles federais, estaduais ou municipais a remuneração dos profissionais da
educação não está associada à sua produtividade. Dessa forma, ótimos e péssimos
professores, preparados ou despreparados, todos ganham a mesma remuneração,
situação que se configura como um desincentivo grave para a carreira.
Outra situação nesse mesmo contexto é o fato de que grande parte dos
alunos dos cursos de Pedagogia no Brasil tem obtido notas no Enem16 menores que
a da média nacional. João Batista Araújo e Oliveira, presidente do Instituto Alfa e
Beto e o entrevistado de uma reportagem do jornal Gazeta do Povo, defendeu que
é necessário “selecionar pessoas de mais talento e bagagem intelectual para a
carreira de professor” (BARONI, 2019).
Por tudo isso, é muito importante que as escolas adotem critérios para uma
avaliação regular dos professores, além de fixar metas e objetivos a serem
atingidos.
5 CONCLUSÃO
F
icou demonstrado que a educação representa um dos principais
fatores para o desenvolvimento da Expressão Científica e
Tecnológica do Poder Nacional e, por consequência, da Base
Industrial de Defesa.
Percebeu-se que documentos como a Declaração Mundial sobre Educação
para Todos (UNESCO) em conjunto com as orientações políticas e técnicas do
Banco Mundial vêm servindo de referência para as políticas educacionais do Brasil,
as quais se baseiam nas políticas sociais para o alívio da pobreza e na redução da
escola para o atendimento a conteúdos mínimos de aprendizagem atreladas a
demandas de preparação para o trabalho.
Vencido o problema da oferta de um ensino básico (infantil, fundamental e
médio) que atendesse a toda a população, a preocupação se volta para a qualidade
do ensino atualmente, que é muito baixa principalmente na rede pública. O Brasil
aparece na 66ª posição do ranking PISA 2018, de um total de 77 países. A situação
da evasão escolar é ainda pior: O Brasil tinha, em 2015, um percentual de 53% de
pessoas na faixa etária de 25 a 64 anos que não haviam completado o ensino
médio.
O Brasil gasta por volta de 6% do PIB com a pasta da educação, um valor
superior à média dos países da OCDE (5,5%), e esses gastos subiram muito nos
últimos 18 anos. Entretanto, ao contrário do esperado, esse aumento de gasto não
tem proporcionado a melhora do desempenho escolar e nem tampouco uma queda
dos níveis de evasão na mesma proporção do aumento dos investimentos.
Além da baixa qualidade do ensino no Brasil, vive-se um outro problema
grave: a baixa qualidade da infraestrutura nas escolas da educação básica.
A qualidade da educação depende de vários fatores e agentes, tais como o
financiamento governamental, a infraestrutura predial e material, os professores e
demais profissionais da educação, bem como do grau de coordenação entre os
diversos atores do sistema de ensino.
Ao analisar os indicadores de qualidade da educação no Brasil, ficou claro
que os gastos governamentais não são o gargalo para a melhoria de qualidade do
sistema educacional.
79
(MEM) voltados para o consumo das Forças Armadas e das forças de Segurança
Pública.
Os valores destinados ao setor de defesa acompanharam o desempenho
do PIB no período 2001-2019, sem alterar significativamente a sua fatia no “bolo”
do orçamento federal.
O Brasil teve, em 2019, o 11o maior orçamento militar do mundo, com o total
de US$ 26,95 bilhões. Entretanto, o gasto brasileiro em relação ao PIB foi de apenas
1,5%, valor que se destoa da média de gastos em relação ao PIB dos dez primeiros
orçamentos de defesa mundiais, com exceção da Alemanha (1,3%) e do Japão
(0,9%). O mesmo acontece com os gastos militares em relação ao orçamento do
governo federal.
Adicionalmente, ressalta-se que nem todos os gastos militares do governo
brasileiro significam uma demanda direta para a Base Industrial de Defesa (BID) do
Brasil.
Apenas o grupo de despesa classificado como “investimentos” podem
significar uma demanda para a BID, já que nesse grupo estão incluídas, além das
aquisições (procurement) que demandam a BID, outras despesas relacionadas às
construções de infraestrutura para os quartéis do Exército, as bases navais e as
bases aéreas, aquisições diversas de Materiais de Emprego Militar (MEM), como
compras de equipamentos de Tecnologia da Informação (TI), veículos comuns etc.
A diminuição do percentual de investimentos no orçamento de defesa do
Brasil é um dos principais fatores que pressionam a demanda do governo federal
por encomendas da Base Industrial de Defesa (BID) e acabam por prejudicar o ritmo
de fortalecimento das indústrias de defesa do País.
Por outro lado, a BID também é pressionada por haver pouca
disponibilidade de mão-de-obra especializada e suficiente para as atividades
realizadas na área de defesa no mercado brasileiro.
Fica assim demonstrado que os problemas educacionais brasileiros
representam um grande óbice para o desenvolvimento sustentável da expressão
científica e tecnológica do Poder Nacional, sem o qual a Base Industrial de Defesa
brasileira não poderá ser fortalecida de forma autônoma sem o comprometimento
da soberania do País.
84
REFERÊNCIAS
Déficit tecnológico brasileiro cresce 80% em seis anos. Portal PROTEC – Pró-
Inovação na Indústria Brasileira, abr. 2015. Disponível em:
http://www.protec.org.br/noticias/pagina/32731. Acesso em: 14 ago. 2020.
Pátria Educadora. O Fim da História (Cap. 1-3). Direção: Filipe Valerim e Lucas
Ferrugem. Produção: Henrique Zingano. Porto Alegre: Brasil Paralelo, 2020.
Disponível em: https://plataforma.brasilparalelo.com.br/playlists/patria-
educadora/media/5e8400517c213e3443f27b73. Acesso em: 16 ago. 2020.
REIS, Thiago; MORENO, Ana Carolina. O raio X das escolas do país. Portal G1
Educação, cap. 1, 17 ago. 2015. Disponível em:
http://especiais.g1.globo.com/educacao/2015/censo-escolar-2014/o-raio-x-das-
escolas-do-pais.html. Acesso em: 22 ago. 2020.