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INSTITUTO DE FILOSOFIA PADRE EUGÊNIO INVERARDI

SEMINÁRIO DIOCESANO NOSSA SENHORA DO DESTERRO


Sem. Gustavo Alexandre da Cruz

Profº Dr. Daner Hornich

Trabalho da disciplina de História da Filosofia


Medieval do curso do primeiro ano de Filosofia –
Instituto Padre Eugênio Inverardi: resenha sobre o
livro O Deus da Idade Média, de Jean Jacques
Legoff.

No livro em questão, no primeiro capítulo, o autor vai relatar sobre de qual Deus se
trata dentro do período da Idade Média. Esse Deus é o Deus dos cristãos. Nesse período, que
Legoff opta por chamar de antiguidade tardia, o Deus trinitário dos cristãos será o único da era
do império romano. O crescimento do cristianismo e a consequente adesão a ele se davam a
partir da concepção salvacionista que esse Deus transmitia. Essa salvação, a princípio, era
apenas terrestre e de cunho político. Todavia, com base na natureza da religião cristã, ela passa
a ser naturalmente religiosa. Dentro dessa dinâmica, no século IV, houve uma alteração na visão
sobre o cristianismo; antes era a religião perseguida e passou a ser a do Estado; Deus passava de
um deus recusado ao Deus oficial.
De acordo com essa perspectiva da passagem de um Deus para outro, houve, na
Europa ocidental, uma grande adesão por parte de muitos homens e mulheres à troca do culto a
diversos deuses, por apenas um único. Havia uma disposição greco-romana para o culto a
diferentes deuses. A doutrina era pautada na ideia de que em uma pessoa, diferentes deuses
existiam. Chega então o cristianismo, e o processo de passagem para o monoteísmo se inicia.
Uma simbologia que demarca a diferença entre esse deus constituído por vários em uma só
pessoa, e o Deus dos cristãos, estava na escrita. O primeiro era posto com o d minúsculo; já o
segundo, com o D maiúsculo.
No parágrafo dez desse primeiro capítulo, Jean relata um processo de
desenvolvimento da adesão ao Deus cristão e mostra-nos uma crítica feita por alguns hereges no
século XI. A tomada da topografia, ou seja, de terrenos estruturados na era da Idade Média,
concedeu mais amplitude ao Deus dos cristãos. Foram construídas e estruturadas novas ordens
religiosas, promoveram-se peregrinações, e estradas foram constituídas. A crítica foi pautada
ante o costume da Igreja em manter o culto e as honras a Deus apenas nos templos, ao passo que
para eles, Deus estava presente em todos os lugares, por ser Ele onipresente e onisciente. Para
embasarem sua contestação, diziam que o melhor lugar para a oração é o nosso próprio coração,
por ser ela um instrumento primordial de culto.
Ainda dentro dessa perspectiva da onipresença de Deus, Legoff aponta no
parágrafo quatorze uma crítica feita ao clero e aos leigos cristãos da Idade Média. O clero era
suspeito de reduzir a possibilidade de se orar apenas no templo. O povo, por sua vez, recebia um
olhar de “primitismo” e de rudez, pois venerava os santos pelas suas relíquias. O aumento do
número dos lugares de culto, dos templos, também era criticado, pois se dava pela verificação e
supervisão do clero. Contudo, um argumento válido usado pelos que contestavam essa dinâmica
da necessidade de estar dentro do templo, junto à imagem ou túmulo de um santo para que se
pudesse bem rezar, era a presença do anjo da guarda. O fato de um anjo da guarda estar sempre
junto a cada um, enviado por Deus, mostrava a presença Dele. Logo, existia a presença de Deus
também fora do templo.
No parágrafo dezesseis o autor começa a tratar das heresias que nasceram contra o
Deus dos cristãos. Percebe-se então que elas nascem a partir da noção do dogma da trindade;
um Deus uno e trino; um Deus em três pessoas. Um primeiro relato é sobre as duas naturezas de
Cristo. Segundo a doutrina da Igreja, devido à encarnação, Jesus possuía a natureza humana e
divina. Porém, um sacerdote alexandrino chamado Ário, criou uma teoria na qual Cristo possuía
apenas a natureza humana. Essa noção herética repercutiu muito no ocidente e provocou
perturbações nos séculos VI e VII. Uma outra heresia foi a promovida por um outro sacerdote
chamado Nestório, que dizia consistir ela na separação da natureza humana e divina de Jesus.
Essa, por sua vez, repercutiu também no ocidente e na Ásia. Apesar das inquietações trazidas
por essas heresias, o Deus do Ocidente medieval não foi abalado em profundidade.
Nos parágrafos dezenove e vinte o autor traz a noção desse Deus trino, dizendo que
para os cristãos, inclusive a parte do clero, Ele se apresentava em três pessoas diferentes, mas
não existia, entre as três pessoas, uma oposição que pudesse colocar em risco a unidade de
Deus. Porém, em meio ao cotidiano dos cristãos da Idade Média, ora acontecia o trato com uma
das três pessoas, ora com outra. E para perceber e compreender essas diferenças entre as três
pessoas, a riqueza das imagens contribuía.
A princípio elas remetiam mais a Deus Pai, como sendo um homem idoso e
protetor; em sua maioria, retratavam apenas Suas mãos através das nuvens. Em seguida, nos
séculos XIII e XVI insurge mais o Filho; Jesus passa a ser não apenas o Deus dos homens, mas
o Deus que se fez homem. Uma figura marcante é a de São Francisco de Assis, o santo da
imitação desse Deus feito homem, Jesus Cristo. Mas ainda no séc. XIII, houve uma
harmonização no relacionamento com esse Deus trino, devido ao crescimento da confecção de
imagens que remetiam às três pessoas juntas. Algumas delas traziam o Pai carregando o Filho e
sobre eles uma pomba representando o Espírito Santo.
Entrando no segundo capítulo, o autor trabalha a figura da pessoa do Espírito Santo
e da Virgem Maria. Em relação à imagem do Espírito Santo, havia uma grande dificuldade de
pensar em Deus sob a forma de um pássaro. A fé e a piedade popular não davam adesão à
terceira pessoa da Trindade. Surge então, no século XIII, a partir dessa preocupação com o lugar
que o Espírito Santo ocupa na teologia, o tema dos sete dons do Espírito. Desse modo,
ganhando força e adesão, Ele adentra na vida social dos fiéis. De acordo com essa aceitação do
Espírito Santo, é inaugurada então uma nova forma de invocar a presença de Deus; seja em qual
fosse o lugar. No trabalho, em casa, dentro da circunstância de cada pessoa, invocava-se o Santo
Espírito para reger, conduzir e abençoar qual fosse o lugar ou a pessoa.
O tema do Espírito Santo foi causa de grande discussão entre clérigos e teólogos.
Dentro dos discursos religiosos e teológicos, a grande questão era verificar a relação entre os
dons e as virtudes. De modo mais específico, se os dons eram as fontes ou os efeitos das
virtudes. O autor então, cita a visão de Santo Agostinho em relação à ordem dos sete dons, dita
pelo profeta Isaías. Para o bispo de Hipona, o dom do temor toma o primeiro lugar, ao invés do
último. Uma outra diferença está na aquisição deles. Em Isaías é Deus quem os concede aos
homens; já em Agostinho é o homem quem os pede. A partir de Agostinho e no séc. XII, os
dons do Espírito Santo, o desenvolvimento do saber e a ciência se correlacionam. Há uma
democratização do saber, e o conhecimento passa a não ser mais apenas dos monges e clérigos.
O Espírito Santo torna-se o principal responsável pelo setor da ciência, e através também do
desenvolvimento da escolástica.
No parágrafo oito desse segundo capítulo, Legoff mostra a noção de São Tomás de
Aquino em relação aos dons e virtudes como uma solução. Ele vai dizer que as virtudes agem
de acordo com as faculdades humanas, enquanto os dons estão acima da natureza humana. Dito
de outra forma, é natural que o homem alcance algumas virtudes, porém, para alcançar os dons,
ele precisa contar com a graça.
Já no parágrafo nove, o autor nos mostra a ideia do monge cisterciense Gioacchino
Fiori, que estabelece uma nova dinâmica para falar de Deus à história. Ele fala da idade do Pai,
do Filho e do Espírito Santo, considerando que uma foi dando lugar a outra, nessa ordem. Sua
doutrina, embora progressista, muito ortodoxa e dando margem à heresia, foi a que alavancou o
Espírito Santo como motor divino da história.
Retomando a noção das imagens retratando a trindade, o século XII contribuiu em
boa parte para o fim da Idade Média. Nos anos entre 1200 e 1400, são encontrados alguns
ícones que representavam a trindade. Em geral elas mostravam Deus Pai sentado, com Deus
Filho Jesus, crucificado à frente e Deus Espírito Santo em diferentes posições, sempre em forma
de pomba. Mas este ícone não foi bem aceito, pois tinha uma conotação mais de um Deus em
duas pessoas do que um Deus trino. Visto que Jesus sempre aparecia como que no peito do Pai,
enquanto o Espírito estava separado. Os ícones que representavam mais a igualdade das três
pessoas divinas eram os triândricos.
Já no fim do século XIV e início do XV, duas novas possibilidades de imagens
foram construídas para explicar a trindade: nascem então a “trindade sofredora” e a “trindade
gloriosa”. A primeira demonstrava o Pai com compaixão. Consistia na imagem de Deus Pai
carregando o Filho nos braços, remetendo-se a José de Arimatéia na descida de Jesus da Cruz, e
depois a Virgem com Cristo em seus braços. Dentro dessa perspectiva, o Espírito Santo estava
em forma de pomba, fazendo a ligação entre o Pai e o Filho. A segunda, retrata a figura de
Maria sendo coroada não apenas por Jesus, mas agora também pelo Pai, tendo a imagem do
Espírito em forma de pomba sobre ela.
No parágrafo vinte e três, o autor faz uma relação entre os anjos e a devoção aos
santos, com ênfase na Virgem Maria. A partir da noção de um Deus misericordioso, bom e
protetor, entende-se que os anjos assumem essa missão de proteção com mais força; e
juntamente com os seres angélicos, ao lado de Deus, estão os santos. Mas essencialmente, a fim
de que os homens alcancem uma relação mais íntima com o Espírito Santo, a Santa Mãe de
Deus é quem age.
Chegando ao término do relato sobre a pessoa do Espírito Santo e da Virgem, para
reforçar o desenvolvimento do papel de ambos, o autor destaca todas as dificuldades, guerras,
perturbações de peste pelo que os séculos XI até o XIV passaram, fazendo uma comparação
com os problemas que vivemos hoje. Dessa forma ele destaca o porquê houve uma identificação
por parte dos homens e mulheres com o Deus sofredor; com o Cristo da paixão. Nesse entender,
nota-se o agir do Espírito e proteção da Virgem.
Por fim, mostrando os temores dos séculos XIV e XV, Legoff relata mais duas
imagens de Deus: um “Bom” Deus que é providência e um Deus da cólera, da punição. Devido
à peste da época, o entendimento era como se ela fosse um castigo de Deus devido ao pecado
dos homens. Essas duas imagens do Divino criador dividiram o governo dos homens e o
caminhar da história.

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