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Rio de Janeiro
2015.2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
Rio de Janeiro
2015.2
Nome: Douglas Batista de Menezes
Matrícula: 113070029
Nota:_____ Data:__/__/____.
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Professor (a):______________________
_______________________________________________
Professor (a):______________________
Às minhas mães, Maria das Neves e
Jonice (in memoriam), por nunca
desistirem de mim.
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar agradeço a Deus por permitir que eu chegasse até aqui e não
desanimasse, mesmo nos momentos de adversidade em que pensei que não
conseguiria.
À minha mãe, Maria das Neves, mulher de fibra, pela incessante cobrança e firmeza.
À minha família, pelo apoio prestado por minhas irmãs sempre que necessário.
Ao professor Nilo Gomes, orientador desta pesquisa, pela paciência, dedicação e
orientação precisa.
A José Augusto Cardoso Bernardes, Professor Catedrático da Faculdade de Letras
de Coimbra, por fornecer materiais essenciais para a pesquisa.
À professora Sueli Alves, apaixonada por literatura portuguesa que forneceu ajuda
bibliográfica para esta pesquisa.
À Universidade Cândido Mendes pelo aprendizado ao longo desses anos de
graduação.
Aos colegas do curso de Letras pela ajuda e companheirismo nessa caminhada.
"A consciência é o melhor livro de moral e o
que menos se consulta."
(Blaise Pascal)
A DENÚNCIA MORAL NA OBRA DE GIL VICENTE
UMA ANÁLISE DO AUTO DA BARCA DO INFERNO
RESUMO
ABSTRACT
This research analyzes the conception about morality in the Middle Ages and shows
misconduct by the clergy, the nobility and the other social classes. Contextualizes the
historical moment wherein Gil Vicente wrote the Auto da Barca do Inferno as shows
the Humanism, a literary movement from which the playwright was part. Exposes a
brief biography of the author and the Vincentian theater features. On the work, there is
a summary that shows the history and allegorical characters in the play. The work ends
with the investigation of moral denunciation present in the work of Gil Vicente,
introducing the characters and social types proposed by the author, showing their
dissatisfaction with the Portuguese attitudes of his time. The portuguese playwright
condemned the sin and not the sinner.
INTRODUÇÃO…………………………………………………………............................09
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................26
REFERÊNCIAS..........................................................................................................27
9
INTRODUÇÃO
1 CAMÕES, Luís de. Os Lusíadas. Prefácio de Álvaro Júlio da Costa Pimpão; Apresentação de Aníbal
Pinto de Castro - 4.a ed. – Lisboa: Ministério dos Negócios Estrangeiros. Instituto Camões, 2000.
2 BLAINEY, Geoffrey. Uma Breve História do Cristianismo. 1. ed. Fundamento, 2012.
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dos pecados”.
A Igreja estava perdendo crédito como pode ser constatado no trecho a seguir:
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BLAINEY, Geoffrey. Uma Breve História do Cristianismo. 1. ed. Fundamento, 2012.
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BLAINEY, Geoffrey. Uma Breve História do Cristianismo. 1. ed. Fundamento, 2012.
5
BLAINEY, Geoffrey. Uma Breve História do Cristianismo. 1. ed. Fundamento, 2012.
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BLAINEY, Geoffrey. Uma Breve História do Cristianismo. 1. ed. Fundamento, 2012.
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MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. - 37. ed., rev. e atual. 1ª reimp. São Paulo: Cultrix 2013.
8 MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. - 37. ed., rev. e atual. 1ª reimp. São Paulo: Cultrix 2013.
14
9
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. - 37. ed., rev. e atual. 1ª reimp. São Paulo: Cultrix 2013.
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De acordo com MOISÉS (2013, p. 54)10, a biografia de Gil Vicente anda envolta
em dúvidas, pois teria nascido em 1465 ou 1466, talvez em Guimarães e morrido entre
1536 e 1540. Ourives e mesmo mestre da balança da Casa da Moeda de Lisboa, inicia
seu teatro a 7 de junho de 1502, por ocasião do nascimento do futuro D. João III, filho
de D. Manuel e de sua segunda mulher, Maria de Castela, filha dos reis católicos, D.
Fernando e D. Isabel.
O Monólogo do Vaqueiro (ou Auto da Visitação) é declamado em espanhol a
fim de saudar o nascimento do filho de D. Manuel assim como o nascimento de Cristo,
pois à criança serão oferecidos presentes, como haviam feito os Reis Magos.
O auto causa tão boa impressão que pedem seu retorno nas festas de Natal.
Em vez de recitar este auto, decide encenar outra peça, de tema similar: Auto Pastoril
Castelhano. A partir daí, Gil dedica-se a escrever e representar teatro para o
entretenimento da realeza e da fidalguia, concomitantemente com suas outras
funções junto à Corte.
Conforme afirma MOISÉS (2013, p.55)11, o teatro vicentino pode ser divido em
três fases: a primeira, de 1502 a 1514, onde é notória a influência de Juan del Elcina,
sobretudo nos primeiros anos e atenuando-se depois de 1510; a segunda de 1515 a
1527, começa com Quem tem farelos? e termina com o Auto das Fadas: corresponde
ao ápice da carreira dramática de Gil Vicente, com a encenação de suas grandes
peças, dentre as quais a Trilogia das Barcas (1517-1518), o Auto da Alma (1518), a
Farsa de Inês Pereira (1523), o Juiz da Beira (1525), e a terceira de 1528, com o Auto
da Feira, até 1536, com a Floresta de Enganos, fase em que o dramaturgo passa a
intelectualizar seu teatro, sob o impacto do classicismo renascentista.
Quanto ao tema, o teatro de Gil Vicente pode ser classificado em tradicional e
de atualidade. O primeiro refere-se àquilo que é evidente e dominante inflexão
medieval: são as peças de cunho religioso, como o Auto da Fé (1510) e o Auto da
Alma (1518), filiadas ao teatro religioso de Juan del Elcina e remotamente aos
milagres e mistérios franceses; as de caráter bucólico, como o Auto Pastoril
Castelhano, o Auto Pastoril Português (1523) e as que tinham como inspiração as
novelas de cavalaria, como D. Duardos (1522) e o Auto de Amadis de Gaula (1533).
10 MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. - 37. ed., rev. e atual. 1ª reimp.São Paulo: Cultrix 2013.
11
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. - 37. ed., rev. e atual. 1ª reimp. São Paulo: Cultrix 2013.
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E complementa em:
12
JUNIOR, Benjamim Abdala. Auto da Índia; Auto da Barca do Inferno; Farsa de Inês Pereira / Gil
Vicente; adaptação e notas por Benjamim Abdala Junior. – 2ª Ed. – São Paulo; Editora Senac,
2003.
13
JUNIOR, Benjamim Abdala. Auto da Índia; Auto da Barca do Inferno; Farsa de Inês Pereira / Gil
Vicente; adaptação e notas por Benjamim Abdala Junior. – 2ª Ed. – São Paulo; Editora Senac,
2003.
17
danças, cantigas e narrativas folclóricas. Este teatro voltou-se ainda para a atualidade
do Renascimento, aliando o humanismo religioso com atitude crítica diante dos
problemas sociais de sua época. Cada personagem representava, principalmente na
oratória, sua condição social.
O anticlericalismo das sátiras de Gil Vicente para ter trazido problemas com a
Inquisição. O autor contava, entretanto, com proteção palaciana, em especial da
rainha D. Leonor, que lhe encomendou várias peças. Talvez esse fato explique o largo
espaço de tempo que vai da morte de Gil Vicente (entre 1536 e 1540) e a publicação
da compilação de suas peças, iniciada pelo autor e concluída por seu filho Luís Vicente
em 1562, compilação essa que foi modificada pela censura inquisitorial.
A reconstituição integral de muitos textos foi possível, como no Auto da Barca
do Inferno, pela existência de folhas avulsas desses textos. A farsa de Inês Pereira
também foi objeto de confronto posterior com folha avulsa da época. Já o texto do
Auto da Índia segue a compilação terminada por Luís Vicente.
18
O Auto da Barca do Inferno é uma peça (um auto de moralidade) escrita por Gil
Vicente em 1517 e tem como personagens as seguintes figuras: Fidalgo, Onzeneiro,
Joane (um parvo), Sapateiro, Alcoviteira, Judeu, Corregedor, Procurador, Enforcado,
Quatro Cavaleiros de Cristo, Anjo, Diabo e seu Companheiro.
A peça trata de um motivo religioso da Idade Média: o do juízo final. O Auto da
Barca do Inferno mostra uma galeria de tipos sociais, alegorias usadas por Gil Vicente.
O tema da peça é a busca da resposta à indagação acerca do destino imposto pela
morte.
À medida que eles chegam à praia, local onde se dá o juízo, são julgados pelos
diabos, que têm a função de conduzir as almas a seu destino. O aspecto mais
importante desse auto é, portanto, a problemática social, contudo, não podemos
esquecer a caracterização dos tipos sociais, que Gil Vicente realiza de forma
magistral, através da fixação dos níveis apropriados de linguagem que os identificam,
de modo imediato, aos olhos do leitor.
De acordo com JUNIOR (2003, p. 11), "cada personagem falava de acordo com
sua condição social, como a fala pernóstica do Fidalgo ou a fala de um Parvo, ou a
estropiada dos judeus".14
Conforme afirma MIRANDA (2003, p.61):
A peça está embebida em uma concepção medievalizante. Daí que seja dada
atenção aos gestos cometidos na terra, porque deles depende a vida
posterior. Desse modo, a peça mostra que trágico é o destino do homem após
o pecado original, por estar sujeito à condenação eterna. 15
14
JUNIOR, Benjamim Abdala. Auto da Índia; Auto da Barca do Inferno; Farsa de Inês Pereira / Gil
Vicente; adaptação e notas por Benjamim Abdala Junior. – 2ª Ed. – São Paulo; Editora Senac,
2003.
15 MIRANDA, I. D. . Gil Vicente e o teatro medieval: a carnavalização em O Auto da Barca do
Todas estas questões são tratadas de maneira cômica na peça vicentina como
pode ser constatado por MIRANDA (2003, p.61):
Na peça de mestre Gil, embora o destino dos mortos já tenha sido previamente
definido, o Diabo age numa relação de aparente independência em relação a Cristo,
ou a seu representante, o Anjo.
Desse modo, as esferas divina e infernal tocam-se apenas por ocuparem o
mesmo espaço, já que não há nenhuma conversação entre o Anjo e o Diabo. Esse
nivela todos os personagens não só pelo tratamento irônico e familiar que lhes
concede, como por apontar em todos, indistintamente, os vícios, ambições, tirania,
desonestidade, entre outros.
Um tribunal estruturado sobre os mesmos valores terrenos acusa
impiedosamente cada um dos personagens. O perdão é concedido a poucos. Os
critérios do Diabo assemelham-se aos utilizados no exercício da justiça terrena,
parecendo ao mesmo tempo, reduplicar o processo da sátira ou da crítica aos
costumes.
Na peça, os personagens são condenados por serem falhos, pecadores,
incompletos e esperam sua completude depois de responderem pela sua existência
terrena. No auto, o simbolismo do fogo remete à ideia de sacrifício necessário à
regeneração:
1989.
20
Com base nesta afirmativa, podemos concluir que o perdão está presente de
forma simbólica no Auto da Barca do Inferno. Gil Vicente é contra o pecado, o desvio
de conduta e não, o pecador como afirma MIRANDA (2003, p.65):
No auto de Gil Vicente, há uma grande dose de sátira que atinge a todos,
grandes e pequenos. Não se limita a anotar esta ou aquela figura mais
saliente. Ao Fidalgo não se perdoa a tirania, aos pequenos dá-se o desprezo.
Acusa o desonesto, seja ele o sapateiro, o onzeneiro, o juiz, ou o corregedor.
Critica o clero, esquecido do verdadeiro sentido de sua missão, apontando-
lhe os desvios, como a luxúria, a soberba e a simonia.18
Teatro de sátira social, não perdoa qualquer classe, povo, fidalguia ou clero.
Obra de moralista, põe em prática o lema castigat ridendo mores (rindo,
corrige os costumes), realizando o princípio de que a graça e o riso,
provocados pelo cômico baseado no ridículo e na caricatura, exercem ação
purificadora, educativa e purgadora de vícios e defeitos.20
20
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. - 37. ed., rev. e atual. 1ª reimp. São Paulo: Cultrix 2013.
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BERNARDES, José Augusto Cardoso. Danças da Vida e da Morte nas Barcas de Gil Vicente.
Revista eHumanista, volume 1, 2001.
22
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JUNIOR, Benjamim Abdala. Auto da Índia; Auto da Barca do Inferno; Farsa de Inês Pereira / Gil
Vicente; adaptação e notas por Benjamim Abdala Junior. – 2ª Ed. – São Paulo; Editora Senac,
2003.
23
JUNIOR, Benjamim Abdala. Auto da Índia; Auto da Barca do Inferno; Farsa de Inês Pereira / Gil
Vicente; adaptação e notas por Benjamim Abdala Junior. – 2ª Ed. – São Paulo; Editora Senac,
2003.
23
argumentos irônicos e apenas aguarda o embarque das poucas almas puras, que no
final são escassas.
O Diabo ou o Arrais do Inferno é aquele que detém mais falas, tem voz ativa
durante toda a encenação e por seu caráter persuasivo, faz que o embarque a Barca
do Inferno, pareça uma viagem agradável. Para convencer as personagens, acusa-as
pelos seus erros quando em vida, conscientizando-as dos mesmos. Mostra-se
extremamente sarcástico, dominador e tem muita pressa pela viagem, uma vez que
sabe que a barca irá cheia. Usa o canto para seduzir as almas no embarque.
O Companheiro do Diabo é analisado como servo do Arrais do Inferno, que
apenas concorda com o seu mestre, sem voz ativa. Este é Caronte, da mitologia
grega, que é encarregado de fazer a travessia das almas rumo ao seu destino.
De acordo com RIOS (2008, p.10):
A passagem dessas almas a um dos dois mundos é feita por meio de barcas,
que lembram ao leitor o barqueiro Caronte e o rio Aqueronte da mitologia
clássica, elementos pagãos que se encontram pari passu 24 com os valores
cristãos. Esse sincretismo entre o paganismo e o cristianismo reforça, mais
uma vez, o caráter transitivo da obra de Gil Vicente, que tem bases sólidas
no medievo e um pé no renascimento, tal qual Janus dividido entre o passado
e o futuro.25
com o Arrais do Céu, embora antes tenha rejeitado o Diabo com muita coragem e
desenvoltura.
Ao entrar na Barca, o condutor pede que aguarde se haverá outros a irem para
o Paraíso na seguinte viagem. Joanes, o parvo, não tem consciência de seus atos e
por esse motivo é considerado puro.
O Sapateiro representa o comércio e chega trazendo consigo, o avental e as
formas do seu ofício. Ele vivia de aparências, enganava as pessoas cobrando sempre
a mais pelo serviço prestado, um verdadeiro ladrão. Por morrer confessado, acreditou
que embarcaria rumo ao Céu, entretanto, o Anjo disse-lhe que para os que roubam, o
desígnio é a maldição. A crítica de Gil Vicente neste ponto está ligada à sua defesa
pelo Cristianismo, mas a forma errônea pela qual a doutrina era estipulada pela Igreja.
O Frade representa a Igreja e vem trazendo uma jovem, de nome Florença, e
uma espada. Vem cantando e dançando, o que mostra sua acomodação frente à
situação a qual aparece seu destino final. Pelo ofício, o de frade, achava-se digno do
Paraíso, mesmo que a companheira feminina fosse a representação de seu maior
delito.
A Alcoviteira traz consigo muitos objetos dos quais fazia uso quando em vida,
inclusive virgos postiços (hímens), com os quais inventava que as moças que oferecia
eram virgens, arrumando assim bons casamentos e ganhando com isso. Na tentativa
de embarcar na Barca do Anjo, Brígida Vaz utilizou alguns dos melhores argumentos
da obra, invocando Santa Úrsula para que o anjo se compadecesse de sua alma.
Queria relacionar o que havia feito com o bem que proporcionara aos usuários de
seus serviços, no entanto, esquecia que enganar o outro também era um pecado fatal.
A personagem do Judeu é claramente apegada ao dinheiro. Sua marca é um
bode, o qual ele carrega as costas. Quando chega à Barca do Inferno já oferece
dinheiro para que o Diabo lhe embarque, o que demonstra de fato que os judeus não
eram bem vistos naquela época e possivelmente eram perseguidos por seus
costumes religiosos, assim como o fato de o próprio autor não saber como lidar com
a figura do judeu dentro de uma sociedade Cristã.
O Corregedor representa a Justiça e traz como marca uma vara na mão e os
processos judiciais. Ao encaminhar-se para falar com o Diabo, utiliza como forma de
persuasão uma linguagem profissional, para mostrar sua importância como juiz. O fato
é de que também o Corregedor traz com bagagem a mais, o pecado da corrupção e
venda de sentenças e não há argumento que o faça embarcar com o Arrais do Céu.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
JUNIOR, Benjamim Abdala. Auto da Índia; Auto da Barca do Inferno; Farsa de Inês
Pereira / Gil Vicente; adaptação e notas por Benjamim Abdala Junior. – 2ª Ed. –
São Paulo; Editora Senac, 2003.
MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa. - 37. ed., rev. e atual. 1ª reimp. São
Paulo: Cultrix 2013.