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null’s POV
Deve ser divertido para quem tem uma grande família que se reúne na noite
do dia 24 de dezembro ou algo do tipo. Quero dizer, comida, presentes... Não
é que eu não entenda da onde deve vir a empolgação com a data, apenas
desconheço essa empolgação. É realmente por causa da comida e dos
presentes? Ou é algo mais? Filmes e especiais de Natal parecem se esforçar
bastante para vender a ideia de que o que realmente importa é a família, os
amigos, a sensação de pertencer a algum lugar, de estar rodeado por aqueles
que te amam e te entendem. E, embora eu tivesse algumas pessoas que me
amavam, era diferente. Eu era diferente. Nunca me senti capaz de estampar
um sorriso no rosto e comemorar algo que pra mim não fazia sentido. Eu não
conseguia tomar parte na “magia” do Natal, seu amor, sua paz... Seus
milagres. Resumindo, eu realmente não conseguia entender a graça daquela
data.
Pra começar, nós não tínhamos a típica ceia em família. Como o prédio
funcionava como residência para todos, éramos forçados a passar a data
juntos. Colocar centenas de pessoas em volta de uma mesa não era algo
possível, então ao invés disso tínhamos uma “Festa de Natal”, que só se
diferenciava de uma festa normal pelo cardápio e a decoração natalina.
Tínhamos algumas árvores espalhadas pelo salão, guirlandas, papais noéis
nas mais diversas formas, velas, estrelas, renas...
Eu estava um pouco bêbada e bastante triste. Por que não aceitar a ajuda da
única pessoa que realmente queria me ajudar?
- Tara, se você acha que ter null na minha vida é algo positivo... Você
realmente não sabe muito sobre nós. – eu declarei, revendo em minha mente
vários dos meus “melhores” momentos com null. O que tivéramos, e de certa
forma ainda tínhamos, não era algo bonito. A essência de nossa relação era
uma competição para ver quem conseguia machucar mais o outro. Tudo o que
fazíamos quando estávamos juntos era brigar e depois usar um ao outro para
fugir da realidade. Eu usava o corpo dele para esquecer que eu não me
amava. Ele usava o meu para esquecer que eu não o amava.
O que tínhamos era envolvente, sim, porém doentio, e eu não queria me ver
arrastada para aquilo novamente. Mas ao pensar no modo como eu o havia
observado de longe a noite inteira, precisava admitir que eu talvez nunca
tivesse realmente conseguido rastejar para fora daquele lamaçal.
- Como eu disse, tudo depende do modo como vocês lidam com a situação.
Vocês só estão se machucando porque ele é um idiota e você se recusa a
abrir seu coração. Não quer arriscar, não quer se aproximar dele, então só vê
o lado ruim da situação. Boa parte disso tudo depende apenas da sua
vontade. – ela suspirou, enquanto contemplava a taça que segurava – Imagine
uma vela. Você pode usá-la para iluminar um quarto ou incendiar uma casa.
Não é culpa do fogo, entende? O que determina se ele é bom ou ruim é o uso
que você faz dele. É a forma como o enxerga e trata.
- Já disse que odeio metáforas? – foi minha única resposta, enquanto eu
virava outro gole de vinho, inutilmente. Nem todo o álcool do mundo deixaria
aquela noite mais agradável. Engraçado, eu sempre pensei que era a bêbada
feliz, não a deprimida.
- Não. Mas vou adicionar isso à infinita lista de coisas que você odeia. – disse
Tara, com um sorriso. Se esse comentário tivesse vindo de qualquer outra
pessoa, o infeliz em questão não teria sido capaz de manter os dentes colados
à gengiva. Tara, porém, era uma exceção. Eu não conseguia me irritar de
verdade com aquela garota.
- Touché. – eu disse, rindo e voltando a observar o resto da festa. Avistei Paris
rapidamente, conversando com um grupo de pessoas que eu nunca me
interessara em conhecer. null, porém, parecia ter sumido.
Dependendo do ponto de vista, alguém poderia dizer que a festa estava ou no
seu ponto alto ou no seu ponto baixo. Quando as primeiras pessoas haviam
começado a chegar, cerca de cinco horas atrás, o local havia sido a definição
de elegância. Todos arrumados, trocando cumprimentos e personificando as
noções hipócritas de amor a todos e paz na terra que a data parecia trazer.
Agora, porém, já passavam das duas da manhã e a maioria dos presentes
havia se embebedado e se esfregavam uns nos outros na pista de dança.
Não que eu pudesse dizer muita coisa, claro, já que também não estava no
momento mais sóbrio da minha vida. “Bêbada”, no entanto, era uma palavra
forte. Eu ainda não havia matado Paris nem me jogado para cima de null,
como na última vez, então podia dizer com segurança que estava sobre total
comando de minhas faculdades mentais. Havia, porém, bebido o suficiente
para ficar emburrada em um canto julgando as pessoas e revelando a Tara
coisas que devia guardar para mim. Enquanto a primeira parte era algo que eu
talvez me visse inclinada a fazer mesmo sóbria, a segunda era a prova de que
o álcool estava sim tendo certo efeito sobre mim.
Aproveitei alguns segundos de silêncio confortável com Tara enquanto
procurava pelo vampiro desgraçado. O que eu mais gostava naquela garota
era o fato de que ela não parecia ter aquela necessidade irritante que algumas
pessoas têm de preencher o silêncio com conversas estúpidas. Tara só falava
quando tinha algo importante para dizer. O problema é que esse “algo”
geralmente tinha o poder de me deixar desconfortável.
- Ah, não. – eu disse, quando no segundo seguinte os primeiros acordes de
Seven Nation Army, do White Stripes, começaram a vir da caixa de som – Não
essa música.
- Não gosta? – Tara perguntou.
- Pelo contrário. Essa porcaria sempre me deixa meio excitada. – eu revelei.
Já havia falado tanta idiotice naquela noite, por que não aquilo?
- Isso certamente é interessante. – uma voz respondeu, mas não foi a de Tara.
Havia algo de errado com o universo naquela noite, no entanto, porque isso foi
exatamente o que ele fez.
Ele não me respondeu imediatamente, mas quando o fez, não foi com alguma
piadinha. Não ouvi nenhuma provocação sobre meus ciúmes, nem vi algum
tipo de expressão convencida em seu rosto. Aquele fato, mais do que qualquer
coisa que ele havia dito, me desarmou totalmente.
- Sim, eu dancei com Paris. – disse ele, simplesmente – Com Tara, também, e
com a ruiva do setor de armamentos. Mas no que diz respeito à única garota
que realmente me interessa, eu não tenho nem o direito de chegar perto. –
disse ele, em seguida fechando os olhos e respirando fundo – Eu ando sendo
legal, não ando? Te dei todo espaço que pude te dar, não insisti, não te
cerquei. Eu entendi, null. Entendi tudo o que você quis dizer. Ser expulso do
quarto de uma garota após ouvi-la dizer que ficar com você a destrói é o tipo
de coisa que deixa uma impressão. Mas... É Natal, ok?
- Desde quando vampiros ligam para o Natal? – eu perguntei, me sentindo
meio entorpecida. A sensação, porém, não tinha nada haver com o álcool.
- Esse é o meu ponto. Eu não dou a mínima pra essa data desde que era
humano. Não tenho família, não acredito mais em milagres. Mas eu to aqui
agora e passei a noite inteira vendo todos abraçando quem amam, rindo e
achando a vida maravilhosa, enquanto eu não tenho nada disso. A única
pessoa que eu tenho no mundo não me quer na vida dela. A única pessoa que
eu amo nem acredita nos meus sentimentos. Eu to me sentindo sozinho, null.
– disse ele, rindo sem nem um pingo de humor – Céus, isso tudo soa ridículo,
mas é a verdade. Eu tenho Tara, mas não é a mesma coisa. Os Cromwell e
Paris também não. Eu só quero essa noite, caçadora. Menos que isso, só
quero esse momento. Falei pra você que não estava aqui para discutir sobre
nós, e disse a verdade. Não estou te cobrando nada ou pedindo para que algo
mude... Só quero que você dance comigo. Só uma vez, só pra eu poder fingir
por alguns momentos que não sou patético. – ele suspirou, abaixando a
cabeça – Todas as memórias que eu tenho de você são estragadas por algum
sentimento ruim. Só estou te pedindo um momento para lembrar sem dor.
- Alguém veria... – eu comecei a argumentar, mas ele não me deixou terminar.
- Eu precisei rodar o salão inteiro pra te encontrar aqui. Pode acreditar, seu
esconderijo é bem seguro. Ninguém vai ver nada e eu juro que não vou tentar
nada. Não tenho segundas intenções. Como já disse, só quero um momento
puro para poder levar comigo. Você é importante pra mim, e embora eu não
seja um especialista, acho que o Natal é uma data para se estar com as
pessoas que são importantes para você.
Eu não estava no clima para dançar, e mesmo se estivesse, nunca me
permitiria dançar Seven Nation Army com ele, por questões de segurança e
manutenção da sanidade mental. Antes que eu pudesse abrir a boca para
argumentar, porém, a música mudou de forma repentina e eu pude reconhecer
as notas iniciais mesmo com as vaias do povo na pista de dança. Eu
reconheceria Wicked Game em qualquer lugar do mundo, assim como
reconheceria qualquer outra coisa que o Three Days Grace já tivesse gravado,
original ou cover. Aquela, porém, não era uma música que se tocava em
festas, fato que me fez voltar meu olhar para a área aonde Porthos agia como
DJ. Meus olhos encontraram os de Tara, que caminhava para longe do garoto
e dos aparelhos de som. A loira ergueu uma sobrancelha para mim, sorrindo, e
eu senti a estranha vontade de esganá-la pela primeira vez na vida. Pelo visto
o álcool não só a deixava mais corajosa como a tornava alguém capaz de
convencer um garoto a fim dela a mandar uma mensagem subliminar para
mim através de uma música. Touché novamente, Maclay. Você tem o meu
respeito.
Voltei meu olhar para o vampiro novamente e tomei minha decisão. Parte
daquilo era o vinho agindo por mim, parte era a sensação de culpa que eu
tinha para com null, mas não importava. Como eu disse antes, estava em
pleno controle de minhas faculdades mentais, de modo que a decisão foi
minha quando aceitei a mão de null e deixei que ele me envolvesse em seus
braços.
Era estranho deixar que ele me abraçasse, mas a leve névoa em minha
cabeça estava me permitindo ignorar o fato. Talvez eu me fosse me
arrepender daquilo quando a manhã chegasse e levasse consigo os traços
finais de álcool, mas por hora estava tudo bem. De certa forma era bom estar
ali, com minhas mãos nos ombros dele e minha cabeça contra seu peito,
deixando que null enlaçasse minha cintura e balançasse meu corpo devagar.
Naquele momento eu podia admitir sem medo que ele tinha o melhor abraço
do mundo e, porra, como eu precisava daquilo. Eu entendia o que ele havia
dito sobre solidão. Céus, nos últimos tempos eu me sentia tão só que queria
gritar. Eu gostava de fingir que não precisava de ninguém, mas sofria ao me
isolar. Era impossível explicar a sensação, aquela necessidade insana de se
ter alguém por perto combinada ao vício de afastar qualquer um que se
aproximasse demais. Era como viver em um quarto absolutamente vazio,
gritando, chorando e batendo nas paredes em puro desespero, porém ao
mesmo tempo sem ter a capacidade de ir até a porta e abri-la, por puro medo
do que poderia acabar entrando. Eu era uma pessoa contraditória, e no
momento só queria um pouco de paz. Eu estava exausta, carente, e só o que
desejava era não me sentir como a pessoa triste e miserável que havia sido a
noite inteira. null estava ali e eu não tinha forças para afastá-lo naquele
momento. Ele estava me oferecendo o carinho que eu nunca seria capaz de
dar a ele, e por hora eu o aceitaria. Afinal, por mais que o vampiro não
pudesse remendar meu coração, fazia com que eu me esquecesse do quanto
ele doía.
- Por que você quer ir? – eu me peguei sussurrando para ele. Sabia que não
precisaria dar muitas explicações sobre ao quê estava me referindo.
- Porque acho que posso ajudar. – respondeu ele, no mesmo tom.
- Tem mais coisa. – eu insisti – Seja honesto comigo.
- Porque é melhor. – ele respondeu novamente – Você não me quer por perto.
Seria bom eu me afastar um pouco. Mas acima de tudo, eu tenho coisas a
provar pra você. Sinto que só poderei me redimir se fizer algo que anule de
certa forma meus erros. – eu senti a cabeça dele encostar-se ao topo da
minha, enquanto ele continuava a me embalar no ritmo da música – Eu não
consigo, null. O jeito como você olhou pra mim no seu quarto... Acho que eu
nunca vou conseguir me esquecer daquilo. Eu senti parte de mim morrendo
naquele momento. Não posso suportar a ideia de ter você me olhando daquele
jeito de novo. Eu preciso consertar as coisas.
Eu não respondi, simplesmente porque não havia o que dizer. A necessidade
que ele parecia sentir de compensar seus erros não era infundada. Eu ainda
estava com raiva dele. Perdão nunca havia sido algo que me viera
naturalmente, de forma que conceder aquilo a null era difícil para mim. Eu não
tinha a capacidade que algumas pessoas pareciam ter de perdoar e esquecer
facilmente. Era rancorosa e desconfiada, defeitos que apenas reforçavam
minha natureza depressiva. null havia traído a pouca confiança que eu tinha
nele e eu não encarava esse tipo de coisa com tranquilidade.
Mas aquilo não significava que ele estava certo. Eu não tinha certeza se o
queria a milhas e milhas de distância. Havia me tornado estranhamente
dependente da presença de null. O vampiro se tornara uma constante em
minha vida e seria horrível não tê-lo por perto por algum tempo. Era uma coisa
me manter afastada dele enquanto ainda podia olhá-lo e manter breves
interações. Seria outra bem diferente ter que aceitar a ideia de que não
poderia vê-lo nem se eu quisesse.
Aquela havia sido uma péssima ideia. Havia esquecido o quanto a sensação
do corpo dele contra o meu era boa, o quanto eu gostava do seu cheiro, do
jeito como ele me tocava. Aquele leve latejar de desejo me afligia, me
machucava, e aquilo tornava mais difícil resistir. Dizer não a null era uma das
coisas mais difíceis que eu já havia feito e eu sabia que dentro de poucos
momentos teria que dar as costas a ele novamente. Aquilo era torturante,
porque enquanto eu permanecia em seus braços, era mais fácil fingir.
Eu não o amava, mas era capaz de esquecer aquilo, afastar aquela noção de
mim junto com todo o meu ódio. Naquele momento null era apenas alguém.
Quem ele era, o que já havia feito e o que representava não era importante.
Ele estava fazendo com que eu me esquecesse o quão infeliz eu era e isso o
tornava, por alguns momentos, a pessoa mais importante do mundo.
null estava me segurando contra ele como se nunca mais pretendesse soltar,
mas eu não me importava. Sabia que, como eu, ele estava buscando conforto
onde quer que o encontrasse. Eu percebi naquele momento que entendia sim
o Natal, apenas não o via como os demais. Havia uma razão pela qual eu me
sentia sempre tão mal naquela época: a data celebrava tudo que eu não era e
não tinha. A capacidade de comemorar o fato de ter seus entes queridos por
perto, a ideia de amor, de paz na vida... De esperança. Aquelas eram coisas
que eu havia perdido ao longo dos anos e que, em algum nível, me faziam
falta. Eu nunca havia conseguido ser parte do Natal porque nele não havia
espaço para pessoas como eu e null. Gente solitária com escuridão na alma.
Eu não podia simplesmente relaxar e me juntar aos outros. Não era capaz de
colocar um gorro vermelho na cabeça e rir com os demais e por isso me
refugiava nos cantos, nas sombras, observando as pessoas, tentando
entender de onde elas tiravam aquele amor pela vida. Como seria poder
relaxar daquele jeito, esquecer-se dos problemas? Eu os odiava, tinha
desprezo por eles e céus, daria qualquer coisa para ser como eles. Aquilo doía
como nada no mundo e eu desejava poder mudar aquela situação. Ali, nos
braços de null, eu desejei poder fazer alguma coisa, qualquer coisa para
mudar a ordem das coisas. Naquele momento eu me sentia muito mais
próxima a ele do que a qualquer um dos meus amigos e aquilo me feria
profundamente.
Com minha cabeça contra o peito de null, eu inspirei fundo, inalando o cheiro
dele, tentando absorver o máximo de sua presença que eu pudesse. Estava
sendo cruel mais uma vez, não estava? Pra mim aquilo seria apenas um
momento, mas e para ele? null era quem havia pedido aquilo, mas não era
aquela a função dele? Era eu quem devia ter forças pra dizer não. Permitir
momentos como aquele e depois deixá-lo de novo era torturá-lo
emocionalmente e eu tinha consciência daquilo. Eu não sabia ao certo o que
ele sentia por mim, mas eu não podia amá-lo e aquele era um dos
relacionamentos nos quais se você não pode investir tudo, é melhor que não
invista nada.
Eu era terrivelmente dependente da presença física de null, porém tinha
milhões de problemas com a pessoa por trás daqueles olhos null. Eu não
podia amá-lo, porém mais do que isso, não queria amá-lo. Se eu ainda fosse
capaz de abrir meu coração para alguém, não seria para ele. Não era seguro
me deixar levar pelo mundo que null me oferecia. Era perigoso, incerto,
intenso e eu tinha medo. Tara estava certa, eu tinha muito medo. Se eu
deixasse que o fogo entre nós me envolvesse de vez, não teria como fazê-lo
parar. Ele me queimaria profundamente até consumir tudo em mim, até me
transformar em cinzas, até me deixar ainda mais vazia. Eu já era destruída
demais para ser capaz de sobreviver àquilo.
Se eu ainda fosse capaz de amar, tentaria amar alguém mais simples, não
uma criatura tão perdida quanto eu. Alguém sem tanta bagagem, sem
tamanha necessidade de ajuda. Alguém como Aramis, talvez. Alguém bom.
null não era bom. De algumas formas, ele era bem pior do que eu. Ele era um
vampiro, um assassino. As pessoas a minha volta pareciam estar esquecendo
disso, mas não eu. Talvez se eu também acreditasse no que eles acreditavam,
veria null em uma luz diferente, porém eu conhecia a verdade. null não estava
ali por arrependimento. Não dera as costas à própria espécie para se redimir.
Oh não, seus motivos eram bem mais egoístas.
Ele só queria a mim. Toda aquela farsa era apenas a maneira dele de chegar
até mim. Ele já havia deixado claro que não dava a mínima para tudo que
havia feito. Em mais de um século, não havia como imaginar a quantidade de
dor que ele havia infligido em inocentes e ele nem ao menos se importava. O
que as famílias daqueles que ele matou diriam se o vissem ali agora? Pior
ainda, se o vissem abraçado a uma caçadora? Eu devia está-lo matando, mas
não o fazia. Era tão horrível da minha parte que eu ao menos não o amasse?
Eu podia mesmo ser considerada uma pessoa ruim por não ser capaz de me
apaixonar por um monstro?
Como eu já disse, perdão não era algo que eu concedia facilmente. Eu não
podia esquecer o passado de null naquelas circunstâncias. null havia ao
menos se arrependido, porém null não passava de um cão raivoso que fora
preso em uma coleira. O fato de ele não estar mais aterrorizando inocentes
não era mérito de seu caráter, e sim das forças externas que o restringiam.
Talvez se eu fosse uma pessoa melhor, pudesse ajudá-lo. null, porém, havia
investido seus assim chamados sentimentos na pior mulher possível. Eu não
podia guiá-lo. Só o que sabia fazer era pegar o pouco de bondade que ele me
oferecia e contaminá-la. Eu deixava meu desejo falar por mim e o usava, tirava
o que podia dele, o convencia de que ele apenas uma coisa e nunca seria
melhor do que aquilo. Eu era a única pessoa que podia ajudar null, mas
infelizmente só sabia deixá-lo pior.
Era por isso que eu não podia ficar com ele. Se havia uma chance para null,
não era comigo. Eu não podia curar nem a mim mesma, então como curaria a
ele? Não podia ser a bússola moral de um vampiro. null precisava de alguém
bom e eu não era boa. Eu transpirava mágoa e ódio e só o que fazia era
espalhar isso à minha volta. Eu não era boa. Não restava quase nada bom em
mim.
Então por que ele me queria? Eu era capaz de admitir que havia algo ali que ia
além do desejo, mas o quê? Por que ele não desistia de mim, por que me
queria por perto, por que estava me abraçando naquele momento? Eu não
tinha nada que justificasse todo aquele esforço. Com a exceção dos meus
poucos amigos, as pessoas geralmente não queriam estar perto de mim.
Gente como eu não serve como companhia, então por quê? O que ele havia
visto em mim? O que podia torná-lo capaz de suportar tudo o que eu fazia com
ele?
Eu afastei minha cabeça do peito de null, precisando olhar no rosto dele, como
se esse fosse me oferecer uma resposta. Ele me encarou com as
sobrancelhas um pouco franzidas, como se pudesse ver a tristeza em meus
olhos. Eu odiava a forma como ele parecia enxergar dentro de mim às vezes e
odiava aquela preocupação no rosto dele. null me olhava como se eu fosse
algo precioso se partindo. Havia tanto calor naqueles olhos null, tanto carinho,
tanto... Sentimento. Aquilo me apavorava, abalava todas as minhas estruturas,
pois eu era incapaz de compreender aquela força que parecia vir de null.
Havia algo na forma como ele me olhava que me parecia maior, mais antigo e
mais bonito do que qualquer coisa no mundo. Ele me olhava como se eu fosse
a pessoa mais importante do planeta. Como se ele gostasse de quem eu era.
Como se...
Não.
Ele não me amava. Ele não podia me amar. Não havia nada amável em mim.
Ele não era capaz de me amar. Ele não me amava. Ele não me amava.
Eu me soltei de seus braços, cambaleando um pouco para traz, sentindo todo
meu corpo tremer. Ele não me amava. Eu não havia passado todo esse tempo
ferindo alguém que tinha reais sentimentos por mim. Eu não podia acreditar
que ele me amava, porque se me amasse aquilo faria de mim um monstro
ainda pior. Ele não me amava, pois eu não poderia aguentar aquilo. Era
incapaz de suportar a ideia de null me amando.
Ele estava me olhando confuso e eu percebi que balançava minha cabeça em
negação sem parar. Em um momento de desespero, entendi que estava
prestes a chorar.
- Eu preciso ir. – disse com voz trêmula antes de dar as costas e praticamente
correr para fora do salão. Ele não me amava. null não me amava. Não era
verdade, eu sabia que não podia ser verdade. Ele não me amava, não podia
me amar, nunca me amaria. Eu não podia ser amada. Ele não me amava. Por
favor, meu Deus, eu não suportaria aquilo se fosse verdade. Por favor, não
deixe ser verdade.
Xx
null’s POV
Meus pés haviam me levado quase como se por vontade própria à mesa a
qual Tara se sentava sozinha pela primeira vez na noite. Eu sabia que não
podia ir atrás de null quando ela fugia daquela maneira, já que aquilo sempre
piorava as coisas. Mas eu não queria ficar sozinho.
Eu andava fazendo muito aquilo, na verdade. Na última semana, havia
precisado de alguém para me ouvir e Tara havia estado lá. Eu abusara um
pouco de sua boa vontade e me envergonhava ao pensar no quanto havia
forçado Tara a escutar. Ela nunca reclamava, no entanto, e acabáramos
ficando bem mais próximos. Era bom ter alguém com quem conversar e eu
tinha certeza que, se não fosse por ela, eu não teria tido forças para ficar longe
de null. Foi Tara quem me ajudou a enxergar que o melhor que eu podia fazer
pela caçadora era dar a ela espaço. Se eu tinha lidado com o fim de minha
relação com null com o mínimo de dignidade, devia aquilo a Tara.
- Precisa conversar? – perguntou a loira, assim que me viu. Me senti mal por
um momento.
- Eu realmente só te procuro quando preciso conversar? – perguntei, puxando
uma cadeira e me sentando.
- Não. – disse ela, sorrindo – Mas o Natal parece ter a capacidade de tornar as
pessoas felizes mais felizes e as tristes mais miseráveis. Imaginei que você
fosse acabar precisando de um ombro amigo, e não tem problema. Já encarei
a null hoje e você é peso pena se comparado a ela.
- Você nunca se cansa de tentar ajudar todo mundo? – eu perguntei,
realmente curioso. Nunca antes havia conhecido alguém tão altruísta quanto
Tara.
- Não, eu gosto. – respondeu a garota – Sou muito boa em lidar com as
pessoas, em entendê-las. Queria ser psicóloga quando era criança, mas
digamos que a vida acabou escolhendo outras coisas para mim. – o jeito como
ela disse aquilo me fez querer questioná-la, mas Tara não me deu tempo para
isso – Mas isso não importa no momento. Imagino que as coisas não tenham
se desenrolado muito bem com null.
Xx
null’s POV
A corrida até o meu quarto acalmou um pouco meus nervos, mas eu ainda me
sentia abalada. Eu nunca antes havia experimentado aquele tipo de medo. Se
null me amasse, então meu mundo desabaria. Tudo que eu havia feito seria
muito pior. Eu nunca seria capaz de me perdoar se ele me amasse, então não
podia acreditar naquilo. null não estava realmente apaixonado por mim. Aquilo
era impossível.
Eu fechei a porta atrás de mim, só então reparando no envelope no chão.
Alguém provavelmente o empurrara por debaixo da porta em algum ponto da
noite.
A inscrição no envelope quase me fez rir. Obrigada, null. Aquilo era a última
coisa que eu precisava no momento, e por isso me sentia grata. Uma carta de
amor ou um poema me permitiriam ficar irritada com ele. Uma tentativa barata
de expressar seus “sentimentos” tornava mais fácil negá-los.
Eu abri o envelope, sem dar nenhuma atenção ao fato de que aquela grafia
me parecia levemente familiar. Eu estava concentrada demais em meu ódio
por cartas. Cartas estragavam tudo, fossem elas cartas misteriosas que não
podiam ser abertas ou cartas vindas do inimigo. Rascunhos de cartas que
traziam importantes informações ou possíveis cartas de amor capazes apenas
de provocar desprezo. Eu odiava cartas. Se nunca mais na vida recebesse
uma, ainda assim seria cedo demais.
Retirei o papel do envelope e o desdobrei. Um pouco confusa, virei o verso,
apenas para obter o mesmo resultado. Nada. Não havia nada escrito naquela
folha, que parecia ter sido dobrada e desdobrada mais de uma vez.
Que tipo de brincadeira era aquela? O que ele queria, me confundir, me
enlouquecer? Talvez simplesmente me irritar. Se fosse isso, estava
conseguindo.
Peguei meu celular e procurei o número dele, disposta a dizer umas verdades
àquele desgraçado. Ele não podia simplesmente me deixar em paz no meu
canto, podia? Pra que me mandar um papel vazio a não ser que fosse para me
irritar?
- Imagino que não tenha gostado do meu presente. – disse ele, ao atender.
- Que tipo de joguinho estúpido é esse? – eu perguntei – Achei que tínhamos
parado com isso.
- Oh, seria bom acreditar nisso. – disse ele, com um riso abafado e triste –
Mas dessa vez não é jogo nenhum, caçadora. Quis te dar um presente, mas
sabia que você não aceitaria nada que eu comprasse. Eu já tinha feito isso,
então... Bom, parecia lógico entregar a você.
- Feito o quê? Entregar o quê, null? Um papel vazio?
Aquilo o fez rir mais ainda e eu detestei o traço de desespero naquele som.
- Tá vazio mesmo, né? É ridículo, se você parar pra pensar...
- null. – eu interrompi, irritada – Explique-se.
Eu o ouvi suspirando do outro lado da linha, calando a risada. Ele levou alguns
segundos antes de voltar a falar.
- Naquela noite, após você fechar a porta na minha cara, eu... Bom, eu não
estava no melhor momento da minha vida. – começou ele – Estava magoado,
com raiva, confuso, e não sabia o que fazer. Nem sei como cheguei em casa,
mas assim que o fiz, quis sair de novo. Eu queria te punir de alguma forma,
null. Queria te machucar como você havia me machucado. Agora eu entendo
suas intenções, mas naquele momento... Naquele momento só o que eu senti
por você foi ódio. – nunca pensei que ouvir aquilo fosse me machucar tanto
quanto machucou. Praticamente me arrastei até a minha cama, pressentindo
que precisaria estar confortável antes de ouvir o resto – Foi então que eu
comecei a pensar em tudo o que podia fazer para te atingir. Esqueci
totalmente meu acordo com seu chefe e comecei a pensar em tudo o que
podia destruir, todas as pessoas que poderia matar, toda dor que poderia
causar... – ele soltou uma respiração trêmula – Tudo o que eu estava
acostumado a fazer. Mas para o meu desespero, cada ideia que eu tinha era
seguida pela lembrança de você me olhando daquele jeito. E isso era só o que
eu precisava para abandonar qualquer plano. Não pense que eu não vejo o
quanto isso é estúpido. A ideia toda era te fazer sofrer, mas só de pensar em
colocar aquilo em prática... – ele suspirou, exasperado – Eu sabia que você se
sentiria culpada por qualquer coisa que eu fizesse. Você sempre se sente,
como se cada vítima de vampiros fosse uma vítima sua, uma falha sua. Eu
descobri que não suportaria ser a pessoa a te causar esse tipo de sofrimento.
Por sua causa eu não posso mais matar.
- Se você está tentando bancar o coitadinho, está fazendo um péssimo
trabalho. – eu disse, porém sem conseguir colocar veneno nas palavras.
- Não estou tentando nada, caçadora. Será que você não vê? Perceber aquilo
apenas me irritou mais. Eu sinceramente não dou a mínima pros seus
humanos queridos, mas você dá, e isso me impede de machucá-los. Eu me
senti patético. Estava sofrendo e queria descontar aquilo em qualquer um que
cruzasse meu caminho, mas não podia porque me recusava a ferir a pessoa
responsável por todo o meu desespero. Que espécie de vampiro sou eu? – ele
perguntou, e por um momento achei que ele realmente esperava uma resposta
– Naquele momento eu percebi que você estava certa quando me disse que
eu estava perdendo meu orgulho, e aquilo me enfureceu mais do que tudo no
mundo. Por que eu fazia aquilo? Por que fazia de tudo por uma garota que só
me tratava como lixo? Aquilo precisava parar. Precisava haver algo no mundo
que eu não faria por você e então eu resolvi compor uma lista. Deixaria
registradas todas as coisas que eu me recusava a fazer por você. Todas as
coisas que, não importando o quanto você me implorasse, eu nunca me
rebaixaria o suficiente para fazer.
- E? – eu perguntei, com medo da resposta, sentindo meu coração doendo no
peito.
- E você a está segurando. – ele disse, em tom cansado – Tá tudo aí. Toda a
minha frustração. Todas as noites que eu passei segurando esse papel e
tentando pensar em alguma coisa. O resto do meu coração que eu ainda não
havia te dado, junto com o que sobrou das minhas reservas, da minha
dignidade. Tá tudo aí nessa folha. – ele disse, com outra risada seca – “O Que
Eu Não Faria Por null”.
null me amava.
Não era só uma obsessão. Ele não apenas pensava me amar, ele... Ele me
amava. Me amava tanto que me assustava. Todas as ações, todas as palavras
dele até aquele momento subitamente passaram a ter outro sentido para mim.
Oh meu Deus. Por todo esse tempo... Como ele podia? null já havia visto o
pior de mim, como podia me amar?
Não fazia sentido. Era tão mais fácil acreditar que ele era incapaz de reais
sentimentos. Acreditar que ele era como eu. Como uma criatura que já havia
feito tudo que ele fez podia ser capaz de sentir mais do que eu? Ele me amava
e eu não era capaz nem de começar a compreender a intensidade do
sentimento que eu havia visto estampado em seus olhos poucos minutos
atrás. E as coisas que eu havia feito com ele...
Eu comecei a chorar de verdade, sem conseguir me controlar. Quis desligar o
telefone, mas não pude. Oh, meu Deus, eu havia torturado alguém que me
amava. Havia usado alguém capaz de sentir. De uma hora para a outra, tudo
se tornara real. Se null tinha sentimentos, ele era real. Não era uma coisa que
podia ser usada, era uma pessoa. Uma pessoa da qual eu havia abusado.
Como? Por quê? Não fazia o menor sentido. Se os sentimentos de null eram
reais, como eu não havia conseguido matá-los? Eu não havia sido nada além
de horrível com ele. Como ele podia me amar? O que havia visto em mim que
considerara digno de amor?
Eu queria perguntar tudo isso, mas não consegui. Não sabia o que dizer ou
como dizer. Não era boa com as palavras e nada que eu dissesse mudaria a
situação. Ele me amava e eu era um monstro. Não havia o que fazer.
- Eu não sei... – eu consegui dizer, finalmente. Sabia que ele podia me ouvir
chorando – Não sei o que você quer que eu diga.
- Nada. – ele disse, e eu quase podia ver o sorriso triste em seus lábios – Não
quero que você diga nada, null. Só o que eu sempre quis foi que você
entendesse. Nada além disso. – ele parou por um segundo, me deixando
entender que ele sabia que eu finalmente entendera – Sinto muito se isso te
machuca, mas eu to cansado de sofrer sozinho. Por isso te mandei a lista.
Minhas palavras nunca foram capazes de te convencer, então imaginei que a
ausência delas fosse. – ele suspirou mais uma vez antes de continuar – Amor
pode parecer um presente sem valor, mas talvez algum dia ele signifique mais
pra você do que dor e culpa. Acho que ainda não desisti de acreditar em
milagres, afinal de contas. – abaixando levemente o tom de voz, ele concluiu –
Feliz Natal, null.
Ok, ao contrário do que essa fic possa fazer parecer, eu amo o Natal. Isso
provavelmente é o motivo pelo qual eu sempre imaginei a caçadora o
detestando xD
Eu sei que fics de natal deviam ser felizes, mas dá pra imaginar um daqueles
dois feliz no natal? Principalmente depois do drama mexicano do capítulo 33...
Tive que estender o drama pra essa fic, mas foi extremamente necessário. Eu
precisava que ela finalmente reconhecesse os sentimentos dele, e a cena
simplesmente não podia ser feliz.
Mais uma vez usei a Tara pra dar bronca nos personagens... xD Eu não
resisto. Sempre que fico irritada com eles, uso a garota pra adminstrar o
choque de realidade. Dessa vez mais com o vampiro do que com a caçadora.
Não me entendam mal, eu adoro esse personagem e AMO a forma como
vocês gostam dele. Mas nos últimos tempos ando tentando ver as coisas pelo
lado da caçadora, e a verdade é que esse vampiro tá MUITO longe de ser
perfeito. Ela não é a única responsável pelo fracasso da relação, gente. Ele
também tem muita coisa a aprender ainda. Precisa evoluir bastante antes de
realmente merecer a relação que quer ter com ela.
Sobre a música da fic, já fazia um bom tempo que eu tava procurando uma
boa desculpa para usá-la. Acho que já deu pra perceber que eu tenho um
sério problema com o Three Days Grace. Esperem mais músicas deles no
futuro de Bite Me!
É isso, estrelinhas! Espero que tenham gostado! Quero desejar parabéns ao
FFOBS por mais um ano fazendo milhares de fangirls felizes <3 E agradecer a
Lara, por ter betado esse especial, e a Carol Fletcher, minha shipper favorita,
que deu VÁRIAS idéias pra essa fic!
Outras fics:
Bite Me [Restritas/Em andamento]
The Cake [Especiais/Contos]
Sexual Healing (Sem pseudônimo) [Restritas/Finalizadas]
Down With Love |HIATUS| (Sem pseudônimo) [Restritas/Andamento]
Nota da Beta: Qualquer erro nessa fanfic é meu, então me avise por email ou mesmo no twitter.
Obrigada. Xx.
Contratempo de
Primeira (Vez), por Sial TAXI, por ANA LI\I 01. Tok
133 Comentários
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se um dia você ler isso, por favor, CONTINUA essa história nem
que seja por livro que a gente compra sim! É MUITO ORIGINAL
pra deixar passa assim
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