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18 - Guilhardi, J. H. (2006). Sobre Comportamento e Cognição (Vol. 18).


Expondo a Variabilidade

Chapter · January 2006

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5 8,246

6 authors, including:

Roberto Alves Banaco Daniel Carvalho de Matos


Paradigma - Centro de Ciências e Tecnologia do Comportamento Universidade Ceuma
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Estudo de processos verbais na Terapia Analítico-Comportamental View project

Capacitação de Estagiários de Psicologia para o Ensino de Habilidades em Crianças com TEA View project

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Sobre Comportamento
e Cognição
Expondo a variabilidade

• Hélio José Quilhardi


Noreen Campbell de Aguirre

ESETèc
Sobre
Comportamento e
Cognição
Associação Brasileira dc Psicotcrapia e
Medicina Comportamental

Diretoria gestão 04/05

Presidente: I Iclio José Quilhardi


Vice-presidente: Maria Martha da Costa i lübner
1asecretária: Patrícia Piaz/on Queiroz
2- secretária: Lilian R. Medeiros

1atesoureira: Marisa Isabel dos Santos dc Brilo


«“ tesoureira: latiana l.ussari

Ex-presidentes: Bernard Pimentel Ran#è


i lélio josc t/uilhardi
Roberto Alves Banaco
Rachel Rodrigues Kerbauy
Maria Zilah da Silva Brandão
Sobre
Comportamento
e Cognição
Expondo d Variabilidade

Volume 18

Organizado por I Iclio josc Quilhardi


Norccn Campbell dc Aguirrc

ESETec
Editores Associados
2006
Copyright O desta edição:
ESETec Editores Associados, Santo André, 2006.
Todos os direitos reservados

Gu/lhardi, Hélio José, et ai.

Sobre Comportamento e Cognição: Expondo a Variabilidade. - Org. Hélio


José Guilhardi, Noreen Campbell de Agulrre 1* ed. Santo André, SP: ESETec
Editores Associados, 2006. v. 18

450 p. 23cm

1. Psicologia do Comportamento e Cognição


2. Behavlorlsmo
3. Análise do Comportamento

CDD 155.2
CDU 159.9.019.4

ISBN-85-88303-74-6

ESETec Editores Associados

A liSHTcc agradece a Ana Curolin» (•'iicrlo* Kclicio peln enorme colaborado na


organi/avüo e preparação deste volume.

Solicitação de exemplares: comercial@esetec.com.br


Santo André-SP
Tel. (11) 4938 6866/ 4990 5683
www.esetec.com.br
Sumário
Modelo cognitivo-comportamental do transtorno do estresse pós-traumáti-
co e da culpa relacionada ao trauma.................................................. 11
Leticia Sant’Anna, Holono Shinohara
Medindo e promovendo a qualidade na interação familiar..................... 25
Lidia Natalia Dobrlanskyj Weber, Ana Paula Viezzer Salvador, Olivia Justen
Brandonburg
Qualidade de interação familiar: uma análise da percepção de adoles­
centes sobre os conflitos em suas famílias...........................................41
Lidia Natalia Dobrianskyj Weber, Josafá Moreira Cunha
Regras e auto-regras: um estudo sobre o comportamento de mulheres no
relacionamento amoroso......................................................................55
Maria Cecilia de Abreu e Silva, Lidia Natalia Dobrianskyj Weber
Variabilidade Comportamental e Adaptabilidade: da Pesquisa à Análise 71
Comportamental Clinica.............................................................................71
João Viconte de Sousa Marçal,Paula Carvalho Natalino
A análise do comportamento no trabalho psicopedagógico em grupo .... 86
Márcia da Rocha Pitta Ferraz
Transtornos de Ansiedade e sua relação com repertórios de leitura, escri­
ta e cálculo, numa abordagem multidisciplinar....................................92
Márcia da Rocha Pitta Ferraz, HildebertoTavares, Cátia da Rocha Pitta
Análise Quantitativa do Comportamento: Funções Matemáticas na Descri­
ção de Funções Comportamentais......................................................*100
Mareio Cruz, Gerson Yukio Tomanari
Comportamento social................................................................................124
Maria Amalia Pie Abib Andery, Tereza Maria de Azevedo Pires Sério
Prevenção primária de abuso sexual em ambiente escolar....................133
Maria da Graça Saldanha Padilha, Lúcia Cavalcanti de Albuquerque Williams
Algumas considerações sobre o conceito de tempo no behaviorismo
radical e na análise do comportamento............................................... 138
Maria de Jesus Dutra dos Reis
Estudo esperimental da depressão....................... .....................................149
Maria Helena Leite Hunziker
Comportamento Criativo e Análise do Comportamento I: variabilidade
comportamental.....................................................................................156
Maria Helena Leite Hunziker
interações verbais durante o treino de assertlvidade: Análise de Compor­
tamento Verbal referente a eventos privados....................................... 166
Maria Júlia Ferreira Xavier Ribeiro, Elvira Aparecida Simões de Araújo, Patrícia
Rivoli Rossi

5
A compreensão do paciente sobre a expectativa da terapia : relações
com a construção do contrato terapêutico...........................................174
Maria Júlia Ferreira Xavier Ribeiro
Variáveis significativas ao comportamento pró-ambiental...................... 180
Maria Julia Ferreira Xavier Riboiro, Ana Carla Barreto de Oliveira, Ana Beatriz Garcia
Costa Rodrigues
Relações entre comportamento verbal e não verbal: ilustrações a partir
de situações empíricas.......................................................................... 191
Maria Martha Costa Hübnor, Paola Espósito de Almeida, Pedro Bordini Faleiros
Intervenções preventivas no transtorno de estresse pós-traumático e sua
eficácia................................................................................................... 220
Felipe Corchs, Mariângola Gentil Savoia
O stress emocional: prevalência eimplicações.........................................229
Marilda Emmanuol Novaes Lipp
^•icoterapia no tratamento da Fibromialgia: Mesclando FAP e ACT.......238
Marilene de A. Martins, Luc Vandenberghe
Clinica Integrada - A Psicologia e a Fisioterapia em trabalho
interdisciplinar desaúde comunitária....................................................249
Marilza Mestre, Simone Murara, Rosana Portes, Janine Antonio, Adriana Paredes,
Ariana Mamcarz, Eduardo Andrade, Izabel Silva, Juliane Ulbrich, Mariana Monteiro,
Micheli Meira, Raphael Amaral, Rodrigo Ribeiro, Tânia Voss
Behaviorismo Sklnnerlano em Contraponto à Psicanálise e à Ciência
Cognitiva................................................................................................ 261
Rodrigo Cruvinel Salgado, Maura Alves Nunes Gongora
O Show de Truman - A escolha por um “ controle mais livre"1 .............280
Michela Rodriguos Ribeiro
Imobilidade no Teste do Nado Forçado: depressão ou estratégia de sobre­
vivência? .............................................................................................. 286
......................................................... Mônica Geraldi Valentim, Katsumasa Hoshino
Psicoterapia Comportamental: Análise de questões teóricas relevantes ao
desenvolvimento da tecnologia..........................................................292
Naione dos Santos Pimentel
Estresse Ocupacional................................................................................297
Nancy Julieta Inocente, Clara Odilia Inocente, Janine Julieta Inocente, Rubens
Reimâo
Formação de classes de estímulos equivalentes e as operações de soma e
subtração............................................................................................. 300
Rafaella Donini, Daniel Del Roy, Nilza Micheletto
O desenvolvimento sócio-emocional nos primeiros anos de vida e as
contingências em operação na interação pais-criança......................315
Patrícia Alvarenga
Imagem Corporal e Transtornos Alimentares..........................................325
Patrícia Guillon Riboiro, Eliane Padilha da Silva , Glauce Costa, Denise Cerqueira
Leite Holler

6
A prática do analista do comportamento: contribuições passadas e recentes para
a educação.......................................................................................................................... 331
Paulo André Barbosa Panotta, Maria Auxiliadora de Lima Wang, Lígia Valladares
Oda Kurokawa , Roberto Alves Banaco
Comportamento criativo & Análise do Comportamento I: Insight............. 345
Paulo Elias Gotardolo Delago, Marcus Bontos do Carvalho Neto
Urgôncia e emergência com crianças em UTI NEONATAL: Contingências
atuais e futuras. É possível uma intervenção?..................................... 352
Queila Piorro Fernandes, Diana Tosello Laloni
Controle e autocontrole, seu papel na cooperação social........................ 359
Rachel Rodrigues Kerbauy*
Registros esparsos de uma supervisora para terapeutas em formação:
intervenção sobre fatores de estresse na terapia..................................366
Regina Christina Wielenska
Proposta de práticas clinicas: um estudo exploratório.............................. 371
Roberto Alves Banaco, Luciana Roberta Donola Cardoso, Daniel Carvalho de
Matos, Mariana São Thiago Bezerra do Menezes, Mariana Ribeiro de Souza.Renata
Huallem Pasquinelli
Lista de Desempenhos: um possível primeiro passo para uma sistematiza­
ção do ensino da Análise do Comportamento na graduação...............382
Roosevelt R. Starling
Urgência e emergência com crianças em UTI Pediátrica: Contingências
de avaliação e intervenção.....................................................................401
Rosana Righetto Dias, Diana Tosello Lalon, Makilim Nunes Baptista
Uma história da História Comportamental................................................. 409
Carlos Renato Xavier Cançado, Paulo Guerra Soares, Sérgio Dias Cirino, André
Luiz Freitas Dias
Queixas......e queixas! Como focalizá-las na Terapia Comportamental 417
Sônia dos S. Castanheira
A relação entre comportamento alimentar, auto-imagem e personalidade:
que variáveis podem predispor uma pessoa aos transtornos alimenta­
res? .........................................................................................................431-
Talita Lopes Marques, Denise Corqueira Loito Heller
Avaliação de fontes de stress em pacientes esquizofrênicos: percepção de
familiares................................................................................................438
Thania Mello Gomes de Matos
Teoria do Conhecimento:Epistemologiae Behaviorismo RadicaM............447*
Tiago Alfredo da Silva Ferreira
Novas Diretrizes Curriculares,Metacontingências e o Plano K eller....... 456
João Claudio Todorov, Ricardo Corrôa Martone, Márcio Borgos Moreira
Comportamento criativo & análise do comportamento III: Comportamento
Verbal......................................................................................................465

7
Tony Nelson
A tomada de decisões nas intervenções psicoterápicas: da teoria à prática
472
Vera Regina Lignelll Otoro, Heloisa Helena Ferreira da Rosa
Psicologia do Desenvolvimento, Análise do Comportamento e a Clínica
Psicológica............................................................................................. 479
Yara Kuperstoin Ingberman, Roseli Hauer
Terapia familiar: um enfoque de vanguarda?........................................... 490
Vara Kuperstein Ingberman
intervenção de acompanhantes terapêuticos em caso de transtorno
bipolar e comportamentos evitativos no trabalho e perante outras
responsabilidades................................................................................. 496
Maria Zilah da Silva Brandão,Camila Carmo de Menezes, Fernanda Marques
Jacovozzi, Jóferson Simomura, Ligia Betencurt, Renata Cristina Alves da Rocha ,
Maria Gabriela Santana
Comportamento de esquiva nocontexto clinico........................................509
Maria Zilah da Silva Brandão,Camila Carmo de Menezes, Fernanda Marques
Jacovozzi, Jóferson Simomura, Ligia Bitencourt, Renata Cristina Alves da Rocha ,
Maria Gabriela Santana

8
Apresentação

Os capítulos que compõem os volumes 17 e 18 da coleção Sobre


Comportamento o Cognição oferecem uma amostra representativa dos trabalhos
apresentados no XIV Encontro Anual da ABPMC, realizado em Campinas em 2005. Os
artigos de pesquisa, de aplicação e de conceitos abrangem o que se tem produzido no
Brasil nas áreas de Análise do Comportamento e Cognitivo-comportamental. Pode-se
dizer que ambas mantêm preocupações e objetivos comuns, mas, com o passar dos
anos, se afastaram quanto aos pressupostos, metodologia e conceitos que as
caracterizam e as definem. Tal afastamento não constituí uma perda, mas um refinamento
de identidades. Há que se louvar a convivência harmoniosa de áreas teóricas,
procedimentos de ação profissional e metodologia de investigação que não se fundem,
mas coexistem como alternativas prósperas, consistentes e eficientes. Os estudiosos
de uma ou outra área encontrarão nos dois volumes textos inovadores, didáticos e
desafiadores para aprofundar e consolidar conhecimentos, que aumentam de
abrangência e se atualizam anualmente, escritos pelos mais lídimos representantes
da área.
As maneiras de abordar o comportamento humano têm se justaposto, expondo
aspectos que se superpõem, ao lado de outros que se diferenciam. O conjunto não é
um todo homogêneo. O produto compõe, como metáfora, um grande painel, em cuja
composição foram usadas diferentes técnicas de expressão, aplicadas por diferentes
artistas. Não é correto falar em comportamentalismo (no singular); mas em
comportamentalismos. Acrescentar aos comportamentalismos adjetivos para identificá-
los produz um resultado peculiar. Os adjetivos não se limitam a justificá-los; mudam-
lhes a essência.
A presente Introdução ó um alerta. Cada capítulo ó um produto em si. Tal ó uma
maneira de estudá-los: ficar sob controle de cada texto. Por outro lado, o conjunto de
capítulos revela processos diferenciados no desenvolvimento de vínculo com os
behaviorismos. Tais processos vêm se explicitando e se personalizando através dos
anos. Tal ó uma outra maneira de ler os textos: organizá-los em sistemas, conforme
vêm sendo selecionados pela comunidade que responde a eles.

Hélio José Guilhardi


Noreen Campbell de Aguirre

Sobre Comportamento e Cofiniçflo 9


Capítulo 1
Modelo cognitivo-comportamental do
transtorno do estresse pós-
traumático e da culpa
relacionada ao trauma
Lelicid S anfA nna
I lelencShinohara
PUC-RJ

O Transtorno de Estresse Pós-traumático


De acordo com Kaplan e Sadock (1984), o Transtorno de Estresse Pós-Traumático
(TEPT) é uma psicopatologia que se desenvolve como resposta a um estressor traumático
externo de significado emocional suficiente para desencadear eventos psicológicos e
neurobiológicos relacionados. O transtorno consiste em um tipo de revivência, onde há
uma recorrência do sofrimento original sentido durante o trauma. Esta ó a definição recente
do TEPT, a qual foi sendo elaborada ao longo do último século, junto com novas
classificações, critérios diagnósticos e características.
Segundo Rangé e Masci (2001), podemos rastrear as conseqüências do trauma
desde o inicio da humanidade, sejam estas causadas por guerras, violência ou
acidentes. O estresse pós-traumático sempre existiu, mas só recentemente foi
considerado um transtorno psíquico.
De acordo com Caminha (2004), existem registros deste transtorno desde o século
XIX, quando o médico alemão Eulenberger introduziu o conceito de trauma psíquico. Já
Margis e Kapczinski (2004) apontam para descrições feitas por Kraepelin em 1896 como
sintomas ansiosos que surgem em situações como incêndios, acidentes, catástrofes etc.
Outros relatos sobre o transtorno também foram feitos por diversos autores
durante guerras. Da Costa, um módico que trabalhou durante a Guerra Civil Americana,
fala de uma slndrome do coração irritável, que já mostrava sintomas característicos do
TEPT. Mais tarde esta mesma slndrome foi apresentada como "neurose de guerra".
Freud observou durante a Primeira Guerra Mundial que veteranos de guerra traumatizados
experimentavam a revivência do evento traumático e também a negação do mesmo.
Apenas mais tarde ela foi observada na população civil, fora do contexto da guerra. Em
1941, após um incêndio ocorrido em uma boate em Boston, pessoas relataram
nervosismo, fadiga e pesadelos recorrentes. Segundo Garcia (2004, citado em Pereira,
2004), outros relatos semelhantes a este corroboraram para que estes sintomas não
fossem apenas relacionados à guerra, mas a um fator estressante grave.

Sobre Comportamento c CognlçJo 11


Apesar de todas essas descrições do transtorno, apenas em 1980 ele foi
apresentado no DSM-III e definido como “desenvolvimento de sintomas característicos
após a experienciação de um acontecimento psicologicamente traumático, ou de
acontecimentos situados fora do campo da experiência humana habitualmente
considerada normal" (p.38). Mas foi no DSM-IV que se retirou a exigência de que o
evento estivesse fora do campo da experiência humana habitual, acrescentado-se que
a resposta da pessoa envolvesse sentimentos de medo intenso, impotência e horror.
Foi também no DSM-IV que o Transtorno de Estresse Agudo foi acrescentado, no qual a
pessoa desenvolveria os sintomas do estresse pós-traumático, mas por um curto espaço
de tempo (até quatro semanas após o evento).
Caminha (2004) diz que "o grande probJema que ocorre na formação do TEPT
é que a pessoa não consegue controlar ou interferir no curso do evento traumático"
(p.268). Durante o evento a pessoa pode perder o controle fisico e psicológico da situação,
apresentando níveis enormes de ansiedade, alterando os padrões normais da
neuroqulmica e, conseqüentemente, das cognições, dos afetos e dos comportamentos,
manifestando-se fora do nlvel controlável e suportável pelo sujeito. Kolk e Mcfarlane
(1996) falam de uma subjugação da vitima a uma realidade inacreditável, na qual é
provocada um grande estresse, e este gera desconforto e sofrimento.
Independente do trauma sofrido, as pessoas que apresentam o TEPT sofrem
conseqüências que interferem no seu funcionamento normal, seja afetando a saúde
física ou mental, o trabalho ou seus relacionamentos, e até muitas vezes adquirindo
outros transtornos. Segundo Silva (2000), existem estudos de crianças que apresentaram
o transtorno devido a abuso sexual e que, mais tarde na adolescência, apresentaram
bulimia ou anorexia.
Obviamente, não são todas as pessoas que passam por um evento traumático
que desenvolvem o TEPT, algumas pessoas apresentam alguns sintomas do transtorno
durante um curto período de tempo, mas à medida que este tempo se alonga e que os
sintomas persistem ou se agravam, poderemos estar diante de um quadro de
Transtorno de Estresse Pós-Traumático.
Segundo o DSM-IV (1993), para ser diagnosticado o Transtorno de Estresse
Pós-traumático, a pessoa tem que ter sido exposta a um evento traumático, no qual esta
vivenciou, testemunhou ou foi confrontada com um ou mais eventos que envolveram
morte ou grave ferimento, sendo estes reais ou ameaçadores, ou mesmo confrontada
com um evento que tenha apresentado ameaça à integridade física própria ou a de
outros. Além disso, a pessoa deve ter apresentado uma resposta que envolvesse medo
intenso, Impotência ou horror.
Este evento traumático também precisa ser revivido com freqüência, seja através
de recordações aflitivas, sonhos, flashbacks díssocíatívos, sensação de que o evento
esteja ocorrendo novamente, ou por sofrimento psicológico ao ser exposto a situações
ou Indícios que sejam diretamente ou indiretamente associados ao evento traumático,
ou reatlvldade fisiológica a estas mesmas situações ou indícios.
Outro critério é a esquiva persistente de estímulos associados ao trauma e
entorpecimento da responsividade geral. Este critério pode ser identificado pelos
seguintes quesitos, sendo que três ou mais devem estar presentes: esforços para
evitar pensamentos, sentimentos ou conversas relacionadas ao trauma, assim como
evitação de lugares, pessoas ou atividades; incapacidade de se recordar de aspectos
importantes relacionados ao trauma; sensação de distanciamento ou afastamento em
relação a outras pessoas, estreitamento da afetividade e sentimento de futuro abreviado.

1 2 L rtid d Sdnt'A nnd, í ic lcn f Shinohard


É necessário que sejam encontrados dois ou mais sintomas do excitabilidade
que não estavam presente antes do trauma. Estes sintomas podem ser insônia,
irritabilidade ou surtos de raiva, falta de concentração, hipervigilância, e resposta de
sobressalto exagerada.
Todos estes sintomas acima tôm que ter uma duração acima de um mês, o ó
necessário que haja um sofrimento significativo, e prejuízo no funcionamento normal da
pessoa, seja na área social, no trabalho, ou em qualquer outra área que seja importanto
para o indivíduo.
De acordo com Rangó e Masci (2001), tanto o aparecimento quanto o curso do
transtorno de estresse pós-traumático pode variar de acordo com as exporiôncias vividas,
histórico do outros transtornos mentais, ocorrência do transtorno na família e variáveis
de personalidade, mas é importante deixar claro que pode ocorrer em pessoas que não
possuam qualquer predisposição, dependendo de quão forte foi o trauma vivido.
Normalmente os primeiros sinais de estresse pós*traumático ocorrem em ató três
meses, mas existem casos em que há um intervalo assintomático de meses ou ató
anos. O transtorno pode aparecer em pessoas de qualquer idade.
Caminha (2004) comenta um estudo recente feito na população norte-americana
que demonstra que o estresse pós-traumático é o quarto transtorno mais comum e
atinge em módia 10,3% dos homens o 18,3% das mulheres ao longo de sua vida. Outro
estudo sugere que grande parte das pessoas vive algum tipo de evento traumático em
sua vida e cerca de 25% destas irão desenvolver o transtorno.
Já Rangó e Masci (2001) apresentam um estudo feito na população geral
mostrando que o TEPT varia entre 1,3 a 9% da população e, em paciontes psiquiátricos,
este número aumenta para 15%, portanto podemos ver variações de acordo com a
população examinada. Em populações de risco, a incidência do transtorno pode variar
de 3% ao surpreendente número de 58%.
Segundo Margis e Kapczinski (2004), o impacto que a pessoa terá irá variar de
acordo com o trauma vivido, então para se entender as conseqüências é necessário
examinar os diferentes grupos de vitimas do transtorno. Pessoas que foram vítimas do
seqüestro estão muito mais propensas a desenvolverem o transtorno do que pessoas
que sofreram agressões físicas, por exemplo.
Calhoun e Resick (1999) apresentam um estudo feito por Kilpatrick, Edmunds
e Seymour em 1992 em mulheres vitimas de estupro. Neste ostudo a incidência do
transtorno chega a 31%. Outros estudos apresentaram taxas mais elevadas, como
94% das mulheres apresentaram sinais de TEPT nas primeiras duas semanas e
aproximadamente 50% em 12 semanas. Contudo, tomos quo considerar que
aproximadamente 13% das mulheres foram vítimas do estupro, sendo que destas,
39% foram estupradas mais de uma vez, podendo variar entre estes dois grupos do
mulheres o índice do TEPT.
O terrorismo tem contribuído para que o número do estudos sobre o transtorno
de estresse pós-traumático aumente. Ballone (2002) chega ao número de 54% em um
estudo feito por Weisaeth em 1987 em vítimas de atentado e de torturas. De acordo com
este autor os números têm aumentado significadamente nos últimos anos com a maior
incidência de atentados, como o do World Trade Center, e outras ameaças, como o
bioterrorismo.
O autor ainda apresenta outras pesquisas mostrando o índice do estresse pós-
traumático de acordo com seu estímulo estressante. O seqüestro (Torr, 1981) possui a
prevalência de aproximadamente 99%, a agressão física (Reinherz, 1993) do 25%, os furacões

Sobre Comportamento e CognlçAo 13


(Shaw, 1996) de 70%, os terremotos (Najarian, 1996) de 32%, os incêndios (March, 1997) de
12%, a guerra (Sack, 1999) de 50% e a violência doméstica (McCIoskey, 2000), de 24%.
É importante observar que, de acordo com Rangó o Masci (2001), podemos
observar o curso crônico do Transtorno de Estresso Pós-Traumático, já que 50% das
possoas com TEPT apresentam remissão ospontânoa nos primoiros dois anos, mas
o restanto podo apresentar sintomas por 15 anos ou mais.
Entre os transtornos psiquiátricos, encontramos uma grande co-morbidade com
a doprossão, pânico, ansiedade social e com o abuso de substâncias. Ainda é muito
importante destacar os custos sociais de pessoas com esse transtorno, já que elas
estão muito propensas a ter dificuldade no trabalho, na escola o nos relacionamentos.
Helzer, Robins & McEvoy (1987, citado por Rangó e Masci, 2001) encontram
uma co-morbidade em 80% do pessoas diagnosticadas com TEPT. As pessoas com o
transtorno apresontam duas vezes mais risco de ter outro transtorno mental. Kessler
(1995, citado por Rangó o Masci, 2001) em outra pesquisa encontrou prevalência co-
mórbida de pelo menos um outro transtorno em 88,3% dos homens e 79% das mulheres.
Segundo Ballone (2002), a depressão se destaca como umas das maiores co-
morbidades do TEPT. Ambos os transtornos apresentam algumas características
semelhantes. O estresse pós-traumático gera angústia e sofrimonto psicológico intenso,
que conseqüentemente podem causar isolamonto social, problemas no trabalho e
deterioração da qualidado de vida o, então, a depressão. Pessoas com TEPT geralmente
apresentam sintomas de desinteresse, visão negativa o pessimista do futuro, apatia
afetiva, que são sintomas muito similares ao da depressão.
Ainda de acordo com o autor, podemos observar que o estresse pós-traumático
sensibiliza a vitima, a isola, baixa sua resistência, tornando-a mais propensa à
depressão. Assim como o contrário também pode ocorrer, já que pessoas deprimidas
estão mais vulneráveis a serem traumatizadas.
Ballone ainda destaca que alguns sintomas como o sentimento de estar
permanentemente em perigo ou ameaçado, que ó encontrado em aproximadamente 77
% dos paciontes de TEPT, podo vir a causar ataques de pânico, assim como ansiedade
social. É comum ver pessoas que foram vítimas de bombas, incêndios, assaltos violentos,
apresontarem um grando medo de sair de casa, freqüentar lugares públicos ou similares.
Yehuda e McFarlane (1995, citado por Rangó e Masci, 2001) destacam que a
maior razão para que o transtorno de estresse pós-traumático aprosente uma co-
morbidado tão grande é sua evolução crônica, de duração maior que dois anos, que
facilita a ocorrência de transtornos secundários ao TEPT.

O Modelo Cognitivo
A teoria cognitiva é baseada na idéia que nossos sentimentos têm, em parto,
grando relação com as avaliações que fazemos dos eventos a nossa volta, podendo estes
serem interpretados de diversas maneiras. Vários acontecimentos podem gerar emoções
negativas, mas poucas vezes há reações oxageradas que nos conduzem a um funcionamento
emocional inadequado. No caso do TEPT, as pessoas teriam seus pensamentos
dominados pela idéia do porigo o culpa, intorpretando acontecimontos, antoriormonte tidos
como inofensivos o aleatórios, como ameaçadores e auto-reforenciados.
De acordo com Caminha (2004), aparece na metade dos anos 70 um modelo
cognitivo criado por Horowitz para explicar a formação das respostas automáticas em
pacientos com TEPT. Segundo ele, o sujeito se torna incapaz de processar as informações

14 I eliii.i S«int'Ami.i, f Idene Sliinokir.i


adequadamente, gerando assim respostas de ansiedade e esquiva Horowitz aponta os
sintomas de revivência e os sintomas de esquiva e diminuição de responsividade como
fundamentais para a formação dos sintomas encontrados em um paciente com TEPT.
Calhoun e Resick (1999) também fazem referência ao modelo do Horowitz. Os
autores explicam que para havor um ajustamento ao evonto traumático ó necessária a
incorporação destes aos esquemas cognitivos já existentes, ou que se desenvolvam
novos esquemas. Para que isso aconteça, a memória do evento traumático ó repetida
várias vezes, na tontativa de processá-lo ou integrá-lo, resultando em flashbacks. Mas
quando isto ocorre de maneira descontrolada, ocorre a retraumatização. Isto pode gerar
respostas de esquiva e fuga, e estas podem impedir que haja o processamento cognitivo
completo do evento traumático.
Outras teorias surgiram para explicar o TEPT. Rachman (1980, citado por
Rangé e Masci) fala do processamento omocional, enfatizando “a possível existência
de processos subjacentes á diminuição da intensidade do uma experiência emocional,
pois, quando estes processos normais ficam prejudicados, surge a psicopatologia”
(p.261). Assim, a persistência de obsessões, pesadelos o fobia seria um sinal do que
este processarnonto não fora feito corretamente.
Foa e Kozak (1986) também explicam o transtorno através desta teoria de
processamento emocional. Usando o conceito de "medo”, os autores tentam explicar a
diferença de como um acontecimento traumático é representado na memória de uma
vítima que adquire o TEPT e em outra que não. Para a maioria das pessoas o medo real
ocorre quando elas estão frente a um estimulo ameaçador e desaparece quando este
estímulo não está mais presente. Mas esse medo pode tornar-se patológico a partir do
momonto que se torna destrutivamente intenso. A estrutura inclui elementos irrealistas,
as associações entre estímulos não-perigosos e respostas de fuga o ovitação também
estão presentes e vários tipos de erros de avaliação ou de interpretação acontecem.
Segundo Rangé o Masci (2001), pessoas com TEPT apresentam memórias
de medo contondo avaliações e associações erradas, onde frente à intensa manifestação
de ansiedade estímulos neutros (EN) passam a ser estímulos condicionados (EC),
capazes de gerar respostas condicionadas (RC) de ansiedade. Em um modelo normal,
as respostas condicionadas seriam extintas após um corto tempo, caso não houvesse
outra exposição ao evento traumático, mas em pessoas com TEPT, ocorre o não-
processamento da experiência traumática pela evitação de lembranças o reações
afetivas decorrentes do trauma, permanecendo assim as respostas de ansiedade. A
pessoa não consegue mais separar situações ameaçadoras de outras situações.
Outros modelos cognitivos foram descritos por diversos autores, mas todos
semelhantes aos descritos acima. O não-procossamento da experiência traumática, o
que Caminha (2004) chama de “digestão mental", é que faz com que a memória
traumática fique em destaque e seja revivida em flashbacks, sendo reforçada polas
respostas do fuga e esquiva.
Segundo Kolk e Mcfarlane (1996), indivíduos que agem sob uma situação
oxtremamente estressante dosenvolvem internamente uma alteração nos hormônios,
uma grande secreção neuro-hormonal que afeta a consolidação da memória. Por causa
da "força hormonal" ocorrida durante o trauma, quando a vítima so encontra em um
ostado de excitação semolhante, seu acesso se toma fácil.
Ainda de acordo com os autores, foram feitos estudos gráficos em cérebros de
pacientes com TEPT, que mostraram grande envolvimento do sistema límbico. Então
realizou-se divorsas pesquisas e chogou-se a duas importantes conclusões: pessoas

Sobre l'omport«imenlo e t ofinlçilo 15


quo passam por um trauma sofrem diminuição do volume do hipocampo; e existe uma
ativação excessiva da amígdala e estruturas relacionadas a ela, lateralização anormal e
aumento da área e da atividade da Broca quando o indivíduo reexperimenta o trauma.
Depois de outras pesquisas a conclusão mais significativa foi a comprovada diminuição
do hipocampo em pessoas traumatizadas.
Rangó e Masci (2001) falam ainda de mudanças no funcionamento
neuroadrenórgico e serotoninórgico, no eixo hipotálamo-pituitário-adrenal e no sistema
dopominórgico/opióide endógeno, que provocam mudanças de longo termo no córebro.
Kolb (1987, citado por Figueiredo, 2004) tambóm mostra uma importante mudança
causada pela estimulação excessiva que ocorre durante o trauma, que são os danos e
alteraçõos das rotas neurais.
Outro importante ponto colocado pelo autor é que, durante a ativação do trauma
(lombrança), a pessoa é capaz de sentir, ver ou ouvir elementos traumáticos, mas ao mosmo
tempo pode ser incapaz de comunicar o que está acontecendo. Durante osta revivência, a
pessoa podo sofrer um grande terror e não ser capaz de comunicá-lo por linguagem verbal.
Desta maneira, Kolk e Mcfarlane (1996) concluíram que a rosposta ao trauma
"ó extremamente complexa e pode incluir hipermnésia, hiper-roatividade a estímulos o
experiências traumáticas, que coexistem com entorpecimento psíquico, evitação,
amnósia e anedonia” (p.258).

Avaliação e tratamento
Os dois objetivos principais da avaliação são o diagnóstico e o planejamento
terapêutico. A Entrevista Clinica Estruturada para Transtornos de Ansiedade IV (ADIS-IV)
é melhor instrumento para o diagnóstico, e também para identificar as co-morbídades
ligadas ao transtorno. Para medir o impacto da experiência traumática ó indicada a
escala do Impacto de Evontos de Horowitz, Wilnes e Alvarez feita em 1979.
Outros instrumentos tambóm são amplamente utilizados para o diagnóstico,
Calhoun e Resick (1999) destacam a Escala Clínica Administrada ao TEPT (Blake, 1990), a
Entrevista Diagnostica Planejada (Robbins, Helzer, Crougham o Ratcliff, 1981) e a Entrevista
Planejada para Transtornos de Ansiedade (Di Nardo e Barlow, 1988). Em termos de
instrumentos psicométricos além da Escala do Impacto de Eventos, oles destacam a Lista
do Sintomas 90-R (Derogatis, 1977), a Escala para o TEPT Relacionado ao Crime SLC-90-
R (Saundersa, Mandoki e Kilpatrick, 1990), o Teste de Sintomas Rosultantes de Estupro
(Kílpatríck, 1988) e a Escala de Sintomas do TEPT (Foa, Ríggs, Dancu e Rothbaum, 1991).
De acordo com Margis e Kapczinski (2004) o tratamento do TEPT objetiva reduzir
sintomas, melhorar a qualidade de vida, aumentar a capacidade de lidar com o estresse
e diminuir a co-morbidade. Já Rangó e Masci (2001) e Calhoun e Resick (1999) colocam
como principal finalidado do tratamento a recuperação do senso pessoal de controle e
estabilidade, movendo o paciente do papel de dominado e controlado para o de detentor
pleno de suas capacidades.
Segundo Blako (1993), o tratamento do TEPT começa apenas depois que a
pessoa já foi removida da situação de crise. Se um sobrevivonte ainda está sendo
exposto ao trauma, está severamonte deprimido ou suicida, está experimentando pânico
e pensamento desorganizado, ou está precisando de desintoxicação de álcool ou drogas,
ó importante que se dê atenção a esses problemas na primoira fase do tratamento.
Vários tipos de tratamentos são sugeridos por diversos autores, o variam de
acordo com a intensidade e o tipo de transtorno:

'1 6 l c tld .1 S a n fA m n i, I lelcnc Sltinoh.ir<t


• Farmacológicos
a) Inibidores Seletivos da Recaptação de Seretonina (ISRS)
Martenyi, Brown, Zhang, Koke, Prakash (2002, citados por Margis e Kapczinski,
2004) fizeram uma pesquisa com um dos ISRSs, a Fluoxetina, e viram que os pacientes
que a receberam eram menos perturbados pelos eventos estressantes do dia-a-dia.
Outros ISRS também sâo usados, como a paroxetina e a setralina, que também
mostraram melhora em pacientes.
Já Rangé e Masci (2001) não recomendam os ISRS nas fases agudas do
transtorno, mas concordam na sua grande utilidade nos sintomas peculiares do TEPT
e em suas co-morbidades como a depressão, o pânico e a ansiedade social.
b) Benzodiazepínicos
Uma pesquisa de Braun (1990, citado por Margis e Kapczinski, 2004) mostrou
que os benzodiazepínicos são ineficazes no tratamento do TEPT, sugerindo até que
pacientes que utilizaram esse tratamento apresentaram uma piora. Rangó e Masci
(2001) apontam que os benzodiazepínicos podem interromper a hiperatividade
autonômica e evitar flashbacks e pesadelos, sendo muito úteis na fase inicial do
tratamento, mas não nas fases mais tardias.
Para Bemik, Laranjeiras e Corrogiarl (2003), os benzodiazepínicos são comumente
utilizados na clinica como adjuvantes, mas devem ser usados com muito cuidado em pacientes
com TEPT, especialmente naqueles que apresentarem pouco controle de impulsos.
c) Antidepressivos Triclclicos
Em um estudo feito em veteranos de guerra por Frank, Kosten Giller, Dan (1988,
citados por Margis e Kapczinski, 2004) foi mostrado que, para pacientes com baixos níveis
de depressão, ansiedade, sintomas somáticos e pensamentos de culpa, os tricíclicos
apresentavam uma boa resposta, principalmente com a amitriptilina e com a imipramina.
d) Anticonvulsivantes
Segundo Clark, Canive, Calais, Qualls, Tuason (1999, citados por Margis e Kapczinski,
2004), a carbamazepina e o ácido valpróico podem ser úteis na presença de impulsividade ou
agressividade, havendo diminuição dos sintomas de intrusão de pensamentos e
hiperexcitabilidade. Como uma terapia adjuvante o uso do ácido valpróico ajuda a melhorar
sintomas como recordações aflitivas, flashbacks, reatividade fisiológica, entre outros.
De acordo com Margis e Kapczinski (2004), outras substâncias também já
foram testadas, mas a taxa de resposta não teve nenhuma diferença significativa entre
os grupos que tomaram o medicamento e os que tomaram placebo.

• Psicoterapia
a) Exposição Prolongada
Margis e Kapczinski (2004) explicam a terapia de exposição de acordo com o
modelo de aprendizagem, onde qualquer estimulo associado ao evento traumático pode
criar uma resposta semelhante á do trauma original. Essa terapia consiste em diferentes
formas de ajudar o paciente a enfrentar situações, memórias e imagens temidas. Com a
exposição a "memória do medo é ativada e a incorporação de uma nova informação
incompatível com a estrutura do medo atual permite que novas memórias se formem"
(p.324). Assim, a terapia consiste em pedir que o paciente fale de forma detalhada do
evento traumático, para depois ajudá-lo a processar a lembrança até que esta não seja
mais dolorosa.

Sobrr Comportamento f Co^niçAo 17


Rangé e Masci (2001) explicam como uma sessão do tratamento ocorre. Cria-se
uma hierarquia dos principais estímulos temidos e evitados, para depois reviver
imaginariamente a situação e descrevé-la em voz alta como se acontecesse no presente. O
paciente é estimulado a cada vez fornecer mais detalhes sobre a situação, e estas descrições
são repetidas diversas vezes em cada sessão e gravadas em fita, e depois o cliente então
é estimulado a ouvir estas gravações em casa e também a se envolver em exposições ao
vivo. Apesar de ativar a estrutura da memória, os autores explicam que esta não fornece a
informação corretiva direta referente às atribuições errôneas ou a outras crenças inadequadas.
b) Tratamento de Inoculação do Estresse
Foa (1997, citado por Margis e Kapczinski, 2004) fala que este tratamento visa
fornecer ao paciente uma sensação de dominio sobre os medos, pelo aprendizado de
várias habilidades de manejo. Neste treinamento explica-se a teoria de aprendizagem
social e também as reações de medo e ansiedade ocorrendo em três canais: físico,
comportamental e cognitivo. Assim o paciente identifica seus sintomas em cada canal. A
técnica pretende dar ao paciente um dominio sobre seus medos através da re-significação
da memória traumática e do ensino de habilidades de manejo frente às situações temidas.
De acordo com Calhoun e Resick (1999), as habilidades consistem em
relaxamento muscular, controle de respiração, representação imaginária, dramatização,
interrupção do pensamento, diálogo autodirigido, etc.
c) Terapia do Processamento Cognitivo
Resick e Schnicke (1992, citados por Margis e Kapczinski, 2004) explicam que
esta terapia é um modelo desenvolvido para tratar pacientes do TEPT que são vítimas
de ataque sexual. Ela é formada de componentes cognitivos e de exposição. Seu objetivo
ó a reestruturação cognitiva com foco em cinco pontos que são associados a vitimas de
ataques sexuais: segurança, confiança, poder, estima, intimidade.
Para McNann e Pearlman (1990, citados por Rangé e Masci, 2001), a suposição
é de que os sintomas relacionados ao TEPT são geralmente causados pelo conflito
entre uma nova informação e esquemas anteriores, por isso o foco da terapia de
processamento cognitivo está na identificação e modificação destes conflitos.
d) Dessensibilização o Reprocessamento por Meio de Movimentos Oculares (EMDR)
Segundo Margis e Kapczinski (2004), esta è uma proposta de terapia nova que
inclui uma forma de exposição acompanhada de movimentos dos olhos. Rangé e Masci
(2001) explicam que ela consiste na estimulação bicortical. Esta seria “responsável por
induzir atividade sincrônica neuronal entre os dois hemisférios cerebrais, contribuindo
para reintegração dos aspectos dissociados da memória e restabelecendo a sincronia
funcional entre dois hemisférios, comprometida pelo processo traumático” (p.267).
e) Tratamento em grupo
Blake (1993) sugere esse tratamento como o ideal para o transtorno, já que os
pacientes podem compartilhar suas experiências traumáticas com um grupo coeso e empático.
Como membros de um grupo, eles conseguem melhor entendimento para resolução do seu
trauma, e normalmente se sentem mais confiantes. Eles discutem e compartilham como
cada um lidou com o trauma, com a vergonha, culpa, raiva, medo, dúvida relacionada a ele.
Narrar o seu trauma e enfrentar diretamente a ansiedade e a culpa permitem que as pessoas
lidem melhor com seus sintomas, memórias e outros aspectos de suas vidas.
Rangé e Masci (2001) ainda propõem outras intervenções para o controle dos
sintomas do TEPT como a hipermnésia, hiper-reatividade, anedonia, entorpecimento,
entre outros. Dentre essas intervenções pode-se destacar o apoio social, para que a

18 Lrticid Sant Anna, f Idcnf Shinohara


pessoa construa uma rede de suporte, seja para fazer companhia como para cuidados
pessoais. Habilidades de relaxamento tambóm podem ser muito vantajosas na medida
que incluem o controle da resposta emocional e fisiológica e proporcionam uma
sensação de auto-eficácia. A integração de sentimentos e sintomas não pode ser
ignorada, pois permite que o paciente diferencie suas emoções de seus pensamentos
automáticos, já que as pessoas traumatizadas acabam usando suas emoções como
lembrança de sua inabilidade em agir em diversas situações. Atividades esportivas,
artísticas ou outras que sejam gratificantes também devem ser estimuladas, pois trazem
gratificação e eficácia pessoal.

A Culpa relacionada ao TEPT


Foa, Steketee e Rothbaum (1989) definem culpa como um sentimento
desagradável acompanhado da crença de que a pessoa deveria ter sentido ou agido de
forma diferente (com implicações de responsabilidade e/ou de falta do justificativa).
Kubany e Watson (2003) descrevem um modelo que conceitualiza a culpa como
um constructo de dimensões afetivas e cognitivas. Este modelo apresenta cinco variáveis
como componentes primários da culpa: angústia e quatro convicções inter-relacionadas
sobre sua participação em um evento negativo. Esse modelo foi originalmente criado
para explicar a culpa que surge no contexto de eventos traumáticos.
Baumeister, Stillwell e Heatherton (1994) afirmam que existem variedades de
personalidade que fazem a pessoa estar mais propensa à culpa, mas não existem
pesquisas para mostrar fatores que façam com que alguns eventos sejam mais
traumáticos que outros. A maioria dos estudos feitos até hoje se concentram nas
diferenças individuais.
De acordo com Kubany e Watson (2002), existe uma diferença entre a culpa
relacionada a um trauma e a culpa comum do dia-a-dia. A culpa experienciada no contexto
de eventos estressantes do dia-a-dia pode ser explicada em termos das mesmas
variáveis da culpa que ocorre em decorrência de um trauma, mas podem ser
diferenciadas primeiramente porque eventos traumáticos e trágicos causam mais
estresse e estes eventos normalmente possuem uma conseqüência irreversível ou
irreparável. Em segundo lugar, a culpa normalmente evoca sentimentos de reparação
do acontecido, enquanto que em um evento traumático isto não poderá ser feito e esta
culpa poderá se tornar crônica.
Segundo Renner (1988, citado por Kubany e Watson, 2003), existem diversos
fatores que contribuem para a culpa em eventos traumáticos:
Normalmente danos severos foram causados; pessoas expostas ao trauma
normalmente sofreram algum tipo de dano; estes traumas muitas vezes foram causados
por pessoas (crimes violentos, estupros, acidentes sérios); sobreviventes de trauma
normalmente foram as vítimas, ou aqueles que testemunharam outros sendo
traumatizados, ou possuem um relacionamento próximo a pessoa que sofreu o trauma;
eventos traumáticos normalmente possuem conseqüências irreparáveis; sobreviventes
de traumas tendem a enfrentar decisões que são consideradas inaceitáveis; alguns
eventos traumáticos não causam o prejuízo nas pessoas envolvidas e o impacto pode
ser diferenciado; vítimas de trauma às vezes são culpadas pelo seu próprio infortúnio.
Kubany e Watson (2003) apontam a culpa como uma seqüela comum em
diferentes tipos de eventos potencialmente traumáticos incluindo abuso sexual, abuso
em relacionamentos, estupro, acidentes sérios e queimaduras, desastres tecnológicos

Sobre Comportamento e Cognição 19


e a perda inesperada de alguém próximo. Por exemplo, em um estudo feito com 269
mulheres que sofreram abuso sexual, 67% apresentaram algum sentimento de culpa.
Ainda, a maneira que sobreviventes de situações traumáticas explicam a sua
participação no evento contribui para a sintomatologia pós-traumática e interfere no processo
de recuperação. Estas explicações normalmente envolvem aspectos cognitivos de culpa.
Kubany e Manke (1995, citados por Kubany e Watson, 2003) notaram que
pessoas traumatizadas tendem a exagerar a importância do seu papel no trauma,
aumentando sua responsabilidade pelo acontecido. Foram identificados diversos
pensamentos errôneos que levam o paciente a achar que possuem culpa:
a) Pensamentos "errôneos" quanto ao grau de responsabilidade
Comum entre sobreviventes de traumas, a compreensão tardia do que devia
ter sido feito faz com que estes acreditem falsamente que eles sabiam o que ia
acontecer antes do evento, e acham que ignoraram as evidências e dicas de que
aquilo iria acontecer. Como acham que tinham uma chance de evitar que o trauma
acontecesse, se julgam responsáveis pelo acontecimento e esquecem que a maioria
destes eventos acontece por diferentes fontes causais.
b) Pensamentos "errôneos" relacionados às ações tomadas durante o evento
As pessoas tém dificuldade em reconhecer que decisões que precisam ser
tomadas rapidamente irão ser diferentes de decisões sem muito tempo para analisar
as opções. Já que normalmente durante eventos traumáticos não há tempo ou muitas
opções, estas acabam sendo decisões automáticas. Mais tarde, quando a pessoa
então tem tempo de pensar, cria soluções que poderiam trazer resultados diferentes e
se culpa por não ter pensado nelas antes. As vezes até acreditam que poderiam ter feito
coisas que nem eram possíveis. Outro problema é que a pessoa se foca apenas nas
coisas boas que poderiam ter acontecido caso sua reação fosse diferente e, raramente,
vô os benefícios da ação que ela tomou.
c) Pensamentos “errôneos” sobre ter agido erradamente, contra os seus “valores".
As pessoas acham que agiram erradamente, não por terem agido
inconsistentemente com seus valores, mas por causa da conclusão trágica do evento.
Outro problema é que as pessoas não percebem que reações emocionais fortes
normalmente não são tidas voluntariamente. Soldados em guerra que sentiram medo,
não tiveram decisão intelectual para tal. Outro pensamento que contribui para todas as
conclusões errôneas ó achar que uma reação emocional promove a veracidade de uma
idéia. Por exemplo, uma pessoa que fale: “Intelectualmente eu acredito no que vocé me
diz, mas ainda me sinto responsável". O sentimento ó usado para validar o pensamento.
Segundo Kubany e Watson (2002), para que a culpa ocorra precisam estar
presentes efeitos e cognições negativas. Esta será máxima quando os seguintes
componentes estiverem presentes em grau extremo:
a) O estresse relacionado ao evento ó profundo.
b) A pessoa acredita que ela sabia com certeza o que ia acontecer e podia ter impedido.
c) Acredita que foi 100% responsável pelas conseqüências.
d) Acredita que suas ações foram injustificadas.
e) Acredita ter violado seus valores pessoais e morais.
De acordo com Baumeister, Stillwell e Heatherton (1994), situações e
circunstâncias sociais que produzem ou evocam estresse tôm uma alta probabilidade

20 l.clici.1 Sant Anna, Mclenc Shlnohara


que a pessoa se perceba como tendo um papel importante nos efeitos negativos,
aumentando a chance de sentir culpa. Alguns fatores irão facilitar que esta culpa ocorra:
- Quando um mal ou dano é causado -. Presume-se que o nlvel do ostresse associado
com um evento negativo tem correlação com a quantidade de dano que foi causado pelo
evonto. A quantidade do culpa aumenta de acordo com a quantidado do dano causado.
Isto podo parocor óbvio, mas mostra a importância de olhar alóm dos fatoros individuais
que contribuem para a culpa.
- Proximidade física ou onvolvimento diroto om um ovonto nogativo - Para Kubany e Watson
(2002), um segundo fator que irá contribuir para culpa ó a proximidade física ao acontecimonto.
Se uma pessoa tostemunha um ovonto nogativo, está perto, ou está envolvida de alguma
outra manoira, a probabilidade da ocorrôncia da culpa aumenta. Quando uma pessoa está
próxima a uma possoa que foi machucada, os elementos afetivos e cognitivos necessários
para a ativação da culpa possuem grande chance do serem ativados. Primeiro, indivíduos
que testemunham alguém passando por um evento negativo irão provavelmente experienciar
estresse empático. Em segundo lugar, estando perto, a pessoa podo achar que teve algum
papel no evento negativo. Como exemplo, um veterano do Vietnã disso que não sentia culpa
quando matava um inimigo do seu holicóptero, já que a distância ora muito grande. Mas
quando tostemunhou pessoas sendo mortas no chão, grande estresse foi ativado e atitudos
de auto-condenação e do culpa severa apareceram.
- Dano causado a uma pessoa muito próxima - De acordo com Baumeister, Stillwell e
Heatherton (1994), a culpa tem mais chance de acontecer no contoxto do relacionamentos
próximos porque a resposta empática é mais forte quando há uma preocupação comum
pelo bem estar da outra possoa. O estresse deverá ser muito maior quando há um
relacionamento próximo, do que quando o mesmo evento acontece com um estranho.
Quando algo muito ruim ou trágico acontece com alguém que amamos sentimentos
pessoais de perda, mágoa e tristeza são profundos. Além disso, as pessoas
normalmente se sentem responsáveis pelo bem estar de alguém muito próximo delas,
por isso podem so sentir rosponsáveis pela conseqüência negativa do evento traumático.
Então, quando um mal ou dano acontece com uma pessoa próxima, a probabilidade da
ocorrência de culpa aumenta significativamonte.
- Envolvimento em eventos que causam danos irreparáveis - Segundo Tagney (1992,
citado por Kubany e Watson, 2003), envolvimonto em ovontos negativos (por proximidade
ou por conhecer a vitima) aumenta a probabilidade da culpa. Mas se compararmos eventos
em que o dano pode ser reparado com eventos onde não pode haver reparação, o segundo
evoca uma culpa mais forte e crônica. A ocorrôncia da culpa estimula impulsos de pedir
desculpas, de tentar restituir a vitima, e fazer essas coisas diminuem significativamente a
culpa. Essa forma de alívio não existe quando os danos são irreparáveis, e a tensão e o
remorso associados com a culpa podem se exacerbar. Este é um dos motivos pelo qual
a culpa relacionada ao trauma é pior do que a culpa do dia-a-dia, já quo esta normalmente
pode ser reparada. Por exemplo, uma pessoa que não merecia morrer não pode ser
trazida de volta à vida. Alóm disso, a culpa associada a eventos irreversíveis quo já oram
provistos, tendem a evocar menos culpa, do que ovontos irreversíveis que ocorrem do
repente. Como exemplo, uma pessoa doente na família quando morre provoca monos
culpa do que quando a possoa é assassinada ou se suicida.
- Eventos negativos causados por pessoa X Eventos que são “atos de Deus" - É da
natureza humana procurar algum significado nos eventos negativos e entender por que
estes eventos ocorreram. Se a explicação da pessoa para o evento é "por causa de algo
que eu fiz ou não consegui fazer", uma das condições necessárias para culpa é ativada
(papol om um ovonto nogativo). Evontos nogativos quo são considorados "atos do Dous"
ou fora do controlo humano (terremotos, tomados) evocam monos culpa do que eventos

Sobrf Comporf.imcnto eCordíç.Io 21


causados por pessoas. Como um exemplo do dia-a-dia, um pai que prometo ao seu
filho de levá-lo a um jogo do basquete sentirá monos culpa so ele não for por causa do
uma grando tompestado, do que se ole osquecer. Segundo Ellsworth (1994, citado por
Baumoistor o colaboradores, 1994), eventos que são porcebidos como "falta de sorto”
ou fora do controlo humano são prováveis de ativar menos culpa. Então, quando uma
possoa não roprosontou um papel ativo no evonto, o sentimento do culpa não ó osporado.
- Situações om quo qualquor atitude tomada teria uma conseqüência nogativa - Situaçõos
om quo não há nonhuma escolha boa e todas as respostas estão associadas com
conseqüências nogativas possuem uma grande possibilidade de evocar culpa. Nestas
situaçõos não importa que ação for tomada, algo ruim irá acontocor, e isto provoca culpa.
Como os indivíduos envolvidos necessariamente fazem uma escolha quo tem
consoqüôncias nogativas, ó fácil perceber porque elos avaliam como tondo um papol ativo
na conseqüência negativa. Alóm disso, quanto mais dano esta escolha “monos mim" produz,
mais culpa será evocada. Kubany e Manko (1995, citados por Kubany e Watson, 2003)
notaram que, durante muitos eventos traumáticos, individuos são confrontados com
escolhas extremamente difíceis, as quais irão causar algum dano ou infligir algum valor
pessoal. Soldados om guorra enfrentam a opção do matar seus inimigos ou deixar olo o
seus companheiros sorom mortos. Vítimas de estupro podem lutar e corrorem o risco de se
machucar gravemente, ou não lutar e ter que enfrentar as conseqüências. Vítimas de abuso
podem escolher contar e correr o risco de rejeição ou sofrer em silêncio. Em todas ossas
situações, as opções têm conseqüências ruins. Elos poderão oxperimentar culpa por ostarem
fronte a um “dilema moral" que não pode ser resolvido. Eles precisam escolher entro
opções que são inaceitáveis. Desta forma, a culpa pode sor predeterminada pela natureza
da situação, mesmo que a culpa oxperienciada não tonha relação com a personalidade,
valores ou integridade moral do indivíduo.
- Evontos negativos que produzem conseqüências arbitrárias ou injustas - Baumeister,
Stillwell e Heatherton (1994) acreditam que a injustiça é uma importante fonte de culpa e
cita situações om que uma pessoa tenha se beneficiado ou sofrido menos que a outra.
Quando há alguma proximidade, uma distribuição injusta do boneflcios e danos provocará
culpa. A percepção de que se tonha beneficiado injustamente ou que alguém tenha sofrido
injustamente estimula cognições de que foi errado o seu beneficio e que algo deveria ter
sido foito para reparar essa injustiça. A culpa do sobrevivente (Survival's Guilt) é um sintoma
comum entre sobreviventes de trauma e demonstra essa cognição de injustiça. Em muitos
eventos traumáticos, como guerras e desastres, as conseqüências negativas são
arbitrárias, e sobroviventes com proximidade a vitimas quo não sobreviveram lutam com
a idéia de que o contrário podia ter facilmente acontecido. A percepção de que alguém não
merecia o quo aconteceu com ela promovo a convicção entre os sobreviventes do que
elos deveriam ter tido o mesmo destino dos outros.
- Culpado por outros - Kubany e Watson (2002) explicam quo ser culpado por outros
podo agir de duas manoiras para produzir ou aumentar o potencial do culpa. Culpa
explicita ou implícita verbalmente provavolmente terão um ofoito negativo. Ser culpado
pelos outros tambóm pode trazor dúvida e aumentar a probabilidade do individuo sondo
culpado, inocento ou não, acreditar que elo teve algum papol na conseqüência nogativa.
Se o individuo culpado já concordava parcialmente com o ponto de vista do acusador,
sua culpa pode ser oxarcebada. Existem ovidências clinicas de que pessoas quo
sofreram abuso sexual o mulheres que sofreram espancamento intornalizam a culpa
atribuída a elas pelo agressor ou por outras pessoas.
De acordo com Matsakis (1999), corrigir pensamentos distorcidos ó o principal
mótodo de roduzir ou aliviar a culpa. A terapia cognitiva ó normalmonte necessária para
ensinar os individuos como corrigir estes "erros", quando a culpa ó crônica e severa.

22 Iefici.i S,mt’An».i, i Iclcnc Shinolntr.i


Resick e Schnick (1993, citado por Margis e Kapczinski, 2004) afirmam que a
culpa, aposar do gorar impulsos para a reparação do ato, alguma ação para fazô-lo é
raramente tomada. Ao invés disso as pessoas apenas evitam pensar sobre o assunto.
Isto podo funcionar por algum tempo, mas a culpa está sempro sujeita a ser reativada.
Em casos onde a reparação não possa ser feita, a culpa às vezos tonde a ser diminuída
por estratégias do evitação. Podemos vor ossa característica como umas das comuns
ao estresse pós-traumático. A amnésia, por exemplo, ó uma manoira do se evitar os
sentimentos de culpa. Para estes casos, ó sempre rocomondada a terapia cognitiva.
Do acordo com Kubany o Manko (1995, citados por Kubany e Watson, 2003), o
objetivo da torapia cognitiva para o trauma relacionado á culpa (CT- TRG, Cognitive Therapy
For Trauma-Relatod Guilt) ó ajudar os pacientes a atingirem uma versão menos distorcida
do seu papol no evento traumático. A CT-TRG possui trôs fases: avaliação do nível do
culpa: exposição por meio de exercícios ao evento traumático; e diferentes procedimentos
para a correção do pensamentos errônoos (quanto ao grau do responsabilidade, quanto
às açõos tomadas duranto o ovonto o sobre ter agido orradamonto, contra os seus "valores”)
que levam a conclusões distorcidas associadas com a culpa.
Portanto a identificação, questionamento e reformulação das crenças
relacionadas à experiência traumática o à culpabilidade são essenciais para a
resignificação do trauma e diminuição dos sintomas e, em ospocial, a culpa.

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Comporlamentais: Um diálogo com a psiquiatria. Porto Alegre- Artmed, 2001.
Silva, I R Abuso e trauma: efeitos da desordem pós-traumática e estresse de múltipla personalidade.
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u I ctici.i Sdnt'Anna, I Iclcnc Shinoh.ir.i


Capítulo £
Medindo e promovendo a qualidade
na interação familiar
Lidia Natalid Dobrianskyj W e b e r1
UFPK
A na Paula Vie/zer Salvador *
Universidade Federal do Paraná
Olivia Justen Brandenbur# 3
Universidade de Londrina

O comportamento pode ser analisado da mesma forma om todas as ároas do


nossas vidas. Seja na área profissional, afetiva, religiosa, familiar, as pessoas apresentam
dificuldades de interação e a análise do comportamento indica onde observar para
compreender o problema e como modificar o quadro. Desta forma, o enfoque se encontra
nos fatores ambientais que interagem com o individuo. Para compreender a relaçáo entre
pais e filhos não é diferente. Os princípios são os mesmos. O analista do comportamento
busca a história de aprendizado de ambos, pais e filhos, e as atuais variáveis mantenedoras
dos comportamentos alvo para entender a interação e estabelecer estratégias de mudanças.
Tendo a análise do comportamento como base, as presentes autoras vôm
realizando diversos estudos na área de relacionamento familiar, em especial entre pais
e filhos, desde 2000 na Universidade Federal do Paraná. O presente texto tem como
objetivo apresentar resultados das pesquisas que tôm sido feitas, que incluem a elaboração
de um instrumento de medida e de um programa de intervenção para pais em grupo.

Práticas educativas parentais


Os pais apresentam muitas dúvidas sobre a melhor forma de educar seus
filhos. Durante o trabalho com grupos de pais (Weber, Salvador & Brandenburg, 2005)
aparece com frequência questões como "Dar muito carinho e elogiar demais não
estragam a criança?", “Eu não aguento meu filho fazendo escândalo quando quer alguma
coisa, o que eu faço?’’, “Meu filho não obedece, já gritei, já bati, já deixei de castigo e não
sei mais o que fazer”. Quais seriam, então, as maneiras mais indicadas para pais e
mães criarem seus filhos, como apresentar contingências favoráveis para promover
comportamentos mais adequados, diminuir os inadequados e preparar crianças e
adolescentes para o futuro? Para encontrar essas respostas, o comportamento dos
pais pode ser estudado em categorias conhecidas como práticas educativas parentais.
' Mmtre a Dtxitora em Patuiíogta Fxperimental pala USP, profaMnra da graduação am Piíootogí« e da pôa-graduaçAoemErducaçâodaUFPR
Coordanadoni do NOdeo da Anáftaa do Comportamento
>PaluMoga pala UFPR, aluna do Programa do póa graduação em Educação (Maatrado) da UFPR
1Palcókqa p«la UFPR; aluna do Mostrado em Anákaa do Comportamento da UEl.

Sobrr Comportamento e Cognição 25


As práticas parentais correspondem a comportamentos definidos por conteúdos
específicos e por objetivos de socialização, incluindo estratégias usadas para suprimir
comportamentos considerados inadequados ou para incentivar a ocorrôncia de
comportamentos adequados (Alvarenga, 2001; Darling & Steinberg, 1993). Diversas
são as práticas educativas parentais, as pesquisas na área ajudam a mostrar quais
dessas práticas são mais positivas para o desenvolvimento de crianças e adolescentes.
Os estudos e buscas bibliográficas realizados pelas autoras auxiliaram na seleção de
práticas relevantes na educação pais-filhos.
O relacionamento afetivo significa demonstração de amor dos pais para seus
filhos, pelo carinho físico ou pela verbalização positiva É importante a aceitação
incondicional do filho, ou seja, o afeto não contingente ao comportamento deste. Além
disso, os pais devem prestar atenção e valorizar os momentos em que o filho age
adequadamente, apresentando consequências positivas. O envolvimento è outra prática
educativa que está interligada, mas se distingue do relacionamento afetivo porque
corresponde à participação dos pais na vida dos filhos. Pais envolvidos dão apoio, são
sensíveis às reações dos filhos, estão presentes e disponíveis no dia-a-dia. Filhos do
pais afetivos e envolvidos apresentam repertórios mais adequados (Aviezer, Sagi, Resníck
& Gini, 2002; Sartor & Youniss, 2002).
Apresentar regras 0 monltorá-laa implica primeiro: definir o quo o filho deve
fazer, como e quando; segundo: supervisionar o cumprimento das regras e monitorar
as atividades do filho. A obediência dos filhos ó muito maior se a explicação da regra for
clara, incluindo o que se deve fazer, quando e as conseqüências caso a criança obedeça
ou caso desobedeça (Davies, McMahon, Flessati e Tiedemann, 1984). A monitoria dos
pais influencia positivamente no desenvolvimento dos filhos, diminuindo principalmente
a probabilidade de comportamentos de risco (Ceballo, Ramirez, Hearn & Maltese, 2003).
A comunicação entre pais e filhos indica como se caracteriza o diálogo na
interação. Quando a comunicação é positiva, há expressão de opiniões, consideração
das preferências dos filhos, incentivo a falar sobre problemas, disponibilidade para
ouvir o filho. Essas trocas verbais positivas contribuem para aumentar a confiança e a
compreensão (Nydegger & Mittenoss, 1991). A comunicação negativa inclui ausência
desses aspectos citados ou um diálogo negativo e coercitivo.
Outra prática educativa parental muito estudada é a punição corporal, que
corresponde à palmada utilizada pelos pais para corrigir ou controlar comportamentos
dos filhos. Estudos atuais têm demonstrado pontos negativos do uso da punição corporal
na interação pais-filhos, por diversos motivos (Brandenburg, & Weber, 2005), dentre
eles, encontra-se as associações do uso freqüente de punições corporais com
comportamentos agressivos com colegas (Strassberg, Dodge, Pettít & Bates, 1994),
baixo autoconceito (Barrish, 1996) e outros aspectos negativos.
Os pais se apresentarem como modelo positivo para os filhos pode ser
entendido como uma prática educativa ao serem considerados os comportamentos
dos pais que servem de exemplo para filhos, especialmente comportamentos que
Indicam valores e modelos morais. O exemplo positivo dos pais é forma de aumentar a
probabilidade de ocorrência de comportamentos adequados dos filhos (Alvarenga, 2001).

Escalas de Qualidade na Interação Familiar (EQIF)


Com os estudos sobre práticas educativas parentais, as presentes autoras
elaboraram um instrumento de medida: As Escalas de Qualidade de Interação Familiar
(EQIF). Trata-se de um instrumento que avalia a qualidade de interação entre a criança/
adolescente e seus pais e entre o casal. Foi considerada importante a inclusão da relação

26 I ulid N. I>. Wcbcr, A 11.1 P.tul.i V. S«ilv«idor, Ollvui I. Br.iiulcnburH


entre o pai e a mãe porque a literatura mostra que tal relação interfere na forma como estes
interagem com seus filhos. Quando pais possuem dificuldade no relacionamento conjugal
normalmente apresentam comportamentos parentais ineicazes (Erel & Burman, 1995).
O instrumento acessa os aspectos de interação familiar por meio do relato dos
filhos, estes respondem separadamente sobre o pai e sobre a mãe. São 50 questões om
sistema Llkert de 5 pontos (nunca, quase nunca, às vezes, quase sempre, sempre),
agrupadas em 10 escalas. Sete delas abordam aspectos da interação familiar considerados
positivos: relacionamento afetivo, envolvimento, regras e monitoria, comunicação positiva
dos filhos, modelo, sentimento dos filhos e clima conjugal positivo. Trôs escalas abordam
aspectos negativos: comunicação negativa, punição corporal e clima conjugal negativo. Os
escores sâo obtidos com a soma dos pontos de cada questão, podem ser somados de
forma independente em cada uma das escalas e pode-se obter um escore total. A Tabela 1
apresenta quais são as questões de cada escala, com as respectivas numerações (a
numeração corresponde à ordem das questões para aplicação).

Tabela 1: Questões de cada escala do instrumento EQIF


(1) Meu* pala coatumam dlzor o quanto ou sou knportantu paru elos
(4) Mau* pala moatram alegria quando eu faço alguma coita legal
(13) Mau« pala flcam feNzee quando aatâo comigo
(16) Maua pala me elogiam quando au cumpro as minhim obrigações
(36) Maua pala demonstram orgulho da mim
(26) Quando a|udo meus pala. eles me agradecem
(38) Maua pala coatumam ma (azar carlnhoa quando eu me comporto barn
(43)
~ Mau»
Mi paia coatumam me dar baHoa. abraçoa ou outroa carinho»
(?) Eu Ipoaao contar com o apoio doa meoa pala quando tenho algum problema
(0) Mau» paia dâo importância para mlnhaa opinlAea
(14) Maua pala ma a|udam nua aatudoa quando au praclao
(24) Maua pal» procuram saber o que aconteceu comigo quando oatou triato
(26) Maua pala ma ouvem a ma respondam quando mi pnrgunlo alguma cotaa
(34) Meua pala coatumam moatrar que ae preocupam comigo
(44) Meu» pal» coatumam perguntar o que eu eatou sontlndo
(47) Meua pal» converaam comigo quando faço alguma coisa urrada, mu oxpllcando
porque eu nâo deveria ter feito daquele (alto
(3) Mau» paia coatumam ver »e eu |á fiz a» minha» übrigaçâes
(15) Meu» pala me dizem o que é certo e o que é errado
(25) Meus pais sabem onde eu eatou quando nâo aatou em caaa
(36) Meu» paia sabem o que faço com o mau tampo livra
(45) Meus pala coatumam me dar conaaihoa
(49) Meua pal» pedem para au lâzer para onda au aatou Indo
(6) Eu coatunto contar a» col»aa boa» que ma acontecem para meu pulAninha m ie
(10) Eu costumo cantar aa colaaa njlna que me acontecem para meu pai/minha mâe
(30) Eu coatumo falar aobra meua sentlmentoa para mau pai/minha mâe
(5) Meu» pala brigam comigo por qualquer coisa
(9) Maus pais coatumam falar alto ou gritar comigo
(17) Meua pais coatumam daacontar em mim quando aatâo com problemas
(20) Meus pais coatumam ma xingar ou falar (lalavrAes para mim
(40) Meua pal» coatumam ma criticar da forma negativa
(27) Meua pala coatumam ma bater quando faço alguma oolaa errada
(30) Maus pala coatumam ma bater »em au tar feito nada de errado
(46) Meua pal» coatumam ma bater por colaaa sem Importância
(11 )0 que meua pala ma ensinam da bom eles também fa/am
(22) Meus pais também fazem aa ohrigaçAes que me ensinam
(32) Eu acho lega» aa cotaaa que meua pala fazem
(12) Eu penso que meu pal/rmnha mâe sâo os melhoro« pais quo eu cxinheço
(23) Eu me sinto amado peloa meus pala
(33) Meua pal» «âo um bom axemplo para mim
(42) Sinto orgulho de meus pais
(50) Qual a nota que vncâ dé para seu» paw, de um a cinco'
(10) Meua pal» fazem carinho um no outro
(21) Meua pais fazem elogloe um para o outro
(31) Meua pala coatumam ae abraçar
(41) Meua pala falam bem um do outro

Òilroa conjugal coatumam xingar"um aõ outro


Negativo (16) Meua pais falam mal um do outro
(29) Meua pais coatumam estar brabos um com o o«
^37]_Meuaj>alsbrtjgrTUjm_co£U)^*rtro^^_^^_

Sobre Comj>ort<imrnto c Co^ni^lo 27


As escalas foram definidas teoricamente, e a construção do EQIF foi feita
utilizando-se testes estatísticos de validação do instrumento. (Weber, Viezzer &
Brandenburg, 2003a, 2003b, 2004). As análises foram realizadas com amostragem
ampla (953 participantes) e as avaliações das propriedades psicométricas do EQIF
demonstraram ser um instrumento confiável e consistente.
Desde a elaboração e validação do EQIF, muitas pesquisas já foram realizadas
utilizando-se de tal instrumento. Pesquisas estas que tiveram como objetivo relacionar
variáveis de interação familiar (medidas pelo EQIF) com variáveis da criança ou
adolescente, tais como depressão, stress, auto-eficácia, auto-estima, habilidades
sociais, freqüência de conflitos familiares, comportamentos pró e anti-sociais e até
mesmo com o fator de intergeracionalidade das práticas. Os resultados de cada uma
destas pesquisas estào apresentados abaixo1;

Depressão X EQIF:
Pesquisa realizada com 178 adolescentes de escola particular e estadual de Curitiba,
com idade entre 14 e 16 anos. Foi aplicado o teste de correlação de Pearson, e a análise
dos dados demonstrou haver correlação negativa significativa entre o escore de depressão
e todas as escalas positivas do EQIF (relacionamento afetivo r=-0,337*, envolvimento r=>
0,393*, regras e monitoria r— 0,259*, comunicação positiva dos filhos r=-0,308\ modelo
r=-0,358*, sentimento dos filhos r=-0,402#, clima conjugal positivo r=-0,272*), e correlação
positiva significativa entre o escore de depressão e todas as escalas negativas do EQIF
(comunicação nogativa r=0,346*, punições inadoquadas r=0,346*, clima conjugal nogativo
r=0,176*). Além disso, foi observado que entre todos os adolescentes considerados em
situação de proteção, nenhum apresentou indícios de depressão (c2=5,230; gl=1; p <
0,05). Estes dados demonstraram que quanto maior a presença de aspectos positivos o
menor a presença de aspectos negativos na interação familiar menores foram os indícios
de depressão. (Weber, Bilobran, Dück, Hassumi, Moura, & Viezzer, 2005).

Stress X EQIF:
Pesqujsa realizada com 125 crianças e adolescentes de escola municipal e estadual
de Curitiba, com idade entre 9 e 16 anos. Os dados foram analisados através do teste qui-
quadrado, que demonstrou haver relação significativa entre o stress e metade das escalas
do EQIF (relacionamento afetivo x^’5,445*, envolvimento x*"4,769*, regras e monitoria x*'2,970,
comunicação positiva dos filhos x?‘2,205, modelo x2*3,291, sentimento dos filhos x*'2,546,
clima conjugal positivo x^õ.õlS*, comunicação negativa x^’6,989*, punições inadequadas
xa*0,440, clima conjugal negativo x2*5,333*). Estes dados, mesmo aqueles que não
apresentaram significáncia estatística, demonstraram haver relação entre os maiores índices
de stress com menor presença de aspectos positivos e maior presença de aspectos
negativos na interação familiar. (Weber, Biscaia, Pavei & Brandenburg, 2003).

Auto-efícácía X EQIF:
Pesquisa realizada com 112 adolescentes de escola estadual de Curitiba e
124 de Paranaguá, com idade entre 14 e 20 anos. Foi aplicado o teste Anova, e a análise
dos dados revelou a existência de uma relação significativa positiva entre auto-eficácia
e quase todas as escalas positivas do EQIF (relacionamento afetivo F=9,610*,
envolvimento F=9,516*, regras e monitoria Fs3,779*( comunicação positiva dos filhos
F=8,120\ modelo F=10,162*. sentimento dos filhos F=6,619\ clima conjugal positivo
F=2,020), e relação negativa entre auto»eficácia e as escalas negativas do EQIF
1Todo« o* vakxtM cotn * aprowmUwn p<0,06

28 I .Ulla N. I). Wcbcr, Ana Paula V, Salvador, Olivia I. Ilramlcnburg


(comunicação negativa F= 1,249, punições inadequadas F=4,327*, clima conjugal
negativo F=2,745). Estes dados, mesmo aqueles que não apresentaram significância
estatística, demonstraram que quanto maior a presença de aspectos positivos o menor
a presença de aspectos negativos na interação familiar maiores foram os escores de
auto-eficácia. (Weber, Dubba, Lopes & Izidoro, 2004).

Auto-estima X EQIF:
Pesquisa realizada com 111 adolescentes de escolas particulares de Porto
União (SC), com idade entre 13 o 14 anos. Foi aplicado o teste Anova, o a análise dos
dados revelou a existência de uma relação significativa positiva entre auto-estima e
todas as escalas positivas do EQIF (relacionamento afotivo F= 16,092*, envolvimonto
F=8,938*, regras e monitoria F=8,938\ comunicação positiva dos filhos F=6,848\ modolo
F=9,243*( sentimento dos filhos F=6,172*, clima conjugal positivo Fs3,432*), e relação
nogativa entro auto-eficácia e as escalas negativas do EQIF (comunicação negativa
F=6,664*t punições inadequadas F=9,938\ clima conjugal negativo F=3,107). Estes
dados demonstraram que quanto maior a presença de aspectos positivos e menor a
presença de aspectos nogativos na Interação familiar maiores foram os oscores do
auto-estima. (Wober, Stasiack & Brandenburg, 2003).

Habilidades sociais X EQIF:


Pesquisa realizada com 268 adolescentes de escola estadual de Curitiba, com
idado entre 13 e 16 anos. Os dados foram analisados através do teste qui-quadrado,
que demonstrou haver relação significativa entre habilidades sociais e algumas das
escalas do EQIF (relacionamento afetivo xJ= 1,978, envolvimento xa= 1,886, regras e
monitoria x*=11,582*, comunicação positiva dos filhos xa=7,719\ modelo x*=6,035*,
sentimento dos filhos x2= 1,718, clima conjugal positivo x2=8,037*, comunicação negativa
x2=0,374, punições inadequadas x*=2,362, clima conjugal negativo x,=2,017). Foi possível
verificar relação entre os maiores índices de habilidades sociais com maior presença
de aspectos positivos e menor presença de aspectos negativos na interação familiar.
Mesmo nas relações que não apresentaram valores estatisticamente significativos, foi
possível perceber uma tendência, um padrão de distribuição das respostas dos
participantes muito semelhante ao padrão apresentado em todas as outras relações
significativas. (Weber, Flor, Viezzer & Gusso, 2004).

Freqüência de conflitos familiares X EQIF:


Posquisa realizada com 128 adolescentes de escola estadual de Campina
Grando do Sul, região metropolitana de Curitiba, com idade média de 16,09 anos. Foi
aplicado o teste de correlação de Pearson, e a análise dos dados demonstrou haver
correlação negativa significativa entro a freqüência de conflitos e todas as escalas
positivas do EQIF (relacionamento afetivo r=-0,481*, envolvimento r=-0,469*, regras o
monitoria r=-0,283*, comunicação positiva dos filhos r=-0,245*. modelo r=-0 ,4 5 r,
sentimento dos filhos r=-0,502*, clima conjugal positivo r=-0,370*), o corrolação
significativa positiva entre freqüência de conflitos e as oscalas nogativas do EQIF
(comunicação nogativa r=0,631\ clima conjugal negativo r=0,432*). Estos dados
demonstraram que quanto maior a presença de aspectos positivos e menor a presença
de aspectos negativos na interação familiar menor foi a freqüência dos conflitos
familiares. A única exceção ocorreu com as punições inadequadas (r=-0,131*) que
procisaria ser melhor invostigada. As mesmas relações foram encontradas ao

Sobrr Comporl.imcnlo r Cofluivilo 29


correlacionar intensidade do conflito, participação do adolescente no conflito e
intensidade da reação afetiva com o instrumento EQIF. (Cunha & Weber, 2005).

Comportamentos pró e anti-sociais X EQIF:


Posquisa qualitativa realizada com dois adolescentes (de 16 e 17 anos, ambos
do sexo masculino). Um deles era aluno selecionado pelo Instituto Bom Aluno do Brasil
(com excelonto desempenho académico); e outro estava detido provisoriamente no
SAS (Serviço do Atendimento Social), à espera de julgamento, por cometer ato infracional.
O instrumento EQIF foi utilizado como roteiro para as 5 entrevistas individuais realizadas
com cada adolescente. Através da análise qualitativa dos resultados foi possível perceber
no relato do adolescente detido a predominância do práticas parentais e clima familiar
bastante coercitivo, alóm de pouco onvolvimento, rogras com pouca monitoria, punições
extremamente exageradas e inconsistentes (podendo ser considoradas como maltrato),
sentimentos de rejeição, modo e mágoa e envolvimonto com pares dosviantos. Já no
relato do adolosconte do Instituto Bom Aluno, foi possívol perceber a predominância de
práticas parentais não-coercitivas e uso freqüente de reforçadores positivos, além de
rogras bom dofinidas e claras, punições brandas e consistontes, sontimentos de orgulho
e respeito e o não onvolvimento com pares desviantes. Portanto, pôde-se perceber a
forte influência da interação destes jovens com seus pais para o desenvolvimento de
comportamontos pró e anti-sociais. (Salvador & Weber, 2005).

Intergeracionalidade das práticas educativas:


Pesquisa realizada com 21 sujeitos do sexo fominino, de sete famílias distintas do
classe média, respeitando-se a linearidado trigoracional (avó / filha / nota). Foi aplicado o
instrumento EQIF para as três gerações, e a análise dos resultados demonstrou a existência
de intergeracionalidade em 95,8% dos casos analisados. Apenas 4,2% não apresontou
transmissão de valores entro as três gerações (relacionamento afetivo com relação à mãe;
comunicação positiva dos filhos com relação á mãe e punições inadequadas com relação
ao pai). O relacionamento afetivo das mães e comunicação positiva dos filhos no em
relação à mãe aumentou considoravolmente da 1“ para a 3" geração, ou seja, a 3" geração,
corn faixa etária entro 12 e 25 anos, foi criada em um ambiente familiar com maior
demonstração mais o afeto e diálogo. Já a escala de punições inadequadas do pai diminuiu
da 1* para a 3* geração. Nenhuma das dimensões da escala de qualidade de interação
familiar mostrou inexistência de intergeracionalidade em ambos os pais: por meio de pelo
monos um dos gonitores houve a transmissão de práticas educativas e aspectos de interação
familiar ao longo das gerações. (Weber, Bemardi & Selig, 2005).

Os resultados encontrados nestas pesquisas indicam que quando as


contingências presentes na família são mais favoráveis (maior presença das práticas
positivas e menor das negativas) a criança passa por um aprendizado diforonto do quo
aquelas que vivem om contingências menos favorávois (menor prosonça das positivas
o maior das negativas). Essa diferença na história de aprendizagom explica porque os
resultados do depressão, stress, auto-eficácia, auto-estima, habilidades sociais, conflitos
familiares, desonvolvimento de comportamentos pró ou anti-sociais diferenciam-se do
acordo com a qualidade da intoração familiar à qual a criança ou adolescente ó submotido.
O fato ó quo o padrão de relação entre as diferentes variáveis com as escalas
positivas o negativas do EQIF se repotiu nas pesquisas, isso fortalece os indicativos de
influência da interação familiar. Através dos dados, foi possível identificar, então, quais
fatores colocam os filhos em situação de proteção e quais em situação do risco.
Os fatores de risco "são condições ou variáveis que estão associadas a uma alta
probabilidado do ocorrência de resultados nogativos ou indesejáveis" (Reppold, Pacheco,

30 I *‘li.i N. I>. Wcbcr, An.1 l\iulii V. Srflv.iilor, Ollvl.i I. Hr.imlenluMR


Bardagi & Hutz, 2002, p. 10). Sendo assim, pode-so pressupor que práticas oducativas
inadequadas ou ausência de práticas positivas que estão associadas a problemas do
dosonvolvimento em crianças o adolescentes poderiam ser considoradas como fatores de
risco presentos na esfora familiar. Os fatoros protetivos se referem a condições contrárias
das de risco, ou soja, são condições ou variávois que modificam e/ou molhoram a resposta
do individuo, diminuindo a probabilidade deste desenvolver problemas de desenvolvimonto
(Reppold e cols., 2002). Para estes autores, uma das formas de proteção refere-se a
características e qualidade das interações familiares. Portanto, novamente, pode-se
prossupor quo práticas educativas positivas e a ausência de práticas inadequadas estão
associadas a comportamentos pró-socias e de competência em crianças o adolescentes,
e poderiam ser considoradas como fatores de protoção prosontos na esfera familiar.
De acordo com as posquisas apresentadas antoriomionto, pode-se concluir que
escores altos das escalas positivas do EQIF e baixo nas negativas reforem-se a fatoros de
proteção para a criança ou adolescente, pois foram os sujeitos quo apresentaram molhor
saúde mental, acroditavam mais neles mesmos e se relacionavam molhor com os outros.
Por outro lado, escores altos nas escalas negativas do EQIF e baixo nas positivas referem-
se a fatores de risco, os participantes com esse perfil apresentaram piores condições de
saúde mental, pior auto-imagem e pior relacionamento com os outros.
Através das Escalas de Qualidade de Interação Familiar pode-se calcular um
ponto de corte para definir se a criança ou o adolescente se encontra om uma familia
com interação de proteção ou de risco. Para este cálculo, houve uma categorização por
idade: participantes com até 12 anos o igual/acirna de 13 anos. Desta forma, foi definido
um ponto de corte para crianças e outro para adolescentes, pois estes últimos tendem
a apresentar escores significativamente menores que os das crianças em 8 escalas do
EQIF (todos com p < 0,001). As exceções foram nas escalas de clima conjugal negativo,
na qual crianças e adolescentes apresentaram a mesma média (p>0,05), e na escala
de comunicação negativa, na qual os adolescentes apresentaram escores
significativamente mais altos (p < 0,001). Os valores de corte encontrados na posquisa
de validação do instrumento foram calculados seguindo-se alguns passos: a) Total
Positivo (TP): somou-se os escores das oscalas positivas (relacionamento afetivo,
envolvimento, regras e monitoria, comunicação positiva dos filhos, modelo parental,
sentimento dos filhos e clima conjugal positivo); b) Total Negativo (TN): somou-se os
escores das escalas negativas (punição corporal, comunicação negativa e clima conjugal
negativo); c) calculou-se os percentis 40 e 60 do TP e do TN; d) o mesmo cálculo dos
percentis foi realizado para a amostra de adoloscentes. Assim, caracterizaram-se como
famílias protetivas aquelas que apresentaram escores altos (acima do percentil 60)
nas práticas positivas e escores baixos (abaixo do percentil 40) nas negativas, e as
famílias de risco como sendo aquelas que apresentaram escores baixos (abaixo do 40)
nas escalas positivas e escores altos (acima do 60) nas negativas. Os pontos de corte
encontrados podem ser visualizados abaixo:
- Crianças com fatores de proteção: TP igual e maior que 342 e TN igual e menor que 39.
- Crianças com fatores de risco: TP igual e menor que 328 e TN igual e maior que 48.
-Adolescentes oomfatoresde proteção:TP iguale maior que 310e TN igualou menor que42.
- Adolescentes com fatores de risco: TP igual e menor que 284 e TN igual e maior que 49.
A utilização destes pontos de corte deve ser cuidadosa. Os valores apresentados
acima devem ser usados preferencialmente como parâmetro de comparações com
outras pesquisas ou como indicativos da qualidade na interação familiar. Utilizá-los

Soliie Comportamento c (.'ognlv.lo 31


como critério de “diagnóstico", único e isolado, pode acarretar em erros ou equívocos,
uma vez que os valores de corte podem ser diferentes em outras amostras.

Trabalho de intervenção com pais


"As pessoas tornam-se pais sem que ninguém as tenha ensinado como dar
conta desta responsabilidade" (Sidman, 2001, p. 250). É por isso quo muitos pais agem
orn função dos modelos recebidos geralmente em casa de seus próprios pais, do vizinhos
o/ou amigos e até mesmo da mídia. Mas isso não é suficiente para aprendor a melhor
forma de educar, e assim, muitos pais se engajam em relacionamentos problemáticos
com seus filhos, podendo gerar gravos problemas de comportamento para estes últimos.
É por isso que todo o conhecimento adquirido nestes e em outros estudos devo
sair do meio científico e ser transmitido aos pais. Isso pode ser feito de diversas maneiras.
Livros (como de Weber, 2005) são formas muito interessantes, trazem informações,
auxiliam no autoconhecimonto e dão dicas de mudança de comportamento. Palestras
também cumprem esta função. No entanto, a análise do comportamonto mostra que uma
efetiva mudança e aquisição de repertório só ocorrem através de intervenções nas quais
a modelagem e o treinamento de comportamentos são propiciados.
Intervençõos com pais podem ser feitas por meio de: psicotorapia parental,
orientação parental aliado á psicoterapia infantil ou treinamento de pais. Estas intervençõos
normalmonto têm como objetivo interromper a interação coercitiva quo se estabelece
entre pais e filhos e promover padrões de interação mais positivos o pró-sociais, e assim,
aumontar os comportamentos pró-sociais' da criança e diminuir a desobediência (Banaco
& Martone, 2001; McMahon, 2002; Patterson, Reid & Dishion, 1992). O foco gira em torno
dos comportamentos parentais, já que são os pais aqueles que dispõem de maior controle
de reforçadores, e são eles que precisam aprender e modificar a forma de aplicá-los para
corrigir comportamentos inadequados de seus filhos (Sousa & Baptista, 2001). Se
modificações ocorrem no comportamento dos pais, isso acarreta alteração das
contingências ambientais que provocam mudanças nos filhos.
Dentre as diferentes formas de intorvenção, o troinamento de pais é o que apresenta
maiores vantagens quanto à adesão e quanto á pratiddade (Marinho & Silvares, 2000). Além
disso, a literatura cientifica mostra que grupos realizados com pais são eficientes, ocorrendo
mudança de comportamento dos pais (Silva, Del Prette & Del Prette, 2000; Rocha e Brandão,
1997; Webster-Stratton, Kolpacoff & Hollinsworth, 1988) e também no comportamento dos
filhos (Marinho, 1999; McGillicuddy, Rychtarik, Duquette & Morsheimer, 2001).
No troinamento do pais alguns procedimentos sâo utilizados, tais como
instruções sobre princípios básicos para a modificação de comportamento, sobro
observação o vigilância do comportamento da criança, sobre o uso do reforço (atenção
positiva, elogios e sistemas de pontos ou fichas), sobre o uso adequado dos processos
do extinção e punição love (time-out e custo de resposta) e sobre como ostabelecer
regras claras e objetivas (McMahon, 2002; Sousa & Baptista, 2001). Porém para estes
autores, a instrução pode ainda ser insuficiente, pois os pais podem não ser capazes de
oporacionalizá-las. Sendo assim, McMahon (2002) e Sousa e Baptista (2001) afirmaram
quo os pais precisam passar ainda por um processo do modelação, reprosentação de
papéis e ensaio comportamental para que realmente possam troinar tais comportamentos.
O objetivo das autoras em desenvolver um trabalho de intervonção com grupos
de pais, intitulado "Programa de Qualidade na Interação Familiar", foi o de instrumontá-los
com informações objetivas e científicas, oportunizando mudanças de comportamento. É
muito importante levar o conhecimento cientifico a quem mais precisa deles: os pais! A
partir do momento em que os pais são capacitados a discriminar e modificar seus próprios

32 I Ml<i N. D. Webcr, A».i l\iul.i V. Salv.ulor, Olivi.i I. Hr.iminilnirg


comportamentos e variáveis que os controlam, a família sofre transformações positivas
no seu padrão de interação e os filhos são indireta e positivamente atingidos.

O PROGRAMA DE QUALIDADE NA INTERAÇÃO FAMILIAR (PQIF)


O programa de Qualidade na Interação Familiar (Weber, Salvador & Brandenburg,
2005), elaborado pelas presentes autoras, já foi aplicado em mais de 200 familias, apontando
resultados muito bons, que comprovaram a sua eficácia (Weber, Brandenburg & Viezzer,
2004). é constituído por oito encontros semanais com os seguintes temas: (1) princípios de
aprendizagem; (2) relacionamento afetivo e envolvimento; (3) regras e limites; (4) reforçamento;
(5) punições; (6) voltando no tempo, (7) autoconhecimento e modelo, (8) fechamento.
No primeiro encontro (Princípios de aprendizagem), o objetivo é de apresentação e
integração dos participantes do grupo e de mostrar para os pais uma forma diferente de
compreender o comportamento humano. O programa é apresentado, ó realizado um contrato
e são passadas noções sobre os principios de aprendizagem, de acordo com a análise do
comportamento. O segundo encontro (Relacionamento afetivo e envolvimento) visa
sensibilizar os pais para a empatia com os filhos, mostrando a importância da demonstração
do afeto, e da participação e envolvimento efetivo na vida dos filhos. O terceiro encontro
(Regras e limites) mostra a necessidade de regras e monitoria para o desenvolvimento
infantil, ressaltando que elas devem ser claras, consistentes e coerentes. O quarto encontro
ó um dos mais importantes (Reforçamento) e enfatiza a educação positiva, ou seja, busca
auxiliar os pais a discriminarem que normalmente só prestam atenção nos erros dos filhos
e ensinar a valorização de comportamentos adequados. A maior expectativa dos pais está
em saber como punir seus filhos, o quinto encontro aborda o tema das punições com o
objetivo de alertar sobre os problemas decorrentes de punições inadequadas e de apresentar
formas mais adequadas e alternativas de conseqüenciar comportamentos inadequados.
O sexto (Voltando no tempo) é um encontro delicado, pois provoca reflexão sobre a educação
que os participantos receberam, analisando as diferenças de contexto e a transmissão
intergeracional das práticas educativas parentais. O sétimo encontro (Autoconhecimento e
modelo) proporciona momento para observar a si mesmo e para perceber-se como modelo
de comportamento para o filho. O último encontro, do fechamento, visa avaliar o
aproveitamento do conteúdo e do grupo em geral, realiza-se uma síntese do programa e
uma atividade de feedback oral.
Os objetivos descritos são alcançados graças a uma diversidade de materiais e
atividades que facilitam a abordagem dos temas, auxiliam no processo de discriminação
e treino de novos comportamentos, tornam os encontros agradáveis e interessantes,
contribuindo para a manutenção da freqüência dos participantes. Como recursos didáticos
são utilizados materiais visuais de auxílio à palestra, como transparências e cenas de
filmes. Relacionadas ao tema trabalhado no dia, vivências e atividades são sempre
realizadas no início, com intuito de sensibilização, e no fim, visando o treino de uma
habilidade educativa parental. Para intensificar a compreensão do conteúdo, os
participantes recebem uma apostila com todas as instruções. Nessa apostila, cada
encontro possui um auto-registro e uma tarefa de casa, o que ajuda muito no processo de
aprendizagem, entre um encontro e outro, no ambiente real com os filhos.
Os temas dos encontros foram divididos de forma didática e facilitadora. Mas
enfatiza-se a interligação dos conteúdos. Não se tem objetivo de apenas oferecer dicas
para resolver problemas específicos sem olhar o conjunto. No caso de um pai que tem
dificuldade em lidar com a birra da criança, por exemplo, não adianta indicar o método de
ignorar para extinguir o comportamento se este não é analisado dentro do contexto familiar
mais amplo. E é por isso que os aplicadores do PQIF devem estar sempre preparados

Sobre Comportamento c Cotfniçio 33


para fazer análises funcionais de determinados comportamentos que os pais relatam ao
longo dos encontros. Se o profissional compreende a função do comportamento relatado,
ele poderá ajudar os pais na compreensão e discriminação da contingência que o mantêm.
Abaixo segue o exemplo de relato de uma mãe, com a respectiva análise funcional.
Relato da mãe: “Meu filho nunca arruma o quarto. Eu peço e ele não obedece. Só
quando eu grito ó que ele me atende". “Eu gosto que as coisas sejam feitas na hora em
que eu peço. Mas não adianta nada que eu faça, eu peço, depois eu grito muito com ele,
mas ele nunca faz o que eu estou pedindo".
Análise funcional: para possibilitar uma análise mais detalhada, foi feita uma divisão
dos comportamentos em etapas, e na seqüência cada uma delas será explicada.
1) Estímulos que mostram haver necessidade de o filho emitir um comportamento
(exemplo: quarto desarrumado).
2) Mãe pede para filho emitir um comportamento.
3) Filho não obedece.
4) Mãe se irrita e mãe grita com o filho.
5) 2 possibilidades:
Situação 1: Filho obedece desta vez, mas repete novamente em outro momento.
Situação 2: Filho continua não obedecendo.
1) Estimulo discriminativo, antocodente para o comportamonto da mãe.
2) Comportamento verbal sob o controle do estímulo do meio. Numa análise molar,
pode-se pensar que este comportamento provavelmente ó governado por regras (como
a necessidade de organização para ser considerada boa mãe e esposa).
3) O comportamento do filho serve como conseqüência (punitiva) para o pedido da mãe.
Se analisado como comportamento de interesse, este desobediência do filho pode ser
explicada, por exemplo, pelo fato de arrumações terem um alto custo de resposta, com
poucos reforçadores para ele. O que pode estar acontecendo, também, ó a falta de
clareza para a arrumação. Estas mães não têm o hábito (evidente em outros relatos
delas) de explicar o porquê de uma ordem. Sem esta explicação, a criança não discrimina
os possíveis reforçadores envolvidos.
4) A desobediência do filho desencadeia sentimentos como irritação e impaciência
dessas mães. Ao mesmo tempo, elas reagem a este comportamento do filho com
gritos. Este tipo de reação pode ter sido aprendido. Estas mães provavelmente
aprenderam, no passado, que com o grito poderiam ser atendidas.
5) Com os berros da mãe, os filhos acatam o pedido ou não.
Situação 1: Se o filho obedece, este comportamento ó reforçado negativamente pela
eliminação do estímulo aversivo "gritos". A obediência imediata funciona como
conseqüência ao comportamento da mãe, reforçando positivamente este último. O
problema ó que as mães relatam repetição da desobediência em outros momentos.
Como elas foram reforçadas, elas gritam novamente e conseguem que o filho emita o
comportamento desejado. Mas porque razão os filhos repetem a desobediência?
Geralmente as mães emitem mandos som aliá-los a explicações do porquê. Assim, a
criança obedece imediatamente, mas não cria auto-regras para construir novos repertórios
comportamentais. Ela age apenas fugindo dos gritos. A fuga tem como efeito colateral o
impedimento de oportunidade para aprendizado de formas alternativas de comportamento.
Situação 2: Se o filho não obedece a mãe, demonstra que há outros fatores controlando o

34 I N. I>. Weòer, Arw P.iuIh V. Saívador, O/ívm I. fír.miicnbuttf


comportamento dele, e a "aversividade" do grito não chega a provocar comportamento de
fuga. O que uma mãe relatou, foi que o filho lhe disse que, quando ela grita, ele fica com raiva
e por vingança não obedece. Sendo assim, o sentimento ruim gerado pelo grito altera
(diminui) a probabilidade de o filho obedecer a mãe. O controle aqui ó diferente do presente
na situação 1. Percebe-se que criança reage diferente de acordo com sua história.
Quando o filho continua desobedecendo, extingue o comportamento de gritar
da mãe, pelo menos naquele momento. O que acontece ó que às vezes o filho obedece,
aos gritos, e às vezes não (talvez dependendo do tipo de atividade). Isso reforça
intermitentemente o comportamento de gritar da mãe, que não tendo uma boa habilidade
de leitura de contingências, generaliza seu comportamento e grita em diversas situações.
Pode-se analisar também o grito como comportamento governado por regras.
Mesmo que o filho não esteja obedecendo, ou seja, não há reforçamento positivo, a mãe
continua gritando com seu filho em diferentes situações porque este comportamento era
funcional anteriormente em sua vida. E isto demonstra que o comportamento controlado
por regras possui menor sensibilidade às contingências atuais.
Em situações como a que foi analisada, é possível identificar o ciclo coercitivo
descrito por Patterson, Reid e Dishion (1992), em que os comportamentos são mantidos
por reforço negativo. A coerção, tanto do filho quanto da mãe, prejudica a relação entre
eles. Ambos passam a esquivar-se um do outro, o que pode caracterizar uma relação
distante ou problemática.
O profissional que realiza treinamento de pais se depara constantemente com
análises como esta, e é seu papel auxiliar os pais na discriminação das contingências
mantenedoras de um determinado comportamento. Discriminar comportamentos e suas
funções ó de extrema importância por permitir modificação de comportamento. Então, quando
os pais conseguem passar pelo processo de discriminação, logo começam a fazer relatos
de modificação de comportamento. As autoras fizeram vários registros dos relatos que pais
e mães apresentavam durante os encontros, dando especial importância àqueles que se
referem à modificação de comportamento. A exemplificação destes registros pode ser
visualizada na Tabela 2, de acordo com a divisão de temas do PQIF: relacionamento afetivo
e envolvimento, regras e limites, reforçamento, punição e autoconhecimento e modelo.

Tabela 2: Relatos dos pais que demonstram mudança nos seus comportamentos
• Expressão do afeio • “Mudei Agora digo 'eu te amo' com mais facilidade Mudei até com h niposn
Relaclo- No começo me sentia melo constrangido Agora está fluindo"
namento ■ Interesse • "Estou prestando mais atençAo no que eles gostam Procuro fazer um agrado’
Afetivo e • Disponibilidade - "Conversar * algo agradável Eu sento agora para falar com ele Antes eu ia
Envolvi- conversar e jà brigava com ele*
menlo • Dar atençío de qualidade - *A gente procura aplicar o que aprende aqui com eles Dedicar um
tempo para eles Eu nâo fazia Isso Eu tinha que fa /er tudo em casa e n to dava ale nçio Agora
eu estou mudando Isso"
- Autonomia - "Aprendi a respeitar a vontade dele, mesmo nâo concordando Claro se n lo for algo
ruim para ele"
• ImplementaçAo de regras na casa - ‘As regras lá em casa foram aplicadas, agora cnda um tem
suas regras, tem horário para brincar, para estudar, para fa/er suas obrlgaçAes "
- Clareza - "Percebi o quanto estar no lugar do filho é dlflcll, por que n lo pode Isso, n to pode aquilo,
n lo A fácil, néo pode nada e n lo tem porquê Passei a explicar para a minha filha o porquê das
coisas, por que ela tem que arrumar suas bonecas ou brinquedos"
- Consistência • "Cumprir o que prometeu. Isso eu nâo fa /la Eu percebi que se eu cumprir o que
falei, as coisas dâo certo’
- Observar comportamentos positivos do filho • "Eu sempre fazia errado, antes do curso, era só
observar os erros das minhas filhas e n io as coisas certas Sempre acabava indo pelo lado
negativo, agora, de pota do curso, me seguro’
- Uso do elogio - "Eu a elogio, e ela me elogia Pus em prática os elogios"
• Técnica de pontuação ou tabela - "Eu só punia e nunca elogiava, depois da aula sobre o cartaz eu
aprendi a fazer Isso, ele desenha aa estrelinhas e fica todo faceiro*.

Sobre Comportamento c CogniçSo 35


• ExpressAo do sfsto - “Mudai Agora digo 'eu I* amo' com m ais facilidade Mudei até com n esposa
Relaclo- No começo ma sentia meio constrangido Agora eatá fluindo"
namento • Interesse - "Estou prestando mais alençôo no que elas gostam Procuro fa /er um agrado"
Afetivo e - Disponibilidade - "Conversar é algo agradável Eu sento agora para falar com ele Antea au la
Envolvi- conversar • já brigava com ala"
mento - Dar atenção de qualidade - ’ A gente procura aplicar o que aprende aqui com elea Dedicar um
tempo para eles Eu nâo fazia isso Eu tinha que fa/er tudo am casa • nAo dava atençAo Agom
eu estou mudando Isso"
Autonomia - 'Aprendi n reapeitar a vontade dele, mesmo nAo concordando Claro se nAo fnr algo
ruim para ele"_________________________________________________________________________
- Implementação de regras na casa • "As regras IA em casa foram aplicadas, agora cada um tem
suas regras, tem horário para bnncar, para estudar, para fa /er suas obrigações "
• Clare/a - "Percebi o quanto estar no lugar do filho é dlflcil, por que nAo pode isso, nAo pode aquilo,
nAo é fácil, nAo pode nada e nAo tem porquê Passal a explicar para a minha filha o porquê das
coisas, por que nla tem que arrumar suas bonecas ou brinquedos"
• Consistência ■ 'Cumprir o que prometeu, isso eu nAo fa ria Eu percebi que se eu cumprir o que
falei, as coisas dAo certo"
• Observar comportamentoa positivos do filho • "Eu sempre fa /la errado, antes do curso, nra só
observar os erros das minhas filhas e nAo as coisas certas Sempre acabava Indo pelo lado
nmgalivo, agora, depois do cun o, ma aeguro"
• Uso do elogio - "Eu a elogio, e ela me elogia Pus em prática os elogios"
• Técnica de pontuaçAo ou tabela • "Eu só punia e nunca elogiava, depois da aula sobre o cariar eu
aprendi a fa /er isso, ele desenha as estrelinhas e fica todo faceiro"

Os depoimentos apresentados na Tabela 2 revelam que, com a participação no PQIF,


muitos comportamentos parentais importantes foram instalados no repertório dos pais, e alguns
comportamentos inadequados diminuíram de freqüência ou foram suprimidos. Ressalta-se
que houve uma renovação do concerto "amor", pois passaram a expressar mais este sentimento
de diversas maneiras, incluindo demonstração de interesse e atenção pelo filho ("Só beijo e
abraço nâo são as únicas formas de expressar que você gosta de alguém. Descobri aqui que
prestar atençáo é uma forma"). Os pais que náo tinham regras bem definidas em casa passaram
a determiná-las, e tomaram-se mais consistentes e mais claros.
O reforço foi um conceito novo introduzido no repertório verbal dos pais, o que
facilitou uma mudança intensa, pois a grande maioria dos pais disse que, enquanto
antes só viam erros, agora percebiam mais os comportamentos corretos dos filhos.
Esta mudança é valiosa, pois interfere no próprio conceito de disciplina e educação, os
quais são, muitas vezes, associados à punição. Além disso, estudos têm mostrado que
a observação e valorização dos comportamentos adequados da criança também alteram
a percepção que os pais têm de seus filhos - vendo-os de forma mais positiva - o de si
mesmos - vendo-se como pais mais eficientes (Marinho e Silvares, 2000).
Quanto à punição, houve mudança no sentido de se utilizar outras formas de
conseqüenciar comportamentos inadequados, mais adequadas e menos danosas, como
o ignorar e conversar ao invés de gritar e dar bronca, possibilitando a diminuiçào de palmadas.
Foram muito interessantes as mudanças relacionadas ao tema
“autoconhecimento e modelo". Os pais passaram a se perceber mais, a se valorizar.
Eles procuraram o programa para solucionar problemas dos filhos e puderam perceber
o quanto eles precisam se conhecer e se modificar, compreendendo que influenciam o
comportamento dos filhos.
Como os pais relataram diversas mudanças em seus próprios
comportamentos, esperava-se que houvesse mudança no repertório dos filhos. Isso é
esperado, uma vez que se houver mudança na contingência, nos antecedentes ou nos
conseqüentes, ou nos elos das cadeias, certamente o comportamento de Interesse
(neste caso o do filho) se modifica. Pelo relato dos pais Isso aconteceu.
Sobre o tema relacionamento afetivo e envolvimento, os pais trouxeram informações
sobre mudança na relação com os filhos, afirmando estarem mais próximos ("Houve bastante

36 l >dl,i N . f>. Weber, A m P.tuJ«i V. Sdlvdüor, Oliw.i I. Kr.mdrnburtf


mudança entro eu e a minha filha: estamos mais próximas"), havendo maior cumplicidade
e, mudança nos filhos que estavam aceitando mais carinhos ou sendo mais carinhosos
("Estou dando mais carinho e recebendo também"). Pais relataram que mudanças quanto
ás regras contribuíram para a obediência dos filhos ("Meu filho está diferente, a semana
inteira ele chegou em casa e primeiro fez a lição e depois foi brincar. Elo está mais obediente").
O ignorar diminui birras de algumas crianças (“Comecei a ver resultado nas atitudes da
minha filha. Quando ela fazia birra, comecei a ignorar, e ela parou de fazer”).
A maioria das mudanças nos filhos foi relacionada pelos pais a uma nova forma
de agir: reforço de comportamentos corretos. A implementação desta prática teve resultados
imediatos. Muitos pais relataram quo perceberam alteração positiva no comportamento
dos filhos ("Comecei a dar as estrelinhas para a minha filha e observei melhoras
excelentes”), comprovando que o reforço aumenta a freqüência do comportamento ("Minha
filha começou a fazer mais as coisas que eu elogiava”); alguns especificaram dizendo
que houve aumonto do desempenho escolar (“Passei a elogiar o caderno do meu filho, e
agora está caprichando mais no caderno"; "Minha a filha está lendo melhor após os
elogios"). Os pais relataram alegria e aproximação dos filhos ("Eu passei a elogiar mais
meu filho, e ele ficou tão alegre que foi contar para a avó 'Vó, a mãe tá me dando parabéns
porque estou indo dormir sozinho"; “Estou elogiando mais meu filho, então ele me escreve
uns bilhetinhos dizendo que me ama, ele está mais junto de mim"). Alguns rolataram
mudanças em outros relacionamentos (“Aprendi a elogiar o a roceber elogios do meu
filho e meu marido, percebi que eles também se sentem bom, melhorou a auto-estima do
todos"; “Comecei a elogiar mais meu irmão. Falei também para meu filho para ele elogiar
a namorada, percebi que mudou a relação deles").
Além das análises qualitativas dos relatos de pais e mães, foi feita também
uma análise quantitativa com apenas 17 mães participantes dos grupos. Estas mães
se dispuseram a responder o instrumento EQIF, versão para pais (Weber, Salvador &
Brandenburg, 2005), no primeiro e último encontros do programa. Os resultados da
primeira e segunda aplicação foram comparados através do teste estatístico não-
paramótrico Mann-Whitney U, e podem ser visualizados na Tabela 3.

Tabela 3: Apresentação das médias dos escores de cada escala do EQIF obtidos no
primeiro e último encontro do programa, valor do Mann-Whitney U e índice de significância

Mftdla M<VUh MmwvWhltnoy U P


1o oncontro B° orx.onlro
NolArtonnmnnto flfatlvn 38*88 38,35 106.5 »0,05
f nvnlvlmonto 35,08 37,83 70.5 <0,05*
Roflrnn 27,80 28,31 108,5 >0,05
ModoIn 12,41 12,88 117,5 >0.06
PuntçAo InMrimitMdii 4,es 3.88 113.5 >0.05
ComunloicAo noaatlvn 11.82 0,88 99,0 >0,05

Foram comparadas as médias apenas das escalas quo modom práticas


educativas parentais, portanto as duas escalas de clima conjugal, comunicação positiva
dos filhos e sentimento dos filhos não foram analisadas, pois estes temas não são
trabalhados no programa. Ao observar as seis escalas apresentadas na Tabela 3,
percebeu-se que houve aumento significativo de apenas uma delas: o envolvimento.
Porém, mesmo nào havendo diferença estatisticamente significativa, pode-se perceber
um sutil aumento nas médias de relacionamento afetivo e regras. As médias de modolo
permaneceram praticamente iguais. E quanto às médias de punição inadequada o
comunicação nogativa, pode-se perceber uma sutil diminuição nas médias.

Sobre Comport.imcnlo c C ognlvtlo 37


O fato de as médias obtidas nas duas aplicações não se apresentarem
diferentes estatisticamente pode ser explicado de três formas: amostra muito pequena,
o quo dificulta a análise estatística; pequeno período entre as duas aplicações (apenas
8 semanas); ou ainda, mães que já iniciaram o programa com um bom repertório de
comportamentos parentais (apresentando altos escores na primeira aplicação).
As alterações nas médias entre a primeira e segunda aplicações, mesmo quo
sutis, apontam para modificações do comportamento destas mães de acordo com o
esperado. E isto podo ser considerado como indicativo da oficácia do programa. Como
a modificação de comportamentos de pais e mães ó um objeto de estudo de difícil
acesso e de difícil investigação, relatos verbais e apontamentos estatísticos são de
extrema rolovância para se obter feedback da efetividade do trabalho realizado em grupo.
Enfim, pôde-se perceber através dos relatos, que os pais avaliaram o programa
de forma positiva, valorizaram a troca de experiências ontro os participantes, ressaltaram
que as dúvidas que tinham foram esclarecidas e que perceberam aumento na segurança
em seus papéis de pais. A aplicação do PQIF demonstrou a importância de trabalhos de
intervenção com pais, estes necessitam muito de auxílio da psicologia, pois se sabe
bem quo ser pai ou mãe não é intuitivo e sim um repertório específico aprendido.

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40 I idi«i N. I>. Weber, Ana 1’dul.i V. S.ilv«ulor, Ollvld I. lU.imlrnlnirv;


Capítulo 3
Qualidade de interação familiar: uma
análise da percepção de
adolescentes sobre os conflitos
em suas famílias
Lídia Natalia Dobrianskyj W c b c r1
Josafá Moreira C u n h a 1
UFPR

Durante as duas últimas décadas os estudos sobre o desenvolvimento na


adolescência têm sido notadamente voltados para questões relacionadas à interação
dos adolescentes com seus pais (Steinberg, 2001; Steinberg & Lerner, 2004). Diversas
pesquisas têm reforçado a importância das interações intrafamiliares para o
desenvolvimento das crianças e adolescentes, em aspectos físicos, psicológicos,
sociais e cognitivos (Steinberg & Silk, 2002), sendo que nesse estudo abordamos
essas interações de estilos e práticas parentais.
É necessário, portanto discutir a diferença entre estilos parentais e práticas
educativas. O estilo parental ó o conjunto de atitudes dos pais em relação à criança, o qual
define o clima emocional em que as práticas parentais se expressam (Darling & Steinberg,
1993). Durante as interações pais-filhos são observados comportamentos em que se
expressa afetividade, responsividade ou autoridade ( Cecconello, Antoni & Koller 2003).
A literatura sobre o tema permite identificar duas dimensões distintas na
interação de pais e filhos: as práticas educativas e os estilos parentais. Weber, Viezzer
& Brandenburg (2003), apontam que as práticas educativas constituem comportamentos
dos pais reforçados por modificações produzidas no comportamento dos filhos.
O estilo parental, por sua vez, refere-se ao padrão global de características da
interação dos pais, que geram um clima emocional. Ou seja, é uma classe de respostas
dos pais mais ampla, que ó comum em várias ações e momentos (Weber & cols., 2003).
A relação entre pais e filhos ilustra uma situação na qual existe uma concentração
de poder na figura dos pais. Existem, no entanto, duas maneiras pelas quais os pais
podem utilizar este poder para alterar o comportamento dos filhos (Cecconello & cols.
2003): a primeira, através de uma disciplina indutiva, que objetiva uma modificação
voluntária no comportamento da criança; e a segunda, através de técnicas que reforçam
e reafirmam o poder parental, como práticas coercitivas. As práticas de maneira Indutiva

1Maitlra a Doutora am Piteoloala Expartmartfal pata USP, profeaaom da graduaçAo em Pnootogla • (ta pô*graduaçAo am EducaçAo da LM-PR
Coordenadora do Núdeo da AnáNee do Comportamento
1Psicóloga pala UFPR; aluua do Programa da pôe graduaçAo em fcducaçAo (Maatrario) da UFPR

Sobre (omporfumenfo c Co^ni^lo 41


promovem uma conscientização das conseqüências dos atos da criança (explicação de
regras, apelo ao amor que sente pelos pais). Já a prática coerciva, envolve a aplicação
direta do poder dos pais (puniçào física e privação de privilégios ou ameaças). A primeira
apela para a estruturação lógica da situação, enquanto a segunda apela para a punição.
Diversos estudos vêm demonstrando que práticas educativas parentais punitivas
estâo associadas a problemas de comportamentos nas crianças, como raiva, sentimentos
de fracasso, diminuição da auto-estima e auto-confiança da criança, além de ensinar o
medo; enquanto práticas que incluem aceitação, incentivo e apoio estão associadas ao
desenvolvimento de comportamentos adequados (Sidman, 2001; Weber & cols., 2003).
Há estudos demonstrando também que a exposição freqüente à punição fisica aumenta
o risco de o adolescente se envolver em brigas (Simons, Lin & Gordon, 1998).
Para diversos autores ocorre durante a adolescência uma situação
aparentemente contraditória na interação entre pais e filhos: os adolescentes buscam
estabelecer autonomia em relação a eles e manter seu sentimento de associação aos
pais (Oliveira & Costa, 1997; Steinberg & col., 2002), sendo que o aumento de conflitos
no âmbito intrafamiliar ó esporado. Apesar disso, Steinberg (2001) ressalta que brigas
freqüentes e de alta intensidade não são normativas durante a adolescência. Ainda
assim, são os conflitos entre pais e adolescentes que recebem a maior atenção por
parte de pais e pesquisadores. Nesta pesquisa definiu-se o termo “conflito" pelo
desentendimento de duas partes sobre um determinado assunto ou situação.
As dificuldades associadas aos conflitos pais-adolescentes podem ostar
relacionadas menos ao conteúdo do conflito e mais à maneira pela qual o conflito é
geralmente resolvido (Steinberg & cols., 2002), ou seja, o mais importante durante
interações em que o pai e o adolescente entram em conflito náo é a razão da briga, mas
sim as estratégias para solução de conflito que emergem durante estas situações.
Mas quais os motivos pelos quais os adolescentes brigam em casa? Com
essa questão em foco, foi realizado um estudo por Weber, Baptista, Cunha, Takeda &
Yamakawa (2005b), no qual foram investigados por meio de um questionário aberto os
motivos comuns de conflitos intrafamiliares, cujas categorias foram utilizadas para análise
no presente estudo. A seguir, serão discutidos os temas de conflito que foram usadas
nesse estudo, e sua relação com o desenvolvimento dos adolescentes.
Uso indevido de álcool e outras drogas. Ao estudar o uso indevido de álcool observa-se
a predominância do gênero masculino dentre os usuários tanto entre pais quanto entre
filhos (Kelly, Kowalyszyn 2003; Costa & cols., 2004; Weber & cols. 2005b). Os estudos de
Kelly & col. (2003) sugerem que em famílias onde um dos membros faz uso Indevido do
álcool observa-se maior freqüência nos conflitos. Em relação ás práticas parentais,
baixos níveis de monitoramento por parte dos pais estão associados ao uso abusivo de
álcool e outras drogas pelos filhos adolescentes (Crouter, Head, 2002).
Viagens e saldas. Os adolescentes preferem estar fora do lar, interagindo com seus
pares desenvolvendo assim sua identidade adulta (Forte, 1988). Entretanto, essas
saidas não supervisionadas são fonte de estresse para os pais representando um foco
importante de conflitos diante da busca de autodefiniçâo dos adolescentes e a atitude
de controlar essas atividades por parte dos pais (Steinberg & col. 2002). Uma forma de
lidar com essa ansiedade dos pais é o investimento na qualidade do tempo, proposta
por Chapman & col. (1999), sendo essa também uma estratégia possível para realizar
o monitoramento das atividades dos filhos (Crouter & col., 2002).
Relacionamentos extrafamiliares. Nessa categoria foram encontrados conflitos
relacionados a (1) relacionamentos amorosos o (2) amizades.

42 Lidia Natalia Dobriansky) Weber, Jo»afá Moreira Cunha


No campo dos relacionamentos amorosos, adolescentes que afirmaram estar envolvidos
em relacionamentos românticos relatam mais conflitos que outros adolescentes (Laursen,
1995; Doyle, Brendgen, Markiewicz & Kamkar, 2003). Collins (2003) aborda essa questão
afirmando que as fontes do problema não são os relacionamentos amorosos dos
adolescentes em si, apontando cinco características das relações românticas entre
adolescentes que podem clarificar esse tema: onvolvimento, seleção do parceiro, conteúdo
do relacionamento e processos cognitivos e emocionais.
Quanto ás amizades há um amplo suporte na literatura quanto ao importante papel
desempenhado pelos relacionamentos horizontais no processo de individualização do
adolescente (Forte, 1988; Steinberg & col., 2002; Doyle & cols., 2003; Bowker, 2004; Rubin ,
Dwyer, Booth-LaForce, Kim, Burgess & Rose-Krasnor, 2004), Durante a infância os pais exercem
uma forte influência na escolha dos amigos de seus filhos. Entretanto, na adolescência, a
escolha das amizades está freqüentemente fora do controle dos pais (Steinberg & col., 2002;
Rubin & cols., 2004). Assim, os pais entram em conflito com o adolescente ao encontrar seu
filho convivendo com amigos a quem os pais consideram inadequados, e mesmo quando
aprovam o relacionamento de amizade os pais irão se deparar com comportamentos quo
não estão de acordo com seus próprios valores. Ê importante notar que apesar do provável
aumento da influência dos amigos, o relacionamento com os pais continua sendo uma base
para o comportamento dos adolescentes (Steinberg & col. 2002).
Finanças. Dificuldades econômicas estão relacionadas a um risco aumentado de
conflitos familiares (Wadsworth & Compas, 2002; Steinberg & col., 2002) e também a
problemas escolares o de saúde (Magnuson & Duncan, 2002). A intensidade dos conflitos
entre os pais e entre os pais e adolescentes foi relacionada a dificuldades econômicas
enfrentadas na família (Wadsworth & col., 2002). Um aspecto interessante das
dificuldades financeiras está relacionado à valorização de bens materiais como forma
de expressão de amor, sendo que Chapman & Campbell (1999) propõem o oferecimento
de presentes como uma das linguagens de amor importantes nas interações familiares.
Tarofas. Segundo Eberly & Montemayor (1999), o conteúdo, intensidade e freqüência
dos conflitos familiares afeta o comportamento pró-social dos adolescentes dirigido
aos pais. Nesse mesmo estudo é destacado que a falta de ajuda nas tarefas por parte
dos adolescentes é um importante catalisador de brigas no âmbito intrafamiliar. No
estudo de Weber & cols. (2005b) observou-se que os conflitos relacionados a tarefas
domésticas envolviam principalmente mães e filhas, sugerindo uma relação com o
papel social da mulher na cultura brasileira (Oliveira & cols., 1997), as quais assumem
uma quantidade maior de tarefas domésticas em relação aos homens.
Escola. Existe ampla literatura suportando a relação entre os estilos parentais e o
desempenho escolar (Steinberg & col., 2002; Leung, McBride-Chang & Lai, 2004).
Conflitos familiares podem acarretar em mau-desempenho escolar voluntário por parte
dos adolescentes (Chapman & col., 1999), como forma de manifestar sua insatisfação.
Outros conflitos. Dentre outros grupos de conflitos encontrados, destacam-se os
motivados por banalidades, incluindo conflitos corriqueiros, como provocações entre
irmãos, discussão sobre futebol, ou quebra não intencional de objetos (Weber & cols.,
2005b). Tais conflitos podem ser categorizados dentro da ocorrência normal de conflitos
na relação entre os adolescentes e seus pais (Steinberg & col., 2002). Entretanto, há
evidências de que algumas dessas brigas podem estar relacionadas às práticas
parentais, como por exemplo, a atribuição negativa a um dos irmãos por parte dos pais
(Matthews & Conger, 2004) sendo também freqüente a observação de conflitos por
banalidades entre irmãos, como parte normal do relacionamento fraterno (Noller, 2005).

Sobre Comporl.imcnto t Cognivào 43


No estudo de Weber & cols. (2005b) sobre os conflitos familiares não foram
encontradas correlações significativas entre as variáveis diretamente relacionadas aos
conflitos e as dimensões de qualidade de interação familiar, sendo que tal fato pode ser
atribuído à multiplicidade de fatores que contribuem para a ocorrência dos conflitos,
incluindo desde aqueles relacionados aos indivíduos, ao núcleo familiar e outras
influências macrossistêmicas (Cecconelo & cols., 2003).
Verhofstadt, Buysse, Ickes, Clercq & Peene (2005), ao estudar interações entre
casais apontam uma tendência de integração no estudo das interações de conflito e o
suporte social. Ao analisar as diferenças comportamentais entre interações de conflito
e suporte foi possível observar comportamentos positivos (validação, facilitação, suporte
emocional, suporte instrumental), negativos (invalidação, culpa, desengajamento) e
neutros (proposta de mudança, descrição do problema, irrelevante).
Noller (2005) sustenta a relação entre o comportamento dos pais entre si e o
comportamento dos filhos ao afirmar que “se os pais são positivos em seus
relacionamentos um com o outro, eles irão também ser positivos em seu relacionamento
com os filhos e os filhos serão positivos no relacionamento entre si". Assim, percebe-se
que os comportamentos positivos e negativos, no presente estudo abordados a partir
das práticas parentais, tem uma influência clara no desenvolvimento das crianças.
Com base na literatura consultada, o objetivo da presente pesquisa foi analisar
a relação entre a qualidade das práticas educativas parentais e as interações de conflitos
e suporte, estudando também algumas variáveis demográficas, partindo da percepção
dos adolescentes sobre essas interações.

Método
3.1 Participantes
A amostra consistiu em 128 estudantes do ensino médio (72 sexo feminino, 56
sexo masculino) com idade média de 16,09 anos. Os adolescentes foram recrutados
em aleatoriamente em uma escola pública de Campina Grande do Sul, na Região
Metropolitana de Curitiba - PR.
Os dados coletados indicam que os adolescentes eram predominantemente
da classe social média. O relacionamento conjugal dos pais tem uma duração média
de 17,36 anos, O tipo de família predominante foi o biparental (78,1 %), sendo 17,2 %
tipo monoparental e 4,2 % outros.
3.2 Instrumentos
Para a coleta de dados foram utilizados quatro instrumentos: as Escalas de
Qualidade de Interação Familiar (EQIF) de Weber & cols. (2003); um questionário de
avaliação da interação em conflitos3elaborado para essa pesquisa a partir do questionário
de conflitos de Weber & cols. (2005b) incluindo uma adaptação do instrumento usado por
Verhofstadt & cols. (2005) para medir o nível de suporte percebido pelos participantes; e
um questionário de mensuração do nlvel socioeconômico desenvolvido pelo IBOPE.
3.3 Procedimento
O contato com a escola selecionada foi feito através de telefone e uma carta de
autorização para realização da pesquisa foi entregue. Com a autorização concedida,
realizou-se a seleção da amostra de acordo com critérios já estabelecidos, sendo a
participação voluntária e anônima. Os participantes responderam os questionários (1o
EQIF; 2o Interação em Conflitos e 3o IBOPE) na própria escola durante um tempo de aula.

44 Lídia Nalalia Dobriantkyf Wrber, lo»afá Moreira Cunha


3.4 Análise dos dados
Demográficos. Os participantes forneceram informações demográficas a respeito de si
e de suas famílias.
Suporte. O nível de suporte foi medido através da adaptação de Verhofstadt & cols
(2005) por meio do uma oscala Likert de 5 pontos. O Alfa da Cronbach (á), usado como
modida de consistência intorna, foi do 0,64. Essas medidas foram somadas em um
escore total do suporto.
Conflitos. Os adolescentes forneceram informações sobre os conflitos em suas famílias
nas 7 categorias (1 = álcool o drogas, 2 = viagens e saldas, 3 = amizade e amor, 4 =
dinheiro e contas da casa, 5 = tarefas, 6 = escola, 7 = outros) om questões de 5 pontos
que ofereciam informações especificas da categoria, freqüência, participação do
adolescente, intensidade da reação afotiva o intensidade dos conflitos , sendo que o
Alfa do Cronbach dessas questões do conflito foi de 0,88. Havia também uma questão
aborta na qual os adolescentes opinaram sobre os conflitos om suas famílias.
Foram computados os escores totais de froqüència, participação do adoloscente,
intensidade da reação afetiva e intensidade dos conflitos somando-se as respostas a
esses itens em todas as categorias do conflito (á= 0,93), sendo que postoriormente os
escores dossas variáveis foram distribuídos nas catogorias alta. média e baixa (á=0,82).
Qualidade do interação familiar. Para esta parto da análise foram selecionados
somente 111 participantes que responderam a essa parte do questionário de forma
completa. As escalas de qualidade de interação familiar foram analisadas por meio dos
escores totais do cada uma das 10 dimensões da EQIF (á = 0,95).
As variáveis de conflito foram relacionadas com as dez dimensões das oscalas de
qualidade de interação familiar por meio do teste de Correlação do Poarson, e em outros
momentos foram usados também o testo tde Student, ANOVA e Qui-quadrado para comparar
as variáveis de conflito com as variáveis suporte e demográficas, conforme adequado.
Utilizou-se principalmente o teste ANOVA para relacionar os níveis de suporte familiar,
as diferentes categorias de família (1 = Monoparontal, 2 = biparental e 3= outros) e as
diferentes classes sociais (1 = Classes C, D e E; 2 = Classes B1 e B2 e 3 = Classes A1 e A2,
de acordo com os critérios do IBGE). Para analisar a relação dos escores das variáveis do
conflito com gênero, idade, e tempo de casamento dos pais foi utilizado o Teste t de Student.

Resultados e discussão
A relação entro o motivo do conflito e o gênero do adoloscente foi significativa
nas categorias tarefas (t = -2,782; p < 0,05) e outros (t = -2,508; p < 0,05). Nessas duas
catogorias a média dos participantes do sexo feminino foi maior que a dos de soxo
masculino, confirmando nos conflitos relacionados às tarefas uma tendência apontada
por Weber & cols. (2005b), tondo em vista que as mulheres estão mais propensas a so
envolver em conflitos relacionados a tarefas por serem responsáveis pela maior parto
das atividades domésticas, além de experimentarem maiores restrições em relação
aos rapazes (Oliveira & cols., 1997).
Foi observada uma relação significativa ontre os membros quo contribuem
financoiramonto para a família o os conflitos motivados por dinheiro e contas da casa (F
= 3,712; p < 0,05) sendo com mais conflitos dessa categoria nas famílias em que
somente a mão foi citada como mantenedora financeira.

Sobrr Comportamento c Co#niv<lo 45


Tabela 1: Correlação ontre escores de conflitos o o nivel de suporte.

Su po rte

Á lcoo l a D rogas -.1 9 4 *

Via q s n s a Saldas -.2 1 3 *

A m iz a d e e A m o r •,2 4 0 **
D in heiro e contas •,3 5 8 **

Ta rufas -.5 1 2 **

f scola -,130

* p < 0,05

** p < 0,01

Observa-se na Tabela 1 que os escores de todas as catogorias de conflito, com


exceção dos relacionados à escola, estão relacionados do forma significativa ao nlvol
do suporte percebido, com valor negativo, ou seja, quanto maior o nível de suporto,
menor o escoro nesses conflitos, e vice versa.
Tabela 2: Correlação entre escores de conflitos por categoria e as dimensões da EQIF

Dmhwroe
A lu » l n Vingfins n Arm/rtd«« conta» (Ih
Drogas Saldas Amor casa Tarefas Escol A Ou Iros
Ralauonamanto afnlvo -.237 * ..3 62 " -,386” -.49 6" -.490" -.187 -,441**
Envolvimanlo -.316** -.319** -.332" -.479" -.524" -.115 -.47 6"
Ragra» a monitoria -.224* -.090 -.155 -.343" -.356" -.125 -.30 6"
PmiçAo corporal -,037 -,061 ,034 -.109 -.058 -.142 ,00«
ComunicaçAo ixmitN« -,158 -.115 -.104 -.208* -.235* -.107 -.270**
Comutw.*vfco (\nynUv« .315“ .615" ,550" ,442" .572" .3 32" ,5B3"
Modalo -.424" -,20 1 " -.438" -.455” -.332" -.228* -.30 8"
Santlmanto (los fllhos -.432“ -.372** -.571" -.480" -.403” -.253* -.45 4"
Clima con|ugd positivo -,283** -.128 -.213* -,488” -.284" -.123 -.311”

**. p<0,01
* p < 0,05

No que diz respeito às correlação dos escores combinados nas categorias de


conflitos com as dimensões da EQIF, podemos observar várias correlações significativas
(Tabela 2), confirmando portanto uma das principais hipóteses do presente estudo,
sobre a qual Weber & cols. (2005b) desenvolveram estudo preliminar, não encontrando
resultados significativos. Percebe-se uma correlação negativa entre as práticas não
coercitivas e o oscore dos conflitos. As dimensões comunicação negativa e clima conjugal
negativo tôm uma correlação positiva com todas as categorias do conflito ostudadas,
sendo importantos fatores de risco quanto a conflitos familiares.
É intorossante observar a falta de correlação do escoro dos conflitos com punição
corporal, fato que se repete entre as dimensões da EQIF com a freqüência, participação,
onvolvimonto afetivo e intensidade dos conflitos. Levantamos a hipótese de que esse fato
estaria relacionado à proposta do Verhofstadt & cols. (2005), segundo a qual as famílias
tenderiam a utilizar ropertórios similares tanto em situações de conflito quanto suporto.

46 l.idUi Nrtldlid Pohrlanskyj Weber, losafA Moreira Cunho


Chama também a atenção pequena correlação dos conflitos relacionados à
escola e as dimensões da EQIF, numa comparação com as outras categorias, sondo
que as relações positivas que encontramos são modelo e sentimento dos filhos.

4.1 Freqüência, participação. reação afetiva e intensidade dos conflitos


O toste Anova demonstrou que oxiste relação significativa entro o suporto
percebido pelos adolescentos o a freqüência dos conflitos (F = 8,494; p < 0,001), a
participação dos adolescentes nossos evontos (F = 10,494; p < 0,001), a intensidade da
reação afotiva (F = 8019; p < 0,01) e a intensidado desses conflitos (F = 6,394; p < 0,01),
sendo que essa relação foi nogativa.
Percebe-se nesse dado o suporto como um fator do proteção om rolação aos
conflitos, sendo quo cabe destacar a importância do uso do estratégias adoquadas do
solução de conflitos, jà que são estas, e não o teor do conflito em si, o fator mais
importante para o desenvolvimento desse adolescente (Steinborg & cols., 2002).
A rolação entre a freqüência dos conflitos foi significativa para o sexo do
adolescento (X? = 6,103; gl= 2; p < 0,05), sendo que entre os participantes do sexo
feminino a froqüência de conflitos ó mais alta. Não foram observadas relações signicativas
entre o soxo do adolescente e a participação, intensidade da reação afetiva e intensidade
do conflito, ombora possamos observar uma tondôncia de uma maior participação das
meninas durante conflitos (X2 = 5,547; 2; p < 0,06).
Não foram observadas relações significativas entro a freqüência, roação afetiva,
participação e intensidade do conflito e o tipo familiar, estado civil dos pais, classe
social e idade do adolescente.
No que diz respeito à intensidade dos conflitos, as pesquisas apontam para
um aumonto desta durante a fase inicial da adolescência. Entretanto, estudos sobre
conflitos entre pais e adolescentes falharam em corroborar a visão de que os conflitos
aumentam no início e diminuem ao final da adolescência (Laursen, Coy & Collins,
1998). Os resultados dessa pesquisa sugerem a necessidade de levar-se em conta
tanto a froqüência quanto a intensidade afetiva dos conflitos para uma descrição mais
precisa de sua trajetória ao longo desta fase. Os escores da freqüência, participação,
reação afetiva e intensidade do conflito entre si apresentaram correlações positivas
muito altas (Tabela 3).
Tabela 3: Correlação dos escores de conflitos por freqüência, participação,
reação afetiva e intensidade.

Partia paçflo Intensidade


FreqüAncn do da maçAo Intensidade
dos conflitos adolescente atetiva do conflito
Froqüénca dos conflitos .857** ,766** .810“
Participaçfto do adolescente ,857" ,762“ ,748**
Intormidade da r«Bçdo afetiva ,766** ,762** ,819“
Intensidade do conflito .810“ .748** .819“
“ p < 0,01

No que diz respeito às dimensões da EQIF, foram também observadas diversas


corrolações significativas (Tabela 4), sendo que a única dimensão não relacionada a
essas variáveis de conflito foi a da punição corporal, já discutida.

Sobre t'omport.imenlo e (.'oftni(do 47


Todas as dimensões relacionadas a práticas não coercitivas (relacionamento afotivo,
envolvimento, regras e monitoria, comunicação positiva) demonstraram estar associadas à
diminuição na freqüência, participação, reação afetiva e intensidade dos conflitos.

Tabela 4: Correlação entre escores de conflitos por freqüência, participação, reação


afetiva e intensidade e as dimensões da EQIF.

Pnrtlrlp*içAo IntnnnidndA
FrwqiiAnctn do da ronçAo Intonsldado
dou conflito» ttddoftanntn nfodvfl do conflito
Rnlnclonnmnnk) Motivo -.553** -,4B0‘ * -.492**
EnvoMmonto •,469** -.571“ -.501“ -,60fl*‘
Rngra* o mnnltortn -.283** -,394** -.2fl1** -,317“
Punição cofpofiil -.131 -.159 .017 -.058
OomunlonçAo poaltlvn •,24S* -.315** -.213* -.229*
Comunicação nngntlvfi ,6 31 " ,0 3 7 " ,711** ,625“
Morta lo -,451** -.445** -,5ie** -.505“
SnnVmflnto rios fHhos -.502** -.590“ -.805** -,564“
Clirrm nnn|iigfll poulttvo -.370** -,3Bfl** -.323** -.362“

** p<0,01
* p < 0,05

A comunicação negativa em especial, e o clima conjugal negativo, apresentaram


uma relação positiva bastante significativa em relação as variáveis da EQIF (Tabola 4),
reforçando os achados quanto aos temas dos conflitos, para os quais essas duas
variáveis apresentaram também relação positiva (Tabela 2).

4.2 Análise dos conflitos por categorias


Como um dos principais objetivos desse estudo foi relacionar aspectos da
interação familiar com o tema dos conflitos, realizamos testes de correlação de fatores
específicos de cada categoria destes, discutida a seguir.

4.2.1 Alcool e uso indevido de drogas


"Meu pai às veies bebe, e mesmo estando separado, minha màe briga com ele,
pois ainda moram na mesma casa“
Não foi encontrada a predominância do gênero masculino quanto ao uso indevido
do álcool (t = -1,843; p > 0,05) prevista na literatura (Kelly & col., 2003; Costa & cols.,
2004; Weber & cols. 2005b). Os dados observados reforçam os achados de Kelly & cols.
(2003)sobre o aumento na freqüência dos conflitos quando um dos membros da família
faz o uso indevido do álcool (F = 4,867; p < 0,01).
No que diz respeito ás dimensões da EQIF, não podemos afirmar com base
nas questões formuladas se o uso de álcool ocorre por parte dos pais, filhos, ou irmãos,
entretanto, observamos diversas relações significativas no que diz respoito ao uso
indevido de álcool e outras drogas (Tabela 5), sendo muito interessante a correlação
negativa com as dimensões positivas e positiva com as negativas.

’ IntKxJtulti-«* a wiANm) (Imm« catngwl«» com reU*» <ki mtoctaniKlot ao* trnna» dm (xxiditn, coluludo» no» r.o»noriWrion dou
oo <nwaVotiárk) da oonflllo«

48 l-idifl Natalia Doltriniiíkyj Weber, losafA Moreira Cunlia


Tabela 5: Correlação entre escores de fatores de conflitos envolvendo álcool e
drogas e as dimensões da EQIF.

Alguém em tu a caaa usa


drogas iiagais (maconha,
Alguém chega bêbado em caaa crack, cocaín a etc)
R eladonam onto afetivo -.213* -,210*
Envolvimento -,270** -.187
R eg ra i e monitoria -.235* -.073
Punição corporal •,021 ,234*
C om unicação po sitka -.178 -,014
Comurxcaçào n e ga iv a ,254“ ,164
Modelo - ,4 1 4 " -,243*
Sentim ento dos fUhoa -,375“ -.214*
Clima conjugal poaltlvo -.26 6“ -.173
.339“

** p<0,01
* p < 0 ,0 5

4.2.1 Viagens e saidas


“A liberdade (...) eles dâo liberdade pra gente falar tudo, mas na hora de Ir pra uma
festa nunca dá"
Quanto à freqüência das viagens, a única relação significativa diz respeito à
comunicação negativa. A relação de somente uma das dimensões da qualidade da
interação familiar com a freqüência das viagens e saidas sugere que os conflitos não
estão relacionados ao tema em si, mas a outros fatores relacionados a essas saídas,
como, por exemplo, o monitoramento, discutido a seguir.
A segunda questão sobre as viagens e saídas apresentou relação significativa
com as dimensões de comunicação, relacionamento afetivo, regras e monitoria (Tabela
6), e tinha por objetivo medir o conhecimento dos pais sobre a as saídas de seus filhos,
sendo essa uma importante estratégia de controle e monitoramento (Crouter & col.,
2002), importantes tanto para os filhos quanto para os pais que tem nas viagens e
saidas um importante fator de stress (Steinberg & col. 2002).

Tabela 6: Correlação entre escores de fatores de conflitos sobre viagens e saídas e as


dimensões da EQIF.

R«l»don«m»nt) aMiv» MM 71**


FnwMm«nk> .041 TW"
Ragral •munturia .000 ,M4"
Puntçtn wtpnrai 034 .Oflft

ComutaaçAontgaliva -.«O* ,WS”


MtaMu -.031 ,1»
ftanlinwolo dn* fita* .001 18A
CKma contm*1poMtlvo -.073 im

** p<0,01

Sobre Comportamento * Cognição 49


4.2.1 Relacionamentos extrafamiliares
"Eles náo concordam que eu tenha relacionamentos amorosos".
O sentimento dos pais em relação ás amizades dos filhos indicou relações
significativas com todas as dimensões da EQIF, com exceção da punição corporal. As
relações foram significativas e negativas para comunicação negativa e clima conjugal
negativo. E embora a literatura aponte para uma diminuição da influôncia dos pais na
escolha dos amigos (Steinberg & col., 2002; Rubin & cols., 2004), esse feedback positivo
dos pais através da comunicação do sentimento em relação às amizades demonstra
ser fator importante.
Já no que diz respeito aos relacionamentos amorosos, o sentimento dos pais
demonstra relação somente com a punição corporal e a comunicação positiva. Levando-
se em consideração que o amor ó influenciado por diversos fatores (Collins, 2003), não
ó possível fazer afirmações conclusivas.

Tabela 7: Correlação entre escores de fatores de conflitos envolvendo relacionamentos


extrafamiliares e as dimensões da EQIF.

Meus pais gostam das minhas Mous pais gostam dos meus
amizades relacionamentos amoroso»
Relacionamento afetivo ,321“ ,176
Envoi vlmenlo ,402“ ,1?«
Regras e monitoria .334“ ,132
Punição corporal .008 ,211*
Comunicação poalVva ,243* ,254*
Comunicação n#gulvn -,439“ -.186
Modelo ,309“ -.013
Sentimento d o i flh o * ,396“ ,004
Clima conjugal poelivo ,261“ .148

**• p <0,01
* p <0.06

4.2.1 Dinheiro e contas da casa


"Devido a falta de dinheiro meus pais ficam muito tempo sem se talar, o que cria um
ambiente ruim".
Confirmou-se a relação entre as dificuldades financeiras e a freqüência (F =
7,494; p < 0,01), participação (F = 3,924; p < 0,05), reação afetiva (F = 4,655; p < 0,05) e
a intensidade dos conflitos (F = 9,619; p < 0,001), sendo que nas famílias com maior
dificuldade financeira essas variáveis apresentam os mais altos escores, confirmando
os problemas financeiros como fator de risco para conflitos (Wadsworth & col., 2002;
Steinberg & col., 2002).
Vale destacar também a relação significativa entre a situação financeira da
família e várias dimensões da EQIF (Tabela 8), confirmando a importância da situação
financeira da família para a qualidade de interação familiar (Wadsworth & col., 2002).

50 Lidia Natalia Dobriantkyj Wfbcr, Jo»afA M orrira Cunha


Tabela 8: Correlação entre escores de fatores de conflitos sobre dinheiro e as dimensões
da EQIF.

Tomos dinheiro para pugar as


contas da casa
Ralactònamento afertivo ,266**
,307**
Ragras • monitoria ,096
PunlçAo corporal -.173
Comunicação positiva .110
Comunicação rmyadva •,331**
Modalo ,244*
Santlmento dos filhos ,309**
Clima conjugal posKivo ,187

** p<0,01
* p < 0 ,0 5

4.2.1 Tarefas
"Quando minha màe chega no meu quarto e está tudo bagunçado, ela começa a
brigar o meu pai se mete no meio e o 'bicho pega'...“
Observaram-se relações significativas entre a definição das tarefas e diversas
dimensões da EQIF (Tabela 9), sendo que curiosamente não se observou relação
significativa entre essa variável e a dimensão de regras e monitoria. Já a participação
dos adolescentes na tarefa tem uma relação significativa justamente com a dimensão
de regras e monitoria. Entretanto, não foram observadas relações significativas entre a
freqüência dos conflitos com definição (F = 1.538; p > 0,05) e participação do adolescente
nas tarefas (F = 0,424; p > 0,655). Também não foram significativas as relações da
intensidade dos conflitos com definição (F = 1,029; p > 0,05) e participação do adolescente
nas tarefas (F = 2,194; p > 0,05). Sobre essas variáveis seria esperada uma relação
significativa, com base no estudo de Eberly & col. (1999) que propõe esses fatores
como Influentes na intensidade e freqüência dos conflitos familiares.

Tabela 9: Correlação entre escores de fatores de conflitos sobre tarefas e as dimensões


da EQIF.

As tarafos « n minha casa estflo


dafinidan Participo das tarefas em casa
Nalactonflmankj atetlvo .288** .078
Envolvtmanlo ,293** ,039
Ragras • monitoria ,184 .221*
Punlçâo corporal ,093 .119
Comunicação poaitlw ,433** ,158
Comunicação nagatlva -.240* ,182
McxMo ,230* ,101
Santlmank) dos filhos .209” ,001
CNma coryugal poslüvo .162 ,083

** p«0,01
* p < 0,06

Sobrr Comportamento c CotinifAo 51


4.2.1 Escola
"Problemas com o colégio (...) nada de mais, apenas uma discussão e, no fim um
'acordo' para os problemas“.
Nas duas questões especificas sobre o desempenho escolar encontramos
uma relação significativa da primeira questão, relacionada à monitoria, com as
dimensões da EQIF (Tabela 10). A relação significativa e negativa do clima conjugal
negativo com o desempenho escolar era esperada (Chappman; 1996).
Tabeia 10; Correlação entre escores de fatores de conflitos sobre a escola e as
dimensões da EQIF.

Meus pais sabem como estou


me saindo na escola Meu desem penho na escola ó
Roladonamento afetivo .281“ -.064
EnvoM m ento .255* -.031
Regras a monitoria ,269“ ,005
P u n lç io corporal -.136 -.125
Comunicação positiva ,296“ ,070
Comunicação negativa -.320** -.183
Modelo .240* -.113
Sentimento do* filhos .151 -.044
Clima conjugal positivo .204* -.100

■ ■ - -J&L
**. p < 0,01
* p < 0.05

4.3 Conclusoes

Os dados da presente pesquisa revelam relações significativas entre os conflitos


familiares, e suas variáveis, com as dimensões da qualidade do interação familiar.
Além disso, ao fazer uma análise, mesmo que limitada, da relação entre o
suporte percebido com os conflitos, sustenta-se a tendência integrativa no estudo de
suporte e conflito (Verhofstadt & cols., 2005), sendo que um estudo pormenorizado
dessa relação possivelmente indicará estratégias importantes para se lidar com os
conflitos, sendo que essas estratégias possivelmente vão estar relacionadas também
ao tema dos conflitos.
Importantes direções para a prevenção de conflitos podem ser traçadas com
base nos resultados, e mesmo levando-se em consideração a inevitabilidade dos
conflitos entre adolescentes e seus pais, percebe-se claramente uma relação entre
fatores de suporte e fatores de risco para o adolescente, sendo que em ações educativas
direcionadas a pais ou adolescentes, como o treinamento de pais (Caballo, 2002;
Weber, 2005a; Weber, Brandenburg & Salvador, 2005c), por exemplo, no qual os pais
poderiam aprender estratégias mais eficazes para lidar com os diferentes conflitos.
Cabe notar que algumas dimensões da EQIF estiveram particularmente
relacionadas a formas mais positivas de lidar conflitos, em particular o relacionamento
afetivo, envolvimento, regras e monitoria, comunicação positiva, sentimento dos filhos e
o clima conjugal positivo. Juntamente, esses fatores podem ser considerados
indicadores de eixos de desenvolvimento para estratégias para lidar com conflitos

52 Lidifl Nalalia Dobrfanskyf Weber, losaíA M oreira Cunha


familiares, sendo que com o desenvolvimento destas dimensões podemos ter mais
adolescentes e pais vivendo em um ambiente familiar mais saudável.
Alóm disso, no que diz respeito ao estudo especifico dos conflitos, esse trabalho
oferece avanços no que diz respeito à mensuração dos conflitos, sendo que o
questionário de conflitos desenvolvido durante o estudo demonstrou-se um instrumento
digno de estudos posteriores visando seu aperfeiçoamento.
Os objetivos propostos para osso trabalho foram atingidos, observando relações
significativas nào só sobre os conflitos em si, mas tambóm com outros aspoctos da
vida do adolescente. Foi reforçada a afirmação sustentada em pesquisas intornacionais
de que os conflitos são normativos da adolescência (Steinberg, 2001), sendo que os
resultados aqui discutidos servem para que pais, profissionais o os próprios
adolescentes possam pensar om formas melhores para lidar com as dificuldades
nesse caminho sempre diferente que ó a adolescência. Espera-se, portanto, que esta
pesquisa tenha oferecido uma contribuição significativa para o progresso da análise
comportamental dos adolescentes e a relação destes com sua familia.

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[Resumo], junho, Buenos Aires, Argentina.

54 Lidia N íilalia »obrianskyj Wehcr, losafá M oreira Cunha


Capítulo 4
Regras e auto-regras: um estudo sobre o
comportamento de mulheres no
relacionamento amoroso1
M aria Cecília de Abreu e Silva *
Lidia Natdlia Pobridnskyj W e b e r'

Segundo Skinner (1975) o comportamento do homem é modelado pelas


contingências ambientais, e os seres humanos apresentam um subconjunto da classe
geral do comportamento modelado pelas contingências que é controlado por
contingências especiais denominadas regras. As características individuais das pessoas
foram e são construídas ao longo de suas histórias, as regras e auto-regras são
aprendidas e elaboradas desde a infância e exercem controle fundamontal no repertório
comportamental dos indivíduos (Skinner, 1975, 1982). Evidentemente são norteadoras
dos comportamentos das pessoas nas relações que estabelecem entre si e,
conseqüentemente, nos relacionamentos amorosos.
Enquanto os livros de auto-ajuda lotam prateleiras de livrarias com dicas o receitas
para relacionamentos bem sucedidos, é relativamente escassa a presença de estudos
científicos que discorram a respeito dos Relacionamentos Amorosos tendo como base a
Análise do Comportamento. O que se busca investigar, geralmente, são os comportamentos
mais freqüentes entre as pessoas envolvidas nesses relacionamentos, a partir de uma
análise dos repertórios comportamentais amorosos mais comuns na atualidade.
As relações amorosas implicam na interação entro duas pessoas com histórias
de vida diferentes e com características que não são necessariamente contingentes ao sou
sexo biológico. Segundo Possati (2002) as relações amorosas predizem um bom estar
psicológico. O desenvolvimento deste trabalho sustentou-se então na importância dos
relacionamentos amorosos como possíveis geradores deste bom estar, focando o
comportamento da mulher neste contexto e as regras que ela constrói em relação a esto
aspecto ao longo da vida. Buscou-se conhecer e estudar as regras e auto-regras que estão
presentes e são controladoras do comportamento de mulhoros no relacionamento amoroso,
bem como a origom e formulação de tais regras. Para tanto, foi realizado um ostudo de caso
múltiplo com duas mulheres com experiências distintas em relacionamentos amorosos.

1. Comportamento governado por regras


Na linguagem cotidiana a palavra regra é utilizada de muitas maneiras diferontos,
geralmente assumindo uma função normativa (Flores, 2004). Na literatura sobre o
1Trabalho derivado da monografia de conclusão do Curso de Pslcokigia da Universidade Federal do Paraná, de autoria da primeira autora,
orientada fxilw iwtguiKla milora
1 Oraduada em Psicologia pela UFPR
’ Psicóloga, mettre e doutora tmi Psicologia Experimental pela USP, Coordenadora do Núcleo de AiiAllse do Compotlamnnto
(www nac ufpr br). Professora da graduaçAo etn Psicologia e do Programa de Pós-Oradoav*" Mn EducaçAo da UFPR

Sobro Comport.imiTito c t'ognl(i1o 55


comportamento governado por regras, grande parte dos autores (Skinnor, 1975, 1982; Baum,
1999; Albuquerque, 2001; Matos, 2001;) têm considerado rogras corno estímulos
discriminativos verbais antecedentes que podem descrever contingências, isto é, que podem
descrever o comportamonto a sor emitido, as condições sob as quais olo deve ser emitido e
suas provávois consoqüôncias. O estímulo discriminativo vorbal controla o comportamento
da mesma forma que o estimulo discriminativo não-vorbal, apenas diferenciam-se na origom
do controle. Os estímulos discriminativos verbais estão ligados á história do reforçamento de
seguir regras, que goralmonto inida logo após o nascimento (Baum, 1999).
O uso cotidiano da palavra regra é mais limitado do que o significado tócnico
empregado pelos analistas comportamentais. As regras do cotidiano encaixam-se no
conceito de regra para a Análise do Comportamento, mas essa catogoria tambóm inclui
ostímulos que normalmente não seriam chamados de rogras. De acordo com
Skinnor (1982) instruções, conselhos, ordens, leis, folclores e provérbios são exemplos
particulares de regras, uma vez que todos descrevem contingências.
Desde muito cedo as pessoas estão expostas a diferentes contingências e o
comportamonto do seguir regras é modelado. Inúmeras vezes as crianças ganham
afeto ou aprovação após fazerem o que lhes podem. No inicio, as regras são verbalizadas
pela família, e depois pelos professores. Conseqüentemente, rogras são seguidas
porque o comportamento de seguir regras similares foi reforçado no passado (Matos,
2001; Skinner, 1982). Goneralizar o comportamento de seguir regras faz com que o
mundo continue, sem tal característica as possibilidades de cultura seriam limitadas
(Baum, 1999). Corroborando com este pensamento, Catania (1999) sugeriu que o
comportamento sob o controle de rogras ó determinado por uma história de reforço
social para responder de acordo com regras.
A regra sempre descreve sempre duas contingências: a contingência última e
a contingência próxima (Baum, 1999). A contingência última é aquela a "longo prazo” e a
razão primeira da regra, e a contingência próxima é a “curto prazo”, o reforço por seguir
a rogra. Diante da regra: "faça seu dever de casa para passar de ano", a contingência
próxima ó o motivo pelo qual o comportamento é denominado controlado por regras
(neste exemplo, o reforço proveniente dos país ou professores por seguir a regra) ao
passo que a contingência ultima (para passar de ano, neste caso) justifica a existência
da contingência próxima o do comportamento de seguir regras, porque incorpora uma
relação entre comportamento e conseqüência.
Nem sempro as pessoas entram em contato com as contingências últimas e ó
suficiente que aconteça à apenas uma pessoa, porque os membros de uma mesma
cultura aprendem rogras uns com os outros. O importante em uma regra é o fato de
fortalecer um comportamento que só trará compensações depois de certo tempo, mas
extremamente relevante ó a contingência em longo prazo que está indicado (Baum, 1999).
Outra importante função das regras ê simplificar as contingências de reforço,
principalmente quando estas contingências são complexas, pouco claras, atuam apenas em
longo prazo ou são pouco eflcazes. Regras também têm o efeito de ampliar o repertório dos
indivíduos, uma vez quo, ao descreverem as contingências de reforço, permitom aos mesmos
ontrarom orn contato com contingências que talvez nunca fossem contatadas naturalmonto.
Um probloma, no entanto, ocorre quando as contingências mudam e as regras não. Nosto
caso, sogundo Skinnor (1975), estas podem mais atrapalhar do que ajudar.
Skinner (1975) afirma que, embora as rogras possibilitem aos membros de
uma cultura comportar-se eficientemente sem estar em contato com as contingências,
o controle por rogras não rosulta apenas em vantagons. A vantagem do comportamonto
governado por regras ocorre quando as contingências são estáveis. Quando as

56 Mciria Crcflid de Abreu c Silvd , LltlU NdlalM Pobrí.mskyj Wcbcr


contingências não são estáveis, as regras podem ser problemáticas, considerando a
possibilidade do comportamento não se alterar, na medida em que continua seguindo
a mesma regra, mesmo que a contingência tenha mudado (Nico, 1999).
Meyer (2005) demonstra que as regras podem produzir uma redução na
sensibilidade comportamental às contingências. Quando as contingências mudam,
tornando as regras discrepantes das contingências, o comportamento estabelecido
por regras tem menor probabilidade de mudar acompanhando tais modificações do
que o comportamento inicialmente estabelecido por modelagem ou reforço diferencial.
Isso significa que o comportamento estabelecido por regras parece pouco sensível a
alterações nas contingências de reforço.
O conceito de insensibilidade ó relativizado por Nico (1999) que argumenta que
a insensibilidade parece ser a característica de não-alteração do comportamento a
despeito da mudança nas contingências implicar perdas de reforço. Pode-se afirmar
que na identificação da insensibilidade enfatiza-se a relação entre a resposta descrita
na regra e a conseqüência diretamente por ela produzida. Nico, entretanto, questiona o
termo "insensibilidade às contingências”, pois este soaria “como um contra-senso
dentro do corpo teórico da Análise do Comportamento” (p. 36).
A investigação de variáveis responsáveis pela manutenção de uma resposta é
sugerida por Nico (1999): o comportamento apenas “aparentemente parece ser
insensível às contingências” (p. 37). Há, ainda, duas possibilidades do explicação para
este padrão dito insensível. A primeira possibilidade está na suposição de que o emissor
da regra emita reforços contingentes ao seguimento desta. Neste caso, não ê possível
classificar este comportamento como insensível às contingências, pois ele é contingente
as conseqüências sociais. A segunda probabilidade é apresentada diante da seguinte
situação: as conseqüências (direta ou social) responsáveis pela manutenção do
comportamento não mais são produzidas, e a despeito deste fato a resposta continua
sendo emitida. Neste caso, tal esquema não basta para dizer que o comportamento é
insensível as contingências, pois o comportamento pode estar em esquema de
resistência à extinção. Para Nico é preciso que os reforços sociais contingentes à regra
sejam considerados, assim como os estudos a respeito da resistência à extinção,
antes de classificar tal comportamento como insensível às regras.
1.1 Auto-regras
A comunidade verbal ensina um indivíduo a descrever seu comportamento e a
identificar as variáveis das quais esse comportamento é função. Quando estas
descrições controlam os comportamentos do descritor ou do ouvinte, elas deixam de
ser meras descrições e se tornam regras. Entretanto quando elas são formuladas ou
reformuladas pelos indivíduos cujo comportamento passam a controlar, chamam-se
de auto-regras (Jonas, 1997). Alguns autores têm estudado as auto-regras e a sua
relevância no controle do comportamento humano (Banaco, 1995; Jonas, 1997; Meyer,
2005). Jonas define as auto-regras como “estímulos verbais especificadores de
contingências que são produzidos pelo comportamento verbal do próprio indivíduo a
quem estas contingências se aplicam” (p. 145).
Meyer (2005) contribui na formulação da definição das auto-regras ao dizer que
os seres humanos seguem não apenas as regras apresentadas pelos outros, como
também formulam e seguem suas próprias regras. Quando estas são formuladas ou
reformuladas pelo indivíduo cujo comportamento passam a controlar, são auto-regras.
Neste caso, uma parte do repertório do indivíduo afeta outra parte deste repertório. As
auto-regras podem ser explicitadas publicamente ou podem ocorrer de forma encoberta
quando o indivíduo pensa (Jonas, 1997).

Sobrr Comport«imrnto c C'oj}niç«1o 57


Skinner (1975) sugere que um indivíduo cujo comportamento é suscetível a um
conjunto de contingências pode formular auto-regras a respeito dessas contingências,
sendo que elo próprio pode então reagir mais eficazmente quando o controle por estas
contingências estiver enfraquecendo. Formular auto-regras é um repertório fundamental
e importante, principalmente nos casos em que o comportamento gerador de problemas
está sob maior controle das contingências diretas e imediatas (Meyer, 2005).
Assim como no comportamento controlado por regras, não ó somente o
comportamento produzido pelo seguir a auto-regra que è reforçado, mas também o
comportamento de formulá-las. Mesmo que seguir a regra não resulte em
conseqüências naturais que mantenham esse comportamento, o comportamento de
formular regras poderá ocorrer devido às conseqüências sociais (Jonas 1997).
As pessoas podem ter seus comportamentos controlados por auto-regras que
não especificam uma contingência verdadeira, o que seria causador de sofrimento
(Banaco, 1995). Segundo Meyer (2005), as desordens na formulação de auto-regras
podem ocorrer de duas maneiras básicas: a pessoa falhar na formulação do regras ou
formular regras de maneira imprecisa ou irrealista.

2. Relacionamentos amorosos
Estudos realizados no Brasil e também presentes na literatura estrangeira
demonstram uma variedade de pesquisas que enfatizam diversos aspectos das relações
amorosas e que buscam compreender melhor este componente da vida humana
(Cordova e Jacobson, 1999; Amélio, 2001; Ayala, 2001; Kiecolt-Glaser & Newton, 2001;
Rochlen e Mahalik, 2004; Kenrich, Sadalla, Groth e Trost, 1990; Sternberg, 1991, 1998;
Otero e Ingberman, 2004).
Algumas pesquisas, ao abordarem a questão da oscolha do parceiro, reportam
que tanto homens como mulheres têm preferências claras sobre certas características
físicas do parceiro que os atraem para um relacionamento casual, sem muito
comprometimento (Buss & Schmitt, 1993). Para relacionamentos mais sérios, com
maior comprometimento e envolvimento das partes, as mulheres tendem a considerar
em menor intensidade os atributos físicos que as atraem. Kenrich, Sadalla, Groth e
Trost (1990) concluem que as mulheres são mais criteriosas ao escolherem parceiros
para qualquer nível de envolvimento, enquanto os homens o são apenas quando
escolhem parceiras para fins de casamento. Neste caso, os homens procuram em
suas parceiras características como bondade, entendimento e habilidades para cuidar
de filhos, mas diferentemente das mulheres a atratividade da parceira tem uma
importância desproporcionalmente maior do que as outras qualidades (Buss, 1999).
A escolha do parceiro é também o foco de muitos estudos baseados em teorias
evolucionistas, que propõem que a atração física tem um papel muito importante na
escolha de um par romântico, pois Indicaria qualidades genotípicas e fenotlpicas de
fertilidade e potencial reprodutivo (Morris, 1996).
Um outro olhar para o evento de escolha do parceiro amoroso é feito por Otero e
Ingberman (2004), que indicam que as afinidades e diferenças existentes entre as pessoas
podem ser consideradas critérios de escolha. As semelhanças existentes entre os
parceiros levam a interações reforçadoras, auxiliando na escolha do parceiro. Os fatores
mais freqüentes são: tipo de educação, valores de vida, projetos para o futuro, escolha de
atividades e interesses parecidos. As afinidades os atraem e são vistas como elementos
de atratividade facilitadores para uma convivência futura. Por outro lado, as diferenças
existentes podem também funcionar como critérios de escolha, e serem vistas como

58 Cccllui de Abreu eSilv.i , l idui N.il.ilui Pobri.inskyi Weber


fatores de complementação, de enriquecimento. Os mais comuns, entre esses fatores,
são: maneira de ser, diferenças de opiniões, afazeres, gostos, interesses. No segundo
caso, cada parceiro atua, ora como controlador, ora como suplemento do outro.
Neste mesmo sentido, Amélio (2001) ao descrever os princípios que regem a
seleção de parceiros cita os princípios da homogamia, da heterogamia e da
complementaridade. Os princípios podem funcionar para a escolha de um grupo de
atributos, e não funcionar para outro grupo. Por exemplo: pode-se buscar alguém com
valores e religião semelhantes, porém, com características físicas diferentes.
Complementando os estudos acerca dos relacionamentos amorosos, Otero e
Ingberman (2004) discorrem a respeito de duas etapas da relação amorosa: o namoro
e o casamento, e sobre como, com o passar do tempo os problemas podem vir a surgir.
A fase do namoro é aquela em que as pessoas explicitam suas melhores idéias, a
melhor maneira de ser e de resolver questões divergontes, pois se conquistam visando
uma vida futura. Os encontros são mais esporádicos e quase sempre tem por objetivo
a recreação, o lazer e o prazer. As diferenças e semelhanças potencialmente conflitantes
geralmente não costumam se caracterizar como problemas nessa fase.
Após o tempo de convivência do namoro, e decidirem viver juntos, o aumento
do tempo compartilhado permite que os casais revelem suas características individuais,
estados de humor, hábitos de vida e preferências pessoais. Beck (1988) diz que casar
ou viver junto é bem diverso das demais formas de relacionamento vividas. Para Lazarus
(1992), na maioria dos casamentos bem sucedidos as pessoas compartilham liberdade
e espaço mútuo, contanto, nem sempre nessa fase desejam as mesmas coisas ao
mesmo tempo e da mesma maneira.
Segundo Lazarus (1992), a maioria dos casais se juntam cheios de sonhos e
expectativas irreais. Cada cultura, em sua especificidade, transmite conhecimentos, o
que alguns autores chamam de mitos relativos aos relacionamentos amorosos (Beck,
1988; Lazarus, 1992, Sternberg, 1991). Com base em alguns estudos Lazarus (1992) e
Stemberg (1991) relacionaram uma série de mitos conjugais que representam uma
crença errônea que geralmente leva a insatisfação nos relacionamentos.
Alguns mitos descritos por Lazarus (1992) merecem ser citados, pois podem
igualmente ser observados na cultura em que nos encontramos inseridos, e também
são descritos pela comunidade verbal que nos rodeia, alguns até mesmo em forma de
provérbios e ditos populares, tais como: marido e esposa sáo os melhores amigos; o
romantismo do casal faz uma boa relação: uma relação extraconjugal destrói o casamento;
marido e esposa devem fazer tudo juntos; é preciso lutar para salvar o casamento; num bom
relacionamento, um tem confiança total no outro; um deve fazer o outro feliz num
relacionamento; num bom relacionamento um pode descarregar “tudo" um no outro; os
bons maridos consertam tudo em casa e as boas esposas fazem limpeza; ter um filho
melhora um mau casamento; os que amam de verdade adivinham os pensamentos e
sentimentos do outro; um casamento infeliz 6 melhor que um lar desfeito; as pessoas
podem transformar o parceiro em uma pessoa melhor; os opostos se atraem e se completam.
Sternberg (1991) também descreve alguns mitos sobre o amor, e diz que as
pessoas são influenciadas por estes conhecimentos difundidos popularmente. Multas
vezes, diante do fracasso dos relacionamentos culpam a si mesmas, ao Invés de
questionar suas premissas básicas. A pesquisa cientifica, segundo este autor, revela
que muitas destas idéias sobre amor, que são aceitas como fato, são falhas. E que as
pessoas dificilmente comparam a realidade que se apresenta com a Idéia. Neste sentido,
há um abismo, entre as expectativas culturais e as circunstancias reais.

Sobre Comportamento r Coflniçdo 59


De acordo com Sternberg (1991) as pessoas aceitam esses mitos sobre os
relacionamentos porque aparentemente fornecem "instruções" sobre como agir (e obter
sucesso) nas relações amorosas. Para ele, o primeiro passo para um relacionamento
inteligente é verificar a falsidade dos mitos comuns sobre o amor. O autor também cita
algumas idéias, transmitidos pela comunidade verbal, que podem ser causadoras de
problemas nas relações: o amor conquista tudo; paixSo e sexo são mais importantes no
começo de um relacionamento; a "química“ 6 essencial no relacionamento; os casais
devem se amar mais do que amam qualquer outra pessoa.
Os mitos conjugais descritos por Lazarus (1992) e Sternberg (1991) podem, sob a
perspectiva da Análise do Comportamento, serem percebidos como exemplos de regras e
que transmitidas culturalmente ou formuladas a partir das experiências individuais funcionam
como estímulos discriminativos verbais controladores de comportamentos no relacionamento
amoroso. Ao ouvir histórias ou observar modelos de interações amorosas, as pessoas
passam a agir conforme as contingências descritas pelas regras. Como nem sempre as
contingências descritas pelas regras são estáveis, e como muitos de tais ditos populares
foram formulados em outra situação histórica e cultural é possível que tais "mitos" levem a
problemas por não condizerem à realidade em que estão sendo aplicados.
Segundo Otero e Ingberman (2004) é possível que, com o passar do tempo, as
características que atraíram o casal passem a ser geradoras de conflito, e tornem-se
fontes de punições mútuas, privando ambos os parceiros de reforços e expondo-os a
estímulos aversivos. Além disso, com o passar do tempo os parceiros tornam-se monos
tolerantes com as diversidades do cotidiano, e podem passar a agredir-se ou interagir
coercitivamente Otero e Ingberman também descrevem a polarização, ou seja, quando
o relacionamento ruim transforma as diferenças em deficiências, fazendo parecer
maiores do que realmente são.
Os casais que estão em um relacionamento satisfatório buscam o
desenvolvimento da afetividade conjugal e não a excitação romântica, e tem como base
a capacidade de negociar, transigir e evitar papéis rígidos. Isso presume um grau de
maturidade em que ambos são conscientes que são responsáveis pela construção e
preservação da felicidade deles (Lazarus, 1992). Além disso, quando um cônjuge deixa
de perceber o outro como uma pessoa única, com direitos, privilégios e destino próprio,
as conseqüências são bastante negativas para o relacionamento.
Os relacionamentos amorosos podem influenciar de maneiras positivas ou
negativas outros aspectos da vida das pessoas. Kiecolt-Glaser & Newton (2001) realizaram
uma revisão em artigos na última década, buscando evidências sobre a relação marital,
sugerindo que o bem estar matrimonial é conseqüência de uma boa saúde, e que aspectos
negativos da interação conjugal influenciam direta e indiretamente a saúde em doenças
como depressão, problemas cardíacos, desordens endócrinas, entre outras.
Rochlen e Mahalik (2004) demonstraram que as mulheres que perceberam
em seus parceiros aspectos como sucesso, poder e competição em detrimento de
comportamento afetuoso e emotivo obtiveram os escores mais altos nas escalas de
ansiedade e depressão. Neste mesmo sentido, Possati (2002) discorre sobre a
associação entre relacionamentos de qualidade e o bem estar psicológico, pois seriam
protetores contra eventos estressantes. Por outro lado, situações de conflito nessas
áreas podem ter um efeito devastador como evento estressor.

2.1 O papel da mulher no relacionamento amoroso


Para tentar compreender o comportamento de mulheres no relacionamento amoroso
toma-se necessário fazer uma breve discussão a respeito da formação de identidade e papel

60 Miiria Crcfliii dc Abreu c Sllv.» , l.ldl.i |)obri<in*kyj Weber


sexual. Sabe-se que a identidade feminina, bem como o papel da miilhor na sodedade e nas
relações que estabelece sofreu grandes transformações nas ultimas décadas.
O movimento feminista, iniciado após a Revolução Francesa, que a principio
reivindicava molhores condições do trabalho para as mulheres e direito ao voto, teve grande
repercussão om todo o mundo, e os osforços para a construção de uma idontidado feminina
e garantir a liberação soxual da mulhor ganham forca a partir da década de 50 (Coelho, 2002)
Importantes mudanças ocorrom com a liberação soxual: os meninos oxpressam mais sous
sontimontos. deixando transparocer fragilidade, o que era bem diferente nas décadas 50, 60
e 70. Com a pílula anticoncepcional as mulheres passam a ter controle sobro o próprio corpo,
as manifostações da sexualidade se transformam. A emancipação feminina possibilita
mudanças no amor, casamento bom como nos papéis sociais o na atividado profissional
(Benedetto, 2003).
Homons o mulheres não tôm que cumprir papéis sociais o sexuais definidos e
estagnados como nas décadas passadas. Novas formas de exprossão estão se
desenvolvendo e facilitando os relacionamentos humanos. Em tese, cada pessoa pode fazer
suas opções sexuais baseadas em seus próprios princípios, valores e proforèndas (Benedetto
2003). Atualmento, há um processo do democratização das relações pessoais, e o casamento
marcado pela dominação masculina vem dando lugar a uma relação fundamentada na
amizade e no companheirismo, onde a mulher negocia e reivindica igualdado.
Biasoli-Alves (2000) constata que há uma nova forma da mulher ser considorada. A
imagem de ser frágil e necessitado de proteção, sob o domínio dos sentimentos, atuando na
intimidade o presa aos cuidados com a prole, ganha outros contornos, fazendo dela um ser
om construção, na busca de seu desenvolvimento e realização de potencialidados,
Beauvoir (1980) ao afirmar "ninguém nasce mulher: toma-so mulher” demonstra
que há uma construção acerca do papel que a mulher exerce em suas relações. Desta forma,
muitas características universalmonte consideradas femininas, tais como passividade,
sensibilidade, dependência, sentimento maternal, podem estar relacionadas a valores
socialmente transmitidos. Segundo Sant’ Ana (2003) o papel soxual, ou papel de gênero é o
conjunto de normas referentes às atitudes, valores, reaçôos emocionais e comportamentos
que são considerados apropriados a cada sexo em uma cultura e momonto historicamente
determinados. Sob este ponto de vista, as características habitualmento apresentadas por
homens e mulhores também não são necessariamente contingentes ao sou sexo biológico.
Em suas pesquisas Franchetto, Cavalcanti e Heilbom (1981) demonstram que algumas das
características femininas são construções sociais, e por isso mesmo passaram pelas
transformações históricas e culturais vivenciadas nas ultimas décadas.

3. Método
Participantos
Participaram desta pesquisa duas mulheres com diferentes níveis de formação
o com experiências variadas em relacionamentos amorosos. Para preservar a identidado
das participantes, optou-se em chamá-las por um nome fictício. A seguir segue a
identificação e breve descrição das participantes:
Maria: 27 anos, solteira, terceiro grau completo. Pedagoga om uma escola, mora com a
irmã e não tem filhos. No momento da entrevista estava namorando havia seis meses,
a relação mais longa depois do primeiro namoro de dois anos (aos 15 anos do idade).
Ana: 30 anos, casada, segundo grau completo. Manicure, mora com o marido do 33
anos e o filho de 12 anos. Casou grávida há 13 anos.

Sobrr l'omport.imcnto c Cognifilo 61


Instrmrmntas
Foi utilizado um roteiro de entrevista previamente elaborado, com base no estudo
e revisão bibliográfica realizados. O roteiro abrangia aspectos como: dados pessoais,
situação amorosa atual, histórico em rolacionamentos amorosos, histórico familiar,
regras e auto-rogras prosontos no comportamento no relacionamento amoroso.

Procedimentos
Esta pesquisa foi dividida em duas etapas: contato próvio com as provávois
participantes o postorior realização das entrevistas. No primeiro contato foi esclarecido
o procodimonto, o objetivo e a importância da posquisa. Após assentirom a colaboração
para o estudo as participantes assinaram o Termo de Consentimonto Livro e Esclarecido.
A sogunda etapa consistiu na realização de entrevistas semi-ostruturadas. Foi realizada
urna ontrovista com cada participante.

Análise dü dados
Os dados foram analisados e codificados através do mótodo da análiso de
contoúdo, segundo a perspectiva de Bardin (1977). A análise de conteúdo foi realizada
em três fases: pró-análise, exploração do material e tratamento dos rosultados e
interpretação. O conteúdo das entrevistas foi agrupado por tomas, sondo eles: escolha
do parceiro, exposição dos sentimentos e comunicação, fidelidade, expectativas do
papel da mulher e percepção do próprio papel no relacionamonto amoroso.

4. Resultados e Discussão
Escolha do parceiro
O comportamento diante da escolha do parceiro pode ser influenciado por três
fatores: universais (relativos á espécie humana), culturais, e individuais (Amólio, 2001).
Sendo assim, ainda que muitos dos comportamentos de atração sejam regidos pelos
princípios evolucionistas de preservação e aprimoramento da espécie, a história de
aprendizagem irá delimitar as características que cada um considera no momento da
escolha e idealiza no parceiro.
Na tabela seguinte, é possível observar na fala de Maria acerca de alguns
aspectos importantes na seleção de parceiro amoroso.

Tabela 1: Apresentação das frases rolatadas por Maria e Ana sobro as caractoristicas do parcoiro.
MARIA
“Eu queria um cara bonito, e ele è feio, è japonAs. E me surpreendi, porque eu
nunca achei que fosse gostar de um cara que eu nflo acho bonito"

"E tambAm me Implico com homem meloso, grudento, nflo dá certo comigo"

De acordo com sua fala ó possível formular a hipótese da existência de regras


regentes de seus comportamentos na escolha do parceiro Ao falar "quem è que pensa
que vai gostar de um japonês" Maria indica que ela havia feito formulaçõos prévias
sobro a aparência física ideal do um parcoiro (noste caso, provavolmento um homem
que ola achasse bonito), o ser japonês não estava dontro dossa classificação.

62 Miiri.i C'ctlli.1 de Abreu e Mlv.i , I Ull.i N.if.ill.i Pobrl.mskyj Weber


Desta forma, a provável auto-regra "só vou gostar de quem acho bonito” pode ter
assumido a função de um estimulo discriminativo que lovou Maria a olhar os homens
que não considerasse bonito com desinteresse amoroso, que é o que ela relata ter
acontecido com seu atual relacionamento: "nunca tinha me interessado por ele antes,
porque ele nào è bonito e a gente quase não conversava”. O que parece tor funcionado
como atrativo, neste relacionamento, não foram as características físicas, mas
provavolmento outras, já que a entrevistada diz que antos do iniciarem o namoro ola e o
namorado já se conheciam.
Alóm da aparôncia física, a partir do relato de Maria percebe-se que ela discrimina
outras características que considera importantes na questão da escolha do parceiro. Ao
dizer "homem meloso, grudento, nào dá certo comigo", ó possível que Maria tenha
aprondido a partir de experiências anteriores que ó importante para que um
relacionamento seja bem sucedido que o homom omita comportamentos concorrentes
a “ser meloso, grudento".
Tabula 2: Aprosontação das frases relatadas por Ana sobre as características do parceiro.

ANA

"... para mim o mais importante 6 alguém que mande om mim, que me dé uns
empurrâo. (sicï. Senôo nôo vou para frente".

“Terri que ter afinidade".

A entrevistada Ana não cita características físicas, porém especifica que


precisa de alguém que “mande" nela. Ao relatar esta frase, Ana demonstra um
padrão correspondente ao descrito por Otero e Ingberman (2004), que relatam que
as diferenças existentes podem funcionar como critérios de escolha, e serem
percebidas como fatores de enriquecimento. Amélio (2001) diz que as pessoas
podem seguir mais de um principio na escolha de diferentes características do
parceiro. Ana, ao dizer que o parceiro "tem que ter afinidade" demonstra também
possuir regras que regem sua escolha sob o princípio da homogamia. Segundo
Amélio, este princípio é o mais importante da seleção de parceiros, e quando as
pessoas possuem características comuns entre si ó grande a chance dos
relacionamentos serem bem sucedidos.
Embora não seja possível a partir das entrevistas saber ao certo a origem
das regras controladoras dos comportamentos de escolha do parceiro, é possível
hipotetizar que as mesmas foram formuladas após as experiências vividas e
observação de outras relações.

Exposição dos sentimentos e comunicação


A exposição dos sentimentos é um fator de importância nos relacionamentos
amorosos. De acordo com Cordova e Jacobson (1999) a comunicação insatisfatória
em um relacionamento pode ser destrutiva, e muitos problemas são exacerbados
pela maneira como os parceiros se comunicam. As falas de Maria sobre este aspecto
podem ser vistas na tabela 3.

Sohre Comporta mento e Cofinlç.lo 63


Tabula 3: Apresentação das frases relatadas por Maria em relação à exposição dos
sentimentos

MARIA

1 "Geralm ente aquele que m ostra o que sente, que deixa o outro m uito
confiante bô bg ferra".
2. "Sou um a petisoa por n a tu re /a m uilo fechada, ao m enos em aspecios sérios
e pessoais Náo consigo nem contar pra ele a história com meu» pais. tipo até
hoje ele náo sabe por q u * eu nâo falo com m au pai... Im agina se eu tiver que
falar com ele dos m eus d e leito * simplesm ente nAo consigo".

3. "Sei lá, eu lento m anter uma postura de forte, te nho receio de falar para ele
colBas importantes sobre m im '

4. "Sou super insegura, tenho um monte de fantasm as e traumas. Sô que nflo


te nho moral, nem coragem. nem o hábito de falar isso pra ninguám . Acho que
o R m esm o nflo entende as mtnhas «Mudes porque me conheceu na versflo
m ulher m oderna super segura e bem resolvida.*.

Maria relata contingências passadas relacionadas ao comportamento de expor


os sentimentos. Ao falar da mãe relata que "... ela não era muito aberta, nào falava que
gostava de mim, e a gente nem falava das coisas do colégio. Ela era fechada, comigo,
com meu pai, com meus irmãos. Sô teve uma vez que ela disse que me amava. A gente
não expressava os sentimentos lá em casa". Pode-se se supor que Maria generalizou
para o relacionamento amoroso o padrão comportamental que ela mantinha com as
possoas de sua família.
Maria na situação da entrevista, disso acreditar quo "aquele que mostra o que
sente, que deixa o outro muito confiante, só se ferral Pode-se imaginar que esta seja
uma regra fortemente controladora de suas atitudes nos relacionamentos. A entrevistada
relata que não consegue falar para o namorado muitas coisas importantes sobre si, e
também fala que isto tem sido gerador de problemas: "um dos grandes problemas da
minha relação ó eu conseguir falar tudo isso que eu acho". De acordo com Otero e
Guerrelhas (2003) os problemas vividos por um casal, na maioria das vezes são
desencadeados pelas dificuldades relativas à comunicação entre eles.
A entrevistada Ana também discorreu sobre a exposição dos sentimentos e
idéias em seu casamento. Algumas frases podem ser observadas na Tabela 4.

Tabola 4: Apresentação das frases relatadas por Ana em relação à exposição dos
sentimentos e comunicação.

ANA

1. “Olha, tem dias que nAo dA nem para falar com «lei Vai falar alguma coim |A
leva grosseria. Oal eu lenho que ficar quieta'.
2. "E «ii sinto muita lalla, de ter alguém (Mira convarsar"
.1. "Mas Iam cotsas que au nâo posso conversar com ele Por exemplo, isso da nu
sentir falta de ter amiga. Sei que se eu falar para ale, ele vai ficar louco)".

Pode-se imaginar, a partir do relato de Ana quo ola seja controlada


coercitivamente pelo seu marido. Estando privada de uma pessoa com quem possa
conversar, ola não o faz com companheiro, e relata receber punição quando o procura
para conversar; "vai falar alguma coisa já leva grosseriá'. Otero e Ingberman (2004)

64 M.trlii C fdli.i de Abreu c Silva , I lillit N.it.ili.i Pobri.tnskyj Wcbcr


expõem que com o passar do tempo ó comum que os parceiros tornem-se intolerantes
e comecem a agredir-se ou a interagir coercitivamento, como descreve Ana. De acordo
com Cordova e Jacobson (1999) muitas vezes os parceiros lançam mão da coerção
para obter mudanças no relacionamento, e a coerção, lamentavelmente, se mostra
bastante eficaz. Além disto, Ana relata uma repetição do que viveu em sua família de
origem, uma vez que diz ter recebido uma educação bastante autoritária e coercitiva,
com um padrão de interação bastante similar ao seu casamento.
Sendo assim, ambas as entrevistadas relataram diferentes aspectos
controladores de seus comportamentos de exposição de sentimentos e comunicação
na relação amorosa. Ao que parece, o comportamento de Maria é relativamente controlado
pelas regras, e não necessariamente as contingências estão submetidas ao mesmo
osquema, gerando problemas a ela. No relato de Ana, sobressaem relatos de
comportamentos controlados diretamente pelas suas conseqüências. A história individual
de cada uma, bem como a historia de vida do marido/namorados são fatores igualmente
Importantes que devem ser considerados na análise de tais comportamentos.

Fidelidade
Embora muitas civilizações humanas sejam poligâmicas, (Morris, 1996) na
cultura ocidental a fidelidade ó um aspecto bastante considerado nos relacionamentos
amorosos. A fala de Maria sobre fidelidade e traição pode ser observada na Tabela 5.

Tabela 5: Apresentação das frases relatadas por Maria em relação ao tema fidelidade.

MARIA
1 "É uma crença muito forte, de que não existe fidelidade de que não podo
haver uma rolação perfeita Continuo acreditando nisso! Nâo existe monogamia
absoluta, fidelidade incondicional. É minha concepção da coisal Senão porquo
todos os relacionamentos fracassariam?".
2 “Aprondi que nas relações sempre vai ter alguém que explora o alguóm se ó
oxplorado Alguém que engana e alguém que ó enganado... o quo trai e o que
é traldo. Se vocè não é um, é outro. Vocé escolhe o papel que vai assumir! Isso
foi em todas as minhas relaçõesl E eu vejo isso no namoro e casamonto de
todas as minhas amigas. Geralmente aquele quo mostra o que sente, que deixa
o outro muito conflanto só se forra."
3. "... as pessoas se perdem com o passar do tempo! Não existe amor, paixão
que supere Tenho certeza disso! Dai rola traição, essas coisas... Eu sou bom
radical om rolação a isso! E profiro ficar solteira a ter que superar uma traição".

De acordo com o relato de Maria ó possível hipotetizar a ligação entre sua


história de aprendizagem, as contingências passadas e as regras sobre traição e
fidelidade. Sua experiência passada de ter vivenciado em casa a infidelidade de seu pai
no casamento com sua mãe serviu como modelo, e resultou na provável formulação
regras, que, de acordo com seu relato, sempre controlaram seu comportamento em
seus relacionamentos: M já trai muito".
A provável regra "sempre vai ter o que trai e o que é traldo" pode ter servido como
estimulo discriminativo para o comportamento de Maria de trair. Contudo, a contingência
atual parece ter mudado, pois neste relacionamento a entrevistada diz estar

Sobrr Comportamento c Cofjniç.lo 65


emocionalmente envolvida, o que não acontecia em seus relacionamentos anteriores.
Nesta situação, Maria é fiel, e como conseqüência desconfia do comportamento do
namorado, como pode ser percebido em seu relato: "tenho tido discussões com meu
namorado porque ele fala que eu sou muito desconfiada".
No caso de Maria a provável regra "não existe fidelidade" não se aplica às
contingências atuais, e ainda que tenha sido formulada com base na observação de
outros relacionamentos e tenha funcionado anteriormente, atualmente tem gerado
problemas para Maria na sua relação amorosa.
O tema fidelidade não foi amplamente investigado na segunda entrevista. Ana
relata que nunca traiu e que acredita que seu marido é fiel.

Expectativas sobre o papel da mulher


O papel da mulher no contexto familiar brasileiro tem passado por mudanças
continuas (Biasoli-Alves, 2000; Coelho, 2002; Benedetto, 2003; Sant'Ana 2003). A
diversidade de expectativas sobre o papel da mulher pode ser notada nas duas
entrevistas. O relato de Maria sobre as expectativas sobre o papel da mulher é
apresentado na Tabela 6.

Tabela 6: Apresentação das frases relatadas por Maria sobre expectativas do papel da
mulher.

MARIA

1. “Eu acho que a mulher precisa ser protegida, paparicada, mas tem que ser
independente. Se acontecer qualquer coisa ela toca a vida sozinha"
2. “... ela (a mâe) dizia que eu tinha que estudar, ter uma profissão, para não
depender de homem nenhum E eu acho que esse foi o conselho que eu mais
segui".

A partir do relato de Maria é interessante observar como as contingências


passadas podem estar relacionadas ao papel da mulher no relacionamento, uma vez
que podem ter colaborado na elaboração de regras sobre este assunto. Maria, ao
relatar que sua mãe dizia que tinha que estudar, ter uma profissão, para que não
dependesse de homem nenhum, reconhece que este foi um conselho o qual ela seguiu.
Baum (1999) diz que o conselho especifica um comportamento e implica conseqüências
positivamente reforçadoras. As conseqüências reforçadoras ("não depender de homem
nenhum") são claramente anunciadas no conselho dado pela mãe de Maria a ela.
Levanta-se a hipótese que ser independente é bastante reforçador para Maria, com
base no seu relato: "Não tem nada mais valioso do que poder estar com alguém e ser
livre para fazer o que você quiset'.
Provavelmente a partir da observação do papel assumido pela mãe, e dos
conteúdos socialmente transmitidos, Maria construiu a idéia de que, apesar de ser
“paparicada e protegida" ela deve s e r"independente
Ana por sua vez, apresenta uma maneira diferenciada de perceber o papel da
mulher. Ela mantém um referencial para o qual a mulher continua tendo papéis
específicos de cuidado da casa e do marido, e somente considera que a atividade
profissional como conseqüência da situação econômica atual, conforme frases
apresentadas na tabela 7.

66 M.irui (.cclliu ilc Abreu c Silva , L kIiü N .i I.i Im Pobri.mskyj Weber


Tabela 7: Apresentação das frases relatadas por Ana sobre expectativas do papel da
mulher.

ANA

1 O homem tem que proteger a mulher, a mulher lem que cuidar do homem,
da casa. Por mais que o homem ajude na casa, e a mulher a|ude no sustento,
Isso nunca vai mudar O meu marido limpa a casa, lava roupa Mas quando ele
faz falta um loque de mulher sabe? Al quando eu cuido, fica tudo bonito,
cheirosinho Na minha casa tem um jardim de flores. Se não fosse por mim ia
ser só grama E do homem a mesma coisa As vezes eu faço umas comldlnhas
que ele gosta, para agradar E o homem protege a mulher, faz o serviço
pesado Pelo menos lá em casa é assim, e dá certo!

Diante do relato de Ana sobre este aspecto, é importante considerar as


contingências as quais foi submetida em sua história de vida. Ana relata que em sua família
não precisava trabalhar, apenas cuidar de casa, enquanto o irmão, único homem da casa,
começou a trabalhar codo. Pode-se supor que no convívio com sua família Ana tenha
formulado tais regras que dizem que o homem e a mulher têm papéis definidos e distintos
no cuidado da casa e na relação amorosa ("a mulhor tem que cuidar do homem, da casa”).
A tônica mais marcante de sua fala ó certo conflito, entre estas regras a respeito
de um casamento marcado pela presença de uma mulher cuidadora e de um homem
provedor, e as adaptações necessárias devido à situação histórico-econômica atual.
Ana relata que atualmente muitas das brigas têm origem na situação em que o casal se
encontra: ela trabalhando e ele desempregado: "No fundo sei que ele não aceita muito
bem o fato de que quem ta mantendo a casa sou eu. É isso que mais incomoda a gente“.
O relato de ambas as entrevistadas suscita uma reflexão a respeito da
transformação do casamento ao longo do tempo. De acordo com McGoldric (2001) o
significado do casamento na nossa época é bem diferente do sou significado em toda
história anterior, quando ele estava firmemente inserido na estrutura econômica e social
da sociedade. A mudança do papel da mulher e a crescente mobilidade na cultura
forçam a redefinir o casamento. As mulheres estão priorizando as próprias carreiras e
estão cada vez mais resistentes a ficarem com as responsabilidades primárias pela
casa, pelos filhos. Contudo, as mudanças chegam muito lentamente, e ainda sustenta-
se um ideal de que o homem tenha uma posição superior (sendo mais alto, mais
esperto, mais instruído e com maior poder de ganhar dinheiro).

5. Considerações Finais
Considerando os princípios da Análise do Comportamento muitas seriam as
possibilidades de foco na compreensão dos relacionamentos amorosos. Restringlr-se
as regras e auto-regras implica em aprofundar a análise no comportamento verbal, e á
característica exclusivamente humana de descrever contingências e submeter o controle
de comportamento a essa descrição. Diante da realização deste trabalho, algumas
considerações merecem ser feitas.
A primeira constatação está no fato de que as regras e auto-regras são fortemente
controladoras dos comportamentos das entrevistadas nos seus relacionamentos. As
contingências descritas pelas regras, bem como os comportamentos controlados são
distintos, mas a presença de tais comportamentos ê bastante significativa, Não se

Sobre Comportamento e Cogni(<lo 67


pretende, através desta afirmação, subestimar a importância das contingências na
instalação e manutenção de comportamentos relativos aos relacionamentos amorosos.
As regras sâo úteis, pois descrevem contingências, ou seja, uma pessoa não precisa
necessariamente passar pela contingência para aprender uma regra. Tanto o controle
através das contingências como o controle através de regras estão presentes no
repertório comportamental das participantes.
O comportamento das entrevistadas de seguir regra provavelmente são reforçados
positivamente, seja pelas contingências, seja pelo reforço social. Isto se explica porque
regras disfuncionais são seguidas, mesmo após a constatação de que os comportamentos
por elas eliciados são causadores de problemas. Desta forma não é possível dizer que
seus comportamentos são insensíveis às contingências, pois as conseqüências colaterais
reforçam a regra. Mesmo que as conseqüências programadas nas contingências descritas
pela regra não aconteçam, o comportamento de segui-la é reforçado socialmente.
O comportamento controlado por regras é vital a existência da cultura e
sociedade humanas. Desta forma, utilizando descrições verbais o homem pode controlar
os comportamentos do outro e de si próprio sem que haja a necessidade de exposição
às conseqüências doscritas.
Outra consideração deve ser feita em relação à análise funcional das entrevistas,
quando se atribuiu ao comportamento governado por regras o controle de alguns
comportamentos. Nenhuma generalização pode ser realizada, pois o contexto de apenas
uma entrevista nâo permite tal tipo de afirmação. Os comportamentos passam polo viés
do relato vorbal da entrevistada, om determinado momonto histórico. Além disso, foi
possível perceber que outros aspectos, como a religião, que não foram abordados
neste estudo podem estar fortemente relacionados com o repertório comportamental
das entrevistadas. Sugere-se então, um estudo complementar seja realizado com a
finalidade de investigar melhor o papel de agências controladoras no comportamento
do relacionamento amoroso, sobretudo a religião.
Este estudo confígura-se ainda num alerta ás mulheres. É de extrema
importância e relevância uma reflexão que promova o autoconhecimento e quo busque
identificar as rogras e auto-regras controladoras de seus comportamentos, verificando
sua correspondência com a realidade, uma vez que o papel da mulher tem mudado
muito, e não há uma forma única de considerar o seu papel. A imagem de um ser frágil
e necessitado de proteção, sob o domínio dos sentimentos, atuando na intimidade
ganha outros contornos, dela um ser em construção, na busca de seu desenvolvimento
e realização de potencialidades.
Por fim, espera-se que os resultados sejam uma contribuição aos terapeutas,
comportamentais ou não. Percebe-se que enormes são os problemas nos
relacionamentos causados comportamentos controlados por regras imprecisas,
irrealistas ou mal formuladas. É de extrema importância que no contexto da clinica o
terapeuta auxilie na formulação de regras adequadas, ensinando ao cliente a colocar
seu comportamento verbal sob controle direto dos eventos vlvenclados e das suas
conseqüências naturais.

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70 M.irid t'ciilid ilc Abreu e Silv.i , I iili.i N.iI.iIi.i l>obri<msky| Weber


Capítulo 5
Variabilidade Comportamental e
Adaptabilidade:
da Pesquisa à Análise
Comportamental Clínica

Joâo Vicenle de Sousa M arçal1


Paula Carvalho Natalino*

Mudanças sâo constantos no universo natural. A variação está presente em


todos os fenômenos físicos, incluindo os fenômenos comportamentais. Num ambiente
com mudanças constantes, variar torna-se uma condição básica de sobrevivência dos
organismos e, de uma forma mais abrangente, das culturas e das espécies (Skinner,
1981). O processo através do qual os elementos desta variabilidade possibilitam a
adaptação é denominado selecionismo (Donahoe, 2003).
O modelo selecionista de causalidade é recente na história do pensamonto.
Darwin apresentou um modelo muito diferente dos mecanismos puxe-empurre da
ciência de sua época e reafirmou uma questão anterior apresentada por David Hume,
quo chamou a atenção para o fato de que a contiguidade entre eventos nem sempre
implica ©m causalidade (Chiesa, 1994). No selecionismo, um evento tem a sua
probabilidade futura de ocorrência afotada por um ovonto que ocorre posterior a ele,
invertendo o tradicional raciocínio mecanicista de contigüidade. No entanto, este sentido
difere do teleológico, em quo o futuro traz o presente para si, pois, na realidade, o que
ocorre é o passado empurrando o presente em direção ao futuro (Donahoo, 2003).
Tanto no modelo darwiniano como no skinnoriano, a seloção ocorre a partir de
eventos proexistentes, é detenninada pelo ambiente o dopondo do um substrato variávol
para que ocorra (Hull, Langman & Glenn, 2001; Skinner, 1966,1981). A variabilidade assume
assim, um papel preponderante no modelo selecionista: sem variação não há seleção. Na
filogênese, a variabilidade é encontrada na formação genética dos indivíduos de uma
espécie, conferindo a cada um propriedades anatômicas, fisiológicas e comportamentais
diforonciadas. Os membros de uma espécie com propriedades mais adequadas ao ambiento
em que vivem, têm mais chances de sobreviverem e transmitirem, através dos seus genes,
estas propriedades aos seus descendentes (Hull & cols., 2001). Uma espécie constituída
de organismos que aprosentam pouca variação ontro si tom menos chance de sobreviver
om ambientes quo passam por mudanças significativas.
Na Análise do Comportamento, os conceitos de variação e seleção são adotados
para explicar a aquisição e a manutenção dos comportamentos de um organismo ao longo
' I BAC- l i m t l l u l ü <Im Aíi AIím i (Io Cotiifiurtamnnto. IJiiBuUnICEUB Eniml ivniMimltiDliiui: mm I»
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Sobre (.'oinportiimrnto e Co«nKc1o 71


do sua história de vida (Skinner, 1981). O processo de seleção comportamontal ocorre quando
contingências de reforçamento selecionam classes de resposta, dentro outras também
omitidas pelo organismo numa dada ocasião, caractorizando o condicionamento oporante
(Catania, 1998). Isto aumentará a probabilidade futura de ocorrência dostas mosmas classes
de respostas em ocasiões somolhantos. No entanto, a seleção propara o indivíduo para
ambientes semelhantes aos que vivou no passado. Classes selecionadas podom ser
inadequadas para produzir reforçamento em outros contextos, exigindo dos organismos formas
diferontos de se comportar. Portanto, dopendondo da requisição apresentada om cada ocasião,
tanto a ostorootipia, como a variabilidade, podem ser adaptativas.
Existem muitas situações em quo a variação ó observada. Na ausência ou
pouca freqüência de reforços, a variação do comportamonto aumonta as chancos de
quo estes possam ser obtidos. Por exemplo, uma pessoa muda imediatamente a
forma e a intensidade de girar a maçaneta de uma porta quando não consegue abri-la.
Na modelagem operante, a variabilidade permite que aspectos espocificos do
comportamento sejam selecionados: apronder a andar do bicicleta onvolvo uma natural
variação e seleção no uso de músculos e níveis de força, chogando a um movimento
novo o rofinado. Noste sontido, Neuringer (1993) afirma quo a modelagem fortalece,
direta ou indirotamonte, a variabilidade de respostas, um raciocínio diforonte daquele
em quo as variações na modelagem são consideradas como docorrontos do pequenas
extinções. A criatividade e a solução de problemas também dependem de um substrato
variávol para ocorror (Skinner, 1938; Stokes, 2001). Estudos também mostram que a
variabilidade ó necessária para a aquisição de habilidades cognitivas (Siegler, 1996,
citado om Neuringer, 2004) e motoras complexas (Manoel & 0'Connolly, 1997). A
variabilidade é adaptativa também em atividades artísticas, esportivas, cientificas,
literárias, assim como em jogos, osquiva de prodadores e atração de pares (Cherot,
Jones & Neuringer, 1996).
Psicólogos e estudiosos de uma maneira geral deram diforontes tratamentos
à variabilidade ao longo dos anos. Neuringer (2004) afirma que muitos psicólogos
concluíram que a variabilidade era um sinal de ignorância o que procedimentos deveriam
ser delinoados para identificar suas causas. Para alguns, as variações são totalmente
causadas e a literatura não apresenta milagres na descrição dostas (Hull & cols., 2001).
Neste caso, a tarefa é descrever os tipos de causas que produzem variação. Outros
teóricos, no entanto, discordam desta posição determinista. Charlos Pierce, por exemplo,
considera "a hipótese da casualidade como base de todos os fenômenos físicos e
psicológicos" (Pierce, 1931, om Moxloy, 1997, p. 12).
Em ciência, a variabilidade foi por diversas vezes caracterizada como indesejável,
decorrente de controlo experimental inadequado e de variáveis desconhecidas (Sidman,
1960). Amostras estatísticas também excluem automaticamente os dados que muito se
afastam da média (Moore, 2000). Chiesa (1994), no entanto, aponta para o fato de que por
mais sofisticadas que sejam as técnicas estatísticas, elas esquocem algo fundamental: a
curva normal e o caso da média simplesmonto documentam que a variação é a regra na
natureza, não algo indesejável a ser evitado. Nesto sentido, há algumas décadas, a análise
oxperimental do comportamento passou a apresentar a variabilidade comportamental como
o próprio objoto do estudo, buscando variáveis de controlo dentro de análises envolvendo
estados ostávois (Hunzikor & Moreno, 2000; Abreu-Rodrigues, 2005).
Neuringer (2003) considera que o estudo da variabilidade comportamental tem
apresentado três grandes influências sobre a mesma (ver também Neuringer, Doiss e
Olson, 2000). A primoira refero-so aos ostados do doença o bom-estar, incluindo ostados
clínicos (indivíduos depressivos e com autismo variam menos que os normais); danos

72 lodo Vicfiilr tlr Sou »a Marçal, 1’aula Carvalho Natalino


no sistema nervoso central (Alzheimer e lesào no córtex frontal reduzem a variabilidade)
e drogas (e.g. álcool, opióides e benzodiazeplnlcos). A segunda fonte ó a variabilidade
eliciada por adversidade, como a decorrente de um súbito decréscimo no reforço, ou
extinção, e a produzida por restrições impostas a classes de respostas. A terceira fonte
de variabilidade é o reforço direto da mesma, que o autor considera como a única capaz
de manter a variabilidado de forma prolongada.
As pesquisas sobre variabilidade comportamental surgiram na década de
cinqüenta, com maior volume nas trôs últimas décadas. Hunziker e Moreno (2002)
consideram que os estudos tôm se aplicado ao surgimento e manutenção da
variabilidade, agrupando-a conforme a sua dispersão e eqüiprobabilidade (ver também
Neuringer, 2002). A dispersão pressupõe que quanto mais um comportamento se afastar
de um valor central, mais variável ele é. A eqüiprobabilidade analisa a distribuição de
valores ao longo de um universo de possibilidades, o que significa que quanto mais
equitativa a distribuição, maior a variabilidade. Hunziker e Moreno concluem que o critério
básico para se definir a variabilidade comportamental é o requisito de diferença ou
mudança entre unidades comportamentais pertencentes a algum universo determinado.
Portanto, não poderia haver variabilidade a não ser entre unidades de algum universo.

1. Variabilidade como produto indireto de contingências


Uma das formas de estudo experimental da variabilidade comportamental
provém do delineamentos em que há remoção total ou parcial do reforço. Pesquisas
relatam que o reforço continuo favorece a estereotipia e que a extinção tende a produzir
variabilidade. Antonitis (1951) avaliou a variação na topografia da resposta de colocar o
focinho em uma barra horizontal de 50 cm de comprimento e observou que num esquema
de reforçamento continuo (CRF), a variabilidade na localização da resposta chegou a
níveis próximos de zero, enquanto que em períodos de extinção, a variabilidade aumentou
consideravelmente (ver também Neuringer, Kornoll & Olufs, 2001; Stokes, 1995).
Resultados análogos foram obtidos em relação à duração da resposta (Margulies,
1961; Millenson, Hurwitz & Nixon, 1961); força da resposta (Notterman, 1959, em
Millenson, Hurwitz & Nixon, 1961; Notterman & Mintz, 1965); topografia da resposta
(Iversen, 2002) e formação de seqüências de respostas (Schwartz, 1980), entre outros.
O aumento no comportamento variável como efeito da extinção também foram
obtidos em humanos, como em estudos envolvendo o comportamento de brincar, em
crianças com um leve retardo no desenvolvimento (Lalli, Zanolli & Wohn, 1994); na localização
da resposta de marcar um "x", em universitários, (Eckerman & Vreeland, 1973) e na formação
de seqüências de respostas (Barret, Deitz, Gaydos, & Quinn, 1997; Schwartz, 1982c).
Os efeitos decorrentes da redução apenas parcial do reforçamento também
foram investigados. Como os esquemas intermitentes contêm períodos sem reforço,
haveria a possibilidade destes esquemas apresentarem níveis intermediários, entre a
extinção e o reforço contínuo, de variação de respostas (Schoenfeld, 1968). No estudo
de Eckerman e Lanson (1969), pombos deveriam bicar em localizações diferentes de
acordo com cinco esquemas de reforçamento (CRF, Fl 15 s, RI 150 s, RI 75 s e RI 30 s).
Foi observado maior variabilidade comportamental nos esquemas Intermitentes em
comparação com o esquema de reforçamento contínuo (ver também Ferraro & Branch,
1968; Stebbins & Lanson, 1962).
Alguns experimentos procuraram investigar se manipulações no tempo entre
respostas (IRT) afetariam a variabilidade comportamental. No estudo de Neuringer
(1991) estavam em vigor duas contingências: uma de variação e uma de repetição. No
entanto, diferentes durações de IRT (entre 0,0 s e 4,0 s) também foram requeridas para

Sobre Comportamento e Cofinlçío 73


o reforçamento. A variabilidade das seqüências aumentou com os aumentos no IRT em
ambas as contingências. Possivelmente longos IRTs desfavorecem o controle
discriminativo, levando a uma maior variabilidade comportamental.
A administração de drogas é outra variável que tem produzido efeitos sobre a
variação do comportamento. No estudo de Cohen, Neuringer e Rhodes (1990) ratos
tinham como tarefa formar seqüências de quatro respostas. Em uma fase do experimento
era exigido que cada seqüência emitida fosse diferente das cinco anteriores (critério
Lag 5) e em outra fase a variação não era exigida, apenas permitida. Quando etanol foi
administrado foi observado aumentos na variabilidade das seqüências emitidas apenas
na fase sem exigência de variação (ver também Abreu-Rodriguos, Hanna, Cruz, Matos &
Delabrida,1997; McElroy & Neuringer, 1990).
Nas pesquisas citadas até o momento, a variabilidade estudada a partir de
efeitos indiretos de esquemas de reforço. No entanto, o interesse maior deste texto se
concentra na variabilidade enquanto dimensão operante do comportamento

2. Variabilidade como comportamento operante


Tem sido questionado que o processo do reforçamento, por si próprio, roduz a
variabilidade comportamental, tendo em vista que, quando em certo contexto, um
comportamonto X é seguido de reforço, a probabilidade do comportamonto X ocorrer naquele
contexto aumenta, enquanto a de outros comportamentos diminui (Schwartz, 1980, 1982c).
Outros autores, entretanto, argumentam quo se o reforçamento reduzisse necessariamente
a variabilidade comportamental, as espécies não sobreviveriam, já que diante das constantes
mudanças no ambiente, a ausência de um repertório comportamontal diverso
impossibilitaria o processo de seleção de comportamentos adaptados ao novo ambiento
(Skinner, 1984; Staddon, 1983). Diante disso, diversos estudos têm sido realizados com
objetivo de identificar os determinantes da variabilidade comportamental.
O estudo de Schwartz (1982c) teve como objetivo geral investigar o papel do
reforçamento no desenvolvimento de estereotipia comportamental em humanos. No
Experimento 1, foi investigado se a estereotipia comportamental seria produzida mesmo se
a contingência em vigor não exigisse tal estereotipa. Estudantes universitários tinham como
tarefa mover uma luz em uma matriz 5x5 utilizando dois botões (direito e esquerdo). Qualquer
seqüência contendo quatro respostas no botão direito e quatro respostas no botão esquerdo
era reforçada. Os resultados indicaram que o número de seqüências diferentes diminuiu,
aproximando-se de zero no final do experimento e paralelamente, a freqüência de uma
seqüência dominante aumentou progressivamente, demonstrando a ocorrência de
estereotipia, mesmo na ausência de contingência de reforçamento para este padrão
comportamental (ver também, Vogel & Annau, 1973; Schwartz, 1980, 1982a, 1982b).
Pago e Neuringer (1985) se opuseram á condusáo de Schwartz (1982c) de que o
reforçamento necessariamente produz estereotipia comportamental. Os autores
argumentaram que a estereotipa observada nos experimentos de Schwartz ocorreu porque
os participantes só podiam responder quatro vezes em cada botão. No Experimento 1, pombos
foram expostos à tarefa da matriz 5x5. Na Fase de Variabilidade, as oito respostas de cada
seqüência poderiam ser distribuídas livremente nos dois discos. Dessa forma, o sujeito
poderia, por exemplo, bicar seis vezes o disco da direita e duas vezes o disco da esquerda, ou
oito vezes o disco da direita. Na Fase de Variabilidade Restrita, não mais do que quatro
respostas poderiam ser dadas em cada disco. Os dados mostraram que a porcentagem de
seqüências diferentes e a porcentagem de seqüências reforçadas foram maiores na Fase de
Variabilidade do que na Variabilidade Restrita. Os autores explicam essa diferença devido à
exigência de apenas quatro respostas por disco na Fase Variabilidade Restrita.

74 lodo Vicmtc dr Souí.i Marçal, Paula Carvalho Natalino


Uma vez que períodos de extinção, presentes em esquemas intermitentes, geram
variação (Eckerman & Vreeland, 1973, Ferraro & Branch, 1968; Stebbins & Lanson, 1962),
Page e Neuringer (1985) argumentaram ser necessário separar o efeito do reforçamento
contingente à variação do efeito da intermitência na liberação de reforços para uma
demonstração inequívoca do controle operante da variabilidade comportamental. No
Experimento 5, a tarefa era similar à dos experimentos anteriores (matriz 5x5). Na Fase Lag
50, uma seqüência somente seria reforçada se fosse diferente das 50 seqüências anteriores;
na Fase de Acoplamento, os sujeitos foram expostos a um esquema de razão variável (VR),
de modo quo os intervalos entre reforços foram semelhantes aos da Fase Lag 50, mas a
variabilidade comportamental não ora exigida, embora fosse permitida. Os resultados
mostraram quo a porcentagem de seqüências diferentes emitidas foi substancialmente
maior na Fase Lag 50 do que na Fase de Acoplamento. Os dados demonstraram que
apesar do na Fase de Acoplamento os sujeitos terem sido expostos à mesma quantidade
o ao mesmo intervalo entre reforços que na Fase Lag 50, a intermitência do reforçamento
não produziu o mosmo nível de variabilidade comportamental do que o reforçamento
contingente à variação (ver também Abreu-Rodrigues, 1994; Lee, McConas & Jawar, 2002).
Machado (1989) reforçou esta tese ao manipular a probabilidade de reforço,
enquanto manteve constante a requisição do variabilidade e vice-versa. Os resultados
indicaram que diferentes montantes de variabilidade comportamontal puderam ser mantidos
por contingências operantes e nenhum efeito consistente pôde ser atribuído à probabilidade
por si ou aos efeitos do reforço intermitente (ver também Machado, 1992).
Nouringer (1986) procurou investigar se um padrão randômico de variação poderia
ser observado em humanos. Alguns estudos anteriores haviam demonstrado quo quando
era solicitado ás pessoas que se comportassem randomicamente (o desempenho não
poderia diferir estatisticamente daquele gerado por uma simulação de computador em
condições análogas), isso não ocorria (e.g., Bakan,1960). Sendo assim, no Experimento 1,
Neuringer investigou se o comportamento poderia se tornar randômico caso os participantes
recebessem feedback a respeito de seus desempenhos. Na Fase de Linha de Base,
estudantes universitários foram instruídos a pressionar as teclas "1" e “2" de um teclado de
computador da forma mais randômica possível. Os participantes não recebiam feedback
se suas respostas eram corretas ou incorretas. Na Fase de Feedback, foi fornecido aos
participantes, após cada tentativa (uma tentativa continha 100 respostas de pressão as
teclas), feedback sobre o grau de variação que estava sendo apresentado. Os participantes
recebiam o feedback "correto" quando suas respostas apresentavam um alto grau de
variação e o feedback "incorreto" quando suas respostas apresentavam um baixo grau de
variação. O grau de variabilidade na pressão das teclas apresentado pelos participantes, na
Fase Linha de Base, foi menor do que o produzido pelo gorador randômico. Na Fase de
Feedback, o grau de variabilidade não apresentou diferença daquele produzido pelo gerador
randômico, indicando assim, quo um padrão randômico de comportamento pode ocorrer
se os participantes forem treinados a se comportar desta maneira (ver também Blough,
1966; Bryant & Church, 1974; Neuringer, 2002).
A variabilidade comportamental também pode ser observada em mais de uma
dimensão de resposta. No experimento de Ross e Neuringer (2002) a tarefa dos participantes
consistia em retirar triângulos numa tola de computador. A fim de verificar a variabilidade trôs
dimensões do triângulo foram selecionadas (área do triângulo, sua forma e sua localização),
resultando em 16 categorias para cada dimensão. Tais categorias foram criadas a fim de
igualar as respostas emitidas por um distribuidor randômico em todas as categorias Para
o Grupo Experimental, a resposta menos freqüente para as categorias área, forma e
localização foi reforçada. Para o Grupo Controle, a quantidade de reforços foi acoplada com

Sobre Comport.imenlo c Coflnlç.lo 75


base nos reforços obtidos no Grupo Experimental Procedimento - Em dezesseis seqüências
possíveis, eram reforçadas aquelas respostas que tinham ocorrido menos freqüento que
5% do tempo (Ross, C. & Neuringer, A., 2002). Os resultaram mostraram que o Grupo
Experimental apresentou maior variabilidade comportamental do que o Grupo Controle.

2.1 Variabilidade sob controle de estímulos


A natureza operante da variabilidade também foi confirmada com o controle
discriminativo da mesma. No estudo de Page e Neuringer (1985, experimento 6), animais
aprenderam a variar ou a repetir dependendo do estimulo que estivesse presente.
Cohen, Neuringer e Rhodes (1990) obtiveram resultados similares com ratos.
Posteriormente, Denney e Neuringer (1998) e Hopson, Burt e Neuringer (2002, em
Neuringer, 2002) apresentaram dados novos e importantes. No primeiro estudo ratos
foram requeridos para variar seqüências na presença de um estimulo (condição Var) e
na presença de outro estimulo obtinham reforços sem requisição, mas com a mesma
freqüôncia de reforços que em Var (condição acoplada - Aco). Com mudanças imediatas
após cada troca de estimulo, a variabilidade foi maior em Var do que em Aco. Neste
estudo, o controle discriminativo não dependeu do reforço para repetição no outro
componente. No trabalho de Hopson, Burt e Neuringer, o controle discriminativo ocorreu
sem a presença de pistas externas, a partir da apresentação de um esquema misto
envolvendo variação (Var) e repetição (Rep), com a probabilidade de reforçamento sendo
igual e constante nos dois componentes.

2.2 Variabilidade e Instruções


A literatura sobre variabilidade/estereotipia comportamental inclui também
ostudos interessados no controle exercido por estímulos verbais, tais com inslruções e
auto-instruções (e.g., Barret & cols., 1987). Hunziker, Lee, Ferreira, da Silva e Caramori
(2002, Experimento 2) investigaram o efeito de instruções acuradas e inacuradas sobre
a variabilidade comportamental. Vinte estudantes tinham como tarefa completar uma
seqüência de quatro pressões em duas teclas. Metade dos participantes foi exposta a
uma contingência do reforçamento da variabilidade (VAR), na qual uma seqüência era
reforçada segundo dois critérios menor freqüôncia (quanto menor fosse a freqüência
de omissão da seqüência, maior seria sua probabilidade de ser reforçada) e menor
recência (quanto maior fosse o número de outras seqüências entre a repetição de uma
seqüência, maior seria sua probabilidade de ser reforçada). A outra metade dos
participantes foi oxposta a uma condição de acoplamento (ACO), na qual o número de
reforços, liberados independentemente das seqüências emitidas, correspondeu ao
número de reforços obtidos pelos participantes expostos a condição VAR. A instrução
que descrevia a contingência VAR foi fornecida para metade dos participantes da
condição VAR, sendo assim uma instrução acurada (Grupo Va), e para metade dos
participantes da condição ACO, para os quais era uma instrução inacurada (Grupo Ai). A
instrução que descrevia a condição ACO foi fornecida para metade dos participantes da
condição ACO (instrução acurada) e para metade dos participantes da condição VAR
(instrução inacurada), gerando os grupos Aa e Vi, respectivamente. Os grupos Va e Vi
apresentaram maior variabilidade nas seqüências emitidas do que os grupos Aa e Ai. O
Grupo Va apresentou maior variação que o grupo VI nas primeiras 30 tentativas, enquanto
o Grupo Ai apresentou maior variação que o grupo Aa. Esses resultados demonstram
que o reforçamento contingente ao comportamento de variar (grupos Va e Vi) produziu
maior variação que o reforçamento intermitente (grupos Aa e Ai). As instruções exerceram
um controle diferencial sobre o comportamento dos participantes, já que os grupos que
receberam instruções de variabilidade (grupos Va e Ai) apresentaram maior variação do

76 M o Vicente de Soum Miirç.il, PauIa Carvalho Natalino


que aquoles grupos quo rocoberam instrução sobre a condição de acoplamento (grupos
Vi e Aa) (ver tambóm Pisacrotta, 1998, Vyse, 1991).

2.3 Variabilidade e Escolha


Estudos relacionando a variabilidade ao comportamonto do escolha tambóm
foram realizados. Uma medida de preferência ó a freqüência do rosponder. Para avaliar
se as mesmas leis quo governam rolações de escolha estariam presentes numa escolha
entro variar ou repetir, Neuringor (1992) demonstrou que quanto maior a freqüência do
reforço em uma das condições, mais esta condição ê oscolhida. Pombos treinaram variar
(Var) ou repotir (Rep) seqüências de quatro respostas o o computador selecionava, em VI
30s, qual a contingência quo estava em vigor e, concomitantemente, se variar ou repetir
seria reforçado. A escolha foi diretamonto afetada pola probabilidado do roforço em cada
condição. No estudo de Abreu-Rodrigues (1994), dois esquomas idênticos VI 30" operaram
no elo inicial e tanto as contingências de variar como repetir foram programadas nos elos
terminais, ambas com taxas similaros de reforçamento. A requisição de variabilidado foi
manipulada no elo variar. O elo terminal de repetição produziu níveis baixos o constantes
de variabilidade enquanto que o elo terminal de variação gorou nívois do variabilidado
proporcionais à requisição da mesma (ver tambóm Abreu-Rodrigues, Lattal, Santos, &
Matos, 2005; Abreu-Rodrigues & cols., 2004; Abreu-Rodrigues & cols., 1997).

2.4 Variabilidade e História de Reforçamento


Pesquisas indicam que a manutenção da variabilidade comportamental pode
ser afetada pela história de exposição a requisições de variação. Stokes (1999),
apresentou uma seqüência de requisições Lag 25, Lag 10, Lag 2 e ausência de exigência
para um grupo de universitários e depois apresentou a ordem inversa para outro grupo.
O grupo que iniciou o experimento com um critério mais rigoroso apresentou maior
variação também nas demais condições quando comparado ao outro grupo. Hunziker,
Caramori, Silva o Barba (1998), mostraram em humanos que se contingências de
variação (Var) são experimentadas antes de contingências acopladas (Aco), os niveis
de variação durante a fase Aco são maiores do que seriam se as contingências Var não
tivessem sido experimentadas. O tempo entre as contingências - três meses - produziu
pouco efeito (ver tambóm Saldana & Neuringer, 1998) Stokes, Mochnor o Balsam (1999,
experimento 3) e Stokes e Balsam (2001) manipularam o momento em quo a requisição
da variabilidade era introduzida na condição experimental e observaram que, quando
isto ocorria om fases iniciais de aprendizagem de uma nova tarefa, mais provávol era
uma postorior manutonção da variabilidado quando a mosma deixava de ser exigida. O
estudo de Miller e Neuringor (2000), com autistas, tambóm mostrou que a variabilidade
persiste após o treino, mesmo quando esta deixa do ser requerida.
Stokes o Harrison (2002) manipularam o nível de restrição da tarefa e o nivol de
restrição da variabilidade num estudo com universitárias. Restrição da tarefa determina
como algo pode ser feito diferentemente (e.g. número de caminhos possíveis numa
matriz piramidal) e restrição de variabilidade especifica o quanto uma tarefa podo ser
feita diferentemente (por exemplo, níveis de requisição Lag). Usando o modelo da matriz
piramidal em que os caminhos iam do ápice à base apertando-se duas teclas, direita
ou esquerda, os autores observaram que requisições mais severas do variabilidade
(Lags elovados) e tarefas do restrição monos severas (mais caminhos e pontos de
chegada) levaram à alta variabilidado enquanto a requisição estava em efeito. No entanto,
restrições iniciais mais severas (poucos pontos de chegada na base) levaram à alta
variabilidade quando a requisição estava relaxada. Outros estudos também mostram
quo quando nívois mais elevados de requisição da variabilidade são apresentados no

Sobre Comportamento e CognicAo 77


inicio do Gxporimonto, maiores são os niveis de variação obtidos quando a requisição
deixa de existir (e.g. Abreu-Rodrigues, 1994).

2.5 Variabilidade e Resistência à Mudança


Doughty o Lattal (2001) estudaram o efeito de alterações nas contingências do
reforçamento sobre a sensibilidade dos comportamentos de variar o repetir
(estereotipia). Pombos foram expostos a uma contingência de variação e a uma
contingência do ropotição. Na Faso do Troino, foi utilizado um osquoma concorronto
oncadoado No elo inicial, o disco iluminado com a cor vormolha sinalizava a contingência
do variação e o disco iluminado com a cor branca sinalizava a contingência de estereotipia.
Rospostas em ambos os discos, emitidas de acordo com um osquoma do intorvalo
variávol (VI) 20 s, rosultavam em um do dois elos torminais. No olo torminal Variação,
dois discos estavam iluminados com a cor vermelha e a tarefa consistia om emitir uma
seqüência de quatro respostas utilizando um ou ambos discos. Uma seqüência somente
era reforçada se a sua freqüência relativa fosse inferior a 0,05. A freqüência relativa após
cada seqüência foi calculada dividindo o número de vezes que a seqüência tinha ocorrido
pelo número total de seqüências emitidas. No olo terminal Repetição, dois discos
estavam iluminados com a cor branca e a tarefa dos sujeitos era a mesma, porém,
somonto uma seqüência ora reforçada: esquerda-direita-esquerda-direita. Durante o
intorvalo ontro tontativas, os sujeitos foram expostos a esquemas do reforçamento não-
contingento, nos quais os reforços oram liberados de acordo com esquemas de tempo
variávol (VT) 15 s, 5 s e 2,5 s. Os dados mostraram que a introdução do reforçamento
não-contingente não alterou a freqüência de seqüências diferentes no olo torminal
Variação, mas aumentou a freqüência de seqüências diferentes no elo terminal
Repetição. Sendo assim, a história de reforçamento da variação produziu menor
sensibilidade à mudança nas contingências experimontais do que a história do
reforçamento da repetição (ver também Natalino, 2002).

3. Pesquisa aplicada
A ciência aplicada envolve a produção de novos conhecimentos na medida
em que estes se relacionam a problemas práticos (Lattal, 2005). Baer e cols.
(1968, citado por Lattal 2005) afirmam que a pesquisa aplicada está interessada
em como conseguir com que um indivíduo faça algo de maneira eficaz. A partir dos
inúmeros aspectos funcionais da variabilidade comportamental, evidenciados pela
pesquisa básica, alguns estudos buscaram verificar os seus efeitos em condições
aplicadas (Abreu-Rodrigues, 2004; Neuringer, 2004).
Dukere Van Lent(1991) aumentaram a proporção de gestos espontâneos
em indivíduos com retardo mental com procedimentos que envolviam o reforço
seguido de extinção.
Saldana o Neuringer (1998), compararam a variabilidade entre crianças com e
som TDAH, tanto antes como depois da variabilidade tor sido reforçada. A variabilidade
de crianças com TDAH não diferiram das outras crianças ao longo das fases o nem foi
mais prontamente reforçada. Todos as crianças variaram quando osta foi roquerida e
esta pormanocia após o treino em variação mesmo quando não era mais requerida. Os
autores concluíram que a variabilidade porsiste após uma história de reforçamento.
Num ostudo com um possivol modolo animal de TDAH - Transtorno de déficit do atenção
e hiporatividade - os chamados ratos SHR - spontaneous hiportensive rat - Mook,

78 PoíI o Vicrnte ifc Sou»a Marçal, Paula Carvalho Natalino


Jeffroy e Neuringer (1993), encontraram que estes indivíduos não podem ser controlados
com reforço operante e que a anfetamina produziu efeitos de controle satisfatórios.
Miller e Neuringer (2000) se interessaram em dosenvolver estratégias que
ampliassem a variabilidade comportamental em indivíduos autistas e,
consoquontomente, roduzissem a perda do roforços decorrontes desta condição.
Indivíduos com autismo (cinco adoloscontes) e dois grupos controle (um do adultos e
um de crianças), jogaram computador onde a pressão a duas teclas oram reforçadas
ocasionalmente A condição permitia 16 seqüências diferentes, sondo cada seqüôncia
composta do quatro pressões a teclas. Após treino proliminar, as respostas eram
reforçadas randomicamente independente da variabilidado. Na segunda fase, o reforço
só ocorria se as respostas variassem, voltando depois à condição inicial. A variabilidade
aumentou quando reforçada e permaneceu alta, mesmo após o reforço não ser mais
contingente a esta. Os participantes com autismo mostraram menor variabilidade que
os adultos do grupo controle. Os autores concluíram que a baixa variabilidade
apresentada por autistas estão mais relacionadas à ausência de contingências de
reforço eficazes do que à características imutáveis. Lee, McComas e Jawor (2002)
também evidenciaram o aumento na variabilidade do comportamento verbal em
indivíduos autistas através do reforço contingente.
A variabilidado comportamental do indivíduos depressivos também sofreu
investigação experimental. Hopkinson e Neuringer (2003), após avaliação inicial,
agruparam setenta e cinco estudantes universitários em quatro grupos experimentais:
deprossivo e instruído, depressivo e não instruído, não dopressivo e instruído, não
dopressivo e não instruído. O experimento envolvia um jogo de computador, om que
cinco prossõos em duas teclas especificas constituíam uma resposta e o ponto dependia
da emissão de uma seqüôncia diferente. Na fase 1 o reforço era independente da
variabilidade, na fase 2 somente seqüências de alta variabilidade eram reforçadas.
Estudantes moderadamente deprossivos responderam monos variavelmente durante
as condições de linha de base (RIV) do que os não deprossivos. O reforço da variabilidado
resultou numa igualação da variabilidado em sujeitos depressivos o não depressivos,
sugerindo quo a baixa variabilidade característica da deprossão pode ser modificada.

4. Variabilidade e análise comportamental clinica


Conforme afirmou Donahoe (2003) a seleção prepara o indivíduo para ambientes
semelhantes aos que viveu no passado, isto significa que não há garantia de que o que foi
selecionado sorá útil se os ambientes futuros forem diforontos. A variação torna-se então a
resposta do um organismo às mudanças potenciais do ambiento. Um comportamento podo
ser funcional num dotorminado momento da vida de alguém o não ser mais posteriormente;
pode servir numa situação e nâo mais em outra; pode produzir certos tipos de reforçadores e
não outros que sejam mais necessários em novas condições e assim por diante. Na visão
skinneriana, "a variabilidade é fundamental para a existência do homom - um ser suscetível
a produzir múltiplas o variáveis formas do ação, um ser criativo o suscetível a mudanças"
(Micholotto, 1997, p. 39).
Aposar dosto status, a variabilidade podo não ocorrer mesmo quando as condições
a requoiram. Um dos grandes desafios na prática clínica é oncontrar formas de produzir
variaçõos ofotivas no repertório apresentado pelo cliente A análiso funcional do comportamento
é um importante instrumento quo possibilita ao terapeuta, em conjunto com o sou cliento,
sabor o quo mudar, quando mudar, por que mudar e também como mudar.

Sobre Comport.imcnto c C'ormív<1o 79


Muitos fatores podem dificultar ou impedir que as pessoas variem, mesmo em
situações em quo variar seja o mais adaptativo. Esta dificuldade pode levar ou manter uma
possoa num quadro do sofrimento e sentimento de incapacidade. É muito importanto que
terapeuta o clionte estejam cientes destas variáveis.

4.1 Alguns fatores quo dificultam a variabilidade comportamental


A história do reforçamento pode ser um destes aspectos. Os hábitos, por
exemplo, indicam classes de respostas que foram inúmeras vezos roforçadas em
algumas ou várias situações na vida do uma pessoa, caracterizando-as como fortemente
condicionadas. Uma mulher que sempre foi reforçada por ser meiga e carinhosa tom
muita dificuldade de mudar sua forma de agir - sentindo-se inclusive culpada - em
situações que requeiram uma postura mais agressiva, firmo ou de enfrentamonto.
A punição da variabilidade tambóm contribui para uma estereotipia disfuncional.
Tentativas de agir diferentemente podem ter produzido conseqüências dosagradáveis
no passado e deixado a pessoa insegura em agir diferente. A punição podo ter origem
social. Ter muitas oxperiências em ambientes com restrições severas quanto ao modo
de se comportar, inibe o desenvolvimento da variabilidade comportamental. Um exemplo
seria um sistema educativo em quo o aluno ó reforçado apenas ao comportar-se
exatamente como o esperado. O culto a um padrão idealizado de conduta, dificulta o
surgimonto de variações, por vezes necessárias.
Agir conforme um modelo significativo também pode estreitar o espectro de
variabilidade. Por exemplo, um estudante de psicologia aprende a fazer ontrevista clinica
baseado apenas em um único modelo de atendimento, sendo reforçado
diferencialmente por segui-lo e/ou punido por não sogui-lo. Em situações em que este
modelo não for o mais adequado, o aluno podo nào apresentar uma variação dosejada.
Quando o controle do comportamento por seguimento de regras impede uma
pessoa do mudar seu comportamento mesmo quo haja demanda das contingências
em vigor, temos um fenômeno chamado de insensibilidade às contingências (Catania,
1998). O controle da regra pode ter origem social, denominado de aquiescência (do
inglês piiance) ou através do contato direto com a contingência, denominado de
rastreamento (do inglês tracking). Na clinica são encontradas diversas situações em
que o seguimento de regras impede o cliente de agir de uma forma mais ofotiva. Uma
pessoa pode estar num casamento infeliz, sem a minima perspectiva de mudança
após anos de tentativas, ter autonomia financeira, mas assim mesmo se esquivar de
tomar atitudes que lhes permita desfazer-se desta união. Rogras do tipo "separação é
sinal do incompetência", “quem se separa não vai para o céu", "possoa separada não
consegue ser feliz depois" e assim por diante, exercem um forte controle comportamontal
o estabelecem uma insensibilidade às contingências.
Variáveis motivacionais também dificultam o processo de mudança. As vozes
uma pessoa so queixa para o terapeuta da condição em que se encontra. Em
concordância com o cliente, são identificadas alternativas para mudar esta condição,
mas o mesmo não se engaja em nenhuma delas. Embora existam condições aversivas
prosentes na situação atual, as condições reforçadores exercem controle mais eficaz,
principalmente quando os reforçadoros positivos envolvidos não foram ou não são
facilmente obtidos de outro modo. A relação beneficio/custo de resposta para mudança
ó outra variável que pode ajudar a manter as coisas como estão. Os reforçadores
obtidos não compensariam o esforço para obtê-lo.
Há tambóm o caso do pessoas que tiveram pouco treino em variabilidado no
decorrer do suas vidas. Contingências favorecendo a ostorootipia foram predominantes

80 lodo Vicente de Sousa Marçal, Paula Carvalho Natalino


e dificultaram o desenvolvimento de habilidades criativas e inovadoras, Alguns clientes
revelam-se muito hábeis em seguir ou executar o que já existe e grande dificuldade em
apresentar inovações. Estudos que comparam variação ou repetição nas linhas de
base, mostram que o contato inicial com a variação favorece a sua apresentação no
futuro. Um clínico pode sinalizar novos comportamentos a serem emitidos pelo seu
cliente, sem se deparar com o fato do que não há o mínimo treino om comportar-se
desta forma ou de um modo semelhante.

4.2 O que pode ser feito?


Ajudar o cliente a produzir mudanças efetivas ó um dos grandes desafios
encontrados na clinica. Após a realização de análises funcionais relevantes junto ao
seu cliente, são lançados recursos na tentativa de favorecer a aquisição de novos
repertórios. Esta análise permite quo o cliente fique sob controle de novas regras quo
irão fazô-lo agir de forma diferenciada em sua vida, produzindo novas contingências e
conseqüentemente novos comportamentos.
Outra estratégia inclui a inserçào em contextos que favorecem o
desenvolvimento de repertórios variados, ou seja, que reforcem a variação. Algumas
atividades artísticas, musicais, esportivas, sociais, de lazer ou mesmo profissionais,
requerem comportamentos diferentes a todo instante. Ficar mais tempo nestes
ambientes permitiria modelar naturalmente a variabilidado.
Estratégias para o enfraquecimento de regras que impeçam a variação também
são um importante recurso. O uso de metáforas, como amplamente sinalizado pela
ACT (Hayes, Strosahl & Wilson, 1999) mostra-se como uma alternativa eficaz. A análise
funcional das regras (origem, manutenção e perspectivas futuras) também auxilia na
emissão de novos comportamentos e exposição a novas contingências.
A instrução para comportar-se diferentemente também é um recurso comumente
encontrado na prática clínica e capaz de induzir mudanças (e.g. Hopkinson & Neuringer,
2003). Ressalta-se que as instruções sâo mais úteis quando as contingências são
complexas, imprecisas ou aversivas (Meyer, 2005). Deve haver cuidado para que a
própria instrução seja apresentada de forma que não favoreça a insensibilidade às
contingências - como por exemplo, variar em situações em que comportar-se
estereotipadamente seria o mais indicado.
Os recursos provenientes da interação terapeuta-cliente também são um
poderoso instrumento de produção de variabilidade. Clientes que apresentam formas
estereotipadas de falar, raciocinar, resolver problemas, etc, podem ser diferencialmente
reforçados na sessão quando emitirem novos repertórios.
Não se pode esquecer que a extinção também é efetiva na produção de
variabilidade, embora seja limitada na manutenção da mesma e na produção da alta
variabilidade. Isto pode ocorrer naturalmente na vida do cliente e também pode ser
apresentada pelo terapeuta - não atenção, não concordância - como recurso que amplie
a diversidade para um reforço diferencial posterior.
A restrição da tarefa também pode produzir variabilidade (Stokes, 2001). Um
exemplo da clínica é obtido quando se sinaliza para o cliente que o mesmo está num
beco sem saída. Na ACT isto é conhecido como desamparo criativo e favorece a variação
adaptativa.
Os recursos para o produção da variabilidade comportamental na clínica podem

Sobrf Comporl.imcnU) e Co^niçAo 81


ser inúmeros. A própria prática terapêutica já é, em si mesma, uma boa contingência
que requer comportamentos variados do profissional para solucionar os mais diversos
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84 João Viccnlr dr So u m Marcai, Pfluln Carvalho Natalino


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Sobrc C'omporl.imcnto c C'i)Hnlv«1o 85


Capítulo 6
A análise do comportamento no
trabalho psicopedagógico em
grupo
Márcia da Rocha Pitta Ferra/

O objotivo do presente trabalho é apresontar o acompanhamento de uma criança


quo froqüonta atualmente a 3“ sórie do Ensino Fundamental, com novo anos do idade,
numa situação do grupo. A descrição deste acompanhamento procura ilustrar a aplicação
da análise do comportamento em situação de grupo, integrada ao acompanhamonto
do outros profissionais (no caso, fonoaudióloga e psiquiatra), tendo como objetivos
desenvolver novos comportamentos acadêmicos do leitura, escrita e cálculo, orientação
dos profissionais da escola e acompanhamonto dos pais e familiares no manojo dos
problemas apresentados pola criança.
O uso do termo "psicopedagógico" no caso aqui descrito e não acompanhamonto
clinico suscita uma questão sobre os limites entre a psicopodagogia e o trabalho do
psicólogo clínico, na intervenção comportamental. A Psicopodagogia refere-se, no geral, à
aplicação dos conhecimentos psicológicos à aprendizagem escolar (Marinotti, 2001). De
acordo com os pressupostos o dados acumulados nas pesquisas básicas o aplicadas da
análise do comportamento baseada no behaviorismo radical, o comportamento humano ó
determinado pela interação entro o sujeito o o seu ambiente, participando dosta interação,
seu patrimônio biológico, sua história de vida e a história de sua cultura. A aprendizagem
escolar é comportamonto, sujeito às mesmas doterminaçõos do outros comportamentos,
portanto, depende da interação entre os aspectos biológicos, de história individual e social.
No caso descrito a soguir, partiu-se desta visão sobre a interação ontro as dificuldades de
dosomponho escolar encontradas pela criança, os aspectos familiares o o contexto escolar
relacionados. Assim, a intervenção do psicólogo não ficou restrita somente ao
dosonvolvimonto do habilidades acadêmicas, ou à análise do quo o problema oscolar era
uma característica biológica da criança, mas procurou rolacioná-lo ao contexto escolar e
familiar, dos quais as dificuldades obsorvadas oram tambóm uma função.
M. procurou uma avaliação psicológica por solicitação da oscola quando ostava na
1" sórie, na ópoca com sete anos de idado. As quoixas apresentadas pola escola oram: não
permanecor sontado realizando qualquer tarefa por mais de 5 minutos, agressõos vorbais o
físicas para com os colegas, não fazer tarefas na sala de aula o agitação constante que
dificultava o seguimento das atividades planojadas pola professora. Os pais relatavam
dificuldades semelhantos: roladonamonto inadequado com outras crianças na escola, rocusa
om atondor às solicitações dos mesmos ou do outro adulto significativo do sou ambiento,
rocusa om roalizar tarofas oscdaros (om casa e em sala do aula), dificuldades do sono,
agitação constante. Sua mãe e avó o acompanhavam nas tarofas oscolaros om casa o osta
ora a situação quo sempre acabava com brigas por parte delas, lontidão oxcessiva ao realizar
as tarefas, tornando a situação muito aversiva para todos. A mãe questionava a oscola o
qualquor pessoa que fizesse alguma observação negativa om relação a M, prindpalmonto as

86 M A ít I<i »la Rocha Pitta f r r r a /


originada na escola. Ela só aceitou uma intervenção quando a escola reforiu-se a não aceitá-
lo como aluno, caso ela não procurasse uma avaliação e orientação.

Avaliação
Após a ontrevista inicial com a mâe, e o pai (separados há alguns anos), contato
com a avó, iniciou-se a avaliação do M. que constou de sessões individuais e de grupo
(corca do oito sessões), onde seus comportamentos eram observados em diversas
situações espontâneas o planejados.
M. apresentou um nível do loitura bom abaixo do osperado para a sórie em questão,
tendo om vista o tipo de atividades a quo foi exposto desde o pró nesta escola. M. reconhecia
todas as letras do alfabeto e númoros do 0 a 9. Fazia inversões nas lotras S, E, F, e com
alguns números, como o 4,3, ou na loitura de numerais que envolvom dois dígitos (confundia
o 12 com o 21), principalmente em situações de escrita espontânea ou com limites de
tempo ou para a qualidade da execução.
Apesar de mostrar um raciocínio lógico adequado, fazendo perguntas interessantos o
comentários intoligentes om várias situações, resolvendo situaçõos-problema quo oram
relatadas e não envolviam leitura, tinha dificuldados significativas em situações quo envolvessem
cálculos com operações básicas e em reconhocer números com mais de dois dígitos.
Sua linguagom oral era adequada em termos dos vocábulos quo utilizava, no
entanto tinha dificuldades em relatar eventos do modo claro, não tinha noção do tempo om
termos de passado, presente e futuro, não sabia os dias da somana ou meses do ano.
Nas sessões em grupo apresentou os problemas de relacionamento relatados
pelos pais o pola escola: agitação constante, recusas claras om realizar atividades que
envolvessem leitura, escrita ou qualquer organização e verbalizações de autoconceito
negativo. Quando as situações envolviam tarofas om que estas habilidades eram requeridas,
M. iniciava comportamentos como cair da cadeira, falar alto, provocar verbal e fisicamonte
algumas das crianças prosentes (cutucar, colocar apelidos, imitar pejorativamente). Quando
todos ostavam realizando uma atividado om que seu desempenho não ora o mesmo, M.
dizia quo não iria mais brincar, que tudo estava muito chato. Levantava -se da mesa e ficava
andando pelo consultório. Na sala do espera sua mãe começava a conversar com ele, num
tom do voz e utilizando palavras somelhantes ás usadas popularmonte com bebês. Sua
agitação e engajamento om atividades fora da tarefa oram excessivos e incomodavam
muito as outras crianças, que passavam a não querer ficar porto dolo, respondiam às suas
provocações e chegavam a se rocusar a tê-lo no grupo. Mesmo para o terapeuta, sou nívol
de comportamontos inadequados e agressivos ora aversivo. Quando fracassava om
atividades, dizia que "não conseguiria porque ele ora burro mesmo".
Uma característica importante e que agravava toda a situação ora a dificuldado da
mãe em administrar seu tempo de trabalho e os cuidados com M. Sua carga do trabalho ora
intonsa e envolvia trabalhos tambóm aos finais de somana. Estava passando por momentos
difíceis e tinha todas as características de depressão.

Hipóteses explicativas
A suposição inicial foi a de que a agitação e recusas om realizar atividades, bem
como o autoconceito negativo, estavam relacionados funcionalmente com o reportório
inadequado de loitura, escrita e cálculo frente às oxigências de sala de aula, onde todos
os outros alunos já apresentavam uma leitura adequada em velocidade, sem muitos
erros e acompanhavam as instruções orais e escritas dadas pela professora. Ao
apresentar dóficits significativos destas habilidades nas situações de realizar tarefas

Sobre Comportamento e C oriií VíI o 87


determinadas pola professora num tempo que ora insuficiente para ele e que exigiam
habilidades mais complexas, M. se engajava em atividades incompatíveis (falar alto,
correr pola sala, subir na mesa da professora, provocar colegas), quo eram mantidas
pola atenção obtida por parte das outras crianças (rindo, brigando) o por interromper as
tarefas (fuga) ou ficar som fazô-las (tanto na sala de aula quanto em casa), o quo
mascarava suas dificuldades reais. Mesmo as conseqüências dadas pela profossora,
como não participar do atividades que ele gostava, não reduziam os comportamontos
inadequados apresentados em sala de aula. Fica claro que esta situação não favorecia
o desenvolvimento dos repertórios académicos adequados, o que agravava mais a
situação. Para a escola como um todo a presença de M. não era reforçadora.
Em casa, seu comportamento de não realizar tarefas foi generalizado para
qualquer solicitação feita pela mãe ou avó, principalmente. Por sua vez, olas acabavam
roforçando estes comportamentos: diminuindo exigências, aceitando acordos quo
adiavam tarefas, muitas vezes fazendo por elo qualquer atividade (comida na boca,
vesti-lo, organizar seus brinquedos) ou tendo "conversas longas" após episódios difíceis
de birras e recusas a cumprir solicitações. Cada uma delas estabelecia regras que não
oram cumpridas pola outra. A interação com M. era aversiva para as duas, quo o puniam
verbal (críticas freqüentes e severas) ou fisicamente. A situação gorava sontimontos de
culpa que acabavam interferindo no estabelecimento de regras claras o conseqüências
adequadas o constantos e com pouco reforçamento positivo para M.

Intervenção
A intervenção planejada para este caso envolveu os seguintes objetivos:
1. Com relação à criança: Optou-se por uma intervenção em grupo, quo permitiria
atuar diretamente nos comportamentos inadequados om relação às outras crianças,
através de RDO e modelagem. O grupo escolhido inicialmente era composto por
elementos que tinham dificuldades mais graves que M. em termos de leitura e
escrita, mas com habilidades de relacionamento mais adequadas e numa série
abaixo da sua. Esta configuração aumenta a probabilidade de M. em itir
comportamentos mais adequados às exigências das atividades, tanto em termos
de tempo quanto de desempenho e conseqüentemente obter reforçamento para os
mesmos. Ao mesmo tempo, a terapeuta tambóm se tornaria uma figura quo não
representasse as críticas e punições às quais estava constantemente exposto,
principalmente na escola, ou seja, estabeleceria um modelo adequado de interação
com os adultos. A situação de grupo ó semolhante á situação que ocorre na oscola
ou em outras situaçõos fora da clínica, o que favorece a ocorrência de comportamontos
inadequados e garante a possibilidade de manejo direto das conseqüências por
parte do terapeuta e das crianças do próprio grupo. Quando uma criança se apresonta
com problemas de leitura, suas habilidades são observadas, geralmente, primoiro
pela psicóloga da clínica. Numa primeira etapa da intervenção gorai quo ó foita com
a criança, atividades são programadas com o objetivo do avaliar e dosenvolver os
comportamentos doficitários. Após algumas semanas, se as dificuldades porsistirom
aposar do todo "pacote" de intervenção, outros encaminhamentos são foitos. Uma
forma de lidar com estes comportamentos é a realização de jogos, com diferentes
nívois do dificuldade, cujas regras pormitam estabelecer uma situação em que os
comportamentos inadequados sejam incompatíveis com as regras estabelecidas
para a situação. Cada atividade realizada em situação de grupo possibilita ao
terapeuta atingir vários objetivos ao mesmo tempo. Um exemplo ó o desenvolvimento
de habilidades de leitura a partir da adaptação de um jogo existente no mercado cujo

88 MArcid ila Kocha Pitla frrra/


nome é "Tapa Certo". O material do jogo consiste em várias figuras comuns para as
crianças como casa, carro, gato, ovo, sapato etc. Cada uma destas figuras ó impressa
numa carteia de forma circular e tem seu par impresso numa carteia em forma de
quadrado. Em cada cartola circular aparece a letra inicial da figura em questão. O
terapeuta espalha as carteias circulares pola mesa e fica com as carteias em forma
de quadrado. Cada criança recebe uma espócie de bastão comprido com uma
"mão" na ponta. O terapeuta distribui as “mãozinhas" entre elas, que ficam em pé, ao
redor de uma mesa. O terapeuta explica que mostrará uma figura de cada vez,
cabendo a cada uma ficar atenta à carteia apresentada e, assim que localizar sua
similar na mesa deve bater com sua “mãozinha". O terapeuta pode bater na mesa
antes de mostrar a carteia ou dizer "atenção" para sinalizar o inicio de uma tentativa.
Quem bater primeiro faz um ponto. A cada 5 pontos vão se formando os "ganhadores".
Todos acabam com uma classificação, os mais treinados vão saindo primeiro do
jogo e os iniciantes tôm a oportunidade de se desempenhar também. A permanência
na atividade, mesmo não sendo o primeiro a acabar e o cumprimento das regras
estabelecidas são os aspectos mais valorizados na sessão. Quem tem muita
dificuldade é ajudado por quem acabou primeiro. O jogo passa a ser mais difícil
quando as carteias com as figuras iguais são substituídas por cartões com as
palavras correspondentes às figuras. Uma outra variação, mais difícil ainda, ó colocar
sobre a mesa as diversas palavras o apresentar os cartões com as figuras. Estas
atividades são repetidas inúmeras vezes e utilizadas para desenvolver repertórios
básicos de leitura. Uma outra atividade, simples e fácil de ser administrada pelo
terapeuta e que mantém as crianças realizando tarefas com complexidade crescente
é o "rodízio de quebra-cabeças". As crianças são divididas em duplas e cada dupla
recebe um quebra cabeças com número inicial de 16 peças. Cada dupla inicia a
montagom dos quebra-cabeças. O terapeuta dá uma ajuda discreta para os que
têm mais dificuldades. São montados quebra cabeças até que um 3o lugar seja
alcançado. Quem não acabou pára onde estiver e se faz um rodízio destes quebra -
cabeças pelas crianças. Todos acabam sendo primeiros, quem tem dificuldado
recebe ajuda do amigo. Novamonte o esforço em permanecer na tarefa, cooperar
com a dupla e atender aos limites de término é que é valorizado. Nas próximas
tentativas, aumenta-se o número de peças dos quebra-cabeças. As crianças
costumam apreciar o resultado “concreto" de seu esforço: terminar um quebra-
cabeça e conseguir aumentar seu número de peças. Passam a comprar quebra-
cabeças com mais peças, trazem estes brinquedos para a clínica, pedem desafios
cada vez maiores. É o início da reversão do quadro de esquiva de atividades, de
aumento do tempo de permanência numa mesma atividade, do desenvolvimento de
habilidades sociais mais adequadas. Estes quebra-cabeças vão sendo substituídos
por carteias que envolvem montagem de palavras, realização de contas com cálculos
mentais, que são atividades desenvolvidas em sala de aula, mas que perdem sua
aversividade: elas passam a requisitar contas cada vez mais difíceis e leituras cada
vez mais complexas.
2. Com relação aos pais e avó: Ajudar a interpretar os comportamentos de M. do ponto
de vista de suas dificuldades em termos de habilidades de leitura, escrita e cálculo
que não eram correspondentes às exigências da escola e como isto se relacionaria
com os demais comportamentos de agitação, não cumprimento de solicitações etc,
anteriormente descritos. A mãe e avó foram orientadas nas tarefas de casa e
participaram de sessões, com outros pais, com o objetivo de desenvolver
comportamentos para lidar com os filhos de maneira mais adequada. A mãe e avó
também foram treinadas na própria clínica na interação com M. possibilitando

Sobre Comportamento e Coriiíí<1o 89


conseqüências mais claras, constantes e com o estabelecimento de objetivos que
tinham níveis crescentes de dificuldades. Isto envolveu observar sessões de grupo e
modelar comportamentos na própria sala de espera quando M. saia da sala de terapia.
A forma de conversar com M. tambóm foi modelada, Nenhuma delas deveria dar
atenção a ele enquanto estivesse fora da sessão e elas deveriam permanecer na
clinica pelo tempo estabelecido para durar a sessão com as outras crianças. Como
as sessões têm caráter lúdico, o ambiente é reforçador para todos, as outras crianças
saiam animadas, comentando o que foi feito e com vários "brindes" (pipoca, pirulito,
adesivos). Tambóm colaboravam não conversando com M.
3. Com relação à escola: Fazer com a professora e orientadora a mesma análise que
poderia explicar os comportamentos inadequados de M., o que contribui para que
estes profissionais se tornem mais reforçadores em relação á criança, uma vez quo
eles percebem a colaboração dos pais, uma ajuda de profissionais e passam a
encarar a criança com características mais positivas. As explicações para os
comportamontos de M. eram de que ele era mal educado, preguiçoso, briguento o
desobediente. Com uma análise mais funcional, estas explicações podem perder
força e levam os professores e funcionários da escola a uma postura onde as
conseqüências podem ser melhor aplicadas. A professora ora orientada a reforçar
mais os esforços de M em realizar tarefas do que os resultados por ele obtidos. As
tarefas foram dadas em menor número para ele, num momento inicial, aumentando
gradualmente conforme seus progressos em leitura, escrita e cálculo: suas avaliações
seriam aplicadas oralmente; M poderia fazer uso de materiais mais concretos para
realizar cálculos em sala de aula (palitos de sorvete, por ex ), a professora apresentaria
modelos de palavras escritas em momentos de ditados, os critérios de correção das
tarefas seriam diferentes e até mesmo a cor da caneta para as correções seria diferente
(em lugar do vermelho para os erros, estes passaram a ser corrigidos com lápis). A
professora reforçava a permanência de M. sentado para realizar as atividades om
intervalos de tempo cada vez maiores (ela passava ao seu lado e o elogiava, fazia
algum comentário positivo em relação a sua letra ou tarefa realizada). Quando m.
conseguia uma porcentagem maior de tarefas realizadas, recebia reforçadores como
ser o ajudante da classe naquele dia, participar de aulas de natação e Jogos. As
demais crianças foram orientadas para ajudar M., que estava com dificuldades. A
professora passava a elogiar e dar alguns privilégios para quem estivesse adequado
á situação e não permitia que as crianças fizessem comentários negativos em relação
a ele. Quando M. se engajava em comportamentos excessivos, toda classe o ignorava
e sua professora só intervinha quando o comportamento representasse perigo para
ele. Ele era retirado da sala e ficava com a orientadora, que por sua vez conversava
com M. sobre o ocorrido, relacionava seu comportamento às conseqüências que
havia obtido e não lhe dava mais atenção. No entanto, ela também passou a ir com
mais freqüência em sua sala, elogiando mais as crianças que se apresentavam
socialmente mais adequadas, principalmente M. Os elogios feitos a ele, inicialmente
eram bem discretos, falados em tom mais baixo. O mesmo ocorria nos intervalos das
aulas, quando os funcionários da escola deveriam seguir as mesmas instruções.

M. apresentou melhoras no relacionamento com outras crianças, passou a realizar


mais tarefas em casa e na escola, mas suas habilidades de leitura e escrita não evoluíram
significativamente. Apresentava déficits atencionais significativos mesmo com a redução
dos excessos comportamentais: dificuldade de manter a atenção numa tarefa por mais
de 10 minutos, dificuldades em manter a aprendizagem de habilidades de leitura de uma
sessão para a seguinte. Foi encaminhado para uma neuropodiatra e psiquiatra infantis e
decidiu-se pelo uso de metilfenidato (Ritalina). M. passou a apresentar melhoras

90 MArcid d<i Kuchii Fcrr»i/


atencionais e a realizar tarefas que exigiam uma organização mais complexa. No entanto,
sua leitura progredia lentamente. Foi encaminhado para a fonoaudióloga da clinica, que
completou o trabalho de desenvolver leitura e escrita mais elaboradas. As sessões com
a fonoaudióloga sâo baseadas na análise funcional dos repertórios de leitura e escrita e
têm as mesmas características das sessões com a psicóloga em termos de formato,
regras de relacionamento, acompanhamento dos pais e da escola.

Resultados
Após os encaminhamentos feitos e com a continuidade do acompanhamento
pela psicóloga, M. desenvolveu habilidades complexas de leitura e escrita, conseguia
ler os textos utilizados em sala de aula, numa velocidade adequada e com compreensão
de conteúdo.
Adquiriu também habilidades de cálculo para operações do adição e subtração
simples e com números que exigiam reservas. Apresentou progressos em cálculo
mental (sem utilizar lápis e caderno para sua realização). Apresentou a aquisição
adequada da tabuada.
Os excessos e inadequações comportamentais diminuíram significativamente
durante o tempo de terapia, M. permanecia o tempo todo da sessão dentro da sala de
terapia, realizando as atividades solicitadas e enfrentando desafios de atividades cada
vez mais complexas. Seu raciocínio lógico era excelente: conseguia desenvolver
estratégias para resolver problemas de matemática apresentados em séries mais
avançadas que a sua.
Os comportamentos de engajamento em atividades fora da tarefa diminuíram
de freqüência, conseguia realizar todas as tarefas dentro de sala de aula, passou a
atender mais às solicitações de tarefas em casa, executando-as sozinho em boa parte
do tempo.
Seu relacionamento com outras crianças ficou significativamente melhor:
conseguiu conversar adequadamente com as crianças da sessão, esperar sua vez na
realização de atividades: na escola as agressões praticamente desapareceram,
conseguindo desenvolver relacionamentos de amizade, melhorando sua cooperação
com as outras crianças e atendendo às solicitações da professora.

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Sobre Comportumcnlo c 1'ognifiio 91


Capítulo 7
Transtornos de Ansiedade e sua relação
com repertórios de leitura,
escrita e cálculo, numa
abordagem multidisciplinar.
Márcia da Kocha Pilta Ferra/
I lildebcrtoTavarcs
Cátia da Kocha Pitta

A palavra ansiedade é amplamente utilizada na nossa vida diária. No senso


comum, podemos estar “ansiosos" antes de fazer uma prova, começarmos num
novo trabalho ou ao pararmos num semáforo mal iluminado à noite. Todas estas
situ açõe s podem envolver um risco e utilizam os a palavra ansie dade para
descrevermos o estado interno que nos acompanha quando supomos perigo. Aflição,
angústia, receio, perturbação, são as palavras empregadas para descrever os
sentim entos que a com panham estas situações. “ Dor na barriga”, “coração
palpitante”, suor nas mãos, medo, são também termos e estados que podem ser
incluidos no que chamamos de ansiedade e aparecem freqüentemente no vocabulário
infantil.
Não ó o objetivo do prosente texto discutir a definição do termo ansiedade.
Partiremos da definição apresentada por Skinner (1953) que conclui que ansiedade ó o
nome usualmente dado à condição resultante da presença de um estimulo que precede
tipicamente um estimulo aversivo, com um intervalo de tempo suficiente para quo se
observem mudanças comportamentais: fortes respostas omocionais, elas próprias
aversivas, respostas do sistema nervoso autônomo, comportamento de esquiva,
interferência com o comportamento operante. A condição antecedente pode ser composta
de múltiplos estímulos, se o evento aversivo for inesperado, ou se foi repetido muitas
vezes em muitas circunstâncias (ansiedade generalizada).
Os problemas apresentados por crianças que têm dificuldades no desempenho
escolar caracterizam um dos motivos mais freqüentes de procura por ajuda psicológica.
Vários fatores podem estar relacionados às dificuldades escolares, como déficits
sensoriais, retardamonto mental, problemas neurológicos, escolarização inadequada
(métodos utilizados na escola, preparação inadequada do professor, frequentar uma
série cujas exigências sejam incompatíveis com a idade cronológica da criança),
dificuldades sócio- econômicas, dificuldades emocionais temporárias decorrentes de
problemas familiares ou de saúde e dificuldades especificas para a aprendizagem da
leitura, escrita ou cálculo que não podem ser explicadas pelos fatores anteriormente

92 MAitld ild Rocha Pllta ferra/, I líldebertofavares, CAlia da Rocha Pltta


mencionados. Este último conjunto de dificuldades é particularmente difícil de ser
identificado pelas próprias características do problema em relação à abrangência de
sua definição, pelo tempo que o profissional requer para fazer uma análise funcional
dos comportamentos e situações envolvidos, pelos comportamentos inicialmente
obsorvados que podem se caracterizar por esquivas sofisticadas por parte da criança e
por toda situação na família e na escola quo são desencadeadas juntamente com o
quadro apresentado. As conseqüências, em longo prazo, para as crianças que são o
centro desta situação, são extremamente nocivas: é comum observarmos baixa auto-
estirna, dóficits nas habilidades sociais, evasão escolar precoce com efeitos nocivos
para sua vida que persistem ató a idade adulta. Os adultos com Transtornos de
Aprondizagem podem ter dificuldades significativas na obtenção de emprego ou no
ajustamento social. Muitos indivíduos (cerca de 10-25%, de acordo com o DSM-IV, APA,
2000) que apresentam transtornos de conduta, déficit de atenção/hiperatívidade,
depressão, tambóm apresentam transtornos de aprendizagem.
O presente texto tem como objetivo analisar reportórios de leitura, escrita e
cálculo, as dificuldades na aquisição destes repertórios e uma possível relação com os
comportamontos de ansiedade que podem acompanhar esta situação. O caso
apresontado, que procura ilustrar esta relação, foi acompanhado por profissionais de
diferentes áreas (psiquiatra, fonoaudióloga e psicóloga), mas com uma abordagem
comportamental comum para analisar e lidar com os problemas colocados.
B ó uma criança do 11 anos, que frequenta a 6a série do Ensino Fundamental
em uma escola regular, na cidado de São Paulo. B. ó a primogênita de sua família e tem
uma irmã mais nova de sete anos. Seus pais têm nível superior (o pai ó módico e a mãe
é assistente social).
Os pais de B. foram encaminhados para uma avaliação pelo psiquiatra. B.
apresentava problemas para ficar longe da mãe, relatava medo intenso, dores
abdominais, agitação, perguntava frequentemente se iria morrer, tinha dificuldades para
dormir, para fazer amigos na escola e problomas de relacionamento com sua irmã
mais nova. Estes comportamentos haviam adquirido uma freqüência significativa
trazendo situações de preocupação o muitas vezes irritação para os pais e a própria
criança, que deixava de ir à escola, a passoios, dificuldades em relacionar-se com as
outras crianças de mesma idade e série: não tinha iniciativas para começar uma amizade,
comportamentos agressivos para com os colegas em sala de aula e no intervalo. Seu
desemponho na escola não era bom: na 5* série, B dependia da mãe ou de professores
particulares para manter um nível médio do desempenho escolar, não realizava tarefas
escolares sozinha. A situação foi ficando pior ao longo do ano, principalmente em
português e matemática.
Quando iniciou a avaliação, B. se mostrou adequada no relacionamento com a
terapeuta, respondia perguntas, escolhia brincadeiras e jogos. Aprosentava linguagem
oral adoquada, falando corretamente e utilizando vocábulos variados. Apresentou
problomas do permanência na sala de espera: no seu primeiro dia no consultório,
entrou em salas quo estavam com as portas fechadas sem a pormissão da secretária,
explorava os diferentes ambientes som mantor contato com as pessoas quo ali estavam.
Dentro da sessão, aposar do dosenvolver um bom nível de relacionamento com a
terapeuta, B. não mantinha muito contato visual, conversava em pó, de costas para ela,
desenhando ou mexendo em vários objetos de forma desordenada. Nos jogos, tinha
dificuldades de obodecor ás rogras, mostrava-se preocupada em ganhar e desistia
deles quando apresontavam alguma exigência maior do organização ou desemponho,
não permanecia muito tempo sentada. Algumas de suas verbalizações eram "isto está

‘»obre Comport<imenfo c C'oflniv<lo 93


difícil", "este jogo está demorando muito”, “não vamos fazer deste jeito, vamos mudar
estas regras" (no meio do jogo, principalmente quando percebia quo estava em
desvantagem).
Apresentava bom raciocínio lógico, comunicando seus pensamentos e
dificuldades. Reclamava muito de seus colegas do escola, dizondo-so injustiçada com
algumas brincadeiras. Não gostava de ir para a ecola, mas nâo queria sair dola. Dizia
quo ora a molhor escola do bairro, que as crianças que a frequentavam oram muito
inteligentes. Relatou os modos do que a mãe morresse, quo pudesse ser "tomada por
algum espirito maligno", ficava muito agitada quando ela saia para frequentar os cultos
da sua religião. Seus pais se mostravam muito preocupados com as queixas verbais
de B., estavam com dificuldades para dormir. B. não atondia às solicitaçõos do sua
mãe, principalmente. Fazia birras (chorava, roclamava, gritava com a mão quando queria
algo, em lugar de so expressar verbalmente), principalmonto quando contrariada ou
quando sous pais colocavam algum limite. Os problomas oram maiores quando eles
estavam afastados dela ou quando doveria fazer atividades escolares.
Seu material escolar apresentava-se aparentemente organizado, com atividades
foitas com cuidado. No entanto, seus professores queixavam-se de desorganização
quando B. realizava atividades em sala de aula: espalhava seu material até mesmo
polo chão para realizá-las, não entregava tarefas agendadas proviamonte. B.não anotava
as tarefas que deveria realizar, não tinha hábitos de estudo adequados, estava com
graves dificuldades no relacionamento com os colegas de sala de aula, chegando a
agredir fisicamente um deles, som provocação aparente. As maiores queixas vinham
da professora de português, uma pessoa que declarava que ora realmente exigonto
com os alunos.
B. apresentou dificuldades de leitura que não eram compatíveis com sua série
escolar: lentidão na leitura em voz alta, pouca compreensão de textos escritos, dificuldade
para o entendimento de instruções escritas sobre atividades, dificuldade de entendimento
de enunciados escritos. Apresentava bom raciocínio em problemas que envolviam
operações básicas, mas dificuldades em organizar mais de uma operação para resolver
um problema. Dificuldades com a tabuada.
Sua escrita aprosontava erros ortográficos que se caracterizavam por trocas na
posição das letras (“abarço" em lugar de “abraço”, por exemplo), omissõos do lotras em
palavras, dificuldades em empregar o "sM, "ss", "ç”, "c", omissões de palavras inteiras
em cópias, dificuldade em escrever uma resposta com sentido lógico. Apresentou
dificuldades em seguir regras matemáticas: na resolução de expressões numéricas,
que requerem uma seqüência para a resolução de sinais e oporações, não conseguia
rosolvô-las na ordom necessária, dificuldade em seguir regras de sinais na operação
com números inteiros, dificuldade de leitura de números com mais de quatro dígitos.
Apresentava também, nestas situações, uma freqüência aumentada de
comportamentos fora da tarefa como apontar lápis, deixar cair objetos, olhar em direção
a estímulos não relevantes para a situação, brincar com objetos.
B. queixava-se dos professores, mas não vorbalizava que tinha dificuldados.
Tudo era considerado fácil, ela já havia entendido "tudo" e quostionava algumas correções
da própria terapeuta, quando ela apresentava algum exercício que tivesso resolvido
sozinha. Não admitia erros de entendimento ou resolução cometidos por ola mosma.
Após as sossões iniciais de avaliação, a terapeuta convidou B. a participar de
uma sessão em grupo, com outras crianças de sua idade e série, que também tinham
dificuldades na escola. B. rolutou, mas rosolvou participar Na primeira vez que entrou

94 M(irci.i il.i Koch.i l’iU«i f m u / , I l i l t l e b e r l o C A t i a «l<i Koclxi Pitla


na sessão em grupo não iniciou nenhum tipo de relacionamento com as crianças, ficou
isolada, não mantinha contato visual, quando se dirigiam a ela, Nestas ocasiões B.
olhava para a terapeuta, respondia á outra criança olhando para a terapeuta e continuava
a não se relacionar com ninguém. A sessão era freqüentada por crianças de ambos os
sexos. Uma das meninas começou a se aproximar mais dela, ajudava B nas atividades
novas, nos jogos do grupo o conversava com ola. No entanto um dos meninos foz algum
comentário negativo sobre B. em relação ao seu desempenho no jogo. Quando isto
ocorreu, B. não roagiu. Após algum tempo, com todas as intervenções da torapeuta, já
om outra situação, B. agrodiu o menino fisicamente. A terapeuta interferiu, todos deram
sous foedbacks a respoito, a outra criança colocou seus sentimentos em relação ao
acontecido, a terapeuta deu o modolo alternativo de intoração, B. colocou-se verbalmento.
Tudo acabou bom nesta sossão, mas B. recusou-se a participar de outras sessões em
grupo. Fazia birras em casa antes de vir para a sessão, chegava atrasada, mas não
verbalizava o que realmente queria (somente situaçõos, que não abordassem conteúdos
relacionados à escola e que nao a colocasse frente aos problemas de relacionamento
com outras crianças).
As suposições feitas pelo terapeuta, que orientariam a intervenção no quadro
descrito foram:
1. B. apresentava-se em uma situação de controle aversivo, emitindo comportamentos
de esquiva frente a situações que exigissem habilidades de leitura, escrita e cálculo,
que se apresentavam deficitárias e inadequadas para sua idade e sórie escolar.
2. As conseqüências que obtinha na escola eram em forma de críticas, notas baixas,
retiradas de pontos por esquecimentos, comentários negativos dos professores ("você
deve prestar mais atenção", “estudar mais", "esqueceu a tarefa") que eram feitos em
sala de aula e eram públicos, como o das outras crianças e também funcionavam como
conseqüências aversivas.
3. Em casa, os pais também se mostravam decepcionados, cansados por ostudar
muitas horas com ela sem obter o êxito esperado e por tantos anos (desde a 1a sórie).
Comentavam quo era diferente da irmã, que nunca havia dado trabalho. Sua irmã era
atenta, simpática, carinhosa, fazia suas tarefas sozinha o estava se alfabetizando sem
qualquer dificuldade. Cada palavra nova que ela lia ou escrevia era uma emoção,
principalmente para a mãe. Sua mãe se mostrava muito preocupada com as notas de
B., evitava que ela ficasse de reforço, recuperação etc para que B. não se sentisso
■fracassada" e não fizesse birras.
4. Os fracassos de B. acabavam funcionando como eventos punitivos para a mãe, que
procurava mais aulas particulares, professores ospocializados etc. A mãe não conseguia
manter uma conduta coerente com B: estabelecia limites, que oram quebrados depois
das birras, mostrava-se desesperada quando B. começava a chorar e emitir
comportamentos "estranhos" (o comportamento da mão estava sob controlo das birras
de B. o, para terminar as birras, negociava todos limites anteriormente colocados,
chegando a fazer as tarofas escolares por ola). Estes comportamentos da mão acabavam
reforçando as birras de B. e dosportavam na própria mão sontimentos de irritação o
raiva em rolação á filha. Sua mão queria afastar-se dola nestes momentos, verbalizava
ostes sentimontos de forma agressiva, mostrando sua docepção e acabava agredindo
B. fisicamento.
5. A reação dos pais, principalmente a da mãe, juntamente com as punições sofridas na
escola, acabaram dosonvolvendo um repertório do esquiva de trabalhos oscolaros: não
anotar tarefas (quando a mãe conferisse a agenda, não haveria lições para serem

Sobro Oomporfiimrnto e (*o«niv«lo 95


feitas), não ter as datas das provas (não estudar era melhor que estudar e tirar notas
baixas - “Se eu estudo bastante, vou mal, se estudo pouco, vou mal também, então eu
não estudo nada e não tenho trabalho, faço coisas melhores como ver TV à tarde"),
perder os livros que precisavam ser lidos, não anotar instruções sobre trabalhos. Toda
a situação quo envolvesse escola ou trabalhos escolares deveria ser ovitada.
6. Os comentários do» professores acabaram por criar uma Imagom do B. nogatlva
para os demais alunos da escola. Como B. não tinha repertórios mais desenvolvidos
de Habilidados Sociais, e como sou modelo de resolução de relacionamentos conflitantos
era o de sua casa, com agressões verbais e físicas que terminavam os impasses que
ocorriam, B. agredia os colegas de sala quando faziam algum comentário ou brincadeira
quo envolvesse sou desemponho em tarefas. As agressões ocorriam mais em sala de
aula e depois que as provocações haviam ocorrido. Isto acabava reforçando uma imagem
nogativa de B. para as outras crianças e afastando-as mais. B.não era mais convidada
para festas de aniversários e, quando isto ocorria, não queira ir. Acabou esquivando-se
de situações quo onvolvessem pessoas desconhecidas, longe dos pais.
7. As quoixas de dores de barriga, palpitações, medo de perder os pais (principalmente
a mãe), suor nas mãos, medo do morrer são comportamontos que poderiam funcionar
como respostas fisiológicas que ocorrem fronte a situações onde ocorrerão
conseqüências aversivas e como esquivas que a retiravam das situações que ela sabia
que terminariam com conseqüências aversivas (por exemplo, não ir á escola naquele
dia). Estes comportamentos de ansiedade ficavam mais freqüentes no final de um
período de férias.
8. Os baixos repertórios de leitura, escrita e cálculo acabavam colocando B. numa
situação onde as exigências eram inadequadas para sua capacidade de resposta, ou
seja, os comportamentos que emitia nunca seriam considerados adequados, ela não
seria reforçada, por mais que se esforçasse.
Além de identificar estas contingências para os pais e professores e colocá-los
num programa de orientação, seria necessário intervir nos repertórios inadequados
de B: leitura, escrita, cálculo, relacionamento com outras crianças e adultos
significativos, com o objetivo de diminuir os comportamentos de ansiedade, de
esquiva e aumentar a possibilidade de obter reforçamento.
A leitura, escrita e cálculo são classes de comportamentos de ordem superior. Na
sua aquisição, comportamentos novos aparecem através do estabelecimento de
relações de equivalência entre estímulos, seguidos de reforçamento (Catania, 1999).
A aquisição destas classes de ordem superior envolve subclasses de comportamento
e caracteriza-se por uma aquisição complexa. Para termos uma idéia, superficial
apenas, dos processos comportamentais implicados na leitura, vamos considerar
o tempo gasto para lermos as seguintes palavras:

BOLA

MACACO

ALGODÁO

FARMÁCIA

96 M Arcid tld Kocha Piltd ferrai, I lililrhcrtofdvnr«*», CAtid ild Korhd 1’ lltd
PSICOTERAPIA

CATASTROFIZAÇÃO

DESCATRACALIZAÇÃO

SONOCOTOMENANO

GRATOFOLOGRAMO

MUNGANGUENTO

ICTIOPSOFOSE

As palavras conhecidas o com sílabas simples (passaram por aprendizagem anterior),


são lidas por nós facilmente, basta que sejam apresentadas e utilizamos apenas suas
propriedades visuais para serem lidas (é como se apenas ao olhá-las, já conseguíssemos
saber o que está escrito, bem como o conceito a que se referem). Mesmo que apenas
algumas dimensões visuais das mosmas aparecessem, ou quo ostivessem escritas com
diferentes formatos de letra, conseguiríamos saber a que palavras se referem. Quando as
palavras vão ficando mais complexas em termos de sílabas que as compõem, da quantidade
de letras ou mesmo do conhecimento que possamos ou não ter delas, o tempo gasto e as
relações que estabelecemos são mais complexas: para ler "psicoterapia" uma criança gasta
um tempo bem maior que um psicólogo deveria gastar. O mesmo ocorre com o psicólogo ao
ler SONOCOTEMANO (uma pseudopalavra) ou ICTIOPSOFOSE (que significa o rumor feito
pelos peixes debaixo da água): ó necessário mais tempo porque temos que "ler” e "ouvir”
cada uma das sílabas ou letras envolvidas. Mesmo assim, dependemos de nossa experiência
anterior para sabermos o significado de cada uma delas.
Uma criança com dificuldades de leitura gastará mais tempo e deverá estabelecer
relações que envolvem dimensões visuais e auditivas do estímulo. Para ler um texto, esta
criança acaba levando mais tempo que outra que não tem esta dificuldade, a compreensão
do seu conteúdo acaba ficando comprometida e o texto escrito acaba adquirindo propriedades
aversivas. Se a criança está em seus estágios iniciais de aquisição de leitura, estas
dificuldades são mais comuns e até mesmo esperadas e seu desempenho não será
punido. No entanto, se as dificuldades persistirem e as exigências aumentarem, a ajuda
requerida será considerada inadequada e não estará mais disponível: o paradigma de
punição estará estabelecido. Ler mais lentamente e cometer erros de escrita são
desempenhos altamente prováveis para quem tem estas dificuldades especificas e serão
criticados severamente pelos professores, principalmente nas séries mais avançadas.
Como a criança não tem respostas mais adequadas disponíveis no seu repertório, só lhe
restará esquivar-se destas punições. Tarefas em maior número, mais quantidade de leitura,
permanecer mais tempo em sala de aula sem recreio ou atividade física são as soluções
que normalmente são empregadas nas escolas. Em lugar de melhorar a leitura e escrita,
a criança passa a desenvolver sentimentos negativos para com estas atividades e só as
realiza para livrar-se de mais punições e não porque é agradável realizá-las. Qualquer sinal
de punição torna-se um estimulo punidor (Sidman, 1989): para alunos punidos em classe,
a escola torna-se um punidor. As próprias pessoas que usam punição são também punidores

Sobre Comport.imenlo e Cogniv>li> 97


condicionados e assim, professores, tarefas escolares, situações que antecipam ir à escola,
ou qualquer atividade que requer leitura, escrita, organização e raciocínio, também adquirem
esta propriedade- A punição, por sua vez, tem efeitos colaterais e um deles é produzir fuga e
esquiva e vir acompanhada de sentimentos e sensações que caracterizam ansiedade
(Sidman, 1989). No caso de B, a ansiedade e o medo quo antecipam as situações que
terminam em punição não sâo as causas dos problemas do palpitação, queixas de dores
abdominais, mas são comportamentos que se desenvolvem em situações onde a punição
é certa, principalmente porque a pessoa não consegue emitir os comportamentos desejados,
uma vez que eles não fazom parte de seu repertório ou estão deficitários e inadequados. A
intervenção do terapeuta deve se dirigir a alterar as contingências atuantes por parto dos
pais e da própria escola, com o objetivo de desenvolver novos comportamentos do leitura,
oscríta, cálculo e de reíacionamento sociaí, que possibilitarão a obtonçáo de reforçamento
positivo para esta nova classe de comportamentos, diminuindo as esquivas e fugas emitidas.
B. foi encaminhada para outra escola, com um esquema educacional diferente da anterior.
B. foi também encaminhada para a fonoaudióloga da clínica, que ó responsável
pelo desenvolvimento de repertórios de leitura e escrita mais sofisticados. O
acompanhamento na área de psicologia inclui sessões individuais e om grupo com o
objetivo de desenvolver habilidades sociais mais adequadas, diminuindo as dificuldades
de relacionamento em casa (com seus pais e sua irmã) e na escola (com seus colegas e
adultos responsáveis), aíém de desenvolver habilidades de cáículo e matemática mais
adequados á sua série escolar.
B. aprendeu a identificar as situações em que apresenta medo o ansiedade; em
lugar de esquivas, foi feito reforçamento de comportamentos de enfrentamcnto das mesmas
(expressar seus pensamentos, expressar os sentimentos de manoira mais adequada).
São feitas orientações com seus país com o objetivo de ensinar modelagem através
de roforçamento positivo, identificar as situações onde os comportamentos de ansiedade e
medo são mais prováveis e enfrentar estas situações sem ceder às birras ou aos evitamontos
anteriormente apresentados,
B. foi colocada em situações onde ficou gradualmente mais tempo sozinha na
clinica, sem a presença da mãe na sala de espera, até que conseguiu permanecer o tempo
todo das sessões sem ir até à sala de espera para verificar se sua mãe estaria lá. Houve
ocasiões em que ficou esperando por seus pais sem demonstrar sinais de desconforto.
Consegue fazer leituras e cálculos com mais rapidez.
Seu relacionamento com as outras crianças ficou mais adequado; inicia conversas,
mantém atividades com outras crianças nas sessões em grupo, dírige-se mais
adequadamente às outras crianças e à terapeuta, brinca com algumas crianças mesmo na
sala de espera, não apresenta mais comportamentos de agressão física ou verbal, tem
excelente relacionamento com as terapeutas. Os comportamentos considerados de
ansiedade diminuíram de freqüôncia e B. encontra-se sem medicação.
O caso de B procurou descrever uma situação onde as queixas iniciais do ansiedade
foram consideradas não causas dos comportamentos, mas como comportamentos que
surgem como produtos de esquemas de contingências punitivos. A intervenção nas
contingências atuantes teve como objetivos uma intervenção na escola e família e nos
próprios repertórios deficitários de leitura, escrita e cálculo que possibilitariam o
desenvolvimento de novos comportamentos, mais adequados à situação escolar e a
diminuição das esquivas e fugas anteriormente utilizadas.
As dificuldades de relacionamento de B. também não foram consideradas como
causadas pelas dificuldades de leitura, escrita e cálculo, mas relacionam-se funcionalmente

98 Márcírt d« Rochri Pittd ferra/, I /<(iíc(>ertor<>v.jrn, C.tfid d<t Kocha fttta


a um esquema de contingências que dificulta o desenvolvimento de Habilidades Sociais
mais adequadas (como assertividade, manter conversação adequada, manter amigos,
entre outras) e tem como conseqüências o agravamento dos comportamentos de ansiedade
inicialmente observados. Intervir nestas contingências envolveu profissionais de diferentes
áreas: um treinamento específico em leitura e escrita (uma atuação nas respostas que a
criança apresentava, realizada principalmente pela fonoaudióloga), a utilização de medicação
(feita pelo psiquiatra), uma vez que os sintomas de ansiedade atingiram níveis importantes,
que levavam B. a esquivas de situações sociais importantes para seu desenvolvimento, o
que agravaria mais ainda sua situação em médio e longo prazo, a retirada gradual desta
medicação e a manutenção da intervenção feita.

Referências

American Psychiatrlc Associatlon: Dlagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fourth
Editlon, Washington. DC, American Psychiatric Assoclation, 1994.
Catanla, A. Charles (1999). Discriminação Condicional e Classes de Ordem Superior. In Aprendizagem:
Comportamento, Linguagem e Cognição, {pp. 163-176). 4 ed Porto Alegre: Artes Médicas
Sul, 1999.
Skinner (1953). Ciência e Comportamento Humano. Sào Paulo. Martins Fontes.
Sidman, M. (1989). Coerção e suas Implicações. Campinas Editora Livro Pleno, 2003.

Sobre Comportamento o CogniçAo 99


Capítulo 8
Análise Quantitativa do
Comportamento:
Funções Matemáticas na Descrição de
Funções Comportamentais
M d rcioC ru/
C/erson Yukio lom.inaii
USP

Apresentação geral
Analistas do comportamento procuram identificar e descrever relações
funcionais de que o comportamento do um organismo é função, tanto no contexto do
pesquisa quanto de aplicação (Meyer, 2001; Sturmey, 1996; Skinner, 1953). Normalmente,
isto é feito por meio da língua falada pelo analista, em sua comunidade verbal. Por
exemplo, diz-se que o comportamento de pressionar a barra por um rato sedento ó
reforçado pela apresentação de uma gota d’água; dessa forma, afirma-se que o
comportamento do rato e a gota d'água mantém uma relação de dependência entre si,
ou seja, uma relação funcional descrita por uma contingência operante. Um terapeuta
verifica que sempre que é deixada sozinha no quarto escuro, a criança começa a chorar
e, ao ouvir o choro, a sua mãe acende imediatamente o abajur; nesse caso, parece
haver uma relação de dependência (funcional) entre o choro da criança o o acender do
abajur pola mão (v. Guilhardi e Queiroz, 2001, para a ilustração de uma análise funcional
minuciosa em contexto clinico; v. Andery, Micheletto e Sério, 2001, acerca dos diferentes
usos da expressão "análise funcional" pelos analistas de comportamento).
Apesar da eficiência com que relações funcionais são descritas por meio da
nossa língua falada, essa não é a única forma de fazê-lo. Quando descrevem-se os
resultados de uma pesquisa, muito freqüentemente figuras e gráficos são utilizados
para atingir uma eficácia de comunicação que dificilmente seria conseguida somente
com palavras (Machado e Silva, 2004). Nos exemplos acima, curvas negativamente
aceleradas representariam o número de pressões à barra do rato ou o número de
iniciativas de choro da criança (variáveis dependentes) em função do número de
exposição às contingências (variável independente). Seria uma forma visualmente clara
e direta de representar tais relações funcionais.
Assim como as relações funcionais são representadas por meio da linguagem
falada ou de recursos gráficos, pode-se também fazer uso da linguagem matemática,
Tal como qualquer outro tipo de linguagem, a descrição matemática, na forma de uma

100 Miircio Cru/, C/cr*on Yuklo lorriiiu.irl


equação (ou modolo matemático), doscreve uma relação funcional, identificando as
principais variáveis envolvidas em um determinado fenômeno comportamental e
rolacionando-as entre si. A linguagem matemática ó uma forma precisa, sucinta e gonérica
de descrever comportamentos, dos mais simples aos mais complexos (Church, 1997).
Contudo, a linguagem matemática não ó de fácil exprossão ou compreensão.
Por isso, raramente as suas vantagens são aproveitadas plenamente, mosmo por
pesquisadoros e terapeutas comportamentais quo poderiam utilizá-la como recurso
analítico. Além disso, análises comportamentais complexas e rigorosas são possíveis
do serem feitas apenas por letras o palavras, em vez de números e equações. Portanto,
considerando-se apenas o fato de a linguagem matemática ser mais sucinta e genérica
do que a linguagem falada, os prejuízos para a análise do comportamonto não são tão
significativos. Entretanto, ao empregar análises quantitativas avançadas, para além da
estatística descritiva mais froqüentemente utilizada, è possível um aprimoramento da
compreensão e, principalmonte, da previsibilidade de fenômenos comportamentais.
Doterminadas esferas das ciôncias humanas são constituidas com base na
precisão propiciada pela linguagem matemática, muito superior á que pode ser obtida
com a linguagem falada. Há séculos, os arquitetos tratam suas obras por meio da
linguagem matemática porque ó muito difícil determinar somente com palavras se um
viaduto vai suportar a carga de tráfego ou se ele vai desabar. Hoje em dia, nos jornais,
afirma-se que a taxa de juros inviabiliza investimentos; mas como os economistas, sem
o uso de linguagem matemática, poderiam decidir qual taxa torna um investimento
atraente?
Manter um viaduto aberto ao tráfego ou interditá-lo? Investir ou não? Questões
como estas mostram que há situações na arquitetura e na economia em que a linguagem
matemática, mais precisa, não poderia ser substituída pela linguagem falada. Da mesma
forma, na análise do comportamento, a linguagem talada pode ganhar muito, ao ser
complementada com a linguagem matemática, sempre que se verifique a necessidade
de maior precisão. É o que tem ocorrido em várias áreas de investigação. Por exemplo,
há uma extensa litoratura que descreve matematicamente a relação entre resposta o
reforçamento (lei da igualação, Hermstein, 1970; 1974; Mijares e Silva, 1999; Todorov e
Hanna, 2005). Há modelos matemáticos de extinção comportamental (Killeen 1975;
1979). Há modelos do escolha comportamental entrelaçadas com inúmeros fatores
que a afetam (Baum, 1974; 1979; Nevin, 1984). Há modelos que descrevem o controle
de estímulos (ou a porda dele) em função do aumento do intervalo entre a apresentação
de um estímulo modolo e as suas comparações no procedimento de escolha de acordo
com o modelo (Watson e Blampied, 1989; White o McKenzie, 1982). Há modelos
matemáticos de autocontrole (Ainslie, 1975; Hanna e Ribeiro, 2005; Rachlin, 1974). Há
modelos matemáticos de avaliação da função reforçadora de um estímulo (Fantino e
Abarca, 1985; Gonçalves, 2005; Mijares, 2005), entre muitos outros.

Funções matemáticas
Para explicar dotalhadamonte o significado que as funções matemáticas podem
assumir na psicologia, será discutida inicialmonte a sua utilização clássica em sistemas
físicos. As equações de movimonto são exemplos dessa natureza. Não é possível, num
dado momento, que um objoto esteja em dois locais ao mesmo tempo, mas é possível,
e bastante comum, que um objoto ocupe o mesmo local em momentos distintos - por
exemplo, quando o objoto está imóvol, ele ocupa o mesmo local durante todos os
momentos quo se passam enquanto ole permanece imóvel Isto exemplifica o conceito

Sobre Comporl.miento e Ci>8»tv<to 101


matomático de função, no qual, para cada valor assumido pela variável, no caso, o tompo
contado a partir de um instante definido, há um único valor que a função pode assumir, no
caso, o valor corrospondento a uma posição.
É fácil perceber a utilidade das funções na previsão de situações futuras, pois,
om principio, so um resultado físico (variável dependente) podo ser calculado como função
do outros parâmetros físicos (variáveis indopondontos) conhocidos ou controlávois, podo-
se prover o seu estado futuro.
Dofinida a posição de um objeto por meio de uma função temporal, é possível
calcular, a cada momento, a posição do objeto. Se um caminhão inicia uma viagem a
partir do quilômetro 120 de uma estrada e trafega a 70 km/h [ou seja, rospeita a função P(t)
= [120 + 70 x t], sabem-se os seus dois parâmetros físicos fundamentais, isto ó, a sua
posição inicial e a sua velocidade. A partir destes dois parâmetros da função, pode-so
prever que, quando o tempo for de duas horas, o caminhão estará no quilômetro 260, ja
quo P(2) = 120 + 70 x 2, ou seja, P(2) = 120 + 140 = 260.
Podo-se também descrever fenômenos como funções de outras variáveis que
não o tompo. Como exomplo, sabendo-se que uma aplicação bancária rondo 1% no môs,
ó possívol provor o valor que será sacado daqui a um môs (valor sacado VS) como função
do valor depositado (VD). A função VS = VD x 1,01 permite sabor que quom depositar R$
100,00 irá sacar, em um môs, R$ 101,00; quem depositar R$ 1.000,00, irá sacar, em um
môs, R$ 1.010,00. Para qualquer valor depositado, pode-se saber qual será o valor sacado.
Assim, pelo conhecimento da função que descreve um fenômeno, juntamente
com os seus parámotros, podo-so prever com procisão como o fenômeno vai se comportar
dianto de cada valor assumido por variáveis controladas. Por outro lado, conhecondo-se
a forma geral da função, podom-se estimar os parâmetros apenas com base em mediçõos
do comportamento em estudo. Neste caso, a palavra "comportamonto” podo ser entendida
em um contexto mais amplo, ao permitir estimar os parâmetros velocidade o posição
inicial do caminhão com base em seu “comportamento”, bom como, a partir do
"comportamento" da aplicação financeira, determinar os parâmetros taxa de juros e valor
inicialmente aplicado.
No caso do caminhão, sabondo-so que a sua posição obedece a uma função do
tipo linoar P(t) = P(0) + V x t, e conhecendo-se duas medições empíricas, já ó possível
estimar os parâmetros correspondentos à sua posição inicial P(0) e á sua velocidade V.
Considora-se quo modições empíricas do "comportamento" de um caminhão consistam
de apontamentos de sua posição na estrada em instantes conhecidos: se na terceira
hora o caminhão estava no quilômetro 330 e na quinta hora elo estava no quilômotro 470,
ó fácil saber a sua velocidade V = (470 - 330) 12 = 140 / 2 = 70 e sua posição inicial P(0)
= P(3) - V x 3 = 330 - 70 x 3 = 330 - 210 = 120 km/h.
Quanto à aplicação financeira, pode-se fazer o mesmo, dosde que so saiba quo,
nosso caso, pode agora ser considerada uma função do tempo do tipo oxpononcial, o quo
sejam conhecidas duas modições empíricas do seu "comportamento": após um môs,
havia R$ 1.010,00; após dois meses, R$1.020,10. Pela divisão dos dois valores, descobre-
se que o parâmotro rondimonto valo 1%; rotirando-se este 1% do valor após um môs (R$
1.010,00), obtóm-se o valor inicial, R$ 1.000,00.
Nesse momento, o leitor poderia questionar: seria possível saber quo tipo do
função determina o comportamento do caminhão o da aplicação financoira somonto a
partir do modiçõos empíricas? Poderia, mas somonto duas modições não seriam
suficientes para isso. Contudo, um levantarnonto cuidadoso da evolução da dinâmica do
comportamonto do caminhão e da aplicação financoira ao longo do tompo, com base na

102 M c ir iio C n u , l/e rs o n V u k io lo m .iin iri


visualização de cinco a dez medições empíricas assinaladas num gráfico, já seria possívol
sugerir que o gráfico do comportamento do caminhão se assemelharia a uma reta, ou
seja, seria possívol recomendar uma análise a partir de uma funçào do tipo linear, O
mesmo poderia ser foito com o gráfico do comportamento da aplicação financeira, cuja
visualização provavolmonte donunciaria a forma do uma função do tipo expononcial (v.
Shull, 1991, que ilustra a correspondôncia entro diferentes equações, gráficos o funções).
Mas, nosto caso, do posso de um número entre cinco e dez medições, como se
poderiam obtor os parâmetros das equações levando em consideração todos estes
dados, ou seja, todas estas medições? É exatamonte isto quo se propõe explicar neste
capítulo: a partir de um conjunto do medições ou dados empíricos, mostrar como os
analistas do comportamonto podom calcular, com o auxílio de um computador com
planilha eletrônica, os parâmetros do funções quo descrevam a dinâmica de um
comportamento. A partir de funções dovidamonto parametrizadas, este analista poderá
realizar provisões, dentro de intervalos de confiança, para o comportamento futuro de
seus sujeitos ou paciontes.
No caso específico de funções quo buscam modelar comportamentos, vale
lembrar quo, ombora muitas sejam obtidas empiricamonte, ou seja, a partir de dados
experimentais aos quais se buscam identificar as funções matemáticas que rnolhor se
ajustam, o analista de comportamento pode se utilizar também de funções criadas com
base em conhocimentos teóricos, na forma de extensões metafóricas (Skinner, 1957),
tal como descrito por Shull (1991). Em todo caso, a descrição da relação ontro as
variáveis e os seus ofeitos, por moio de funçõos matemáticas, contribui para a clareza
e a elaboração mais precisa de um fenômono natural, ao confrontar previsões com
resultados reais obtidos experimontalmente, e vice-versa.

Metodologia geral para avaliação quantitativa de previsões teóricas


Hipóteses devem ser testáveis oxperimentalmente e, assim, precisam ser
confrontadas com dados empíricos. Quando isso ocorro, cabe ao pesquisador procodor
com a avaliação quantitativa do ajuste entro as previsões feitas e os dados empíricos
obtidos, utilizando-se de metodologias espocificas.
Apresenta-se, a seguir, uma metodologia geral para avaliação quantitativa de
previsões teóricas. Uma metodologia geral, ó verdade, que não sorá incondicionalmonte
eficaz. Mas espera-se que seja útil como referência e como introdução didática, facilitando
aos aprondizes a compreensão dos conceitos matemáticos envolvidos. De posso
destes conceitos, cada usuário poderá construir motodologias específicas para as
suas necossidades ou acompanhar a sua construção, por profissionais com formação
matomática apropriada.
Para que esta metodologia possa ser aplicada, ó necessário que o corpo do
conhecimentos teóricos sobro uma dada realidade - física, biológica, psicológica, social
etc, - sejam suficientes para que uma função matemática possa ser escolhida com o
objetivo do descrever quantitativamente algum dos aspectos desta realidade. De posse
desta função, podem-se aplicar técnicas matemáticas de otimização para se obter os
parâmetros da função quo a ajustem (ou soja, que aproximem a função) o máximo
possivel aos dados empíricos disponlvois. Definidos a funçào matemática o os seus
parâmetros, podem-se calcular os valores que ela assumirá no futuro, formulando
hipóteses quantitativas testáveis oxperímentalmonte. Da comparação entre estes valores
provistos e os valores observados empiricamento, pode-so, caso as previsões sejam

Sobro Comporl.tmonlo o CoRniçilo 103


inadequadas, refutar a função matemática o o seu correspondente corpo de
conhecimentos teóricos ou, caso contrário, avaliar quantitativamente, por meio de
ostatísticas, as previsões feitas e o modolo teórico utilizado. A capacidade de realizar
previsões acuradas e confiáveis pode viabilizar a aplicação do conhecimento teórico a
situações econômicas, tecnológicas o científicas.
A análise do comportamonto conta com modolos matemáticos aplicados a
diversas áreas de pesquisa, conforme apontado anteriormente. Muitas destas
aplicações, entretanto, são relativamente desconhecidas por muitos, apesar de suas
indiscutíveis relevâncias. Parto da razão para isso pode ser explicada por características
próprias da linguagem matemática, que exige uma dodicação especial para o seu uso
durante a elaboração de um trabalho, ou mesmo para quo so possa comproonder um
trabalho que a emprega. É uma nova linguagem que se dove dominar, tanto
concoitualmente, quanto tecnicamente, antes quo uma análise quantitativa possa ser
apreciada na ausência do seu afamado caráter incompreensível, abstrato, aversivo.
Concebido para cumprir fins didáticos, propomos quo o presente capitulo soja
para o leitor uma iniciação ao universo das funções matemáticas, de função matemática
teórica, parâmetros da função, ajuste, dados empíricos, valores previstos, valores
observados e avaliação estatística. Por essa razão, será utilizado um exemplo bastante
simples do situação física que permite ilustrar todos esses conceitos sem excesso de
dificuldades matemáticas ou exigôncia de conhecimentos específicos. Assim, adota*se
uma situação prototípica composta por uma lata contendo maçãs. Não se sabe o poso
da lata, tampouco o peso de cada maçã, mas dispõom-so de três pesagens desta lata
com 8, 10 e 11 maçãs. A partir desses dados, será possível estimar o peso da lata? O
peso de uma maçã? O peso da lata quando contiver 20 maçãs? Com que margem de
acerto isso pode ser foito?
O uso deste exemplo simples e facilmonte acessível ao leitor pode minimizar
as dificuldades conceituais que porventura pudessem surgir caso fossem empregados
exomplos comportamentais, cortamento mais complexos, por mais simples que
fossem. Nesse momento introdutório, não é desejável que a atenção do aprendiz seja
dividida com a análise de um fenômeno comportamental em qualquer de seus aspectos,
metodológicos ou conceituais. É muito importante que o leitor so concentre nos
fundamentos que norteiam a análise quantitativa dos dados. Quo a simplicidade deste
exemplo físico sirva como estimulo para que o leitor desenvolva analogias adequadas
à sua área de atuação e aplique a análise quantitativa do dados na descrição do
fenômeno comportamental de seu interesse. Ao final do capítulo, esso ponto ó retomado
para explicitar algumas das possíveis relações entro a analogia da lata de maçãs o
questões específicas da análise do comportamento.

O peso da lata de maçãs


Sobre uma balança, tom-se uma lata com oito maçãs. A balança indica 1355 g
como poso total da lata e das maçãs. Acroscentando-se duas maçãs á lata, choga-se ao
poso de 1530 g. Com mais uma maçã, atinge-se 1635 g. Qual será o peso da lata vazia?
Quanto posará a lata com três ou quinze maçãs?
Este problema pode ser facilmento modolado considerando-se o conhecimento
que todos os leitores têm acerca dos pesos de latas e maçãs om nosso mundo físico.
Embora cada maçã tenha um poso ligeiramente diforonte, todas devem estar próximas
do um "peso módio" (que será chamado "M”). Além disso, considora-se que a lata tenha

104 M.irtio Cruz, C/crson Vukio lom.m.iri


determinado peso (que será chamado "L"), mesmo vazia (contendo “zero maçãs").
Finalmente, a cada maça que seja colocada na lata, o peso total do conjunto irá aumentar
proporcional e linearmente. Ou seja, com base em experiências anteriores, sabe-se que,
ao acrescentar maçãs a uma lata, o poso do conjunto se comporta como uma função
linear e o seu gráfico tem a forma de uma reta inclinada. Portanto, o peso total da lata com
maçãs (que será chamado "T”) devo seguir aproximadamento a seguinte equação1:
T=L+n.M
Esta equação significa que o peso total (T) é igual ao peso da lata vazia (L) mais o
peso médio de uma maçã (M) multiplicado pelo número de maçàs (que será chamado “n").
Note-se que esta equação, embora descreva adequadamente o problema, não
explicita o peso da lata (L) nem o peso médio de cada maçã (M). Do ponto de vista matemático,
isto é conveniente, porque indica que esta mesma equação também serviria para descrever
um problema equivalente no qual, em vez de maçãs, a lata contivesse molancias (que têm
um peso médio bem maior que as maçãs!) ou outras frutas. Interessantemente, mesmo
que a lata fosse trocada por outra de peso diferente, a equação continuaria válida. Assim, o
peso da lata (L) e o peso médio das maçãs (M) são os dois parâmetros da equação, valores
que devem ser obtidos para adequar esta equação, que é muito geral (serve para maçãs,
melancias etc.), ao problema em particular que se deseja resolver, ou soja, o peso estimado
desta lata e o peso médio de uma dasmaçãs, em particular.
_ . __ , Dispõe-se dedados empíricos
Tabela 1 - Três pesagens experimentos da correspondenlos a lrês pesagons dis,inlas,
atfl com macas,------------------------ uma com 0 jt0 0utracom dez e outra com onze
Quantidade de maçãs Peso total maçãs, conforme mostra a Tabela 1.
n T- . É com base nestes dados empíricos
_______________________ que os parâmetros L e M deverão ser
0 1 355 inicialmente escolhidos. A escolha de
parâmetros adequados faz com que a equação
10 1530 resulte em valores possivelmente mais
próximos dos valores empíricos.
1635

Na Figura 1, os três T(g)


pequenos círculos correspondem 2500-f
às três pesagens. Os valores
correspondentes aos três pontos
no eixo “n” indicam quantas são -q Q -
as frutas (oito, dez e onze maçãs),
e os valores, no eixo "T” ,
correspondem ao peso total em
cada uma das três situações
(1355, 1530 e 1635 gramas). 20 n

Figura 1 - Pesagens com lata de maçfls.

1Uma dHV;uWade muno discutida na áma da modelagem matoméb<.a (la fenômenoe oomportamartal», axpoata em outra» partes deste capitulo,
diz raapeto à proposiçãode equaçAes (1) com base am oorhecknenlos prtwtna «abi» a realdade (o comportamento) ani estudo ou (2) exduelvamonte
base na ^n e # w iç a da funçáoe da reaklade (do comportamento) Esta equação Ineartoi proposta oom base em conhedmentaneórlcos"
do como uma lata da maçt se comporta porque, caeo contrário, seriam necessárias mais da três meòtçOes para propor uma (unçéo, IIrMiar ou nâo
Nosso cato. a* tatieles d« cálculo Mflam mal* complexas, o que deixaria de cumprir os flns didáticos a que nos propomos

Sobre Comport.imrnto e CoflniçJo 105


Solução gráfica
Note-se que os trés pontos são aproximadamente alinhados, o que é coerente
com a equação usada para descrever a situação fisica (T = L + n . M), uma equação
linear* em n, cujo gráfico T x n sempre forma retas.
Na Figura 2, alóm dos trôs pontos empíricos exibidos na Figura 1, há três retas.
Estas retas correspondem à mesma equação (T * L + n . M), mas elas são diferentes
entre si porque têm valores diferentes para os parâmetros L e M. Por exemplo,
comparando-se as retas continua e pontilhada, verifica-se que a rota contínua assume
uma lata de 300 g (ou seja, L = 300) e maçãs com peso módio de 125 g (M = 125); a reta
pontilhada assume L 55 1000 e M = 50.
A reta contínua ó a mais
inclinada das trôs, o que indica que ela
corresponderia a frutas mais pesadas
(valores de M maiores), já que o
acréscimo (ou retirada) de uma fruta
alteraria mais preponderantemente o
valor de T. Por outro lado, a reta
pontilhada é a que indica o maior
parâmetro L (peso da lata vazia), o que
podo ser visto comparando-se a altura
0 5 10 15 20 n om quo as trôs retas cruzam o eixo T "
-
Figura 2 - Pesagens com lata de maçãs e projeções. igual a zero, ou seja, quando o peso
total não inclui nenhuma fruta (lata
vazia). Finalmente, a reta tracejada é a
que visualmente mais se aproxima dos três pontos empíricos e, por isso, os seus
parâmetros L e M possivelmente são próximos ao peso da lata e ao peso médio das
maçãs em nosso problema.
Assim, este problema pode ser resolvido graficamente, assinalando-se os
pontos empíricos, traçando-se uma reta que passe o mais próximo possível destes
pontos, e estimando-se os
parâmetros L e M, conforme
T(g)
indicado na Figura 3.
Esta solução gráfica, |L - 050 g |
se 10 maçAs
apesar de prática, não é muito Humtntam o
precisa Alóm de a estimativa dos poso om 000 Q,
parâmetros ser relativamente M - 90 0 I
grosseira, o traçado da reta "mais
próxima" dos pontos pode deixar
dúvidas, principalmente quando
há muitos pontos empíricos, ou 0 5 10 15 20 n
existe uma grande variação nas
pesagens. Por exemplo, seria Figura 3 - Pesagens com lata de maçãs e estimativa
difícil decidir qual a "melhor" reta gráfica de parâmetros.

1Podo m (llzor que uma equaçAo è Mnear em um pwlimrtru (n, nu cato) m . mantendo »a o« demata parAmatro* conatanto* (no caao, L a
M), a aquaçAo m toma uma aquaçAo d« prirnotrograu. como por oxompto, y - a x + b. a aquaçAo da rata Realmente, «a L a M aAo
conatante», T - L ♦ n M * equivalente a y • a x ♦ b, com a ■ M, b ■ L, a lun\£o y »atido o paao total T a a variável x »ando o número da
maçAa n Da meama forma, pode «a Oi/ar qua a furçAo T é Hnear em L (mantando aa M a n amatantM) aatnM (inartando «a L a N

I 06 M.ircio C'ru/, t/crion Yukio tom.in.iri


para a nuvem de pontos empíricos mostrados na Figura 4, pois sempre pode haver
discordância sobre qual reta e quais parâmetros seriam mais adequados a este (ou
qualquer outro) conjunto de dados empíricos.
Há vários motivos para
as pesagens ou as medidas
T(g) apresentarem variações. Se,
__ em vez de maçâs, a lata
contivesse sapos vivos (I),
— haveria uma variação intrínseca
__ na pesagem dos sapos - ou
seja, uma variação que seria
— essencial, inseparável da
__ pesagem de sapos vivos -, que
provavelmente ficariam pulando
— i ou se mexendo o tempo todo.
10 20 n Assim, resultados semelhantes
aos da Figura 4 provavelmente
Figura 4 - Pesagens com variação Intrínseca.
seriam obtidos, o que dificultaria
bastante a identificação gráfica
da reta “mais próxima" dos
dados empíricos.

Cálculo dos parâmetros: Erro Quadrático Médio (e.q.m.)


Dada a atual disponibilidade de máquinas de calcular e planilhas eletrônicas
(Excelda Microsoft, por exemplo), tem-se mostrado muito conveniente obter parâmetros,
tais como L e M, por meio de cálculos. Além de mais precisos que as soluções gráficas,
os cálculos permitem que dois ou mais pesquisadores adotem um procedimento único
para obter exatamente os mesmos parâmetros diante dos mesmos dados experimentais.
Na Tabela 2, podem ser comparados os valores obtidos experimentalmente
nas pesagens da lata contendo oito, dez e onze maçãs, com os valores calculados pela
função T = L + n . M, adotando os parâmetros correspondentes á rota continua (L = 300
e M = 125) e á reta pontilhada (L = 1000 e M = 50) da Figura 2.

Pesagens experimenta» Pesos calculados

Quantidade de maçfls Peso total Rela continua Reta pontilhada

n T (g) T ® 300 + n . 125 T* 1000 + n.50

8 1355 1300 1400

10 1530 1550 1500

11 1635 1675 1550

Tabela 2 - Comparação das pesagens com as funções.

Pela equação da reta continua (quando há oito maçãs na lata), T = 300 + n . 125,
tem-se, com n = 8:

Sobre Comportamento e Cogniftlo 107


T = 300+ 8 . 125
T = 300+ 1000
T = 1300

Por meio de cálculos semelhantes, realizados para dez e onze maçãs (n = 10 e


n = 11), são obtidos os pesos 1550 e 1675, previstos pela a reta continua na Tabela 2.
Com a equação da reta pontilhada, T = 1000 + n . 50, são calculados os pesos 1400,
1500 e 1550, provistos por esta equação para oito, dez e onze maçãs, respoctivamente.
Note-se que o peso de 1400 g, previsto pela reta pontilhada para oito maçãs, foi 45
g maior do que o valor obtido na pesagem experimental (1400 - 1355 = 45), e quo o poso de
1300 g, previsto pela reta contínua, foi 55 g menor do que o obtido experimentalmente (1355
- 1300 = 55). Assim, como o "erro" da reta pontilhada foi maior, em comparação com os
dados experimentais, pode-se dizer que, para oito maçãs, a reta continua teve "melhor"
aproximação. O contrário ocorreu com dez e onze maçãs: com estas quantidades de maçãs,
as previsões da equação da reta pontilhada ficaram mais próximas aos valores das
pesagens do que as previsões da reta contínua; ou seja, para dez e onze maçãs, pode-se
dizer que a reta pontilhada aproximou-se melhor dos dados experimentais.
Por um lado, com a pesagem de oito maçãs, a reta contínua se aproxima
melhor. Por outro, para dez e onze maçãs, a reta pontilhada se aproxima melhor. Assim,
como dizer qual das duas retas “melhor" se ajusta aos dados experimentais? Nesse
caso, ó necessário adotar um critério que permita calcular um "erro médio" frente às três
pesagens. Este "erro médio" calculado deve permitir avaliar cada equação
simultaneamente às três pesagens; comparando-se as avaliações das equações, pode-
se escolher aquela que "melhor" se ajusta aos dados empíricos.
Para a avaliação de parâmetros e de equações, é comum a adoção do critério
do menor erro quadrático médio (e.q.m.), pois este envolve cálculos bastante simples.
A Tabela 3 ilustra como o erro quadrático pode ser calculado, permitindo comparar qual
reta da Figura 2, a contínua ou a pontilhada, "melhor" se ajusta aos dados.
Tabela 3 - Cálculo dos erros quadráticos médios das duas retas.

Pesagens experimentais Pesos calculados

Quantidade de maçãs Peso total Reta continua Reta pontilhada

n T (fl) T = 300 + n 125 T ■ 1000 + n . 50

8 1355 1300 3025 1400 2025

10 1530 1550 400 1500 900

11 1635 1675 1600 1550 7225

Erros quadráticos médios (e.q.m.) 1675 3383,3

Os valores dos erros quadráticos são obtidos elevando-se ao quadrado (daí o


nome "quadrático") as diferenças entre as pesagens experimentais e os pesos previstos
pelas equações das retas contínua e pontilhada. Como exemplo, o valor do erro quadrático
de 3025, obtido para a reta contínua com oito maçãs, foi calculado elevando-se ao quadrado
o erro de 55 (a diferença entro o peso calculado e o obtido, ou seja, 1355 - 1300 = 55), isto
é, multiplicando-se 55 por 55 (55J = 55 x 55 = 3025). Segue outro exemplo, mostrando
como foi calculado o erro quadrático de 7225 da reta pontilhada para onze maçãs:

108 M.ircio Cru/, C/rrson Yukio Fomainiri


Erro quadrático = (1635 - 1550)2
Erro quadrático = 85^
Erro quadrático = 85 x 85
Erro quadrático = 7225
Calculando-se todos os seis erros quadráticos das rotas contínua e pontilhada,
para oito, der e onzo maçãs, chegam-se aos erros quadráticos médios de 1675 e
3383,3 indicados para cada uma das duas retas na última linha da Tabela 3. Para isso,
basta calcular a média aritmética dos trés orros quadráticos 3025, 400 e 1600, obtidos
para oito, dez e onze maçãs na rota contínua, e a média dos trés erros quadráticos 2025,
900 o 7225, obtidos na reta pontilhada. Exibem-se abaixo os cálculos das médias
aritméticas para obtenção dos e.q.m. correspondentes ás retas contínua e pontilhada.
Reta continua Reta pontilhada
e.q.m. * (3025+ 400 + 1600): 3 o.q.m. = (2025 + 900 + 7225): 3
e.q.m. = 5025 : 3 e.q.m. = 10150 : 3
e.q.m. = 1675 o.q.m. = 3383,333...'3383,3

Note-se (ver Tabela 3) que o e.q.m. da reta continua foi calculado com os
parâmetros L = 300 e M = 125. Da mesma forma, o o.q.m. da reta pontilhada foi calculado
com os parâmetros L = 1000 e M = 50. Os parâmetros da reta contínua L = 300 e M = 125
resultaram em menor orro quadrático. Com base neste critério, portanto, entre ostas
duas possibilidades (rota contínua e pontilhada), seriam estes os parâmetros adotados,
por se aproximarem mais das pesagens empíricas. Neste procedimento, adota-se
sempre como critério a escolha de parâmetros que resultem em menor erro quadrático
médio, ainda que os procedimentos de cálculo aqui apresentados também possam -
mediante adaptações - operar com outros critérios.

Cálculo de parâmetros: m inimizar o e.q.m.


Definido o critério de avaliação, podem ser testados vários conjuntos de
parâmetros até que sejam encontrados aqueles que resultem no "melhor" ajuste, ou
seja, no menor "erro" possível. Observando os e.q.m. calculados na Tabela 3, podem-
se aplicar e avaliar parâmetros próximos a L = 300 o M = 125 na busca por um e.q.m.
menor que o obtido com os parâmetros da reta continua, aprimorando-os ainda mais.
Por exemplo, variando-se o parâmetro L em 1%J para mais e para menos em torno do
valor L = 300, tem-se L = 297 e L s 303. Na Tabela 4, são calculados os e.q.m. para L =
297, 300 e 303, mantendo-se M = 125.

Tabela 4 - E.q.m. para variação no parâmetro L, mantendo fixo M = 125.

Heaayan» experlmaulala H»»i» calculado* (Mira M ■ 12». vanwtdu L «*m loto» da 300

anlldade da rnaçAi Paao lotai «ala L 1% Mela L HetaL 4 1%

n l (g) r ■ » 7 ♦ n 125 T a 300 ♦ n 125 T a 303 4 n 125

■ 1MB 1297 11M noo 1025 1303 2704

10 1530 1547 28« 1550 400 1553 520

11 1635 1672 1360 1675 1600 167H 1H4U

oa quadi*tk:<M mAdtoa (a <) m ) 1074 1675 1604

' Eata vmloçAo do pai Afimlm mn 1% Iam como otyellvo nvahnr de que tmxk) iitim | mk|uih\m mudança rto fxtrAnintru rtfoluoa q m Podtiri* Mr
uIM/míh vurirtvAo do pnrAnwtro. d«0.1 %, 0,5% ele , axn lyoiil roíuiltndo

Sobre Comporta mcnlo e Co^itlvAo 109


Obsorvando-so a e.q.m.
Tabola 4, porcobo-se um 2000
aumento do e.q.m. à medida que 1950
L aumenta (mantondo-so M = 1900
125). Isto sugoro quo, com M = 1H50
125, sejam obtidos e.q.m. 1600
1750
menoros, ou seja, “melhores” 1700
ajustos, quando os valores de 1650
L são menores que 300. Mas 1600
qual será o valor de L que 296 297 29B 299 300 301 302
resultaria no menor e.q.m ? Há Peso da lata L (g)
infinitos valores de L menores
quo 300, e não ó possível testá- Figura 5 - E q m x L para M * 125
los todos!
A Figura 5 ilustra como o e.q.m. varia em função de L, quando M = 125. Nele, há
três pequenos triângulos que indicam os e.q.m. para L igual a 297, 300 o 303.
Observando-se apenas os dados mostrados na Figura 5, quo oxibo três
triângulos representando os três e.q.m. calculados, ó difícil imaginar a qual L
corresponderá o e.q.m. mínimo, porquo ó impossível saber quo tipo do função rolaciona
o e.q.m. ao parâmetro L. Em outras palavras, o fato do o e.q.m ser monor para L = 300
do que para L = 303 não garante, por exemplo, que o menor e.q.m, ocorra para L monor
que 300. Ou soja, somento observando estes três o.q.m. calculados, não se pode
descartar que o menor e.q.m. ocorra para L maior que 300.
A Figura 6 mostra, para
M = 125, duas das infinitas e
possíveis funções que podem
relacionar o e.q.m. com o
parâmetro L. e que passam
pelos três pontos indicados
pelos triângulos. Neste gráfico,
a função ropresontada por uma
linha continua sugere quo o
296 297 29« 299 300 301 302 303 menor e.q.m. ocorra com L
próximo a 298, enquanto quo a
Peto da lata L (g) função representada pola linha
pontilhada indica um L próximo
Figura 6 - Possíveis funções para E q m x L a 302. Somente observando
estes três e.q.m. calculados,
não é possivol saber qual destas duas funções sugoro um L "melhor”, ou soja, um L
quo rosulto num menor e.q.m..
Aponas observando-se gráficos tambóm não ó possível saber, entro todas as
outras infinitas funções diforentes destas duas, se alguma outra sugoro o "molhor" L,
aquele quo corrospondoria ao monor e.q.m.. Contudo, como a função T é linoar om L (vor
nota do rodapé número 1), podo-so provar1 que o e.q.m. se rolaciona ao parârnotro L
' Considerando-se T1, T2 e T3 o» pesos lotais medidos nas trAs pesagen» com n1, n2 e n3 rnaçA», lem-ne (com
o parAmetro M mantido conslanle e dofinindo-se ki * Ti - ni M) que o erro quadrAlico mrtdio (e.q.m .) ó o.q.m
" I V <l V> M)l; * I V <L * V M)l' ♦ I V <l * n- M>l'
e.q.m. » [T, - I. - n, . M )' + [V L - n, , M|» ♦ [ T - L - n , . M]'
m. * [k, — L)' ♦ (Kj— 11' ♦ [k ,- L)'
m. ■ k , * - 2 k. . L + l.* + k , » - 2 . k3 L ♦ L1 * k ,*- 2 k , . L + L'

110 M.irtli) Cru/, l/crsun Yukio lnmiin.irl


conformo um polinómio de sogundo grau, ou seja, sou gráfico tem a forma do uma parábola*
Para que o erro seja representado por uma parábola de segundo grau em x, é necessário
que (1) a função que se utiliza para aproximar os dados empíricos seja linoar e que (2) o
critório de erro soja o e.q.m. Em condições diferontes dessas, caso o método genérico ora
apresentado não sirva apropriadamonto, outros métodos terão de ser analisados o testados,
muito provavolmente com a ajuda
de um especialista nas áreas de 2ooo
mat emát i ca/ est at í st i ca.
Conhecendo-se apenas trôs
valores de e.q.m. calculados a partir , 1800
de trôs ostimativas do L (ou seja, 1750
1700
apenas com os trôs pontos 1650
indicados pelos trôs pequenos 1000

triângulos), é possível, conformo 296 207 29« 2»9 300 301 302 303 304

mostra a Figura 7, obter a parábola Paso da lata L (g)


indicada o ostimar graficamente
(em 298,5) o valor de L que Figura 7 - E.q.m. x L aproximado por parábola.
minimiza o e.q.m..
Contudo, para obter um valor exato, sem a necossidade de construir este gráfico,
desenhar a parábola, ou ostimar visualmente o ponto de minimo, basta utilizar a seguinte
equação:
V (y, - y,) ♦ *,* (y3- y.)+ * / (y, • V
X = ------------------------------------------------------
2 (x, - xa) (y, - y;t) - (x, - x^ (y, - y3)

Nesta equação, aqui chamada “equação de minimo", deve-se substituir x,, x, e


x3, respectivamente, pelos três valores de L utilizados (297, 300 e 303), bem como
substituir y1t y?o y3pelos valores dos e.q.m. correspondentes a estes valores de L (1674,
1675 e 1694). Assim, neste exemplo, obtém-se:
297’ (1675 - 1694)♦ 3002 .(1694 - 1674)♦ 303*.(1674 - 1675)

2 [(297- 303) . (1675 - 1694) - (300 - 303) (1674 - 1694))

88209 (-19) + 90000 20 ♦ 91809 ( -1)


x ■
2 . [(-6) (-19). (-3) (-20)|
-1675971 + 1800000 - 91809
x * -----
2 (114-60]

e.q.m. « k * ♦ k / ♦ - 2 . k, . L - 2 . k , . I. - 2 . k , . L ♦ L> ♦ V * U
e.q.m. - l k / - 2 1
k, l + 1 LJ
e.q.m. ■ £ (Tr n ,. M )' - 2 . 1 (T, - n, M) L ♦ 3 . L'
Trata-se de uma equaçAo d« segunda gmu do tipo « q m. ■ A + 0 . 1 + C , U , onde A, B e C sào canatanlfit», com
A » I (T, - n, MP, B ■ - 2 . I (T, - n, M) e C - 3.

'P a ra que o erro se|a representado por uma parábola de segundo grau em x, A necessArio que (1) a lunçflo que ne
utiliza para aproximar o * dado» empíricos seja linear e que (2) o critòrlo de erro seja o e.q.m. Em condições diferentes
dessas, cafio o mátodo genérico ora apresentado nào sirva apropriadamente, outros métodos ter Ao de ser analisados
e testados, multo provavelmente com a ajuda de um especialista nas áreas de matemática/estatística

Sobre ('omporMmrnto e C.*ofinlv*1‘> 111


32220
x=
108

x - 298,333... - 298,3

Assim, o parâmotro L que resultaria no mínimo o.q.m. seria 298,3 g. Noto-so


ainda que, embora simplos, os cálculos aqui omprogados são bastanto trabalhosos -
por isso, ó conveniente o uso do planilhas eletrônicas para realizá-los de modo prático
e possivelmente com menos erros. Note-se tambóm que, mesmo em situações em
que não se tratar do uma função linear (como ó linoar a função T = L + n . M usada neste
exemplo), a utilização desta equação de mínimo pode resultar em boas estimativas do
parâmotro L, desde que a função e.q.m. ao redor dos valores de L em uso soja
somolhante a uma parábola com um valor mínimo (parábola com a "boca para cima"),
isto é, seja contínua e a sua segunda derivada varie pouco, om torno do um valor
constante o positivo". É difícil sabor do antomão se a função atondo a estes critérios.
Assim, podo ser conveniente aplicar a equação de mínimo e verificar se o valor do
parâmetro L resulta ou não num menor e.q.m..
Obtido este valor de L = 298,3, pode-se usar o mesmo procodimento para obter
uma melhor estimativa do parâmetro M Na Tabola 5, fixa-se o valor de L om 298,3 g,
variando-se o valor de M em 1% em torno de 125 g. _________________
Quantldad» d» maçAs Pnso total Reta L - 1% R h Ih L Rata L ♦ 1%

n T (0 ) T ■ 296,3 ♦ n 123,7 T - 298,3 + n . 125 T * 298,3 ♦ n 126,2

8 1356 1287,9 4502,4 1298,3 3214,9 1307,9 2218,4

10 1530 1535,3 28,1 1548,3 334,9 1560,3 918,1

11 1635 1659,0 576,0 1673,3 1466,9 1686,5 2652,3

Erros quadráticos médios (e.q.m ) 1702,2 1672,2 1929,6

Tabela 5 - E.q.m para variaçflo no parâmetro M, mantendo fixo L * 298,3.

Aplica-se novamente a equação de mínimo, mas agora se substituem os valoros


x,, x? e xJt respectivamento pelos très valores do M utilizados (123,7; 125 e 126,2), bem
como se substituem y,, y? e pelos valores dos o.q.m. correspondentes a estes valores
de M (1702,2; 1672,2 e 1929,6), e obtém-se uma estimativa de M * 124,4.

Cálculo de parâmetros: Iterações e convergência


A partir de um "chute inicial" dos parâmetros M = 125 e L = 300, que resultavam
em um e.q.m. = 1675 (ver Tabela 4), obtiveram-se novos parâmetros M = 124,4 e L *
' AfiurAUikiUmiHfiKiçAoyurnly» h x' + |> x * c A|»«àtx>lt<ét»^.«nFl«k:MUxm>«|iia<*>dom(>aç<)(S■ So*Vo M g 12/2)(HtiH(k>M^ww«r
a rin (|tm Mo arrameaaadoa »ob yravklada em função do lampo A primar« darivada d« aqiiaçAo em x A dy/dx »2 h x♦ ba
rti|HniM!nlaavetoddadeenifunçAodotempo(ou V ■ Vo ♦ g l,comoéu»*daemíl»tca) A»egundailerlvedada«*|iiav*o* d2y/dx2■ 2 a(ou,
como MMH»k;a A<-^l«raçâo ■ g) Em parAtx>la« do »ngurxlo grau, a «egiinda derivada è unia oonilartt* Por Hmki a Flaica uMH/a- wi da iwntlxiliw
im n (teacrever lançamento de o ty * » gravidade pó«*» a vetocklade do* cÂtfik» varta da modo ^jroxlmadamenta linoar ami o tomfxj, txi aeja,
a ixlnwwa derivada da vekxidade (qtm 6 a »egimda derivada da eqiieçâodo eapeço. ou teja, a aoeleraçAo) nfci varta muHo Auun, mi |>ariMx>laH
«Ao Ixm*tf(iroxlmMçAe« (M NHo movimento de lançado. wübgravtdadn abxlnquenali» objeto» em <|ueda kvrri nAo raapnilem|mrfellamanti>
n<)(iaçAea<lollpo8 ■ So ♦ Vo M g 12/2 a aceleraçAogravllaciunalnAoé tutaliiKxitacxxmlante Ma«.oomoaa(«tnfav*ogravlUid(i<ialiiâovartH
rniilto (dewle qt m «e e«te)a falando »obre utyeto« do diaadia, a n*o »obre nave« eapadali), pode-ae utar atia equaçAo (com nave» «»pedal»
** **<*iaçflei» »Ao (Hitraa ) De voHaao noa*o caao, m a »ogonda derivada da hinçAo ono variar pouco, pode-aa afiroxlmar a funçAo mm|xx um a
parAM«. m ui riMlore» riaooa

112 M.iriit> Cru?, l/ m o n Vukio lom.in.irl


298,3, que fornecem um melhor e.q.m., que, calculado da mesma forma que Indicado
nas Tabelas 3, 4 e 5, resulta em 1646,1, um erro bem menor do que os 1675 Iniciais.
Pode-se chamar de iteração a cada conjunto de cálculos necessário para, a partir de
uma estimativa dos parâmetros L e M, obter uma outra estimativa destes mesmos
parâmetros - que, espera-se, resulte em menor e.q.m.. Em geral, são necessárias
várias destas iterações para se obter, com a precisão desejada, os parâmetros L e M. A
Tabela 6 mostra os valores dos parâmotros L e M, além dos e.q.m. obtidos para zero,
uma, duas, três, dez, vinte, trinta, cem, duzentas, trezentas e novecentas iterações (zero
iterações corresponde ao "chute inicial").
Iteração L M e .q .m

0 300 125 1675

1 298 124 1645

2 303 124 1593

3 309 123 1542

10 342 120 1230

20 383 116 892

30 418 112 649

100 551 99 91

200 601 94 31

300 610 93 29

900 612 93 29

Tabela 6 - Iterações para obtenção de L e M.

Da análise da Tabela 6, verifica-se uma grande redução do e.q.m. a partir da


décima, até a centésima iteração. A partir da ducentésima iteração, as diferenças nos
parâmetros e no e.q.m. tornam-se menos expressivas, passando a ser menos relevantes
frente aos recursos envolvidos, caso se deseje realizar iterações aos milhares, dezenas
de milhares etc. Chama-se convergência este fenômeno em que pequenas variações
nos parâmetros ou no e.q.m. são obtidas com um grande número de iterações. Diz-se,
no caso, que os valores de L, M e e.q.m. convergem para valores7 próximos de,

' O» vatom» d«t L • M para o* gualt m ftantçAm oonvergam »*n 92,5 b fi 12,5 TaMvakvaapnriamaaniMfcluapotragnNaâoInaarporquaahjnvA»
r ■ L ♦ n MéurTWh)nçâolnn«r,oqueparnrirteadotaromé*xV>doamlnirnoaqiJ*1rii<1oa,umc«aopartk)utof(1oprocedlmento(|iiralaquldeaorito,
quarwurfta noa partmotra» detajadoa com oa Muuintoa cátcutoa wnptaa, Mm a necesaidíHJe da KornvOoa, Mindo | o número total do pesagem

I n « 8 * 10* 11 «29
£ t - 1366+ 1530* 1835 - 4520
I n' • 0' ♦ 10' ♦ 11' ■ 64 ♦ 100 ♦ 121 ■ 205
£ n T -B 1355♦ 10 1530♦ 11 1035- 10040* 15300* 17906-44125
D - | . I n ' - ( I n ) » " 3 ?86-2»»a055 - 041 »14
L ■ ( X T I n '- I n I n T): D» (4520 20 5-2 8 44125): 14
L» (1200200-1279026): 14-0575:14-012.5
M ■ ( j. I n T - I n I T) D»( 3 44125 - 29 4520) 14 «(132375-131000) 14-92.5

Sobre C'omport.imfnlo c (.'oRniçilo 113


respectivamente, 612, 93 e 29. Destaca-se, ainda, a total inviabilidade de realizar tais
quantidades de iterações sem a utilização de planilhas eletrônicas, mesmo porque,
com elas, a obtenção destes parâmetros ó muito rápida, envolve muito pouco trabalho
e praticamente nenhum cálculo - por parte do usuário da planilha, obviamente, já que
todos os cálculos são feitos pelo computador.
Considerando-se L = 612 e M = 93, pode-se finalmente responder às questões
propostas no inicio deste capitulo. L - 612 deve ser o peso da lata vazia, sem maçãs.
Com trôs e com quinze maçãs, tem-se:
T=L+n.M T * L +n .M
T - 612+ 3 . 92 T = 612 + 15 . 93
T * 612+ 276 T ■ 612 + 1395
T = 888 g T = 2007 g

Ou seja, com trôs maçás, a lata deve pesar 888 g. Com quinze maçãs, deve
posar pouco mais do dois quilogramas.

Confronto entre previsões e medições reais


Tendo finalmente as projeções dos pesos da lata com três e quinze maças om
mãos, como saber o quão adequadas elas são? A obtenção dos dados empíricos que
permitiriam compará-las com pesagens reais, no caso, seria a forma possível de avaliá-
las definitivamente. Em nosso caso, pode-se supor que as pesagens empíricas foram
possíveis de serem feitas. Na Tabela 7, são comparados os pesos previstos e reais
para a lata com quinze maçãs.
Provisto Roal E abs t rol (% )

2007 2048 41 2,0


Tabela 7 - Avaliação dos erros de previsão da lata com quinze maçâs
(E Abs = Erro Absoluto e E.Rei. « Erro Relativo).

Na Tabela 7, verifica-se uma diferença absoluta (E.abs) de 41 g entre o valor


provisto (2007 g) e aquele medido empiricamente (2048 g), quando a lata com quinze
maçãs foi pesada. Esta diferença, multiplicada por 100% e dividida pelo valor previsto,
resulta em uma diferença relativa (E.rei) de aproximadamente 2%. Ou seja, com base
em trôs pesagens, com oito, dez e onze maçãs, foi possível prever, com um erro
relativamente pequeno, qual seria o peso da lata com quinze maçãs. Mas será que este
resultado pode ser generalizado? Pesando-se outra lata, comprada da mesma fábrica
de latas, tambóm com oito, dez e onze maçãs, todas extraídas do mesmo lote de onde
foram tiradas as primeiras maçãs utilizadas para as primeiras previsões, a previsão
para quinze maçãs seria tão boa quanto foi da primeira vez?
Para que se possa ter confiança no nível de erros e na qualidade das previsões
realizadas, ó necessário replicar o experimento com mais de um "sujeito". Os "sujeitos", neste
experimento'', sào as várias latas, e o objetivo do experimentador é, com base no
conhecimento do resultado de cada sujeito, em trôs condições iniciais (pesagens com
oito, com dez e com onze maçás), ser capaz de prever o resultado de cada sujeito diante
de uma situação futura, portanto, nova e desconhecida (pesagem com quinze maçãs).
* Por no trutur do oxporimonlo estutiattco. outro nome uaado para clMcnrm nuprttoa «x|>«rimantMi humano«, vtvoa n*o-humanos ou nftovIvoR
ri ’HrnotitrR“

1 1 4 M iird o C ru /, C/crson Yukio Fonnm.m


Com este objetivo, tem-se a Tabela 8, a partir da qual a confiabilidade ou
generalidade das previsões pode ser avaliada. Têm-se como base dez sujeitos
independentes, ou seja, dez latas oriundas de uma população controlada (ou apenas
de uma população em estudo), que foram testadas em trôs situações, ou seja, pesagem
com oito, dez e onze maçãs retiradas de um mesmo lote (ou de um conjunto de maçãs
em estudo).
Como ó detalhado a seguir, os pequenos erros das previsões mostrados na
Tabela 8, quando comparadas aos pesos reais medidos para os dez sujeitos, permitem
supor, com certo grau do confiança estatística, que a função escolhida seria adequada
para descrever o comportamento da lata de maçãs, ou mesmo realizar previsões com
alguma segurança.

Avaliação estatística da função: aspectos gerais


Nessa Tabela 8, há dez "sujeitos" (N.suj), ou seja, há dez conjuntos formados
por uma lata e suas maçãs, acompanhados dos resultados das pesagens com oito,
dez e onze maçãs (P.8, P. 10 e P. 11), bem como dos parâmetros L e M (relacionados ao
peso da lata e ao peso médio das maçãs), calculados conforme já descrito, e o peso
Previsto para quinze maçãs, calculado a partir da equação T = L ♦ n . M, usando os
parâmetros L e M de cada sujeito. Nas quatro colunas da direita, a tabela confronta, para
os dez sujeitos, os pesos previstos e reais, de modo semelhante ao exibido na Tabela
7, com a diferença que, dado o número de (dez) sujeitos envolvidos, é possível calcular
médias, desvios-padrão e projeções do intervalos de confiança, exibidos nas trôs linhas
inferiores da tabela.

N.su) P.8 P 10 P.11 L M Previsto Real E.abs E.rel (%)

1 1355 1530 1635 93 612 2007 2048 41 2,04

2 1357 1529 1633 91 625 1992 2017 25 1,25

3 1340 1510 1639 98 553 2017 2023 6 0.30

4 1360 1550 1660 99 564 2053 2102 49 2,39

5 1359 1525 1635 91 629 1990 2018 28 1,41

6 1355 1525 1637 93 609 2000 2053 53 2,65

7 1358 1519 1630 89 64 0 1978 2044 66 3.34

8 1348 1524 1633 94 593 2003 2038 35 1.75

9 1352 1529 1634 93 604 2002 2052 50 2.50

10 1354 1527 1634 92 612 1998 2015 17 0,85

Médias 93 604 2004 2041 37 1,85

Desvios 3.1 27,7 20,0 26,1 18,3 0,92

Projeções (p ■ 90% ) minimo 6,9 0,34

máximo 67,1 3,35

Tabela 8 - Dados estatísticos para previsão de peso para n = 15.

Sobre (.'omport.imcnlo c Coflniçfio 115


Há vários aspectos relevantes nesta Tabela 8, dos quais serão destacados: os
valores médios dos parâmetros L e M, a comparação entre os valores médios e desvios
previstos e reais para quinze maçãs e os valores médios e desvios de E.abs e E.rel“,
além de suas correspondentes projeções em intervalos de confiança.

Avaliação estatística da função: parâmetros


Os valores médios dos parâmetros L e M podem sor úteis de várias formas. Se os dez
sujeitos formarem uma amostra retirada com os devidos cuidados da população controlada,
isso pode permitir ao experimentador ter uma idéia do que esperar do outros sujeitos vindos
desta população, quando expostos a experimentos semelhantes. Esta informação seguramente
irá contribuir para o dolinoamonto geral do experimentos e para a definição do número mínimo
de sujeitos necessário para o teste de previsões teóricas, quando for o caso, com o objetivo de
oncontrar respostas significativas do ponto de vista estatístico.
Os valores médios de L e M sâo também muito úteis como “chutes" iniciais para a
determinação de parâmetros de novos sujeitos. Utilizando-os como ponto de partida, podem-
se economizar dezenas de iterações iniciais com valores excessivamente distantes do ponto
de mínimo e.q.m.. A escolha de um bom “chute" inicial dos parâmetros pode fazer toda a
diferença entre a convergência e a divergência das iterações, já que a escolha de parâmetros
muito diferentes daqueles que resultam no mínimo e,q,m, freqüentemente compromete a
capacidade da "equação de mínimo" de indicar “bons" parâmetros. Ou seja, a cada iteração,
a equação fornece valores de parâmetros mais afastados dos corretos, sendo necessária,
por mais de uma vez, a escolha (em certa medida, arbitrária) de novos valores iniciais.
Quanto aos parâmetros LeM , destaca-se ainda a importância do desvio-padrão
que, quando é um valor baixo, indica maior homogeneidade da população ou um controle
adequado das variáveis experimentais. Altos desvios-padrão acusam provável influência
excessiva de variáveis intervenientes, o que compromete as possíveis conclusões que
possam ser tiradas dos resultados da pesquisa,
Comparando-se as médias dos pesos previstos e reais com quinze maçãs,
percebe-se que a média dos pesos reais é ligeiramente superior. Estatisticamente, pode-
se verificar a hipótese de que esta diferença seja apenas resultante da oscilação normal
do peso das maçãs, ou seja, o indício de um erro sistemático na média prevista em
comparação com a média real. Independentemente da possibilidade de corrigir e minimizar
o efeito de tais erros para a qualidade das previsões (conforme procedimento descrito a
seguir juntamente com os comentários sobre os itens E.abs, E.rel e Projeções da Tabela
8), é conveniente descobrir suas fontes experimentais, teóricas (da equação que descreve
o fenômeno) ou matemáticas, e tomar as providências para mantê-las sob controle.
Da comparação entre os desvios-padrão previstos e reais dos pesos com quinze
maçãs, percebe-se um maior desvio entre as pesagens reais. Embora pequena, tal diferença
contraria a expectativa de que as diferenças dos pesos das maçás resultem em maior
dispersão nas previsões do que nas pesagons reais. Quanto maior o número de maçãs
envolvidas, mais o peso total deve se aproximar do resultado da multiplicação do número de
maçãs (n) pelo peso médio real do lote MR (que deve ser um pouco diferente de M, que é só
uma estimativa de MR), pois a quantidade de maçás com pesos abaixo da média deve
compensar a quantidade detas com pesos acima da média. Enquanto isso, o valor previsto
será calculado com base em M, uma estimativa calculada apenas com base na pesagem de

‘ Aporia» p w IKntraçâo, ta w i caluiado» ■ màdla f t n létka « o dtwvto do» fc ml w n nnnhurna oorraçAn Cunludo, par «atalarrie um ano rotativo
qu» é urrm propixváo do vak» absoluto da n wdida. »«gundo Shul (1BU1) aerta mato praciao o cálculo da média • do daavfcj do« lagartlmo» do»
t fol. qu« icmultanam, raapactivamantii, «m 0.44 ■ 0,71, com profoçA«» (p ■ 00%) d« mínimo tgiiiü ■ 0,40% a máximo igual a 5%

116 M.irclo Cru/, C/erson Vuklo fom.m.iri


onze maçãs: qualquer pequeno erro no cálculo do parâmetro M produzirá um enro sistemático
(maior que a dispersão dos dados empíricos) nos pesos previstos para quinze maçãs.
Assim, osta maior dispersão das pesagens reais do que das previsões denuncia
que os dados da Tabela 8 não foram obtidos experimentalmento, mas, sim, foram criados
apenas para ilustrar os procodimentos e as análises om quostão. Numa situação oxperimental,
uma dispersão muito maior dos pesos previstos em relação aos roais podo indicar a
necessidade do mais pesagens para melhorar a previsão ou pode indicar, ontro outros
motivos, a oxistônda de falhas na modelagem toórica do fonômono em estudo. Ao contrário,
um desvio-padrão maior das pesagens roais pode indicar defidôndas nas pesagens.

Avaliação estatística da função: erros e intervalo de confiança


Como tanto as latas quanto as maçãs foram retiradas das mesmas populações,
não há grande diforença do usar E.abs ou E.rei como índice da díforença entro os posos
previstos e roais. Por outro lado, como exemplo, se para motado dos dez sujeitos as
pesagens fossem realizadas com melancias, no lugar de maçãs, não faria sentido
comparar E.abs, que possivelmente seria maior para o grupo das rnolancias, embora o
E.rol talvez ainda fosse comparável. Da mesma forma, se para um outro grupo de
sujeitos as latas fossem muito mais pesadas (feitas de chumbo, por oxemplo), E.rei se
mostraria artificialmente menor, enquanto o E.abs deste outro grupo ainda seria útil
numa comparação com o E.abs exibido na Tabela 8.
Com base em E.abs ou E.rei, ó possível criar um procedimento para, a partir
dos resultados das pesagens de um novo sujeito com oito, dez e onze maçãs, calcular
um intervalo do confiança que indique, com um certo nível de confiança estatística, qual
será o peso deste novo sujeito com quinze maçãs. Como exemplo, ilustra-se este
procedimento para E.abs, mas pode ser igualmente realizado com E.rei.
Supõe-se, inicialmente, que os valores de E.abs respeitem uma distribuição
normal, cujos parâmetros E (esperança matemática ou módia populacional) e D (desvio-
padrão) são estimados10, respectivamente, pela módia e pelo desvio-padrão da amostra
de dez valores de E.abs da Tabela 8. A média aritmética da amostra vale 37, conforme a
Tabela 8, e ó obtida somando-se os dez valores de E.abs o dividindo-se o resultado por
dez (o númoro do sujeitos); o desvio-padrão da amostra S pode ser calculado pela
equação - nesta oquação, áx ó a soma dos dez valoros de E.abs, áx2 ó a soma dos
mesmos dez valores multiplicados por oles mesmos (elevados ao quadrado) e j ô o
númoro de sujeitos (igual a dez):

SJ = [ Ix J- ( I x ) 2: j ] : ( j - 1 )

S> - [16706 -(3 7 0 )’ : 10] : (1 0 -1 )

S? - [16706 - 136900 ' 101 • 9

S '■ j 16706 - 13690]: 9

S o V3016 : 9 ~ 18,3

lfl Embora m|m *kii|>kt» do utlctilur u lácJt do af*»M»itNr, a nubmatrvn <|« médta » do dfiivtn da pmvkuko |kjt moio de dtatftlxjlvAo normal com média
• dmtvlo Igonta ao* d««nmo»tm è morto* nuita <)tma tfm Mria dMrtn com o imo de uma dtolritttMçAo I. o mia kmxatklAo (iodo «o mfWilk na dnflnlvAo
da um kilervnlo dtt conflança innoor qmt o nacMiaArío |*ra obtnr o conlk tanta do MgurançM donjado Como aaarnpk), m o krtarvak) 2011 >2071 g
M calculado com oitn mAlodo |>ara contar o (uno rnal d« um ufrik) com um (xwfk^tnUt d« coriflanva do 90%. I»k> dovorta «gnUcar quo a|wriai
nm 10% doa coaot o peio mal mria rnakir qim 2071, ou iimnk* qu« 2011 porém. uoittoo mékxk) do rJWcuk>do kiliirvnk) do mnltança riAo 6 |im<fco,
(»ovHVHlrriofilo mal» do 10% do auHto* mus pmtoa rnala com qukua maçia (ora doatn Morvaki, no wja, a pravmán miará mrada wn mali
do 10% dativo/«»

Sobre ComporMmenlo c C'o«nlv«lo 117


Assim, o desvio-padrão da amostra S é aproximadamente 18,3, conforme
indicado na Tabola 8.
Consultando-se a distribuição normal em tabelas estatísticas (vor Tabela 9),
calculadoras científicas ou planilhas eletrônicas, verifica-se que 90% da população
ostá a monos do 1,65 dosvios-padrão de distância da módia. Assim, podom-so calcular
os limites de um intorvalo do confiança com coeficiento do confiança do 90%":

Limite inferior = E - 1,65 . D Limite superior = E + 1,65 . D


Limite inforior = 37 - 1,65 . 18,3 Limite superior = 37 + 1,65 . 18,3
Limite inferior = 37 - 30,1 Limite superior = 37 + 30,1
Limito inforior = 6,9 Limito superior = 67,1

C (%) desvios-padrâo

9 9 ,9 3,2 9 0 5

99 2,5 7 5 8

90 1,64 49

75 1 ,15 03

50 0 ,6 7 4 5

Tabela 9 - Distribuição normal: distância à média em


desvios-padrão para obtenção de intervalo de
confiança para cada indice de confiança C

Estes cálculos explicam como, a partir da média e do desvio-padrão do E.abs,


foram obtidos os dois valores, 6,9 e 67,1, indicados como projeção na Tabela 8. Com
estes dois valores, ó possível determinar uma faixa de valores que deve conter, em 90%
dos casos, as diferenças entre os valores previstos e a pesagem real com quinze maçãs.

Avaliação estatística da função: intervalo de confiança para previsões


Em suma, os oxporimontos com os doz sujeitos mostraram que os valoros
previstos para P. 15 não são exatamonte iguais aos valores medidos. Como ora do so
esperar, há pequenos erros nas previsões, já que os E.abs e os E.rei são diferentes do
zoro. Para lidar com estos erros das previsões, em vez de prever P. 15 por moio do um
único valor, P. 15 sorá estimado por meio de um intervalo de valores (ou uma faixa de
valoros). Com isso, será possível ter-se certeza estatística de que, em grande parte das
vezes, o valor roal estará dontro deste intervalo provisto.
Numa distribuição normal, 90% dos valoros estão distantes, no máximo, 1,65
dosvios-padrão de distância da módia. Da mesma forma, os erros om nossas provisõos
devem ficar próximos da módia dos o it o s obtida com os dez sujeitos, que ó de 37g; mais
oxatarnonte, 90% dos erros devem ficar distantes, no máximo, 1,65 desvios-padrão deste
erro módio de 37g. Como o desvio-padrão dos erros dos dez sujeitos vale 18,3 g, 90% dos
erros devem ter valores entre 37 - 1,65 x 18,3 o 37 + 1,65 x 18,3 Desta forma, chega-se ao

11 Oi i Iiii forma do calcular o* dol» limllmi Hirl* consktnrnr o urro rnfctto E kju»I n im o * calcular <>• cl«»vto»|>a<lrAo D com m tòumila 0 ■
riii/[A(E ntmy/fj-1)) E*1« r.Ak:ulo prtxlu/ InInrvHioft <1ocixiflança nialomi qim contAm o |x>»o cnk.ulM<in(p 1fl, no «ixwiplo)

118 M.irno Cru/, l/cr«on Yuklo lom.in.irl


intervalo dentro do qual 90% dos erros devem estar, que ó ontre 6,9 e 67,1g. Se os erros
ostão (90% das vezes) nesse intervalo, pode-se saber facilmente em que intervalo estão os
valores do peso real; bastando somar estes erros ao valor do peso provisto pela equação.
Ou seja, caso sejam realizadas as pesagens P.8, P 10 o P. 11 para um novo sujoito,
o a sua provisão do poso para quinze maçãs (prev.P.15) for calculada com baso na oquação
com os parâmetros L e M dosto sujoito, será necessário adicionar 6,9 g à provisão (prev.P. 15)
para obter o limite inferior do intervalo, e adicionar 67,1 g à mesma provisão (prev.P 15) para
obter o limite superior. Assim, haverá 90% de chances de que, durante a medição roal, o
poso do sujoito P. 15 fique entre estes dois valores extremos, prev.P. 15 + 6,9 e prev.P. 15 +
67,1 (em linguagem matemática, prev.P.15 + 6,9 < P.15 < prev.P15 + 67,1). Se, por exemplo,
o peso previsto P.15 desse novo sujeito fosse calculado em 2012 g, haveria 90% do chances
de que, durante a pesagem real, ele pesasse entre 2018,9 o 2079,9 g.
Note-se que, como os dois limites (6,9 e 67,1) são positivos, aparentemente
houve um erro sistemático que resultou em previsões subestimadas de P15. Ainda
assim, se o coeficiente de confiança fosse um pouco maior que 90%, o valor para
cálculo do limito inferior seria nogativo, seu módulo teria do ser subtraído de prev.P.15,
o o intervalo de confiança conteria prev.P.15.
Com este mesmo procedimento, podem ser obtidos intervalos mais amplos e
confiáveis (com maiores coeficientes de confiança), ou mais restritos e monos confiáveis
(com monoros coeficientes), conforme as necessidades ospeclficas do experimentador
ou de uma possível aplicação prática de pesquisa.
Em conclusão, podo-so avaliar quantitativamente previsões exprossas por meio de
funções matemáticas, bastando para isso verificar, por meio de prova estatística de hipótese
para proporção, so as suas provisões, exprossas em intervalos de confiança, são corrotas na
proporção provista por seu coeficiente de segurança. Por exemplo, se uma função prevê um
comportamento por meio de intervalos com um coofidonte de confiança de 90%, não mais que
10% dos sujeitos testados futuramente devem ficar fora deste intervalo; mais que 10% fora
indicariam que há algo de errado com a função, ou com a condução/análise dos experimentos.

Considerações finais
O que uma lata de maçàs tem a ver com análise do comportamento?
Uma lata de maçãs é um sistema físico bastante simples, mas quo pode servir a
uma metáfora didática com relação ao comploxo objeto de estudo dos analistas do
comportamento (i.e., as relações funcionais organismo-ambionte). Obviamente, portanto, a
analogia ô aponas matemática e não comportarnental. Tornados dossa forma, o númoro do
maçãs adicionadas á lata podo representar qualquer variávol indopondonto que ostoja sob
estudo, o o poso total da lata com maçãs pode ser interpretado como um aspocto monsurável
do comportamento, a variável dependente
Apenas para ilustração, cada maçã adicionada poderia representar uma sessão de
troino om que comportamentos específicos são reforçados. Nosto caso, a modificação do
comportamento resultante seria análoga ao peso total da lata porque, a cada sessão de
troino, a freqüência do comportamento om quostão se fortalece de forma semelhante ao
aumento do peso total da lata quando se acrescentam maçãs. Raciocínio semelhante poderia
sor feito a comportamontos sob punição ou extinção, om que a freqüência de um
comportamento seria reduzida; neste caso, por analogia, maçãs estariam sendo retiradas da
lata e o peso do conjunto diminuiria. Alguns aspoctos dosta analogia podem ser comentados
com o objetivo de contribuir para a compreonsão da análise quantitativa que expomos, bem
como, eventualmente, permitir aos analistas do comportamonto realizar as modificações
necessárias para quo este método seja útil e adequado às suas nocessidades específicas.

Sobre Comportamento e Cogniv<lo 119


Um primeiro aspecto a destacar é que, tipicamento, as representações gráficas das
curvas de modificação de comportamento nào são Hnhas retas, ou seja, ao longo da exposição
às contingôncias, ocorre aceleração na freqüência com que o comportamento em estudo ó
vorificado, fato este representado graficamento por moio de curvas positiva ou negativamente
acoloradas. Além disso, o processo de modificação do comportamento ó sompre
acompanhado do uma certa variabilidade local, ainda que, no geral, aprosonto uma tondônda
de fortalecimonto, enfraquecimento ou manutenção do comportamonto.
O primoiro destaquo justificaria a escolha de outra função matemática, que não a
função linear (do tipo y = a . x + b) empregada no oxomplo da lata de maçãs. Uma função
logarítmica podoria, talvez, doscrever melhor a aquisição de um roportório comportamental
com o passar das sessões de treino. Shull (1991) apresenta várias equações simples que
podom ser emprogadas para descrever aspectos do comportamento. Muito importanto é
rossaltar quo o procedimento geral aqui exposto, em princípio, não se modificaria pelo uso de
qualquer outra função quo não a linear. O analista do comportamento quo roalizar o
procodimonto aqui descrito com o uso de uma planilha elotrônica não dovo ter qualquer
dificuldado adicional docoiTente do uso de outra função que não a linear.
O sogundo dostaquo, relacionado à variabilidade do comportamento, ó mais crítico,
pois procisará ser analisado em função de suas origens, muitas vezes roveladoras do um
fraco controlo exporimontal. Não há como lidar adequadamente com dados que apresentem
alto grau de variabilidade não sistemática. So o comportamonto não tom suas variáveis
experimentais devidamente controladas, a análise matemática dos dados não pode ajudar
muito. Aliás, nestes casos, Skinner (1963) alerta que os pesquisadores devom onfrentar
exporimentalmento as dificuldades encontradas para controlar os seus experimentos, e jamais
tentar trocar os seus sujeitos por modelos matemáticos destes sujeitos, pois ossa troca
solaparia as bases empíricas da análise do comportamento; nâo há milagres matemáticos
que possam substituir a experimentação controlada e cuidadosamente conduzida.
Neste capitulo, propomos que a análise matemática soja aplicada a situações
experimentais bem controladas, onde esteja mais evidente a relação funcional, do causa o
efeito, ontre variáveis independentes e dependentes. Somente nestes casos ó quo faz sontido
tentar prever com maior precisão aspectos da relação oryanismo-ambiente que descrevam
a contingência determinante do um determinado comportamento. Aliás, em situações
experimentais em que ainda nâo seja possível um controlo adequado, ou em que a própria
natureza do comportamonto em estudo seja, em si, de difícil controlo por variações intrinsocas,
a aplicação do método provavelmente resultará em condusõos irrelevantes.
O oxemplo ilustrado pela Figura 4, em que a pesagom de maçãs seria substituída pola
posagom do sapos vivos (e pulando...), revela que a variabilidade nos dados não impodo
absolutamonto a aplicação da análise quantitativa. Contudo, não se podo esperar, caso a
variabilidade seja demasiada, que se obtenham previsões prodsas. Improdsõos ou variabilidades
excessivas nos dados soguramonte devem resultar no erro ou na impredsão das provisões
ostatisticas, o a aplicação do método, nestes casos, podo sorvir somente para demonstrar quão
pouco se podo controlar o comportamento na situação experimental em estudo.

O s ig n ific a d o dos p a râ m e tro s da eq u açã o para uma an á lise


comportamental
Noste capítulo, foi apresentada uma metodologia para calcular os parâmetros
de funções quo tenham por objetivo descrovor sucintamente o comportamento passado
o de prover o comportamento futuro de organismos individuais, sob condições
experimentais ospeclficas. Não há, aqui, nenhuma pretensão de que os parâmetros
calculados por estes métodos tenham validade geral, possam ser aplicáveis ao mesmo

120 M iir iio Cru/, t)crs«n Yukio lom.m.iri


sujeito sob outras condições experimentais, ou possam ser aplicáveis a outros sujeitos
alóm daqueles que originaram as previsões.
No exemplo do caminhão em viagem pela estrada, a velocidade é um parâmetro
que pôde ser calculado. Enquanto este parâmetro for mantido, o comportamento do
caminhão estará sendo adequadamente descrito por esta velocidade. Também o
comportamento futuro do caminhão poderá ser previsto se este parâmetro for mantido.
Contudo, não há como prever o comportamento de outros caminhões com base na
velocidade deste, nem como prever o comportamento deste mesmo caminhão caso ele
sala da estrada e entre numa cidade.
Feitas previsões matematicamente precisas do comportamento de um sujeito
com base em seu repertório em um momento inicial de um processo de aprendizagom,
por exemplo, seria teoricamente possivel prever qual seria o desemponho atingido por
este sujeito após uma determinada quantidade de exposição às contingências.
Assumindo-se que funções semelhantes possam ser compartilhadas por diferentes
sujeitos expostos às mesmas contingências, extrapolações podem ser feitas, contanto
que parâmetros individuais de cada sujeito sejam obtidos e respeitados.
Imagine-se um sujeito exposto a uma série de sessões em que um determinado
comportamento encontra-se sob contingências de reforçamento. Sabe-se a freqüência
deste comportamento na terceira sessão, mas ó importante estimar a sua freqüência
na décima sessão, A partir da análise matemática do processo de reforçamento deste
sujeito único, chega-se a uma proposta de função que supostamente descrevo a
aquisição deste repertório. Feito isso, comparam-se a previsão feita a partir da função
matemática com dados efetivamente coletados na décima sessão. Dessa comparação,
repetida para vários outros sujeitos, pode-se verificar, eventualmente, que a previsão ó
estatisticamente precisa e limita-se a um erro pequeno e conhecido. A partir desta
margem de acerto estatisticamente calculada, haveria condições de se fazer uma
estimativa semelhante para qualquer novo sujeito, com base em seu próprio
desempenho na terceira sessão.
Calculados os parâmetros para cada sujeito, poderiam ser realizadas inúmeras
previsões individuais sobre seus comportamentos. Seria possível prever quantas
sessões seriam necessárias para atingir certo critério de aprendizagem, qual o nível
máximo de aprendizagem que cada sujeito tenderia a atingir (em assfntota), quantas
sessões deveriam ser aplicadas aos animais de piores desempenhos para que o nivel
de acerto deles fosse equivalente ao dos animais com melhores desempenhos etc..
Esta discussão é análoga à exposta no exemplo da lata de maçãs. Cada maçã
adicionada à lata corresponderia a uma sessão experimental, e o peso da lata rosultante
poderia ser considerado análogo ao número do respostas reforçadas em cada sessão.

C o m e n tá rio s fin a is so b re a s p e c to s e s ta tís tic o s do m éto d o


apresentado
Finalmente, sobre o método apresentado no presente capitulo para avaliação
quantitativa de provisões teóricas, deve-se reiterar que ele é bastante genérico. Esta é
sua força, mas também é sua fraqueza. Deve ser entendido em seu valor didático,
porque a compreensão de seus fundamentos permite ao leitor, com pequenas
modificações, aplicá-lo na determinação de parâmetros de funções não-lineares, de
funções que tenham virtualmente qualquer número do parâmetros (não é necessário
ter apenas dois parâmetros, como L e M n o exemplo), conforme vários critérios de
avaliação de ajuste (que não precisam ser o método do mínimo e.q.m.). A compreensão
deste método também permite ao analista do comportamento acompanhar melhor o
trabalho de um profissional que lhe preste serviços na área estatística.

Sobre Comportiimcnlo c CogniçAo 121


A maior dificuldade na aplicação deste método para a definição de parâmetros
está na escolha de “candidatos" a bons ajustes. A "equação de mínimo" escolhida para
este objetivo nem sempre "converge", principalmente se o critério de avaliação de ajuste
deixar de ser o de mínimo e.q.m.. Definidos os parâmetros para uma amostra pequena
de dez sujeitos, por exemplo, tem-se como definir as distribuições dos erros absoluto e
relativo (E.abs e E.rei) das previsões em relação aos valores medidos experimentalmento,
o que permite fazer previsões para novos sujeitos, por meio do cálculo de intervalos de
confiança. Com estes intervalos de confiança tem-se, finalmente, como fazer previsões,
com relativa precisão o a partir de dados iniciais, sobre um conjunto de dados aplicados
a sujeitos individuais - objeto de análise tão caro aos analistas do comportamento.

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Sobre Comportamento c CogniçAo 123


Capítulo 9
Comportamento social
M aria A m alia Pic A bib A iulc ry ',
Tere/a M aria tlc A/evcdo Pires Sério'
PUC SP

Os dois primeiros manuais de análise do comportamonto, publicados na década


de 1950 (Keller e Schoenfeld, 1950 e Skinner, 1953/ 1965) têm cada um deles pelo
menos um capitulo intitulado comportamento social. Em ambos os casos os capítulos
sobre comportamento social são apresentados como relevantes para a compreensão do
comportamonto humano e como testo da validade e potencial analítico o explicativo da
análise do comportamento. Apesar da preocupação e do compromisso explicitados desde
as primeiras formulações do sistema conceituai da análise do comportamento quando
aplicado ao comportamento humano, ainda hoje nos defrontamos com dificuldades para
doflnir o que consideramos comportamento social e para analisá-lo.
Este artigo tem por objetivo sistematizar algumas das proposições e reflexões
sobre a definição e análise do comportamento social apresentados por quatro autores
que, a partir da perspectiva da análise do comportamento, se debruçaram sobre o tema:
Keller e Schoenfeld (1950), Skinner (1953/ 1965) e Guerin (1994). Em todos os casos, no
presente artigo não se esgotará a proposição de cada um desses autores sobre o tema,
polo contrário, circunscreveremos a análise a trabalhos especificos desses autores,
escolhidos por sua represontatividade e importância na obra desses autores.
No primeiro manual de análise do comportamento, Keller e Schoenfeld (1950)
em seu capitulo intitulado Comportamento Social - capitulo 11 - deixam clara a
impossibilidade de compreender o comportamento humano desconsiderando-se sua
relação com o ambiente social.
A comunidade na qual homens e mulheres vivem representa uma parte Importante
do seu meio. Ê difícil, senão impossível, pensar em uma simples atividade operante
do Indivíduo que nâo mostre, em algum grau, a Influência penetrante dos
ensinamentos da comunidade.... O meio cultural (ou, mais exatamente, os membros
da comunidade) começa com um recôm-nascido formado e dotado segundo as
linhas da espécie, mas cujo comportamento pode ser treinado em diversas direções.
Desse material bruto a cultura principia a fazer, até onde consegue, um produto
que ela própria aceite. O faz treinando: reforçando o comportamento que deseja e
extinguindo os outros; tomando alguns estímulos naturais e sociais Sd e ignorando
outros; diferenciando esta ou aquela resposta especifica ou cadeia de respostas
como maneiras e atitudes; condicionando reações de emoção e ansiedade a
alguns estímulos e não a outros. Ensina ao indivíduo o que pode e o que nâo pode
fazer, dando-lhe normas e determinando a amplitude dos comportamentos sociaia
permitidos, prescritos ou proibidos. Ensina-lhe a linguagem que deve falar, dá-lhe

1F»Ib tiMbultio lo» elHbofBdo durant« vtuétvdn do Bote« Pnx1utMd«du wn Po»qum« do CNPQ umcttdklH (is autora»

124 Mdri.i Am.ilia Plc Abib Amlcry, Tcrc/d M.irid ilc A/rvcdo Pires Sério
seus padrões de beleza e arte, de boa ou má conduta; cotoca diante dele um
quadro da personalidade ideal que deve imitar e procurar ser. Em tudo isso estão
presentes as leis fundamentais do comportamento, (pp. 380-382)
Assim como a relação indivíduo - ambiente conduziu os analistas do
comportamento á definição de comportamento (operante e respondente) ó exatamente
a rolação entre indivíduos e ambionte social que conduz à definição de comportamento
social, tal como proposta por Keller e Schoenfeld (1950) já em sou capitulo 8, sobre
Reforço Condicionado:
o comportamento social pode ser descrito como aquele para o qual estímulos
reforçadores ou discriminativos sâo, ou foram, mediados p«Jo comportamento de outro
organismo Por mediado' quer se dizer originando-se de' ou ’em conexão com' e nàô
há nenhuma intenção de forçar a conotação da palavra. Não se pretende nem (1)
incluir a entrega pelo experimentador de um bocado de alimento ao rato que pressiona
a barra - pode ser uma situação sodal para o experimentador, mas não o è pam o rato;
nem (2) excluir o comportamento do náufrago que fala consigo mesmo ou faz roupas
de peles, pois ambas as atividades foram socialmente adquiridas (pp 271-272)
Para os autores, então, chamamos do comportamento social os
comportamentos - as relações sujeito ambionte - nas quais os estímulos que constituem
a relação comportamental se originam de outros indivíduos. É comportamento social
uma relação social e o que ó característico desta relação é o ambionte - são os estímulos.
Os comentários dos autores sobre o termo mediação são osclarecedores e merecem
ser explorados. As razões da exclusão, enquanto comportamento social, do comportamento
do rato de pressionar a barra produzindo alimento parecem bastante claras no toxto: o
comportamento do animal ó afetado polo alimento e o papel do oxperimentador ó simplesmente
operar um comedouro. As relações entre a resposta de pressionar a barra e a produção do
alimento são, em principio, regidas por regras que indopendem da situação em que se
encontra o oxperimentador ou de suas características particulares. Em outras palavras, a
relação entre as características críticas da resposta e o aparedmonto do alimento pode ser
descrita completamente recorrondo-se às leis da física. Já a inclusão dos comportamentos
do náufrago - que fala consigo mesmo ou costura suas roupas com materiais disponíveis *
onfatiza que a caracterização de um dado comportamento como social não depende da
presença, no momento da emissão da resposta, do outro organismo. Tal inclusão onfatiza
que se uma dada relação sujeito-ambiente for impossívol sem uma história anterior que
envolveu um sujoito que participou de um ambiento social, então seu comportamento, ainda
que sem a presença de outro como mediador, é comportamento social.
Então, ó crítico para a caracterização de comportamento social a participação
de estímulos sociais na constituição do comportamento. Cabo, assim, a pergunta: o
que caracteriza um estímulo como estimulo social?
Os estímulos sociais não diferem nas suas dimensões de outros estímulos. Ao
contrário, a diferença ó só de origem provém de outro organismo, do seu
comportamento, ou de produtos de seu comportamento. E, ainda mais, os estimulos
sociais não diferem quanto á função daqueles de origem inanimada; atuam como
ellciadores, reforçadores, discriminativos etc A vida social surge porque os estímulos
sociais passam a exercer essas funções. (Keller e Schoenfeld, 1950, pp. 369-370)
Segundo Keller e Schoenfeld, estímulos sociais e estímulos não sociais são
todos de dimensão material, tôm a mosma natureza. Mais ainda, as possíveis funções
comportamentais dos estímulos sociais e não sociais são as mesmas o as funções
destacadas poios autores são: os estímulos que antecedem a resposta podem ter
função do ostímulo eliciador ou do ostímulo discriminativo e os ostímulos que seguem
a rosposta podem ter função de estímulo reforçador. Assim, na análise do comportamento

Sobre I'omporl.imcnto c t'oflnit.lo 125


social, lidamos com relações sujeito - ambiente que envolvem funções do estimulo
que constituem as relações respondentes e operantes-'.
Parece assim que, para Keller e Schoenfeld (1950), a contribuição da análiso
do comportamento para a análise do comportamento social estava exatamonto na
identificação das funções comportamentais dos estímulos sociais, assim corno dos
processos poios quais tais funções são adquiridas.
No ontanto, a compreonsão da proposta de Keller e Schoonfold não soria correta
so não onfatizássomos quo embora os autores constatassem a possibilidado do
comportamento social em outras espécies animais que não a espécie humana, os
autoros também ressaltaram que alguns processos constitutivos o as funçõos
comportamentais dos estímulos que doles decorrem são espocialmonto importantes
para a compreensão do comportamento espocificamente humano.
No inicio deste livro foi dito que o comportamento humano ó o objeto final do
interesse da maioria dos psicólogos, tanto como o é dos leigos. Na consecução
desse desideratum, o principio do reforço condicionado será da maior ajuda
analítica Ao lado das outras funções do estimulo, fornece uma ferramenta poderosa
o Indispensável para a solução de muitos problemas absorventes e deceptlvos da
ação humana (Keller e Schoenfeld, 1950, pp 271-272)
Parece então que, para Keller e Schoenfeld, na análise do comportamento
social humano ônfase especial precisaria ser dada ao estudo dos processos onvolvidos
na produção de reforçadores condicionados.
Há muitos pontos em comum entre as propostas de Keller e Schoenfeld e de
Skinner para a caracterização e análise do comportamento social. Em primeiro lugar,
também para Skinner é imprescindível que se considere e se compreenda a interação
dos indivíduos com seu ambiente social para que se compreenda o comportamento
humano em geral. Vale a pena destacar que Skinner (1947/1965) explicitamente afirma
que tal ambiente social é construção humana e que ai está o determinanto mais
importante do comportamento humano.
A constituição genética do Indivíduo e sua história pessoa/ até o presente
desempenham uma parte nesta [do seu comportamento] determinação Alôm dal,
o controle está no ambiente Além do mais, as forças mais Importantes estão no
ambiente social que é feito pelo homem /man-madoj Comportamento humano
está portanto amplamente sobre comportamento humano (p 345)
Também a definição do comportamento social podo ser entendida como um
ponto orn comum entre Kollor e Schoenfeld e Skinner (1953/1965), que afirma:
comportamento social pode ser definido como comportamento de duas ou mais
pessoas, uma em relação a outra, ou em conjunto em relação a um ambiente
comum (p 297)
Está implícito nesta dofinição que no caso do comportamonto social, também
para Skinner o ambiente quo participa do comportamonto de um indivíduo se origina do
rospostas de um outro indivíduo, ou soja, que repostas deste segundo indivíduo
assumom funções de estímulo - como já afirmaram Kellor e Schoenfeld.
O quo talvez a dofinição do Skinner acrescente em relação á proposta de Kellor
o Schoenfeld é que na dofinição do Skinner o autor explicita as condições om quo o
comportamento social podo acontecor. Do primeiro caso em que o comportamonto é

1Ê |>nanlvt<l <|ii<>Hlilalrmxilt' uilnis mriortm armwxtfiümwHii outra« lniçAm (xxnporlMiiMMiM* |>Mfuos esllmtA» iwtwomiítnin*, tnh corno a<|iiHui
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126 M.tri.i Am.ili.i IV Abib Amlcry, fere/it M jriii do A/cvcdo Pires Sório
definido como social para Skinner (1953/1965) - "duas ou mais pessoas se comportam
uma em relação á outra” - podemos supor a possibilidade de pelo menos três
possibilidades diferentes nas quais o comportamento ocorreria, como diagramado na
Figura 1

Possibilidade 1 Possibilidade 2 Possibilidade 3


Indivíduo A Indivíduo A Indivíduo A

Sd -» Sr Sd — R -» Sr

Sd — H Sr Sd — R -TSr W
Sd-~'R '-TSr .
Indivíduo B Indivíduo B Indivíduo B

Figura 1 Diagrama de possíveis contingências que descrevem comportamonto social


quando uma pessoa se comporta em relação á outra.

Na Figura 1 destacamos que no caso do comportamento social as ações de


um indivíduo assumem função, por exemplo, de estímulo discriminativo e/ou de estímulo
reforçador que constituem o comportamento operante de outro indivíduo, o que pode
ocorrer de maneira que apenas um dos indivíduos se constitui om ambiente social para
o outro, ou de forma que ambos os indivíduos são ambiente social um do outro. Assim,
na Figura 1, nos painéis indicados como Possibilidade 1 e 2 aporias o comportamento
do B seria chamado de comportamento social, uma vez que o estímulo discriminativo
ou estimulo reforçador que constitui seu comportamento se origina do comportamonto
de A; mas no painel intitulado como Possibilidade 3 ambos os indivíduos comportam-
se socialmente, uma vez que o comportamonto de um deles depende do comportamonto
do outro que se constitui em seu ambiente social. Em todos estes exemplos as
contingências resultantes da interação entre os indivíduos só podem ser descritas
como contingências entrelaçadas, como conjuntos de contingências que se constituem
umas em relação às outras (Andery, Micheletto e Sério, 2005). Em todas as três
possibilidades "duas ou mais pessoas se comportam uma em relação à outra". (Skinner,
1953/1965, p. 297)
A outra condição definidora de comportamento social destacada por Skinner
(1953/1965), onvolvoria o "comportamento de duas ou mais pessoas... em conjunto em
relação a um ambiente comum" (p. 297). Na Figura 2 diagramamos uma possivel
contingência que descreveria tal condição.

IndM diio A |

3d/8f i
I Sd ~ RA ♦ RB -* Sr
^ Sd/Sr

IndivkJuo B I

Figura 2. Diagrama do possíveis contingências que descrevem comportamento social


quando duas pessoas se comportam em relação a um ambiente comum.

Na Figura 2 ambos os indivíduos comportam-se de maneira que as respostas


de ambos estão onvolvidas em uma única contingência, possivelmonte delimitada polos
estímulos discriminativos que evocam as respostas do cada um dos participantes em
conjunto e pelos estímulos reforçadores que só são produzidos so ambos os
Sobre l o m p o rt.im n ilo e l'o#nlv<lo 127
participantes emitirem as repostas que são parte da contingência. Nesta contingência,
alóm disso, o comportamento de cada um opera como ostímulo discriminativo ou
reforçador para o comportamento do outro, Aqui também o comportamento dos indivíduos
ó parte do contingências ontrelaçadas.
Como indicam as figuras apresentadas, ainda quo a definição de
comportamento social proposta por Skinnor om 1953 não difira no que ó essencial da
dofinição proposta por Keller e Schoenfeld em 1950, a redação dada por Skinner permite
antever a divorsidade de possíveis entrelaçamentos de contingências o a complexidade
envolvida em tal entrelaçamento, o que implica em um desafio para a analiso do
comportamento social.
Finalmento, o terceiro aspocto em comuns das proposições de Keller e
Schoonfeld e de Skinnor para o comportamento social ó a ênfase quo os autoros dão ao
ambionte social. Afirma Skinnor (1953/ 1965). :
Comporlamonto social se origina porque um organismo ô importante para o outro
como parte de seu ambiente. Portanto, um pnmeiro passo ò uma análise do ambiente
social e de quaisquer aspectos especiais que ele possa possuir (p 297)
A ênfase sobre o ambiente social conduz, então, Skinner a incluir om sua análise
do comportamento social aspectos que não estavam presentes na proposição foita por
Keller e Schoenfeld. Para Skinner, a análise do ambiente social onvolvo sim, como já
apontado, identificar as funções comportamentais do ambiento (o comportamento do
outro) - por exemplo, de estímulo discriminativo ou reforçador - mas envolvo também
identificar as características especiais do ambiento social. Coerentemente, boa parte
do capítulo 19 de Ciência e Comportamento Humano - intitulado Comportamento Social-
é dedicada à listagem e discussão de quais seriam essas características especiais do
ambiente social. Skinner primeiro discute o quo considera como características
específicas dos reforçadoros sociais e então o que considera como características dos
estímulos antecedentes sociais.
A primeira característica dos reforçadores sociais destacada por Skinner (1053/
1965) envolve o que podemos chamar de urna definição de reforço social:
Reforço social nào pode ser descrito “sem fazer referência a outro organismo", em
alguns casos “a outra pessoa participa meramente como objeto... mas usualmente
o reforçamento social ó uma questão de mediação pessoal", (pp.298-299)
Desta definição de reforço social como reforço que envolve a mediação de outro
indivíduo decorrem pelo menos duas outras características, destacadas por Skinnor
(1953/ 1965) no mesmo capitulo: a primeira delas ó que o reforço dificilmente independe
da ocorrência da resposta o a segunda ó que "o reforçamento social varia de momonto
a momonto, dependendo da condição do agente reforçador” (p. 299). Estas características
ospociais do roforço social, por seu turno, imprimem às respostas envolvidas no
comportamento social flexibilidade e extensão ímpares.
Skinnor (1953/ 1965) dostaca ainda uma terceira característica do reforçamento
social: "as contingências estabelecidas por moio de um sistema de reforçamento social
podom mudar lentamente" (p. 299). Entro as muitas possivois decorrências dosta
afirmação, destacamos que no caso do comportamonto social não nos depararemos
com contingências que se reproduzem de maneira idêntica no docorror do tempo, mas
sim com contingências que carregam em seu cerno a possibilidade o a probabilidade
do mudar na modida mesma em que se realizam. Como destaca Skinner, no caso do
comportamonto social o sistema de reforçamento se ajusta ao comportamento reforçado,

128 M.iri.i Am.iliii IV Ablb Aiulcry, lere/<i M.iri.i ile Azevedo Pire« Sírio
o que só ocorre raramente na natureza inorgânica, e o que sugere que “o agente reforçador
que modifica a contingência em termos do comportamento deve ser sensível e complexo"
(p. 301). Se, de um lado, esta característica do reforço social imprime flexibilidade e
extensão ao comportamento social, de outro, pode ser origem de problemas
comportamentais, como esclarece Skinner (1953/ 1965):
Isto pode explicar porque as contingências reforçadoras da sociedade causam
comportamento Indesejável muito mais freqüentemente do que as contingências
aparentemente comparáveis na natureza inanimada, (p.301)
Já a caracterização que Skinner (1953/ 1965) faz dos estímulos antecedentes
sociais envolve, em primeiro lugar, o destaque da semelhança destes estímulos com
qualquer outro estimulo antecedente que tenha algum controle sobre comportamento
operante: o estimulo antecedente social “como qualquer outro estimulo, torna-se
Importante no controle do comportamento por causa das contingências de que participa",
(pp. 301, 302)
No caso dos estímulos antecedentes sociais, as contingências de reforçamento
que atribuem a tais estímulos função comportamental “são determinados pela cultura e
por uma história particular" (p. 302). É implicação desta posição que para se identificar
estímulos antecedentes sociais e os processos que os constituem é preciso algum
conhecimento da cultura, do grupo social de que participa o indivíduo para o qual o
estimulo é significativo.
Finalmonto, Skinnor (1953/ 1965) rossalta quo a sonsibilidado a roforçadoros
sociais altera a sensibilidade a estímulos antecedentes sociais e como conseqüência
a sensibilidade a tais reforçadores sociais pode colocar o comportamento dos indivíduos
sob controle de aspectos extremamente sutis do ambiente - ou seja, do outro.
Estímulos sociais »ào importantes porque os reforçadores sociais com os quais
estâo correlacionados sâo importantes... Estímulos sociais são importantes para
aqueles para quem reforçamento social è importante (pp. 302, 303).
As proposições de Koller e Schoenfeld (1950) e de Skinner (1953/ 1965) sobre
comportamento social sugerem três conclusões. A análise do comportamento social
não exige nenhum novo principio / conceito alóm daqueles já estabelecidos
experimentalmente a partir do estudo de animais infra-humanos. Assim, não há
necessidade de um novo modelo causal, distinto do modelo de seleção por
conseqüências no estudo do comportamento social. No entanto, há sim que se
reconhecer as propriedades especiais do ambiente social (e, por conseqüência do
comportamento social) quando do estudo deste fenômeno.
Esta última conclusão conduz às proposições de Guerin (1992, 1994) para o
estudo do comportamento social. O autor inicia sua discussão de comportamento social
fazendo uma distinção entre princípios que regem o comportamento e propriedades do
comportamento social. Para Guerin, o reconhecimento desta distinção ó essencial
para que a análise do comportamento possa estudar e compreender o comportamento
social. São as propriedades especiais do comportamento social - que é regido pelos
mesmos princípios que o comportamento em geral - que o destacam.
Tal como no caso dos autores já discutidos, para Guerin (1994) as propriedades
especiais do comportamento social são encontradas no ambiente que chamamos de
ambiente social:
Parece que outras pessoas são tipos especiais de objetos no ambiente ... Elas
têm propriedades não partilhadas por outros objetos, embora a análise de

Sobrr Comportiimcnto e CoRniçdo 129


comportamentos sociais seja baseada nos mesmos princípios [de análise] com
os quais analisamos quaisquer outros comportamentos. Pessoas tèm propriedades
reforçadoras especiais, assim como propriedades de estimulo especiais, (p.78)
Para Guerin (1994), as propriedades reforçadoras e discriminativas especiais
do ambiente social, como não poderia deixar de ser, são construções, são produtos de
histórias de interação que contribuem para a construção dessas propriedades e o autor
ressalta: " objetos sociais são mais dinâmicos e interativos, tôm conseqüências mais
poderosas e mais generalizadas." (p. 86). Nos capítulos om que Guerin discute
discriminações sociais e conseqüências sociais, suas caracteristicas vão sendo listadas
pelo autor. O que Guerin (1994) considera o caráter dinâmico e flexível das contingências
sociais ó explicitado no trecho a seguir:
Primeiro eles (os adjetivos dinâmico e flexível) significam que interações sào
rápidas.... Segundo, dinâmico também quer dizer que as contingências mudam
frequentemente.... Contingências sociais freqüentemente envolvem uma espécie
de ajustamento do esquema de reforçamento ou punição.... Contingências sociais
também sâo dinâmicas no sentido de que muitas estâo usualmente disponíveis de
tal forma que parece podemos escolher entre elas.... Um quarto significado de
dinâmico é que o simples contatar uma contingência social pode mudar a
contingência. Embora isto também possa ocorrer com contingências nâo-socials,
é o efeito normal quando se contato contingências sociais.... O último significado
de dinâmico é que contingências sociais sâo muito frequentemente contingências
de quatro ou cinco termos muito sutis. Isto é, as conseqüências que recebo
dependem de mudanças muito sutis nos contextos sociais, (pp. 103, 104)
Vale notar que estas características são semelhantes a aquelas destacadas
por Skinner (1953), quando ressalta as características especiais do ambiente social -
como estímulo reforçador e discriminativo.
As semelhanças entre Guerin e Skinner se estreitam em um artigo do Guerin
de 1992, quando o autor enfatiza que as conseqüências sociais são reforçadores
condicionados e generalizados, o que acarreta relações bastante arbitrárias entre
respostas e o ambiente e permite que a mesma conseqüência possa ser produzida por
diferentes respostas, facilitando o estabelecimento de aspectos do outro - o agente
reforçador - como estímulo discriminativo independentemente de outras características
do contexto. Finalmente, Guerin (1992) destaca um aspecto que conduziria à necessidade
de uma análise mais detalhada dos estímulos reforçadores condicionados
generalizados: conseqüências sociais mediadas freqüentemente parecem ser
reforçadores "sem valor de troca", ou seja, são eventos reforçadores que uma voz
estabelecidos parecem ser independentes da recorrência das relações que os
constituíram, como estímulos reforçadores.
De maneira coerente com sua posição de que falar em comportamento social
é falar de contingências sociais, de contingências que são constituídas pelo ambiente
social, Guerin (1994) constata as dificuldades e quase inutilidade de centrar a análise
do comportamento social na caracterização de respostas como sociais ou não-sociais.
Essas dificuldades podem ser resumidas em três perguntas: (1) Definimos como social
apenas respostas que para serem emitidas dependem necessariamente da
participação de outro, ou bastaria que uma resposta pudesse envolver a presença de
outro para ser tomada como social? (2) O que quer dizer "envolvida": que só chamaríamos
de social respostas em que o outro estivesse diretamente envolvido, ou bastaria que a
resposta envolvesse relações com o ambiente que envolvem, por sua vez, o produto do
responder do outro3 ? O fato de uma dada resposta ser aprendida apenas pela medição
de outro é suficiente para defini-la como social?

130 M.m.i Atmiliii Pie Abib Andcry, fmv.i M.iri.i dc A/cvedo Pirrs Sério
Guerin (1994) entäo sugere que a alternativa mais heurística quando se discute
comportamento social seria falar de contingências com propriedades sociais... "que
incluirão quaisquer contingências nas quais outra pessoa está envolvida como estímulo
de contexto, ou como determinante de conseqüências, ou como parte do próprio
comportamento (do grupo)" (p. 78) e sugere, o que é mais peculiar de sua proposição, que
talvez a mais importante distinção quando se discute comportamento social seja a distinção
entre comportamento social que não envolve a comunidade verbal e comportamento
social que envolve a comunidade verbal. As contingências com propriedades sociais que
envolvem a comunidade verbal abrem a possibilidade de contingências com propriedades
sociais que, diretamente, envolvem apenas um indivíduo; são contingências que têm
propriedades sociais, mas que descrevem o comportamento de um indivíduo "sozinho"4.

Indivíduo A

Sd — R — l h + Sr

\\ /
comunidade verbal

Figura 3. Diagrama de cò n w iym icia uum pi upiiouaouy sociais que envolve a


comunidade verbal
O diagrama apresentado na Figura 3 ó uma tentativa de representar esta
possibilidade: neste caso, a função de estímulo discriminativo do estímulo que evoca a
resposta, ou a função do estimulo consequente como estimulo reforçador são
estabelecidos pela comunidade verbal. A partir daí a ocorrência da resposta pode
independer da presença de outras pessoas para que a resposta seja emitida.
Esta posição de Guerin tem por fundamento a suposição de que todo
comportamento humano é social, mesmo aqueles comportamentos que não envolvem
diretamente outros indivíduos. Esta posição se esclarece em artigo de 2001 no qual
Guerin afirma (como indicado desde o título) que indivíduos são relações sociais, mesmo
nas mais individualistas e solitárias de suas ações. Esta conclusão, por sua vez, já se
encontra no livro de 2002, como indica o trecho a seguir:
Comportamento humano individual è completamente social porque a maior parte
dele ó mantida por contingências sociais generalizadas iomiadas nas comunidades
verbais. Apenas quando contatamos diretamente o ambiente estamos sendo não-
sociais, por exemplo, quando cavamos um buraco no chão Entretanto, mesmo
neste caso, há muitas respostas componentes que sâo socialmente mantidas. Por
exemplo, isto poderia ocorrer quando, ao cavar um buraco, seu comportamento
mudar se alguém mais estiver presente..., se você estiver imitando a maneira pela
qual seu vizinho cava buracos, se alguém mais controlar as conseqüências de
cavar o buraco, se outros ajudarem você a cavar o buraco, se você estiver falando
com outro ou até com você mesmo sobre como cavará o buraco e o que fará com
ele quando estiver pronto, (p. 125)

' KiiHor o Schoonfokl. oiti 1950. uljordani o inowno |>rt>t>t*wTmn parecem auunWr ■ puaiçjko tio i|0« à (xxnfxxlntTinnto »<x:lal toda interação rw
qual o mntHofrto lo) cnnatttuldo puta av&> <)o outro
‘ Dovo ao dn tw m que a doflrwvAo da comportamento »odel ofcweckia por Kefc* • SchoenMri (18M)) antecipava esta [xwntbMdade. como
Ata cliim na sua (.«racteflZHçflo de comportamento mediado, dMtacada no Inido detta artlyo

Nobrr 1'omport.imcnto c C'üRniv'«lo 131


Considerando, entào, a posição dos quatro autores citados, o estudo do
comportamento social segundo a perspectiva da análise do comportamento envolveria,
alóm dos aspectos já destacados - a identificação das funções do ambiente no caso do
comportamento social e das propriedades especiais do comportamento social -, a
identificação de dois tipos de contingências com propriedades sociais: as contingências
em que os eventos que as constituem estão todos presentes quando a interação
resposta-ambiente acontece - “contingências nas quais pessoas agem dlretamonto
como estimulo discriminativo, conseqüência ou como parte da resposta" (Guerin, 1994,
p.81) - e aquelas contingências nas quais nem todos os eventos constituintes estão
presentes quando a interação ocorre - contingências "nas quais uma comunidade
verbal mantém o comportamento a despeito do se outra pessoa está ou não presente"
(Guerin, 1994, p. 81).
Exatamente este último aspecto sugero que o estudo do comportamento social
exige a investigação e análise sistemáticas do que vem sondo chamado de reforço
atrasado ou de controlo do comportamento por conseqüências remotas, ou seja, talvez
tenhamos que voltar ao estudo de processos e princípios básicos para entender de fato
o fenômeno que chamamos de comportamento social, como já apontava Michael (1986):
A essência da superioridade humana sobre os organismos não humanos está no
nosso controle por contingências remotas... mas é uma super-símplificação
drástica interpretar os efeitos de contingências remotas como nada além do que
os efeitos de conseqüências comportamentals bem conhecidos e bem
pesquisados... deveríamos evitar usar nossos termos técnicos para relações
funcionais alteradoras de repertório quando estivermos falando de efeitos que
agem-indiretamente. Linguagem técnica usada incorretamente é pior que a
linguagem do senso comum, já que sugere um domínio que não existe o, fazendo
crer que a situação é bem conhecida, afasta tentativas sérias de entendê-la. Até
que sejamos capazes de prover uma análise acurada dos processos complexos
que são relevantes para qualquer instância de efeitos que agem-indiretamente
faremos melhor usando termos descritivos do cotidiano, (pp. 13-16)

Referência

Andery, M. A. P. A., Mlcheletto, N., e Sério, T. M A. P. (2005). A análise de fenômenos sociais:


esboçando uma proposta para identificação de contingências entrelaçadas e
metacontingôndas. Revista Brasileira de Análise do Comportamento, 1, 149-165.
Guerin, B. (1994). Analyzing social behavior: Behavlor analysis and the social sciences. Reno, NV:
Context Press.
Guerin, B. (1992). Social behavior as discriminativo stimulus and consequence in social anthropology.
The Behavior Anatyst, 15, 31-41.
Keller, F. S., e Schoenfeld, W. N. (1950/1968). Princípios de psicologia. Sâo Paulo, SP: Herder.
Michael, j. (1986). Repertoire-alterlng effects of remote contingencles. The Analysis of Verbal
Behavior, 4, 10-18.
Sklnner, B. F. (1947/1965). Current trends in experimental psychology. Em B. F. Skinner. Cumulatlve
record. Acton, MA; Acton Publishing Group.
Skinner, B, F. (1953/1965). Science and human behavior. New York, NV: Freo Press

132 Miiri.i Am,ilúi l’ic Abib Andrry, Tcrr/.» M.iri.i dc A/cvcilo Pires Sério
Capítulo 10
Prevenção primária de abuso sexual em
ambiente escolar
M aria da C/raça Saldanha Padilha'
Lúcia Cavalcanti de Albuquerque W illiam s1'

Diversos estudos disponíveis na literatura cientifica internacional mostram


relações entro as várias formas de abuso contra crianças e os prejuízos decorrontes
destes abusos para o seu desenvolvimento. Do acordo com Barnett (1997), abuso infantil
e negligôncia são os fatores de risco social que têm associação mais forte com a
psicopatologia do desenvolvimonto. As crianças maltratadas funcionam em média mais
pobremente do que as não maltratadas em áreas como tostes intelectuais padronizados,
expressão verbal das emoções, desempenho académico, habilidade de se engajar em
desafios, habilidade em persistir em tarefas, autopercepção, desenvolvimonto de apego
seguro, contato com pares e comportamento pró-social. Em uma revisão sobre três
décadas de pesquisa na área que procura investigar as implicações do abuso infantil
sobre a vida escolar das crianças, Veltman e Browne (2001) relataram estudos indicando
que existe uma relação entre as diversas formas de abuso e prejuizos na linguagem,
desenvolvimonto cognitivo, baixo Ql e performance escolar pobre.
De acordo com Williams (2003), o abuso sexual infantil é um estressor
generalizado e um fator de risco para vários problemas infantis. Seu impacto se faz presente
não somente logo após a sua ocorrência, mas também a médio e longo prazo, tanto na
vida familiar da vitima como no seu desemponho acadêmico.
Conforme Friedrich (1998), a criança abusada sexualmente pode apresentar
problemas internalizantes, como ansiedade, depressão, queixas somáticas, inibição e
sintomas de Transtorno de Stross Pós-Traumático ou externalizantes como agressão,
delinqüência, envolvimento em prostituição, um nlvol de atividade aumontado e problemas
de comportamento sexual.
O fator de proteção que pode diminuir o impacto do abuso sexual é a existência
de apoio individual e/ou institucional que estejam disponiveis para a criança e a família.
Conforme Veltman e Browne (2001) afirmaram, a pesquisa tem mostrado que agressores
sexuais visam crianças com baixa auto-estima, que pareçam vulneráveis e inseguras do
si mosmas, com necessidade mais aparente do serom cuidadas. As crianças quo têm
boa auto-estima, habilidades de resolução do problemas o conhocimento sexual estão
mais aptas a se protogorom de situações de exploração sexual.
Segundo Wolfo (1998), o repertório de habilidades pessoais de segurança envolve
0 seguintes comportamentos: reconhecer o comportamento inapropriado do adulto, resistir
a induções, ou seja, dizer "não", reagir rapidamente para deixar a situação e contar para

1 DoulofWKtn do Programa <ki P6»-gr«1uaçáo mn EiJucaçAo Eapadal dü Univaraidada Fadarat da SAo Cario* Docsnln da IJnlvnraldadn Tulutl
òoPitninA
* Docnnln <1h Unlvwnldadn Fodnrnl do Sâo Cario* rio «ir»o d** Piicotogla a no Programa da Pfa-gmduavâo mn EdiKwtçâo E«f>fl<:jal

Sobro ('omport.imcnfo e 133


alguém sobro o incidente. Para Gordon e Schrooder (1995), ensinar às crianças as
habilidades do sogurança pessoal ó um fator de proteção de alta magnitude. É importanto
ensinar o que ó comportamento abusivo, como se proteger do interações abusivas com
outros, incluindo irmãos e amigos, e as conseqüências do coagir outras crianças a se
ongajarom em comportamentos sexuais. Faz parte desta oducação ensinar a criança a
ser assertiva e tomar decisões adequadas no contexto das rolações sexuais e sociais.
A prevenção primária de abuso sexual ó doscrita na litoratura como aquola que
tem o objotivo de eliminar ou reduzir os fatores sociais, culturais e ambiontais que favorecem
o abuso (Wolfe, 1998). O treinamonto das habilidades de segurança possoal ó uma das
ostratógias possíveis dontro da prevonção primária.
Padilha (2002) apontou algumas questões para posquisa quo ostào rolacionadas
com a provonção, entre olas: avaliação de programas educacionais para a prevenção
primária do abuso sexual e desenvolvimento de estratégias para capacitação do
profissionais que trabalhom com crianças para a avaliação dos riscos de abuso.
As pesquisas nesta área são oscassas no Brasil. Entretanto, Brino (2005)
desenvolveu um estudo com o objetivo de avaliar urna intervonção com educadoras no
sentido de capacitá-las a atuarem como agentes de prevonção primária do abuso sexual
infantil, habilitando crianças a se protegorom do abuso e habilitando mães a reconhocerem
sinais de ocorrência do abuso sexual o formas de proteção à criança.
O presente trabalho ó o relato de uma intorvenção realizada em ambiente escolar
com pró-adolescentes e adolescentes que teve o objetivo de incrementar o seu repertório
do habilidades pessoais de segurança, trabalhando quatro comportamentos-alvo:
reconhecer o comportamonto inapropriado do adulto, resistir a induções, ou seja, dizor
"não”, reagir rapidamento para deixar a situação o contar para alguém sobre o incidento.
Configura-se como prevenção primária, já que foi desenvolvido como intervenção educativa
com uma população exposta a riscos do abuso, mas que não teve necessariamente
casos relatados.

Método
Os participantos foram 59 estudantes de uma escola pública da Rogião Metropolitana
de Curitiba, Pr., com idades entre 11 e 15 anos, sendo 31 do sexo masculino e 28 do sexo
fominino, residentes com suas famílias, cuja renda ora baixa.
Para a avaliação da intervenção, foi utilizado um questionário auto-rospondido
intitulado Questionário para Avaliação de Conhecimento sobre Abuso Sexual, elaborado
polas autoras especialmente para este trabalho. A primeira parte do questionário tom 18
afirmações sobre características do abuso sexual, com trôs alternativas cada (verdadoiro,
falso e não sei). Na segunda parte há 15 afirmações que descrevem situações quo podom ou
não ser consideradas abuso sexual, com a instrução de assinalar aquelas quo são abuso
sexual na opinião do respondente.
Após ser assinado pelos pais o Termo do Consontimento Livro o Esclarecido para a
participação na pesquisa, foram realizados 12 encontros com os participantos dontro da
própria escola em horário de aula. O primeiro e o último encontro foram dedicados á avaliação
e os 10 encontros intermediários à intervenção propriamento dita. Foram feitos quatro grupos
do Í4 a 15 estudantes em sessões de uma hora e meia cada. conduzidas pola primeira
autora e por seis estudantos do graduação om Psicologia.
As sessõos uram estruturadas de maneira a atingir objetivos previamonto dofinidos.
A primoira sossão visou a doscontraçào do grupo, com uma técnica de apresontação e a

134 M<irlii (lii ^./f.iç.i S.ilil.inh.i Piiilillni, I úciii ('.iv.ilc.inli ilc Allnu|urri|uc Willi.ims
atividade "Jogo dos direitos © das responsabilidades" (Goicoechea. Nafíez e Alonso, 2001). A
segunda e torcoira sessões visaram trabalhar o repertório de habilidades sociais, com a
identificação dos diroitos das pessoas, conceitos de ompatia e assortividade. As atividados
propostas foram "Direitos humanos e interpossoais" e "Nem passivo, nem agressivo: assertivo",
ambas desonvolvidas por Do! Protto e Del Protte (2001). Na terceira e na quarta sessões foi
desenvolvido o tema sexualidade, com o objetivo do identificar as partes privadas do corpo o
os contatos considerados apropriados e inapropriados. Foi utilizado o filme "O quo está
acontecendo comigo" (Smalwood e Walsh, 1986) e a atividado "História colotiva oral" (DoIPrette
e Del Pretto, 2001). Nas sessões seis e sote foram discutidas situações abusivas com o
objetivo do kiontificar situaçõos potoncialmonte perigosas, atravòs das atividados "Pensar o
decidir" e "Bons e maus segredos", ambas propostas por Goicoechea et al. (2001). As trôs
últimas sessões foram dedicadas ás habilidades de auto-protoção, com os objetivos:
discriminar nuances das situações potencialmente perigosas, aprender a rosponder
assertivamento ao possível agressor, deixar a situação, pedir ajuda o apoiar cologas que
precisam de ajuda. As atividades utilizadas foram “Jogo da auto-estima" (Goicoochoa et al.,
2001) e dramatizações, induindo a "história de Rosinha" (Padilha, 2001).
O propósito do se adotar a soqüência de temas abordados - habilidades sociais,
sexualidade, situaçõos abusivas, habilidades de auto-proteçâo - foi lovar ao tema "abuso
sexual" por aproximações, já que habilidades sociais e conhecimento sobro sexualidade sáo
pró-roquisitos para o entendimento do situações potencialmente abusivas e para a aquisição
de habilidades de auto-proteçâo (Fryer et al.,1987; Gordon o Schroeder, 1995; Robert, 2003).
As técnicas utilizadas tiveram a função de contemplar osta seqüência de temas.

Resultados e Discussão
A análise dos resultados do Questionário para Avaliação de Conhecimento
sobre Abuso Sexual mostrou que 53 estudantes (89,8%) melhoraram seu desempenho
na segunda aplicação do questionário; os escores de dois participantes (3,3%)
permaneceram iguais e quatro estudantes tiveram rosultado pior na segunda avaliação
(6,7%).
As questões do quostionário nas quais foram obsorvadas as maiores mudanças
(acima de 25 pontos percontuais) entro a primeira aplicação e a segunda foram: em um
abuso sexual o agressor usa sempre a força o a violência; as pessoas quo cometem
abuso sexual sáo sempre dosconhocidas daquele que sofreu abuso sexual; aponas
homens abusam sexualmonte; apenas crianças do sexo feminino são vitimas de abuso
sexual; adolescentes (soxo masculino ou feminino) também podem ser agressores
sexuais; uma criança ou adolescento pode ser abusado por um adulto de quem gosta
muito. Nestas mesmas questões também foram observadas as maiores reduções no
número de respostas "nâo soi" (acima do 15 pontos percentuais), á exceção da primeira
questão.
A Tabola 1 mostra os resultados das quostões da primeira parte do quostionário
nas quais foram observadas as mudanças mais significativas.
Todas as questões nas quais ocorreram mudanças significativas, entre a
primeira e a segunda aplicação do Questionário, são da categoria "discriminar sinais",
ou seja, onvolvem conhecimento sobro os riscos de abuso sexual ou reconhecimento
do comportamento inapropriado do adulto. Foi também nestas questões que se observou
a diminuição expressiva do número de respostas "não sei" na segunda aplicação. De
acordo com estes resultados, esta foi a categoria sobro a qual os participantes mudaram
mais seu desempenho da primeira para a sogunda aplicação do questionário.

Sobro Comportamento o Cou»Kik> 135


Quostóes da Primeira Parte % de respostas correta» % do respostas
“nâo sei"
pré pó«- pré- pós-
intervonçAo intarvençflo mtervençfto intnrvençfto
Em um abuso sexual o agressor usa sempre a 1.6 74.6 0 1.7
força e a violôncia.
As pessoas que cometem abuso soxual sâo 37,1 88,1 29 6.8
sempre pessoas desconhecidas daquele que
sofreu abuso.
Apenas homens abusam sexualmente. 43,5 98,3 33.9 0
Aponas crianças do sexo feminino sâo vítimas 62,9 94.9 16.1 1.7
de abuso sexual.
Adolescentes (sexo mascuitno ou feminino) 64,5 96.6 25.8 3.4
também podem ser agressores sexuais.
Uma criança ou adolescente pode ser abusado 62,9 91.5 22,6 3.4
sexualmente por um adulto de quem gosta
muito.

Tabela 1: Porcentagens de respostas na primeira e a sogunda aplicação do Questionário


para Avaliação de Conhecimento sobre Abuso Sexual.

Este estudo mostrou que é possivel desenvolver um programa de prevenção


primária de abuso sexual em escolas, dirigido a adolescentes e pró-adolescentes o
adaptado à realidade brasileira. Os resultados mostraram que algumas crenças dos
participantes a respeito de abuso sexual foram mudadas, principalmente as referentes
a: uso da força física no abuso sexual; possibilidade de o agressor sor alguém próximo
à criança, incluindo familiares e pais; idade ou sexo do agressor; sexo da vitima. São
mudanças em crenças que podem fazer diferença para os participantes quando se
defrontarem com uma situação real de abuso sexual.

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Nobre C omportamento e CoflniçAo 137


Capítulo 11
Algumas considerações sobre o conceito
de tempo no behaviorismo
radical e na análise do
comportamento
M aria de Jesus Dutra dos Reis
Universidade Federal de São Carlos

“...Cronos, o mais jovem filho de Gea, de mente tortuosa e o mais terrivel de seus
filhos". (Heslodo, Teogonia, 1978, p.5)
"...Quando percebemos um ‘antes' e um 'depois', então dizemos que houve tempo.
Tempo seria slmplosmonte Isto: o númoro do movimentos conformo o 'antes' o o
'depois'." (Aristóteles, Physics, 1952, p.299)
O tempo aparece como objeto de especulação em todas as civilizações,
povoando o imaginário humano como na figura de Cronos, o terrivel filho de Gea. Ao
examinarmos a história do pensamento metafísico ocidental, vemos que tentativas de
sistematização deste conceito tem tido lugar por aproximadamente 2500 anos.
Naturalmente, não faz parte deste trabalho recuperar todo o contexto da discussão
sobre o tempo, em toda sua complexa extensão. Entretanto, começaremos apresentando
algumas questões filosóficas que foram (e ainda são), sistematicamente, objeto de
especulação por estudiosos interessados no que tem sido denominado Teoria Filosófica
do Tempo. Examinaremos, então, à luz destas questões, como o conceito de tempo tem
sido tratado no interior de algumas obras do B. F. Skinner. Concluiremos discutindo
algumas das implicações decorrentes do conceito de tempo no contexto do uma ciência
do comportamento.

Filosofia e tempo
Algumas questões têm sido tradicionalmente abordadas, dentro do escopo da
filosofia, quando tentativas são feitas para tratar, de forma mais sistemática, do conceito
de tempo-, as questões mais freqüentes dizem respeito à natureza do tempo, as formas
mais adequadas de medi-lo, a existência hipotética de uma direção identificável do mesmo,
a distinção da natureza temporal dos eventos e dos seres, a definição do finito e do infinito,
entre outras. Um problema importante, com desdobramentos essenciais para uma ciência
da psicologia, seria aquele que tenta tratar da natureza do tempo, ou seja, questões mais
diretamente relacionadas com o que podemos denominar sua natureza ontológica.

138 Maria 1'ertlia tie Abreu c Silva , I uii.i Natalia Dobrianskyj Weber
A dofinição de um conceito de tempo aparece fundamentalmente como corolário
do conceito de espaço, no contexto das teorias metafísicas e/ou físicas mais tradicionais
da filosofia clássica e escolástica ocidental. O movimento do ser em um determinado
espaço normalmente conduz à definição do conceito de tempo; na grande maioria dos
textos filosóficos o conceito de tempo deriva diretamente da noção de movimento. A
discussão sobre a natureza do tempo aparece sistematicamente desenvolvida, ou pelo
menos indicada, em trôs diferentes contextos da filosofia clássica; (1) quando os autores
tentam identificar a natureza da permanência dos seres, em detrimento de sua constante
mudança; (2) na intuição de uma temporalidade que definiria um ‘antes’ e 'depois', um
'passado', 'presente' e 'futuro' que, usualmente, conduz a discussões sobre (3) as
bases ontológicas que fundamentaria os atributos dos seres perfeitos (ex., imortal,
absoluto, onisciente e onipresente) e imperfeitos (ex., mortal, relativo).
Numa sistematização grosseira e simplificada de uma perspectiva da natureza
ontológica do tempo, podemos identificar polo menos dois grandes conjuntos de
tentativas teóricas para solução deste probloma; (1) o tempo como parte mensurável do
movimento e (2) o tempo como movimento intuído.
O primeiro grande conjunto de teorias tenta solucionar o problema da natureza
do tempo identificando o mesmo como uma dimensão ontológica do ser, inerente á sua
natureza; uma propriedade intrínseca ao objeto observado e externa à natureza do sujeito
da observação, derivada diretamente do movimento dos seres numa dimensão do espaço.
Podemos encontrar este tipo de definição em textos diversos, tais como na física
de Aristóteles, na física clássica de Newton ou no tratado do teoria relativa de Einstein. Um
elemento aparentemente comum que podemos identificar neste tipo de resolução conceituai
ó que o tempo seria uma dimensão derivada do movimento no espaço. De forma simplificada
podemos sumarizar que a definição de Aristóteles (1952) apresenta, por exemplo, o tempo
como uma dimensão do movimento das formas existentes no mundo.
Newton, em sua obra mais conhecida, Philosophiae Naturalis Principia
Mathematics - no corpo do escólio, apresentado ao final do capitulo onde organiza sua
Dofinição VIII - sistematiza o que ele definiria como espaço, absoluto e relativo, dos
quais deriva, respectivamente, as noções de tempo,_abso/ufo e re/at/vo; a distinção
entre estes conceitos estaria fundamentada no movimento dos corpos, chegando a
utilizar a famosa metáfora do movimento em um navio para enfatizar a distinção entre os
diferentes conceitos (Mach, 1953; Newton, 1687/1987). De fato, a forma como
tradicionalmente mensuramos fisicamente o tempo, considera o movimento da terra
quando examinada da perspectiva de sua relação com o que denominou-se estrelas
fixas; estas estrelas seriam corpos celestes tão distantes que poderiam ser considerados
pontos astronomicamente fixos com relação ao nosso planeta,
Da mesma forma, no coração da teoria relativa de Einstein, as equações sobre o
tempo são desenvolvidas considerando o movimento das partículas á velocidade da luz.
A presença de grandes massas produziria distorções na curvatura espaço-temporal;
estas distorções podem ser observadas através das alterações no movimento das
partículas de luz. Esta forma de tratar o conceito torna possível prever o comportamento
das partículas em sua relação com fenômenos astronômicos, tais como os buracos
negros; nestas estruturas do espaço o tempo literalmente não existiria (uma vez que na
proximidado destes a luz seria desviada e absorvida, produzindo mudanças de aceleração
e a eventual ausência total de movimento). É possível prever ainda fenômenos tais como
o paradoxo dos gémeos e/ou dos relógios (Einstein, 1953; Reichenbach, 1953).
Ao circunscrevermos o tempo como um fenômeno da natureza, questões
importantes devem ser respondidas, tais como: (1) qual a propriedade do mundo que

Sobre Comportamento e Cofiniç.lo 139


identificamos como sendo temporal? (2) qual seria a relação entre tempo e os eventos
da natureza? (3) se o tempo pode ser definido independentemente da noção de espaço
e/ou movimento, qual seria as propriodades definidoras deste fenômeno? (4) se o
conceito de tempo é absolutamente dependente do conceito de movimento e, desta
forma, do espaço, qual (is) a (s) dimensão (ões) deste evento seriam elementos
definidores da temporalidade? (5) sendo independente ou não, qual seria a unidade do
medida do tempo enquanto objeto de especulação? (6) qual seria a unidade minima de
análise? (7) o tempo teria uma direção, uma seta direciona) (arrow of time)?
O segundo conjunto do resolução tenta identificar o tempo como movimento
intuído-, uma construção humana, produto de uma organização ou categoria especial do
sujeito cognoscente. Um dos primeiros exemplos desta resolução pode ser encontrado
no diálogo platônico de Timeu (Platão, 1952) no qual o tempo ó descrito como sendo
derivado da apreensão impressa pela imagem eterna, do mundo das idóias,
movimentando-se de acordo com números. A formulação Kantiana também aponta
uma solução desta mesma natureza. Kant (1781/1987), no capitulo referente à estética
transcendental, defende que existiria uma faculdade da intuição, a sensibilidade, através
da qual os objetos seriam apreendidos pelo sujeito cognoscente; o tempo e o espaço
seriam duas sensibilidades apriorísticas.
Ao apresentar o tempo como um produto do sujeito cognoscente, os filósofos têm
historicamente levantado questões que permanecem importantes, particularmonte para
uma ciência da psicologia, a saber: (1) qual a função desta construção humana? (2) eventos
percebidos em sucessão, numa relação de contiguidade, seriam eventos causais? (3)
quando atribuímos relações de causa e efeito estaríamos simplesmente atribuindo relações
de contiguidade temporal entre eventos? (5) Como podemos delimitar, nas mais diversas
definições do fenômeno, o que entendemos como presente, passado e futuro?
Qualquer pensador que tente lançar alguma luz sobre os problemas inerentes
ao conceito de tempo terá que obrigatoriamente debruçar-se, em algum momento,
sobre algumas destas questões. Desta forma, para o escrutínio do conceito de tempo
em algumas das obras de B. F. Skinner procurou-se considerar como algumas destas
questões poderiam estar sendo, direta ou indiretamente, endereçadas.

O tempo na obra de Skinner


Para uma análise inicial do conceito de tempo na obra de B.F. Skinner, foram
examinadas mais cuidadosa, três diferentes trabalhos do autor: (1) About Behaviorism
(AB, 1974), (2) Science and Human Behavior (SHB, 1953) e (3) Contingencies o f
Reinforcement (CR, 1969)1. Estes textos foram selecionados por serem obras na quais
o autor sistematiza grande parte das bases de sua filosofia (Behaviorismo radical), e
pressupostos e conceitos de uma ciôncia do comportamento (Análise do
Comportamento). Naturalmente, quando acreditamos pertinentes, estaremos fazendo
referências a outras obras do autor.

Referência explícita ao tempo como variável


O conceito de tempo foi explicitamente tratado em momentos distintos de
duas das obras examinadas. Em seu texto de 1953, Science and Human Behavior
(SHB), na seção II, onde apresenta os fundamentos gerais da Análise do Comportamento,
o autor discute a importância do tempo como possível variável a ser considerada em

1Ao fu/orim» roforofxiiw u o»üu otxas, no rmlMiilu do texto, uttK/afwnou ■ nK)Ui iiNlk^Klu pura cart* um* dota»

140 M.iri.i Ccclliii ilc Abreu t Silv«i , I uli.) N.itiili.i Pobrltinskyj Wcbcr
uma ciência do comportamento. O conceito ó tratado, ainda, na mesma obra, no interior
do capítulo 9, onde se discute o papel da privação e da saciação para a descrição de
contingências. Ele começa afirmando que um comportamento que não foi diretamente
suprimido, e que tenha a sua possibilidade de ocorrência a qualquer tempo, usualmente
mostra algum tipo de periodicidade identificável. Ele afirma que:
" When th« behavior is possible at all times, it shows periodicity When the period
can be established, we may use time as an independent variable In predicting the
behavior. (SHB, p 155) 2
O autor discute neste momento a periodicidado envolvendo fenômenos
regulares e periódicos na espécie, tais como o sono o a menstruação, afirmando que:
"Time appears to be the principal experimental variable In certain slower periodic
changes Time as a variable cannot be manipulated experimentally Many behavioral
changes, especially In the instinctive behavior of lower organisms, follow an annual
cycle Migratory patterns, for example, coincide fairly accurately with the seasons
of the year Some conditions varying with the time may be more important than time
Itself (BHS, 155-156) 3
Volta-se a tratar explicitamente do tompo, como uma variávol, no capitulo 4,
denominado The Experimental Analysis of Behavior, da coletânea apresentada na obra
Contingencies of Reinforcement (CR). O conteúdo deste capitulo foi originalmente
publicado como What is the Experimental Analysis of BehaviorZ no Journal of
Experimental Analysis of Behavior (1966). Nesta obra o tempo foi examinado no contexto
da discussão sobre variáveis independentes incontroláveis, onde declara;
“ Cycles are another kind of temporal patterning... autocorrelation techniques can
be used to clarify cycles and trends, but unless we know that a cycle will maintain
Its period or a trend continue, we cannot use the results for purposes of prediction.
Nor of course, can time be manipulated as an independent variable" (p 89). 4
Do forma geral, as referências mais diretas sobro o conceito do tempo parece
estar circunscritas à análise da periodicidade e regularidade de padrões de
comportamonto, particularmente por uma história da seleção filogenótica. A etologia e a
análise do comportamento têm tentado determinar mais sistematicamente estas
relações complexas e periódicas, como, por exemplo, nos estudos quo tentam descrever
o que tem sido denominado cronobiologia (Lejeune, 1990).

Qs diferentes usos de conceitos temporais


Embora o autor discuta mais explicitamente o conceito de tempo como uma
variávol independente a ser considerada nos comportamentos mantidos por
contingências do primeiro nível de seleção, o conceito de tompo também parece ser
crucial para a análise e descrição dos comportamentos selecionados e mantidos por
outros níveis de seleção. Embora não se detenha na discussão do papel do tempo
como uma variável a ser entendida no contexto das contingências de três termos, defende
que o comportamonto soria solecionado e mantido em um certo tempo; encontramos

2Trad * quando o comfxxlamunloé n o m p r * r r > o * l r a imtU |)»rklkx*to<to Quando6 p o * * lv t t lo ( » t r k x lo . ix x ie r t n o * u m i


o ktm(K><;(>rTK) txtia variAvtri kwta|>andanto nu irtivMko do comporlamorrio*
3 Trad O tompo parar* *ar a principal vanávtri oxporlmantal Mn cwla* mudança* partotteaa tonta* T»m|x> como um« vartóvol nio (xxto «ar
manlfxilada «x|N«1maHMmanta MiiMa* da* mudança* comportamento«. aipotiaimanto. o comporlamwrto in*Unllvo d« ankiial* interior«*, mu i»
um tido anual O* («adrtVmmigratório*. (x* «xnmfilo. coincidam com razuAvd pracMko a* MtoçA»» do ano Alguma* da* condlçôe* quo variam
com o tompo podmn *ar mal* importante* do qua o tnmpo mu *1imamu *
4 Trad A r.lcückJad* A outro tipo (to f>adrfto temporal Téenlea* d« atitocorrataçAo podam *ar utilizada* para tornar mal* claro* ciclo* e
tondAncla* Errtr«tanto, a mano* qua «albamo* <|un um tido l i mantar *oa (»ariodidriada ou qua a*la IntxMnda lar* umlmulriade. nlo jxxiamo»
i i u i o* rimultHdoH oom o olijotlvodfl prtttlçâo Tamfxxicoo tompo |xxlo *nr m an cad o (xxno uma vxriAvnl lnda(xMK)anln

Sobre Comport,imrnto c CofinlçiU» 141


no inicio do capítulo 4, da obra Contingencies of Reinforcement, a afirmação do quo “ a
natural datum in a science of behavior is the probability that a given bit of behavior will
occur at a given time" (p. 75) s. Desta forma, podemos entendor quo uma resposta
sempre estaria acontecendo numa determinada relação espaço-temporal.
Trôs diferentes utilizações do conceito do tompo parecem ser Idontificávois no
contexto das obras oxaminadas. Um primeiro uso sistemático do concoitos temporais
apareço mais diretamente nas descrições do processo do planejamento e
implementação de procedimontos experimentais. Um exemplo disto pode sor
encontrado nas descrições referentes à programação do alguns dos esquemas de
reforço, como aprosontado abaixo:
"In a Fixed-lnterval schedule of reinforcement (FI), the first response after a
designated interval of time is followed by a reinforcing stimulus It is programmed by
a timer which starts from zero after each reinforcement (or from the start of the
session) The first response following this period operates the magazine" (Ferster
& Skinner, 1957, p 133)*.
Este primeiro uso sistemático de conceitos temporais diria respoito a como o
reforço e a resposta seriam disponibilizados em um certo continuum ospaço-temporal,
pelas ações realizadas polo exporimentador em sua investigação Nestes casos, o
tempo ó descrito dentro de uma unidade padrão de medida fisica, utilizando as medidas
estabelecidas por convenções internacionais.
Um segundo conjunto de doscrições temporais pode ser inferido quando
examinamos mais cuidadosamente os processos complexos que seriam o produto
das contingências programadas. A disponibilidade das contingências estabelece um
efeito especifico, muitas vezes provisivel, sobro o desempenho, gerando o quo tom sido
denominado padrão do responder. Considerando, por exemplo, o esquema de reforço
em intervalo fixo descrito antoriormente, podemos encontrar, na seqüência do mesmo
texto, a seguinte afirmação:
"... a fixed-lnterval schedule normally generates a stable state in which a pause
follows each reinforcement after which the rate accelerates to a terminal (usually
moderate) value" (Ferster & Skinner, 1957, p 134) '
Na sua obra de 1938, The Behavior of Organisms, Skinnor já discutia como a
disposição temporal de conseqüências poderia afetar o responder, lovando a padrões
previsívois de respostas, no que ele então denominava periodic reconditionig
(recondicionamonto periódico). Mais do que isto, ao discutir sobre comportamento
operante, tratando das "contingências acidentais e comportamento supersticioso"
estabelecidas especialmente sob o respondor em esquemas temporais não
contingentes, o autor chega a afirmar:
" But these need not. and usually do not, affect the organism in any other way So far
as the organism is concerned, the only Important property of the contingency Is
temporal The reinforcer slmçly follows the response How this is brought about
does not matter" (SBH, p 85)

5 Trad IJm (tack) natural mima oêrida do cotM[x>rtaiiMnU> A(pai unia dada porçAo do ounipwlNnmnl» provHvHmnrili» IfAcxxirmr ran imm |x>rvAo
•M|xx:llkui (In tomi[x >
0 Trad No Eaqunma da Rafotvo atn Intorvak) Flxo (FI) a primeHa rna(x>*la nmlUda npô» um Intorvak) (Ip lom|x> dnaignado imrA utiguldn [miIh
a|>r»M>nlaçAo da inti aatlmuk) n rfo fp rt* Um mlrtyki é programado mmmJorvinklado no vakx ian> apA* («da r*forço(oti do lnlok> da mmwAo) A
(xtmolra r»»)x»la angulndo aata parlodo opara o cotimdcxim
7 Trad Um nm|in*nia da rwlorço am Intarvak) flxo normalmnritti prtxki/ urn anbido nalAvtil no qiial uma pauta no mafxmdar »**()(ta cad« um (km
rtiforçt«, dnpoti daata (>au*a a tax* no mufxxKlnr amima |>ara um vakx tmminai (i*uaknmiln modorado)
fl Trad NAo A nacaMArki qua haja uma GonoxAopnmianantatinini rn»(xnta n mkxvo No qua (1/ mtjxtiloaon orgHnlamo* a link» |KK*f>n«xImki
Irnixirtanln da contlngAnda A a lnm|xxal O raforçador ulmfitmutNini« aucadu A n»{xiata Como laao aconloc« nAu Imjxjrtfi *

142 M.triit t'cclliu »lc Abrcu c Silvu , I iilhi N.it.ilt«i l>obri<mskyj Weber
Desta forma, a relação temporal seria um olomento crucial a sor considerado
como uma propriedade da contingência. Os estudos que usualmente estão preocupados
com as variáveis envolvidas no que tem sido denominado controle temporal poderiam
ser considerados exemplos importantes, na descrição deste tipo de relação (Skinner,
1948; Staddon & Simmelhang, 1971; Staddon & Frank, 1975). Uma questão teórica
legitimamente iovantada neste contexto diz respeito aos desdobramentos previsíveis
ao discutirmos a rolação de contigüidade e contingência. A apresentação sucessiva e
persistente entre oventos seria suficiente para manter o responder, independente das
contingências funcionalmente em vigor? Como trataríamos, neste contexto, a noção de
causa ou do relação funcional? (Killeen, 1981; Moore, 1984; Staddon, 1973).
O oxame das dimensões temporais parece importante não somente quando
consideramos os esquemas temporais contingentes e não contingentes, mas, tambóm,
quando examinamos outros elementos das contingências. Por exomplo, vemos que a
taxa de resposta tem sido utilizada como uma medida fundamental na descrição do
comportamento; sabemos, entretanto, que a taxa nada mais é do que a distribuição do
responder em um detorminado tempo. O exame, mesmo que rápido da análise do
comportamento revela ao investigador que a duração (enquanto uma medida da
permanência e ocorrência de eventos num intervalo de tempo) è considerada tanto
como uma propriedade das condições antecedentos (ox., tempo de apresentação do
ostimulo antecedente) e conseqüentes (ex., tempo do apresentação do reforço), quanto
da própria resposta (ex., tempo de apresentação de uma determinada resposta).
Sendo assim, este segundo uso de conceitos temporais parece ser entendido
em sua relação intrínseca com a contingência, como uma propriedade da mesma; a
propriedade temporal das contingências apareceria como um elemento fundamental
em sua constituição.
Como um corolário desta forma de tratar a relação de contingência em seu
continuum temporal, o papel da história passada segue-se como uma discussão natural;
entendemos que considorar a história passada significa examinar a ocorrência de uma
resposta num momento temporal selecionado como atual, à luz das relações de
contingências envolvidas na emissão de respostas similares em uma unidade espaço-
temporal anterior. Tratar do comportamento dentro do sua unidade histórica parece ser
uma variávol importante para a previsão da probabilidade do comportamento presento
e a possibilidade do inferência da emissão do comportamento no futuro. O autor chega
a afirmar que uma análiso do comportamento seria necessariamente histórica:
“Something is done today which affects the behavior of an organism tomorroWi (AB,
1974, p. 215).° Hayes (1992) apresonta algumas das questões e implicações conceituais
envolvidas no conceito de história passada e de dimensões da temporalidade para a
análise do comportamento.
É interessante observarmos que, intuitivamente, ostos elementos da dimensão
temporal das contingências aparecem desdo os primeiros estudos do autor,
particularmente quando consideramos o responder na sua forma mais tradicional de
descrição: o registro cumulativo;
A Figura 1 apresenta um segmento de registro cumulativo roforente aos
responder de um pombo, em sua segunda sessão sob Esquema de Reforço em Intervalo
Fixo de 3 minutos, onde o reforço era a apresentação do comedouro por um tempo igual
a 5 segundos. Esta figura foi produzida por um registrador cumulativo, aparato de forma
cilíndrica, no qual foram afixados um rolo de papol e uma pena com tinta. Este ap arato

fl írml Alyunm coimn A loitn hojn (|mi nkilit o «xxnpurtMmoiilo <lo um orynnlMtto nmnrihA

s«l>rc ('omportiimcnto e CoqniÇilo 143


girava em uma velocidade constante produzindo um movimento do papel. A pena ora
posicionada sobre o papel de tal forma que um movimento vertical era impresso sobre
o mesmo á cada resposta; caso nenhuma resposta fosse emita, a pena era mantida na
mesma posição, produ2ido um registro de forma linear e horizontal. A curva mostra que
a pena registrava o aparecimento do reforço voltando para o ponto inicial do papol o
gerando uma reta vertical. Desta forma, neste segmento de análise, vemos a liboração
de um total de oito diferentes reforços. Esta forma de apresentação do responder ponto
a ponto representa um elemento importante de descrição da análise experimental do
comportamento.Skinner utilizou abundantemente este tipo do registro para descrever
os padrõos de respostas observados em cada um dos esquemas de reforço. Podemos
ver em obras como The Behavior of Organisms (Skinner, 1938) e Schedules of
Reinforcement (Ferstor & Skinner, 1957) descrições relativamente sofisticadas e
complexas deste tipo do registro.

Figura 1 - Segmento de um registro cumulativo, apresentando o responder de um pombo


em sua segunda sessão (estado de transição) sob esquema de intervalo fixo 3 minutos.

Este tipo de registro permite visualizar o responder nos diferentes momentos


das condições experimentais, em sua distribuição temporal. Podemos observar
mudanças continuas acontecendo ao longo da sessão, de tal forma que a primeira
resposta (R1), emitida no inicio da sessão (to), previsivelmente teria uma relação distinta
das contingências operando quando emissão da última resposta (Rn), ao final da sessão
(tn). O efeito complexo obtido pela interação entre o rosponder, a apresentação dos
reforços o a sua distribuição na dimensão espaço-temporal podem ser inforidos pela
obsorvação sistemática do transcorrer da sessão. Podemos pressupor quo ombora a
resposta de bicar no disco possa se apresentar como topograficamente similar ao
longo da sessão, quando consideramos isoladamente cada resposta (R1, R (n-x) o
Rn), emitidas em diferentes momentos (to, t (n-x) e tn), as relações de contingências na
manutenção do comportamento - em cada urna delas - poderiam ser distintas, levando
á hipótese de que diferentes relações funcionais podoriam estar em vigor no momento
em que cada uma destas respostas foi emitida.
O autor afirma, ainda, que "temporal and intensive properties of behavior can
also be traced to both ontogenic and phylogenic s o u rc e s (CR, 1969, p.204),ü. Desta

10 rrw í fVoixtedHílMií tempofHHt o tfe krinnnklmtn do uomfxrtnmnnto |xxktnt tambóni w tonçudu*. lunlo em mjuh urfgen» fltuu<irWítl(:u)M|iu>n<fc)
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144 Miirl.i Ccdlld de Abreu e Sllv.i , I idi.i N.it.ili.i Dohriiinskyj Webcr


forma, duração - assim como freqüência, intensidade ou extensão espacial - podem ser
entendida como uma propriedade, e certamente, uma propriedade discriminável do
comportamento; ficaria implícito, portanto, que o tempo seria uma dimensão identificável
do mundo. Entretanto, sendo este o caso, pormanece as seguintes questões: Quais
dimensões dos estímulos são discrimináveis como temporais? Quais as propriedades
relevantes para esta discriminação? Esta noção de tempo derivaria de alguma dimensão
do movimento? Qual a dimensão marcante de mudanças que levaria a este processo
de discriminabilidade temporal (a sucessão das respostas, dos antecedentes, dos
conseqüentes ou uma interação das mesmas)?
Além disto a afirmativa" a natural datum in a science of behavior is the probability
that a given bit of behavior will occur at a given time" (p. 75)11, levanta imediatamente
pelo menos duas questões essenciais: (1) qual a porção do comportamento a ser
privilegiada? e (2) qual o limite de tempo a ser considerado na delimitação do fenômeno
estudado? Ou, seja, quais as condições temporais a serem consideradas como parte
de uma unidade minima de análise?
Um terceiro uso do conceito de tempo pode ser identificado no que iremos
denominar aqui como temporalidade. Por toda sua obra, Skinner relata a habilidade do
ser humana de descrever algumas das contingências da qual o seu comportamento
seria função. Algumas destas descrições, direta ou indiretamente, faz menção a uma
inferência temporal. Neste caso, podemos dizer que o conceito de tempo poderia ser
tomado como uma dimensão do comportamento verbal, especificamente na descrição
de certas condições das contingências. Eis alguns dos exemplos deste tipo de
comportamento verbal. " What did you do yesterdayV 12, ou "What happened
yesterday?" 13 (AB, p 26). De fato, na descrição de comportamentos passados ou futuros
(AB, pgs, 26-27), podemos inferir que uma dimensão temporal do comportamento teria
que ser discriminada, possibilitando identificar uma certa relação como tendo tido lugar
em um momento anterior ao atual, ou como um comportamento de alta possibilidade
de ocorrência, em um tempo posterior ao delimitado como presente.

Implicações para uma ciência do comportamento


O conceito de tempo apareceria no contexto das obras examinadas em pelo
menos três diferentes perspectivas: (1) como uma descrição de medidas temporais, na
programação de condições experimentais; (2) como uma dimensão discriminável do
processo estabelecido pelas contingências e (3) como um comportamento verbal que
descreveria aspectos temporais discrimináveis das contingências.
A discussão dos fenômenos cíclicos temporais, afirmando o tempo como uma
variável independente a ser considerada em uma ciência do comportamento, pode ser
entendido como um exemplo do segundo conjunto de dimensões temporais. Seria
uma forma de identificar e descrever propriedades do tempo, na sua relação com
comportamentos relativamente complexos, entendidos, contudo no contexto do primeiro
nível de seleção, a saber, na seleção filogenética.
As pesquisas sobre controle temporal têm contribuído para a descrição e previsão
dos comportamentos mantidos por contingências ditas temporais; investigações cuidadosas
poderiam esclarecer mais diretamente quais as propriedades relevantes discrimináveis do
tempo quando consideramos as contingências em vigor. Embora os resultados de pesquisas
sobre controle temporal não levem a resoluções filosóficas ou lógicas do problema da

11 V*f tmduçâo na no«« da rodapé n 4


12 Tr«d.: O qu« vocé tw ontoin?
13Tr«d. Oqu««conlBciHj ontem?

Sobrr Comport.imcnlo c CognifJo 145


contiguidade e causalidade, podem, entretanto ajudar na sistematização do papel destas
variáveis, no interior da análise do comportamento.
A análise dos comportamentos verbais envolvendo descrições temporais pode ser
importante para entendermos algumas dimensões do que denominamos temporalidade.
Ela se torna particularmente importante quando identificamos que uma parte considerável
das discussões filosóficas sobre o tempo, como movimento intuido, foi construída
considerando particularmente algumas dimensões destes operantes verbais.
Como em todo comportamento verbal, podemos supor que uma comunidade verba)
devo ter reforçado a discriminabilidade de certas propriedades das contingências em vigor,
inclusive aquelas dimensões ditas temporais. Consideremos, por exemplo, um indivíduo
que olha para um relógio na parede e relata: “sào duas horas da tarde". Neste contexto, o
falante esta emitindo um comportamento verbal, sob o controle de um estimulo específico do
ambiento (relógio). Esta descrição, considerando a sua topografia, parece ser um tato
relativamento importante, selecionado na maioria das culturas; seja na forma do discriminação
do movimonto dos pontoiros dos relógios, da diferentes posições das sombras nos rológios
do sol ou do movimento de nossa estrela no céu, durante o dia.
Da mesma forma, a comunidade vorbal reforça diferencialmonte a descrição de
eventos passados, ao omitir perguntas do tipo "como foi sua viagem no final do ano?" O quo
aconteceu ontem na festa? Como foi a entrevista de trabalho feita ontem?), diante destas
perguntas o ouvinte usualmente ó reforçado ao emitir respostas do tipo: "foi uma viagem
inesquecível", "fiquei paralisada durante a entrevista", entre outros. Comunidades verbais
também modelam e fortalecem a descrição da probabilidade futura do comportamonto (ox.,
"Hoje estou contento o pretondo continuar assim por toda esta semana", “Devo visitara Espanha
no final deste and ) ao reforçarem diferencialmonte respostas a questões do tipo: "o que você
irá fazer amanhãToo "quais os seus planos para as próximas férias?".
Considerando que a consciência de uma determinada contingência implicaria na
descrição verbal da mesma (AB, 1974), poderíamos hipotetizar que estar consciente da
temporalidado (ontem, hoje, amanhà; passado, presente e futuro) poderia ser inicialmente
entendida como um comportamento verbal.
As condições temporais discrimináveis poderiam ser afetadas por diferentes
elomontos da contingência tríplice (antecedente, propriedades da resposta e conseqüências)?
Se sim, como dar-se-ia este processo? Para ilustrar, vamos considerar, como exemplo, o
comportamento de uma garota adolescente, na casa de seus Pais, pronta a três horas para
ir à uma festa; enquanto ela espera o namorado, olha repetidamente para o relógio e, de
repente, exclama: "parece que o tempo não passai" Por outro lado, duranto a festa ao olhar que
o relógio, que marca 2:00 da manhã, ela demonstra surpresa, pois havia consultada o relógio
havia aproximadamente três horas mas, declarou que "nào viu o tempo passaC Observamos
que o tempo enquanto medida física aparentemente seria o mesmo em ambas situaçõos
(aproximadamente 3 horas). Entretanto, as contingências de reforço em vigor e a possibilidade
de acesso a contingências roforçadoras positivas na emissão de comportamentos, parecem
alterar a discriminabilidade das dimensões temporais, produzindo distorções. Ao observar o
movimento dos ponteiros de um relógio, na sala de aula, nos momentos quo antecedem o
sinal do recreio, um estudante pode afirmar que tem a sensação de que o tompo esta
demorando infinitamente para passarl Nestes exemplos podemos supor que a relação com
algumas das dimensões das contingências podem ser importantes na discriminação e
descrição das relações temporais. Permanece a questão: como diferentes contingências do
reforço estariam envolvidas e relacionadas com a percepção pessoal e individual da
temporalidade, por um determinado sujeito cognoscente?
Para entendermos melhor como as condições temporais das contingências podem
afetar o responder, vamos tentar examinar uma situação hipotética, usualmente delicada,

146 M . in .i Cccihii dc Abreu c Silv.i , I uli.i N.itali.i Pobri.mskyj Wrbcr


comum para profissionais que lidam no ambiente de saúde. Um módico oncologista, após
análise dos exames pertinentes, informa ao paciente que ele ó portador do uma doença
terminal, com prognóstico de sobrevivência de, no máximo, quatro (4) meses. Observe que a
informação sobre a mortalidade nào deveria ser nova ou surpreendente; todos os seres
humanos morrem. A mortalidade ó uma certeza e este paciente poderia vir a morrer, por
exemplo, de um acidente de carro, na própria saída do consultório; a informação realmente
nova refere-se à dimensão temporal adicionada a esta informação. Usualmente parecemos
organizamos o dia a dia considerando como certo que teremos um amanhã, no qual respostas
poderão ser emitidas e algumas conseqüências obtidas. Além disto, boa parte dos
comportamentos de afta probabilidade de um indivíduo adulto, estão relacionados à obtenção
de reforçadores em longo prazo (ex. estudar para obtenção de um curso superior, fazer uma
poupança para comprar imóvel próprio, casar e organizar-se para ter filhos, entre outros).
Desta forma, o contato com a reafirmação de sua mortalidade, acrescida de uma data
relativamonte previsível deste evento, introduz um conjunto razoável de mudanças nas
contingências em vigor; desempenhos mantidos por contingências de reforços em longo
prazo podem entrar em extinção; o ambiente biológico do paciente passará por mudanças
como produto da doença, produzindo extinção previsível de algumas cadeias comportamentais
importantes; a possível presença de estimulação dolorosa (relativas à patologia o ao próprio
tratamento) pode aumentar o responder mantido por condições sob controle aversivo, com a
presença de alguns de seus efeitos colaterais, entre outros. Para entender como a consciôncia
de aspectos da temporalidade afetaria propriedades do comportamento ou como as
contingências afetariam a discriminabilidade de propriedade temporais, far-se-ia necessário
avaliar como todas ostas condições em vigor, om toda a sua complexidade, poderiam estar
operando.
Delimitar o conceito do tempo pode ter um papol conceituai crucial em pelo menos
quatro aspectos importantes na formulação teórica da Análise do Comportamento: (1) uma
delimitação conceitualmente mais específica da unidade de análise do comportamento,
incluindo mais explicitamente sua dimensão temporal, conseqüentemente produzindo uma
melhor delimitação do conceito de operante; (2) estabelecendo um limite mais claro do papel
da contigüidade na análise funcional do comportamento; (3) uma estrutura teórica mais
consistente onde pudesse ser melhor especificado o papel e a análise do tempo em sua
dimensão de controle temporal e (4) uma delimitação mais clara e precisa das condições
físicas e sociais que constroem o que ternos denominado temporalidade.
Não deixa de ser interessante notar que Skinner irá tratar mais sistematicamente do
conceito de tempo no contexto do desenvolvimento de uma possível ciência do comportamento,
não dedicando ao tema nenhum capítulo específico na sua obra de cunho mais filosófico:
About Behaviorism (1974). Este dado, por si, surpreende uma vez que, enquanto filósofo
consciencioso, raramente deixou de tratar problemas, do âmbito da filosofia ou da psicologia,
que fossem pertinentes para os fundamentos do Behaviorismo Radical. Consideramos esta
aparente omissão de certa forma sugestiva.
Da multiplicidade de possibilidades e de eventos que poderiam estar relacionados
a esta omissão, destacaremos pelo menos duas possíveis explicações. Uma delas refere-
se ao fato de que a ausência de delimitação teórica do conceito de tempo e de temporalidade,
no interior da teoria, não parece ser um limite efetivo e prático para o desenvolvimento de uma
ciência do comportamento. Estabelecidos alguns parâmetros de manipulação possívol desta
variável, o analista do comportamento parece prescindir, no momento, pelo menos no que
concerne a pesquisa e a intervenção, de uma discussão mais ampla sobre o conceito de
tempo © como este poderia impactar sobro o desenvolvimento de seu corpo teórico. Não seria
a primeira vez que um problema lógico/conceituai na teoria de Skinner receberia uma solução
empírica. Temos um exemplo similar no tratamento teórico dado a cidicidade defínicional do
operante (Schick, 1971).

Sobre Comportamento e Conmç.lo 147


Um outro fator pode ser a dificuldade de estabelecer uma definição conceituai
mais precisa do que seja ambiente (Micheletto, 1999). Quando examinamos sua obra
podemos ver que o conceito de ambiente evolui ao longo da mesma, passando por
sucessivas mudanças. Uma vez que a definição de tempo parece necessariamente ter
sido precedida, historicamente, por uma melhor definição do que seria ambiente, espaço,
ovonto, não parece surpreendente que os problemas com o uso do conceito, envolvendo
dimensões temporais, tenham passado quase despercebidas em sua filosofia; o
conceito de tempo poderá, possivelmente, ser mais adequadamente delineado quando
estabelecermos, de forma mais clara, o que entendemos como ambiente.

Referências

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148 Crrlllti dr Abrru f Silva , liili.i N.it.ilw Pobri.miky) Weber


Capítulo 12
Estudo esperimental da depressão
M uriü I lelena Leite I lun/iker
USP

Em contraposição aos ostudos desenvolvidos segundo pressupostos


mentalistas - que atribuem as causas da depressão a processos mentais inferidos,
baseados em classificações de sintomas - os estudos realizados sob o prisma da
Análise do Comportamento consideram, prioritariamente, as relações funcionais
existentes entre o indivíduo deprimido e o seu meio ambiente. Dessa perspectiva, as
descrições topográficas dos comportamentos envolvidos são menos relevantes do
que a identificação das relações de reforçamento/punição/extinção às quais o indivíduo
deprimido está submetido. Também, dessa perspectiva, é igualmente desnecessária
a caracterização da depressão como uma psicopatologia (uma "doença") já que todo
comportamento - independente se classificado como normal ou patológico - decorre
das relações funcionais estabelecidas ao longo da história do indivíduo, somadas às
contingências atuais. Portanto, o estudo da depressão, feito pelos analistas do
comportamento, deixa de lado a concepção de doença e a elaboração de listas
classificatórias de sintomas, para se ater às interações organismo/ambiente, atuais e
históricas, do indivíduo em análise.
Ferster (1973) realizou um trabalho pioneiro de análise funcional da depressão,
que ainda ó referência na área. Segundo ele, a pessoa deprimida sofre basicamente
de falta de reforçadores. Como a emissão de comportamento é mantida por reforçadores,
a falta deles deve gerar, necessariamente, uma baixa comportamental que pode
corresponder à baixa iniciativa (passividade), isolamento social, pouca ingestão de
alimento, baixa atividade sexual, etc. No nível dos comportamentos encobertos, descreve-
se tristeza ou infelicidade, pessimismo, entre outros comportamentos que chegam a
público via verbalização do indivíduo deprimido. Essa enumeração de "sintomas",
contudo, não ó o ponto central do estudo de Ferster, sendo crítico, para ele, que se
compreendam os processos que levam o sujeito a ter baixa freqüência de reforçamento.
Portanto, o estudo da deprossão necessariamente deve abranger a identificação dos
processos que reduzem o valor reforçador dos estímulos disponíveis no ambiente, ou
das condições de vida que limitam o acesso do sujeito aos reforçadores,. Tais ostudos
podem ser realizados clinicamente ou em laboratório, derivados de investigações
básicas sobre o comportamento. É sobre esses últimos que trataremos a seguir.

O estudo experimental da depressão


Segundo McKinney (1984), no laboratório "os modelos animais representam
preparações experimentais desenvolvidas em uma espécie com o propósito do estudar os
fenômenos que ocorrem em outra espécie. No caso dos modelos de psicopatologia humana,
buscam-se desenvolver síndrornes nos animais que de corto modo se assemelhem

NoUt Apoio CNP(|, proco»»o m> »50907/2002-9

Sobre l'omport.imenlo e CoflnlcÜo 149


àquolas apresentadas pelos humanos, com o fim de estudar aspoctos seletos da
psicopatologia humana" (p. 77). Assim, a escolha do modolo animal deponde, basicamente,
da caractorização dos comportamentos (da "psicopatologia") que elo se propõe a investigar:
se essa caracterização é topográfica, o modelo deverá mimetizar, em animais,
comportamentos topograficamonto somolhantes aos apresentados por humanos; se ela ó
funcional, como na análise da depressão feita por Forstor, o modolo adotado deverá criar no
laboratório condições que gerem a menor freqüência de reforçamento do indivíduo.
Do acordo com Willner (1991), ao monos 18 modelos de depressão já foram
doscritos, sendo a maioria utilizada em estudos farmacológicos que testam drogas com
potencial efeito antideprossivo. Grando parte desses modelos atondo ao quosito
topográfico classificatório da doprossão, som dosonvolver qualquer análise dos procossos
de aprondizagorn responsáveis pelo comportamonto om ostudo A ausôncia dessa análiso
torna tais modelos insuficientes para os objetivos da análiso do comportamonto, uma vez
que o ofoito do drogas só podo ser analisado dentro de uma rolação da oquilíbrío ontro os
dois componontos da rolação organismo/ambiente (Blackman & Pollón, 1993), som a
qual o modelo se torna apenas uma tócnica de laboratório (Hunzikor & Pórz-Acosta, 2001).
Aparontomento, apenas trés modelos fazem a análise das relações funcionais
supostamonto onvolvidas na dopressão: (1) separação, (2) ostresse modorado crônico
(chronic mild stross- CMS), e (3) desamparo aprendido.
O modolo do soparaçâo (Harlow & Suorni, 1971; 1974) utiliza principalmente
primatas como sujoitos, tondo por baso a separação do filhote da sua mãe, ou do um
macaco adulto separado do sou meio social, por um período prolongado (cerca de 30 dias).
No caso do filhote, ele continua sendo alimentado e tondo as condições básicas de
sobrovivôncia, mas não recebo outros reforçadores que eram providos anteriormento pola
mão, principalmonte aqueles decorrontes do contato físico que ó agudo nessa sua faso do
desonvolvimento. O que se observa é que o filhote passa a apresentar redução generalizada
dos seus comportamentos, caindo drasticamento sua interação com outros macacos e a
ingestão de alimentos, podendo levá*lo à morte. No caso do macaco adulto, o isolamento
social é feito em gaiolas verticais que não permitem muita mobilidade física: ao ser liborado
para o convívio com outros macacos, o sujeito mostra acontuada rodução do locomoção e
do exploração do ambiente (comparativamente à linha do base obtida antes do tratamento),
postura física de "fechamento em si próprio" (o macaco permanece "auto-abraçado"), além
de aumento de comportamentos destrutivos (Colotla, 1979). Portanto, de uma maneira
geral, esse modolo de soparaçâo mimetiza situações onde a falta de reforçadores se dá
pola privação da fonte do reforçamento social (da mãe ou do outros mombros da espécie).
Sorá que osso modolo poderia corrospondor ao ostudo da oxtinção oporanto, ondo
comportamontos quo anteriormente produziam reforçadores doixam do fazô-lo? Na extinção
operante, a interrupção da relação de roforçamonto produz, inicialmente, o aumento da taxa de
respostas anteriormento reforçadas, seguida por um aumento da taxa de outras respostas
(maior variabilidado comportamental) e, depois, por uma baixa generalizada da taxa do
rospostas. No modolo de separação, a relação resposta/roforço cai drasticamonto porque as
respostas que anteriormente produziam os reforços não podem sor omitidas pela ausôncia
do agente roforçador (a mão ou outros macacos). No caso dos filhotes, o quo se doscrevo ó
quo olos inicialmento “protestam", depois apresentam uma expressão facial "triste", soguida
do grando rodução comportamental (passividade). Seria esse modelo equivalente ao rato,
anteriormente reforçado a pressionar a bana, ser colocado na caixa experimental sem a
barra? Provavelmente não, pois parece sor crítica a natureza social dos roforçadoros subtraídos
do sujeito. Assim, o modolo do separação mimotiza um tipo do doprossão humana docorronto
da privação de roforçadoros sociais como, por exomplo, em casos do prisão, onde o sujoito ó
totalmonto removido do seu meio reforçador, ou em casos de morte/separação de uma
possoa quorida, om quo o sujeito ó privado dos reforçadores pela falta da pessoa que era a

150 I d lii.i S,mi Ann.i, I lolcnc shinoli.ir.i


sua principal fonte de reforçamonto. Se esso ó o processo desencadoador da baixa
comportarnontal, aparentemente a sua abordagem terapêutica deveria se dar na rostauração
das relações de reforçamonto subtraídas, ou na sua substituição, no caso da impossibilidade
dessa restauração. De qualquer modo, esse modelo aponta para o fato de que o probloma
não está no indivíduo (não ó ele que não está sonsível ao reforçamento), mas sim nas
relaçõos do roforçamonto quo foram impedidas do ocorror.
Os outros modelos apontam na direção contrária, ou seja, para processos que
tomam o sujeito monos "reforçável". O modelo do CMS envolve, basicamonto, a exposição
crônica do sujeito a estímulos estrossores (aversivos) moderados, sendo sous efoitos
analisados sobre a redução da função reforçadora de estímulos disponíveis ao sujeito. Na
faso do tratamento (indução da depressão), ratos são expostos a um conjunto do condições
que já foram demonstradas oxperimontalmonto como geradoras de estresse em ratos, tais
como luz estroboscópica, inclinação da gaiola viveiro, ruído intenso, odor estranho, inclusão
de outro rato na sua gaiola viveiro, e outras. Essas alteraçõos ficam prosentes no biotório
por poríodos prolongados (algumas duram 24 h, alternando-se ao longo do 6 semanas).
Com isso, ao terminar uma condição de estímulo estressor, outra é introduzida, gorando
um contexto de “desconforto" crônico, embora as condições básicas do sobrovivôncia sejam
mantidas, sem evidência de exposição a uma aversividade acentuada. A medida
comportamental utilizada para avaliar os efeitos desse tratamento envolvo uma condição do
escolha entro ingerir água ou solução de sacarose, comparando-se o volumo de ingestão
da sacarose pós-tratamento com a obtida na fase de linha-de-base, antes de qualquer
manipulação experimental. Os resultados mostram que, na linha-de-base, os ratos
apresentam grande proferôncia pela sacarose, o que sugere ser essa substância um
poderoso roforçador positivo. Contudo, após a exposição ao CMS, os mosmos animais
mostram reduzido consumo de sacarose, sugerindo uma quoda no valor roforçador dessa
substância em função da exposição crônica aos estímulos aversivos “moderados". Esse
efeito é denominado “anedonia", que corresponde à insensibilidade ao reforço ou “perda do
prazer" (Willnor, 1997; Willner, Muscat & Papp, 1992).
O modelo do CMS reproduz, portanto, um conjunto do rolações que tem paralelo
na vida cotidiana, onde episódios de aversividade moderada se alternam, mantendo uma
cronicidade de dosconforto. Por exemplo, ao sair de casa o indivíduo se defronta com o
trânsito engarrafado, ao chegar ao trabalho constata quo o computador não funciona, no
retorno ao lar o ônibus está lotado e, ao se deitar, o barulho da cidade dificulta seu o sono.
Nenhum desses eventos, isoladamente, seria muito aversivo para esse sujeito (daí sua
classificação como “moderado"), mas a somatória contínua deles é que possivelmente
potência a função aversiva do conjunto, porturbando o seu comportamento.
A qualificação desses estímulos como avorsivos "moderados" podo ser
questionada uma vez que não são apresentadas medidas comportamontais quo atostom
o seu poder como roforçador negativo. Alóm disso, a cronicidade de exposição a eles
dificulta a aferição da sua função aversiva, que pode ir se alterando ao longo do processo.
Contudo, apesar dessa imprecisão, o modelo tem recebido grande aceitação, tanto
entre os analistas do comportamento (Thomaz, 2005) como entre os
psícofarmacologistas que, entre outras coisas, domonstraram ofeitos seletivos de drogas
antidepressivas na reversão dessa anedonia (Moreau, 1998). No que diz respeito á
análise do comportamento, o CMS propicia o estudo dos efeitos de eventos aversivos
aparentemente pouco intensos, porém crônicos, que podem roduzir a sensibilidade
dos sujeitos a eventos naturalmente reforçadores. Ao reduzir a função reforçadora de
estímulos disponíveis ao sujeito, esse modolo mimetiza, portanto, uma das condições
básicas para o estudo da depressão.
O modolo de “desamparo aprendido" ó o que mais abrangência tem mostrado om
diversos níveis do investigação, quor comportamental, bioquímico ou farmacológico (Hunzikor,

Sobre ('omportiimrnlo c (.'o#nlv*1o 151


2003). Ele vem sondo estudado desdo a dócada de 60, mostrando resultados sistemáticos
em diversas espécies (Hunziker, 2005; Maior & Selígman, 1976; Petorson, Maier & Selígman,
1993; Soligman & Maior, 1967). Nos estudos com ratos, o sujeito é exposto a 60 choques
elétricos de 1,0 mA, com duração máxima de 10 s cada, ospaçados entre si de forma que ao
final de 1 h de sessão o sujeito recebe um máximo do 10 min do exposição ao choquo.
Postoriormonte (yeralmonto, após 24h), esses animais são submetidos a uma contingência
de fuga, ondo novos choques são apresentados e podem ser dosligados em função do urna
detorminada resposta do sujeito. A aprendizagem dessa resposta (fuga) ó comparada com a
de outros animais expostos previamente aos mesmos choques, porém controláveis, ou a
nenhum choquo. Os resultados mostram que apenas os sujeitos submetidos aos choques
incontroláveis aprosontam dificuldade de aprendizagem de fuga: alguns sujeitos apresentam
baixa probabilidade de omitir a resposta, não exporimontando o reforçamonto nogativo que
ostá disponível; outros sujeitos, embora eventualmonto omitam algumas respostas de fuga
(o com isso exporimontom que aquela resposta produz a remoção do estimulo aversivo), eles
não tôm seu comportamonto modificado por essa experiônda, ou seja, mantém altas latôncias
de fuga por toda a sessão ou deixam do emitir essa resposta. Tal dificuldado do aprendizagem,
om função da oxposição prévia a estímulos aversivos incontroláveis, é o efeito comportamental
denominado “desamparo aprendido" (Maior & Seligman, 1976; Potorson & cols, 1993).
Importanto destacar que, nesses estudos, a aversividade dos choques é definida
oporacionalmonte: ratos não expostos a qualquer tratamento prévio aprondom rapidamente
a omitir uma resposta que os desliguem (fuga) ou evitem (esquiva). Portanto, do ponto de vista
metodológico/conceituai, pode-se assegurar que esses estímulos são roforçadores negativos
poderosos, se componentes de uma contingência de fuga/esquiva, ou meramente estímulos
aversivos intensos, quando incontroláveis.
Segundo Seligman (1975), o arranjo experimental do desamparo aprondido
possibilita mimetizar, no laboratório, condições que atingem o ser humano e quo produzem
neles comportamontos depressivos. No nível comportamental, o desamparo mimetiza
histórias de vida que envolvem grando aversividade, e que, como conseqüência, reduzem a
atuação do sujeito sobre seu meio ambiento (passividade). Essa passividade podo se dar
tanto pola baixa iniciativa comportamental, quo o impede de entrar em contato com
roforçadores disponíveis, como pela redução da função reforçadora dos ostímulos
disponíveis, os quais são normalmente roforçadores para a espécie ou para o próprio
sujeito antes da experiência com a sua incontrolabilidade. Ambos os efeitos levam á queda
de reforçamento para o sujeito, condição característica da depressão. No nívol bioquímico,
são descritas alterações semelhantes às identificadas em pessoas deprimidas aponas
nos animais submetidos aos choques incontroláveis (Peterson & cols., 1993; Willnor, 1984).
Aposar do diforirom bastante quanto ao procedimento utilizado, os três modolos
têm semelhanças funcionais. Em primeiro lugar, todos geram redução de roforçamento
para o sujoito, quer pola redução dos roforçadores disponíveis (separação), quer pela
redução da função roforçadora dos estímulos disponíveis (CMS o dosamparo). Além
disso, esses dois últimos modelos têm em comum dois aspoctos: (1) a manipulação
direta de estímulos aversivos, e (2) a incontrolabilidade desses estímulos. Essa ultima
característica dos estímulos, embora não seja objeto de análise e manipulação no
CMS, não pode ser ignorada ao analisarmos esse modelo: os sucessivos "estímulos
estressantes” não podem ser removidos por qualquer resposta do rato, o que lhes
conforo a classificação de incontroláveis. Em paralelo a essas semelhanças, há também
diferenças importantes entre os modelos do dosamparo e de CMS: eles diferem,
basicamente, quanto à intensidade dos estímulos aversivos manipulados (intonsos no
desamparo, e moderados no CMS) e na sua forma de administração (aguda no
desamparo, e crônica no CMS). Contudo, em ambos, o efeito é de relações funcionais

152 I i’tlil .1 S.inl Ann.i, Nrlcnc Sltínoli.ir.i


equivalentes, ou seja, mudança da função dos estímulos disponíveis ao sujeito:
reforçadores positivos (no CMS) e negativos (no desamparo).
Esses dados de laboratório parecem confirmar que diferentes processos podem
levar à depressão: os efeitos foram obtidos tanto após exposição a estímulos aversivos
agudos como crônicos, intensos ou moderados, como pela subtração de fontes de reforçadores
positivos sociais. Assim, para se compreender a depressão, mais relevante do que as
características individuais das condições de estímulo ó relevante que se analisem as relações
estabelecidas entre o comportamento do sujeito e esses estímulos. Alóm disso, a diversidade
de variáveis dependentes estudadas nesses modolos no laboratório (interação social, ingestão
de substância reforçadora ou remoção de um choque) fortalece a concepção de que o crítico,
no estudo da depressão, não são as similaridades topográficas dos comportamentos em
estudo, mas sim as similaridades funcionais entre eles: em todos esses modelos, a baixa
sensibilidade ao reforçamento (positivo e negativo) é o fator central da análise.
No nosso laboratório, os estudos sobre o modelo de desamparo aprendido, com
ratos, têm permitido a investigação experimental de algumas questões teóricas que
acabam por se relacionar, em algum nível, com questões possivelmente aplicadas à
depressão humana (Hunziker, 2003). Por exemplo, uma questão teórica que nos mobilizou
foi saber se o desamparo aprendido é um efeito comportamental que se dissipa com o
tempo ou permanece após a passagem de um longo período desde a exposição à
incontrolabilidade. A literatura apresenta dados conflitantes a esse respeito, sendo
predominante a noção de que o desamparo se dissipa após cerca de 48h (Maier &
Seligman, 1976; Glazer & Weiss, 1976). Essa suposta transitoriedade do efeito gerou
dúvidas quanto á sua natureza "aprendida” uma vez que, sabidamente, a aprendizagem
não é modificada pela mera passagem de tempo (Levis, 1976). Contudo, como os estudos
que mostraram essa transitoriedade do desamparo eram passíveis de criticas
metodológicas (conforme analisado por Hunziker, 2003), consideramos necessário fazer
esse teste com procedimentos bem controlados experimentalmente. Para isso, foi
analisada a aprendizagem de fuga de ratos adultos jovens (90 dias de idade), que haviam
sido anteriormente expostos a choques incontroláveis com diferentes intervalos entre
tratamento e testo: um grupo recebeu os choques incontroláveis 60 dias antes do teste de
fuga, e outro apenas um dia (24 h) antes do teste. Os animais quo tiveram intervalo de 60
dias receberam o tratamento de incontrolabilidade no período equivalente ao da "primeira
infância" (logo após o desmame, em torno do 30° dia de vida), enquanto os outros foram
tratados já na idade adulta (com 89 dias de vida). Cada um desses grupos de ratos foi
também comparado a outros que, com igual intervalo temporal, foram expostos inicialmente
a choques controláveis, ou apenas colocados na caixa experimental, sem exposição a
choques. Os resultados mostraram igual desamparo pelos animais expostos previamente
aos choques incontroláveis, independentemente se esse tratamento se deu com 1 ou 60
dias de intervalo; os demais sujeitos, expostos aos choques controláveis ou a nenhum
tratamento específico, aprenderam rapidamente a resposta de fuga (Mestre & Hunziker,
1996). Ou seja, com o procedimento utilizado nesse estudo, ficou demonstrado que o
desamparo aprendido não foi alterado pela mera passagem de tempo, o que fortalece a
sua natureza de comportamento aprendido. Além de responder uma questão teórica, os
mesmos resultados também podem ser analisados pelo viés clínico: eles sugerem que
a exposição a eventos aversivos incontroláveis na primeira infância pode ser determinante
do insucesso do indivíduo adulto no enfrentamento de novas situações que envolvam
controle aversivo (depressão na fase adulta em função de experiências na infância?).
Outra questão teórica que consideramos relevante diz respeito á sua prevenção.
Sabe-se que a exposição ao reforçamento negativo (ou seja, experiência do sujeito com
controle sobre estímulos aversivos) evita quo o desamparo se desenvolva posteriormente
("efeito de imunização"). Será que o controle do sujeito sobre reforçadores positivos teria

Sobrr Comporí>imrnto c Cognifdo 153


esse mesmo efeito preventivo contra o desamparo aprendido? Em um dos estudos, animais
que receberam poucos reforços positivos, liberados de forma contínua (40-100 reforços
liberados em CRF), apresentaram o desamparo de forma equivalente a outros animais que
não passaram por esse reforçamonto, ou seja, não apresentaram o efeito de "imunização"
(Mestre & Hunziker, 1996). Contudo, outro estudo demonstrou que o desamparo foi
apresentado de forma menos intensa quando os animais foram proviamonte oxpostos a
reforços positivos liberados em maior quantidade e de forma modoradamente crônica
(cinco sessões com 200 reforços cada), sob contingências de reforçamento continuo (CRF)
ou moderadamente intermitente (FR 2, FR 4 e FR 6). Essa redução do grau de desamparo
foi considerada, pelos autores, como uma “Imunização parcial" produzida pelo reforçamento
positivo (Hunziker & Lima, submetido). Por fim, experiência prolongada com reforçamento
positivo (14 sessões de 200 reforços cada), sob contingências de reforçamento da
variabilidade ou da repotição de seqüências de quatro respostas (que, pela sua
complexidade, acarretavam alto grau de intermitência do reforçamento) produziu imunização
total contra o desamparo aprendido (Hunziker, Manfré & Yamada, no prelo),
Em paralelo às informações teóricas fornecidas por esses estudos, eles podem
sugerir que experiências prolongadas com reforçamento positivo - principalmente aquelas
nas quais o reforço é intercalado com uma grande freqüência de não reforçamento,
condição denominada, no senso comum, como "frustração" podem facilitar que,
futuramente, o indivíduo enfrente situações aversivas incontroláveis sem se deixar abater
por elas. Por outro lado, o indivíduo "mimado" ou "super protegido", que foi poupado da
exposição a situações dificeis de serem solucionadas ou que geravam baixa densidade
de reforçamento, pode, quando exposto futuramente a condições aversivas intensas e
incontroláveis, ser mais propenso a desenvolver um quadro depressivo.
Evidentemente, essas generalizações do laboratório para a clínica são exercícios
de extensão das informações obtidas em um nível experimental, onde se tem um controle
relativamente alto das variáveis envolvidas, para outro, onde a complexidade de contingências
om vigor extrapola qualquer arranjo experimental. Contudo, essa é apenas uma das etapas
da inclusão das informações básicas para o uso aplicado, que precisa sem complementado
com estudos fora do laboratório. Foi assim desde a demonstração básica de Skinner,
obtida com ratos e pombos, de que o comportamento é controlado pelas suas
conseqüências. Nos seus trabalhos iniciais, possivelmonte nem o próprio Skinner deve ter
imaginado o quanto essas demonstrações, aparentemente simplos, poderiam modificar a
forma de se pensar a psicologia e a complexidade do comportamento humano. No entanto,
a evolução da análise do comportamento, nos diversos níveis de atividade humana
(educação, indústria, propaganda, planejamento urbanístico, clínica, entre outros) veio provar
que essa "simplicidade" do laboratório é aparente, e tem uma relação estreita com o
comportamento complexo que se observa fora dele. Análises sofisticadas a respeito do
comportamento complexo sendo fruto de processos simples e cumulativos corroboram a
importância dos estudos de laboratório como uma estratégia indispensável para a ampliação
do conhecimento sobre o comportamento humano (Donahoe & Palmer, 1994). No caso do
estudo experimental da depressão, espera-se que a identificação das diversas condições
ambientais que levam à redução da eficácia dos reforçadores possa ser útil, tanto para o
seu tratamento como para a sua prevenção, ampliando a análise funcional iniciada por
Ferster há mais de três décadas, mas que ainda precisa de estudos adicionais que
aumentem sua abrangência científica e potencial de aplicação.

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Sobre Comportamento c Co^niçAo 155


Capítulo 13
Comportamento Criativo c Análise do
Comportamento I: variabilidade
comportamental
M aria I Iclena Leite I lun/iker
l/SP

A criatividade é uma característica do comportamento humano que pode ocorrer


nos mais diferentes contextos, tanto nas artes como nas guerras, na arquitetura e no
urbanismo, nas vestimentas, nas diferentes formas de solucionar problemas, na
diversidade da linguagem e outras formas de comunicação entre os indivíduos, etc.
Mas, o que é exatamente a criatividade? Ela é uma característica mensurável do
comportamento? Pode ser estudada cientificamente?
É importante destacar que ao falamos de criatividade estamos falando, na verdade,
de comportamento criativo. Embora a definição desse comportamento não seja simples, um
possível consenso parece existir na noção de que o termo criatividade envolve, ao menos, o
requisito de novidade ou difemnça em relação ao que ocorreu anteriormente (Holman, Goetz
& Baer, 1977; Stokes, 1999b; Winston & Baker, 1985). Comecemos pela análise de uma
situação prática que é uma visita a um museu. A grande concentração de pinturas nos pormite
observar diferenças marcantes não apenas entre os quadros dos vários autores como também
entre pinturas de um mesmo artista. Por exemplo, Picasso realizou ao menos duas pinturas
sobre o tema "mãe com filho", em períodos diversos da sua produção. Na primeira tela,
realizada durante a chamada “fase azul e rosa" (1901-1906), ele pintou essas figuras com
formas e cores que se aproximam das reais; na segunda tela, realizada décadas depois, ele
as pintou com linhas distorcidas e cores berrantes, totalmente diferentes das encontradas na
realidade. No senso comum, tais “originalidades" são chamadas de criatividade, sendo seus
autores apontados como indivíduos criativos.
Apesar do requisito da novidade ser um consenso na caracterização da
criatividade, o fato de “ser novo" não basta para caracterizar um comportamento como
"criativo". De uma maneira geral, a criatividade está relacionada a critérios sócio-culturais
quo nem sempre atingem um consenso. Por exemplo, para ser criativo, algumas vezes
exige-se que o comportamento atenda a um objetivo especificado (seja útil), outras que
agregue um valor estético adotado pela cultura, outras ainda quo solucione um problema
(seja funcional), entre outros (Winston & Baker, 1985). Como o objetivo aqui não é tratar
profundamente da definição de criatividade, vamos adotar como requisito mínimo
(embora sabidamente não suficiente) o aspecto aparentemente mais característico
desse conceito, ou seja, ao fato de que ser criativo implica, ao menos, em "ser diferente
de" (sobre a conceituaçào de comportamento criativo, ver Marr, 2003; Skinner, 1953;
1974; Stokes, 2001; Winston & Baker, 1985)
Porém, mesmo com essa simplificação conceituai, novas questões surgem. Qual
é o grau de diferença requerido? Basta ser diferente de alguns comportamentos omitidos

156 Maria l Iria m Leilr I lu n /ikrr


mais recentemente ou precisa ser diferente de qualquer comportamonto já emitido
anteriormente? É necessário diforir totalmente de qualquor comportamento previamente
emitido pelo sujeito (fazer algo que nunca fez antes), ou basta diferir do comportamento
apresentado anteriormente pelo sujeito naquolo ambiente (fazer algo que nunca havia sido
feito naquela condição)? De uma forma mais radical, pode-se considerar que, para ser
criativo, é necessário quo o comportamento difira de qualquor outro apresentado por um
mombro da sua espécie? Por oxomplo, quando o astronauta Arrnstrong pisou na lua pela
primoira vez, esse comportamento diferiu de qualquor outro já apresentado pela espécie
humana. Isso basta para elo ser chamado de criativo? Uma música, nova para alguns mas
conhecida de outros, ó criativa para uns mas não para outros? Tais questões parocom
apontar para um aspecto a sor considerado na análise da criatividade: a característica de
ser novo/original/criativo não ó propriodado do comportamento, mas sim ó uma propriodade
fornecida pelos referentes aos quais elo está sendo comparado, dentro de um universo
particular. Ou soja, a caracterização do comportamento como criativo ó mutanto e relativa, o
que toma a sua análise bastante complexa.
A dlficuldado, encontrada nessa conceituaçào, não ó menor quando são buscadas
as causas do comportamento criativo. O que produz osse comportamento? No senso
comum, criar ó tido como fruto de um “talento" que o indivíduo traz em si e que o distingue
das demais pessoas. Apesar de sermos capazes de rabiscar dosonhos e criar sons,
admitimos que não somos comparáveis (em nlvel de criatividade) a um Picasso ou a um
Chico Buarque. O que os toma diferentes de nós? No geral, diz-se que esses artistas se
distinguem das demais pessoas porque tôm talento; Contudo, essa forma de encarar a
criatividade incorre na conhecida falácia da explicação circular: considera-se que um
indivíduo ó talentoso porque faz coisas criativas, e ao mesmo tempo diz-se que ele faz
coisas criativas porque ó talentoso. Ou seja, esse raciocínio caminha em círculos, sem
avançar na compreensão do que se convencionou chamar de criatividade (Skinnor, 1953).
Sem uma explicação que extrapole essa circularidade, não ó de se estranhar que o
“talento", como explicação causal da criatividade, venha acompanhado de uma boa dose
de "mistério" ou "magia", que, se assumidos, impediriam a sua investigação cientifica.
Contudo, não é essa a perspectiva da análise do comportamento. Ao invés de
dizer que o Chico Buarque faz músicas maravilhosas porque é talentoso, considera-se
mais útil simplesmente admitir que elo é considerado talentoso porque seguidamonte
faz músicas maravilhosas. Dessa forma, o “talento" deixa de ser causa e passa a ser
simplosmente um termo descritivo para um conjunto de comportamontos ditos criativos.
Assim, para compreender porque, ou como, o Chico Buarque faz suas músicas, deve-
se abandonar a noção do "talento" como causa dessa criatividade o passar a investigar
os processos que controlam seus comportamentos.
Por uma questão de parcimônia, esse toxto pressupõe que não há porque
assumir uma natureza diferenciada para o comportamento criativo. A menos que se
prove o contrário, está sendo assumido que, aposar da sua aparência desordenada ou
aleatória, o comportamento criativo é tão organizado e sujeito a leis como qualquer
outro comportamento (Skinner, 1974; Stokes, 1999a; 2001). Assim, em princípio, ele
pode ser estudado cientificamente através da idontificação das condições que alteram
a sua probabilidade de ocorrência.
Essa porspectiva analltico-comportamental também modifica outro aspecto básico
da análise não científica da criatividade: ao contrário do sonso comum, que considera que
os indivíduos sâo criativos, a perspoctiva ciontífica considera que as pessoas tornam-se
criativas ao longo da vida (ou soja, aprondom a agir do forma criativa). Admitir esse ser
implicaria admitir que a criatividade é uma característica que nasce com o indivíduo,
portanto é determinada geneticamente. Essa suposição, além de não ter indícios científicos

Sobre C*ompoi1«imenfo c CoflnivAo 157


comprobatórios, limita o estudo da criatividade ao campo da genética e nos impodo do
atuar diretamente sobre essa característica humana. Por outro lado, a suposição do que
os indivíduos tomam-se criativos baseia*so no pressuposto de que a criatividade ó um
conjunto de comportamentos quo, como todos os demais, podem ser aprendidos através
do processos simplos e cumulativos de interação do organismo (geneticamente
constituído) com o sou moio ambionto (Donahoo & Palmor, 1994). Sob essa perspectiva,
o estudo da criatividado podo se dar através da investigação das condições ambientais
quo tornam mais provável os comportamentos criativos, conhecimento esse que pode
gorar possibilidades do atuação direta sobre eles. Ou seja, a criatividade passa a ser
oncarada como uma característica comportamontal passível de modificação (via história
de roforçamonto), o que equivale a dizer quo ela pode sor investigada cientificamente o
alterada através de um planejamento ambiental.
Não se está nogando, aqui, que a constituição genética do indivíduo interfira na
sua criatividade. Pela lógica, se é o organismo que interage com o moio, e se elo tem
uma constituição genética básica, então o comportamento necossariarnonto sofre
intorferôncia do variáveis genéticas. A investigação dirota do grau de interforôncia dessas
variáveis, a ser dosonvolvida pola engenharia genética, pode acrescentar informações
relovantos para a compreonsão do comportamento criativo. Porém, no atual estágio de
conhecimento cientifico não há informações que permitam apontar que essas variávois
sejam responsáveis por esse comportamento. Conforme se verá mais á frente,
investigações indiretas sobre a influência de variáveis genéticas mostram quo elas
oxistem, mas nâo são as mais críticas. Por outro lado, há muitas demonstrações
experimentais que apontam para a rolovância das contingências ambientais na
determinação de comportamentos que se relacionam à criatividade.
Dada a variedade de características comportamentais que definem a criatividado, o
seu estudo envolve análises separadas dessa diversidado de comportamentos. Um exemplo
desses estudos, são as pesquisas experimentais sobre a variabilidade comportamontal.
Assim como a criatividade, a análise da variabilidado comportamental envolve o requisito do
comportamento sor diferonte de outros, ela requer referentes (que podem sor mutantos) para
que se estabeleça essa comparação, e esses referentes são sempro relativos a um
determinado universo de análíso (para uma análise conceituai da variabilidado
comportamontal, ver Hunziker & Moreno, 2000). Tantas semelhanças sugerem que a análise
funcional do comportamento de variar pode ter implicações diretas para a análise do
comportamento de criar (Neuringer, 2002; 2003; 2004; Stokes, 1999a; 1999b; 2001).
Sabo-so que a variabilidade comportamontal pode ser função de urna enorme
gama de condições, fisiológicas (por exemplo, losões, patologias ou drogas) ou
ambientais. Essas últimas são estudadas em processos comportamentais diversos,
dentro eles o reforçamento operante. Nesse processo, entende-se quo o roforço
seleciona a classo de respostas que o produziu, sendo essa seleção definida pelo
aumento da probabilidade do emissão daquela classe de respostas, e conseqüente
diminuição da probabilidade de omissão do outras (Skinner, 1981). Portanto, sondo
sempro seletivo, o esperado seria que o reforço necessariamente reduzisse a
variabilidade comportamontal. Por analogia, seria também razoável supor que a
doscontinuidade do reforçamento doveria produzir maior variação.
Trabalhos oxporimontais confirmam apenas parcialmonto essas suposições
lógicas. Foi demonstrado que a supressão (total ou parcial) da contingência do
reforçamento é uma das condições favorecedoras de maior variação comportamental.
Em um desses estudos (Antonitis, 1955), ratos foram expostos ao roforçamonto contínuo
(CRF) da rosposta de tocar um painel com o focinho e dopois submetidos à extinção
dossa rosposta. Modindo-se o ponto do painel tocado pelo rato, verificou-se que eles

158 M<iri<i I lelend l.ritr I lu n /ik rr


variavam mais quando estavam submetidos à extinção do quo sob CRF. A roversão
dossas condições mostrou que, indepondentemente da ordem de apresentação, as
respostas oram menos variáveis durante reforçamonto do que durante a extinção.
Relações equivalentes foram obtidas na comparação do CRF com reforçamento
intermitento (Ekorman & Lanson, 1969), confirmando a suposição lógica de que o poder
seletivo do reforço leva à rodução da variabilidade do comportamento.
Contudo, ao contrário do esperado por essa análise, ficou demonstrado quo o
roforço pode tambóm selocionar a variação comportamontal (Abrou-Rodriguos, 2005;
Neuringer, 2002). Nesses estudos, são roforçados diferencialmente os comportamentos
que atingem algum critório de variação, característica essa avaliada sobro alguma
dimonsão especifica da resposta (topografia, força, duração, etc). Um delineamento
oxporimental froqüentomonte utilizado requer, como roquisito mlnirno para reforçamento,
quo sojam emitidas seqüências de d respostas frente a duas barras (ou discos)
localizados á direita (D) e á esquerda (E) do sujeito. A disposição das respostas D ou E,
dontro da seqüência, ê a dimensão comparada. O d que compõo a seqüência deponde,
geralmente , do sujeito exporimental em estudo: o mais freqüente ê o uso de seqüências
do quatro respostas, para ratos (Neuringer & Huntley, 1991; Hunzikor, Saldana &
Neuringer, 1996), o do oito respostas, para pombos (Machado, 1989; 1992:1993; Pago
e Neuringer, 1985). As escolhas do tamanho da seqüência e do número do operanda
disponíveis dolimitam, conseqüentemonte, o universo em estudo: nesses exemplos, a
variabílidado é analisada dentro de univorsos de 16 ou 256 seqüências diferentes entro
si, para ratos ou pombos, respectivamente. Portanto, nesses ostudos a unidade
comportamental ó a seqüência de respostas, a sua variabilidade ô dada na comparação
da distribuição das respostas D e E dentro da seqüência. Por exemplo, a seqüência
EEDD é diferente de EDDD, que, por sua vez, é igual a EDDD.
Com essa caracterização da unidade comportamental, diferentes contingências
de reforçamento podem ser utilizadas para estabelecer o critório de variação para que o
reforço seja liberado após a emissão da seqüência. Uma dessas contingências,
denominada Lag n, só libera o reforço após seqüências que foram diferentes das n
seqüências emitidas anteriormente (Page & Neuringer, 1985). Um exemplo desse
procedimento pode ser visto no estudo de Barba e Hunziker (2002) que submeteram
três ratos à contingência Lag 4: o roforço seguia apenas as seqüências de quatro
respostas de pressão a duas barras (D e E) que diferissem das quatro seqüências
omitidas imediatamente antes. Portanto, nesse estudo o universo de comparação era
composto por 16 seqüências diferentes. Por exemplo, se o animal tivesse apresentado
anteriormente as seqüências DDEE, EEDE, EEEE, EEDD, EEED, e a seqüência seguinte
fosso EEDE, ela não seria reforçada (pois repete uma das quatro anteriores); contudo,
se essa seqüência fosse DDEE ela seria seguida pelo reforço (pois era diferente das
quatro anteriores, sendo igual apenas à quinta seqüência que a antecedeu). Como
controle dos efoitos da intermitência do reforçamento, esse estudo utilizou outros três
outros sujeitos cujas respostas receberam a mesma distribuição de reforços que os
animais submetidos ao Lag 4, sendo esse reforçamento independente da sua variação
comportamental (dolineamento acoplado ou ACO). Esse acoplamento foi feito aos pares,
de forma que cada sujeito Lag 4 fornecia a distribuição de reforços para seu par ACO.
Assim, se o sujeito 1 submetido ao Lag 4 teve reforçadas as seqüências 2, 5, 6, 8 e 15
(em função do elas terem diferido das quatro anteriores), o sujeito 1 ACO teve reforçadas
as seqüências 2, 5, 6, 8 e 15 (independente do elas serem iguais ou diferentes das
quatro anteriores). O mesmo se deu com os demais pares de sujeitos LAG/ACO. Esses
procedimentos foram mantidos por 40 sessões consocutivas, sendo a variabilidade da
seqüência medida por um índice estatístico (índice U) que ocorre dentro de um contínuo

Sobre Comportamento e Cogniv<lo 159


de 0,0 a 1,0: quanto mais esse índice se aproxima de 1,0, tanto maior a variabilidade,
sendo o máximo de repetição indicada pelo Indice 0,0. Os resultados desse estudo,
reproduzidos na Figura 1, indicam que a variabilidade apresentada pelos sujeitos foi
dependente do seu reforçamento diferencial: os três sujeitos Lay apresentaram índices
de U nitidamente mais elevados que os dos sujeitos ACO, com valores em torno de 0,8
e 0,2, respectivamente. Tais resultados pormitom afirmar que o reforçamonto seletivo
das diferenças entre as seqüências foi a variável crítica para a produção da alta
variabilidade comportamental obtida, sondo pequenos os efeitos da intermitência do
roforçamento. Portanto, pode-se dizer que a variabilidado obtida nesse estudo ó operante,
ou seja, ê controlada pelas suas conseqüências.

MMÕeS
Figura 1 Niveis de variabilidade (índices U) apresentados por ratos
submetidos ao reforçamento de seqüôncias de quatro respostas de
pressão a duas barras. No grupo LAG 4 a liberação do reforço foi
contingente à diferença da seqüência em relação às quatro anteriores;
no grupo ACO o reforçamento foi Independente da variação dessas
seqüências. O índice U Indica grau de variabilidade ê tanto maior quanto
mais próximo ele for de 1,0 (adaptado de Barba & Hunziker, 2000)
Outra contingência que vem sendo utilizada em estudos sobre a variabilidade
operante estabelece a probabilidade de liberação do reforço inversamente proporcional
à freqüência da seqüência ("reforço dependente da freqüência" ou RDF). Sob osso
arranjo oxporimental, a probabilidade de reforçamento se torna tanto maior quanto mais
eqüitativa for a omissão de todas as seqüências possíveis (Hunziker & cols., 2002;
Machado, 1992; Donney & Neuringer, 1998). Por exemplo, no estudo de Hunzikor o cols,
estudantes universitários foram alocados fronte à tela de um computador onde aparecia
um triângulo vazio, sendo que a tarefa que lhes cabia era encher esse triângulo com 15
desenhos estilizados da face humana ("carinhas"). Para produzir o aparecimento das
carínhas, o sujeito rocebia instruções solicitando que apertasse as tecias Q eP, formando
seqüôncias de quatro respostas. Após cada seqüência, poderia ocorrer uma dontre
duas conseqüências: (1) um som agudo (3.000 Hz) seguido da adição do uma carinha
dentro do triângulo (reforço positivo), ou (2) um som gravo (500 Hz) seguido do
escurecimento da tela por 2 s, durante o qual nenhuma contingência estava om vigor
(liim m it). A probabilidade de reforço para cada seqüência era de 1/16 (ou seja, freqüência
relativa de omissão não superior a 0,0625). Ao longo da sessão, cada seqüência omitida

16 0 Maria I lelena Lci»c l fun/ikcr


produzia a multiplicação das demais pelo fator 0,99, de forma que estas tinham reduzido
o seu registro de freqüência e, conseqüentemente, aumentadas as suas probabilidades
de reforçamento. Portanto, se freqüência e recência eram inversamente proporcionais á
probabilidade de reforçamento, o sujeito teria maior probabilidade de ter suas respostas
reforçadas quanto mais ele emitisse todas as 16 seqüências possíveis, com um minimo
de repetições sucessivas. Cada triângulo completado encerrava um "jogo", sendo cada
sujeito exposto a 10 jogos sob essa contingência. Os mesmos sujeitos foram submetidos
também a 10 jogos sob o procedimento acoplado (ACO), semelhante ao descrito
anteriormente: a liberação do reforço seguia a mesma ordem de apresentação obtida
sob RDF, sem depender da configuração de seqüência que estava sendo apresentada.
Foi variada a ordem de exposição a essas contingências, do forma que metade dos
sujeitos passou pela ordem RDF-ACO e outra metade pela ordem ACO-RDF (esses
últimos, que começaram pelo procedimento ACO, receberam os reforços na ordem de
apresentação dos reforços obtidos pelos outros sujeitos em RDF). Um intervalo de 3
meses foi dado entre a exposição à primeira e à segunda contingência. Os resultados
obtidos são mostrados na Figura 2. Todos os estudantes tiveram Índices U bastante
elevados sob a contingência RDF, com desempenho muito regular intra-grupo; sob a
contingência ACO, esses índices foram menos elevados, havendo maior diferença de
desempenho entre os sujeitos expostos ao mesmo tratamento experimental. Resultados
equivalentes foram obtidos com outros sujeitos, que passaram por igual procedimento
porém sem o intervalo de 3 meses entre a exposição a ambas as contingências.
Esses dados replicam os obtidos com animais, apesar de que,
comparativamente, os estudantes variaram muito mais na condição ACO que os ratos
(Custo menor da resposta de alternar entre os manipulanda para os estudantes? Reforço
menos efetivo para os estudantes que para os ratos?). Um dado adicional ao dos
animais foi obtido através da análise do comportamento verbal dos estudantes: ao
serem solicitados a descrever o comportamento que produzia o reforço, eles
consideraram que ora preciso variar as seqüências para que o reforço fosse liberado,
independente se expostos à contingência RDF ou ACO. Esses resultados indicaram,
portanto, que o controle operante da variabilidade, estabelecido sobre a emissão das
seqüências, não se estendeu ao comportamento verbal dos sujeitos. Tal dissociação
do resultados sugere que mesmo em situações onde o sujeito não "tem consciência"
do controle pelas conseqüências (ou seja, não é capaz de descrevor corretamente a
relação de conseqüenciação em vigor), elas atuam sobre seu comportamento. Uma
analogia desses resultados pode ser feita em relação à "mágica" que alguns consideram
inerente ao processo criativo: o fato do sujeito não identificar as contingências em vigor
(que levam-no a se comportar daquela maneira) não significa que elas não estão atuando
na seleção do seu comportamento criativo. Essa noção de “mágica" traduz apenas a
Ignorância sobre as contingências que controlam esse comportamento
Embora utilizando critérios diferentes para estabelecer a classe de respostas a
ser reforçada, deve-se atentar para o fato de que em ambos os procedimentos o referente
de comparação é mutante; cada seqüência emitida tem um novo referente que determina
sua adequação/inadequação para o reforço. Como esse referente é produzido pelo
comportamento do sujeito ao longo da sessão, não podem ser especificadas a priori
quais seqüências serão reforçadas. Nesse tipo do contingência, o experimentador
apenas estabelece os critérios exigidos para reforçamento, sendo o sujeito o agente
determinador do referente que vai estabelecer, a cada emissão do soqüência, se ela é
ou não elegível para reforçamento. Portanto, o comportamento atual do sujeito deve
estar sob controle do seu próprio comportamento antecedente, que fornece o referente
para repeti-lo ou não, a depender da contingência em vigor.

Sobrr Comportamento c CoflníçAo 161


RDF ACO ACO RDF

/vy

J o jjo t

Figura 2. índices U apresentados por estudantes universitários submetidos ao


reforçamento de sequèndas de 4 respostas de pressão à teclas Q e P do um
computador; sob o procedimento RDF, era exigida variabilldado da seqüência;
em ACO, o reforço era liberado independente da configuração da seqüência.
Os sujeitos do gráfico à esquerda foram expostos à ordem RDF/ACO, e os da
diroita à ordem ACO/RDF, sempre com Intervalo de 3 moses ontro ambas as
contingências. O grau do variabilidade é tanto maior quanto mais próximo de
1,0 for o valor de U (adaptado de Hunziker & cols., 2002)

Essa característica torna muito relevante que se identifiquem as propriedades


discriminativas da contingência e do próprio comportamento do sujeito. Em estudo recente,
Souza (2006) demonstrou que o comportamento de pombos fica sob controle diferencial
das contingências de reforçamento contingente a variar ou a repetir, mesmo estando essas
contingência apresentadas em um esquema misto, onde não está sinalizado qual o
esquema em vigor. Além de se comportarem de forma diferencial frente ás diferentes
contingências, os pombos foram capazes de “relatar” o esquema sob o qual estavam se
comportando (emitiam respostas especificas em discos, indicando qual o esquema que,
"do ponto de vista do pombo", estava em vigor). Esses dados mostram que, em função de
um arranjo experimental, o pombo se tomou capaz de discriminar o padrão comportamental
que estava sendo reforçado. Tais resultados podem ter implicações para a análise do
comportamento criativo de artistas que, nas etapas mais evoluidas das suas carreiras, tem
o seu comportamento criativo controlado prioritariamente pelos critérios que eles próprios
se impõem. Por exemplo, na análise de Stokes faz sobre as pinturas de Monet, discute-se
que a variação demonstrada nos quadros desse artista sofreu mudanças de controles ao
longo da sua carreira: no inicio, a variação nas pinturas era mais dependente do reforçamento
social; mas posteriormente esse comportamento ficou sob controle dos critérios de
variabilidade/criatividade impostos pelo próprio artista. Seguramente, os resultados desses
critérios auto-impostos eram mantidos por reforçadores sociais, mas o estabelecimento
de referentes pelo próprio artista deve ter facilitado a emissão de novos comportamentos,
favorecendo sua criaçião artística. Nesse sentido, os experimentos de laboratório podem
contribuir mostrando o caminho de evolução para se chegar a essa etapa chamada de
"maturidade artística”: processos simples de seleção se acumulam ao longo da experiência
do sujeito, gerando controles comportamentais gradativamente mais complexos e sutis
que mantém comportamentos que, para o leigo, parecem “emergentes” ou "mágicos”.

162 M aria I Iclcna Lrilc I lun/iker


Outras questões, com implicações diretas ou indiretas para o estudo da
criatividade, podem ser investigadas no laboratório a partir da identificação das condições
ambientais que aumentam ou reduzem a variabilidade comportamental. Por exemplo, os
individuos proferem variar ou repetir? Eles aprendem a discriminar contextos onde cada
um desses comportamentos ó mais adaptativo? Estudos com animais e humanos,
utilizando contingências de escolha, tôm demonstrado que tal "preferência" não existe por
si, mas ó função das contingências om vigor. Portanto, um mosmo indivíduo varia quando
isso ó adaptativo, mas se comporta de forma esteriotipada quando o ambiento assim o
exige (Denney & Neuringer, 1998; Abreu-Rodrigues e cols, 2004; 2005).
Os procedimentos aqui descritos permitem, também, que se confronte no
laboratório a relevância da determinação genética ou ambiental da variabilidado/
criatividade. Há indivíduos geneticamente mais propensos a variar? (em analogia, há
indivíduos mais propensos a criar? Hunziker e cols. (1996) manipularam duas cepas de
ratos geneticamente diferentes, uma denominada "ratos espontaneamente hipertensivos"
(spontaneously hyportensive rats, ou SHR) e outra denominada Wistar Kyoto (WKR). Por
estudos antoriores, sabia-se que, independentemente de qualquer treino, esses animais
diferem comportamontalmente quanto ao grau de atividade motora espontânea; os ratos
SHR são hiperativos, om contraposição aos WYR, que são hipoativos. Nesse estudo, em
condições onde a variabilidade não era exigida, verificou-so quo os ratos SHR variaram
mais que os WYR, quando tinham disponível duas barras e o reforçamento era um simples
FR4. Esse resultado mostra um grau de determinação genética dessa variabilidado.
Contudo, ao se impor uma contingência de variação (Lag 4), todos os sujoitos mostraram
alta variabilidade, sem distinção entre as cepas. Esses resultados sugerem que, apesar
de variáveis genéticas poderem interferir no grau de variabilidade do comportamento, as
contingências ambientais foram as variáveis mais criticas no controle desse
comportamento. Uma analogia com o comportamento criativo nos permite especular
quo, mesmo que existam determinantes genéticos para a criatividade, eles podem não
ser indispensáveis ou suficientes: aparentemente, o crítico é que existam contingências
de reforçamento para o comportamento de criar.
Um aspecto a destacar dentro essos estudos é eles têm sido limitados ao
reforçamento positivo. Será que contingências avorsivas também podem aumentar a
probabilidade de comportamentos variáveis (e criativos)? Nas artes, no esporte, na ciência,
na resolução do problemas, enfim, em todas as atividades onde variar ou repetir podem
ser comportamentos funcionais, podemos identificar que contingências aversivas estão
presentes. Por exemplo, para um piloto de avião, variar os procedimentos de comando da
aeronave, fora dos limites impostos pelos manuais de vôo, pode ter conseqüências
fatais, contudo, em determinadas circunstâncias de vôo, é possível quo um certo grau do
variabilidade seja necessário para que o piloto enfrente situações inusitadas, evitando
acidentes. Esse comportamento discriminativo, de variar ou repetir do acordo com as
circunstâncias, está sendo mantido, ao menos em parte, por reforçamento negativo. Se
contingências aversivas fazem parte do cotidiano, controlando maior ou menor variabilidade
do comportamento, é preciso que a pesquisa básica sobre variabilidade comportamental
englobe o uso dessas contingências. Dada a relevância dessa questão, espera-se que,
num futuro próximo, pesquisas experimentais tragam informações sobre o controle
aversivo da variabilidade comportamental.
Concluindo, pode-se afirmar que estudos experimentais mostram, com animais
e humanos, que a variabilidade comportamental pode ser um comportamento operante
pois: (1) é dependente do reforçamento, (2) fica sob controle de estímulos, e (3) é
modificada pela história de reforçamento. Sendo a variação uma das características básicas
da criatividade, esses estudos fortalecem a suposição de que comportamentos criativos

Sobre Comportamento c CoRniftlo 163


também podem ser sujeitos ao controle pelas conseqüências. Espera-se que, com
esses (e outros) procedimentos experimentais, possamos avançar mais na compreensão
dessa característica tão valorizada, mas ainda tão pouco compreendida, que ó a criatividade.

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Sobrc t'omport.imento c Cogniçüo 165


Capítulo 14
Interações verbais durante o treino de
assertividade: Análise de
Comportamento Verbal
referente a eventos privados
M aria Júlia Ferreira Xavier Ribeiro
Elvira Aparecida Simões de A raújo
Patrícia Rivoli Rossi
Universidade de Taubak4

A rolação psicotorapeuta - cliente se dá, de manoira privilogiada, por moio das


interações verbais. O psicoterapeuta comportamental trabalha o comportamento quo
se vê publicamente. Assim, relatos verbais sobre eventos privados são extremamente
importantes, uma voz quo só tomamos conhecimento deles a partir do comportamonto
do indivíduo de falar sobre si mesmo.
Comportamento assertivo é aquele que envolve a expressão de pensamentos,
sentimentos ou desejos de maneira socialmente adequada (Alberti & Emmons, 1990),
é portanto, relato verbal sobre eventos privados. Desenvolver o repertório assertivo
implica capacidade de desenvolver habilidades sociais rolevantos para a melhoria do
convívio com outros indivíduos.
Portanto, a descrição e a análise funcional de comportamentos verbais
referentes a eventos privados durante o treino de assertividade são oxtrernamonte
necessárias ao entendimonto e à melhoria do ropertório de habilidades sociais.
Evontos privados (Skinnor, 1953/1970, 1963/1969) são estímulos e respostas
que ocorrem sob a pele do indivíduo. Sério (2000) e Tourinho (1999) discutom esse
conceito tratado por Skinnor em vários pontos de sua obra, o lembram que eventos
privados são parte de uma tríplice contingência e não mediações fisiológicas do
comportamento. Sendo assim, as alterações dentro da pele do organismo podem ser:
ostlmulos discriminativos, respostas ou estímulos reforçadores. Acrescentam que
enquanto estímulos e respostas, os eventos privados devem ser vistos corno
constitutivos de relações, e o comportamonto é, olo mesmo, rolação.
Os eventos privados, mesmo não se apresentando para ostudo como a maioria
dos fonõmonos do nosso ambiente, também são da mesma natureza e possuem as
mesmas dimonsões que os demais fenómenos do mundo físico. A psicologia não
precisa do nonhum tipo de conhecimento diferente do científico, nem de métodos
especiais, quor para estudá-los quer para tratá-los (Sério, 2000). "Podemos lidar com
ossos ovontos sem assumir que eles tenham qualquor natureza ospocial ou quo devam
ser conhecidos do uma maneira especial (...) Eventos públicos e privados têm os
mesmos tipos de dimensões físicas" (Skinnor, 1963/1969, p. 228).

166 M.irl.i lúli.i Icrrcira Xavifr Ribeiro, IIvlr.i A|nin*tlil,i SlmtV* ilc Ar.iú|o, P.ilrlií.i Rlvoll Rossl
A ospecificidade dos eventos privados consiste na inacessibilidado à observação
pública, quo pode ser momentânea e circunstancial. Tourinho (1999) discute a expressão
"sob a pele”, que podo sor entendida de diferentes modos, ora significa interno, ora significa
inacessívol à obsorvação pública. Quando privado significa interno, a intenção ó discriminar
em quais circunstâncias os eventos do próprio organismo afetam seu comportamento
subseqüente. Em se tratando de privado como inacessível á obsorvação pública, pretendo-se
destacar um aspecto especial desse tipo de ocorrôncia que ó a impossibilidade de ser
observado diretamonte por outros indivíduos. Portanto, 'interno" não coincide com "inacessível
à observação". Tourinho (1999) ainda conclui afirmando que nem tudo quo ó inacessível a
uma observação pública ó interno; o nem tudo que é interno é inacessível á observação
pública direta.
Os ostlmulos privados podem ser originalmente inacessíveis a uma observação
pública direta, porém, om rolação aos comportamentos privados, a origom nunca ó encoberta.
"Todo comportamento ó inicialmente aprendido em sua forma aborta, e só passa a uma
condição oncoberta quando contingências (sodais) apropriadas produzem isso" (Símonassi,
Tourinho & Silva, 2001, p. 134). Finalmento, o comportamonto encoberto ó circunstancialmonto
oncoberto, pois sua acessibilidado varia om função das contingências sociais.
É importante destacar quo os eventos privados não possuem papol causal em um
episódio comportamental, isto ó, não são causa dos oventos públicos (Sério, 2000). As
respostas encobertas não são causas de respostas abertas, ambas são produtos de variáveis
em comum. Atribuir causalidade aos eventos privados é mentalizar contingências
comportamentais.
Para os propósitos psicoterápicos, os eventos privados possuem duas funções
principais; a investigação e a intorvonção. Tais funções foram detalhadas por Dolitti e Meyor
(1995, p. 271-272) e Martins e Tourinho (2000, p. 42).
Na função de investigação, o comportamento do terapeuta assumo função de
antecedente para o rolato de eventos privados quo fomoça ou refira-se a informações que
auxiliarão a análise funcional, o entendimento da quoixa o da história comportamental. Na
função de intervonção, o comportamento do torapouta visará à modelagem ou a extinção de
doterminados eventos privados, sendo o principal alvo o autoconhecimento do paciente -
instalação e ampliação de ropertório discriminado de análise de contingências atuantes om
sua vida.
Quando o sujoito quo produz o conhecimento é também o objoto do estudo, o
autoconhecimento ocorro (Sério, 2000). O autoconhedmonto ó sompro mediado por outros
indivíduos. Uma pessoa saberá mais de si mesma na medida om quo os intoressos quo o
grupo social tem nela sejam mantidos.
O autoconhocimento é um aspecto relevante do ropertório individual, na modida em
que coopera para que o indivíduo faça análise do contingências, sondo osso um poderoso
instrumonto do controle sobre outros repertórios, dontro esses últimos, os que são da vida
social, como a assertividade.
Para Ribeiro (1990, p. 74), a assertividade é uma classo multidimonsional de
oporantos Esta classe envolvo comportamentos vorbais o não vertais o sua omissão tom a
função de criar, manter ou aumentar roforçamonto, om uma situação sodal. Essa dasse do
rospostas consiste na oxpressão do ponsamentos, sentimentos ou desejos, de uma forma
socialmente acoita, quando tal omissão cria o risco de perda de reforçamento ou punição.
Ao considerar a assertividade uma classo de comportamentos. Ribeiro (1990,
p. 74) estabelece como podo sor analisada funcionalmente:

Sobre Comportamento e Coflniç.lo 167


Condições antecedentes e conseqüentes controlam a ocorrência e a topografia da
resposta, determinando se ela irá gerar ostlmuios roforçadores ou aversivos
Dentro estas condições antecedentes, incluem-se a análise dos estímulos
ambientais e das conseqüências que podem sor esperadas da emissão do
comportamento assertivo, tanto as externas quanto as internas (respeito aos seus
próprios direitos e aos direitos dos outros) Os estímulos conseqüentes à omissão
dos comportamentos assertivos detenninarâo sua probabilidade futura, e podem
tanto ser externos (obtenção das modificações solicitadas ao melo) quanto Internos
(fortalecimento da auto-eatima)
Uma alternativa encontrada para so investigar os eventos privados, deixando
de lado a visão mentalista, ó utilizar o rolato verbal como fonto do informação. Skinner
(1970, p. 163) escreveu sobro as conseqüências de considorar os relatos vorbais do
modo como o behaviorismo o faz:
Continua a lidar com os eventos privados, mesmo que apenas como uma inferência.
Não substitui o relato verbal, do qual se faz a Inferência, polo próprio evento O
relato verbal ó uma resposta ao evento privado e pode ser usado como uma fonte
de informação sobre ele.
Portanto, se o relato verbal ó considerado um comportamonto, logo, há uma
condição do controle, que embora possa ser multideterminada, não pode deixar de
incluir o evento privado. Se for controlado exclusivamente polo terapeuta, o
comportamento de falar sobre o evento privado pode se tornar falar sobre o que o
terapeuta reforça e fugir, portanto, do Comportamento Clinicamonto Relevante salientado
por Kohlenberg e Tsai (2001, pp. 19-26). Tourinho (2001) também contribui ao assunto,
ao destacar que por moio do relato verbal o pesquisador pode ter acesso aos
comportamentos verbais encobertos quando a resolução envolve a análise das
contingências por parte do próprio solucionador e, assim, inferir as variáveis que
controlam a rosposta solução.
Na psicoterapia, o relato verbal ó uma categoria freqüente de comportamento
verbal: muito do processo psicoterápico consiste em falar sobre. Isto ó, o cliente relembra
comportamentos que emitiu e condições que antecederam ou sucederam aos
comportamentos relembrados. Boa parto dos antecodentes ou conseqüentes sobro os
quais se fala constituem comportamentos de outras possoas - deram-se em situação
social. A evocação do relato - os antecedentes - pode ser provocada tanto pelo
comportamento do terapeuta quanto por eventos encobertos do próprio cliente
(Kohlenberg & Tsai, 2001, pp. 89-92).
Portanto, se a assertividade ó uma classe de respostas descrita como expressão
do sentimentos o desejos, então ó entendida como relato verbal de ovento privado.
Então, os eventos privados são antecedentes do comportamento assertivo, e a
competência de discriminar sob que condições o mesmo sorá reforçado também pode
ser condição antecedente: características da audiência e da situação de interação, bem
como as auto-regras referentes á expectativa do desempenho e de suas consoqüôncias
(Ribeiro, 1990, p. 9). Além disto, a possibilidade de prever reforçamonto em novas situações
será dependente da similaridade entre novos contextos e contextos conhecidos.
Entro os ovontos conseqüentes estão as reações da audiência e da própria
pessoa. Aqui, novamento, atuam os eventos privados. Ser valorizado ou respeitado
pelos outros ou sentir-se bom após a omissão do comportamento podem ter a mesma
funcionalidade: aumontar a probabilidade futura de ocorrência da resposta.
A expressão Treinamento Assertivo designa um treino que tom por objetivo o
dosonvolvimento de comportamentos assertivos (Ribeiro, 1990, p. 59). Emprega técnicas

168 lúllci ferrotr.i X.ivlcr Ribeiro, HvImApiirccíd.i Simdcs ilc Ar.iújo, f\itrfclii Rlvoll Rt>s*i
diversas, mas o critério básico para verificar se um determinado tratamento é um
treinamento assertivo é a observação do comportamento alvo: assertividade.
Para Lange e Jakubowski (1977), o treinamento assertivo pode ser definido
como um tipo de treino semi-estruturado, onde a aquisição de habilidades assertivas
ocorre por meio de práticas diretas (por exemplo, exercícios de papel) ou indiretas
(aquisição dada através da observação do modelo).
O treino assertivo ó composto por sessões nas quais são propostas atividades
com o objotivo do favorecer a ocorrência de dotorminados comportamentos,
classificáveis como assertivos, e esses comportamentos constituem-se metas de
aprendizagem. As atividades propostas levam á interação verbal, que pode ser
classificada como referente, ou não, a eventos privados.
O presente trabalho teve por objetivo descrever e analisar, no contoxto do
treinamento assertivo do grupo, interações verbais referentes a eventos privados. Essa
análise levou em conta as categorias de conteúdo, os emissores (facilitadores e
participantes), e a natureza da atividade da sessão.
Os sujeitos deste trabalho foram 6 universitárias ingressantes em curso de
psicologia (participantes), e duas universitárias que freqüentavam a quinta série do mesmo
curso (facilitadoras). O contexto de realização do trabalho foi um Treinamento de Assertividade
proposto como tarefa de ostágio supervisionado, conduzido polas facilitadoras.
Foram analisadas gravações e respectivas transcrições das seqüências de
interação ocorridas em sete de treze sessões de treinamento assertivo. A análise de
apenas sete sessões se deu pelo estado inaudível de seis gravações. Tais gravações
fazem parte do arquivo do Grupo de Pesquisa em Psicologia, na linha de pesquisa
Desenvolvimento de Habilidades Sociais.
As falas dos participantes foram classificadas primeiramente como referentes,
ou não, a eventos privados.
As falas referentes a eventos privados foram classificadas de acordo com o
conteúdo (organizado em categorias verbais). Essas categorias para classificação do
conteúdo foram empregadas por Ribeiro (1990, pp. 104-108). Tais categorias são Inicia
(expressão de opiniões ou informações independentes de solicitação ou sugestão
imediata), Dirige (apresentação de instruções sobre a execução de comportamentos),
Informa (afirmações que expandem tópico anterior, ampliando contribuições de outro
membro), Aceita (afirmação que expressa concordância, satisfação ou prazer com
comportamento do outro), Discorda (afirmação que expressa discordância, irritação ou
desagrado com comportamento do outro), Pergunta (intervenção interrogativa pedindo
informação sobre comportamento, assunto ou procedimento), Responde (afirmação
ligada a pergunta ou instrução feita anteriormente), Corrige (afirmação que indique ao
outro que seu comportamento está incorreto ou inadequado).
Também foram registrados: a) o emissor das falas classificadas como referentes
a eventos privados, b) o emissor da fala que lhe é antecedente e c) o emissor da fala que
lhe é conseqüente. Os emissores foram classificados quanto à sua condição de
participantes (chamados P1 a P6) ou de facilitadores (chamados A e B).
Com tais observações, foi possível verificar freqüências de comportamentos
verbais referentes a eventos privados; a) por emissor, por sessão; b) por categoria de
conteúdo, por sessão; c) categoria do antecedente / categoria do comportamento;
d) categoria do comportamento categoria do conseqüente; e) emissor do antecedente
/ emissor do comportamento; f) emissor do comportamento / emissor do conseqüente;
g) comparadas ao total geral de emissões verbais; h) relacionadas à tarefa da sessão.

Sobre (.‘omportiimenlo c Co^nlçAo 169


As falas dos participantes e dos facilitadores foram classificadas como
referentes ou não a eventos privados. As falas referentes a eventos privados foram
organizadas em sete categorias reciprocas: Inicia, Dirige, Aceita, Discorda, Pergunta,
Responde, Corrige.
A categoria de maior freqüôncia foi Responde, correspondendo a mais da metade
dos relatos referontes aos eventos privados, como mostra a Figura 1.

Figura 1. Relatos de eventos privados por Categorias


Outro dado de análise corresponde aos comportamentos antecedentes e
conseqüentes aos relatos verbais. A Figura 2 mostra a freqüôncia, classificada por omissor
e por sessão, dos comportamentos verbais antecedentes ao relato de eventos privados.

10

Mnj ISL Ulüj


808800 6 808800 7 SOSSftO 8 805800 9
UuU M J
808800 10 808BÍ0 11 SRBftAO 12

Figura 2. Freqüência de comportamentos verbais antecedentes ao relato de Eventos Privados,


apresentados por emissor e por sessão.

A Figura 3 mostra a freqüôncia, classificada por emissor e por sessão, dos


comportamentos verbais conseqüentes ao relato de eventos privados.

170 M .iiia lúliti f erreira Xavier Ribeiro, Mvira Aparecida Simões de Araú)o, Patricia Rivoli Ro*si
tnMjiD
*o«»io 10 IMÜ011 m i t o I?

Figura 3. Freqüência de comportamentos verbais conseqüentes ao relato de Eventos Privados,


apresentados por emissor e por sessão.
Tanto os comportamentos antecedentes quanto os conseqüentes foram emitidos
mais freqüentemonte pelos facilitadores. Esse resultado pode ser decorrente da própria
estrutura do treinamento, uma vez que ó funçáo dos facilitadores no treino de assertividade
criar condições para que o relato ocorra e mediante tal ocorrência, reforçá-la.
Houve um aumento em relação à freqüência de emissão de comportamentos
verbais referentes aos eventos privados pelos participantes no decorrer do treino de
assertividade, tanto a de comportamentos que funcionaram como antecedentes quanto
conseqüentes aos relatos verbais de outros membros (Figura 4).

Set l i o S m tâ o Sm s Ao Sessão So»»4o SeasAo SesaAo

Figutd h - r v tJ id iu a ut> c v o i i i u n i v a u u pui o e s f c a u o i i m iu u s pui pamcipantes

O aumento da freqüência de comportamentos verbais, emitidos pelos


participantes ao longo do treino, que funcionaram como antecedentes ou conseqüentes
aos relatos verbais de eventos privados, sugere melhoria do repertório assertivo, à
medida que os participantes assumiram papel que inicialmente era dos facilitadores.
Portanto, o fato de comportamentos dos membros do grupo antecederem e
conseqüenciarem relatos verbais ê um meio de se aumentar 0 comportamento
clinicamente relevante (Kohlenberg & Tsai, 2001, p. 19-26). Uma vez que os sujeitos
conheceram dentro do grupo as conseqüências de seus comportamentos, a
possibilidade de prever reforçamento em um contexto extragrupo será maior, pois as
contingências serão similares às do contexto do treino (Ribeiro, 1990, p. 9),

Sobre Comportamento c CotfnlçJo 171


Já o aumento em relaçáo à emissão dos relatos verbais de eventos privados
também pode ter sofrido a influência da natureza das atividades. Na sexta sessão, era
proposto, em uma atividade de exercício de papel, que alguns participantes vivenciassem
uma situação desagradável, (por exemplo, uma pessoa inconveniente que sempre senta
perto de você no ônibus e insiste em conversar), e os demais assistissem. Os sujeitos
simulavam a situação da pessoa que falava, da outra quo não quoria conversar, o como
essa última poderia dizer quo não queria conversar de uma maneira assertiva. Ao final da
simulação, os facilitadores questionam a opinião dos participantes a respeito do
comportamento do sujeito que não queria conversar, perguntavam se o comportamento
fora ou não assertivo, Essa pergunta feita pelos facilitadores provoca a resposta dos
sujeitos. Ao respondorom, os sujeitos relatam eventos privados. É fácil identificar que a
maioria dos relatos de eventos privados ocorridos na sexta sessão refere-se à categoria
Responde (Figura 5). Portanto, o comportamento antecedente do facilitador de perguntar
provocou o comportamento conseqüente do sujeito de responder. Sendo assim, nesse
estudo os eventos privados adquiriram a função de intervenção. O comportamento do
terapeuta teve como finalidade a modelação de comportamentos, partindo de episódios
recordados pelos sujeitos, portanto com a participação de eventos encobertos, tendo
como alvo o autoconhecimento do sujeito (Delitti & Meyer, 1995, pp. 271-272).

F ig u ra 5 ■ Relato de Eventos Privados - 6" Sessáo

É possível ampliar algumas considerações quanto á tarefa do facilitador, já


discutidas acima. As categorias dirige e pergunta são prevalentes na emissão dos
facilitadores, tanto como antecedentes quanto como conseqüentes aos relatos verbais
de eventos privados dos participantes e têm freqüência muito baixa de emissão por
participantes. Estas categorias parecem favorecer a ocorrência dos relatos verbais
durante o treinamento e sua ocorrência deve-se à natureza da tarefa, o que, se ignorado,
pode levar a análises equivocadas.
Tais resultados permitem concluir que as interações verbais modificam-se pelo
treinamento assertivo. Essa modificação apresenta relevância clínica, pois sendo a
assertividade uma classe de respostas que abrange a expressão de sentimentos,
pensamento e desejos, é então entendida como comportamento verbal referente a
eventos privados. Portanto, as mudanças ocorridas nas interações verbais são
significativas om relação ao comportamento assertivo, uma vez que os eventos privados
são antecedentes da assertividade (Ribeiro, 1990).
Se o treinamento assertivo visa ao desenvolvimento de comportamentos
assertivos (Ribeiro, 1990, p. 59), tal treino enfatiza a ocorrência de relatos verbais de
eventos privados. Se o critério básico para verificar se um determinado tratamento ó
assertivo é observar o comportamento alvo: assertividade (Ribeiro, 1990, p. 59) e se o

172 M.fr/.i lúliti fenvir.i Xavier Ribeiro, I Ivim Ap.irecúfa Simdes ifi* Araújo, f’.iftfd.i Rivoli Rossf
evento privado pode ser antecedente da assertividade, é preciso que no treinamento
assertivo sejam incluídas situações que aumentem a probabilidado de ocorrência dos
relatos verbais de eventos privados e do reforçamonto destes relatos. Pode ser considerada
meta terapêutica aumentar a freqüência de emissão de relatos verbais de eventos privados.
Dovo-so considorar algumas limitações inorentes à análise ora roalizada. O
fato de se extrair do uma intoração verbal continua recortes reforentos a um tipo do
manifestação - eventos privados, pode sugerir artificialmente maior freqüência de
emissões vorbais do um participante relativamente a outro, que não seria assim
considerada se todo o comportamento verbal nas sossões fosse considerado. A própria
forma original de registro dos dados (gravações de áudio) negligoncia aspectos
rolovantes da interação social, que podem ser os antecedentes ou conseqüentes eficazes
presentes na situação real, como sorrisos, troca de olhares, acenos.
Ainda assim, a análise das interações verbais roferontes a rolatos de eventos
privados mostrou-se relevante ao entendimonto do processo do treinamento assortivo,
e assim pode fornecer elementos para melhoria do treinamonto. Novos estudos devem
considerar a natureza da atividade proposta como condição antecodonto para a emissão
do relato verbal referente a eventos privados o para o fortalecimento de comportarnontos
dos membros do grupo que podem funcionar como conseqüentos para o relato verbal
referente a eventos privados.

Referências

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Oelitti, M.; Meyer, S B. (1995) O uso dos encobertos na prática da terapia comportamental In: B
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Kohlenberg, R J.; Tsai, M (2001) Pslcoterapla analítica funcional: criando ralações terapêuticas
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Lange, A. J & Jakubowski, P (1977) Responsible assertive behavior: cognitive/behavior procedures
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A3. 6, 1081-1096
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Tourlnho, E.Z. (1999) Eventos privados: o que, como e por que estudar. In: R R. Kerbauy & R.C.
Wielenska (Pros.) Sobre Comportamento e Coonlcáo: Psicologia Comoortamantal a Coonillva;
da reflexão teòrlca à diversidade da aolicacâo (pp 13-25) Santo André: ESETec

Sobre (.'omporl.imcnlo e Coni»iv«lo 173


Capítulo 15
A compreensão do paciente sobre a
expectativa da terapia : relações
com a construção do contrato
terapêutico
Maria.Júlia Ferreira Xavier Ribeiro
Universidade de Taubaté

Tenho certeza que vindo à terapia você me ajudará a lidar melhor com meu filho,
que ostó tão nervoso (Mulher de 32 anos. separando-se do marido e com dois
filhos o “nervoso", de 3 anos, e um bebê de dois mesos, que fica aos cuidados de
uma babá permanentemente.)
Nào acho que (a terapia) resolva, mas o que eu gostaria è que parasse esse
aperto que sinto todo o tempo, e as crises de choro. (Mulher de 33 anos, que
procura terapia, vem à primeira sessão, desmarca a próxima e remarca)
Espero me sentir melhor. Vivo com esse mal-estar hà tantos anos, que tudo que eu
queria era poder sentar-me para Jantar com outras pessoas e não ficar sentindo
que tudo que se fala ó indireta para mim (Homem, 38 anos, diagnosticado pela
famiiia desde os 18 anos como depressivo.)
A pessoa que busca por terapia está sempro rospondondo à presença de
condições avorsivas. Ela detecta que algo está errado, está ruim, e busca no repertório
do terapeuta o "alivio para seus problemas". Portanto, a primeira expectativa sobro
possíveis ganhos terapêuticos está sempre ligada a uma contingência de reforçamento
negativo: esta terapia e este terapeuta podem diminuir ou fazer cessar a aversividade
prosonto om meu cotidiano.
Nesse sentido, queixa e expectativas são apresentadas como uma
continuidade, que deve ser considerada com vistas à investigação torapêutica
subseqüente (César, 2001).
O seguinte excerto de uma primeira sessão torapêutica ilustra este ponto:
Meu marido e eu vivemos em briuas desde auo casamos. Ê verdade, há as
criancas. aue são o lado bom do casamento. Mas iá pensei muito. iá chorei, tá
nedi. iá briguei. Ele nào muda. Vivemos de modo bem independente Quando
vamos sair, cada um vai no seu carro. Assim, p o s s o ficar quanto eu ouiser. passar
onde eu ouiser. Quando bnoamos. falamos em seoarar. Deoois eu üonso: primeiro
qiqqsq ma oroanuar. ü m com minha Lâüauà malhar. Qãnhar malhar, ora entâo
ancarar a vida de mulher seoarada Mas minha cabeca nem semore à boa. Por
i&to aue Ytm aqui.
Que contingências está a Cliente doscrevendo?
Nesto caso, a situação pode sor interpretada da seguinto forma:

174 Miiriii lúliii I crrcir«! X.ivifr Ribeiro


Convivência com o marido ó produtora do aversividade, o a separação ó o
comportamento quo faria cossar ou reduzir a avorsividado (fuga/esquiva), o sou comportamento
seria nogativamente reforçado. Entrotanto, antecipa conseqüências aversivas na "vida de
mulher soparada", cuja redução seria possível "ficando com a cabeça melhor”.
Nesta linha de análise, o processo torapôutico seria o instrumento que faria
"sua cabeça melhorar", ostabolocendo em sou reportório comportamontal os
desempenhos que evitariam a aversividade ulterior e permitiriam a emissão do
comportamonto de separar-se que, este sim, oliminaria a aversividade prosonte.

Condição avorsiva Desempenho que põe fim, reduz Fuga ou esquiva


ou evita estimulação aversiva

Comportamento do marido Separação Estar separada

Estar separada Preparar-se para a separação

Neste momento, o T se perguntará: estará a C descrevondo as contingências


que de fato estão presentes em sua relação conjugal e familiar? Supondo-se que a
resposta à pergunta seja não, que contingências estão controlando este relato verbal?
É possível pensarem diversas possibilidados (Beckert, 2001), que demandariam
exploração.
Pensemos no trecho abaixo:
Vivemos de modo bem independente. Quando vamos sair, cada um vai no seu
carro Assim, posso ficar quanto eu quiser, passar onde eu quiser.
Há, no relato, referência a uma tentativa de redução de aversividade, ovitando o
contato freqüente característico das relações conjugais. Mas há também reforçadores
positivos (ficar quanto eu quiser, passar onde eu quiser). Como esta forma de controle
do ambiente afeta o repertório do marido? Ele também estará sondo roforçado o, por
isto, cooperando para o distanciamento entro ambos? Que outras formas "paliativas"
estarão sendo emitidas?
Mas já pensei muito, lá chorei, já pedi, fá briguei Ele não muda.
Neste trecho, há a idéia de que a molhoria do relacionamento dependoría de
mudanças do repertório do marido. Ela poderia ganhar controle sobre o comportamento
dole?
Primeiro preciso me organizar, ficar com minha cabeça melhor, ganhar melhor,
pra então encarar a vida de mulher soparada.
Ficar desorganizada', com a cabeça ruim', não seriam do fato comportamentos
de esquiva à separação, ao invés de classe de resposta independente da relação
conjugal?
Com estas possibilidades, o T provavelmente passará a investigar:
- Como o marido roage á cvitação do convivência? Ele intensifica a emissão do
comportamentos aversivos para a C? Quo características têm tais comportamentos?
Elo reduz a emissão do aversivos? Emite comportamentos que reforçam positivamente?
- Quais os reforçadores positivos presentes na vida da C? Onde ela passa?
Com quem?

Sobre Comportamento c CoflniçJo 175


- Qual a topografia dos comportamentos da C que pedem mudança do marido?
Não sorão aversivos para ele?
- Que dificuldades a C relata em sua vida cotidiana, relacionadas ao quo ola
denomina "cabeça ruim"? Isto poderia esclarecer até quo ponto este ó um fator limitante,
cuja solução facultaria a separação?
Resumindo:
Pode-so ontondor, apressadamente, que a expectativa ó melhorar para separar-se.
Entretanto, cabe a dúvida: não seria preciso melhorar para podor convivor?
Deste m odo, a queixa Inicial ó sem pre reform u lad a, por força das
discriminações do T e das Intervenções verbais feitas por ele.
Gosto do sua voz macia
e do sorriso que dança em seus olhos
Gosto de suas palavras tranqüilas

e desse anjo temo que te habita


Voltemos à relação entre expectativas o as formas de construção do contrato
terapôutico.
Ao explicitar que a forma de ajuda que posso prestar requer a presença do cliente
nos locais, horários e tempo pré-estabelecidos, estou dizendo ao cliente que espero sua
colaboração ativa. Em outros termos, espero quo se comporte, de modo que possa
observá-lo, reagir a seu comportamento e alterá-to, bem como ser alterada por elo.
Digo a ole que não espere ajuda da terapia sem se relacionar comigo, das
maneiras como ó capaz, porém resguardados os limites terapêuticos. Assim, surge
para o cliente a regra: preciso analisar meu comportamento e fornocor elementos de
análise. Esta regra faz com que falar de si próprio tenha alta probabilidade de ocorrência.
Além disto, não falo de mim, mas sou ouvinte atenta (Skinner, 1953/1970, 1989/
1991) e as formas como meus comportamentos verbais e não verbais provêm
conseqüências para o falar do si próprio fortalecem ainda mais tal repertório.
Solidão Agonia.
E a sua alma em algum ponto
tocando a minha.
Assim, o exame destas condições inicialmonte propostas pela queixa constitui
fator altamento relevante no estabelecimento da Aliança Terapêutica.
Esto conceito, proposto por Zetzel (1956) no âmbito da psicotcrapia psicanalltica,
podo ser aqui retomado como uma classe de respostas que inclui comportamentos de
variadas topografias, mas cuja funcionalidade se caracteriza por orientar-se a um exame
das contingências controladoras dos comportamentos do paciente, realizada sob
condições redutoras de aversividade, mobilizando o repertório vorbal do terapeuta, que
doscrove as contingências observadas e, freqüentemente, retoma o reconstrói
comportamentos verbais do paciente.
O estabelecimento da aliança terapêutica ó dependente de muitos fatores,
incluindo a oxperiôncia anterior do terapeuta. Entretanto, implica deixar-se controlar o
simultaneamente reconhecer as fontes de controle emanadas do comportamonto do
paciente (Delitti, 2005). Para modificar o repertório do paciente, preciso prover

176 M.iri .1 lúll.i f mclr.i Xuvler Ribeiro


conseqüências por meio de meu próprio repertório. Para que o meu comportamento
seja de fato conseqüência do dele, tenho que permitir que ele me controle, dentro das
regras contratadas.
Por isto, durante as sessões, as regras do contrato sào experimentadas como
contingências. O comportamento governado por regras é submetido também ao controle
por contingência.
Estabelecida a aliança terapêutica, sobrevem um período de Intensa
roformulação nas oxpoctativas do paciente.
O paciente torna-se progressivamente mais apto a realizar análises funcionais
(do seu comportamento e do dos outros), como resultado das análises efetuadas pelo
terapeuta e pelas instruções de auto-observação dadas ao paciente (Beckert, 2002).
Esta partilha de nosso principal instrumento * a análise funcional - provoca importantes
mudanças na forma do paciente ver o mundo:
a) Muitos pacientes têm inicialmente uma visão parcial da questão do controle.
Imaginam-se vitimas passivas do controle ambiental, ou, alternativamente, poderosos
controladores e culpados pelas inadequações do mundo. A análise funcional favorece
discriminações mais adequadas das formas de controle existentes e possíveis e, assim,
favorece que se sinta integrado ao ambiente, nem vitima, nem agressor.
b) Desenvolve-se a atenção a pequenas unidades comportamentais. O paciente espera
inicialmente grandes melhoras, grandes mudanças. Entretanto, aprende que o processo
de modelagem requer atenção a mudanças sutis do comportamonto.
c) Desenvolve-se a atenção a relações entre respostas aparentemente dispares, mas
que se incluem nas mesmas classes de resposta (diferentes topografias, mesmo
controle funcional). Assim, reconhece progresso quando observa aumento de freqüência
em condutas que são funcionalmente relacionadas.
d) Desenvolve-se a atenção às ações, ao comportamento público. Nossa comunidade
social prioriza como "EU" os eventos privados e, muito especialmente, os sentimentos
e as emoções. Assim, boa parte da terapia ó consumida com relatos de sentimentos e
boa parte das expectativas do pacionte é relacionada a mudanças pretendidas em
sentimentos e emoções Já o terapeuta reage ao comportamento aberto: provê para ele
conseqüências por meio de seu comportamento verbal e não verbal. Revoluciona-se a
regra do paciente, de que sentimentos e emoções são causas do comportamento. O
paciente passa a incorporar o comportamento aberto como elemento de sua auto-
análise. Pode então esperar mudanças nas suas ações sem precisar antes mudar
seus sentimentos.
Nesta fase, fica mais clara a congruência entre os objetivos do terapeuta e as
expectativas do paciente (Santos & Abreu-Rodrigues, 2002), pois este vai aprendendo
habilidades que inicialmente eram especificas do terapeuta.
E se hoje eu estendo a minha mão
foi porque a sua me tocou.
E se o sangue pulsa em minhas veias
foi porque você se importou.
Com o progressivo domínio da análise funcional, o paciente atinge a etapa final
da terapia. Nesta fase, faz análises muitas vezes, mais pertinentes que as do terapeuta.
Fica cada vez mais clara a expectativa de autonomia, de ser reconhecido pelo terapeuta
como capaz de analisar-se sozinho. É a hora da alta,

Sobre Comportamento e Cofiniçdo 177


Retomando e concluindo:
O contrato terapêutico refere-se à explicitação verbal, realizada pelo terapeuta,
de um conjunto de contingências pelas quais a relação será controlada: local, horário,
periodicidade e duração das sessões, interrupções programadas e pagamentos.
Entretanto, muito mais do que "contingências contratadas" vigorarão durante o
procosso psicoterápico. A queixa (ora expectativa, ora diagnóstico) regulará o
comportamento da dlade paciente-terapeuta. Será manejada ao longo do processo
(Silveira e Kerbauy, 2000). Inicialmento irá interagir com o contrato, no ostabolecimonto
e manutenção do que se convencionou chamar "aliança terapêutica", o tipo muito especial
de relação humana que se dá quando uma relação de trabalho, com papéis bem
definidos, se firma entre paciente e psicoterapeuta. Irá reverter o "relacionamento real"
típico do inicio da terapia, quando informações especificas sobre a pessoa do terapeuta
são eventos controladores preponderantes. Será progressivamente retomada, durante
a fase intermediária em que Terapeuta e Cliente são controlados pela aliança terapêutica.
Mudará novamente quando, ao final do processo, os ganhos terapêuticos se fundirem
ao cotidiano do cliente, revertendo novamente a relação à real.
Analisei aqui a evolução das expectativas ao longo de um processo psicoterápico
que evolui para a alta. Caberia analisar outras possibilidades, inclusive aquelas que
envolvem interrupção prematura da psicoterapia.
Concluo minha exposição citando um trecho bem conhecido.
A afirmação de abertura do Skinner em Verbal Behavior é “Os homens agem
sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez são modificados por ele". No processo
terapêutico, T e C são organismo e são ambiente, são simultaneamente Homem e
Mundo. Assim, o processo terapêutico os modifica. O longo processo de transformação
por que passam as expectativas do cliente não ó a emergência de anseios e
possibilidades ocultas do paciente, mas sim construção partilhada pela dlade,
construção que modificou a ambos.

Nota
Atendi durante 3 anos uma mulher, que ao me procurar, queixava-se de que não sentia
proximidade afetiva. Apresentava episódios depressivos freqüentes. Ao longo do
processo, esperou ter mais amigos, esperou encontrar um parceiro mais caloroso,
esperou mudar seus irmãos e a relação com a família. Ocorreram vicissitudes, de
ordem material, o ela esperou resolvê-las. Vivenciou a doença e a morte de uma irmã,
e esperou superá-la. Junto com ela, eu também esperei. Esperei principalmente que
ela discriminasse os elementos de seu repertório que favorecessem relacionamentos
calorosos.
A interrupção do processo se deu por motivos financeiros, em um momento em que seu
repertório de intimidade se consolidava.
Aproximadamente um ano depois, recebi dela a poesia cujos fragmentos ilustram este
texto, que ela denominou A uma amiga.

178 Mari.i lúli.i f crreir.i Xavier Ribeiio


Referências
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para o terapeuta.. In: H. J. Gullhardi, M. B. B. P. Madl, P. P. Queiroz & M. C. Scoz (Org.), Sobre
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Beckert, M. (2002). Correspondência: Quando o objetivo terapêutico é o digo o que faço e faço o quo
digo. In: In: H. J. Gullhardi, M. B. B. P. Madi, P. P. Queiroz & M. C. Scoz (Org.), S o b ra
comportamento e coanicflo: contribuicõaa para a construção da taoria do comportamento
(pp. 183-194). S.P.: ESETec. v. 10. c. 19.
Cesar, G. (2001). Da queixa espontânea à descrição de contingências de reforçamento. In: H. J.
Gullhardi, M, B. B. P. Madl, P. P. Queiroz & M. C. Scoz (Org.), Sobre comportamento h
cognlcflo: expondo a variabilidade (pp. 35-48). S.P.: ESETec.
Delittl, M. (2005) A relaçôo terapêutica na terapia comportarnenta). )n: H. J. Gullhardi & N. C Aguirre
(Org.), Sobre comportamento e coanicâo: expondo a variabilidade (pp. 360*369). S.P.: ESETec.
v. 15.
Santos, C.V.; Abreu-Rodrlgues, J. (2002). Valores do terapeuta e do cliente no estabelecimento de
objetivos: uma análise funcional baseada no conceito de metacontlngôncia. In; H. J. Guilhardl,
M. B. B. P. Madl, P. P. Queiroz & M C. Scoz (Org ), Sobre comportamento e cognição:
contribuições para a construção da teoria do comportamento (pp. 83-87). S.P.: ESETec. v. 9.
c. 8.
Silveira, J.M. & Kerbauy, R.R A interação terapeuta-cliente: uma investigação com base na queixa
clínica. In; R. R. Kerbauy, (Org.) Sobre comportamento e cognição: conceitos, pesquisa e
aplicação, a ônfase no ensinar, na emoção e no questionamento clinico (pp.213-221). S.P.:
ESETec. v.5. c.25.
Skinner, B.F. M9911 Questões recentes na análise comoortamental. Campinas: Papirus.
Sklnner, B.F. (1970) Ciência e comportamento humano 2. ed. Brasília: Editora Universidade de
Brasília.
Zetzel, E. R. (1956). Current concepts of transference. Int. J. PsvchoanaL 37, 369-376.

Nobre (.'omportamrnto r C'o#r>iç<lo 179


Capítulo 16
Variáveis significativas ao
comportamento pró-ambiental
M aria Julia Ferreira Xavier Ribeiro
A n a Carla Barreto de Oliveira
A n a Bealri/ Qarcia Costa Rodrigues
Universidade de Taubuté

Em A Solução Ambiental, Skinner (1969/1980) obsorva que o mundo tem se


modificado muito mais rapidamente que o homem, ao ponto de certas características
do corpo humano, benéficas e necessárias à sua sobrevivência, serem atualmente
fonte de problemas.
Em particular, Skinner (1969/1980, p. 211) discute uma característica que se
mantém: "a extensão em quo o comportamento humano ó fortalecido por conseqüências
reforçadoras”. Essa característica faz com que ele gaste recursos naturais finitos, e o
faça de modo não sustentável, contribuindo com a degradação do meio ambiente.
É o que ocorre quando se usa água além do estritamente necessário para higiene
e subsistência, porque o contato com a água tem, em muitas circunstâncias, propriedades
reforçadoras. Entretanto, é diferente o indivíduo consumir água para beber e utilizar água
tratada para lavar calçadas e ruas. Além do, no segundo caso, não haver relação direta com
a sobrevivência do organismo, o volume de água despendido é muito maior.
Se essa característica - a de ser o comportamento fortalecido pelas
conseqüências - em algumas condições se torna um problema, três tipos de soluções
são tradicionalmente empregados para enfrentá-lo. Na primeira, chamada por Skinner
(1969/1980) de sibarítica, o homem busca soluções no sentido de maximizar o reforço,
e evita ou desconsidera as suas conseqüências desastrosas. No tocante à água, a
solução sibarítica pode ser exemplificada pela máxima utilização desse recurso, sem
preocupação com sua finitude ou ainda quando são construídos reservatórios para uso
de alguns, sem preocupação com o impacto causado sobre outros indivíduos, outros
grupos populacionais, outras espécies ou à renovação do recurso,
A segunda solução tradicional é classificada como puritana. Nela, o reforço é
contrabalançado pela punição, e a expectativa de quem defende sua aplicação é que o
poder dos eventos aversivos para desencadear a supressão do comportamento seja
maior que o poder dos reforçadoras para mantê-lo. Quando um comportamento implica
consumo de recursos naturais em demasia, controles sociais podem ser utilizados,
classificando o comportamento como mau, ilegal ou imoral, conferindo conseqüências
avorslvas, eventualmente ministradas pelo próprio indivíduo
A terceira solução tradicional para alterar a extensão em que o corpo humano é
sensível às conseqüências reforçadoras é, segundo Skinner (1969/1980), "atualizar o
corpo", como ocorre quando da ingestão de substâncias químicas para a inibição do
apetite, ou, no caso extremo, pela seleção genética.
A alternativa para as soluções tradicionais apontadas deriva-se, propôs Skinner
(1969/1980), da Análise Experimental do Comportamento. Uma forma de resolver os

180 Maria lulia f . Xavier Ribeiro, Ana Carla H. iie Oliveira, Ana Realri/ C/. Cosia Rodrigues
problemas suscitados pela alta sensibilidade do ser humano a determinados
reforçadores pode ser a sua indisponibilidade, como ocorre quando alguém se afasta
do uma mesa de comida para não comer em demasia. Outro modo ainda ó tornar o
reforçador tão disponível que ocorra saciação, como se dá em uma fábrica de chocolates
que pormite aos funcionários comerem quanto chocolate desejarem, e isso reduz a
ingestão de chocolate. Mas nem todos os casos permitem ossos arranjos ambientais,
pela remoção física dos reforçadores ou pela saciação. Muitos reforçadores são úteis
ou até indispensáveis á vida humana, outros não são disponíveis de modo a gerar
saciação em todos os organismos para os quais tôm poder reforçador.
Deve-se então agir para modorar seus efeitos. Em suma, pode-se "lidar com
os problemas gerados por um reforçador poderoso simplesmente trocando as
contingências de reforço” (Skinner, 1969/1980, p. 215). Para isso, é necessário que se
conheça as variáveis das quais o comportamento, neste caso, comportamento pró-
ambiontal, ó função.
A rápida modificação do mundo a que se referiu Skinner (1969/1980) ó muitas
vezes, conseqüência da própria atuação do homem. Como afirmam Lehman e Gellor
(2004), se o comportamento humano ó o problema, a Análise do Comportamento pode
oferecer soluções tecnológicas que façam diferença.

Comportamentos pró-ambientais
Comportamonto pró-ambiontal foi definido (Corral-Verdugo & Pinheiro, 1999) como
cuidado e proteção ao meio ambionte, ou seja, comportamentos considerados responsáveis
para a conservação dos recursos naturais e para a manutenção da vida humana. No estudo
do Comportamento Pró-ambiental o principal interesse ó "descobrir quais características
pessoais e quais condições estão associadas a um indivíduo que se mostra responsável
em relação ao meio ambionte" (Corral-Vordugo & Pinheiro, 1999, p. 8). Exige conhecer
variáveis significativas que levom o indivíduo a adotar comportamento pró-ambiental.
Rodrigues (2006) questiona esse modo de definir comportamento pró-
arnb/enfal, que assume como critério o fato de este comportamento gerar conseqüências
relacionadas à preservação ambiental, independente de ser a preservação integrante
das contingências que mantém o comportamento. A autora posquisou os
comportamentos pró-ambientais em um Projeto do Triagem do Lixo. No Projoto, homens
e mulheres desenvolviam atividades durante oito horas por dia, seis dias por somana,
separando resíduos sólidos em categorias para posterior comercialização. Esse
comportamonto contribui, é claro, para a preservação do Meio Ambiento, á medida que
oportuniza reaproveitamento de recursos naturais.
Rodrigues (2006) verificou, entretanto, quo os comportamentos de triar resíduos
sólidos emitidos pelos indivíduos que participavam do projeto eram mantidos pelas
rofeições, salários o cestas básicas fornecidas por esse projeto aos participantes, como
ocorre em qualquor organização de trabalho. Não eram ligados à conservação ambiontal.
Dessa forma sugere-se um segundo critério, mais restritivo que o anterior, no
qual para quo um comportamento seja categorizado como pró-ambiental, além de ter
conseqüências favoráveis à conservação do ambionte, ele deve ser mantido por essas
mesmas conseqüências (Rodrigues, p. 83).
Se, do ponto do vista da análise funcional, essa distinção faz diferença, do
ponto de vista da proteção e conservação ambiental considera-se relevante que
comportamentos que levem à preservação ambiental tenham sua freqüôncia aumentada,
ainda que por conseqüências arbitrárias, e que aqueles que sejam danosos ao ambiente

Sobrr Comportdrncntu t C ordIvAo 181


tenham sua freqüência diminuída, pois se entonde que disso dependem os
ecossistomas o a biodiversidade.
Skinner (1987) apresenta uma dificuldade relacionada à instalação o
manutenção do comportamento pró-ambiental e à conservação do Moio Ambiente, ao
argumontar quo estes comportamentos objetivam um futuro que ainda não existo o do
qual só se tom um conhecimonto presumívol o quo podo ostar alóm da oxistôncia do
indivíduo que se comporta. Alóm disso, o autor ressalta quo só haveria uma mudança
ofetiva de comportamento se as instituições governamentais, religiosas e os regimes
econômicos mantivessom seus osforços voltados para o futuro da espécie humana.
Assim, quando um corto tipo do comportamento pusesse em perigo a
sobrevivência da ospócio, tais instituições declarariam osso comportamento ilegal,
pecaminoso ou oneroso, modificando-lho as contingências, e conseqüentomonto os
repertórios comportamontais. Contudo o que se presencia, salionta ainda Skinner (1987),
ó que tais instituiçõos estão voltadas apenas para a sua própria sobrovivôncia.
Lehman o Gellor (2004) reviram as contribuiçõos dos cientistas comportamontais
para a promoção do comportamento pró-ambiental. Nesta revisão, observam que o
florescimento da área na década de 1970, embora avaliada como promissora, não
continuou nas décadas posterioros com a mesma intensidade, deixando uma lacuna a
sor proenchida. A pesquisa sobre comportamento pró-ambiental dou lugar à pesquisa
sobro atitude e características demográficas de pessoas onvolvidas com comportamentos
ambientalmente relevantes.
Dificuldades de ordem metodológica podem explicar a mudança do foco na
pesquisa. Alguns comportamentos permitem monsuração. Outros são desafios à
observação e, conseqüentemente, à intervenção. Por outro lado. auto-rolatos são fáceis
de obter e muito freqüontos na pesquisa de atitudes.
Por exemplo, o consumo de energia elétrica residencial podo sor apurado pelo
medidor de watt-hora, mas a utilidade deste dispositivo para registro de comportamento
pró-ambiental decresce quanto mais pessoas utilizarem energia elétrica modida por um
mesmo aparelho. Assim, programas que envolvem algumas pessoas quo geram registros
de comportamento quo se misturam aos registros do comportamentos de outras, sobro as
quais os procedimentos do posquisa não incidem, apresentam restrições metodológicas
importantes, comprometendo as conclusões e conseqüentemente as intervenções.
A pesquisa de Olivoira (2006), quo teve como foco a diminuição do consumo
residoncial do água, contornou ossa dificuldado pola padronização do número de moradoras
por rosidôncia, e assumindo como critério o consumo mensal registrado no hidrômetro,
comparado ao consumo ideal proposto pola companhia distribuidora de água.
Comportamentos mais freqüentemente estudados como pró-ambientais
(Lehman & Gellor, 2004) são voltados para reciclagem do resíduos, diminuição do
consumo do água, de energia elétrica e do combustíveis o o chamado "consumo verde",
que é o consumo de produtos com menor dano ao ambiente.
De um lado, os estudos fornocem conhecimentos relevantes à proteção
ambiental. De outro, campanhas, governamentais ou do agôncias não governamentais,
apoiam à promoção do comportamento pró-ambiontal. Essas campanhas protondom
aumentar a freqüência de emissão dosses comportamentos por meio da adosão ao
quo se convencionou chamar Novo Paradigma Ambiental (Bechtel, 2000, p.3).
O Novo Paradigma Ambiental representa a idéia do quo os humanos são parto
da natureza, e estão em recíproca intoração com ela, sofrendo influência e
simultaneamonto influenciando. Humanos não estão acima da natureza e os recursos
no ambiente são limitados.

182 M.irlii lull.i I. Xavier Ribeiro, Ana t'arla U ile Oliveira, Ana Heatrl; (./. Costa Rodrigues
Uma posquisa divulgada em maio do 2006 polo Ministério do Moio Ambionto
(Brasil, 2006) rovolou que ó crescente o número de brasileiros que considoram que
problemas ambientais merecem preocupação. De acordo com essa pesquisa, a
“consciência ambiental" no Brasil cresceu no período entre 1992 e 2006, e essa conclusão
ó basoada om dois resultados encontrados. Primeiro, houve um decréscimo considerável
no número do pessoas que negam a existência de problemas ambientais no seu pais,
cidado, bairro ou rua. Um outro dado om que se baseia ossa conclusão é que o número
do pessoas que roconhocem e citam problomas ambiontais cresceu considoravelmonto.
Porém, osses problomas apontados não são roforidos como ambientais.
Apesar de o desemprego ser apontado como o principal problema do pais,
mais de 60% da amostra acredita que não vale a pena conviver com mais poluição,
mesmo que soja para gorar mais emprego, e que o conforto trazido polo progresso não
é justificativa para a devastação da natureza.
Quando se porgunta sobro quais são os problemas do bairro, entro os dez
maiores problomas, quatro são ambiontais. E dos quatro, três se rolacionam à água: a
falta de rede de esgoto e de saneamento básico, a falta de água e de tratamento de
água, as enchentes, ruas alagadas e inundações. Obsorva-se, então, o roconhocimonto
da relevância da água como elemento ambiental.
Mas o que se está disposto a fazer para ajudar? Ou perguntando de outra
maneira, há disposição para comportar-se de maneira pró-ambiental? Enquanto 65%
das pessoas diz estar dispostas a reduzir o desperdício no consumo de água, o número
roduz-se para 17% quando se trata de participar de um domingo por mês de um mutirão
de limpeza de rios e córregos e cai mais ainda - para 7% - quando a proposta seria
pagar um imposto a ser usado para despoluir rios e córregos.
Isto significa que, embora o resultado final das três propostas implique melhoria
para os recursos hídricos, há muita disposição quando o comportamento pró-ambiental
traz uma vantagem mais próxima ao indivíduo, ou seja, quando a contingência é de curto
prazo. Reduzir o despordício de água, que diminui o custo da conta, tem muito mais aceitação
do que dispor de horas de lazer para melhorar as condições de um curso d'água ou, pior
ainda, de dinheiro extra além do que se gasta para ter a vantagem do consumo.
Baum (1999) destaca o conflito ontre conseqüências de respostas em curto e
em longo prazo. Lembrou o exemplo das sacolas plásticas, quo om curto prazo fizeram
muito sucesso ontre a comunidade americana, por serem adequadas e mais baratas.
Porém a conseqüência de sua disseminação, em longo prazo, foi a poluição do ambionto,
e seu custo real tornou-se muito mais alto porque demandam um sistema próprio para
eliminá-las com oficácia.
Usar sacolas plásticas por sua adequação e preço é ter o comportamento
controlado pelas conseqüências de curto prazo, é ser reforçado de maneira imediata.
Deixar de usá-las, levando para o mercado sacolas reutilizáveis, porque isso é bonéfico
à conservação do rocursos naturais, é ser controlado pela contingência última. O controlo
pelas conseqüências de longo prazo apresenta dificuldados, por sorem postorgadas e
nem sempre definidas com precisão Assim, aumentar a precisão das contingências,
por meio de reforçadores freqüentes e imediatos (contingência próxima) é necessário
para estabelecer a resposta.
Isso nos remeto ao problema levantado por Skinner (1969/1980) e a uma
questão relevante das leis que regem o comportamonto humano, já extensamonto
demonstrada (Skinner, 1953/1970). Nosso comportamento é controlado polas
conseqüências, e somos mais sensíveis às conseqüências quanto mais próximas
elas estão do momento em que nos comportamos.

Sobre Comportamento e CoRni(ih) 183


A pesquisa realizada por Olivoíra (2006) tratou da questão da redução do
consumo doméstico de água. Durante seis meses a pesquisadora visitou quarenta
residências familiares com quatro pessoas de um bairro de classe média da região
central de Taubató (SP).
Entro os rosultados de seu trabalho, destacam-se: a) informação oferecida de
modo porsonalizado, analisando com cada familia os hábitos de consumo do água, ó
eficaz na redução do consumo mensal e b) os ganhos com a redução do consumo do
água não são mantidos quando se encerra o programa. Seu trabalho mostrou ainda
que a principal razão para economizar água ó economia de dinheiro. Secundariamente,
a economia do água ó vista como valiosa, pola conservação de um recurso natural. Em
mais um exemplo, aparece a contingência om curto prazo como mais relovante.
O que se verifica ó quo apesar da existência de tantas campanhas voltadas
para o aumento da “consciência ambiental" e para a aquisição e manutenção dos
comportamontos pró-ambientais nos repertórios comportamentais da sociodade,
atitudes pró-ambientais não são correlacionadas com comportamentos (Scott & Willits,
1994). Muitas vezes, comportamentos pró-ambientais são instalados, mas não se
mantôm (Oliveira, 2006). Então, ò necessário que antes de se elaborar campanhas de
intervenção, volte-se a atenção para as variáveis significativas a estes comportamentos.
"O comportamento é função do variáveis e pode ser modificado quando qualquer uma
dessas variáveis for alterada" (Skinner, 1970, p.80), regra que vale, portanto, para o
comportamento pró-ambiental.

Variáveis significativas ao comportamento pro-ambiental


Podo-se conceituar as variáveis significativas ao estabelecimento e ao
fortalecimento do comportamento pró-ambiontal nas condições antecedentes ou nas
conseqüências destes comportamentos (Lehman & Geller, 2004). Assim, uma
intervenção pode apoiar-se em estratégias classificadas como antecedentes, nas
conseqüências ou em ambas.
Estratégias apoiadas nas condições antecodentes costumam incluir informação
e educação, dicas escritas ou orais, modelação ou demonstração, comprometimento e
alterações ambientais. Essas estratégias são usadas em combinação em muitos casos,
com evidências empíricas em favor desse uso combinado.
Estratégias apoiadas nas conseqüências consistem na disponibilização de
reforçadores. Dinheiro, cupons ou brinquedos podem ser usados em uma contingência
de reforçamonto positivo, o constituem exemplos de roforçamento arbitrário (Ferster, 1968/
1977), não causando estranheza se sua utilização instala o comportamento e que após
sua retirada o comportamento não se mantenha. Outra forma de conseqüência
froquentemento empregada é o feedback, oral ou escrito, individual ou coletivo. O feedback
é normalmente de natureza social, e constitui uma maneira para aproximar conseqüências
imediatas de conseqüências últimas, deixando clara a regra e aumentando o poder das
mesmas passarem a controlar o comportamento pró-ambiontal.
É importante lembrar que estratégias apoiadas nas condições antecedentes
só serão eficazes so essas condições forem associadas às conseqüências, pois são
ostas que definem o poder daquolas.
Ao investigarem condições sob as quais indivíduos mais provavelmente
adquirirão comportamento pró-ambiental, Villacorta, Koestnor, Lekes (2003) concluíram
por três circunstâncias: 1* quando seus parentes demonstram interesses em desenvolver
comportamentos pró-ambientais; 2* quando seus parceiros e/ou familiares apóiam o

184 M ariii lullii h X.ivler Ribeira, An<i ('.irl.i B. de Ollvelr.t, A m i lUMlrl? (/. l ‘ost«i Roilrl#ues
seu envolvimento com comportamentos pró-ambientais e 3* quando eles já dispõem
de aspirações ambientais voltadas para problemas de sua comunidade local.
Observa-se, nos trôs casos descritos acima, a importância de reforçadores sociais
para essa classe de comportamento. A aprovação social tem uma função reforçadora em
curto prazo e pode preencher a distância entre a contingência de curto prazo e a contingência
última, para a instalação e manutenção de comportamento pró-ambiental.
Outros aspectos referentes ao comportamento social são relevantes, como a
cooperação e a competição. Uma discussão sobre eles pode ser vista em Ribeiro,
Carvalho e Oliveira (2004).
As dimensões culturais e sociais influenciam os comportamentos quo o indivíduo
emite frente ao ambiente, configurando assim uma reciprocidade dinâmica entre pessoa e
ambiente. Nesse sentido, segundo Skinner (1970), o comportamento do ser humano ó moldado
de acordo com os padrões de um determinado grupo social, quando certos comportamentos
são reforçados ou recompensados e outros são punidos ou extintos. Esses padrões do
grupo, aliados a políticas públicas e econômicas, determinam o repertório comportamontal
de um grupo social, e definindo a ação do homem em relação ao moio ambiento.

Por uma cultura pro-ambíental


A preservação da natureza e o uso sustentado dos rocursos naturais não podem
ser conseguidos apenas por intervenções pontuais desenvolvidas em projetos isolados.
Equilíbrio natural e diversidade dos ecossistemas são complexos e sua conservação
exige mais do que meramente o fortalecimento de alguns comportamentos pró-
ambientais. Exige uma transformação cultural.
A questão dos resíduos pode ser um exemplo. Os 3R - Reduzir, Reutilizar,
Reciclar - são usados nessa ordem, porque nessa ordem deveriam ser feitos. Reduzir
tem impactos mais benéficos na conservação ambiental do que reutilizar e, finalmente,
reciclar. Por outro lado, há hoje uma longa cadeia produtiva, com interesses econômicos
na comercialização de resíduos, liberando potentes reforçadores econômicos nos
diferentes pontos da cadeia. Assim, nem sempre do fortalecimento de certos tipos do
comportamentos pró-ambientais irão se derivar os melhores resultados para a sociedade.
Lehman e Geller (2004) argumentam que a mudança e a manutenção dos
comportamentos podem ser mais garantidas por intervenções que sejam permanentes.
Assim, de acordo com esses autores, para que haja uma contribuição em larga escala
para a preservação ambiental, os pesquisadores devem traçar intervenções eficientes,
dimensionar os seus custos, demonstrar empiricamente sua utilidade e apresentá-las
para as autoridades responsáveis, a fim de realizar uma implantação efetiva.
Essa mesma visão já estava presente em Skinner (1971/2000) e em
Baum (1994/1999), que defendem a sobrevivência da cultura por meio de planejamento
cultural, acompanhado e avaliado por experiôncias-piloto. Para eles, a educação não
basta, é necessária uma reforma cultural. Uma cultura imutável, lembra Baum, só poderia
sobreviver em um mundo também estático, sem novos desafios ambientais e sem
concorrência por parte de outras culturas, por isso uma cultura tem que ser capaz de
mudar para que sobreviva.
Neste sentido, Baum (1994/1999) trata de questões metodológicas para a
efetivação de tal proposta, afirmando que os resultados de uma experimentação de
ordem cultural possivelmente serão discretas modificações nas freqüências de certos
desempenhos individuais em um grupo. Como critério de avaliação para questões
globais, Baum (1994/1999) adere à sugestão de Skinner e adota o critério referente à

Sobre (.'omporliimcnto e Co^niç.lo 185


sobrevivência humanidade e de suas culturas. É o indivíduo que se comporta, é no seu
repertório que ocorrem os acidentes comportamentais que instituem variações, que
poderão ser transmitidas e selecionadas, incorporando-se à cultura, a qual é, por sua
vez, o conjunto de comportamentos aprendidos compartilhados por um grupo. Não se
pode considerar o interesse do indivíduo para definir o quo deve sobreviver, mas o
critério da cultura. Isso é, em alguma medida, a sobrevivência do indivíduo, pois não se
pode falar em cultura sem a pressuposição de uma sociedade, e não se pode pressupor
sociedade sem pressupor o indivíduo que se comporta.
Tal critério - a sobrevivência da cultura - implica a mudança, com uma resposta
efetiva em longo prazo.
Muitos exemplos, dispersos pelo mundo, ilustram esforços desse gênero em
favor de uma cultura pró-ambiental, e são relatados por Gardner e Assadourian (2004).
Um deles, nos EUA, ó o dos chamados consumidores LOHAS, pessoas que ao fazerem
compras escolhem produtos de comércio justo (produtos que pagam um salário justo
aos produtores ou que causam impacto ambiental menor que os produtos comuns). No
Japão, a União de Cooperativas de Consumidores Seikatsu Club estoca alimentos
livres de agrotóxicos e aditivos e conservantes artificiais, juntamente com produtos
domésticos livres de toxinas. Seus produtos são acondicionados em potes reutilizáveis
para reduzir o descarte de embalagens, que representa 60% do lixo doméstico. O Plano
de Ação Global é uma coalizão de organizações em 19 países, quo oferece treinamento
a famílias para reduzir o lixo, aliviar o uso de energia e mudar para produtos ocoamigáveis.
Na Holanda, após trabalharem no redirecionamento do seu consumo, pelo menos
10.000 famílias reduziram seu lixo doméstico em 28% em média. Seis a nove meses
depois, já haviam alcançado 39%.
O consumo verde por corporações e órgãos governamentais constitui outra
mudança cultural importante. Dentre os exemplos citados por Mastny (2004, p. 157), está
o caso do maior fabricante mundial de cosméticos, L'Oreal, que "reduziu suas emissões
de gás de estufa em 40% entre 1990 e 2000, aumentando, ao mesmo tempo, a produção
em 60%, principalmente através da instalação de iluminação eficiente em toda sua área
e a introdução de um programa de reciclagem para reduzir a incineração do lixo". Anheuser-
Busch e IBM estão entre as várias outras empresas que vêm economizando milhões de
dólares por meio de melhorias em eficiência energética e hídrica, Na Dinamarca, líder
mundial em aquisições verdes, uma lei de 1994 obriga todos os órgãos públicos federais
e municipais a utilizarem produtos reciclados ou recicláveis, e também todas as
autoridades a adotarem uma política de aquisições verdes.
Instituições de todos os tipos recebem uma ampla variedade de pressões,
quer normativas, quer de consumidores, para que se instale um ciclo de produção e de
consumo ambientalmente responsável. Por exemplo, muitos governos hoje dão
isenções fiscais e outros incentivos econômicos para encorajar empresas, escolas,
indivíduos o outros consumidores a investirem em equipamentos ecoeficientes. Por
outro lado, a instituição de impostos ambientais - receitas ecofiscais -inclui os custos
ambientais nos preços dos produtos e sua implantação na Europa tem sua maior
arrecadação na taxação de gasolina, diesel e veículos a motor.
No Brasil, o disciplinamento legal de "devolução", que obriga os fabricantes a
recolher as embalagens e produtos descartados, favoreceu a política berço-a-berço.
Esse disciplinamento, apoiado no Princípio de Responsabilidade do Produtor, aplica-
se a pneus, baterias, equipamentos elétrico-eletrônicos, veículos e embalagens.
Outra ação é o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores
-Proconve, que completou 20 anos de criação, com resultados importantes (BRASIL,

186 M uri.i luliii K X*ivicr Ribeiro, An.» t\ir l.i H. de Oliveira, A iw He.ttri/ (./. Cosl.i Roilriflue*
2006b). Instituído por resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente - Conama, o
Proconve teve como principal objetivo reduzir a emissão de poluentes dos veículos
automotores, Para tanto, o programa alia legislação que proibe certas práticas, ao
mesmo tempo que incentiva outras.
Embora a frota de veículos no pais tenha aumentado de 10 milhões para 24
milhões em duas décadas, houve significativa melhoria na qualidade do ar. Em 1986,
quando o programa foi instituído, um carro lançava no ar atmosférico 54 gramas de
monóxido de carbono a cada quilômetro rodado. Hoje, essa quantidade ó de 0,3 gramas,
redução de 99%.
O Proconve impulsionou, por meio de normas de controle do emissão, o
desenvolvimento tecnológico da indústria automotiva, que teve que evoluir e incluir, na
fabricação dos veículos brasileiros, tecnologias que controlassem a emissão de
poluentes. Como conseqüência, o carro brasileiro se tornou mais competitivo em
morcados com legislações ambientais mais rígidas.
Uma conseqüência importante estimada é a economia de US$ 1, 32 bilhão em
gastos com doenças pulmonares, cardíacas e câncer de pulmão. O estudo, que engloba
o período de 1996 a 2005, também mostra quo foram evitadas 14.495 mortes na grande
São Paulo com a implementação do programa, dado que representa um acréscimo
médio de treze anos no tempo de vida da população.
Esses exemplos mostram que comportamentos pró-ambientais, valorizados
culturalmente, geram maior impacto na conservação dos recursos naturais. Ilustram
também que a valorização cultural é de fato controle por contingências, ainda que possa
ser oxprossa por regras. "Compro o produto da empresa X, uma empresa quo respoita
a natureza", diz um anunciante. Tenta assim vender mais, é claro, para indivíduos quo se
comportam, comprando, em uma cultura pró-ambiontal, e assim obter reforçadores. O
princípio do poluidor pagador institui conseqüências aversivas para quem se comporta
contrariamente à prescrição da cultura pró-ambiontal: "se você contaminar o solo, você
deverá fazor ações do reparação e pagar por elas". O consumidor que adquire um
produto avaliado como ambientalmente responsável está fortalecendo classes e cadeias
de comportamentos implicadas nesse modo de produção.
Outro aspecto mostrado pelos exemplos é que as contingências operam,
independente de que o indivíduo cujo comportamento está sendo controlado por ela
tenha disso conhecimento. Até que ponto um comprador de automóveis sabe que
características tecnológicas que uma campanha publicitária descreve como "avançadas"
são de fato resultados de determinações legais? A determinação legal descreve
contingências que controlam o comportamento dos fabricantes de carros, e por isso
tem eficácia sobro o comportamento deles. Já os compradores de carros têm seu
comportamento controlado por outro conjunto de eventos: o preço, características
estéticas e funcionais, publicidade. Ao substituírem um carro de modelo anterior por
outro, amblentalmente correto (em virtude das contingências que operaram sobre o
comportamento dos fabricantes), cooperam com a proteção ambiental. Nesse sentido,
tanto fabricantes quanto consumidores podem ter seu comportamento classificado
como pró-ambiental. O caso do Proconve pode ter passado despercebido à maioria
dos compradores, mas seus comportamentos foram também controlados e parte
dessas contingências.
Finalmente, esses exemplos mostram que os benefícios são compartilhados
pela parcela da sociedade que, muitas vezes sem participar da determinação dos modos
de produção, por estar à margem da cadeia de consumo, é a principal prejudicada

Sobre Compor1.imenlo e Co^niçdo 187


pelos danos ambientais. A melhoria da qualidade do ar ó um beneficio que se estende
a todos, não apenas aos que usam automóveis, ou que lucram com sua fabricação e
venda. Essa melhoria se estende também no tempo, às próximas gerações. São as
conseqüências últimas em operação.
Gardner e Assadourian (2004) são autores de um texto muito interessante
denominado Repensando a Boa Vida. Neste texto (p. 204), questionam os critérios
tradicionais de desenvolvimento assumidos pelos govornos:
A maioria dos governos faz dos aumentos contínuos no produto interna bruto (PIB)
uma prioridade maior da política doméstica, assumindo que estando a riqueza
garantida, o bem-estar ó assegurado. No entanto, ênfase indevida na geração de
riqueza, especialmente pelo encorajamento do alto consumo, pode estar gerando
retornos decrescentes. No todo, a qualidade de vida está se deteriorando em
alguns dos mais ricos palses do globo à medida que as pessoas vão sofrendo
maior estresse e pressão de tempo, com menos relacionamentos sociais
satisfatórios, e à medida que o melo ambiente vai mostrando cada vez mais sina/s
de perigo. Enquanto isso, nos palses mais pobres a qualidade de vida é degradada
pelo náo-atendimento das necessidades básicas das pessoas.
Esses critérios de desenvolvimento - regras que descrevem contingências -
deveriam gerar bem estar, mas não é o que os dados demonstram Assim, Gardner e
Assadourian (2004, p.204) alertam para a necessidade de estabelecimento de novos
critérios de desenvolvimento social.
Repensar o que significa “a boa vida“ é mais que necessário num mundo que
caminha rapidamente numa trilha de males auto-lnfligidos o danos planetários a
florestas, oceanos, biodiversidade e outros recursos naturais. Ao redefinir
prosperidade com ênfase numa melhor qualidade de vida, em vez de numa mera
acumulação de bens, indivíduos, comunidades e governos podem concentrar-se
na conquista do que as pessoas mais almejam. Realmente, uma nova compreensão
do que seja boa vida pode ser construído não em torno da riqueza, e sim do bem-
estar: atendimento das necessidades básicas de sobrevivência, juntamente com
liberdade, saúde, segurança e relações sociais gratificantes. Naturalmente, o
consumo ainda seria importante, mas somente na medida em oue incremente n
auahdada de vida. Realmente, uma sociedade de bem estar deve empenhar se
em minimizar o consumo ao necessário para uma vida diona e oratificante.
Ressaltam-se nesses critérios de desenvolvimento propostos a atenção a
esferas de abrangência diversas e progressivas: indivíduos, comunidade, governos.
Não há riqueza do pais sem bem estar das pessoas que o formam.
Descrevem ainda como se comportariam as pessoas numa sociedade de
bom estar:
As pessoas numa sociedade de bem-estar também desenvolveriam
relacionamentos íntimos com o meio ambiente natural. Reconheceriam as árvores em
seus parques e as flores em seus jardins com a mesma facilidade com quo identificam
logomarcas corporativas. Entenderiam os fundamentos ambientais de sua atividade
econômica: de onde vem sua água, para onde vai seu lixo e se a energia que sua usina
usa para gerar eletricidade é carvão, nuclear ou renovável.
Há, portanto, o reconhecimento que a sociedade de bem estar, que Gardner e
Assadourian (2004) descrevem, afetará o comportamento dos indivíduos e,
simultaneamente, depende de mudanças no comportamento dos indivíduos. E que
"relacionamentos íntimos com o meio ambiente natural" - controle pelas contingências
próximas - constrói "bem estar" - leva às conseqüências últimas.

188 M .iriii luli.i h X .iv irr Ribeiro, Ana C.irl.i H. ilo Olivoir.i An«i Hc.itii/ (). Costa Kotingurs
Ao evidenciar as conseqüências do consumo para o repertório individual, para
o ambiente natural e para a vida social, esses autores enfatizam (p.221) a necessidade
de alteração dessa classo de respostas:
Para os indivíduos, c? escolha genuína provavelmente incluiria a escolha do nào
consumir. Todos pracisarào tormr-se exímios em lidar com uma questào-chave.
quanto é demais? As respostas serào diferentes de pessoa a pessoa, porém uma
diretriz que vale a pena considerar ô uma do filósofo chinês Lau Tzu‘ "Saber
quando se tem o suficiente é ser rico".
Vê-se, então que sua proposta prescreve a moderação dos efeitos roforçadores
do comportamonto de consumo, como postula Skinner, e implica a disponibilização do
outros reforçadoros:
Ao cultivar relacionamentos, facilitar escolhas sadias, aprender a viver em harmonia
com a natureza e atender às necessidades básicas de todos, as sociedades
podem mudar de uma ênfase no consumo para uma ônfase no bem-estar. Isso
poderá ser uma tamanha conquista no século XXI, como os tremendos avanços
om oportunidade, conveniência e conforto foram no século XX.
Já houve òpocas na história da humanidade em que a medida do tempo era
feita pelos ciclos biológicos e geológicos, e não por artefatos, mecânicos ou digitais. O
distanciamento das contingências naturais, ao mesmo tempo em que representou
conquistas, trouxe também graves riscos. A tarefa agora ó descobrir como mantor as
conquistas, roduzir os danos já produzidos e evitar novos danos. Ou, na linguagem da
análise do comportamento, como moderar os efeitos reforçadores das conquistas,
para evitar os eventos aversivos ulteriores, e para que os reforçadores sejam disponíveis
aos comportamentos de mais indivíduos, os que se comportam hoje, e os que virão a
se comportar depois de nós, em gerações futuras. Essa é a tarefa da humanidade, o
nola se inscreve a tarefa dos analistas do comportamento.

Referências
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Sobre ('omport.imento e ('o#nlv<lo 180


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190 M.iri,) U/liti Í. Xdvlcr Uibciro, Aiut L\trl,i H. dc Ollveirit, A rut Hc.itru ConUi llodrtftues
Capítulo 17
Relações entre comportamento verbal e
não verbal: ilustrações a partir
de situações empíricas

M aria Martha Cosia I lülm erH '


Paula Kspósilo de Almeida,
Pedro Hordini Faleiros
USP

Aposar da proposta de uma análise funcional do comportamento verbal ostar


pronta dosde 1957, com a publicação do livro "Verbal Bohavior" de Skinner, os procossos
básicos deste comportamento o suas relações com o comportamento não verbal
ainda estão sendo compreendidos e estudos destas relações vêm sendo considerado
uma linha produtiva do investigação empírica.
Autores da área operante vêm investigando, de modo mais direto, possíveis
relações entre os operantes verbais e não verbais, com doscobortas instigantes, revelando
o poder e os limites do controle verbal no comportamento humano, produto de uma
comunidade eminentemente verbal. A modelagem do comportamento vorbal pode ser
uma técnica potente para modificar o comportamento humano, espocialmonto, sabendo-
se que a distinção entre o comportamento governado verbalmente e o comportamento
governado por contingências é rolevante tanto para o comportamonto verbal como para o
não-verbal. O comportamento vorbal modelado ou governado por contingências ó, como
o comportamento não-verbal modelado, sensível às suas conseqüências, mas ó, também,
acompanhado pelo comportamento não-verbal correspondente (Catania, 1999). A
depender, ontretanto, das contingências, do controle discriminativo, respostas verbais o
não-verbais permanecerão ou não sob controle exclusivo de suas conseqüências diretas.
Em condições experimentais, diforentes autores estudaram o controle de dicas
vorbais (rogras/auto-regras/instrução) sobre o comportamento não verbal, em situações
em que descrições verbais e contingências de reforçamento opostas oram programadas
(Catania, Matthewls e Schimoff, 1982; Galizio, 1979; Arnorin, 2001, Torgrud e Holborn,
1990). Uma síntese destes resultados pormite afirmar que somente nas circunstâncias
onde um fraco controle discriminativo foi estabelecido, verificou-se o controle das
respostas vorbais sobre as não-verbais de maneira transitória.
As pesquisas continuam o têm implicações importantes para a compreensão
do ambos os procossos, bem como implicações para procedimentos de intervenção.

1A HDloiH Huradntai A» tilunai Remata Codho « FaWmwi Fonaeca ( USP) ■ colaboraç*“ <>* cotola (1b dado» u hMxjtnvAo da» flguraN do
EitiKk) 3

Sobro (.'omportiimcnlo e CoruIviI o 191


No presente artigo serão apresontados novos estudos que investigam
a relação estabelecida entre respostas vorbais e não vorbais, em situaçõos
oxperimentais. Nos dois primeiros, a relação de controlo entro comportamento verbal e
não verbal foi discutida em uma situação de jogos. No terceiro estudo, o reforçamento
diferencial de diferentes respostas verbais sobro a prática do exorcícios físicos foi
avaliada, a partir dos efeitos obtidos sobro o tempo do envolvimonto com esta atívidado,
em uma situação posterior.

ESTUDO 1

O objetivo deste estudo foi investigar prováveis relações de controle entre


comportamonto verbal o não verbal, em uma situação de rosolução de problemas.
Segundo Skinner (1969), podemos dizer que temos um problema quando nos
deparamos com uma situação para a qual não temos uma rosposta oficionto em produzir
reforços. Para resolvô-lo, precisamos nos comportar do manoira a produzir dicas, ou
■ estímulos discriminativos, que favoreçam a omissão de uma rosposta apropriada. Para
. Skinner, uma das formas de produzir dicas que auxiliom na rosolução de um problorria
! seria a partir do comportamento verbal.
O comportamento verbal pode estar envolvido com a situação de resolução de
um problema de duas formas: a partir do seguimento de regras, como quando uma dica
li verbal que controla nosso comportamento é fornecida por outros; ou a partir da formulação
do descrições das contingências feita pela própria pessoa. Dicas vorbais podem ser
resumidas descrições de contingências, do tipo "Se (X) então (Y)". Uma descrição deste
tipo podo aumentar a probabilidade de sucesso da pessoa que a produziu, tanto quanto
de outras pessoas que a sigam.
Durante este estudo, quatro participantes foram submetidos a uma situação
de resolução de problemas durante o jogo de Senhas. Porque os participantes não
podiam emitir, a princípio, a resposta final que lovava ao ganho do jogo, a situação foi
considerada, essencialmente, uma situação-problema. O problema do jogo consistia
em que os participantes dispusessem diferentes poças em um tabuleiro, de modo a
reproduzir uma seqüência oculta arranjada pelo pesquisador.
O estudo investigou o efeito da solicitação do descrições verbais sobre as
contingências do jogo, no desompenho dos participantes durante uma tarefa do
rosolução de problomas. O estudo pretende explorar algumas variáveis onvolvidas com
o controlo do comportamonto vorbal e não verbal, apontando dificuldades motodológicas
no ostudo desta relação.

MÉTODO

PARTICIPANTES:
Foram selocionados quatro participantes de nível universitário, de idade entre
27 o 34 anos, moradores da cidade de São Paulo.
Os participantes foram agrupados om duplas, a fim de favorecer a omissão de
respostas verbais públicas durante o jogo que, de outra forma, poderiam manter-se
privadas.

192 M.iri.i M.irth.i Cosl.i I liibner, P.iol.i f ípósito de Almeid.i, IVdro Hordinl I .ilelros
Uma das duplas (AB) foi submetida à condição experimental, enquanto a outra
(CD) foi submetida à condição controle.

LOCAL
Sala confortável e silenciosa, com trôs cadeiras o uma mesa, onde foi disposto
o tabuleiro do jogo.

MATERIAL
Jogo de Senha Mastermino, (Grow).
Gravador de fita cassete, para registro e reprodução das respostas verbais dos
participantes.
Máquina digital Mavica (Sony), para registrar o tabuleiro de jogo após a conclusão
das partidas.
Folha de respostas, onde foram registradas as respostas verbais dos
participantes das duplas às perguntas formuladas pelo pesquisador.

PROCEDIMENTO
Em uma única sessão, o experimentador e uma dupla do participantes se
encontraram para jogar seis partidas de Senha, com intervalos de até cinco minutos
entre cada partida.
Durante o jogo, os participantes deveriam completar uma seqüência do pinos
idêntica à seqüência oculta arranjada pelo experimentador. Para isto, deveriam selecionar
quatro pinos, entre sete diferentes cores, e colocá-los no tabuleiro. Ao final de cada
tentativa arranjada pelos participantes, o pesquisador apresentava até quatro peças
brancas ou pretas, que descreviam o desempenho da dupla naquela tentativa. Para
cada cor que os participantes acertavam sobre a seqüência oculta, uma peça branca
era colocada no tabuleiro A cada vez que os participantes acertavam a cor e a posição
de um pino, uma peça preta era colocada. Quando nenhum pino era colocado, os
participantes não haviam acertado nem a cor nem a posição do nenhuma das peças.
Não existia ordem para a colocação dos pinos brancos e pretos. A presença ou a
ausência dos pinos podia, então, funcionar como dica verbal, ou descrições de
contingências de reforço mantidas no jogo, do tipo "SE... você repetir uma das cores (ou
posições) desta seqüência..., ENTÂO poderá ganhar o jogo". Pode-se dizer ainda que
os pinos poderiam funcionar também como estímulos reforçadores condicionados,
que aumentavam a probabilidade das respostas dos participantes que os produzissem.
A fim do garantir o mesmo grau de dificuldade no inicio das partidas, em todas
as fases, o experimentador arranjava não apenas a seqüência-oculta, mas produzia
também um primeiro arranjo de seqüências a ser seguido pelos participantes. Assim,
todas as partidas da dupla de participantes eram iniciadas após uma primeira
combinação de cores arranjada pelo experimentador, que produzia sempre um pino
branco e um pino preto como dicas sobre a seqüência oculta. O participante passava,
então, a ter nove tentativas para chegar à seqüência oculta e não mais dez como nas
regras originais do jogo.
Em todas as partidas, uma cor (AZUL) foi eleita pelo experimentador para estar
presente tanto na seqüência oculta, como na primeira seqüência de tentativas entregue aos
participantes. Ainda que o pesquisador pudesse alterar, a cada partida, a posição da peça
azul na seqüência oculta, a peça sempre aparecia em posição idêntica na primeira tentativa
arranjada pelo experimentador, produzindo o pino preto da primeira sinalização disponível

Sobre l'omport.imcnlo c Co#niç<lo 193


aos participantes. A manutenção da cor azul sempre na posição correta nào era, no entanto,
diretamente comunicada aos participantes em quaisquer das partidas. Ao longo da exposição
do participante às partidas, a seguinte condição poderia, então, ser descrita "SE cor azul,
ENTÃO posição correta". O número de tentativas necessário para que os participantes
formulassem a regra sobre a função da peça azul ora também avaliada pelo pesquisador.
A dupla na condição experimental (AB) completou as seguintes fases: Linha de
Base, Fase Experimental I, Il e III.
A dupla na condição controle (CD) passou por trôs partidas do Linha do Base o
outras trôs na condição controle.
As diferentes fases serão descritas a seguir:

Fase de Linha de Base:


As trôs primeiras partidas serviram como Linha de Base do comportamento
verbal o não verbal das duas duplas de participantes, antes da manipulação experimental.
Durante as partidas, foram registradas as respostas verbais espontaneamente
declaradas pelos participantes, assim como as respostas não verbais do arranjo de
seqüências emitidas durante o jogo. O número de tentativas para chegar à resposta-
solução (arranjo da seqüência do quatro pinos, idêntica à seqüência oculta) foi registrado,
servindo de medida para comparar o efeito das condições de linha de base com as da
condição experimental (Fase I, Il e III) e controle.

Fase Experimental I - Formulação ou explicitação de dicas verbais seguidas pelos


participantes - Modo afirmativo.
Após as três primeiras partidas, o experimentador entregava à dupla de
participantes uma folha com a seguinte pergunta: “O que vocês aprenderam sobro o que
fazer para ganhar este jogo?". A dupla deveria escrever sua resposta, podendo completar
até três descrições de uma relação do tipo "SE...ENTÃO", nos espaços apropriados da
folha. Os jogadores foram instruídos a completar o maior número de descrições possíveis.
A descrição verbal dos participantes não foi seguida por nenhum tipo de reforçamento
diferencial, e a folha de respostas foi recolhida pelo experimentador antes do início da
quarta partida. O objetivo desta fase foi avaliar se respostas verbais privadas, que não
tivessem sido antes declaradas, poderiam ter controlado a comportamonto não-verbal
dos participantes nas três partidas anteriores. Ciente de que a própria indagação do
experimentador poderia funcionar como uma dica para a formulação de descrições verbais
pela dupla de participantes, as tentativas necessárias para completar o jogo durante a
quarta partida foram registradas, sendo comparadas ao número de tentativas das partidas
anteriores. Continuaram sendo registradas durante esta fase as seqüências não verbais
e as respostas verbais espontaneamento declaradas pela dupla durante a partida.

Fase Experimental II - Formulação ou explicitação de dicas verbais seguidas pelos


participantes - Modo negativo.
Após a quarta partida, o experimentador entregava aos participantes uma folha
com a seguinte pergunta: "O que vocês aprenderam sobre o que não fazer para ganhar
este jogo?". A dupla deveria escrever sua resposta, podendo completar até três descrições
do uma relação do tipo "SE...ENTÃO”, nos espaços apropriados da folha. Os jogadores
foram instruídos a completar o maior número de descrições possíveis. Como na fase
anterior, a descrição verbal dos participantes não foi seguida por nenhum tipo de
reforçamento diferencial, e a folha de respostas foi recolhida pelo experimentador antes
do início da quinta partida. O objetivo desta fase foi permitir ao experimentador avaliar o
efeito da formulação de dicas verbais sobre o comportamento dos participantes, a partir

194 M aria M iiitlk i Costa I lübner, Paola Cspósilo de Alm eida, IVdro Hordini Caleiros
de uma comparação do número de tentativas para completar a tarefa nesta e nas outras
fases do experimento. Continuaram sendo registradas as seqüências não verbais e as
respostas verbais espontaneamente declaradas pela dupla durante a partida.

Fase Experimental III - Formulação de dicas verbais sobre a função da cor azul.
Antes do inicio da sexta sessão, o experimentador entregava aos participantes
uma folha contendo a seguinte pergunta "O que se mantevo igual om todas as partidas
do jogo?" Os jogadores deveriam responder a pergunta antes do início da sexta partida.
Novamente, as tentativas necessárias para completar o jogo durante a partida foram
registradas, assim como as seqüências não verbais e as respostas verbais
espontaneamente declaradas pelos participantes durante o jogo. A manipulação
pretendia avaliar se a dica verbal fornecida polo experimentador poderia favorecer a
formulação da regra sobre a peça azul, que se mantinha sempre na posição correta em
Iodas as partidas - o que poderia facilitar a conclusão do jogo.
Fase controle
Durante as três últimas partidas da dupla CD, nenhuma descrição verbal
sobre as contingências do jogo foi solicitada ao participante ou vocalmente fornecida
pelo experimentador. A condição controle pretendia avaliar se eventuais melhoras no
desempenho dos participantes durante as partidas poderiam dever-se ao efeito do
treino e exposição dirota às contingências do jogo, o não à solicitação direta de dicas
verbais durante as fases experimentais. Após as três últimas partidas, o experimentador
fazia aos participantes da dupla CD as mesmas perguntas respondidas pelos
participantes AB durante a condição experimental, descritas acima.

A figura abaixo ilustra a composição com que o tabuleiro aparecia ao participante


ao inicio do jogo:

Tentativa arranjada pelo experimentador.


(Ex: azul, vermelho, verde, amarelo).

Dicas arranjadas pelo experimentador.


’ (1* - Pino branco, pino preto, sem pino, sem
pino)

Tentativas do participante

O o O < Seqüôncia-oculta
(azul, verde, rosa, laranja)
Figura 1. Exemplo do tabuleiro apresentado ao participante no inicio do jogo

Sobre Comporl.imcnlo c Cognição 195


Resultados e discussão
A Figura 2 ilustra o desempenho não verbal dos participantes AB e CD durante
as seis partidas do jogo de Senhas. As trôs primeiras partidas são consideradas como
de Linha de Base e as trôs últimas partidas como parte da Fase Experimental I, II e III
(AB) ou Fase controle (CD).

— Dupla AB
Dupla CD

1 2 3 4 5 6
Figura 2. Número de tentativas da dupla de participantes AB e CD durante a Linha de Base (partidas
1-3) e Fase Experimental (partidas 4-6, dupla AB ) ou Controle (Partidas 4-6, dupla CD). No eixo X
estâo as partidas realizadas e no eixo Y estão os números de tentativas para a solução ou término
da partida.

Como se pode notar há grande variabilidade no número de tentativas


necessárias para que as duas duplas pudessem chegar à resposta solução. Os dados
indicam que o desempenho dos participantes nas três partidas de Linha de Base não
pode ser considerado estável, já que a dupla AB apresentou uma variação de ató 05
tentativas para completar as diferentes partidas desta fase, enquanto a dupla CD
apresentou uma tendência crescente no número de tentativas necessárias para chegar
á resposta-soluçáo,
A comparação dos desempenhos das duplas parece indicar ainda que a simples
exposição às contingências do jogo não pode ser considerada condição suficiente para
melhora no desempenho dos participantes. Durante as trôs sessões de Linha de Base,
a dupla CD apresentou uma variação de duas tentativas entre o maior e o menor número
de jogadas necessárias para conclusão do jogo. No entanto, nas três últimas tentativas
da condição controle, uma variação de cinco tentativas entre a maior e o menor número
de jogadas foi observada - devendo>se ressaltar que, na última partida, a dupla chegou
ao final das nove tentativas, sem emitir o arranjo de seqüências correto.
Os dados parecem sugerir que a solicitação de descrições verbais possa ter
contribuído para os melhores resultados da dupla AB, durante a tarefa de solução do
problema, A relação funcional estabelecida entre estas solicitações e a emissão da
resposta-solução, no entanto, não parece clara. Isto porque, a revisão do registro das
respostas verbais das duas duplas permite afirmar que todos os participantes vinham
descrevendo as contingências do jogo, mesmo na ausência de solicitações diretas do
pesquisador. A apresentação das solicitações para a dupla AB pôde, no entanto, ter
suplementado a estimulação disponível para o controle de novas descrições, ou, talvez,
tenha fornecido dicas adicionais sobre as contingências programadas (exemplo da
terceira pergunta: o que se manteve igual durante todo o jogo").

196 M .iri.i M .irtlni Costii I lübner, P.iol.i íspósito ile Almeida, Pedro Rordim hileiros
Os demais resultados das duplas do participantes AB e CD serão descritos
separadamente. Uma seleção do trechos do algumas partidas pretende elucidar a
discussão sobre o controle das respostas verbais sobre as não verbais, e vice-versa.

Parle 1- Análise do desempenho verbal e não verbal da duola de participantes AB.

Corno dito antes, uma análise das respostas vorbais dos participantes indica
que as contingências mantidas no jogo estariam sendo descritas já nas três primeiras
partidas, antes da apresentação das solicitações do experimentador.
Na primeira partida da dupla, por exemplo, um dos participantes declara a
necessidade de formular uma estratégia sobro como selecionar as peças do jogo:
Participante B - Ai, nâo vai na louca. Vamos criar uma tose.
Participante A - Que tese o escambau Agora è fácil A gonte já sabe que sáo
ossas cores.
Participante B - S e você for repetindo essas cores até o final, tôm n possibilidades.
Participante A - Nem tanto. Entâo tá, qual está certa?
Participante B - Assume uma certa.

Fica claro que, diante da imposição do problema no jogo, os participantos da


dupla AB passaram a ‘ marcar" as poças do jogo, descrevendo-as como corretas, mesmo
na ausência de outras ovidências que indicassem sua relevância. Tal descrição poderia,
assim, ter estabolecido controle sobre a resposta de seleção da peça, sendo nocessário
um prolongamento no contacto com as contingências para enfraquecer o controle verbal,
nos casos em que as peças fossem desnecessárias. Tal situação pode ser
acompanhada a partir da observação dos resultados da terceira partida da linha de
base. Nesta partida, o desempenho da dupla foi o pior dentre todas as demais partidas.
Tal desempenho parece resultar do controle por estímulos irrelevantes, estabelecido a
partir de coincidências acidentais entre a emissão das respostas verbais (descrição
verbal da peça laranja como poça correta) o não verbais (soleção de peças desta cor),
com a apresontação de conseqüências reforçadoras (produção de pinos pretos ou
brancos) após as jogadas.
(3* partida- Primeira tentativa)
PA- A primeira ó meio chutào
PB - Tudo bom Agora nós vamos escolher a verde e a laranja (como peças
corretas).

(Apòs segunda sinalização)


PA- Vamos fazer de conta que o verde está certo, mas na posição errada.
PB- Nào, mas ele podo ..6 verdade Entâo o laranja está na posição certa
PA -Ê, a gento assumiu ele Entâo...
PB -O laranja tá na posição certa. Aqui ele mudou.

(Após terceira sinalização)


PB- É, nos perdemos uma parada. Isso è bom, porque aqui o roxo apareceu e nós

Sol»re Comportamento e Cognição 197


ganhamos uma. EntAo o roxo è uma cor conhecida.
PA- Nilo nessa posiçáo
PB- Exatamente O laranja e o verde nós repetimos, estão em posição errada, mas
eles existem.
PA- Esse aqui (laranja) deve estar certo, porque nós colocamos ele aqui de novo
o veio um preto
PB- Exato.
PA- Então coloca ele ali

Nesto caso, contingências acidentais podem ter fortalecido a rosposta verbal


do eleger uma das peças como estimulo relevanto, favorecondo o controle
correspondonte sobro o comportamento não verbal, ou podoriam, independentomente,
ter fortalocido a resposta não verbal supersticiosa.
Os resultados parecem corroborar dados anteriores apresentados por Torgrud
o Holborn (1990), que indicam que contingências ambíguas, que dificultam a
discriminação das condições que garantem a maximização do reforços (como as
mantidas no jogo de Senhas) podom favorecer o controle da resposta não verbal por
uma descrição vorbal, mesmo que "falsa". Durante o jogo de Senhas, uma das
dificuldades na solução do problema decorre do fato de que as conseqüências
diferenciais (pinos pretos ou brancos) eram apresentadas apôs a seleção das quatro
peças da seqüência arranjada pelos participantes, e não a partir da seleção de cada
uma das poças. Tal condição dificultava um controle discriminativo preciso sobre o
comportamonto do seleção das peças, podendo facilitar o controle pela descrição verbal.
Segundo Skinner, dicas verbais são particularmente provávois de controlar o
comportamento diante do uma situação-problema, mesmo quando não
necessariamente úteis. Porque “responder sem nenhuma indicação de sucesso é
avorsivo, podo-se escapar achando algum indicador aparente" (Skinnor, 1969 p. 295).
Nostos casos, o controle pelas dicas verbais poderia tor dificultado a solução do problema
durante a terceira partida, impedindo o responder apropriado e o recebimento do reforço.
Interessanto notar que, após a quarta tentativa sem sucesso na conclusão do
jogo, a peça laranja passou a controlar uma nova resposta verbal do um dos participantes.
PB- Mas o laranja tá certo também, nào tá?
A inclusão da palavra não e da intorrogaçào ao final da frase parece ter uma
função autoclítica, quo altora a frase anterior, que descrevia a escolha da peça laranja
como corrota. Podoríamos dizer que, nosta situação, o sujeito pareco estar "tateando"
estímulos que controlassom um novo curso de ação - no caso, rejeitar a poça laranja.
Este rosultado sugere forternonto o controle das contingências não verbais sobre as
rospostas vorbais dos participantes. Nota-se, no entanto, que a omissão de uma
descrição vorbal com estas características não parece ter controlado a resposta não
verbal dos participantes, que continuaram a selecionar a peça laranja om outras trôs
tentativas durante a terceira partida. O controle da “falsa" regra sobre a poça laranja só
foi enfraquecido durante a oitava tentativa, após uma longa exposição às contingências
de reforço das sete tentativas anteriores.
Tal como indica Skinnor (1969) a descrição de rospostas que falham om
satisfazor as contingências sâo também prováveis e valiosas durante o processo de
rosolução de problomas. Diante da dificuldade em encerrar a terceira partida, durante a
sexta tentativa, um dos participantes sugere:

I98 Murki M.irtl),i Cosl.i I lülmer, l\iol.t Ispóslto de Almeid.i, Pedro Rordlni I .ileiros
PB - Entào qual que a gente errou aqui? Vamos pensar de uma outra visão. Qual
a gente errou?

O resultado parece indicar a descrição de respostas de observação das


contingências mantidas durante o jogo, e rogistradas no tabuleiro, de forma a oliminar
o controlo por estímulos irrelevantes.
A Tabela I descreve as respostas verbais dos participantes diante das
solicitações do experimentador, nas diferentes fases da condição experimental.

Tabola I- Respostas verbais dos participantes durante as fases exporimentais I, Il e III.

PERGUNTAS DO REÍ5POSTAS DOS P A R T IC IP A ITES


EXPERIMENTADOR NAS RESPOSTA 1 RËSPOSTA2 RESPOSTA3
DIFERENTES FASES
EXPERIMENTAIS.
"So r«|K)llnno» m m cor quo "Se acortarmos a» coro*, "Sn chogarmoa A pnnúltlma
Fase l/Partkia 4: 0 quo vocAs lulgamoft corta, podomo» mosmo om ordom orrada, rodada som muito sticosso,
aprondoram sobro o quo nnlAo concluir quo ola 6 nntAo Isso facilita" ontAo tomou quo ropotlr os
fazor para ganhar o |ogo? corta ou orrada passos do Inicio".
dnflnltlvamonto, a partir da
5a kxia d»'
"So partlrmoa para o chuto, "So nAo chocarmos a» “So nâo arriscarmos coroa
Faso ll/Partlda ft; 0 quo enlflo dlmlnuom a* nossa# |ogadas antorloros, aloatórlas, ontflo nAo
vocAs nprondoram sobro o chancos" pordomos Infomiaçftos saboromos so p odor Ao sor
quo nAo íazor paru ganhar o para próximas jogadas* usadas*.
logo?

"Toda voz quo ropotimoa uma cor nos damos bem"


Faso Ill/Partida 6 - Do inicio
«o dm do logo. o quo
mantftvo Igual?

Como se pode notar, as respostas dos participantes duranto a Fase I descrevem


as contingências vividas durante as três partidas da Linha de Base. As descrições
parecem indicar o controle das contingências passadas sobro as respostas verbais
dos participantes, diante da solicitação do pesquisador. Uma análise do conteúdo destas
descrições parece indicar que, ao descrever uma das peças como correta, os
participantes ampliavam o controle desta peça sobre a emissão de outras respostas
(ex: olhar para a peça, testá-la em tentativas seqüenciais, etc), necessárias para a
resolução de problemas. O desempenho não verbal dos participantes na Fase I, no
entanto, foi igual ao desempenho observado na segunda partida da Linha de Base. O
resultado poderia indicar que as solicitações do pesquisador não teriam estabelecido
controlo diferencial sobre as respostas não verbais dos participantes. Contudo, duranto
a Linha do Base, os participantes acertaram ocasionalmente os quatro pinos da
seqüôncia-oculta na segunda tentativa da partida, o que não se repetiu durante a Fase
I. Assim, o mesmo número de tentativas para chegar à resposta-solução foi obtido,
nesto segundo momento, diante de uma situação mais complexa.
As rospostas verbais da Fase II indicam, por sua vez, que a descrição das
respostas que não deveriam ser emitidas durante o jogo também não toria favorecido o
rendimento dos participantes durante a quinta partida, quando a resposta solução foi
emitida apenas na sétima tentativa. Ainda que as descrições indicassem a necessidade
de continuar observando o tabuleiro para checar as jogadas anteriores, não toram
especificados os estímulos relevantes a serem observados a cada inspeção. Nota-so,

Sobre t'omporl.imcnlo e C'oruK'.Io 199


no entanto, quo os participantes passaram a descrever a necessidade de introduzir
novas coros o checar seu controle, indicando a necessidado de "testar" a relação
ostabelecida entre a seleção de cores e a apresentação do reforço.
Ao início da sexta partida (Fase III), fica evidente que os participantes não haviam
ainda descrito corrutamento a função da cor azul. Uma análise das respostas não
vorbais espontanoamonte omitidas pelos participantes indica tambóm que o controlo
por osta poça não havia sido ostabolocido após as três primoiras partidas de linha de
base. No entanto, alguns dados parecem interessantes para conduzir esta análise.
Na segunda partida da linha de base, um dos jogadores descreve da soguinte
forma a prosonça da cor azul no tabuleiro:
PA - O azul está errado. Se ele estava certo antes, nào vai estar certo agora.
A rosposta do participante durante esta partida parece indicar o controlo da
história prévia do participante com outras contingências do resolução do problornas
mantidas om diferentes jogos.
É interessante notar que durante o inicio da quinta partida (Fase II), os jogadores
passam a formular hipóteses sobro a cor azul, tal como pode ser obsorvado abaixo:
PB - O azul está certo.
PA- O azul está na posíçào errada
PB- O azul está certo, na posição certa
PA- O azul de novo? Vocè acha que ela (a pesquisadora) é tonta?
PB- Nào, ela (a pesquisadora) acha que a gente ô tonto.
Ainda quo um dos participantes tivesse descrito corretamente a contingência
do jogo antes da primoira tontativa da Fase II, a dupla mudou ainda mais uma vez a
posição da cor azul, demorando outra jogada para colocar a poça no local correto.
Assim, a descrição vorbal não parece ter controlado a emissão da rosposta não verbal
de seleção da peça, antes que as contingências tivessem punido as respostas de
selecionar outras cores. Uma possível interpretação para o fraco controlo da descrição
vorbal, noste caso, seria que a reação do participante A tivesse punido a rosposta verbal
do participante B, quando este declarou a regra. A análise da rosposta verbal dos
participantes diante da pergunta da pesquisadora durante a Fase III evidencia também
a ausência do controle da descrição verbal do participante B, omitida na partida anterior,
sobre a resposta verbal da dupla diante das solicitações.
Durante as tentativas iniciais da Faso III, a dupla passou, também, a selecionar
o azul como a poça correta aponas após a exposição às contingências, na terceira
tentativa. Os dados evidenciam que a declaração verbal do participante B na quinta
sessão, do fato, não teria adquirido controlo sobro as respostas vorbais ou não verbais
da dupla, antes da exposição a outras contingências.
Curioso notar a declaração do participante B após a terceira tentativa da sexta
partida:
PB- Então, ou o azul ou o rosa está certo. Ê o azul. Eu falei desde o começo, Você
não entende £ tudo o azul Ela (pesquisadora) sempre vai usar o azul Isso se
repetiu também. A gente não escreveu
A descrição indica quo as próprias perguntas apresentadas pelo pesquisador
poderiam tor funcionado como dicas sobro as contingências do jogo, podondo, tambóm
ser interpretadas como mandos, que controlariam a resposta de observação dos
participantes, ampliando o controlo dos estímulos não verbais.

200 M.iri.i Miiitlhi (,'ost.i I lübncr, l\it>l«i I spósilo tlc Almciil.i, IVdro Hordini I dlciros
Em síntese, o desempenho dos participantes parece sugerir que o controle de
respostas verbais sobre não verbais, e vice-versa, ocorre gradualmente, sofrendo a
interferência de diferentes fatores, como a história prévia dos participantes em situações
semelhantes, a presença e as características do agente Instrucional (no caso, a
pesquisadora), ou a presença de outros fatores que possam punir a formulação da regras.

Parte 2- Análise do desempenho verbal e nào verbal da dupla de participantes CD


Uma análise das respostas verbais dos participantes durante as três partidas
iniciais sugere, também, que desde a Linha de Base, os participantes descreviam as
contingências do jogo, revendo e manipulando constantemente o tabuleiro. Diante da
imposição do problema no jogo, mais de um curso de ação era possível em diferentes
momentos.
Na primeira partida, durante a quarta tentativa, podemos acompanhar a soguinte
descrição verbal dos sujeitos sobre as peças no tabuleiro:
PD O azul lá certo
PC- Ou vermelho Vamos manter o azul o mudar o vermelho, porque acertamos só
uma cor e perdemos um lugar. Vamos colocar o amarelo pra ver se foi a diferença
que a gente fez ou o rosa
PD Coloca o amarelo...
PC- Al, esse deve ter porque a gente tirou e vamos colocar verde aqui. Qual outra
cor? Se bem que nós introduzimos uma cor certa, pode ser o laranja. Ou roxa.
Repete uma dessa cores. Ou pode ser o vermelho.
A escolha por um dos possíveis cursos de ação não parece estar sob forte
controle discriminativo neste momento. A revisão de descrições "registradas" no tabuleiro,
e a manipulação constante das peças teriam, assim, a função de ampliar a estimulação
presente, garantindo o controle de novas respostas, verbais e não verbais. Tais
estratégias de manipulação do ambiente podem ser também observadas na segunda
partida da Linha de Base.
PC- Ok, o amarelo está certo.
PD O azul pode estar cerio...
PC- O que a gente pode fazer è trocar um por um. Mas nào vai dar tempo.
A análise do conteúdo das verbalizações da dupla CD durante a terceira partida
da Linha de Base parece indicar que a tomada de decisões sobre a seleção das peças,
neste momonto, passou a ficar sob controle de contingências aversivas presentes na
situação. Isto porque, "as alternativas em conflito levam a uma oscilação entre formas
incompletas de respostas às quais, ocupando boa parte do tempo do indivíduo, podem
ser poderosamente aversivas" (Skinner, 1953, p. 236).
Terceira partida
(1a sinalização)
PD- Entào, repete o laranja...
PC- Que bom, eu tambôm tive essa intuição.
PD- Pega o verde e põe no lugar do azul e troca as outras duas.

Sobre Comportamento e t'o}?niç«lo 201


PC - Nossa, igualzinho. Tá...Eu ponho o rosa aqui e você põe o laranja

( í sinalização)
PD- Então o verde...

PC- Mas por que você acha que é o verde? Pode ser o azul e o vermelho.
PD- Não, porque não tem duas cores aqui? A gente acertou duas cores de novo.
PC- Tira uma de lugar. A gente sabe que o lugar nâo è esse, porque senão ele
seria repetido aqui... Vai na sua intuição. Você acha que é verde?

Como se nota, as descrições verbais da dupla não mencionam aspectos


relevantes para a soluçào do problema. A frase "Vai na intuição”, sugere quo a descrição
ou a seleção das peças não estava sob controle de estímulos relevantes, dificultando o
acesso ao reforço.
Somente a partir da quinta partida, no entanto, pode-se observar que os
participantes passam a formular regras sobre como manipular as peças do tabuleiro,
para maximizar as possibilidades de reforços.
Quinta partida
(Segunda sinalização)

PD -A gente podia tentar fazer um meio termo dos dois.


PC- Como assim? Colocar o azul no canto e ver se ele entra em algum lugar?
PD -A gente usou essas quatro cores. Pegar três cores e o amarelo.

Sexta partida
(Primeira sinalização)
PD -Amarelo.
PC- Verde? Não sei se essa ó uma estratégia inteligente. A gente troca metade do
jogo de uma vez. Precisa de mais uma pra saber qual 6 de verdade. Mais duas, na
verdade.

A Tabela II apresenta o registro das respostas verbais dos participantes diante


das porguntas do experimentador, após as seis partidas. Uma análise do conteúdo das
descrições verbais da dupla CD parece sustentar a hipótese de que o desempenho dos
participantes durante as partidas iniciais do jogo tenha sido ao acaso.
Interessante notar que o desempenho dos participantes CD tenha sido melhor
nas primeiras do que nas últimas partidas do jogo. Pode-se supor que a descoberta da
solução nas primeiras tentativas tenha sido ocasional e, portanto, nâo tenham sido
extraídas da situação dicas que pudessem controlar a resposta solução em próximas
ocasiões, om um menor número de tentativas.
Ao mesmo tempo, a primeira resposta dos participantes à pergunta do
pesquisador na Fase I indica que a dupla seguia também uma “falsa" regra, considerando
como estimulo relevante para a resolução do problema a ordem com que o pesquisador
dispunha os pinos brancos e pretos no tabuleiro após cada jogada da dupla.

M .ir iii M .ir th .i C'osl,i I lü bn cr, l\io lii f spósllo tie A lm e id .i, Pedro Ilo rd in i K ileim s
Como indica a resposta à última pergunta (Fase III) a função da peça azul como
peça na posição correta não foi, em nonhum momento, descrita pelos participantes.
Uma análise das verbalizações espontâneas emitidas por eles durante as seis partidas
indica a ausência do controle da condição programada pelo experimentador (peça azul
sompre na mesma posição) sobre o comportamento vorbal e não verbal dos participantes.

Tabela II - Respostas verbais dos participantes CD após as seis partidas do jogo.

PERGUNTAS DO RESPOSTAS DOS PARTICIPA


EXPERIMENTADOR NAS
DIFERENTES FASES
EXPERIMENTAIS
Fase Controle/ Partida 4 O que "Prestar atençáo naa "Eu (PD) comecei a "As primeiras jogamos mais
vocés aprenderam »obre o que pedras e descobrir qual raciocinar após o quinto na sorte, na Intulçflo,
fa /er para ganhar o jogo? era o lance disso aqui. jogo Antes, estava iudo Imaginando como
que tinha alguma ordem meio aleatório (pesquisadora) misturaria
(a ordem am que a Começamos a descobrir o as cores. Nos últimos
pesquisadora racioclnto do logo pelo passamos a usar mais
apresentava os pinos final, por Isso a gente se raciocínio, olhando
brancos e pretos após complicou NAo estávamos tabuleiro Quanto mais
cada jogada dos prestando atenção no jogo Intuitivo a gente ficou,
partlcipantea)" ainda Se a gente tivesse melhor foi ”
errado, entendendo o que
estàvamoe errando no
começo, em vez de Ir no
aleatório, talvez no final a
gunte entendesse e fosse
mais rApido"
Fase Controla) Partida 5 O que 'Quando comecei a "É um jogo de esUatégit* li
"Fnrtou uma «»ttatòym tio
vocés aprenderam »obre o que pensar demais, foi o na sorte é arriscado Tem jogo desde o começo
nflo fs/n r f>ara ganhar o jogo? momento que fiquei matemática pensar a nstraiAgin Talvez
e Jogar
mais confuso numa
Talvez intuitivamente è mais fácil terceira |ogadn
seja meio contiaste do errar no chegasse a uma conr.lusfto
final sem
anteriorMus tentar a partir das duas primeiras
conseguir Apesar da gente
Logo na segunda jogada
racionaliza o jogo. fiquei ter provado o contrário" Se
confuso o n*o gente invertia 60% do jogo,
fui nflo checarmos as jogadas
andando pra frente" anteriores, em vez de trocar i
perdemos
trocava duas peças Isso
informações para próximas
jogadas" abre mulias possibilidades
Acho que um erro de
estratégia foi tonlnr
adivinhar o mais rrtpldo
|K>»Blvel A gente contou
muito com a sorte"
F aie Controla/ Partida 8 - Do "Se n to fosse pela ultima etapa, o nosso rendimento foi linear Foi o mais
Inicio ao fim do jogo, o que se constante Eu nflo vejo nada igual"
manteve Igual?

Tal como para os participantes da dupla AB, a presença de uma rogra anterior
sobre a situação de jogos fica evidente na segunda partida:
PC - Temos um lugar e uma cor
PD - Vamos chutar aleatório... Verde
PC - Ela nâo iria repetir a mesma cor, a nfío ser que ela quisesse enganar muito a
gente
O dado permite supor que, novamente, a presença de uma regra prévia sobre
as contingências mantidas em outros jogos, poderia ter dificultado a descrição de uma
nova contingência, em que uma cor se repete propositadamente na mesma posição.

A partir dos resultados apresentados pelas duas duplas de participantes,

Sobre Comportamento e Cotfniçilo 203


podemos supor que a emissão da resposta solução durante o Jogo de Senhas parece
ter maior probabilidade de ocorrência quando acompanhada por descrições verbais de
aspectos relevantes para a solução do jogo.
Na condição mantida para os participantes da dupla AB, a descrição das
contingências do jogo pode ter sido favorecida por perguntas do experimentador, que
solicitava aos participantes que emitissem respostas verbais sobre o jogo, completando
sentenças do tipo "SE...ENTÀO”. O desempenho destes participantes parece ter sido
melhor do que os da dupla CD, que não recebeu nenhuma solicitação direta para
descrever verbalmente as contingências vividas.
Não se pode dizer, no entanto, quo os participantes CD não descreveram as
contingências do jogo durante as partidas, mesmo sem a solicitação do pesquisador.
Comparados os desempenhos das duplas, o pior desemponho de CD poderia ser
devido ao fato do não haver sido estabelecida uma estratégia regular de manipulação
do tabuleiro, diferente do que se pode acompanhar no caso dos participantes AB. A
descrição de estímulos irrelevantes para a solução do problema pode também ter
contribuído para o pior desempenho dos participantes CD durante as partidas.
Interessante notar que a função da peça azul foi descrita apenas por uma das
duplas (AB) e, mesmo assim, não parece ter estabelecido controle imediato sobre as
respostas não verbais dos participantes. Talvez, a condição mantida no jogo, caracterizada
polo rospondor dianto de poças dispostas polo experimentador, possa tor diminuído a
probabilidade de que os jogadores descrevessem rapidamente contingências sob
controle de outros estímulos - como a posição da peça em diferentes partidas. Mesmo
quando a descrição verbal desta contingência foi estabelecida, as características da
situação de jogo parecem ter evocado regras anteriores sobre outros jogos, que teriam
dificultado a emissão de respostas verbais e não verbais adequadas às novas condições.
Futuros estudos poderiam aprofundar a discussão aqui iniciada, a partir da
programação de um maior número de tentativas em cada fase experimental, e da
manipulação de solicitações do experimentador que obrigassem a descrição de
diferentes contingências do jogo.

ESTUDO 2
Pesquisas experimentais baseadas no jogo dilema do prisioneiro (Prisoner's
Dilemma) têm sido alvo de investigação desde a década de 60 (ex. Rapoport e Chammah,
1965). Para Reboreda e Kacelnik (1993), este esquema é interessante devido ao conflito
entre o comportamento que leva a uma média máxima no reforçador a longo prazo
("cooperação mútua") e o comportamento que dá a possibilidade do reforçamento máximo
a curto prazo ("delatar" dá um ganho Imediato maior se o parceiro “cooperar" ou "delatar").2
Em uma simples tentativa no Dilema do Prisioneiro, "delatar" sempre é uma
estratégia que pode produzir maior ganho do que cooperar, além de evitar obter um
número reduzido de ganhos. No entanto, os mesmos dois indivíduos podem se encontrar
mais do que uma vez. Então, a situação estratégica torna-se um dilema do prisioneiro
repetido (Interated Pisioners Dilemma Game - IPD).
Uma estratégia estudada no jogo dilema do prisioneiro repetido é a TIT-FOR-
TAT (TFT). Esta expressão pode ser traduzida como "toma lá e da cá" ou "pagar na

10 tornio "cooperar a 'dalatar" M rio uMIzado* aqui com baaa na tamilnoíogla «ntpf»Qada no |ogo riitana do priaJonutro o nflo com b«wt
noa princípios do comportamonto opefanlu

204 M.iria Miirth.i Co*l.i I lübner, Puola Kspóslío tic Almeida, 1’cdro Uimlml l.ileiros
mesma moeda". Na estratégia TFT, em uma tentativa se o jogador “A" optar por cooperar,
om uma tontativa, na próxima tontativa o jogador HBMemitirá uma reposta reciproca
também cooperativa. Se o jogador "A" delatar em uma tentativa, o jogador “B" também
emitirá uma resposta reciproca de delação na próxima tentativa.

JOGADOR A
COOPERAÇÃO TRAIÇÃO

COOPERAÇÃO

TRAIÇÃO

Figura 3. Escolhas e resultados do jogo do Dilema do Prisioneiro Cada jogador tem duas alternativas
("cooperação" e “delação") Quando A e B cooperaram, ambos ganham 3 pontos cada A ganha 4
pontos quando "delata” e B "coopera", não recebendo nenhum ponto Esta relaçáo de pontos se
reverte quando B “delata" e A "coopera" Quando os dois escolhem delatar ambos recebem um ponto.

Analistas do comportamento (Silverstein, Brown e Rachlin, 1998; Baker o Rachlin


2001) têm investigado o efeito de estímulos discriminativos no jogo diloma do prisioneiro.
Porém, ainda não foram feitos estudos, por analistas do comportamonto, que modem o
ofeito do regras ou instruções como estímulo discriminativo no jogo dilema do prisioneiro.
O objetivo do estudo 2 foi Avaliar o efoito de instruções sobro a escolha da estratégia
de "cooperação", utilizando o jogo Dilema do Prisioneiro Ropetido, na estratégia TFT.

MÉTODO
PARTICIPANTE
Uma estudante universitária, com 21 anos do idade, foi submetida ao jogo diloma
do prisioneiro. A participante estava no último poríodo do curso do letras com ênfase na
língua inglesa. O conhecimento om lingua inglesa ora um critério do inclusão na pesquisa,
pois as informações contidas no momento do jogo estavam programadas na língua inglesa.

EQUIPAMENTO E MATERIAL:
O equipamento utilizado foi um microcomputador AMD-ATHLON com monitor
Sansung com 17 polegadas e um teclado. Uma cartolina preta cobria as teclas do
computador, deixando visível para a participante, somonte as que ela usaria para o jogo.
( "barra de espaço”, “enter" e "Q").
O software utilizado foi o PSYCHOLOGY ON A DISK: Interactive Actvities for
Psychology 4.0®. Há neste software 14 tipos de atividades voltadas à aprendizagem do
conceitos básicos om Psicologia. A atividade utilizada no presente experimento foi o
programa donominado Cooporação o Competição (Cooperation and Competition).

Sobre l'omport.imenlo e Cognifilu 205


PROCEDIMENTO:
Na figura 3 estão traduzidas para o português as informações contidas na tela
do computador, roferontes ao "jogo" que a participante foi submetida. Este ora o modolo
disponibilizado à participante em uma folha de papel, caso ela tivesse alguma dúvida
com as informações me inglês contidas na tela do computador.

META * 30 TKN I ATIVAS


SKDS K K S I AN TK S l*< )T( )S
nr
P ONTOS
Mw

SUAS OPÇÕES OPÇÕES DE M.W.

DAK I PARA M IM DAR I PARA M IM

DAR 1 PARA O OUTRO DAR 1 PARA O OU I RO

Barra do espaço para mudar sua opção


“Enter" para aprovar sua opção
Digito O para desistir

Figura 4 Répttca traduzida para o português das tnformaçOes apresentadas na teta para a participante
experimental, antes do inicio do jogo.

A tontativa começava quando a participante escolhia na sua parto da tola (SUAS


OPÇÕES), entro DAR 1 PARA MIM ou DAR 3 PARA O OUTRO. Ao clicar a barra de espaço,
uma destas duas opções ficava marcada com uma sombra. Após escolha ontro as
duas opções tor sido feita bastava clicar a tecla "Enter” para ganhar o (s) ponto (s). Ao
fazer a escolha DAR 1 PARA MIM, um ponto ora adicionado no contador da participante
(quadro a esquerda no alto da tela). Ao escolhor DAR 3 PARA O OUTRO, trôs pontos
eram adicionados no contador de M.W (computador) no alto da tola á direita.
Após a adição dos pontos no contador, o computador fazia sua escolha (OPÇÕES
do M.W,). Sempre na primeira tentativa, a escolha programada ora DAR 3 PONTOS PARA
O OUTRO Nas tentativas posteriores o computador estava programado para fazer as
escolhas na estratégia TIT-FOR-TAT. O computador, com exceção da primoira tentativa,
estava programado para fazer a escolha recíproca na próxima tontativa, conforme a
escolha da participante na tentativa anterior (modelo N+1).
Após as oscolhas foitas pelo computador, pontos poderiam ser adicionados no
contador da participante ou no contador do próprio computador. O valor a ser adicionado
nos contadores dependia da escolha feita na tentativa anterior pela participante e também
pela oscolha do computador.
Caso a participante escolhesse DAR 1 PARA MIM na primeira tentativa, ela
ganharia 4 pontos, pois o computador estava programado para escolhor DAR 3 PARA O
OUTRO. Porém, na próxima tentativa, a oscolha feita polo computador seria DAR 1 PARA
MIM, pois a rosposta era reciproca à escolha do participanto na tontativa antorior. Então,
se o jogador continuasse a insistir em escolhor DAR 1 PONTO PARA MIM, nas próximas
tontativas, ele só ganharia 1 ponto, pois o computador também faria a mosma escolha.

206 M.iri.i M.irlli.i C'ost.i \ lübner, P.iol.i |-sp4*ito de Almeld.i, Pedro Hordinl I .ilelros
A tentativa torminava quando no quadro no alto e ao centro da tola indicava o
número de tentativas restantes. No inicio da sessão o número 12 era apresentado
neste quadro, indicando o número de tentativas que a participante teria para obter a
meta de 30 pontos. Na medida em que as tentativas iam ocorrondo o número decrescia
até chagar a zoro. Acima do contador da participante, havia ainda o número do pontos
(META=30) que ela tinha quo obtor nas 12 tentativas.
A participanto poderia cancelar a sessão a qualquer momento, clicando a tecla
"Q" Esta opção foi considerada no presente exporimento, pois a participante poderia no
decorror da sessão cornotor algum tipo de erro ou discriminar a estratégia do jogo no
meio da sessão o optar por cancelar a sessão. Caso ela abortasse a sessão, a pontuação
seria aquela obtida ató a última tentativa antes da sessão ser cancelada.
Após a exposição às 12 tontativas de cada sessão ora apresentada á participante
uma informação na tola indicando término da sessão. As sessões duravam em média
de um a dois minutos. Este tempo foi diminuindo no docorrer do experimonto, devido à
familiaridade da participante com o jogo. Ao fim de cada sessão era entregue a
participante uma folha que solicitava que ele respondesso qual tinha sido a estratégia
utilizada para que ela obtivesse o maior número de pontos.
A participante foi submetida a duas fases experimetais: linha do baso (3 sessões)
e instrução em prol da cooperação (9 sessões). Cabe salientar, que na segunda fase
houve très tipos de instrução pró cooperação, devido ao padrão de respostas verbais e
não verbais da participante por escolher mais por "delatar" do que “cooporar"

1* Fase - Linha de Base.


O objetivo da linha de base foi medir a freqüência das respostas da participante
em dar pontos para a ola ou para o seu parceiro. Três sessões foram realizadas nesta
linha de base. Caso a participanto atingisse os 30 pontos na primeira sessão ela seria
dispensada do experimonto. Porém se a participante não atingisse a meta de 30 pontos
no em trôs sessões, ola era submetida à segunda fase do experimento.Todas as
informações referentes ao jogo eram dadas antes do inicio do jogo, com exceção da
estratégia de TIT-FOR-TAT do computador e das palavras "cooperar" e "delatar", que
não forma mencionadas em nenhum momento, nem antes e nem durante as sessões.
Pós-sessão: Ao término do cada uma das sessões o exporimontador ontrava
na sala e entregava uma folha à participante com a seguinto porgunta: Qual foi a sua
estratégia para obter pontos?

2" Fase - Instrução - cooperação.


Ao todo seis sessões foram realizadas nosta segunda fase. O objetivo desta
fase era fazer com que a participante ficasse sob controlo da contingência TFT o passasso
a emitir um maior número de repostas cooperativas em rolação ãs sessões de linha de
baso. Antes do início da sessão a seguinte instrução era aprosontada:
Para que vocô atm/a a meta, ô necessário também que M. W. de pontos a você.
Porém, a resposta de M. W. depende da sua resposta Isto quer dizer que a estratégia
de M W. ó feita com base na sua Ele lhe dará pontos dependendo de qual ó sua
estratégia de obter pontos Portanto, se você lhe der fiontos ele também lhe retribuirá
cooperando com você.

Sobrr ( ‘omporl.imenfo c Cofiniç.lo 207


Pós-Sessão: Nesta nova fase foi adicionada uma outra instrução que tinha por
finalidado fazer com que a participante emitisse suas respostas do acordo com a estratégia
utilizada por M.W (computador). Uma nova pergunta, além da já feita na linha do base, era
feita da seguinte maneira: Qual foi a estratégia de M.W. para lhe fornecor pontos?
Como podorá ser visto na sessão do rosultados, a instrução descrita acima
não foi suficionto para que a participante passasse a optar, na maioria das vozes por dar
3 pontos a M.W. Após 3 sossõos uma nova instrução foi formulada pelo experimentador
e entroguo a participante, com o seguinte conteúdo.
A sua mela pura ser bem sucedida no jogo ò obter trinta pontos (30), mas vocô
sozinha, nâo consegue obter estes pontos, ó necessário também que M W. do
pontos a vocô Porém, a resposta de M W depende da sua resposta Isto quer
dizer que a estratégia de M W é feita com base na sua Ele lhe dará pontos
dependendo de qual è a sua estratégia de obter pontos. Portanto, se vocô lho der
pontos, ele também retribuíra dando pontos a vocô
Duas sessões foram realizadas após esta instrução e novamente a maioria das
respostas da participante foi dar um ponto a ola mesma, nâo atingindo a meta de 30 pontos
na sossâo. Uma nova instrução foi formulada, desta vez, contondo as seguintes informações:
Dar pontos para M.W ó a melhor maneira para obter os trinta pontos (30).
Como poderá ser visto na sessõa de rosultados, esta instrução promoveu a
escolha de "cooperação" por parte da participante. Em todas as tentativas ela optou por
DAR 3 PARA O OUTRO.

ANÁLISE DOS DADOS


Os dados foram analisados com base nas porcentagens de escolhas por
"cooperar” e no número de tentativas em cada uma das sessões. Também foram analisados
os pontos máximos obtidos em cada uma das sossõos que a participante foi submetida.

Resultados e discussão
Os resultados serão apresentados em gráficos e serão apresentados os
dados obtidos durante as sessões da primeira e segunda fase para a
participante e para M.W.
No gráfico estão apresentadas as porcentagens do escolhas "cooperativas"
feitas pela participanto, nas sessões a que foi submotida durante o exporimonto. As trôs
primeiras sossões referem-se á linha de base. As sessões de 4 a 9 roforem-se a
sogunda fase na qual foram dadas instruções om prol da cooperação. As linhas
tracejadas indicam o momento em que as instruções foram dadas. Ao todo trôs tipos
diferentes de instrução em prol da "cooperação" foram disponibilizadas à participante.
A porcentagem de escolhas por “cooperação" variou ontro as sessões. Nas
trôs primeiras sossões (linha de base) não houve um padrão estável na porcentagem
do oscolhas cooperativas. Na segunda fase do experimento (instruçâo-cooporação),
quando houve instruções prol da "cooperação", a variação dependeu do tipo do instrução,
nâo havendo também um padrão estável na porcentagem das escolhas.
A variação das ocolhas "cooperativas", segunda faso, podo ter ocorrido polo fato
de sorom diforentos uma das outras. Entretanto, o acesso à própria pontuação e a
pontuação do outro teve um papol fundamental nas escolhas envolvendo instrução.
Para atingir 100% de escolhas "cooperativas" era necessário fazer 12 oscolhas
em DAR 3 PARA O OUTRO Se a participante escolhesse nas 12 tentativas por "cooporar",

208 M.iri.i M.irth.i f lülmcr, l\tol<i I spmjto do Almoid.i, 1'cilro Rordlnl I .ilelros
ela obteria 36 pontos. Cabe ressaltar, que a meta a ser atingida em cada sessão era de
30 pontos. Para atingir esta meta bastaria a participante escolher 8 de 12 tentativas, a
opção DAR 3 PARA O OUTRO, que ela obteria 31 pontos (66.6% de escolhas
''cooperativas"). (Ver tabela 3)

SESSÕES
Figura 5 - porcentagem das escolhas “cooperativas" feitas pela participante em cada
uma das sessões realizadas.
O númoro máximo possivel de ser obtido em cada uma das sessões era de 37
pontos Caso a participante escolhesse nas 11 tentativas por “cooperar" e na última por
"delatar" (DAR 1 PONTO PARA MIM), ela poderia obtor 37 pontos no final da sessão. Na
última tentativa o computador faria a escolha conforme a escolha da participante na
penúltima tentativa (N+1). A escolha da participante por "cooperar” na 11a tentativa,
produziria uma escolha “cooperativa" do computador na 12* tentativa. Portanto, na 12“
tentativa a participante poderia ganhar 4 pontos. No ontanto em nenhuma das 9 sessões
em que a participante foi submetida, a quantidade de pontos chegou a 37.
A obtenção de 37 pontos em uma sessão produzia um valor máximo de ganhos
à participante. Porém esta pontuação máxima nâo significava 100% de cooperação.
Escolhas por sempre cooperar produziria no máximo 36 pontos. A tabela 3 mostra o
número de tentativas escolhidas de "cooperação" e “delação" e o número máximo de
pontos obtidos em cada uma das 9 sessões que a participante foi submetida.

Tabela III - Relação da quantidade de escolhas entre "cooperação" e "competição" e


número de pontos obtidos em cada uma das sessões do experimento.

N
°DÈTEN
T
o' C
OOPERAÇÃO'p W PONTOS
sessA j OBTIDOS
I 1* 5 7 25
f *j 2« 7 5 29
3* 1 11 17
4" 8 4 31
5" 0 12 15
il e* 1 11 17
11 - 7* 4 8 23
2* 8* 3 9 21
9* 12 0 38

Sobre Comportdmento c Cogniçdo 209


Nas trôs sessões de linha de base, a porcentagem de escolhas “cooperativas"
foi de 41.3% , 58.3% e 8.3%, na primeira, segunda e terceira sessão respectivamente.
O número de pontos obtidos variou de 29 (segunda sessão) a 15 (última sessão).
Escolhas por "cooperar" variaram entro 1 e 7 tentativa e por delatar entre 7 e 11. Somente
na segunda sessão o número de escolhas por "cooperar" foi maior do que “delatar".
Após ter terminado a primeira sessão, ao responder a pergunta sobre qual
tinha sido a sua estratégia para obter um maior númoro do pontos, a participante
mencionou que no inicio optou por teclar a opção DAR 3 PARA O OUTRO, mas quo optou
na maioria das vezes por dar pontos somente a ela. Na segunda sessão a participante
mencionou que havia misturado as duas opções, pois afirmou que teclando na opção
DAR 3 PARA O OUTRO ola obteria mais pontos.
A participante nesta segunda sessão desconsiderou a possibilidade do obter
um maior número de pontos escolhendo "cooperar", afirmando: "mas quando ou vi que
estava ompatando o jogo, voltei para a 1* opção DAR 1 PARA MIM". Mesmo obtendo um
maior número de pontos, o que indica que ela "cooperou" mais que "delatou”, o relato
pós-sessão da participante mostrou que ela estava procurando ganhar mais pontos
que M.W. e não "cooperar". Este relato demonstra que a participante começou
"cooperando" e depois passou a "delatar"
Após a terceira sessão, a participante relaltou que somente optou pela opção
"DAR 1 PARA MIM" e ainda completou afirmando: "acho que estou ganhando". Esta
terceira sessão em relação às outras duas anteriores da linha de base fol a que houve
um menor número de escolhas por "cooperar”.
Hake, Vukelich e Kaplan (1973) afirmam que seres humanos freqüentemente
emitem respostas que produzem pontos do seu próprio desempenho ou do
desempenho dos outros. Estudos têm demonstrado que, quando contingências
competitivas estão em vigor, ter acesso a pontuação do outro, produz um aumento na
freqüência da resposta dos participantes. (Hake, Vukelich e Kaplan, 1973; Vukelich e
Hake, 1973 e Schmitt, 2000)
Em relação às sessões de linha de base, os dados apresentados na Figura 2
e na Tabela III corroboram com a afirmação dos autores mencionados no parágrafo
acima. Com a exposição à pontuação do outro, a participante ficou sob controle da
pontuação do outro, mais que obter um maior número de pontos. Este controle fica
evidente, quando na terceira sessão, ela menciona que optou mais pela escolha DAR 1
PARA MIM e ainda afirmou que estava ganhando o jogo.
O controle de estimulo antecedente sob o qual a participante estava neste
momento, era a pontuação do outro e também sob controle da conseqüência que eram
os pontos produzidos no seu contador.
Estes dados não replicam as afirmações propostas pelos Sociobiologistas
interessados em estudar a reciprocidade (Trivers, 1971; Axerold e Hamilton 1981). Estes
autores defendem que a repetição na estratégia TIT-FOR-TAT promove a "cooperação"
associado a fatores biológicos como média de expectativa de vida, mobilidade relativa
e saúde dos indivíduos. Porém, analistas do comportamento têm estudado as relações
envolvendo "cooperação" no jogo dilema do prisioneiro com base nas contingências de
reforçamento.
Porém, Axerold e Hamilton (1981) afirmam que na estratégia TIT-FOR-TAT,
quando há um número de alternativas definidas, a possibilidade de delatar,
principalmente na última tentativa, podo produzir escolhas pela "delação". Como o jogador
sabe que aquela é última tentativa, "delatar" produzirá mais pontos do que "cooperar",
caso o jogador tenha "cooperado na penúltima tentativa".

210 M.iriit Miirthii Coshi I lübncr, P.iol.i tspósito ilc Almeidu, Pedro Rordini hilelros
Analistas do comportamento (Reboreda e Kacelnik, 1993; Green, Price e
Hamburger, 1995; Silverstein, Brown e Rachlin, 1998; .Baker e Rachlin 2001; Stephens,
Mclinn e Stevens, 2002; Vi e Rachlin, 2004) têm demonstrado o efeito de estímulos
antecedentes e conseqüências na promoção da cooperação no jogo dilema do
prisioneiro repetido, quando a estratégia jogada ó TIT-FOR-TAT.
A quarta sessão foi a primeira da 2" fase a ser realizada, a participante obteve
31pontos, "cooperando em 8 tentativas (66.6%), atingindo pela primeira vez a meta que
era de 30 pontos.
Provavelmente a instrução em prol da cooperação, apresentada antes da
sessão teve efeito sobre a escolha da participante. Nesto caso poderíamos dizer que a
instrução teve uma função discriminativa sobre o comportamento de escolha pela
“cooperação" da participante. Ela passou a optar mais por dar pontos a M.W. que dar
pontos a ela. Porém, novamente a participante estava sob controlo de ganhar mais
pontos que M.W. O relato da participante após a sessão, ao responder a pergunta foi:
"Primeiro eu teclei DAR 3 PARA O OUTRO, porque eu achei que dando três pontos, eu
iria ganhar mais pontos do que M.W. Mas eu vi que estava empatando o jogo, então só
teclei na opção DAR 1 PARA MIM, pois só assim eu acumulava pontos."
No relato acima, a participante mostrou qual foi a sua estratégia para obter
pontos, porém ela estava esquivando do empate com M.W. O importante ainda era obter
mais pontos que M.W. A participante estava mais sob controle desta auto-regra e é claro
das conseqüências imediatas em dar pontos a ela e obter mais pontos que M.W, do que
a regra proposta pelo experimentador, mesmo alcançando a meta proposta.
Torgrud e Holbom (1990) e Amorin (2001) afirmaram que o comportamento
verbal tem efeito sobre o não verbal quando as conseqüências que controlam o não
verbal são fracas ou não discriminadas. Quando as conseqüências do comportamonto
não verbal são opostas às conseqüências descritas pelo comportamento verbal o as
conseqüências do comportamento não verbal são fortes e discrimináveis, o
comportamento verbal não tem efeito sobre o não verbal.
Em uma revisão considerando os estudos realizados com objetivo de investigar
o efeito do comportamento verbal sobre o não verbal correlacionado, Amorin e Andery
(2002) fizoram a seguinte afirmação:

De acordo com os resultados de pesquisa apresentados, o controle verbal sobre


a resposta descrita è mais provável quando contingências em vigor para as
respostas não verbais exercem um fraco controle discriminativo sobre padrões
de respostas não correspondentes com a descrição verbal. A depender destas
contingências, respostas verbais e não-verbais permanecerão ou não sob controle
exclusivo de suas conseqüências diretas, (p. 37)

Na quarta sessão do presente experimento, a instrução foi efetiva em fazer com


que a participante atingisse a meta, mas nâo que ela pudesse mudar o seu relato verbal
em dizer que dar pontos ao outro jogador poderia ser a melhor estratégia para atingir a
meta. Ela ainda permanecia dizendo que dar um para ela fazia com que ganhasse mais
pontos que o computador
Este mesmo relato continuou a ser emitido na quinta e sexta sessão om que
novamente a participante passou a optar em escolher somonte a opção DAR 1 PARA MIM”.
A porcentagem de escolhas cooperativas feitas pela participante na quinta e sexta sessões
foram respectivamente 0% e 8.3% (uma escolha “cooperativa"). O resultado da sexta
sessão foi o mesmo que a terceira sessão (última sessão da linha de base). Novamente

Sobre (.'omportamento c CoRnifilo 211


a conseqüência imediata produzida pela escolha em dar um ponto para si mesma e os
contadores mostrando que ela obtinha mais pontos que o computador demonstrou que
ela estava mais sobre controle destas contingências e do que a regra dada pelo
experimentador. O resultado obitdo na quinta sessão, em que a participante não emitiu
nehuma escolha por cooperar pode ter sido produzido pelo efeito da sessão anterior. Na
quarta sessão, participante "cooperou" mais que "delatou". Segundo o seu próprio relato,
o computador (M.W.) estava obtendo o mesmo número de pontos do quo ela, então ela
passou a dar um ponto para ela, pois esta estratégia impedia M,W de alcançá-la. Portanto,
na quinta sessão, a participante escolheu 100% das vezes dar um ponto para ela mesma.
Pelos pontos obtidos nas sessões e pelos relatos apresentados nas folhas de
respostas, parecia que atingir a meta tinha sido deixado de lado, ou nunca havia tido
efeito sob a participante. Não importava a ela a maximização global dos pontos, mas
sim vencer o computador.
O experimentador elaborou uma nova instrução, que dava um destaque a mota
a ser atingida. A nova instrução acrescentava em relação a anterior o fato de que a
participante teria que obter trinta pontos para ser bem sucedida no jogo.
Esta nova instrução não teve efeito sobre o comportamento de escolha da
participante. Houve um pequeno aumento nas respostas cooperativas, mas insuficiente
para atingir os trinta pontos. Ela obteve 23 pontos na sétima (33.3% de escolhas
"cooporativas") e 21 pontos na oitava sessão (25% do escolhas cooperativas)
Novamente, o relato da participante era de preferência pela opção DAR 1 PARA
MIM. Ela ainda afirmou: "às vezes por erro, descuido. Eu teclei na outra opção DAR 3
PARA O OUTRO, mas eu prefiro optar somente em DAR 1 PARA MIM
Novamente o experimentador mudou a instrução e a apresentou a participante
antes da nona sessão, com o seguinte conteúdo: Dar pontos para M W ô a melhor
maneira para obter os trinta pontos (30).
A diferença nesta nova instrução em relação às outras foi à maneira direta do
seu conteúdo, com mais clareza e mostrando exatamente qual era a maneira que a
participante teria que desempenhar. Foram retiradas ainda as informações que descrevia
qual era a estratégia do outro jogador para dar pontos à participante.
Após esta instrução, na nona sessão, a participante escolheu 100% das vezes
em cooperar, optando por dar três pontos ao computador. Em todas as tentativas. Como
a resposta do computador ora recíproca a participante escolheu pela cooperação
exclusiva entre os jogadores em toda a sessão. Ao responder a questão pós-sessão a
participante mencionou que M.W. havia obtido a mesma pontuação que ela e que desta
vez ela havia obtido o maior número do pontos e atingido a meta. Porém, não mencionou
se havia feito a melhor estratégia ou não.
Estudo em analise do comportamento têm demonstrado que instruções claras e
precisas são mais eficazes na emissão de comportamento em relação a instruções amplas
e vagas, que por sua vez controlam mais comportamento do que a total ausência de instrução
(Bramm & Mallot, 1990). A extensão e a complexidade de uma regra também podem interferir
nas escolhas por respostas não verbais (Albuquerque, Ferreira e Darwich, 2001)
Em relação à questão que foi inserida na folha de perguntas. E qual foi a estratégia
de M. W. para lhe fornecer pontos? Em nenhuma das folhas a participante respondeu
qual era a estratégia de M.W. Ela continuou apenas relatando o que estava fazendo para
obter pontos.
Os dados apresentados no Estudo 2 mostram que os efeitos do comportamento

Maria Marlha C\wta I lübner, P.10I.1 tspósito tic Almeida, Pedro Bordini hilriros
vorbal sobre o não verbal podem ocorrer dependendo da forma om que a instrução é
dada e do efeito de outros estímulos discriminativos que ocorrem concomitante a esta
instrução, além do efeito das conseqüências.
Os estudos realizados por analistas do comportamento têm enfocado ou
caractoristicas dos eventos antocedontos ou dos eventos conseqüentes. Novas
pesquisas podoriam investigar os efeitos de ambos ao mosmo tempo, alterando valores
das consoqüências e as formas das instruções. Este estudo também apresenta
contribuições para o estudo dos efeitos do comportamento vorbal nos padrões do
escolha no jogo dilema do prisioneiro, revelando o poder da instrução clava e precisa,
quo doscreve o desempenho esperado.
Os estudos envolvendo o jogo do diloma do prisioneiro, realizados por analistas
do comportamonto, não têm focado no efoito de instruções ou regras sobre as escolhas
entro 'cooporar o "delatar",Perguntas ainda restam, com base nos dados obtidos no
Estudo 2, como por exemplo: Qual seria o padrão de respostas da participante caso
houvesse um número maior do tentativas nas sessões? O quo ocorreria se o aceso a
pontuação do outro fosse retirada no decorrer das sessões? o estudo 2 possibilita uma
discussão para que novas pesquisas nesta área possam ser realizadas.

ESTUDO 3
Instigadas pelas descobertas rolativas aos efeitos de comportamonto verbal
sobro o não-verbal, Hübnor o Dias (2002) realizaram um estudo om que pretendiam
vorificar, om uma situação considerada mais "natural" (uma conversa fluonte entre duas
pessoas), as possibilidades de mudança no hábito de ler de algumas crianças que
apresentavam baixo interesse pela leitura. Para tanto, empregaram o reforçamento
diferencial (aceno de cabeça, sorriso, elogio) de falas com autocllticos qualificadoros
positivos sobre a leitura ( falas pró- leitura ). Os resultados obtidos indicaram que, após
as sessões de reforçamento diferencial das falas pró- leitura, os participantes
aprosentaram aumento no tempo de dedicação à leitura. As autoras concluíram quo o
comportamento não verbal pôde ser modificado em sua freqüência pelo reforçamento
do comportamento verbal favorável a ele.
Neste sentido, o Estudo 3 tem como base o experimonto de Dias & Hübner
(2002), Hübnor (2003), verificando o efeito do comportamonto verbal sobre o não-verbal.
O comportamonto a ser modelado no prosente oxporimento, entretanto, diferentemente
do de Hübner e Dias, ó a prática de exercícios físicos. Nas sessões de reforçamento
diferencial foram reforçados tacUfc^ualificadores positivos sobro exercício físico,
enquanto nas sessões do oscolha de afividades foi observada a froqüôncia com quo a
prática de exercício físico foi escolhida em relação a outras atividades, observando-se,
assim, o ofeito do comportamento verbal sobre o não-verbal.
A pergunta que direcionou o experimonto foi se o procodimonto de reforçar
diforencialmente a fala na direção de obter verbalizações que descrevam as
conseqüências positivas do se fazer exercícios físicos possuem ofeitos semelhantes
àquolos observados na pesquisa de Hübner e Dias (2002), ou seja, se o dizer tom
conseqüências diretas sobre o fazer.

Sobre Comporf.irnenlo e Copnlçdo 213


MÉTODO
PARTICIPANTES
Dois participantes fizeram parte do estudo. Os dois eram estudantes universitários,
um do sexo fominino, do 20 anos e outro do sexo masculino de 21 anos. O critério de
soleção dos participantes foi a falta do regularidado na prática do oxercicios físicos.

LOCAL
A colota do dados ocorreu em dois ambientes: em uma sala semelhanto a uma
sala do estar, com duas poltronas, em que o experimentador e o participante sentavam-
se fronte à fronte, e orn uma sala adjacente a um espelho unidirecional, especialmente
montada para as sossõos experimentais.

ESQUIPAMENTO E MATERIAL
Os participantos foram observados em ambos os ambientes através de uma
máquina filmadora VHS.
Na sala do ospolhos, havia um sofá, uma bicicleta orgométrica, colchões para
a prática do exercícios, halteres, uma televisão, um videocassete, um vídeo foito por
uma professora de Educação Física e revistas.

PROCEDIMENTO
Os participantes foram selecionados segundo o critério anteriormente descrito,
o convidados a participar da pesquisa o solicitados a lorom a Carta do Informação e
preencherem o Termo de Consentimento Livre e Estabelecido segundo determinação
do Ministério da Saúde, resolução 198/96.
O procedimento foi composto pelas seguintes fases:
Fase I- Linha de Base
Esta etapa tovo como objotivo obsorvar a escolha dos participantos por atividades
relacionadas à prática de exercício físico em rolação a outras atividados. Consistia na aprosontação
de trôs situações de escolha, sendo duas delas práticas sedentárias e uma, não.
As atividades que podiam ser executadas pelo participante nas sessõos
exporimentais eram : 1) ler revistas sobre assuntos diversos que não estivessem
rolacionados a atividades físicas; 2) assistir a urn vídeo sobre oxercicios físicos; 3)
roalizar atividade física; 4) assistir vídeos de entretenimento; 5) ler apostilas instrucionais
sobre origami; 6) fazer origami; 7) combinar quaisquor destas atividados.
Os pesquisadores iniciavam a sessão dizendo ao participanto:
"Aqui você tem a possibilidade de fasor algumas atividades. Aqui, nossa estante, há
várias revistas Se você quiser ler, pode ler Aqui tem vários videos (ler o nome dos
videos). Tem musical, seriados, desenhos... Se você quiser, vocô pode assisti-los
Há também fitas sobro exercício físico. Se você quiser, você pode fazer os exercidos
aqui (aponta os colchões e a bicicleta) E também há revistas do origami. Têm
papéis aqui (aponta a mesa) se você quiser fa/er origami Você também pode
combinar quaisquer destas atividades ou mudar de uma para outra. Vocô vai ficar 10
minutos aqui Durante esse tempo, você pode fa/er o que você quiser"
Os comportamentos dos participantos eram registrados por uma câmora de
vídoo o também havia experimentadores registrando as oscolhas "atrás do espolho",
bom como sua ordem de escolha, caso mais de uma atividade fosso executada.

214 M .ul .1 M.irtlhi ('ost.i I lübncr, hiol.i I spóslto ile AlmcliLi, lYdro Horillnl I .ilolrus
Cada sessão durava aproximadamento 10 minutos, existindo tolerância de um
tempo extra, caso os participantes ainda estivessem realizando alguma atividade. As
sessões eram individuais e ocorriam tantas vezes quanto fossom necessárias, de
forma que se verificasse uma estabilidade na Linha de Base. Por estabilidade, nesse
caso, definiu-se que o participante apresentasse, em trôs sessões consecutivas, a
oscolha de quaisquor atividades excetuando-se a atividade física, ou que nessas três
sessões o participante ficasse apenas 20 sogundos realizando exercício físico.
Era registrado om cada sessão o tempo em quo os participantes
permaneciam ongajados em cada atividade .

Fase II - Reforçamonto diferencial dos Tactos sobro atividado física.


Durante a semana soguinte, duas vezos por semana, durante 5 a 10 minutos,
eram aprosontadas fotografias quo ilustravam a prática de atividados físicas aos
participantes (fotos de pessoas nadando, correndo ou fazendo uso do instrumentos quo
tambórn ostavam presentos na sala de espelhos, como halteres o biciclota orgomótrica).
Foram apresentadas novo fotos relativas a exercício físico.
Para haver um contrabalanceamento, também foram apresentadas novo
fotografias das outras atividades diversas que poderiam ser realizadas na sala de espelhos,
como do pessoas fazendo origami, lendo revistas ou assistindo vídeos, de forma a permitir
o reforçamento diferencial dos tactos om relação às fotos de atividades físicas.
No momento em que as fotos eram apresentadas, uma por vez, ora solicitado ao
participante quo descrevesse a figura ao experimentador e que dissesse o que achava da
prática da atividade ilustrada na imagem:
“Descreva esta figura, contando o que a pessoa está fazendo e o que você acha
disso“.
As sessões de reforçamento diferencial eram realizadas em seguida ( duas ) e
não havia sessões de escolha do atividades entre elas.
Esta foi uma modificação a mais em relação ao ostudo de Hübner e Dias (2002).
Naquele ostudo, as sessões do roforçamonto de falas oram entremeadas corri sessões
do observação do comportamento não-verbal. Avontou-se a possibilidado de quo as sessões
do reforçamento, que se seguiam ás de observação, poderiam ostar "reforçando" o
comportamento não-vorbal da sessão que as antocodeu, pelo fato de que oram agradáveis
o vinham logo depois daquelas em que o participante havia emitido o comportamonto não
vorbal om estudo (no caso, a loitura, no estudo de Hübner e Dias, 2002).

Fase III- Pós-teste I


Na semana seguinte, os participantes voltavam à sala de espelhos duas vezes
por semana para a mesma situação de escolha aprosentada anteriormente e as
mesmas observações da linha de base eram realizadas,
Se o comportamento de fazer oxercicios físicos não ocorresse após as duas
sessões de obsorvação, mais duas sossões do reforçamento diferoncial oram
realizadas o, em seguida, mais duas sessões de observação, ou soja, a seqüência
Sessão I e Pós Toste era repetida.

Sobre Comport.imenlo e C'ogolv<1o 215


Fase IV- Instrução Completa
Se na fase de Pós Teste I o comportamento não verbal relativo à realização de
alguma atividade fisica não ocorresse, os participantes tinham mais duas sessões do
10 minutos, na qual a mesma atividade da Linha de Base era solicitada. Entretanto,
dessa voz, os participantes recebiam,antes de ontrarom na sala, uma INSTRUÇÃO
explicita:
"Entre na sala e faça exercício físico, nem que seja um pouco".
Fase V- Instrução com anúncio do contingência não verbal
Na semana seguinte, os participantes, foram novamente à sala de espelho,
sendo submotidos à mesma situação de oscolha apresontada na Linha do Base e no
pós-teste I, durante 10 minutos. Antes de entrarem na sala, rocobiam a seguinte instrução:
"Entre na sala e faça exercício físico, nem que seja um pouco.
Se você fizer, você ganhará 30 reais.”

Resultados e discussão
Ambos os sujoitos (P1 e P2) não omitiram o comportamento de fazer exercícios
físicos, soja na Linha de Base, soja após as sessões do reforçamento diforencial das
falas positivas sobe as atividades físicas.
Podo-se considerar, observando as Figura 5 o 6, quo não houve 100% do
reforçamento das falas positivas nas sessões de reforçamento diferencial, o que pode
ter influenciado na não emergência de atividade fisica na Fase de Pós Testo 1. Em
outras palavras, para algumas falas positivas sobre o exercício físico não houve
reforçamento por parte do experimentador. Para P1 isto ocorreu 40% das vezes na
primeira sessão e 20% das vezes na terceira sessão. Para P2 o não roforçamento das
falas positivas sobre exercícios físicos ocorreu, em média, 50% das vezes.
Na etapa de Instrução Completa, notou-se um aumento da freqüência de
exercícios fisicos, para os dois participantes ( P1 passou a sentar na bicicleta ergométrica,
assistir videos de ginástica e P2 já permaneceu 100% do tempo alongando-se).
Na etapa de Instrução com anúncio de contingência não verbal, ambos os
participantes permaneceram 100% do tempo realizando atividados físicas.
Os resultados indicaram que o reforçamento diferencial do comportamento
verbal não foi suficíonte para que o comportamonto não verbal relacionado omorgísse.
Foi aponas após a fase de instrução completa e da que anunciava a liberação do
roforçadores não verbais generalizados contingontes ao fazer exercício físico quo este
comportamento ocorrou.
O controle discriminativo o contingências não verbais oxistontes em relação à
atividade física (por exemplo, o alto custo da respostas de so exorcitar em uma sala
poquena, com baixa ventilação o pessoas obsorvando) pode ter predominado sobre o
controle verbal que 3e esporava conseguir com o reforçamento diforoncial dos autoclíticos
qualificadores positivos. A instrução, ontretanto, mostrou-se condição suficiente para
que o comportamento não verbal emorgisse, sendo mais poderosa quando anunciou
conseqüências com roforçadores generalizados poderosos.

216 M ari.i M .irfh .i Cost.i I lübucr, l\io l.i I spóslfo ilc A lm elil.i, IVtlro Honlini I .iloiros
120,0%

| 40,0%

f 20,0%

|§ 0 ,0%
Sessão 1 Sessão 2 Sessão 3 Sessão 4

Figura 5: Porcentagem de tactos conseqüenciados positivamente 9obre


tactos com autoclitlcos qualificadores positivos omitidos na sessAo
(R/Ap%), para o participante P1
de reforçam ento
Porcentagem

Figura 6: Porcontagem do tactos consoqüenclados positi\«menle sobro tactos


com autoclíticos qualificadores positivos emitidos na sessAo (R/Ap%), para o
participante P2

Pós Testei Instrução Instrução


completa com anúncio
de
contingência

Figura 7: Tempo dispendldo por participante em atividades


relacionadas a exercícios físicos nas diversas etapas do experimento

Sobre Comportamento c Cogni(do 217


Considerações Finais
Embora realizados em contextos muito diferentes, os estudo apresentam pontos
comuns: todos foram realizados com adultos: os Estudos 1 e 3 foram feitos em
contingências controladas, envolvendo respostas relacionadas ao cotidiano das
pessoas (Estudo 1 - resolução de problemas o Estudo 3 - prática do exercícios físicos.)
Os Estudos 1 e 2 envolveram respostas cooperativas. No Estudo 1 - os participantes
tinham que se comunicar e cooperar entre eles para obter o resultado esperado. No
Estudo 2, a participante tinha que emitir uma resposta ’’cooperativa" com o computador
para obter o maior número de pontos. Em todos os casos, poróm, o efeito do
comportamento verbal sobre o não verbal, na forma de instrução ou regra, ocorreu.
Mas o conjunto dos três estudos revela também que o controle do comportamento
verbal sobre o nâo verbal depende de várias condições, podendo ser forte, mas também
fraco quando se tratar de "modelagem” do comportamento vorbal. Tanto no Estudo 2, como
no Estudo 3, as instruções tiveram um claro controle sobro o comportamonto não vorbal.
A história prévia verbal do participante mostrou-se uma variável relevante (Estudo
1), tanto na formulação de novas regras, como na discriminação das contingências não
verbais envolvidas. Em situações em que a discriminação não verbal mostrou-se mais
difusa ou complexa, o controle pelo verbal ocorreu, havendo a superioridade da eficácia
da instrução sobre o roforçamento diferencial de falas (modelagem), uma questão que
a literatura ainda nào tem clareza (Catania, Matthews and Shimoff ,1982, Hübner, 2003.).
A complexidade da tarefa não verbal determinou também o tipo de controle verbal que é
necessário: o Estudo 2, principalmente, revela que neste caso, a instrução deve ser a
mais explícita possível, no que diz respeito às contingências em vigor, corroborando
dados da literatura ( Bramm & Mallot 1990).
O custo da resposta não verbal estudada também mostrou-se uma condição
importante: se ele é alto, o controle verbal só se mostrou eficaz via instrução direta e
sobretudo quando esta instrução especificava claramente as contingências, anunciando
reforçadores generalizados poderosos.
Estudos posteriores são necessários, visando ao aumento da generalidade
dos resultados (replicar com crianças, por exemplo) e controles mais sofisticados na
situação experimental, estando, dentre eles, o controle da história de vida dos
participantes e rigor na instalação do controle discriminativo anterior à introdução dos
estímulos verbais.

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Sobrc ComporUimrnto c Cognitfo 219


Capítulo 18
Intervenções preventivas no transtorno
de estresse pós-traumático e sua
eficácia
Felipe Corchs,
Cortscicntiii, A M U A N
Mariângeld C/ciitil Savoia
Conscicntid, A M B A N ) , f C M S d n td Cdsd.

Ansiedade é uma experiência universal da espécie humana. É uma emoção


desconfortável que os seres humanos experienciam em resposta a um perigo que os
preparam para enfrentar uma situação, emitindo comportamentos que reduzem ou
previnem a ocorrência de situações semelhantes. Desta forma, a ansiedade é necessária
para a nossa sobrevivência e para nossa integridade física e psicológica. Em
contrapartida, a ansiedade é também um sintoma predominante de um grupo de
condições chamadas de transtornos ansiosos. Os principais sinais e sintomas da
ansiedade "patológica" são compartilhados pelos indivíduos normais e sujeitos
ansiosos. Cada um desses transtornos tem características diferentes, desencadeantes
diversos, mas o tratamento combinado - Terapia Cognitivo Comportamental e
farmacoterapia é o mais eficaz para todos eles (Lader & Bond, 1998).
Dentre esses se inclui o Transtorno de Estresse Pós Traumático (TEPT), no qual
indivíduos que sofrem deste transtorno vlvenciaram ou testemunharam um evento estressor
traumático que envolve ameaça à integridade física, própria ou de outros. DSM IV-TR
Segundo Hans Selye (1936), o estresse é a resposta do organismo às
demandas a ele impostas. Todos os organismos, das bactérias aos homens, sào
expostos a riscos no curso de suas vidas como destruição do seu próprio organismo ou
do seu "nicho” social. Dessa forma, foram selecionadas espécies que apresentavam
mecanismos para lidar com mudanças significativas no seu ambiente interno ou externo,
ou soja, os estressores.
O medo e a ansiedade, estados emocionais proximamente relacionados, são,
portanto um logado evolutivo que permite ao indivíduo enfrentar situações ameaçadoras,
próximas ou distantes, e desta forma evitar a própria destruição. Seguindo este raciocínio,
a ansiedade envolve entào um conjunto de respostas, operantes e respondentes, que
maximizam o desempenho do organismo em situações de estresse.
Os estressores a que são subm etidos os seres hum an os podem ser
caracterizados como: eventos vitais versus eventos traumáticos e estresse crônico
versus estresse agudo.

f-cltpr Corchs, M.iridnflcl.i C/cnfil S«ivoii»


Os eventos vitais constituem situações também pontuais e altamente
estressantes porém sem ameaça iminente a vida ou integridade física. Como exemplo
dessas situações temos perda de empregos, términos de relacionamentos, grandes
perdas financeiras, entre outros. O impacto do evento vital para os sujeitos depende da
história de vida de cada um, pois o que foi aprendido como ameaçador para uns pode
não o ser para outros. Já os eventos traumáticos, por definição, causam sofrimento a
todos os sujeitos a oles expostos. Em casos como passar do carro ao lado de um
acidente com vitimas graves por si só não é considerado como um evento traumático, a
possoa deve vivenciar a experiência com fortes emoções conformo descrito acima.
Dovomos ainda diferenciar o trauma agudo o pontual, seja traumático ou ovento
vital, do ostrosso crônico como, por exemplo, ambientes profissionais muito tensos,
dificuldades conjugais, problemas financeiros, doenças crônicas, entre outros. Note-se
que sâo situações diferentes do eventos traumáticos repetitivos como ocorro em
situações de combate ou o abuso sexual continuado de uma criança por um familiar.
Esses eventos podom ser vivenciados pela possoa que aprosonta os sintomas
ou por uma possoa próxima. Ter um filho soqüestrado, por exemplo. O impacto do
evento estressor goralmonto causa respostas subjetivas importantes como medo, horror,
sensação de desamparo o impotência. Os tipos de eventos mais comuns diferem
quanto ao gênero. Para os homens são: acidentes, combate, testomunhar violência o
morte, já para as mulheres, estupro ou violência sexual, violência física. Eventos
traumáticos modificam regras sobre controle, segurança e evitação da dor e do
sofrimento.
Uma vez vivida uma dessas oxperiências traumáticas, alguns outros critérios
devem ser preenchidos para que o diagnóstico de transtorno do estresse pós-traumático
(TEPT) se estabeleça. As principais classificações diagnósticas em psiquiatria
determinam que os sintomas do transtorno persistam por pelo menos um mês após a
ocorrência do trauma. O motivo para existência deste critério, é o fato de que, as reações
a uma situação de ameaça iminente a existência sejam altamente adaptativas do ponto
de vista evolutivo conforme descrito no inicio doste texto Desta forma, os sintomas
presentos por menos de um mês são chamados de transtorno do estresse agudo
(American Psychiatric Association, 2000) ou até mesmo de reação aguda ao estresse
segundo a décima edição da classificação internacional de doenças da organização
mundial de saúde (CID-10, OMS, 1992), retirando do nome a palavra transtorno o
enfatizando uma reação "normal" aquele evento.
O transtorno é pouco diagnosticado, acredita-se que pela minimização o negação
dos sintomas por parte dos pacientes, por falha na obtenção de uma história de trauma
pelos profissionais de saúde e pelo alto índice de quadros comórbidos associados,
cerca de 80% dos indivíduos com TEPT sofrem de alguma outra patologia psiquiátrica.
O curso deste transtorno é flutuante, podendo haver remissão o recrudescimonto dos
sintomas ao longo de anos e pode haver também sintomas residuais - que não
preenchem os critérios para o diagnóstico do TEPT, os sintomas depressivos o ansiosos
predominam em relação aos sintomas intrusivos o do esquiva (McFarlane, 2000).
Sabor o que determina o desenvolvimento de um transtorno psiquiátrico podo
auxiliar na intervenção e principalmonte na prevenção de sua ocorrência. O que levaria
alguém a desenvolver TEPT segundo McFarlane 2000 ó falta do habilidade do indivíduo
para modular a resposta ao estresse agudo e rostabelocer a homeostaso psicológica
o biológica. A natureza do ovento traumático, sua controlabilidado o intensidade
determinam a severidade e a prevalência de TEPT . Kessler (2000) ainda relatou que

Sohrc Comporíiimcnto e 221


om paísos subdesenvolvidos, ou com histórico do guerras torrorismo, violência e
desastros naturais, oxistom maiores chances de exposição a situações traumáticas
são prováveis dosenvolvimontos de TEPT, mas números não são mencionados
Os autores (Foa, Zimbarg & Rothbaum 1992) onfatizaram quo a falta de controlo
o a impossibilidade do prover as situações traumáticas, seriam fatoros chavos no
dosonvolvimento da sintomatologia do TEPT. O problema de diferonciação ontro os
limitos do sogurança, faz com que o individuo viva sempre om ostado do ativação das
estruturas de medo. Em contra partida, Fairbank e Nicholson (1987), afirmaram quo a
tendência ao negativismo e incontrolabilidade não são dotorminantos e sim a
incapacidado do onfrontamonto. Os mesmos autores acroditam quo, polas
caractorlsticas do problema podem ocorrer diforontes tipos do ostratógias do controle.
Se existe a possibilidado do mudança as ostratógias são focadas no problema, quando
não há porspoctivas cio mudança as estratégias são focalizadas na omoção envolvida.
A momória tambóm ó um fator que influencia o desonvolvimonto do transtorno.
Turnbull, Campbell e Swann, (2001), apontaram quo indivíduos que não possuíam
lembranças traumáticas aprosentavam maiores sintomas de ostrosso comparados
aqueles que se lembravam da situação traumática, indicando que a ausência do
lembranças não impodo o desonvolvimonto do TEPT. A forma como o evento traumático
ó avaliado tambóm ó importante, pois varia de possoa para pessoa. Foa o Rothbaum
(1998), om sous estudos, apontaram que memórias quo foram interpretadas
erroneamente refletem maior patologia. Essa estrutura patológica onvolvo uma sórie de
sintomas físicos o respostas de fuga e esquiva alóm do uma intorprotação orrônoa
sobre o mundo e sobre o que é perigoso.
A exposição a situações traumáticas tem prevalência elevada 50 a 90% dos
adultos já torem vivido ao menos uma experiência traumática em suas vidas (Kesller,
Sonnega, Bromet, Hughes & Nelson, 1995). Apesar disso, apenas 9% dolos
desenvolverão TEPT, ou seja, continuarão a ter sintomas clinicamente significativos por
mais de um mês. Porém, sabemos que nas primeiras semanas após tais ovontos,
90% dos indivíduos apresentam sintomas significantes o que nos lova a crer que apesar
de muito frequentes e muitas vezes assustarem os profissionais de saúde, os sintomas
pós-traumáticos agudos tendem a diminuir naturalmente na maioria dos casos.
Tendo em vista os relatos acima, que tipos de medidas podom sor adotadas
para provonir que o sujoito oxposto a uma situação traumática desenvolva TEPT ou ao
monos tornar sua evolução menos grave?
Podemos entonder quo tanto o TEPT quanto o transtorno de estresse agudo são
quadros comploxos onvolvendo amplamonto a idéia do ostado omocional. Os modelos
teóricos tanto biológicos quanto psicológicos ainda não são congruentes na explicação
do dosenvolvimonto do TEPT. Savoia e Vianna (2006), os aprosontam informando a
relevância de cada um deles principalmente no que diz respeito a tratamento. Dentre
ossos modolos o aqui a ser enfatizado é o comportamental onde os procedimontos do
condicionamento clássico aliado a reforçamento negativo explicam a resposta de esquiva,
diminuindo, assim, uma provável exposição a condições semelhantes no futuro, Ao mosmo
tempo em quo diversos comportamentos abortos do fuga o esquiva são observados
nossos pacientes, existe uma diminuição marcada na frequência do comportamentos
reforçados positivamonte. Isso tudo ocorro juntamonte com uma infinidade de
comportamentos respondentes como, por exemplo, aumento da frequência cardíaca e
contração dos capilares porifóricos e que teriam funções adaptativas aumentando as
chances do sobrovivência do organismo conforme discutido acima.
A comploxidado não tormina por ai, dada interação de aspoctos verbais,
encobertos, operantes o respondentes, quo cria uma intrincada rodo do contingências

f clip c C '» rd)s, M .ir i.ln flc l.i l/ e n t il S,ivoi<i


cornumente observada nosta condição. Podomos usar como exomplo, os sintomas de
esquiva. Neste grupo do sintomas, além dos comportamentos abertos de esquiva que
são descritos, existem outros como “evitar pensamentos e sentimentos relacionados
ao trauma" e a anestesia afetiva, que podem ser compreendidos aqui como formas de
esquiva encobertas. A hipótese do que experiências privadas possam adquirir
propriedades avorsivas já foi apontada anteriormente por autores como Skinnor (1953)
e Sidman (1989) Tais vivências seriam segundo alguns autores, condições
antecedentes suficiontes para que comportamontos de esquiva ocorressem, idéia que
vem sendo chamada do "esquiva experiencial" conforme denominação de Hayes o
colaboradores (Hayos, Wilson, Gifford, Follet, & Strosahl, 1996). Sugorimos ao leitor
interessado que leia Banaco ot al. (Zamignani & Banaco, 2004) para uma discussão
mais aprofundada sobre o assunto.
Algumas teorias do aprendizagem existem para o dosonvolvimento de rnodolos
etiológicos no TEPT (por exemplo Nauglo & Follet, 1998). Dentro elas, uma nos chama
a atenção dado o tema deste toxto. Recentemente, alguns artigos têm suportado a
hipótese de que sujeitos que preenchom critérios diagnósticos para TEPT demorariam
mais a extinguir rospostas aversivas condicionadas do que aqueles também expostos
a condições traumáticas, mas que não desenvolvem TEPT (Guthrio & Bryant, 2006).
Nesse sentido, podoríamos supor que modidas precoces que tivessem como objetivo
extinguir respostas condicionadas relacionadas ao trauma podoriam ter um papel
preventivo, evitando a progressão e manutenção dos sintomas a médio e longo prazo.
Continuando a seguir este raciocínio, o simples falar sobre o evento tem sido encarado
como uma classe de respostas que envolvo estímulos equivalentes aos do trauma em
si, e pode portanto represontar por si só um papel terapêutico nos traumatizados (Wilson
& Blackledge, 1999) uma vez que tal exposição e a oxtinção das respostas relacionadas
a mesma parece se transforir através dos membros de uma classe de estímulos
equivalentes (Dougher, Augustson, Markham, Greenway, & Wulfert, 1994).
Essa idéia é verdadeira principalmente em indivíduos que já preenchem critérios
para TEPT por manterem os sintomas por mais de um mês. Apesar disso, o tema deste
artigo é a intervenção precoce no traumatizado psicológico, o qual onvolve algo mais
complexo e inoxplorado conforme discutido adiante.

Intervenções preventivas
Tendo om vista que dos transtornos montais o TEPT é o que mais claramente
se identifica o fator desencadeante da primeira manifestação, pode-so pensar em
intervenções preventivas, ou seja, após a exposição a um trauma as pessoas passariam
por um procedimento de intorvenção para quo não desenvolvessem a patologia.
Antes de iniciarmos a discussão sobre o quo existo na literatura sobre intervençõos
provontivas psicossociais para o TEPT, achamos prudente esclarecer o conceito de
provonção focado no toma om quostão. O fato de intorvenções voltadas a indivíduos já
expostos ao trauma e muitas vezes sintomáticos pode deixar algumas pessoas confusas
sobre o por quo isso está sondo chamado de prevenção e não de tratamento. Realmente,
a forma mais eficaz de prevenção é aquela que chamamos de provonção primária e neste
caso consistiria om modidas quo diminuíssem as chances dos indivíduos ontrarem om
contato com situações traumáticas como, por exemplo, oducação de motoristas,
campanhas do direção provontiva e modidas para diminuição da violência.
Dentro da torminologia médica, uma voz que a exposição ao trauma ocorrou, já
não podemos falar em prevenção primária. Por outro lado, o tratamento só seria um

Sobre (.'omporti mento e ( o^ni^lo 223


tormo adequado se o indivíduo preenchesse critérios para TEPT, o quo só ocorre após
um môs de manutenção dos sintomas. Neste período entre a ocorrência do evento
traumático o a passagem do tempo necessário para se diagnosticar o TEPT, qualquer
intervenção no sentido de diminuir a chance do quadro se manter ao longo do tempo ou
inosmo de diminuir sua gravidade futura ó chamada de prevenção secundária. Prevenção
socundária do TEPT é uma intervenção após o evento traumático antes do
desenvolvimento do TEPT.
Não precisamos discorrer muito sobre o fato do quanto soria importante para
governantos e empregadoros se dispuséssemos de modidas proventivas secundárias
para o TEPT. Profissionais até mesmo civis que inevitavelmonto ontrassem em contato
com situações traumáticas não evoluiriam com quadros duradouros de incapacidado o
gastos terapêuticos do previdenciários. Não é para monos quo alguns dos principais
investidores em pesquisas na área são as forças armadas do grandes potências bélicas,
que estudam o utilizam diversas formas do prevenção.
Uma das formas mais froqüontomonto utilizadas no passado por militaros era um
tipo de entrovista chamada do debrieflng. O tormo, originário da língua inglesa, ó usado
num contoxto mais amplo para expressar uma forma de entrevista na qual se relata
detalhadamonto trabalhos realizados, por exemplo, em urna operação militar. Do ponto de
vista psicológico, se refere a uma forma de intervenção em quo o indivíduo é colocado
quase quo imediatamente numa entrovista sistematizada voltada basicamonto a oducaçào
dos indivíduos quanto aos sintomas quo poderão vivenciar, ensino de técnicas de
onfrentamento, e estímulo á expressão de sentimentos e pensamentos relacionados ao
trauma. Frequentemente ocorre om sossões precoces em até quaronta e oito horas pós-
trauma, tem duração de 2 a 3 horas, com variações técnicas e de aplicação. Inicialmente era
realizado em grupo, mas atualmente também pode ser feito individualmente, em encontros
únicos ou múltiplos, etc. Para tais variações, encontramos nomes diversos na literatura
como o "debriefing psicológico" e o “debriefing em incidentos críticos" (Mitchell & Everly Jr.,
1996) porém são todas variações do mesmo tema. Este método, utilizado até o presente
tom resultados controversos (Aulagnier, Vergor, & Rouillon, 2004).
A única forma de debriefing avaliada om estudos randomizados até o momento
foi a de sessão única e individual. Apesar do utilizado sistematicamente por anos, ostos
estudos consistentemonte demonstraram inoficácia do debriefing (ver Van Emmorik,
Kamphuis, Hulsbosch, & Emmelkamp, 2002 para uma meta-analize) ou até mesmo
efeitos negativos para tal intorvenção (Bisson, Jenkins, Alexander, & Bannistor, 1997; Mayou,
Ehlers, & Hobbs, 2000) nos quais os sujeitos submetidos ao debriefing melhoraram
menos a longo prazo (13 a 36 moses) que os não submetidos a ossa intervenção.
Também não se encontrou diferença ontro escores de pensamentos intrusivos e
comportamontos do esquiva ontro os sujeitos que passaram por esta intorvonção o os
que falaram informalmente a seus pares o verificou-se que a intervenção não diminui
substancialmonte o sofrimonto das vítimas (Amir, Weil, Kaplan. Tockor, & Witztum, 1998).
Entretanto algumas vítimas de eventos traumáticos têm percobido o debriefing
positivamente. Essas avaliações podem na verdade representar um ofeito halo "não
específico" originado da apreciação de seus efeitos paliativos como o apoio, presença,
preocupação e empatia diante do sofrimento das vítimas de trauma, quo podem ter
efeitos iguais ou maiores associados a outras intervonções, quo podom até estar mais
prosentos om outros contextos (Devilly, 2002) quo são procedimentos comuns a TCC o
ao "primeiro socorro psicológico".
Além do debriefing. a única outra forma de intervenção psicológica preventiva
estudada de forma randomizada foi a aplicação de sessões de terapia comportamontal-

Íili4 I clipe M .iriantfrLi C/cnlll S.ivoi.i


cognitiva (TCC). Estas consistiam basicamente de educação quanto aos possíveis
eventos do trauma, técnicas de exposição encoberta, reestruturação cognitiva, reversão
de comportamentos de esquiva e treino de técnicas de manejo da ansiedade. Os
estudos que avaliaram a eficácia da TCC em traumatizados tôm, de forma geral, mostrado
resultados positivos para esta intervenção em relação aos grupos controle como a
terapia do apoio e o aconselhamento (ver Ehlers & Clark, 2003 para uma revisão).
Focando a discussão inicialmente nas diversas formas de exposição como
foco terapêutico utilizado na maioria destes estudos, algumas questões controversas
relacionadas à quostão citada acima. Num estudo não publicado (Ehlors & Stoil, 1995
citado em Ehlers & Clark, 2003), os autores apresentaram videos de acidontes
automobilísticos a voluntários. Parte deles foi instruída a lembrar diariamente das cenas
e a falar com outras pessoas sobre a fita por uma semana. O restante dos voluntários
foi instruído a evitar falar, pensar ou vivenciar eventos no mesmo período, que estivessem
relacionados ao assunto, como por exemplo noticiários sobre acidentes, Contrariamente
ao quo observamos em técnicas de terapia encoberta, o grupo que se esquivou
apresentou menos lembranças intrusivas, monos sofrimento e menor aumonto nas
respostas galvânicas quando lembrados do video quo o grupo que se expôs.
Talvez algumas das únicas intervenções psicossociais que tenham mostrado
alguma forma de proteção na evolução em longo prazo ao traumatizado tenha sido o
chamado "primeiro socorro psicológico". Esta se caracteriza por suporte, uma escuta
empática que respeite o limite que o paciente deseja falar, e proporcionar a vitima
orientações e ajuda de ordem prática como garantir sua segurança e facilitar o acesso
a organizações e recursos que possam ajudá-la a obter suas necessidades mais
básicas naquele momento. Além disso, suportes familiares, sociais e até religioso se
mostraram eficazes em melhorar o curso do traumatizado a médio e longo prazo em
diversos estudos, principalmente em pacientes que estavam "motivados" a usar essa
rede (Martin, Rosen, Durand, Knudson, & Stretch, 2000; Pennebaker & 0'Heeron, 1984).
Poderíamos então, estar frente a um segundo fator que eventualmonto justificaria
a ineficácia destas técnicas na prevenção secundária do TEPT. Comportamentos de
esquiva froquentos e generalizados, internações ou imobilidade por eventuais lesões
físicas causadas durante o evento e a porda de entes queridos no próprio trauma
poderiam exercer um papel importante na evolução do quadro uma vez que tendem a
empobrecer o repertorio comportamental do indivíduo com porda significativa de
reforçadores. De fato, existem evidências de que até um terço dos traumas
desoncadeantes de TEPT envolvem a perda de um ente querido como um amigo próximo
ou um parente (Breslau et al., 1998).
Verifica-se portanto que temos dados isolados sobre medidas interventivas
precoces pós-trauma. Porém, pouco se sabe de forma integrada e consistente sobre a
forma de proceder nesta situação.
Ao que tudo indica, as reações agudas após um trauma têm um componente
filogenético importante. Aparentemente estas respostas teriam portanto um papel adaptativo
num primeiro momento, porém, tenderiam a diminuir de frequência e intensidade com o
tempo, Por outro lado, quando estes se mantêm, podemos supor que esta havendo alguma
forma de seleção ontogonética. Seguindo esse raciocínio, faz sentido a idéia de que não
adiantaria simplesmente a aplicação de técnicas “prontas" e breves como prevenção destes
casos de pior evolução se não for identificando o que mantém estas rospostas.
Do que se conclui que mais estudos são necessários para uma compreensão
mais sólida e integrada das medidas de intervenção precoce como por exemplo o

Sobre Comportamento e CogniçAo 225


momento ideal para se iniciar cada tipo de intervenção e a abordagem adequada para
cada indivíduo, de modo que possamos saber a partir de que momento cada intorvenção
psicossocial deixa de ser iatrogônica e passa a ser terapêutica. Da mesma forma, a
investigação do abordagens inespecíficas que vão desde as terapêuticas como higiene
do sono, até cuidados com interrogatórios de rotina, muito comuns em delegacias e
pronto socorros. O contato com possoas relevantes que possam evitar problemas
secundários como perda de emprego e relacionamentos, podem ser tentadas mas
também precisam ser mais estudadas cientificamento.
O que fazer ontão? Aqui vão algumas sugestõos: 1) Nada, ao que tudo indica
estamos falando de uma resposta adaptativa que como regra se extingue uma vez cessado
o estimulo aversivo, ou seja, o indivíduo se ajusta e o quadro não evolui; 2) Estimular
busca de suporto social, uma das medidas com mais evidências de eficácia a longo
prazo. Não devemos limitar suporte social à família, uma vez quo esta também pode ter
sido afetada pelo evento. Uma ampla rede de suporte quo vai dosde amigos até entidades
governamentais e religiosas nos parece mais adequado; 3) psicoeducação sobro o como
obter ajuda de qualquer natureza desde que desojada. Isto inclui informar ao pacionte que
a crença popular de que ele deve "falar sobre aquilo que o angustia", "colocar para fora"
não é necessariamente verdadeira e pode até ser projudicial; 4) tratamento de quadros
comorbidos que estão presentes em até 80% dos casos de TEPT.
Portanto, uma vez que a avaliação clinica parece ser superior a nenhuma
intervenção (Ehlers et al., 2003), acreditamos quo o indivíduo exposto a um evento
traumático deva ser avaliado num primeiro momento, e então submetido a uma
intervenção psicológica intensiva cerca do 2 a 3 meses após o evento so o mesmo
continuar sintomático neste momento. Casos particulares podem ser avaliados para
uma possível intervenção mais precoce mas, ao que tudo indica, nunca antes de dez a
quinze dias pós-trauma. É importante notar nesse sentido, que os principais estudos
quo obtiveram resultados positivos em intervenções psicológicas precoces no
traumatizado, tiveram início em aproximadamente 10 dias ou mais após o trauma (Bryant,
Harvey, Dang, Sackville, & Baston, 1998; Foa, Hearst-lkeda, & Porry, 1995). Além disso, o
tompo de intervenção parece um fator decisivo na eficáfia de tais abordagens visto
ineficácia ou efeito iatrogônico das sessões únicas de debriefing aparentemente
insuficiontes nestes casos.
De forma geral, os dados apresentados sugerem que nem todos os sujeitos
expostos a um evento traumático precisarão de intervenção, de fato, a maioria superara
os efeitos do trauma sem a ajuda de um profissional de saúde mental. Mas tendo em
vista a incapacítação que o transtorno causa ao paciente deve-se investigar propostas
de intorvenção preventivas, para que o custo módico social seja minimizado, e que as
pessoas expostas a eventos críticos possam manter qualidade de vida.

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228 fclipc Cord«, Miirrônflcld C/cnlil Savoia


Capítulo 18
O stress emocional: prevalência e
implicações
M arilda Kmmanuel Novaes Lipp
PUC -Campinas

Stress ó um estado de desequilíbrio do funcionamento desenvolvido fronte a


situações desafiadoras, que levam o organismo a utilizar seus recursos psico-biológicos
para lidar com ovontos que exijam uma ação mobilizadora. Essencialmente, possuí,
em sua génese, a nocessidade do organismo lidar com algo que ameaça sua
homeostase ou equilíbrio interno. Quando os recursos do momento são insuficiontes
devido à vulnerabilidade pessoal, ou à ausência do estratégia de enfrentamento, ou
ainda pela gravidade ou intensidade do estressor presento, o organismo pode ser
afetado em sua plenitude com consoqüéncias graves para sua saúde física ou mental
(Lipp & Rocha, 1996; Magalhães, 2003; Steiner & Perfeito, 2004; Andrade & Lotufo Neto;
2004; Savoia, 2004; Yehuda & McEwen, 2004; Steptoe, 2005).
A reação do stress ó um processo complexo, com componentes
psicobioquímicos já geneticamente programados no ser humano desde o seu
nascimento a fim de ajudá-lo a preservar sua vida. Foi o stress, através de sua ação
adrenérgica, que capacitou o Homem a ficar vivo e se adaptar às mudanças pelas quais
tem passado. É o stross que permite a luta contra os ostressores de cada época. O
stress sempre existiu, porém atualmente parece estar se tornando mais freqüente Em
dosos moderadas, a adrenalina produzida, aumenta a motivação, fornece energia, vigor
e pode resultar em alta produtividade. Em doses excessivas ele tem a capacidade do
destruir o desequilibrar (Lipp & Malagris, 1995, 2001; Ebrecht, Hextall, Kirtley, Taylor,
Dyson & Woinman, 2004).
Alom da saúde, existe evidência do que a qualidade de vida e a sensação de bem
estar o do plonitudo também podem ser afetadas polo stress excessivo (Lovi, Sautor o
Shimomitsu, 1999). O ser humano estressado mostra irritação, impaciência, dificuldade
do se concentrar e de pensar de modo racional e lógico. Irritado, sem paciência e sem
concentração elo não se relaciona bem com as outras pessoas, fica mais agressivo e
menos interessado om assuntos quo não o afetam diretamente. Estando em condições
emocionais tão procárias, sua qualidade de vida deixa de atingir o nível ideal.

Conseqüências do stress excessivo


Conseqüências Físicas
Quando o stross é prolongado, olc podo afotar o sistema imunológico reduzindo
a resistência da pessoa e tornando*a vulnerável ao desenvolvimento de infecções o

Sobre Comportamento e Co#nlv<lo


doenças contagiosas. Ao mesmo tompo porque o organismo ostá enfraquecido,
doenças que permaneciam latentes podem ser desencadoadas. Úlceras, hipertensão
arterial, diabetes, problemas dermatológicos, alergias, impotência sexual e obesidade
podem surgir (Steptoe, Owen, Kunz-Ebrecht & Brydon, 2004).

Conseqüências Psicológicas
O sor humano, cronicamento estrossado, aprosenta cansaço montai, dificuldade
do concontração, perda do memória imediata, apatia o indiferença emocional. Sua
produtividade sofre quedas e a criatividade fica prejudicada. Auto-dúvidas começam a
surgir devido à percepção do desempenho insatisfatório. Crises do ansiedade o humor
depressivo se seguem. A libido fica reduzida e os problemas de ordem fisica se fazom
presentes. Nestas condições, a qualidade de vida sofre um dano bastante pronunciado
e o ser humano so questiona se algum dia será de novo foliz.

Conseqüências Sociais
Uma sociedade saudável e desenvolvida requer a somatória das habilidades
dos seus cidadãos. Se o stress está muito alto no pais, ou na comunidade, os adultos
podem se tornar frágeis, som resistência aos embatos o dificuldades da vida. A possoa
estressada lida mal com as mudanças porque sua habilidade de adaptação está
envolvida inteiramente no combate ao stress. Em um pais em desenvolvimento como o
nosso, onde as mudanças ocorrem em todas as áreas com uma rapidez surpreendente,
aqueles que estiverem incapacitados para lidar com mudanças, certamente não poderão
fazer uma contribuição para o sucesso do país e o bem estar de sua população. Adultos
rosistentes, capazes de pronta adaptação, quo possam pensar do modo lógico e não
estressanto nos momentos mais difíceis de modificações sociais, econômicas, óticas,
políticas e filosóficas são do importância impar no âmbito da sociodade no geral.
Pelas suas conseqüências sociais, a importância que o combate ao stress
assume é de grande relevância em nível de campanhas educativas o preventivas no
âmbito nacional. Reconhecendo esta relevância, foi que a Câmera Municipal de
Campinas através da Lei N° 12.369, publicada no Diário Oficial em 23/09/2005, instituiu
o dia 23 do setombro como Dia Municipal do Combate ao Stress. Existom projetos om
andamonto que pretendem instituir o Dia Estadual e o Dia Nacional de Combate ao
Stress no Brasil.

Tipos de stress

Classificação do acordo com o evento desencadoador:

A roação do stress pode ter sua ontogênese em uma série de estímulos, eventos
ou situações do naturoza muito diferonciada, dosignadas de estressores. Um modo de
classificar os estressores ó ontre extornos e internos. Os primeiros são ovontos ou
condições externas que afetam o organismo. Eles indepondom, muitas vezos, das
características ou comportamento da pessoa, como, por exemplo, mudança do chofia,
mudanças políticas no país, acidentes o qualquer outra situação quo ocorra fora do
corpo e da mente da pessoa. Já os estressores intomos são doterminados
completamente pelo próprio individuo. Eles se constituem do modo do sor da possoa,
so ola ó ansiosa, se ela ó tímida ou depressiva ou se tem distúrbios psicológicos.
Outros oxomplos de estressores internos são: crenças irracionais (Ellis, 1973), Padrão
Tipo A de Comportamento (Hilton & Rotheilor,1991), falta de assertividade e dificuldade

230 M.iriM.i hnm.miK'1 Novues l.ipp


de expressar sentimentos (Lipp & Rocha, 1995; Lipp, 1999). Assim, a reação do stross
pode ocorrer fronto a estrossoros inerentemente negativos, como no caso de dor, fome,
frio ou calor excessivo ou devido à interpretação quo so dá ao evonto desafiador. Deste
modo, o mosmo evento pode desencadear ou não uma roação de stress em pessoas
diferentes dopondondo da intorprotação que cada uma dá ao ovonto, como vom sendo
postulando Lazarus desdo 1966. Do acordo corn Lazarus o Folkman (1984) as atividades
cognitivas usadas pelo indivíduo para intorprotar eventos arnbiontais, são fundamentais
no processo do stress.
Dependendo do que gera o stross, ole adquiro nomenclatura específica, por
oxomplo, a tensão oxcessiva ligada à atividade profissional de uma pessoa, ó dosignada
do "stress ocupacional", enquanto quo a roação do stross oliciada pelos contatos com
outras pessoas, é chamada de “stress interpessoal" e o stross ligado a aspectos da
infância è conhecido como "stress infantil”. Considerando quo cada uma dossas áreas
tem suas domandas e sous estímulos particulares, pode-so supor que a forma com
quo o indivíduo roage fronte aos desafios ó o resultado da somatória das múltiplas
fontes do stress presentes om sua vida, mediadas polas estratégias do onfrontamento
existentos em seu reportório comportamental e pelos recursos oriundos de sua
resistência biológica.

Stress ocupacional:
Várias profissões já foram pesquisadas o foi identificado quo diferentes
ocupações goram níveis de stress diferenciados chogando até a 70% de pessoas
estrossadas em amostras, por exemplo, do juizes do trabalho (Lipp & Tanganelli, 2002).
Verificou-se tambóm quo o índice de stress entro pessoas quo ocupam cargo de chofia
em São Paulo subiu de 40%, om 1996, para 49% om 2004 dontro os 95 indivíduos que
foram avaliados (69 homens e 26 mulheres). Analisando por gènoro, verificou-se quo
32% dos homens e 46% das mulheres da amostra possuía sintomas do stress. No
que se reforo a estudantes, na época do vestibular o índice de stress chega a 45%
entre mulheres e 38% nos homens (Calais, Andrade & Lipp, 2002) e (Lipp, Arantes,
Buriti & Witzig, 2003) verificaram que dentro 255 escolares avaliados, com idados variando
de 7 a 14 anos, 23% das crianças da primeira sério tinham sintomas gravos de stross.
Com relação a professores, Rossa (2004) relata quo em uma amostra do 62
profossores, 58% tinha stress. Uma pesquisa com 13 modolos profissionais (Lipp &
Allegretti, 2004) rovolou que 85% delas tinham sintomas da fase intermediária do stress.
Várias outras pesquisas tom sido publicadas sobre stress ocupacional mostrando a
preocupação atual com a influencia das contingências de trabalho na saúde e bom
estar das pessoas.

Classificação pela periodicidade:


Alom do se levar em consideração o tipo do estressor, outros critérios necessitam
sor considerados no diagnóstico do stress, como, por oxomplo, se elo ó agudo, pós-
traumático, crônico ou recorrente.

Stress Agudo e Stross Pós Traumático:

Stress agudo se rofore à reação com sintomas específicos, que ocorre logo
após um ovento traumático, por um período limitado de tempo. Evonto traumático é aquele
que soria considorado altamonte perturbador pola maioria das possoas. É necessário

Nobre Comportamento e C orm I( i1o 231


levar om consideração o modo especifico do cada pessoa interprotar cada ovonto, pois
as cognições basoadas orn experiências passadas, em muito determinam a classificação
dos acontecimentos como traumáticos ou não. Alem, disto eventos de valor positivo para
a maioria das pessoas podem, pela sua carga emocional, atuar no desencadoamento do
ostrosso agudo, como o choque de uma fosta surprosa, discussão acalorada ou um jogo
de futebol (Carrol et al. 2002).
O Transtorno de Stress Agudo (TEA) está relacionado a sintomas físicos o
psicológicos quo podem surgir devido á intensidado do evento critico exporionciado que
leva a altorações disfuncionais nos sistomas nourológico, endócrino o imunológico. O
estressor, nostos casos, quebra a ordom do mundo prosumido, rompo com as crenças
do controlabilidade, invulverabilidade e imortalidado que om geral o ser humano mantóm
a fim de vivor o seu dia a dia com tranqüilidado (Gregio, 2005).
Quanto às possíveis conseqüências do stress agudo, olas podem ser
dosencadoadas tanto no âmbito psicológico/psiquiátrico, como no físico. Louros,
SanfAnna o Baldatto (2002) apontam a associação ontro stress mental o o aparocimento
e curso do muitas doenças, desde simplos infecções virais, ató úlcoras gástricas e
nooplasias. Por exemplo, no stress agudo os hormônios podom atuar sobre os tecidos
do coração e impedir a contração natural. Arritmias graves podom ocorror com conseqüento
morto súbita. O stross agudo também podo desencadear a ruptura do placas de gordura
nas artérias e levar ao enfarte a outros problemas cardíacos (Strike & Steptoe, 2005).
O aspecto do transtorno de stross agudo mais discutido na literatura se refere
à busca de uma relação entre ole e o transtorno de stross pós traumático Inúmeros
trabalhos mostram quo na ausência de tratamento, o TEA ó um preditor de subseqüente
do Transtorno de Stress Pós Traumático (TEPT) e estudos epidomiológicos sugerem que
de 15 a 24% das pessoas quo passam por experiências traumáticas, desenvolvem o
TEPT (Breslau, 2001). Malagris (2003) menciona um estudo de Gáloa ot al. (2002) com
988 possoas que residiam em Manhattan no bombardeio de 11 de setembro de 2001,
quo detectou a presença de pelo menos um sintoma do TEPT em 57,8% dos entrevistados.
O stress pós traumático pode gerar conseqüências graves para o ser humano,
tanto física como psicologicamente. Kessler (2002), om um estudo epidemiológico, relata
que 88,3% dos homens e 79% das mulheres desenvolvem alguma comobidade
psiquiátrica juntamente com o desenvolvimento do TEPT.
O DSM-IV (1994) acrescentou o diagnóstico de Transtorno do Estrosso Agudo, na
secção de ansiedade, conceituando-o como uma forma aguda do stress pós-traumático.
Há de so onfatizar que existem diferenças conceituais e diagnosticas entre os dois transtornos,
Por oxomplo, no TEA a ênfase ó colocada nos sintomas dissociativos, em que pelo monos
três sintomas do dissociação devem estar presentes a fim de que o TEA possa ser
diagnosticado. Já no transtorno de stress pós-traumático, revisto por Caminha (2005), não
há tanta ônfaso om sintomas do dissociação. Alem disto, se os sintomas persistirem mais
do um môs, ontão, o diagnóstico seria de stress pós-traumático.

Stress Crônico:
Refere-se a um estado de tensão prolongado que podo lovar ao desenvolvimonto
de varias doenças o prejuízos para a qualidado do vida do sor humano. Em gorai, o
stress crônico evolui para fases mais graves do processo do stross (Lipp, 2005). Elo
podo ocorror devido a permanecia do um estressor na história e vida da possoa, dovido
ao acúmulo de estressores ou ainda devido ao stross recorrente.

Stress Rocorrente:
Temos observado ao longo de nossas pesquisas o tratamento clinico do stress,
em um número grande de pacientes, a presença recorrente do quo designamos como

232 M.irilii.i I mm.mucl Novac* l.ipp


temas de vida. Temas estes que se repetem inúmeras vezes na vida dessas pessoas,
sempre gerando um nível de stress excessivo e contribuindo para uma sensação crônica
de fragilidade frente ao mundo. O stress recorrente se diferencia das crises de stress
que podem ocorrer em qualquer pessoa devido a diferentes tipos de es\ressores e não
ao mesmo tipo repetido várias vozes na vida.
Temas de vida não so referem simplesmonte a uma tendência de interpretar os
eventos de determinada maneira, como em um esquema, mas sim de um padrão de
comportamento, de uma necessidade de recriar no presente as mesmas situações
geradoras do stress encontradas no passado, de revivor os seus temas de vida. Temos
tratado pessoas cujo tema de vida é se envolver em situações de traição, de violência,
de rejeição, de demanda ou de cobrança com episódios repetidos e grandes níveis de
stress em suas vidas Ê como se essas pessoas procurassem reviver os temas que
são característicos de suas vidas. Esses temas agiriam como verdadeiros cenários
estáveis nos quais a vida da pessoa se desenrola e onde elas parecem contracenarem
com pessoas diferentes, mas sempre mantendo o mesmo scripL

Algumas pessoas ou grupos seriam mais vulneráveis?


Pessoas biologicamente mais sensíveis, isto é, com uma grande
hipersensibilidade do sistema límbico (Everly, 1989) e que possuem uma história de
vida onde cognições inadequadas foram desenvolvidas (Elllis, 1973). com esquemas
iniciais desadaptativos (Voung, 1999) e com temas de vida estressantes, que não tenham
desenvolvido estratégias de onfrentamento, seriam as mais vulneráveis.

Como os temas são desenvolvidos e mantidos e o porquê da constância de alguns


deles através dos anos e de contextos.
Sugere-se que os temas de vida resultam da interação de vulnerabilidades
biológicas o experiências de vida que moldam as escolhas das pessoas quanto à
busca de experiências, parceiros, oportunidades e atuações. Inicialmente existe a
vulnerabilidade biológica que torna a pessoa mais sensível a determinadas experiências.
Quando elas acontecem na vida da pessoa, a hipersensibilidade do sistema límbico as
torna mais marcantes e duradouras, o condicionamento ocorre com mais rapidez do
que para outros indivíduos . A pessoa assimila aquela situação que ocorreu e que a
estressou e dela mantém uma memória nem sempre multo clara mas que se resume
nos sentimentos de medo, de ansiedade e de stress. Se a situação ó repetida várias
vezes em sua história de vida, o condicionamento se torna mais forte. Mesmo que a
situação seja extremamente estressante, ela é familiar e por isto, talvez, exerça uma
atração sobro a pessoa quo entra, então, em uma busca incessante para dominar a
situação, tentando constantemente refazer o seu tema de vida. Essas tentativas, embora
saudáveis, criam um nível alto de stress, por serem desestabilizadoras. Assim, os
tomas seriam desenvolvidos durante a infância, produto da interação das
vulnerabilidades biológicas e das experiências da vida. Obviamente se eles surgem
como o resultado de um processo de aprendizagem, podem também sofrer modificações
e serem corrigidos, dependendo de novas experiências de vida ou de um processo
terapêutico. Neste caso, seria necessário o ensinamento de estratégias de
enfrentamento, que permitam a redução da excitabilidade do sistema límbico (como
técnicas de respiração profunda e de relaxamento) e que favoreçam a reestruturação
cognitiva. Adicionalmente, a identificação e mudança dos temas de vida que se repetem
no decorrer dos anos deve ser parte fundamental do tratamento do stress emocional
recorrente.

Sobre Comportamento c CoRnivílo 233


O Stress no Brasil:
O Brasil, como todo o país em desenvolvimento, está no centro de um processo
do mudanças intonsas: mudanças de valores, de princípios, de hábitos, de tecnologia,
do pensar e do fazer. Este processo, necessário e benéfico em longo prazo, ó também
a fonte mais importante de stress para o Homem que, de repente, precisa aprender
uma nova maneira de pensar, sentir e agir! E tudo isto, dentro de um tempo muito
limitado.Os estudos sobre o stress emocional no Brasil tôm se multiplicado com grande
rapidez. Dentre eles se encontram principalmente:
a) pesquisas realizadas dentro de instituições de ensino, como as oriundas do
Laboratório de Estudos Psicofisiológicos do Stress (LEPS) da PUC-Campinas, as teses,
dissertações e a produção intelectual de docentes dos programas de pós-graduação e,
até certo ponto, até mesmo da graduação;
b) pesquisas implementadas por organizações não universitárias;
c) ações empresariais que envolvem levantamento do Indice de stress entre funcionários;
d) pesquisas de populações não-clinicas;
e) pesquisas com populações clinicas e
f) atendimentos clfnicos do Centro Psicológico de Controlo do Stress e do outras clinicas
especializadas.
Essas fontes principais de informações podem ser acessadas através de
publicações em anais de congresso, artigos publicados em revistas cientificas, livros,
comunicações em congressos, e trabalhos de meta-análise como, os publicados por
Witter (2003); Cusatis Neto e Andrade (2004) e Benzoni, Carneiro, Ribeiro, Peros, Marchi
e Milaré (2004).
Alem das 55 dissertações e teses sobre stress produzidas na PUC-Campinas,
várias outras universidades tôm dado origem a trabalhos de Mestrado e Doutorado, como
os do: Figueredo (2000), da Universidade Gama Filho; Leal ( 2001), de João Pessoa ;
Souza (2002), da USP-SP; Almeida (2002), da Universidade São Francisco; Magalhães
Neto (2002), da Universidade Católica de Brasília; Cardoso (2002), da USP-SP;
Camelo(2002), da USP-Ribeirão Preto; Páfaro (2002), da Unicamp o Pereira (2004), da
PUC-SP, dentre várias outras. Esses e outros trabalhos tem possibilitado entender de
modo mais profundo as conseqüências do stress emocional no povo brasileiro.
Epidemiologia
O Indice de stress em São Paulo era, em 1996, de 32% conforme demonstrado
em uma pesquisa com 1818 pessoas que transitavam pelo aeroporto de Cumbica o no
Conjunto Nacional, e que se prontificaram a responder ao Inventário de Sintomas
informatizado (Lipp, Pereira, Floksztrumpf, Muniz & Ismael, 1996). Da amostra com
stress encontrada (32% dos entrevistados), 13% eram homens e 19 % mulheres. Esta
pesquisa foi a primeira em nosso meio a indicar que mulheres apresentam mais stress
do que homens. Este índice foi encontrado tambóm, no mesmo ano, no Rio de Janeiro,
Rio Grande do Sul, Paraíba e Campo Grande.
Em 2001, pesquisas tambóm nâo-clinicas com 619 pessoas, na cidade de São
Paulo, demonstram um indice de 21% de stress entre os homens e 41% dentre as mulheres,
mais uma vez mostrando maior índice para o sexo feminino. Este índice de stress sofreu
um acréscimo comparado com os índices dos anos anteriores conforme mostrou uma
pesquisa realizada pelo Centro Psicológico de Controle do Stress, em janeiro de 2004, com
917 adultos (601 homens e 314 mulheres), funcionários de escritório de várias empresas
da cidade de São Paulo, que não ocupavam cargos de chefia e que aceitaram passar por

234 MaiiUIa hmm.inucl Novücs l.lpp


uma avaliação de stress. Verificou-se que 40% do total dos entrevistados tinham sintomas
de stress, sendo 228 homens (38%) e 145 mulheres (46%).

Stress e Doenças
A área em que o stress emocional tem sido mais estudado no Brasil 6 a que
tenta averiguar a contribuição do fator stress para o adoecer, buscando alternativas para
o tratamento e prevenção do stress excessivo como uma estratégia para redução do
risco envolvido om uma série de doenças (Lipp,2004). Novaes Malagris (2004),
posquisando stress e hipertensão, verificou que ao introduzir o fator stress em sou
estudo, se produziu uma redução no transporte de L-arginina através dos sistemas y* e
y+L em pacientes hipertensas estressadas quando comparadas com normotensas
estressadas. Estes achados sugerem que a associação de stress com hipertensão,
afeta mecanismos celulares e abre novos rumos para os estudos do stress emocional.
Os efeitos do TCS nas manifestações clinicas do stress e das doenças, no
contexto das quais foi testado, já eram bastante encorajadores até o presente, mas o
estudo de Novaes Malagris (2004) deu nova dimensão a esta área de pesquisa, pois ,
no contexto de sua tese de doutorado, foi verificado que quando o TCS foi testado em
pacientes hipertensas, nào só houve uma redução do stress em 71,4% da amostra
após o TCS, mas verificou-se também que a redução do stress, pelo treinamento do
controle de stress em pacientes hipertensas estressadas, restaurou os níveis de
transporte de L-arginina através do sistoma y* a níveis obsorvados em pacientes
hipertensas não-estressadas. Assim, o estudo mostrou que o transporte de L-arginina
é altorado tanto pela hipertensão como pelo stress. Como a L-arginina é um aminoácido
procursor do óxido nítrico, é possível que a redução do stress aumente a produção do
óxido nítrico trazendo benefícios para o hipertenso devido aos seus efeitos vasodilatores.
O interesse pela área do stress emocional, no entanto, não se restringe somente
ao âmbito da posquisa ou da clinica. Há um grande interesse atualmente com a
provenção e medidas educativas que possam contribuir para a existência do um ser
humano menos estressado, e, conseqüentemente, uma sociedade mais ajustada e
com melhor qualidade do vida. Embora o estudo do stress esteja recebendo em nosso
meio uma atenção marcante, ainda muito há a se estudar e pesquisar para so
compreender exatamente o mecanismo de ação e de tratamento do stress emocional.

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Sobri* C*nmp»»r1.imcnto c C'ognivilo 237


Capítulo 19
Psicoterapia no tratamento da
Fibromialgia: Mesclando FAP e
ACT.

Marilene de A . Martins
Consultório Particular, Universidade Católica de C/oiás, I lospilal das Clínicas da
Universidade f ederal de C/oiás.
l.uc Vandenberphe
Consultório particular, C/oiânia/ Universidade Católica de C/oiás.

A dor ó conceituada pela Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP,


1986) como uma experiência subjotiva, sensorial, e emocional desagradávol, rosultanto
de urn dano real ou potencial dos tecidos, ou descrita ©m termos de tais losões. Assim
como os danos (supostos ou verdadeiros) que deixam a dor compreensível. Porém, a
dor pode se tornar crônica com ou sem alterações físicas. A dor quando incompreendida
gera medo e mantém a pessoa numa reação de alorta constante.
A contribuição do psicólogo no acompanhamonto do pacientos com dor crônica
se limitou por muito tempo a fornir apoio e treinar habilidades do coping. Há, porém,
diferontes visões teóricas que sustentam paradigmas e oxplicam as divorgôncias nas
práticas clínicas, mas cada uma propõe e contribui na abordagem da dor.
No olhar da Terapia Comportamental Clássica a dor é uma forma de se
relacionar com um meio ameaçador. Faz parte de um sistema complexo de fuga e
proteção, quo dispõe o organismo para se retirar, cuidar de suas losões e evitar lesões
maiores (Sokolov, 1963). Do acordo com esta visão, a dor é um comportamento
respondonto. É uma resposta fisiológica condicionávoi, quando ocorre omparelhamonto
entro o ovento traumático (que evoca a resposta de dor incondicionada) e outros estímulos
(quo originalmente não eram dolorosos por si mesmo). O condicionamento pode
propagar a dor através de diferentes situações de vida. O ambiente de trabalho, a
cadoira onde se senta, ou cortos movimentos podem se tornar estímulos condicionados
quo oliciam dor. Uma vez que a dor ao se tornar crônica, muitas vezes, ola doixa do fazer
sentido para a pessoa, o que aumenta sua qualidade ameaçadora.
A Análiso Aplicada do Comportamento aborda a dor como um comportamonto
oporante sonsívol às contingências, e sujeito a reforço natural e/ou social, é descrita como
comportamonto do dor (Fordyce, 1976). Trata-se dos aspectos da dor que são observáveis
para terceiros. O comportamento de dor inclui expressões e atitudes públicas que fazem
parto dos episódios interpessoais e devem sor compreendidos como operantes.

238 M.irilcni’ ilc A. M.irlins, I ui V.imlenbcrfllu’


Em conjunto, as contribuições do paradigma clássica e do paradigma operante
nos forneceram uma coleção riquíssima de técnicas de tratamento. Enquanto que a
Terapia Comportamental Clássica desenvolveu tecnologias do exposição ao vivo, para
extinguir as respostas condicionadas disfuncionais que mantém a dor (Vlaeyen, de
Jonq, Onghena, Korckhoffs-Hansson, & Kolo-Snijders, 2002), os analistas aplicados
desenvolveram tratamontos que passam pela modificação do contingências de
reforçamento, mudando a forma om que esposa, família, colegas do paciente reagem
aos comportamentos de dor (Fordyce, 1976).
Uma Segunda Onda das terapias comportamontais trouxe o modelo cognitivo
como instrumento principal para o entendimento do funcionamento humano. Na Terapia
Cognitivo-Comportamental vieses cognitivos contribuem para a intensidade da dor.
Atribuições disfuncionais e distorções como a catastrofizaçáo, são trabalhados na torapia.
Assim a roestruturação cognitiva conquistou um papel importante na abordagem da dor
crônica. Há apoio empírico para a eficácia de técnicas cognitivas nas quais o cliente aprende
a lidar com emoções negativas; situações estrossantes; pensamentos mal-adaptativos; e
vieses cognitivos (Thom, Boothby & Sullivan, 2002: Tumor, Jensen & Romano, 2000), mas
também para técnicas comportamontais clássicas quo seguem a pista do medo da dor e
enfoquom a extinção de respostas condicionadas (Vlaeyen e cols., 2002). Os dados de
pesquisas justificam a incorporação destas técnicas. Porém nos pautamos nosso trabalho
numa visão ampla, numa abordagem que envolva o contexto intogral da pessoa.
O advento da Terceira Onda trouxe uma visão contextuai de eventos privados
(Alvarez, 2001; Hayes, 2004; Zettle, 2005) ondo anteriormente dominaram tentativas
diretas do controlar ou modificar sentimentos e pensamentos. A nova onda de terapias
comportamentais inclui tratamontos como a Terapia do Aceitação e Compromisso (ACT)
e a Psicoterapia Analitico-Funcional (FAP). É com base nestes dois que procuramos
construir um trabalho curativo visando mudanças profundas nas táticas de vida do
paciente, mudanças estas, que estão relacionadas às melhoras em termos de remissão
da dor e melhor qualidade de vida.
No olhar da Análise Clínica do Comportamento (nome geral quo destaca terapias
comportamentais como ACT e FAP das abordagens de cunho mais lineares que são
agrupadas sob o rotulo Análise Aplicada do Comportamento) o comportamento do dorê
um conjunto de estratégias de relacionar-se com os outros e com aspectos encobertos
de si mesmo. Assim, a dor adquiro diversas funções. Pode dar acesso a ganhos, ao
possibilitar a pessoa à resolução de problemas, ou ajudando na esquiva de situações
desagradáveis. A dor pode dar sentido ao projeto de vida da possoa, depois do fracasso
de outras estratégias ou pode consistir numa forma de dofinir a si mesmo como forte e
corajoso. Podo também adquirir valor de comunicação quando é utilizado para expressar
sentimentos, como dizer que precisa de atenção, cuidado, respeito.
Ao tentar controlar a dor, pessoas abandonam atividades importantes como
trabalho, vida social e tudo que poderia molhorar a sua vida. Estes são comportamentos
de esquiva que tende a aumentar a probabilidade do novas respostas avorsivas o
dolorosas, vindo a ampliar cada vez mais o quadro de dor caracterizando em fonte de
sua manutenção, num processo de retroalimentação, num círculo vicioso da dor.

Fibromialgia
A Fibromialgia é uma síndrome dolorosa complexa, so caracteriza pela
variodade de sintomas que aumentam e diminuem som a presença de um dano

Sobre l omport.imento e t'ogniv<lo 239


especifico. Não acarreta deformidade física ou outros tipos de seqüelas. No entanto
pode prejudicar a qualidade de vida e o desempenho profissional da pessoa. Acomete
principalmente mulheres, o equivalente a 85% dos Casos nos Estados Unidos (Catalano
e Hardin, 2004).
Tom sido domonstrado quo possoas com Fibromialgia uprosentarn
anormalidades bioquímicas ou na função do processamento da dor, poróm dlforontos
fatoros, isolados ou combinados, dentro oles, eventos traumáticos ou estressantes,
doenças graves, e mudanças hormonais, podom favorecer a sua manifostação. Estudos
indicam para causas locais, e/ou causas centrais resultanto do um desequilíbrio entro
mediadores do sistema nervoso central (SNC), um distúrbio funcional e neuroquímico
do substâncias como a sorotonina quo interfere no limiar da dor (Knoplich, 2001).
O diagnóstico de Fibromialgia é essencialmonto clinico, e consisto do: dor
generalizada ou migratória com mais do trôs meses de duração. No exame fisico oxigo
a presença de dor à apalpação nos 11 dos 18 pontos (tender points). anatomicamente
determinados, associados a distúrbios do sono, rigidez corporal e articular, cansaço ou
fadiga (Menezes, 1999; Knoplich, 2001; Catalano & Hardin, 2004).
Freqüentomonte a Fibromialgia é confundida com outros diagnósticos, isso se
deve ao fato desta sindrome vir acompanhada de um conjunto de sintomas comum om
outras doenças. Ressaltamos que os exames laboratoriais trazem resultados sem
nenhuma rolação com as queixas da pessoa, dos quais sâo necessários por excluir
outras doonças, cuja sintomatologia são semelhantes às da Fibromialgia. Estudos
recontes demonstram que o contexto familiar e fatores ambientais somados ao fator
genético influenciam na Fibromialgia. Entretanto faz-se nocossário rever cuidadosamente
a história clínica do paciente para chegar ao diagnóstico correto.
Não existe uma explicação clara para persistência dos sintomas, poróm a Fibromialgia
provoca sentimentos de invalidez, angústia, desespero, isolamento, culpa, sobretudo desamparo,
resultante da busca incessanto e sem sucesso pela cura ou por explicaçõos claras sobre a
origem da dor, vindo a ampliar cada voz mais o sofrimento da pessoa.
Na avaliação psicológica faz-se necessário investigar a relação entre
expectativas e níveis de frustração frente aos projetos de vida da pessoa, a relação entre
querer o poder fazer. A dor pode significar uma forma de comunicar o seu sofrimento e
de dar sentido à vida. Pode configurar a maneira de estabelecer vínculos e obter
resultados positivos como a isenção de responsabilidades, variáveis que dificultam a
possibilidado do molhora (Monozes, 1999; Knoplich, 2001).
A avaliação precisa incluir uma análise funcional das relações interpessoais
nos quais a dor e sua vivência se encaixam. Assim, deve se considerar a possibilidade
da dor ter se tornado uma estratégia de regular a intimidade, de se esquivar do problemas
interpessoais com aspectos encobertos que são usados para definir a exporiôncia de
si mesmo e dar significado aos seus sentimentos. A dor pode vir a ser uma forramonta
do apoio, um recurso que a pessoa utiliza para validar as suas experiências.
Na literatura não há evidências de cura para a Fibromialgia. Goralmente o
tratamonto ó dirocionado para as dores no corpo e alterações do sono. A proscrição de
antidopressívos associados a outras medicações tem demonstrado resultados positivos,
além de fisíotorapia, acupuntura, biofeodback e psicoterapia geralmente voltada para a
solução de probfomas provenientos da dor (Caudill, 1998; Menozes, 1999; Knoplich,
2001; Catalano & Hardin, 2004), com a finalidade de fazer a pessoa aceitar a doença e
estabelecer objetivos de vida, na maioria das vezes, adaptativos.

240 M.irllene de A. M.irtins, I ui Viindenberglte


Em busca de uma abordagem psicoterápica.
Ao abandonar a luta contra a dor a pessoa pode redirecionar a sua vida e
abandonar tentativas improdutivas de controlá-la. A FAP e a ACT são formas de tratamento
inspiradas na idéia que problemas psicológicos possuem uma natureza interpessoal.
Skinner (1974/2004) apontou que a consciência que temos do que sentimos dentre de
nós é resultante de uma construção social. Quando alguém descreve a sua dor, ela está
descrevendo um comportamento privado, e a comunidade verbal não tem acesso aos
estímulos que controlam este comportamento. Porém a linguagem possibilitou a
pessoa a identificar e descrever muitos dos seus estados orgânicos. Assim, os
significados da dor são respostas aos estímulos privados, mas também produtos das
contingências sociais. As explicações variam de acordo com os tipos de respostas
aceitas pela comunidade verbal. Neste contexto a dor adquire dupla função, é operante
e respondente ao mesmo tempo.
Isto implica na necessidade de desconstruir os contextos sócio-verbais que mantém
os problomas, algo que pode ser feito de varias formas. Na FAP o objeto de análise se dá no
relacionamento terapeuta-cliente. A vivência de si no contexto interpessoal e a intensidade
do relacionamento terapêutico possibilitam um processo do mudança profundo. O objeto
de análise se dá na relação terapêutica dentro do ambiente terapêutico (Kohlenberg & Tsai,
2001). Estes autores distinguem três tipos de comportamentos do cliente que são chamados
de Comportamentos Clinicamente Relevantes (CCR). CCR1 é o comportamento problema
do cliente, que ocorre dentre da relação terapêutica. CCR2 é a melhora do cliente, que
ocorre ao vivo durante a interação com o terapeuta e CCK3 onvolve a maneira em que o
próprio cliente entende e interpreta os CCR1 e CCR2. As oportunidades de aprendizagem
ao vivo no relacionamento terapeuta-cliente devem produzir um aumento na freqüência dos
CCRs2 ao longo do processo. Os CCRs são funcionalmente equivalentes com
comportamentos que ocorrem fora da sessão e que são indicados com a letra O (da palavra
Inglesa Outside). Assim há 01, 02 e 03 respectivamente correspondendo aos CCRs com
o mesmo número (Kohlenberg e cols., 2004).
A ACT propõe como critério de mudança terapêutica a quebra dos contextos
socio-verbais que apóiam a esquiva experiencial. Esta define a esquiva exporiencial
como a tentativa de não sentir sinais, sensações, ou sentimentos aversivos. A pessoa
quo aprende a evitar pensamentos negativos, emoções desagradáveis ou outros sinais
encobertos aversivos, pode se sentir melhor em curto prazo, mas perde ao mesmo
tempo o contato com fontes de informação valiosas sobre o que está ocorrendo em sua
vida (Hayes, Strosahl & Wilson, 1999).
Muitas vezes a razão (o seguir regras), também não é o caminho mais direto
para resolver os problemas emocionais. O terapeuta, que quer evitar reforçar o
comportamento de seguir regras do cliente, não deve trabalhar com instruções diretas.
Ele pode fazer uso criativo da linguagem para fragmentar o controle verbal e deixar o
cliente entrar em contato com a oxperiência sem precisar focalizar uma compreensão
intelectual (Hayes & Melancon, 1988). A filosofia por traz disto explica que o excesso de
controlo verbal é alienante, assim como, o comportamento de dor. A alienação resultante
de padrões de esquiva experiencial constitui um fator relovante na manutenção da dor
ao impossibilitar um contato direto com as contingências e reforçadores naturais. No
quadro de dor esta alienação pode vir a constituir o cerne dos problemas.
A linguagem é constituinte dos problemas psicológicos, cuja solução muitas
vezes consiste em modificar o contexto interpessoal e sócio-verbal para modificar o
comportamento, a partir de uma visão contextualista em quo o comportamento tem um
caráter complexo, histórico, social e cultural (Alvarez, 1996a).

Sobre Comportamento e Co«niç.lo 241


Para haver mudança ó preciso a aceitação, que significa viver sem defesa e
aceitar os eventos como eles são e não como eles pretendem ser. Com a dor não ó
diferente, a recontextualizaçào pode resultar em oportunidades de crescimento e
compreensão. Desta forma, aceitar a dor pode preparar a pessoa para mudança. Alvarez
(1996b) destaca no seu resumo sobre o pensamento de Hayes, que aceitar sentimentos
aversivos pode aumentar a capacidade de agir e pode configurar um contexto de
mudança. A vivência direta e intensa dos encobertos pode redirecionar a vida da possoa.
Quando a pessoa deixa de investir tudo na luta contra a dor, a atenção se volta para
outras variáveis como parte do problema. Assim é possível redefinir outras fontes de
estimulação para retomada da vida.
Para o psicólogo, ó necessário, não somente tontar solucionar os problemas
provonientes da dor, mas intervir nos aspectos que a mantém. O processo terapêutico
devo possibilitar ao cliente a compreensão da experiência dolorosa, e ajudá-lo a
desonvolver habilidades e altornativas mais eficazes para a resolução de problemas
quo o impedem de encontrar uma forma de viver que realmente valha a pena. Portanto
faz-se necessário investigar os aspectos emocionais, cognitivos, e interpossoals
envolvidos na manutenção da dor.
Vandonberghe, Cruz e Ferro (2003) descrevem intervenções psicológicas em
portadores de dor crônica orofacial dentro de um modelo de psicoterapia de grupo. Com
base na FAP eles procuraram os cernes dos problemas nas relações sociais e contextos
verbais. A terapia de grupo descrita propôs ao cliente: a) ampliar a interpretação de
sinais fisiológicos e possibilitar conhecer melhor o seu corpo; b) identificar os fatores
situacionais e comportamentais relevantes, o que ela faz quando ocorre episódio sem
dor ou com menos dor, que recursos são utilizados para aliviar a sua dor; c) tentar
quobrar o circulo vicioso da dor, examinando as funções das queixas e sintomas no
ambiente social, que significados tem esta experiência no seu contexto de vida; d)
redefinir a maneira como o cliente compreende e interage com a dor, dentro de um
modelo teórico em que ele é ativo no processo de mudança; e) quebrar o controle verbal
alienante e possibilitar um contato maior com as contingências; f) verificar o que a
pessoa faz com as informações provenientes do médico, e o grau de envolvimento que
ele tem, junto aos procedimentos relacionados ao manejo da dor.
Para atingir estas metas o tratamento deve incluir: a) fornecer informações
sobre dor e reestruturar interpretações irracionais; b) concretizar as queixas om relação
a possíveis variáveis causais e explorar a história relevante da pessoa; c) treinar
habilidades de auto-observação e habilidades para detectar sinais que antecedem o
aumento da dor; d) aprender a diferenciar níveis de dor, como também identificar e
interpretar situações interpessoais que sáo relacionadas com estes níveis; e)
desconstruir crenças e expectativas prejudiciais e aprender a identificar as contingências
relevantes da experiência dolorosa; 0 valorizar a relação cliente-terapeuta como ambiente
de transformação.
Como neste trabalho de grupo, o tratamento individual que forneceu os trechos
abaixo visou quobrar o controle verbal sobre o comportamento de dor e a alienação
resultante da esquiva experiencial. As intervenções focaram os comportamentos
clinicamente relevantes durante as sessões, permitindo ao cliente um contato direto
com as contingências e uma leitura diferente do seu próprio comportamento.
Não temos a intenção de detalhar o programa terapêutico aplicado. Este enfocou
a intensidade, as variações e características temporais da sensação dolorosa e também
as Interferências determinadas pela dor nas atividades diárias, bem como, o sofrimento
subjetivo, as incapacidades físicas, econômicas e sociais resultantes dela. Apenas

242 M .irilcnc de A . M .irtins, l.uc Vtindcnbcrghr


pretendemos ilustrar como o significado da experiência dolorosa se encaixa nas relações
interpessoais, incluindo o relacionamento terapeuta-cliente e como, por conseqüência
as oportunidades de aprendizagem ao vivo podem surgir neste relacionamento. Este
trabalho teve como objetivo refletir, através de discussão de caso, sobre a possível
contribuição de uma abordagem integrativa, psicoterápica com base na FAP e na ACT
para o tratamento da Fibromialgia.
Método
Participante
Participou deste trabalho uma cliente de 32 anos, curso superior incompleto,
divorciada, classe sócio-econômica baixa, que será chamada de Meire (nome fictício).
Ela trouxe como principal problema a Fibromialgia.
Meire sentia mialgias (dores musculares) gerais e em pontos anatomicamente
dotorminados. Tinha distúrbio do sono e problemas de memória. Aluna de graduação
em Administração de Empresas, ela não freqüentava as aulas adequadamente e
dedicava parto do seu tempo em busca de atestados para explicar o seu sofrimento.
Estava de licença do trabalho e ao mesmo tempo tentando conseguir uma aposentadoria
no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por invalidez. No periodo de quase três
anos ela experimentou vários tratamentos e consultou com vários especialistas, entre
eles: seis reumatologistas, ortopedistas, psiquiatras e psicólogos, cujos resultados,
segundo ela, não foram satisfatórios.
Meire trouxe como propósito para a terapia, não sentir medo da dor, diminuir a
ansiedade, melhorar o relacionamento com familiares, e também a auto-estima.
Desejava tornar-se mais autônoma e dona de si. O problema era definido por ela, como
totalmente incapacitante.

Procedimentos
Os trechos apresentados foram colhidos durante as sessões de psicoterapia
individual. Foi utilizado o método de análise qualitativa, segundo o modelo conceituai da
Grounded Theory que explica um fenômeno através da análise dos dados colhidos pelo
pesquisador a partir de situações concretas (Charmaz, 2003).
A coleta de dados aconteceu num sistema de co-terapia em que as duas
terapeutas faziam papel de observador-participante. Os papéis de primeiro terapeuta e
co-terapeuta eram alternados, enquanto o primeiro terapeuta conduzia a sessão, o co-
terapeuta observava e anotava os dados para serem discutidos durante as supervisões
semanais, e nas intervisões antes e depois dos atendimentos. De acordo com a
Grounded Theory, os trechos foram codificados linha por linha, com o intuito de construir
categorias que captaram as variáveis relevantes nas sessões, o que possibilitou
posteriormente a identificação de trechos relevantes para exemplificar o trabalho
psicoterápico.

1o sessão
Cliente: Eu trouxe aqui vários atestados médicos [...]
Terapeuta: Por que você os trouxe?
Cliente: Faço cópias, porque geralmente preciso, eles comprovam que tenho realmente
Fibromialgia.
Terapeuta: Não vamos precisar deles, eu acredito no seu sofrimento (...)

Sobre Comportamento e CogniçÜo 243


No trecho acima a cliente tenta comprovar concretamente (CCR1) que não está
bem, comportamento que fora reforçado anteriormente numa diversidade de situações
do cotidiano. A terapeuta pretende não reforçar este comportamento.

2o Sessão
Cliente: Dói multo, às vozes acho que é punição, penso tambóm que a dor é emocional
[...]
Terapeuta: O que faz você pensar isso?
Cliente: Quando fico chateada sinto dor [...]
A cliento faz uma relação causal para a dor (CCR3). A terapouta pede a ela
evidência para a interpretação. A cliente oferece um argumento consistindo de uma
relação temporal interessante.
Cliente: O psiquiatra pediu para acelerar o processo [...]
Terapeuta; Por quê?
Cliente: Eu quero parar de tomar os remédios, ó aqui no processo que vou consoguir
isso [...]
Percebe que a cliente tenta controlar a terapeuta através da autoridade módica
(CCR1). A dor é operante neste contexto. É utilizada para obter controlo interpessoal. O
questionamento da terapeuta leva à descrição de um desejo pessoal (CCR2) da cliento.
[...]
Cliente: A minha mãe não acreditava em mim [...] Tive quo arrumar uma prova concreta
para ela acreditar no que eu falava [...J
Terapeuta; Ela acreditou?
Cliente: Não teve outro jeito, mas toda vez que eu falava, ela achava ruim [...]
A cliente relata uma contingência de reforço em que a relação de confiança fora
estabelecida a partir de prova concreta (01).

4o Sessão
Cliente: Quero fazer uma regressão com meu psiquiatra para ver se alcanço rosultados
mais rápidos e queria saber o que você acha.
Terapouta: Não posso interferir em procedimentos de outros profissionais, você fica a
vontade para decidir o que julgar melhor.
Ê possível que a cliente tenta mais uma vez controlar a terapeuta e relaciona a
possibilidade de melhora à atuação de um outro profissional (CCR1). A terapeuta não
reforça esto comportamento e direciona a responsabilidade a cliente na tentativa de
favorecer controle privado (Interno) com relação as suas escolhas, possibilitando a
escolha em função das próprias necessidades da cliente.
Cliente: Eu estava deitada e a minha mãe falou: Filha! Eu pensei, tom tanto tempo que
ola não me chama assim [...]
Terapouta: O que você fez?
Cliente: Fiquei deitada olhando para ela, normal
A cliente tem consciência (03) que a condição de estar doente ó reforçada pela
atenção e carinho da mãe.

244 M .irilcnc tlc A . M .irtiru , l.uc V.imlcnlxrrtlH*


6o Sessão
Terapeuta: Você fez as tarofas de casa?
Clionto: Não li os textos sobre dor, mas fiz o diário da dor (...]
Terapouta: Como tom sido para você preencher o diário?
Cliento: Às vezos eu esquoço [...] Eu já sei as situações quo sinto dor (...)
Terapouta: A forma como você tom lidado com olas tem sido eficaz?
Cliento: Como assim?
Terapouta: Como você tom agido nestas situações?
Cliento: Eu preciso aprondor a lidar melhor com as situações em minha vida (...)
A terapouta tenta favorecer um contexto vorbal propicio para o desempenho de
atividades, mas a cliente se esquiva das tarefas do casa, situações avorsivas por exigir
disciplina e responsabilidade. Ela tenta justificar (CCR1) seu comportamento
esquivando-se tarnbóm do questionamento da terapeuta (CCR1).

7o Sessão
Cliente: O módico me encaminhou para um roumatologista, e quando cheguoi lá, ele
disse que não entendia nada sobre Fibromialgia. Então fui encaminhada para outro que
já fiz tratamento com ele, mas não deu certo.
Terapeuta: Por que não deu corto?
Cliento: Eu precisei de um atestado e ele não quis me dar (...) (01).
Ao final da sessão:
Cliente: Vou ao médico, o quero conseguir uma cortesia para o atendimento. Será que
você poderia me dar uma doclaração como sou isenta de payamonto?
Terapeuta: Talvez você não precise desta declaração. Basta falar com o médico. Penso
que ele não terá motivos para não acreditar em você, porquê você estará falando a
verdade... Tente!
No trecho acima a cliente faz um podido à terapeuta no sentido do rosolver
problemas para ela. Foi importante a terapouta não reforçar este CCR1.

10° Sessão
Cliente: Depois do exarno elos vão ficar mais próximos de mim (...)
Terapouta: Por que mais próximos?
Cliento: Eles são muito distantes (...)
Terapouta: Então eu espero que na próxima sessão você venha com o resultado do
exame e mais tranqüila (...)
Cliente: Quo ridículo!
Terapeuta: O que é ridículo?
Clionto: Porquê eu não tenho dúvidas disso (...)
Terapeuta: Eu também não, e acredito em você, mas procisa provar para as possoas
que olas podom confiar em você?
Cliento: Nunca parei para pensar sobro isso (...)
A cliente relata buscar recursos materiais para validar as suas relações (01),
comportamento governado por rogras quo fora reforçado pela comunidade verbal. Nesto

Sobre Comportamento e Co«niv'.lo 245


caso, a terapeuta se comportou como as possoas do cotidiano da cliente. Esta se
vulnorabilizou (CCR2) e criticou abortamento (outro CCR2) a atitude da terapeuta que
acolheu o feedback dado pela cliente.

11° Sessão
Cliente: Este exame foi a molhor coisa que já fiz na minha vida [...]
Torapouta: Por quê?
Cliento: Agora olos sabom que falo a verdade (...)
Terapouta: Para mim este exame não significa nada, eu sempre acreditoi em você, mas
fico pensando, o que vocô pretende com isso? Sempre foi assim, na sua infância, nas
suas rolaçõos com as pessoas. Vocô ostá sompro quorondo provar alguma coisal
Cliente: Será que vou ter que provar a vida toda para as pessoas que elas devem confiar
em mim? E quando ou não tivor provas?
A torapouta tonta quebrar o contexto verbal (que favoroce o 01) o levar a cliente
a um contato direto com as contingências.

14° Sessão
Clionto: Estou tomando remédio natural, o módico pediu para ou fazer outro tratamonto
(...)

Terapeuta: E vocô, o que pensa disso?


Cliente: Eu ostava fazendo um tratamento, elo pediu para eu mudar, então mudei (...)
Torapouta: Você procurou vários profissionais para curar a sua dor, mudando de
tratamonto várias vezos, atribuiu a estos profissionais a responsabilidade por sua
molhora, mas o que cabe a você?
Cliente: Eu percebi que não preciso provar nada para ninguém o estou melhor da
Fibromialgia (...)
Torapouta: Vocô atribui a molhora ao romédio?
Cliente: A dor não passou com o remédio, foi difícil perceber que eu era a responsável
pela dor (...)
Terapouta: Como assim?
Cliento: O módico disso que eu ostava tomando o quo do mais avançado oxistia para
dor, e ou não molhorava.
Terapeuta: Como a Fibromialgia está na sua vida?
Cliente: Da mesma forma que ela entrou, está saindo (...) A dor ora como uma bengala.
Vocês tiraram a minha bengala e eu não quero mais essa bengala.
Terapeuta: Quem abandonou a bengala foi você, porquo percebeu quo não prodsava mais dela.
A cliente está descrevendo relações funcionais importantes o que a possibilitou
tomar atitudes de modo diferente, sem comportamento de dor. Porém, ela ainda mostra
a tondôncia de atribuir a mudança às terapeutas.
15° Sessão
"Eu ora uma coitada, de repente todos estavam indo mo visitar porquo ou estava doente.
Percobi que posso viver sem dor, e quando ela vem não dou mais a importância que eu
dava e fico bem (...]"

246 M .ir ilo n e »lo A . M iir lln « , l.uc V .m »lc»bor#l)o


"Nâo faço as coisas para provar, mas sim porquê escolho"
"Eu vivia doente para que as pessoas me percebessem, não preciso mais disso.
Acrodito mais em mim e sei quo sou capaz [...]”
"Vojo que o meu problema tinha tudo a ver com a minha saúde psicológica, hoje estou
bom o quaso não sinto dor[...J”
"Tonho quo cuidar do mim. Estou mais autônoma. Estou bem [...]"

22° Sessão
"Estou mais resolvida hoje. Posso viver e usufruir as coisas como antes sem sentimontos
de pordas [...]"
"Eu me beneficiei muito com o probloma da Fibromialgia, isso foi errado [...] Vou fazer
tudo diferente não quero mais ser vista como a coitadinha [...]"
Nestas falas da cliente da 15° a 22° sessão, ela oxplicitou uma nova filosofia
em que abrir mão da dor possibilitou ganhos suporiores na qualidado do vida

Conclusão
O ser humano ó um organismo que está em constanto interação com o sou
ambiente No que so rofero ao comportamento de dor, o ambiento ó social, e a relação se
dá a partir do significado dado ao mundo e a si mesmo. No início do tratamento, a dor ora
uma estratégia de relacionar-se com os outros e para dar sentido a sua vida, para se
sentir aceita, obter carinho, resolver problemas, além do se oximir de várias
responsabilidades nos estudos, na vida social, no trabalho, nos compromissos diários.
A dor tinha se tornada um agente possibilitador, e ao mesmo toinpo alienante.
Gradualmente a dor tinha adquirido força e espaço, absorvendo recursos psicológicos,
financeiros e sociais que podoriam ter sido usados para o crescimento pessoal da cliente.
No ambiente terapêutico a cliente so relacionou com as terapeutas (CCR1)
conformo as táticas do seu cotidiano. A torapouta pôde usar, assim, o rolacionamonto
com ela para transformar o comportamonto problema da cliente, e permitir a emergência
de estratégias mais saudáveis para a resolução de problemas. No docorrer da terapia,
a dor deixou de ser o foco da atenção, em sessões mais avançadas os exemplos com
relatos de dor se tornaram mais escassos, o que explica os trechos apresentados
acima. A cliente se voltou para os problomas interpossoais e para as dificuldades no
cotidiano, possibilitando novas experiências. Sugerimos que as oportunidades de
aprondizagem ao vivo, num rolacionamonto íntimo com alguém (a terapeuta) que não
ajudou a manter o comportamonto do dor, teve um papol fundamental nesta mudança.
Encarar plenamente a catástrofe da sua vida e seus próprios sentimentos
aversivos (modo da dor, raiva, rejeição o a própria dor) e abrir mão da esquiva (doixar do
trabalhar, estudar, buscar evitar rejeição, controlar a dor) permitiram a cliente fazer
escolhas coerentes, e configurou num contexto de mudança profundo. O trabalho
possibilitou à cliente fazer uma leitura diforento da dor. Ela deixou do vor a experiência
dolorosa como algo que impossibilitava a sua vida, e se abriu para novas oportunidados
molhorando sua qualidade de vida.

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Sobro 1'omport.imonto o Cofiníç.lo 247


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248 M.irllcnc tic A. M.irtins, I in V<imlonl)cr«l)c


Capítulo 20

Clínica Integrada - A Psicologia e a


Fisioterapia em trabalho
interdisciplinar de saúde
comunitária
M(iril/«i M eslrc', Simone Murara, Kosana Portes c lanine A n to n io A d ria n a
Paredes, Ariana Mamear/, Lduardo Andrade/ l/abel Silva, luliane L/Ibrich, Mariana
Monteiro, M icheli Meira, Kaphacl Amaral, Kodrigo Ribeiro, e IclniaVoss*.

Introdução

O século XXI traz em sua "natureza" um homem globalizado que, se vive


intensamonte suas dores pessoais, sofre também as dores sócio-culturais, que o
afetam como um grande todo. Dal a obrigação de se formar profissionais aptos a lidar
com essa atual realidade. Um atendimento de saúde requer serviço onde a totalidade
desse ser seja tratada.
A criação da Clinica Evangélica de Atendimento Integrado (Cl) vom ao encontro
dessa crença e, é claro, o psicólogo faz parte desse trabalho. Watson, um behaviorista
do inicio do século XX (1913, em Mestre, 1991) inserido numa experiência hospitalar -
clínica geral - desenvolveu um método de terapia psicológica que viria a ser o embrião
do bohaviorismo, no qual o psicólogo, em sua prática individual, segundo essa filosofia,
deveria interagir com o moio ambiente do seu cliente.
E, essa, parece ser a proposta de Bleger, 1964, em relação às políticas de
saúde. O conceito proposto por esse autor só veio encontrar respaldo - no Brasil - em
1984, com a publicação de seu livro em português, acerca da necessidade da psicologia
deixar de ser exclusivamente uma atividade individual e começar a dedicar maior atenção
às práticas que visassem o social. Hoje não há mais qualquer dúvida que a saúde é, e
deve ser, independente da filosofia psicológica abraçada, vista desde um modelo
biopsicosocial (Laloni, 1999).
Saúde é um termo complexo, que numa tentativa de definição, poderia ser
considerado como um estado de "bem-estar" amplo e em várias instâncias do ser. Há,
1Psicóloga clinlcu (UFPR 1980), Mimlro om pwcotogla (USP8P-1004). Doutora am Hiitôfla (UFPR-2004); prafo«»orn • «uporvlaom no»
curso» do graduaçAo o prt» graduação am Pmtcotogia da Faculdad« FvantfMca • da UTP; pMquwadora o orientadora da pomiulM
' Palcóloya» dlnica (PUCPR-2002, PUCPR 2000 • UFPR-2002); p««qul»adoraa • oo ortantadoras da (Misquina
1Aluno« do 4* parlodo do cunto d« PiücologM da Facutdado* Fvangétca do Paran* PaaqtitoadorM

Sobre Comportamento e Coflniçilo 249


atualmente, uma crescente utilização do modelo biopsicossocial em substituição ao
modelo biomédico (ausência de doenças) usado até o século XX. (Miyazki (2001), Brannon
e Feist (1992), Cohen-Cole e Levinson, (1994).
As principais causas de morbidade e mortalidade modificaram-se de doenças
infecciosas para doenças relacionadas aos estilos de vida e padrões comporta montais,
colocando assim, em evidência a importância da educação sobre práticas saudáveis e
comportamentos preventivos, a fim de reduzir a vulnerabilidade para doenças e a
importância de uma intervenção global para aumentar índices de adesão ao tratamento e
reduzir o impacto da doença sobre o funcionamento global do indivíduo.
Miyazaki, 2001, se apóia em Ribes-lfiesta (1990), quando este afirma que os
comportamentos modulam estados biológicos na medida em que regula o contato ontre
organismo o ambiente, constitui o meio de contato direto com agentes patogênicos, leva
a mudanças graduais no organismo, permite a identificação precoco de sintomas e a
procura dos serviços de saúde, além de potencializar as ações terapêuticas, através da
adesão ao tratamento.
O paciente, segundo Malerbi, 2002, pode trazer à consulta uma combinação do
sintomas, freqüentemente acompanhados de várias queixas corporais quo podom dificultar
o raciocínio clinico. A equipe médica também pode estar tão envolvida nas suas atividades
- próprias do cada disciplina - e dados relevantes podem passar desapercebidos e,
assim, indiscriminar o problema, possibilitando o oforecimonto de tratamonto inadequado.
Segundo Gorayeb e Rango, 1988, as equipes muítidisciplinares vêm florescendo
no pais, e por este tipo de trabalho entende-se a presença de mais profissionais além dos
tradicionais da área módica e de enfermagem. Tais como fisioterapia, nutrição, psicologia,
teologia, terapia ocupacional e outros da área de saúde. Assim começou a havor uma
subdivisão dos trabalhos. Passou-se om seguida, a contar com a existência do nlgumas
equipes interdisciplinares, com membros da equipe interagindo entre si, em busca de uma
melhor qualidade de vida para os pacientes. Hoje no Brasil, ainda temos muitos instituições
do saúde, tradicionais, onde o serviço multidisciplinar e interdisciplinar estão ausentes.
Ao estar inserido em uma mesma equipe, o profissional da saúde, perde algo
que na verdade nunca existiu, a pseudoneutralidade cientifica, e acaba ganhando o
conhecimento da realidade com a qual os outros profissionais convivem dia-a-dia.
Somente assim se pode pretender ajudar a recuperar (ou prevenir a perda da) saúdo e,
dessa forma produzir reinserção social e - simultaneamente - alcançar qualidade de
vida. Todas as ações, de qualquer dos profissionais inseridos nessas atividades, irão
repercutir dentro do sistema e ele também sofrerá influência das variáveis ali presentes.
Então, é necessário se ter claro que, qualquer instituição que tem por objetivo promover
saúde, convive, obrigatoriamente, com disfunções dessa natureza.
Assim, Miyazaki, 2001, elege o psicólogo, na qualidade do especialista om
comportamento, como tendo um papel importante a desempenhar como parte das equipes
e instituições de saúde; e Heller, 2003, esclarece que este profissional precisa centrar seus
objetivos psicoterapêuticos na quebra da relação estabelecida entre a realidade imposta
pela doença (e as perdas concomitantes a esta) e a ansiedade dos pacientes e seus
familiares. O controle da ansiedade e a reestruturação da idéia irracional da doença (saúde
X autonomia) para esta autora,são os primeiros comportamentos a serem trabalhados.
Por causa da doença o individuo pode não desenvolver (ou ter momentaneamente
perdido) habilidades sociais e pode tornar-se uma pessoa agressiva ou excessivamente
introvertida, o que resultaria dificuldades de convívio com os pares. O comportamento
agressivo geralmente gera conflitos interpessoais, perda de oportunidades; dano aos

250 M a ril/a Mestre, S. M u m m , R. Portes, I. A ntonio A . Pareiles, A . Marne«»/, I . Aiulratle, I. Silva, I.


W lbridi, M . M ontciro, M . Moira, R. Amaral, R. Ribeiro, I. Voss
outros; sensaçào de estar sem controle, auto imagem negativa; culpa; frustração, rejeição
e solidão. O comportamento passivo promove efeitos tais como: conflitos interpessoais,
auto-imagem negativa, dano a si mesmo, perda de oportunidades, incontrolabilidade,
desamparo e depressão, tensão, solidão. Além de insegurança ansiedade, baixa auto-
estima, falta de repertório, e grande fragilidade.
A falta de informação adequada se constitui em grande geradora de ansiedade
nos pacientes e seus familiares, que acabam por desconhecer, exatamente, com o que
estão lidando. Soma-se a isso o fato do diagnóstico normalmente ser feito diante de uma
situação grave em que o paciente pode estar correndo riscos de ser hospitalizado e/ou
apresentando sintomas característicos. Essa incontrolabilidade apresentada pelo paciente
diante do diagnóstico, pode ser comparada à teoria do desamparo Aprendido de Seligman
(1977), que afirma que acontecimentos imprevisíveis e incontroláveis geram mais tensão
e ansiedade do que acontecimentos previsíveis. (Helller, 2003).
Botega, Furlaneto e Frágua, 2003, realizaram pesquisa, com amostras brasileiras,
para avaliar comportamentos de ansiedade e ou depressão de pacientes internados
devido a doenças físicas: perda do interesse nas pessoas, pessimismo (desânimo),
indecisão, irritabilidade, anedonia (perda do interesse e prazer), melhor discriminaram os
pacientes com síndromes depressivas moderadas e graves. Observou-se, então, quo os
pacientes admitidos em enfermarias de clínica médica que apresentavam indecisão,
insônia, baixa auto-estima, desesperança ou anedonia tiveram maior mortalidade durante
a internação, independente da gravidade física inicial. Além disto se faz necessário ter em
conta a importância da família neste processo.
A qual, de acordo com Malerbi (2002). é considerada por alguns autores como a
unidade básica de cuidados com a saúde, procurando entender como a doença pode
afetar a estrutura familiar, e como é visto o doente; considerando a sua função na casa e
o papel que cada um exerce no meio em que vive, por exemplo, quem é o provedor
econômico, quais são os recursos materiais, sociais o comportamentais dessa família.
As relações familiares, consangüíneas ou por afinidade, são vitais para o
reforçamento social e para a adesão ao tratamento. A família precisa reconhocer e acoitar
o estímulo doença, caso contrário corre-se o risco de esquiva ao tratamento. Tal adesão
facilita o processo da recuperação da saúde ou da melhoria da qualidade de vida, no
entanto este grupo social, pode hiper aderir e com isto atrapalhar. Superprotegendo-o,
acaba passando uma mensagem de que julga o paciente como um incapaz.
A avaliação do funcionamento familiar deveria se proocupar com as categorias
como: coesão familiar; flexibilidade e adaptabilidade; enfrentamento do estresse; padrões
de comunicação; apoio familiar; conflitos e emoções expressos. A prática de
psicologia da saúde inclui extensão de serviços á comunidade, ensino e pesquisa
relacionados. Por exemplo, identificação de fatores ambientais ou comportamentais que
aumentam ou reduzem a vulnerabilidade para doenças; avaliação de programas que
reduzem a ansiedade do paciento e do cuidador frente a procedimentos médicos, o
impacto da doença crônica sobre paciente e cuidador; intervenções junto a pacientes
portadores de doenças crônicas e em crises; entre outros, também atendimento
psicológico e programas de prevenção para futuros profissionais da saúde.
Ao se trabalhar com a diversidade, contida em qualquer programa de
interdisciplinaridade, é necessário saber que esta tem, em si mesma, a solução e o
problema para sua atuação. Nesse sentido as intervenções psicológicas deveriam estar
preocupadas com entender e assimilar as diferenças metodológicas, e ató posturais,
desses diversos profissionais, independentemente de suas ações preventivas ou curativas

Sobre Comportamento e Co^niçAo 251


e propiciar que seus instrumentos "cognitivos" intercedessem em favor dos trabalhos
módico-curativos-prevontivos dos demais membros da equipe (Enumo e Kerbauy, 1994).
Todas as situações onde podem se desenvolver as ações de um psicólogo, é
imprescindível que estas ações se iniciem com uma análise sistemática, uma análise
funcional (Gorayeb e Rango, 1988).
Com isso o objetivo é fazer uma analise e descrever algumas experiências
vividas pela equipe ao longo deste ano, relativas á inserção do psicólogo na clinica e
adosão do paciente a fisioterapia, como mostrar formas do atuação deste profissional
que possam favorecer seu trabalho, tornando-o mais eficiente e conseqüentemente
facilitando suas relações com os outros membros da equipe interdisciplinar. Resultando
em uma melhoria para a qualidade de vida dos pacientes e seus familiares.
Os dados deste relatório, então, poderão auxiliar aos outros profissionais que
ora vem so integrando a equipe, tais como enfermagem, teologia o modicina.

M etodologia
O método usado foi o de pesquísa-partícípante, om quo os alunos e o professor
do psicologia foram os pesquisadores em situação do atividade de extensão de ensino
com atendimento comunitário (Gil, 2002).
Participantes
N= 96
Alunos e professores do curso de fisioterapia e psicologia; (n= 46);
Pacientes, e familiares, usuários dos serviços da Clinica, (n-47);
Funcionários da clinica (n=3);

Local
Cl - Clinica Evangélica de Atendimento Integrado - campus I
Rua Padre Anchieta, 2770, CEP 60.730-000 - Curitiba/PR,
E-mail: foparffifepar.odu.br Site: www.fopar.edu.br

Material
Humano: alunos e professor de psicologia e dos demais cursos
integrados à equipe;
Material: papel, caneta, lápis, computador, gravador de fitas - VHS e
áudio, outros.

Instrumentos
Técnica de observação de comportamentos e atividades adaptadas á realidade
vivida e criadas a partir das observações e, entrevista clinica.

Procedimento
A professora de psicologia, após realizar entrevistas individuais com professores
e alunos de fisioterapia, fez o levantamento das necessidades da comunidade de
fisioterapeutas em relação ao serviço de psicologia. De posse desses dados foi feito

252 M .iril/,i Mestre, S. Mur.iru, R. Portes, I. A ntonio A . P.tretle*, A . M .im c.ir/, J . Amlr.ule, I. Silvü, J.
W lb riil), M . M onteiro/ M . M eir.i, R. Am<ir<il* R. Ribeiro, f. Voss
orientação aos alunos do psicologia (leitura do toxtos e supervisão de seus
questionamentos) de modo a que esses pudessem compreendê-las e se preparar a
atender aos imperativos daquelos profissionais, dentro do possível.
Os alunos procedoram, também, a entrovistas com os profissionais citados,
com os usuários da clínica o também com sous familiaros. De acordo com a domanda
ostabolocida, os alunos de psicologia prepararam atividades na tentativa de supri-las.
A demanda dos alunos do fisioterapia foi orn relação à adesão ao tratamonto
proscrito e que, no entondor dosses profissionais, poderia estar ocorrendo resistência
por parte do paciento e do seus familiares e eles - discentes do fisioterapia - não so
julgavam preparados a lidar com osso empecilho.
Os alunos da psicologia - sob supervisão - atonderam aos paciontes om
conjunto com os alunos de fisioterapia o ou individualmente e ou, ainda, em grupos de
familiaros. Durante a semana, cada aluno roalizava atendimento individualizado a seus
pacientose em sub-grupos participavam de suporvisão voltada ao aspecto toórico da
clinica ambulatorial. A supervisão focal aos seus casos do atendimento ocorria via o-
mail, Quor dizer, o aluno enviava - ao suporvisor - um relato completo, do forma cursiva
- sobro tudo que ocorrera durante seu atondimonto (modelo em anexo - 1). O supervisor,
ontão, corrigia insorindo suas obsorvações em cor vermelha e em lotra maiúscula no
corpo do próprio relatório, devolvendo ao aluno emissor Dosta forma, antes do próximo
atondimonto o aluno sempre tinha suas dúvidas imediatas sanadas. Do acordo com as
demandas surgidas o supervisor selecionava os temas de aula toórica quo ocorriam
om rnornontos das horas de atividade da pesquisa. Além disto, como o supervisor
sompro esteve presente durante as atividades dos alunos sempre que alguma dificuldade
surgia o aluno tinha como orientação chamar o professor imediatamente. Nestes casos
este assumia a sessão terápica, ampliando, diminuindo ou mudando o foco de apoio
omergencial.
Os atondimontos aos alunos de fisioterapia foram realizados pelo professor
de psicologia.
O objetivo do projeto inicial sofrou alterações para atender a demanda das
necessidades específicas da comunidade da clinica integrada. O foco controu-se, ontão,
na descoberta de motodologia de atendimento possível, bem como na descrição
operacional deste, quo ficou constatado, faz falta na literatura existente.
Do maneira a so adoquar às necessidades peculiares de cada intogranto da
oquipo de saúde, O que viabilizou o atendimento clínico, o grupo optou om modificar o
setting torapêutico, ou seja, utilizar locais alternativos, como por exemplo à sala de
espora, box de atendimento do fisiotorapouta, corredor, jardim externo da C.I., banheiro
ou qualquer outro espaço.

Análise dos Rosultados


Os dados encontrados foram analisados de forma qualitativa, por análise do
conteúdo e, quantitativamente, polo teste não-paramétrico £ , do programa estatístico SPSS.

Resultados e discussão
O trabalho da psicologia junto a clinica6 integrada, teve inicio no ano de 2004,
sob a orientação da professora Ms. Giovana Munhoz da Rocha sendo que, naquele
poríodo, os alunos - então no primeiro ano da faculdade procediam aponas à
obsorvação do funcionamento da clinica e de alguns de seus pacientes. Por isso, o

Sobre Comportamento e C'ofli)iv<lo 253


relatório daquelas atividades foi fundamental como parte da análise do quais seriam as
necessidades mais prementes da equipe de fisioterapia no que diz respeito a ajuda
que a psicologia poderia oferecer. Mas, ainda assiin, ocorreu um período inicial de
observação e adaptação da nova equipe - da profossora Dra. Marilza Mostro e dos nove
discentes (segundo ano do psicologia), junto a equipo do fisiotorapia, únicos
profissionais já atuando na clinica intograda. Logo ao inicio so porcobou a nocossidado
do tor na equipe profissionais e ou alunos do últimos anos do curso do forma a atondor
as demandas exigidas pela realidado da instituição. Em função de o curso ostar- no
ano de 2005 - em sou inicio (terceiro ano de formação), foi foito uma parceria com
cursos de pós-graduação om psicologia e três profissionais psicólogos so dispusoram
a prestar serviços voluntários que serão registrados em forma do horas complementares
a sua atuação prática om clinica psicológica (ambulatorial) junto a cada um de seus
cursos.
O quadro 1 traz os dados de cada paciente em tratamento multidisciplinar:
fisiotorapia-psicologia e, traz ainda, o número de sessões que o paciente já havia feito
antos do inicio do atondimonto psicológico; a queixa quo o lovou a buscar atondimonto
om fisioterapia; a queixa clínica que o aluno do fisioterapia apresentou à equipo de
psicologia; o número de sessões totais de psicologia e o número dessas requeridos
antos do inicio da obtenção do objetivo.

Quadro 1: dados do protocolo construído ao longo do processo de atendimento om


psicotorapia do apoio à fisioterapia, na C.l. durante o ano do 2005.

tk u lM

lUtIUUiUIUil
ii ULlluLuuIíxu

Saqualas por Reformular o «alilo iwiranlal


1. Fatia da habüKiadaa
hKlror.afahn do cukI ik dn criança e
VI Fam. 3 sociais para Mar oom 2« 21 / H
mMoRwnmgunGAko confrontar os {»ais com a
anoa ragrai
a rMlidada imadlala

lasáo doa
mambrrm Dasamparo por haixx 2004 (02
2. CowicmntizaçAo do
»ujjartoras a pravisitxlidada • sassôas) «i
V. Maso. 1« / 3 capacidada da controla na
mfarloraa, do lado oonlrolabtlidada da 2005 (46
60 ariON mttlhorA da saúda
«aquardo. cau»ado paralisia sassôas)
DOf AVC
lasAo no mambro
3.
mtarlor dlraito, Ausência da oonflança EHmlneç*o ila mnmòrla da
M. Fam. 14 111
causado por na cura da laaAo dor
19 anos
acktanla «aportivo.
Parallaaçto doa
mamhros Malhorar a auto astima a
4, Batxa adasfto ao
inlartora», por aulooortcaito promovancio
J. Fam, 63 Iralamanto, davtdo a 24 24/ 1
acidant» da coluna uma motivação para o
ano» dwprassAo lava.
a níval lombar • traiam anto.
torfxlca
Limitaçào
Funcional na taca,
S. Trabalhar *<mj auto-concalto
carvical. ombro a
Jrt.Fam Dafirassiva 3 2 5 /6 « ANtima, trabalhar
darto rnlnimo
26 anoa habíldadas sociais
aaquardo causado
uor quamiadura
ParailsaçAo do lado
8 Trabalhar a rasistAnoa á
dlraita/oompromati
L M * »c. 77 manto da» cordas ImstraçAo jwntomanta com
IrntaçAo 1 2 0 /7
vocais, causado »« hatxiidadas soaals (tara
axprasaar asta santlmanto
por AVC

254 /,1
M.irll Mestre, S. Mur.ira, R. Portes, I Antonio A l\irciles, A. M.imc.ir/, I . Amlnule, I Silv.iy I
Wlbrich, M . Monteiro, M Meir.i, R. Am.ir.il, R. Ribeiro, I. Voss
I
AVC,
7.
comprometimento Mutismo d ralação á Trabalhar altamatlvas de
Sa. Masc. 50 um
inotor total, sonda a»po*a comunicação possível
73 ano*
veste «I

M l Trabatiar a m»utén<jrt «
4 pcciant«« frustraçAo |untamanla com
Maslectomia total a 2 «nos « 1
com C.A. d« OapressAo, irntabilidada 25/9 habilidades social« para
ou parcial ano
numa axprasnnr asta sentimento «
lutar por saus direitos

12-17.
Hipertensão Trabalhar a reslstAnciH k
1* grupo d* IrrllaMkleòa, baixa
arterial, frustraçAo juntamente com
déficit* compraansAo da seu i Maaes 1(V1
cardlopatias, asma luibllidades sociais para
respirai •atado
anflsama putrt>onar expressar asta sentimento
(5 pacienta»)

18-23.
HIpartensAo Tralwlhiir h rasIslAnda rt
2* gru|x> d« Imtabtlidade, baixa
arterial, fmstraçAo |untnmanla co»n
dAflcit* compreenaAo d*i sau 6/1
respirai.
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anflsama pulmonar [ axprassar esla sentimento
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24-25. E stado depressivo, com Trabdlh.K a rnsistèncm á


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26 27. frustração (untamartta oom
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28 a dificuldades con|uga*s axprassar asta sanllmanto «
26(asposn) Parmitir um aspaço para
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«•posa da S. Sra. A - 12/ 3 Parmitir um ««paço para
Sra. A. «i Sra.
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axprassar asta sanllmanto
por AVC !
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32. ara. Ro
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adulta, viúva
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33 e 34.
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Resultados flutuantes *
1 encaminhamento

Sobre Comport.imcnlo e (,‘oqniçilo 255


35 *i 36. Compraansáo da
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42. VA
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43-47 Lavit-loa a (xxnprnnndar o


cinco rito da piinftagam social qua
Slrans ao Anal do InriUibilidadn, nsAnia,
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período da aalAgio confuaâo da
4" ano do ' ■ fl|udá-los a jmrcabar as
no C l »«ntiinanti»
oi tf ao ria (»ardas a ganhos dessa
tlsiolarapia momanto.

Segundo Enumo (1999) o psicólogo, enquanto agente da saúdo, dovoria ostar


identificado com a instituição onde presta serviço, conhecendo as regras de seu funcionamento
e, mais que isso, vivondando-as. Portanto, a Cl, bem como outros locais de prestação de
saúdo, na Faculdade Evangélica, antevendo e compactuando com osta premissa como um
todo, ao abrir espaço para o atendimento interdisciplinar, se colocou dontro das oriontações
preconizadas pola OMS e permitiu a prática integrada, não só na formação do psicólogo (e
outros aprendizados profissionais) enquanto graduação como cuidadores da saúde (atividade
de extensão) mas, também, preparando-o como pesquisador.
Ao fazê-lo, este cumpriu, sem dúvida, com o proviamonte estabelecido como
sondo sou papel e função, como estabolocer diagnóstico psicológico, mas se foz ovidôncia
que cada vez mais ó preciso desenvolver pesquisa que amplio esse loque de atividades
profissionais, não só do psicólogo como da equipe multidisciplinar, pois o fenômeno
biopsicosocial roquor maior o molhor investigação (Brasil, Ministério da saúde, 1997).
Uma equipo engloba muitas disciplinas que interagem entro si em prol da saúde
como um todo, tais como a fisioterapia, a nutrição, a medicina, a onformagom, a oducação
ospecial e também, é claro a psicologia, entre muitas.
O psicólogo vem sondo solicitado a colaborar com a atenção integral à saúde e
para isso terá de ir além das ações psicológicas convencionais e ser capaz de dar
contribuições diferenciadas, na tentativa do responder a inúmeras questões como: adesão
a tratamentos, a ótica nesse processo, fatores de risco a algumas doenças onde os

256 M .iill/.i Mestre, S. Mwr.ir.i, R. 1’ orlcs, I. A n lo n io A . P.irede*, A . M .tm c.ir/, I . Am lr.itlc, I. Sllv.i, J.
W lbriil), M . M onteiro, M , M eir.i/ R. A m .itiil, R. Ribeiro, I. Voss
fatores de estresse social e ou comportamental desencadeiam e ou mantém a doença,
como seu relacionamento familiar, entre muitas outras. (Guimarães, 1996).
A familia e seu relacionamento costumam sofrer desequilíbrio em um processo
em que seus membros se vejam sofrendo tratamento de saúde. A ansiedade perpassa o
diálogo, mesmo quando esse ainda ó possível, e o pode ser uma das causas de seu
bloqueio e impedimento (Enuno e Kerbauy, 1994).
Ao se analisar estatisticamente os dados encontrados, se percebe que o setor
de neurologia e de queimados sâo aqueles que mais apresentam pacientes com
necessidade de acompanhamento familiar. Em ambos os sotores ó freqüento a presença
do crianças, dal tal urgência. No primeiro setor se percebe também que as causas físicas
que trazem o paciente a clinica são de impossibilitação, ou diminuição, de autonomia. O
que, também, justifica a necessidade de trabalho com familiares. Os dados confirmam a
literatura (Enumo, 1994) de que o familiar, um cuidador por função, acaba desenvolvendo
comportamentos compatíveis com estresse. Ao cuidar acaba descuidando-se de si mesmo
e gerando problemas ao tratamento. Quanto mais tempo de cuidados maior o déficit de
adesão a fisioterapia do paciento em questão (p, 0,001, teste de XJ). São duas as queixas
maiores; baixa adesão por falha no cumprimento das recomendações ou excesso de
fazeres no lugar do paciente. Quer dizer, o cuidador impedo o paciente de tentar e assim
se exercitar. Ao interagir, o psicólogo acaba por quebrar estas relações e possibilitar que
um novo tipo de relacionamento venha a ocorrer.
A equipe de saúde, em certo sentido, também funciona aos moldes das relações
familiares Com conflitos o afastamentos e aproximações sociais que variam ao sabor de
variáveis intervenientes.
E, nem sempre a boa comunicação pôde ser travada entre os vários personagens
desta dinâmica social desenrolada na Clinica Integrada. Por motivos didáticos, de facilitação
de análise, sub-dividiu-se em 7 categorias de atendimento psicológico: cinco da classificação
de atividades de fisioterapia: 1.neurologia; 2. ortopedia; 3. dermatologia-queimados; 4.C.A-
câncer de mama e õ.pneumologia. Criaram-se mais duas pela demanda de pedido de
ajuda ao psicólogo, chamadas de acadêmicos, quando a ajuda foi direta a estes e suas
demandas pessoais e psicologia quando o pedido veio de fora da atividade de fisioterapia,
mas por encaminhamento de pacientes. Os resultados intercruzados mostram que a
primeira solicitação do atendimento ocorreu do setor de queimados e esta demanda acabou
trazendo resultados chamados aqui de flutuantes. Quando a psicologia pôde atuar, logo
em duas a três sessões se verificou maior adesão ao tratamento fisioterápico, contudo
assim que esta se afastava o comportamento queixa retornava.
A apresentação de um caso clinico talvez lance luz sobre tal situação e,
simultaneamente, possa demonstrar como a psicologia adaptou-se as necessidades
de alteração do setting terapêutico.
Este relato de caso, ilustra como a psicologia vem passando por metamorfoses
que visam acompanhar as mudanças sociais e melhor atender as demandas que vão
sendo construidas pela comunidade humana. A atuação psícoterápica vem sendo, cada
vez mais, requisitada nas mais diversas modalidades e o modelo clínico permanente por
quase cem anos não atende mais ao que se pede do profissional psicólogo
(Guimarães,1996).
A criatividade, então, vem sendo um dos instrumentos de maior valia, para todos
os profissionais cuidadores de saúde e ou educação. Exemplo disso são as alterações
que dizem respeito ao setting clinico. Se num tempo recente o ideal era proceder ao
atendimento em salas com privacidade e num colóquio entre cliente e terapeuta, hoje
isso não se faz mais possível e nem mesmo necessário. O psicólogo atua quase sempre

Sobre Com|K>rt.imento c Coflniç.lo 257


em situações emergenciais que se instalam com flutuações emocionais diante deste
momentum da queixa e de sua inter-relaçào
A partir do momento em que o grupo despreocupou-se com a questão da privacidade
extrema e, passou a fazer os atendimentos onde quer que fosse possível, focando a pessoa a
ser atendida e não mais o local onde isso ocorria, ampliou-se a ligação afetiva entre os
profissionais, da equipe, que tomam o paciente como um único ser que se toma responsabilidade
conjunta, nào mals fragmentado em queixas dispersas e estanques, passando assim de
clínica multidisciplinar para clínica interdisciplinar. Bem como, pode-se atender um maior número
de casos. Assim, o profissional precisa estar presente nas situações em que sua ajuda se toma
mais eficiente, na totalidade dessa realidade. (Angerami-Camom, 2001)

R ELA TO DE CASQ.
METODOLOGIA
Participante?;
U ma criança (1 ano e 8 mesas), que havia sofrido queim aduras graves no pescoço, peito e braços e a
mAe desta (aproximadamente 30 anos. vendedora autônoma, casada em segundas núpcias e, com um
filho de 15 anos da primeira união).
L&âL
Clinica Integrada da FBculdnde Evangélica do Pnraná -Curitiba, PR. E-mail; paicoloaiaffifeDar,edu.br
Instrumentos.
Observação e registro de comportamento, entrevista clinica, terapia d e apoio e ou breve
Procedimento.
Atendimentos integrado» com a fisioterapia, a uma criança que havia sofrido queim aduras graves e
apresentava resistência ao tratamento quando na situação de atendimento de fisioterapia. Esse tipo de
acidente vem acompanhado de muitas dores físicas e acarreta seqüelas comportamentais, indicativos de
"memória da dor" No caso, havia uma situação agravante de insegurança e culpa materna em relação às
dores do filho. Já haviam ocorrido oito sessões de fisioterapia, anterior à entrada dn psicologia, e a cada
vez, a criança chorava e apresentava tentativas de fuga das mãos dos atendentes de fisioterapia No
primeiro atendimento de psicologia, foram realizadas observação e intervenção pela professora e uma
das estagiárias desse curso. Concomitantemente, a m ãe foi entrevistada, em outro local, por outra
aalagiária. A c ria n ça foi lava da p a ra a s ala d a psico log ia e là b rinco u com alu n o a d e ps ico lo g ia b a aluna-
atendente de fisioterapia, para depois fazer a sessão indicada para suas seqüelas de queim adura
No segundo atendimento repetiu-se o procedimento anterior e ao final dessa, a criança retornou aos
cuidados da psicologia
A partir da terceira sessão a criança passou a apresentar tranqüilidade e não precisou mais ser
acompanhada, pelos psicólogos, na sessão de fisioterapia, passando a dormir durante as sessões
Contudo, continuou a ir para a sala de psicologia apôs o atendimento
A m âe permaneceu em atendimento e por Intervenção da aluna mudou algum as posturas em relação a,
por exemplo, fazer uso da malha elástica própria ao tratamento de queim ados, fazer exercícios em casa e
colocar a criança em pré-escola. Aos poucos essa criança não mais precisou de acompanhamento de
psicologia e aderiu ao trabalho de fisioterapia.
No entanto, apareceu, dois meses depois, uma recidiva e que coincidiu quando houve(retirar) (a qual
coincidiu com a) troca da aluna de fisioterapia (prática comum nessa m odalidade de atendimento) e a
criança reagiu com estranheza à nova fisioterapeuta. Infelizmente a Inter-disclplinariedade foi
interrompida e, não foi mais permltklo a presença da psicologia junto a sessão de fisioterapia A aluna e a
professora de psicologia passaram, então, a dar orientação apenas à mãe
A parlir da 5* sessão com a nova aluna de fisioterapia, a professora de psicologia interviu novamente,
junto ã criança, levando-a a brincar com a aluna-(académ ica) fisioterapeuta, na sala de psicologia e
pedindo à criança que a chamasse para brincarem apóe a sessão de fisioterapia

Adesão da m ãe ao processo fisioterápico, com compra e uso da malha especial para queim aduras; relato
de que o pai está fazendo exercícios de massagem no corpo da criança - como requerido, mas de forma
lúdica, durante o banho A m ãe se mostra mais tranqüila em sala de espera, entregando a criança para a
fisioterapeuta e conversando com a aluna de psicologia enquanto espera, assim como com outras mães.
Relata ter posto a criança em escollnha e vem demonstrando preocupação com o filho mais velho, que
havia "abandonado" (S IC ) na casa da própria mãe, desde que se casou em segundas núpcias com o pai
do mais novo. Tem se dedicado ãs suas atividades de vendedora no período em que a criança fica na
escollnha. E, a criança apresenta melhoras em sua sociabilidade, bem como na recuperação de suas
seqüelas.

258 M ti r il/ ,i M estre, S. M u r.ir.i, R. P o rt« , I. A n to n io A . P.irciles, A . M t in m ir /, f . A m ln u le , I. Silvrt, ).


W lb riib , M . M o n te iro , M . M e ir .i, R, A n i.ir.il, R, R ib eiro, f. Voss
Então não se está apenas falando de locais diferentes para atender, mas de
uma postura diferente no atendimento. É uma pessoa total que se apresenta para ser
atendido e respeitado em sua essência por uma equipe que estuda suas queixas,
discute-as e troca informações. Entre os objetivos propostos (e alcançados om muitos
dos casos) estava a necessidade de modificar o espaço de trabalho psicológico. Quebrar
com antigas premissas em função de mudanças sociais. O setting terapêutico,
preconizado pela atividade de consultório, resguardado e sigiloso pode ser o Ideal e
muito provavelmente ainda cumpre sua função na maior parte dos casos, Contudo na
realidade ambulatorial (e também hospitalar) este é um "luxo” ausente. O que se tem é
a articulação entre os vários profissionais que estão ali cuidando do paciente. E, ou o
trabalho se faz na frente de todos ou não ocorrerá. Se não ocorrer, o sofrimento aumenta
e pode obscurecer todo o trabalho da equipo.

Conclusão
O trabalho realizado se mostrou eficaz, no que tange aos resultados encontr&dos.
A analise qualitativa e estatistica demonstraram que quando o tratamento ocorre de
forma - realmente integrado - a adesão ao tratamento e a reinserção social se faz mais
prontamente, alem de melhorar a qualidade de vida do pacionte e de seus familiares e
da equipe cuidadora.
Percebeu-se, outrossim, que o próximo projeto deveria ocorrer em conjunto
entre os profissionais envolvidos. Ou seja, a fisioterapia e a psicologia, no presente
caso. Há demanda de ampliação de serviços para o ano de 2006, como por exemplo,
grupos de 3“ idade, específicos para as queixas de fisioterapia, necessidade de
ampliação dos grupos de DPOC e C A. e de atendimento aos pais de crianças com
necessidades especiais (queimados, Sindrome de Down, paralisia cerebral, etc).
Alem disto, se faz importante repensar a entrada do aluno de fisioterapia no
primeiro setor de estagio, ao inicio do ano. O psicólogo poderia estar mais atento ao
stress que representa o dosafio de pela primeira vez ser responsável por pacientes e
mais ainda o momento da quebra do vinculo quando - por imposição da realidade do
curso de fisioterapia - há troca de grupo de estagiários. Tanto os pacientes sofrem com
a ruptura do vinculo como o aluno-atendente de fisioterapia se vê cobrado pelo paciente
ou seu familiar. E uma época propicia a conflitos e problemas - intra e interdisciplinar,
como da equipe com os pacientes.
Enfim, o saldo da pesquisa e de que houve maior adesão e menor stress da
equipe de fisioterapeutas e de seus pacientes quanto mais cedo houve a entrada da
psicologia na equipe profissional. Que as áreas que mais solicitam ajuda são aquelas
que precisam de maior adesão familiar ao tratamento - neurologia e queimados.

Referências

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Sobrf Comportamento c CognifAo 259


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conhecer e avançar. Vol.1. Santo André: ESETec.

2Ó 0 M e flr e , S. M u m u i, R. Portes, I. Anlonio A. I\u e d e f, A. f. Andr.nlc, I. Silvd, )■


W lbrid), M . M o nteiro, M . M e ir.i, R. A m .ir.il, R. Ribeiro, 1. Voss
Capítulo 21
Behaviorismo Skinneriano em
Contraponto à Psicanálise e à
Ciência Cognitiva
Rodrigo Cruvmel Salgado1
UH
Maura Alves Nunes C/ongora'
UFL

Esto ensaio procura reunir algumas das mais significativas diferenças que o
Behaviorismo Radical mantém com a Psicanálise e com a Ciência Cognitiva. Pretende-se,
assim, tornar mais claras importantes questões com as quais o analista do comportamento
se vê onvolvido e, com isso, ampliar suas possibilidades de dialogar com outros sistemas
teóricos da Psicologia. Na medida em que estas diferenças possam tornar-se mais
evidentes, espera-se contribuir para que a adoção ou rejeição da tradição behaviorista seja
mais fundamentada e menos dogmática. Assume-se ao leitor que as outras abordagens
em foco ganham algum significado sob um ponto de vista parcial, qual seja, o do
Behaviorismo Radical, mas quo isso não torna a argumentação menos proveitosa.
Iniciamos reconhecendo que om Psicologia, nenhum modelo teórico ó de fácil
compreensão. Uma visão global de determinado sistema, ou de seus pormenores, ou
de possíveis influências que tenha recebido, pode demandar anos de estudo e
amadurecimento pessoal. Em se tratando do Behaviorismo Radical, o leitor iniciante,
não raro, desconhece suas premissas e objetivos. Por motivos que não cabo aqui
discutir, o ensino do sistema skinneriano, às vozes, apresenta dificuldades maiores
que o ensino de quaisquer outros sistemas. Em geral, o estudante aprende a condicionar
ratos a apertar barras, mas falta-lho o ensino de outra etapa do caminho.
Pormanece, por vezes, uma importante parto da história que so passa fora do
laboratório e que precisa ser contada, è pretensão deste ensaio recontar parto dessa
história. Não ó demais lembrar que o substancial interesse de B. F. Skinnor não era o
rato. Entre seus interesses finais, dois merecem destaque: um deles, explicar o
comportamento humano, um intoresse que apareço, insistentemente, em diversas obras
suas com a mesma frase "Porque as possoas se comportam da maneira como o
fazem?” (Skinnor, 1974, p. 9). O segundo o talvez mais importante interesse era o
desenvolvimento de uma ferramenta ou tecnologia que pudesso tnzer bem-estar à vida
das pessoas. Em outros termos, seu interesse último não só não era o rato, como

1Mimtmiirio d« ProgrHiiitichi Moitlrudoihii AmAIbo doComporlaimmlodu Univnwdado EiUdual d* Londrtnn BoIumIh da


CAPES rr4<Btp»kx> n**t
' Dnunnl« do Oi|iHrtaniwiUid*i Psicologia Owal o Anàliwi do Comportam«tio o do Programa d» Mantwdo om Aitállwi do ComporUimimlo (Im
Unlvorhklado bttlHdutil de Londrina riiaoraOtwl b*

Sobro Comporfiimonlo c C ormIv^ o 261


também não era apenas desonvolver uma ciência para sor contemplada4 Ele só via
sentido em uma ciência que pudesse ser aplicada para molhorar a vida em sociedade,
ou em suas palavras, preservar práticas culturais. Essas são metas das quais nâo
devem se distanciar nossas considerações, caso se pretenda alguma compreensão
do caminho pavimontado e porcorrido polo Bohaviorismo skinnoriano.
Ao conduzir a discussão, espera-se que o leitor leve em conta dois pontos:
primoiro que B. F. Skinnor denomina Behaviorismo Radical à filosofia quo fundamenta
a Análise do Comportamento, entendida esta como uma ciência do comportamento;
segundo, que o Behaviorismo Radical fundamenta a Analiso do Comportamento com
dois modelos explicativos - a Análise Funcional o o modelo de Variação e Soloção do
Comportamento polas Conseqüências (filogenóticas, ontogenóticas e culturais). A
conjunção de ambos os modelos permito à Análise do Comportamonto afastar-se de
explicações pautadas no modelo tradicional de ciência conhecido como modelo causal
ou do tipo causa-ofeito. A visão causal prossupõo quo as oxplicaçõos para cada um do
diferentes fenômenos estudados sejam únicas (cada fenómeno tom uma única
explicação corrota), linearos (unidirecionais), contíguas (próximas no tompo e no espaço)
e necossárias, do tipo mocanicista. O primoiro dos modolos adotado polo Bohaviorismo
Radical - funcionalismo - pressupõe relações múltiplas e em múltiplas direções (em
redo), não nocossárias, incluindo a bidirecionalidado. O sogundo modolo adotado,
solocionismo, além de compatível com o modelo de relações funcionais, pressupõe
transformação histórica do comportamento, o qual ó modelado ao longo do tempo.
Esse modo causal dispensa a contigüidade temporal e espacial entro os fonómonos
estudados. Com esses dois modelos de explicação, portanto, o Behaviorismo Radical
toma outro rumo (diferente do tradicional) enquanto visão do mundo o do ciência. Feitas
essas considerações, é hora de abrir o debate.

Contraponto com a Psicanálise


B, F. Skinner não poupou palavras ao dirigir críticas à Psicanálise froudiana,
mas não escondeu certa admiração pelo pensador austríaco. Logo no primoiro parágrafo
de sou artigo A Critique of Psychoanalytic Concepts and Theories (1972) reconhece que
uma grande contribuição de S. Freud foi a de "reduzir grandemente a esfera de acidente
o capricho em nossas considerações da conduta humana" (p. 239). Em outras palavras,
elo reconhece quo S. Freud foi um dos pioneiros em assumir que se as pessoas fazem
e sentom cortas coisas e não outras, não o fazem por simples acaso, ou do forma
caótica ou improvisível, mas que oxistem certas relações de regularidade entre estas
ocorrências o as ocorrências do mundo
Em suas pontuações ao modolo psicanalitico, portanto, B. F. Skinner não deixará
do apontar-lhe os momontos felizes ao investigar a conduta humana, ombora a maior
parto do tempo seja para demonstrar, ponto a ponto, sérios problomas da linguagem
psicanalítica, do ponto de vista científico ou, molhor dizendo, do ponto do vista
opistomológico. Serão estas algumas das considerações gerais contidas nesta seção.
Em primeiro lugar, reconhoce-so que S. Froud se aproxima de uma posição determinista.
Como tal, uma importante providência a ser tomada ó analisar, ontão, do que modo a
Psicanálise ostá constituída enquanto modelo causal ou explicativo.
Como apontou Skinnor (1972), oste modelo pode ser visto sob dois asf>octos: de
um lado, através do obsorvações clinicas, S. Freud descrove relações ontro ocorrências
traumáticas na infância o comportamento patológico subseqüente, ou soja, a rolação ontro
eventos ambientais e comportamonto. Nesse sontido, o modelo psicanalitico é descritivo,
atendo-so aos fatos públicos, passíveis de observação direta. Por outro lado, à medida que

262 Rmlriflo CruvinW S.ilfl.iilo, M<iur.i A lvo* Nunes C/odrom


o modolo vai sendo construído, ganha cada vez mais corpo o aparelho psíquico, situado
entre essas ocorrôncias do ambiente e o comportamento patológico do indivíduo. Nesto
momento, portanto, está constituída uma cadeia explicativa em três elos que se seguem
nesta ordom: eventos ambientais - estados ou processos mentais - comportamento. Assim,
S. Froud parecia trilhar um caminho seguro, não fosse por sua insistôncia om voltar-se para
o elo do meio como medida explicativa dos problemas humanos. Os eventos ambientais
(traumáticos, em sua maioria) modificariam profundamente o aparelho psíquico e este, por
sua vez, produziria determinados padrões do comportamento como manifestação (sintomas)
das modificações intornas. Esse ó, esquomaticamente, o modelo analisado e criticado por
B. F. Skinner. Pontuaremos, na seqüôncia, alguns dos principais temas debatidos entre a
Psicanálise froudiana e o modolo skinneriano.

O contraponto skinneriano em alguns temas especificos


Desvio de rota e excesso de teoria - Para B. F. Skinner, alguns problemas tornaram-se
cada vez maiores á medida que o aparelho psíquico ganhava detalhes refinados com
relação ao modo como potencialmente funcionava. A clássica subdivisão om ld, Ego e
Superego delineava o que Skinner (1974) chamou de "atores internos" que compunham
a dinâmica da Psique. A grande questão não ó que o constructo do aparelho psíquico
seja totalmente infundado, mas que o dispendioso trabalho de elaboração do aparelho
e de todo o seu funcionamento, se deu a partir da observação do comportamento em
contingências públicas que podem ser descritas com bastante rigor e precisão. No
entanto, a descrição de contingências não tem lugar privilegiado no sistema explicativo
freudiano. Tomando aponas um exemplo dentre os que dizem respeito aos mecanismos
psíquicos de defesa, considero Repressão;
Repressão, grosso modo, diz rospeito ao mecanismo de defesa do Ego
segundo o qual desejos incapazes de serem satisfeitos são mantidos fora do alcance
da consciência. Enquanto a explicação se mantém nesse nível, estará obscura. Veja:
quem ou o que produz o mecanismo de defesa? E quem ou o que mantêm o desejo
inacessível à consciência? Skinner (1974) procurou explicar o fenômeno denominado
repressão na Psicanálise, sob a perspectiva da filosofia comportamentalista radical.
Nessa perspectiva, seria mais provoitoso dizor quo um comportamento (libidinoso, por
exemplo) que foi extremamente punido pode adquirir, ele próprio, propriedades de
estimulação aversiva condicionada. Isto quor dizer que a simples ocorrência desse
comportamento podo ser geradora de intensa ansiedade. Â medida que a pessoa,
sistematicamente, faz outra coisa e com isso não emite o comportamonto antoriormento
punido, também "não entra em contato" com os produtos daquelo comportamento, se
osquivando assim da estimulação emocional aversiva Importante constatar neste
exemplo, que se pode identificar e descrever objetivamonte, nas práticas culturais em
gorai, quem pune, como o faz e quais os comportamentos punidos, uma vez quo, tais
ocorrôncias se dão, em grande parte, no domínio público de observação.
Outro exemplo de Skinner (1974) ó a "explosão" do pessoas iradas. O
comportamento de manifestar raiva que se diz ter sido sistematicamente reprimido,
provavelmonte foi punido, mas a idéia que se faz é que a raiva reprimida vai sendo, por
isso, armazenada até que haja uma explosão de ira. B. F. Skinner sugere que a
manifostação da raiva ou a "explosão", em geral pode ser explicada por certas mudanças
no ambiente, que passam a permitir essa manifestação, e não porque transbordou
como um líquido que enche um recipiente. O processo de repressão, portanto, teria sua
origem no ambiente o não na ação de algum agente interno.

Sobre Comport.imento e t'ognlv<1o 263


O desvio aqui discutido poderia ser, ainda, ilustrado com uma metáfora. Um
mensageiro estuda em detalhes o melhor caminho para percorrer e entregar, em tempo
e do modo seguro, uma correspondência importante. Contudo, embora escolha um bom
caminho, ao fazer o percurso, ele se depara com muitas flores, se encanta com elas e
pára a contomplá-las. Esquece-se, assim, do continuar em ritmo e direção suficientes
para ontrogar a corrospondôncia. Pior ainda, ao se encantar com as flores toma um longo
desvio o se afasta da rota principal. O quo B. F. Skinnor quor dizer a S. Freud ó oxatarnento
isso: O caminho que vocô escolheu ó bom! Esqueça as flores e os desvios, agora não é
hora disso! Proocupe-so om percorrer o caminho mais adequado para sous objotivos. Do
exposto, o que se quor demonstrar ó que modelos teóricos que se afastam ou se abstém
dos dados obsorvávois tondom, inevitavelmente, para o excesso do teorização. Dentre
outros fatoros isso podo sor prejudicial porque um trabalho dispondioso podo sor inútil,
na medida om quo aumenta as chances de erros para qualquor explicação.
Nosta soção e em todo o docorror desto onsaio, o leitor perceberá uma
insistência de B. F. Skinner em transportar as explicações do comportamonto para u
domínio das ocorrências públicas, onde, em geral, se ontonde que seja possível roalizar
observações diretas. Com isso, ole não quer dizer que tais obsorvações sejam totalmente
isentas de interpretação, ele quer dizer aponas quo elas são monos inferenciais que as
indiretas e suficientes para os sous objotivos pragmáticos de predição o controle do
comportamento. Afinal o comportamonto do ciontista estará sempre sob o controle de
algum paradigma com o qual ole conduz suas obsorvações (Skinner, 1989).

Atribuição de estatuto ontológico a construções teóricas - Até aqui tomos onfatizado o


desvio freudiano das explicações ambientais para as explicaçõos montais conceituais,
representadas no segundo elo de uma suposta cadeia causal, Isto por si só dificulta a
investigação e se caracteriza como excesso de teoria. Apesar disso, construir motaforas
(o aparelho psíquico) para melhor explicar um fenômono não constitui, necessariamente,
um problema epistemológico. O problema surge quando a motáfora passa a assumir
função de agente causal na explicação do comportamento. Recorremos a outra metáfora
para ilustrar essa questão. Imaginemos aquele eixo sob o qual se diz que a Terra gira
om torno de si mesma. Não oxiste eixo algum, mas imaginá-lo auxilia na compreensão
desse tipo de movimento da torra, tal como quando se porgunta * Em quantos graus a
Terra estará inclinada agora? Ponsar metaforicamente nesto oxernplo implica imaginar
o movimento terrestre, de tal modo, quo seria “como se" a terra girasse em torno de um
eixo. Mas o problema surge, digamos, quando se começa a atribuir uma catástrofe
geográfica qualquor a um mau funcionamento do eixo terrestre.
Do acordo com esse exemplo do eixo da Terra, havendo a queda de um meteoro
(primeiro elo), um maremoto poderia ocorrer (terceiro elo). B. F. Skinner diria que ô
oxatarrionto a relação entre estes dois elos que precisa ser detalhada. Mas o problema
surgiria se alguém dissesse, então, que o meteoro abalou o bom funcionamento do
oixo (segundo elo), e que por isso o maremoto foi produzido. Isto implica atribuir ostatuto
causal ao olo intermodiário, um procedimento problemático porque muito diferonte de
simplosmonte recorrer-se a uma metáfora como um recurso de linguagem. Tambóm
nào so trata aponas de desviar-se de um caminho explicativo mais promissor, ó muito
mais quo isso, ó dar estatuto ontológico a constructos hipotéticos, é atribuir existência
factual a algo quo ó apenas conceituai. Dito de outra forma, ó osquocor-so do quo a
metáfora dizia apenas quo era “como se” a Terra tivesse uni eixo central, ou era "como
se" nós tivóssomos um aparolho psíquico que funcionasse de certo modo. Porém,
esquecendo-se do dizer “como se" passa-se a tratar o aparelho psíquico como se ole
pudesse assumir propriodades do mundo físico ou dos eventos passíveis de serem

264 Ivoilrifl» 1'iuvinel S.i Ir.h Io, M .iur.i Alves Nunes í/oiiRur.i
medidos em dimensões físicas. Com isso, permanece para a Psicanálise a questão
da impossibilidade lógica de um constructo, sem dimensões físicas, causar o
comportamento potencialmente descrito em termos físicos. Mas esse problema se
complica ainda mais, porque permanece também com ele outro problema logicamente
insolúvel, o de explicar a relação mente-corpo.
Modelo de ciência e contexto om quo S. Freud produziu sua obra - Cabem, nesta altura
do debate, algumas considerações a respeito do contexto no qual S. Freud produziu sua
obra o sua visão do ciôncia. Inicialmonto, o aparolho psíquico talvoz tivosso pouco a
contribuir na cadeia causal, mas, levando-se em consideração os contextos científico e
profissional com os quais estava em contato, talvez seu trabalho não pudesse mesmo
ser diferente, e a mente inventada por ele passou a adquirir dimensões cada vez maiores,
segundo Skinnor (1972; 1974). Deve-se lembrar que S. Freud era médico. Como tal, e
principalmente segundo a medicina da época, havia uma necessidade lógica em se
encontrar, no corpo, uma causa localizável e imediata de qualquer problema ou sintoma.
Um evento ou sintoma sem uma causa palpável dificilmente poderia ser imaginado.
Somado a isso, considore que no contexto médico-cientlfico da época concebiam-se as
relações entre os fenômenos com causalidade linear e, temporalmente, próximas.
Levando-se em consideração estas observações, provavelmente o trabalho de S. Freud
tenha sido profundamente influenciado, de um lado, por sua formação médica,
substancialista; de outro, por uma visão de ciência que ainda aderia ao modelo causal
de explicação, ou seja, um modelo predominantemente mecanicista. Era um contexto
que, provavelmente, não permitiria uma explicação histórica do comportamento. No
caso, seria difícil que as contingências nas quais se deram as experiências infantis,
distantes no tempo e no espaço, adquirissem em sua teoria o papel central de explicar
os comportamontos (sintomas) atuais. Nas palavras do próprio Skinner (1972):
(...) Ele [Freud] nâo apelou para o elo do melo para explicar osponlaneidado ou
capricho Ao invés, ele utilizou-o para preencher lacunas no tempo e no espaço
entre os eventos que mantinham comprovada relação de causalidade (p. 241,
tiüduGãú nüütità).
Em contraponto a essas possiveis limitações do modelo freudiano, ao
Behaviorismo Radical, desenvolvido em outro contexto científico, foi possível admitir
que variáveis independentes entram no processo de modelagem do comportamento,
ao longo do tempo, sem requerer para isto uma relação temporal ou espacial imediata
com o comportamento de interesse (Chiesa, 1994; Smith, 1986). Em outros termos,
eventos do ambiente que explicam o comportamento atual, nào necessariamente
encontram-se próximos no tempo. Portanto, não há razão alguma para se atribuir a
relação entre eles a alguma entidade mental, apenas para que esta faça a ligação entre
as duas ocorrências. Desse modo, o elo do meio da explicação freudiana poderia ser
dispensado se fosse revisto por um modelo de ciência não causal, mas apenas relacional
(de análise funcional) e histórico (de seleção pelas conseqüências) nos moldes
defendidos por Skinner (1972; 1974; 1987; 1990).

Objeto de estudo e descritivismo - O interesse central dos estudos psicanalíticos está


na compreensão do funcionamento do aparelho psíquico, ou dos mecanismos mentais
dos quais o comportamento público é manifestação ou sintoma. Diz-se, então, quo é
preciso encontrar ou demonstrar as causas das quais o comportamento é sintoma.
Conforme já mencionado, S. Freud não prosperou na análise das contingôncias infantis
para poder prescindir de centralizar seus esforços no ostudo do aparelho psíquico. Ou,
como afirma Skinner (1974), ele internalizou o ambiente público transformando-o nas
instâncias do aparelho psíquico. Contudo, enquanto a Psicanálise procura as causas

Sobre (.’omporUimcnto c Cohiiíç<1o 265


mentais das quais o comportamento é sintoma, a Análise do Comportamento procura
nas próprias contingências ambientais públicas, as variáveis das quais o comportamento
é função.
Em contraponto à Psicanálise, o Behavionsmo Radical tem como objeto de estudo o
próprio comportamonto, entendido como o produto conjunto de trés tipos de contingências
seletivas: as naturais, as operantes e as culturais. Contudo, como a Análise do Comportamento
tem se dedicado ao estudo das contingências operantes, no contraponto entre ela e a
Psicanálise, direcionaremos o nosso exame ao modelo operante. Nele, a noção de
comportamento ó fundamentalmente relacional - comportamento operante ó por definição o
responder sob o controle do ambiente, seja do ambiento antecedente (discriminativo); seja do
controle conseqúente (reforçador). Isto quer dizer que toda vez quo o tormo comportamonto ó
utilizado para referir-se á ocorrência de respostas (ações) sem pressupor que essas
ocorrências são parte da contingência operante, e que estão, necessariamente, sob o controle
discriminativo e reforçador do ambiente, o sentido não ó de comportamento operante. Estô é
apenas o uso do senso comum para o termo comportamonto (como uma ação qualquor, ou
como a resposta em sua topografia). Do exposto, decorrem duas implicações. Por um lado,
na explicação do comportamento oporante pela descrição das contingências ontogenéticas
há uma superposição ou identificação entre o objeto de estudo (comportamento) o a sua
explicação (descrição das contingências). Por outro lado, o objeto de interosse no modelo
operante não é o comportamento, entendido no sentido comum do termo. O intoresse está na
relação de respostas específicas com variáveis ambientais também específicas, ou seja, nas
relações de contingência Isto quer dizer que o comportamonto da concepção psicanalítica
nào é, naturalmente, o comportamento oporante, é só sintoma, cuja utilidade única é pormitir
a inferência de processos mentais interiores subjacentes, mais importantes. Estes, sim,
representados pelo aparelho psíquico constituem o foco de interosse. Sobre a teoria operante,
diz Skinner (1968):
(...) o termo teoria não se refere aqui (...) a alguma explicação de um fato observado
que esteja relacionado a eventos que acontecem em outro lugar, de acordo com
algum outro nível de observação, descrito em diferentes termos, e medidos em
diferentes dimensões, (p. 69, tradução nossaL

O trecho acima expressa bem a posição skinneriana contrária a todas as formas


de mentalismo, justamente porque os dados dos quais elas inferem processos mentais
são comportamentais. Ou seja, elas deslocam sua análise de interesse do domínio
comportamental para o mental, deixando ao comportamento apenas papel secundário.
A Análise do Comportamento parece ser a única ciência do comportamento que, de fato,
enfoca o comportamento como objeto de estudo. E, ao fazê-lo explica-o em seu próprio
domínio e direito onde ele mesmo ê o foco de interesse, assumindo papel principal.
Explica-o apenas descrevendo-o, uma vez que descrever as contingências é o mesmo
que descrever o comportamento; descritivismo é a denominação dessa forma de fazer
ciência. Como diz Skinner (1968), esta é a maneira encontrada de se evitar construir
teorias que pouco olham para os dados empíricos, ou teorias lógico-dedutivas que se
abstém do contato com os dados, ou de teorias realistas, que atribuem essências
causadoras ao comportamento, quando de fato têm acesso apenas à relação entre os
eventos que tomam parte nas contingências, neste caso, nas contingências operantes.
Assim, como lembrou Abib (1997), mesmo para autores de tradição de pensamento
completamente diferentes (Kofka, Skinner, Plaget, por ex) a Psicologia é ciência do
comportamento. E se o objeto de estudo da Psicologia ó o comportamento, tomemos
diretamente o comportamento como objeto de estudo.

266 Roilrigo Cruvinel S«tlg.ulo, M .iura Alves Nunes Qongor.i


Sobre o inconsciente - Alguns psicanalistas tomam para si o mérito de serem os
investigadores das causas "profundas" do comportamento, causas que dizem respeito
ao inconsciente. Com isso, em geral argumentam que estão estudando a natureza
humana em toda a sua complexidade, e que os comportamentalistas estão longe do
alcance de tais causas, tornando sua abordagem superficial se comparada à
Psicanálise. O que eventualmente desconhecem, como o próprio S. Freud considerou,
ó quo a grande questão não se trata do que seja consciente ou inconsciente para uma
pessoa. Mas ó o fato de que, ainda que o indivíduo seja consciente de porque se
comporta de tal modo em tal situação, ou das causas de seu sentimento, isso om nada
muda o fato de que o comportamento continua, de algum modo, à mercê das causas
quo realmente o originaram e o mantém (Skinner, 1972). O que B. F. Skinner pretende
salientar com esta observação é que descrever tanto quanto possível as relações entre
ocorrências do ambiente e do comportamento, pode ser um caminho legitimo para a
investigação das "causas profundas" do comportamento.
O comportamento, om termos simples, ó por principio inconsciente. A pessoa
simplesmente se comporta em função de variáveis do ambiente. Numa fase posterior é
que, eventualmente, será capaz de descrever as razões pelas quais se comporta daquele
modo. As coisas do mundo ou sou próprio comportamento tornam-se conscientes á
medida que sua comunidade verbal lhe provê condições para isso e, neste episódio,
estão envolvidos dois comportamentos; um primeiro, ó inconsciente. Por exemplo, andar
de um lado para outro e apresentar comportamentos de irritação, ao mesmo tempo em
que ocorre desconforto estomacal. Um segundo, é comportamento verbal e,
eventualmente, descreve as razões do primeiro. Por exemplo, nomear o estado como
ansiedade, relacionar o processo com o eminente término de um namoro ou com uma
possível situação aversiva na infância que mantenha certa semelhança com a atual.
Fazer esta descrição também constitui um comportamonto, mas em separado do primeiro
(andar de um lado para outro, etc). Desta forma, como insistiu Skinner (1974), o
comportamentalista em geral não se avém com outra coisa que não seja o que os
psicanalistas chamam de inconsciente. A consciência, no entanto, ó um produto de
aprendizagem social, mas "se a consciência parece ter um efeito causal, trata-se do
efeito do ambiente especial que induz a auto-observação" (Skinner, 1974, p. 153).
Desse modo, ao que indica nossa argumentação, o modelo skinneriano teria
uma vantagem substancial nesse debate; tal como a Psicanálise, admite as "causas"
inconscientes, mas elas não emanam de um agente misterioso dos recônditos da
mente, ao invés disso, emanam dos ambientes passado e presente. Nesse sentido,
são causas passíveis de descrição e compreensão relativamente seguras. Os
psicanalistas, em geral, tendem a um discurso charmoso e rebuscado ao descrever a
dinâmica inconsciente envolvida na ação das pessoas. No entanto, deve-se perguntar
se eles realmente se aproximam do que seja o inconsciente sem considerar as
estratégias próprias de sua comunidade verbal, com as quais auxiliam seus pacientes
a se conhecerem.
Em termos conclusivos, as impressões gerais que ficam da leitura de Skinner
(1972; 1974) em diálogo com a Psicanálise são de uma critica em grande estilo. Não há
um movimento irritadiço em direção ao oponente. Ao contrário, há um duelo de estudo e
respeito, No texto skinneriano, em que é escassa a generosidade ou a indulgência,
permeia a admiração ao trabalho freudiano, mesmo em momentos de crítica
contundente. É o torcedor que xinga seu próprio time ao perder um gol feito. Em A
Critique of Psychoanalytic Concepts and Theories (1972),_há um trecho bastante irônico
em que B. F. Skinner diz que S. Freud por pouco não participaria de um movimento

Sobre Comportamento c Co^niv^o 267


americano chamado Behaviorismo. O que lhe faltou, segundo o pensador americano,
foi uma operacionalização de termos psicológicos mais adequada.

Contraponto com a Ciência Cognitiva


Esto seçfto talvez sugira ao leitor um debate mais simples, tendo em conta
nossa familiaridade com a maioria dos conceitos e termos próprios da Ciéncla Cognitiva;
termos afinados à linguagem popular, utilizados na vida cotidiana. Mas, ao contrário, no
debate científico, o uso de linguagem extremamente familiar tende a dificultar uma
análise apropriada. Podemos adiantar que nos textos skinnerianos, fica clara sua irritação
com os descuidos da linguagem e do raciocínio cognitivista e, ao contrário de alguma
simpatia e concordância que deixa escapar em relação á Psicanálise freudiana, com a
Ciência Cognitiva a divergência é muito mais pronunciada. Esta seção será uma tentativa
de demonstrar alguns pontos críticos das discordâncias.
Nào há um modelo toórico único quo caracterize a Ciência Cognitiva. No entanto,
quaisquer versões cognitivistas compartilham de uma proposta geral de eyplicação
causal; fenômenos ou processos cognitivos e estados mentais, de ordem interna, são
responsáveis pelo comportamento e, por vezes, pelos afetos. O que em geral varia é o
modo como cada modelo se propõe a explicar o que sejam tais fenômenos ou processos.
Uma variação importante é o modelo cognitivo de A. T. Beck. Embora tenha recebido
várias outras contribuições desde sua origem na década do 1960, esse modelo continua
sendo o principal norte do cognitivismo no campo da Psicoterapia. Nele é central a tese
de que os problemas psicológicos humanos têm origem, essencialmente, na avaliação
que a pessoa faz do mundo, de si mesma e do futuro, a qual A. T. Beck denominou
"tríade cognitiva". A avaliação tende para formas mais negativas ou mais positivas e,
dependendo de tais tendências, produz problemas emocionais e comportamentais em
grau variável, diretamente proporcional à qualidade de tais avaliações. Tal funcionamento
cognitivo se dá com base em uma complexa rede de regras ou esquemas cognitivos de
base, dos quais derivam outras cognlções, crenças ou pensamentos (Rangè, 1997). O
modelo se ocupa dos conteúdos mentais conscientes ou pró-conscientes (aqueles
facilmente trazidos para a consciência) e com isso, entende que o comportamento
humano e as emoções são gerados por estes conteúdos e não pelos conteúdos
profundamente inconscientes, como pressupõe a Psicanálise freudiana (Beck, 1976).
Para um outro tipo de cognitivismo, o neurocientífico, a mente pode ser
identificada diretamente com o que o cérebro faz, o que, por sua vez, determina o que o
indivíduo fará. Desta forma, uma Psicologia Cognitiva fundada no domínio de estudo da
Neurociência e quo transplanta seus termos psicológicos para o campo cerebral espera,
definitivamente, que as respostas acerca da estrutura e funcionamento físico-químico
do cérebro lance luz sobre suas perguntas. Essa versão, bastante atual, mereceu de B.
F. Skinner um tratamento á parte, razão pela qual a comentaremos em separado.
Ao longo desta seção, será examinada a ciência cognitiva, em suas versões
mentalistas, as quais não se reduzem nem ao estudo de processos biológicos
(genéticos, ou neurofisiológicos por ex.) nem aos processos comportamentais
estudados pela Análise do Comportamento. Desse modo, incluem-se entre as versões
mentalistas, além do modelo de A. T. Beck, outras versões tais como a da "Transformação
da Informação" ou da "Inteligência Artificial", as quais usam o funcionamento do
computador como metáfora explicativa do funcionamento da mente.
Antes de continuar, porém, para evitar repetições, serão indicadas, entre as
críticas já feitas à Psicanálise, aquelas que também se aplicam á Ciência Cognitiva: a
interiorização do ambiente público ou das contingências ambientais com o conseqüente

268 Rodrigo Cruvlncl S.iltfitdo, M .tuw A lv rs Nunes C/oiirom


afastamento dos dados observáveis; o impasse corn a relação mente-corpo, traduzido
na atribuição de estatuto ontológico para os constructos teóricos; a definição de
fenômonos montais como objeto de ostudo em contraposição ao papel secundário
reservado ao comportamento; a concepção não operante de comportamento que o
reduz a simples ações observáveis, dofimdas aponas por sua topografia; o, finalmente,
o modo mocanicista de buscar oxplicações para o comportamonto. Como se tratam de
tomas complexos, ainda voltaremos a abordar alguns doles, ao analisarmos outros
aspectos da Ciôncia Cognitiva.

F en ô m e no s c o g n itiv o s e seu p o te n c ia l para e x p lic a r o


comportamento
Valo lombrar alguns dos termos mais usados para denominar fenômenos
mentais cognitivos: pensamento, inteligôncia, imaginação, avaliação, sistemas de
crenças, processamento de informações, cognição, conhecimento, percepção, intenção,
vontade, propósito, associação de idéias, expectativa, momória, conceito, abstração,
atenção, sensibilidado, consciência, criatividade. Enquanto na Psicanálise os conceitos
montais visam, de forma predominante, explicar fenômenos emocionais o motivacionais,
ou seja, relativos a desejos, impulsos e sentimentos, o que se vô, em um rápido oxamo
dos termos acima, é que na versão da mente cognitiva, os conceitos dão ênfase à
explicação de fenômenos relativos à inteligência e, especialmente, ao conhecimento;
aliás, ó este o sentido aproximado de "cognição". Termos como sensibilidade, atenção,
percepção, memória, abstração, pensamento, consciência e, finalmente, conhecimento,
são todos relativos aos processos pelos quais uma pessoa se relaciona com o mundo
e pode-se dizer que passa a conhecê-lo.
Na ciência cognitiva entendo-se que esses termos descrevem ou se referem
aos processos mentais superiores, campo do embates entro B. F. Skinnor e o cognitivismo
em geral. São ombatos que envolvom importantos questõos opistomológicas as quais,
sogundo elo, mereceriam maior consideração por parto dos cognitivistas. Dessa
manoira, grande parto da argumentação skinneriana constitui tontativas do domonstrar-
íhes como os chamados processos mentais superiores podem ser entendidos, em
maiores detalhes e com maior propriedade, da perspectiva do Behaviorismo Radical e,
especialmente, do modelo operante de análise do comportamento
Fenômenos mentais “conceituais" e “reais” - Alguns dos termos cognitivos se roforom a
comportamentos encobertos ou a eventos privados (estados corporais) que podem ser
objeto de auto-obsorvação, via introspecção: imaginar, ponsar, sontir, tor vontade. No
Behaviorismo Radical, esse tipo de ocorrência encoberta ó considerada como evento
natural, e como tal, semelhante a qualquer outro evento do dominio público, embora
sua observação direta esteja restrita aponas ao próprio sujoito comportanto. Esses são
os fenômenos mentais aqui denominados "reais". O Behaviorismo do B. F. Skinnor foi
donominado "Radical’’, em grande parte, por ter integrado ao sou campo do estudo os
fenômenos mentais reais, abordando-os como fenômenos naturais, o doscrevendo-os
sogundo leis do comportamento.
Outros fenômenos montais próprios da Ciência Cognitiva, porém, não
constituem comportamento encoberto (imaginar, ponsar verbalmente) e nem estados
corporais ou ovontos privados (sentimentos, sensações, vontade). Portanto, não podem
ser observados por ninguém, nem pela própria pessoa que se comporta. Esto é o caso
de esquemas cognitivos, processamento do informações, inteligência, memória,
criatividade e tantos mais. Ninguém que olhe para dentro de si mesmo observa sua
inteligôncia, rodes cognitivas ou criatividade. Estes termos não se referem a eventos

Sobre C'omporl.imento e l\>fl»lv«lo 269


naturais, ao contrário, são de natureza meramente concoitual, tratam de puras
construções teóricas ou de metáforas, por isso os denominamos aqui "conceituais".
Em sous dobatos com as teorias mentalistas om geraíe com a Ciência Cognitiva,
em particular, B. F. Skinner refuta a possibilidado do comportamento vir a ser explicado
por fenômenos mentais, sejam eles os roais ou os conceituais. Entretanto, os
argumentos para refuta-los são distintos, como mostrarão as próximas soçõos.

Fonômonos cognitivos "conceituais" e a oxpficação do comportamento z Não ó preciso


ir muito longo para so demonstrar quais as alegações skinnerianas para refutar as
explicações que se pautam eni fenômenos puramonte conceituais. Aplicam-se aqui os
rnosmos argumentos das análises já apresontadas om rolação aos constructos teóricos
e às metáforas psicanalíticas. Embora, 110 campo cognitivo, talvez soja mais difícil ao
leitor distinguir 0 que sejam apenas construções teóricas frágois, dovido à familiaridade
com muitos dos seus termos. Acrescente-se ainda outra dificuldado: os usos do muitos
tormos cognitivos (e tambóm psicanalíticos) envolvem práticas linguísticas ospeciais,
com as quais se constroem inferências e substantivações do comportamentos.
Os processos de inferências e do substantivação, ganham formas do tipo - "ele
decora com rapidez porque tem boa memória"', "identifica diferentes tipos de vinho porque
tem sensibilidade"', “pinta quadros improssionantos porque tem criatividade ou talento";
"mantêm diferentes amigos porque tem habilidades sociais". Nesses casos, não havendo
corno se observar diretamente a memória ou a sensibilidade, afirmar que alguém as
possui só pode ser por inferência dos comportamentos observados: decorar com rapidez
e identificar vinhos. Isto quer dizer que as descrições de comportamentos, representadas
por verbos (decorar ou identificar), quo expressam de maneira mais apropriada a atividade
dos organismos vivos, foram apenas substituídas pelos substantivos (memória e
sensibilidade) A forma substantivada pode ser prática no uso cotidiano, mas na visão
skinneriana nâo acrescenta nada enquanto explicação. Ou seja, o substantivo "criatividade"
não podo sor a entidade que causa o comportamonto de “pintar quadros impressionantes",
pelo simples fato do dizer a mesma coisa. Torna-se, em última instância, uma circularidade
grosseira: supõo-so quo alguém "pinta quadros impressionantes porque tom criatividado";
e que "tem criatividade porque pinta quadros impressionantes".
Sobre a noção operante de comportamento - Acabamos de demonstrar que as cognições
goralmente sâo representadas por substantivos, mas para representar o comportamento,
verbos são mais apropriados. Em Skinnor (1974) o leitor poderá constatar que a
percepção aparece como perceber e 0 pensamento, como pensar. Mentalistas tendem
a tratar sous objetos de estudo como algo ou coisas, daí sua preferência por formas do
linguagem substantivadas. Decorre disso a necessidade de metáforas que indiquem
espaços ondo ossas coisas fiquem armazenadas ou processadas; a mente, a memória
e o computador são exemplos delas. Na Psicologia de tradição mentalista, as metáforas
e as construções teóricas, que envolvem entidades nessas formas substantivadas,
têm sido os objetos de estudo. Mas quando o objoto do ostudo ó 0 processo
comportamental dinâmico, a ênfase muda de lugar. Como diz Skinnor (1990), se há
algum lugar, dovo-so considerar que seja o corpo ou 0 organismo que vai se
transformando na sua rolação com o ambionte. Como comportamento ó rolação, dizer
isto equivale dizer que 0 comportamonto vai se transformando. E se fôssemos escolher
uma metáfora, melhor seria a da "luz" quo só passa a existir quando a lâmpada está
acesa, e que deixa de existir quando a lâmpada ó apagada. Do mesmo modo quo a luz
nâo fica guardada em parte alguma da lâmpada, enquanto permanece apagada, tambóm
0 comportamonto não fica guardado em qualquer parte do corpo ou da mente, quando
o organismo não está se comportando

270 Rodrigo ('ruvincl S.ilg.ido, M .iu r.i Alves Nunes 1/ongoM


O problema é que tendemos a preencher espaços temporais nos quais os
comportamentos não ocorrem, especialmento aqueles encobertos. Dessa maneira, se
ficamos muito tempo sem andar de bicicleta ou sem nadar e depois voltamos a fazê-
los, não tendemos a dizor que esses comportamentos ficaram guardados em algum
lugar Mas se ficamos muito tompo sem pensar ou relembrar imagens ou idéias,
tendemos a dizer quo representações o conteúdos ficaram guardados na monto ou na
memória (Skinnor, 1974; 1987). Nossa linguagem ocidental ó mentalista e
substancialista, por isso tomos dificuldades em escapar das armadilhas das formas
substantivadas (Chiesa, 1994). O analista do comportamento tambóm deveria atentar
para essas armadilhas, quando dizemos, por exemplo, que adquirimos ou possuímos
um repertório ou que possuímos habilidades. Essas expressões, quando usadas,
devem indicar apenas que dadas as condições adoquadas de controle discriminativo,
certos comportamentos selecionados na história ambiental daquela pessoa, para
aquelas circunstâncias, tenderão a ocorrer (Skinner, 1974).
Fenómenos cognitivos “reais” e a explicação do comportamento - B. F. Skinner refutou
tambóm as explicações com base em fenómenos cognitivos reais, embora por motivos
diferentes dos alegados contra os fenômenos cognitivos conceituais. Sâo pelo menos
trôs ossos motivos: O primeiro deles ó que, no Bohaviorismo Radical, como já foi dito,
os fenômenos montais roais foram integrados ao objeto de estudo da Análise do
Comportamento, especialmente ao campo de estudo da “subjetividade". Ora, ao tratar
os fonômonos cognitivos reais como fenômenos comportamentais, eles não poderiam
explicar o comportamento porque passaram a fazer parte do quo precisa ser explicado.
Dessa maneira, o comportamonto encoborto, tanto quanto o aberto, deve sor explicado
poios processos ambientais seletivos (Skinner, 1974; 1989).
Essa argumentação pode sor mal compreendida se não for levada em conta
urna distinção que B. F Skinnor faz ontro a “explicação" do comportamento como um todo
e outras relações de controlo. Elo defendo, em primeiro lugar, que explicar o comportamento
implica descrevor suas origens e que estas se encontram, necessariamente, nos
processos seletivos ambiontais. Portanto, as explicações do comportamento sempre
devem “iniciar-se" com as descrições desses processos. Contudo, atendidas essas
condições (uma vez já explicada a origem do comportamento como um todo) ole também
admite relações de controle entre partos ou classes do comportamonto tal como ocorre
em cadeias comportamentais. Assim, eventualmonte, um comportamento encoberto pode
controlar a ocorrência de um comportamonto aberto: o primoiro produzindo a estimulação
necessária para aumentar a probabilidade de ocorrência do segundo. Veja uma do suas
afirmações ao analisar o mundo interno: “as partes iniciais do comportamonto [encobertas]
afotam as partes seguintes, mas ó o comportamento como um todo que ó o produto de
variação o soloção" (Skinner, 1990, p. 1208).
Temos nos referido até aqui a comportamento "aberto" e "encoberto" e
gostaríamos, a esta altura, de fazer algumas ressalvas sobre eles. Apesar da linguagem
dicotômica quo sugere tratar-se de diferentes categorias de comportamento, na
concepção skinnoriana trata-se apenas de dois modos diferentes de ocorrência de
comportamontos de mesma natureza. Mentalistas e senso comum tendem a reconhecer
apenas o modo público ou aberto. Mas o comportamonto humano não se roduz aponas
às ações ou às ocorrências abertas. Por outro lado, mesmo quem reconhece ambas as
formas de ocorrência tende a concebê-las como categorias do natureza distinta e oxplicá-
las tambóm de forma distinta. Contudo, da perspectiva do Behaviorismo Radical, há
continuidade e uma única explicação para ambas as formas - as contingências públicas.
Por exemplo, podemos pensar em voz alta ou inaudlvol, mas aquilo que ponsamos nas
duas formas - aberta ou encoberta - devorá ser explicado da mesma manoira: polas

Soltrc fomporf.imrnlo c C'ogniv<lo 271


contingências responsáveis pela seleção do comportamonto verbal. Desse modo, a
única diferença que importa entre tais ocorrências está no seu acesso imediato à
observação dirota (Skinner, 1957; 1974).
Retornando à discussão anterior, o segundo motivo pelo qual o Behaviorismo
Radical rejeita explicações com base em fenômenos cognitivos, ainda que reais, rosido
na própria visão skinneriana do ciência - a visão pragmática. Ele entende que os produtos
de toda ciência dovom ser revertidos em aplicações tecnológicas que melhorem as
condições de vida das populações. Justamente por isso, a explicação cognitivista
impedirá este intento, na medida em que permanece no domínio inacessívol da mente,
o que não pode ser acessivol à intervenção, caso um problema comportamental exija
solução. Ao contrário, se for possivel descrevor tais ocorrências em termos
comportamentais, espocifica-se as variávois em jogo no processo, tornando possível
sua manipulação. O menino com "problemas do memória" não poderia ser ajudado
porque a memória cognitiva (algo inacessívol) não poderia ser manipulada. Mas poderá
ser ajudado ao serem identificadas as variáveis que controlam o comportamonto de
lembrart naquolas condições particulares de sua vida.
Entrotanto, explicações rápidas e econômicas, que sugorem causas imediatas
e quo so roforem a um agente interno, têm valor prático e são úteis e suficiontos no dia
a dia das pessoas, porque lhes permitem uma razoável previsão do comportamento
umas das outras e de si próprias (Lopes & Abib, 2003). Se alguém diz que tem a
intenção de ir à festa está dizendo que é provável que vá e diante disso vocô dove se
comportar de alguma forma, pedindo ou oferecendo carona, por exemplo. Mas uma
ciência do comportamento que se contontar com explicações como essa estará, no
máximo, sendo tão eficiente como o ó o sonso comum.
O terceiro motivo poderia reunir todas as argumentações pelas quais B. F.
Skinner escolheu o modelo do variação e de seleção pelas conseqüências, um modelo
essencialmente ambiental, para explicar o comportamento. Neste sentido, se lhe
perguntássemos qual o terceiro argumento pelo qual ele nào aceita que explicações
mentais, ainda que reais, expliquem o comportamento, ele certamente diria; Porque ó
lá, no ambiente do domínio público que as coisas importantes acontecem! (Skinner,
1989). Consideramos ossa a principal linha de argumentação skinneriana; esperamos
esclarecê-la na próxima seção.

O comportamento é produto de processos seletivos ou de processos


cognitivos?
Em sous contrapontos à Ciência Cognitiva, B. F. Skinnor insiste om afirmar que
o problema com as premissas cognitivistas é que tratam apenas dos produtos finais de
longos processos de seleção do comportamento. Ele afirma que cognitivistas só
enxergam o produto, mas não a maneira como se dá a sua produção. Quo produtos são
esses? Que processos são esses? Não parece possível dimensionar a crítica
skinneriana ao cognitivismo sem responder essas questões. Alguns exemplos, descritos
om maiores detalhes, podem nos auxiliar.
Sensibilidade - Um onólogo podo identificar diferentes tipos do vinho ou, ainda mais
precisamento, diforontes propriodades do vinho: so ó mais ou monos "encorpado", ou
mais ou rnenos "ácido"; fabricado com quo "tipo de uva"; e assim por diante. Uma
explicação cognitiva para o comportamento refinado do enólogo tenderia para algo
assim: ele tem sensibilidade gustativa. Assim, escolhor com precisão admirável diferentes
tipos de vinho, ó o comportamento imediato para o qual se olha, ou seja, o produto.

Ivotirlflo Cruvlncl Si i Ir.i i Io, Mtiur.i Alves Nunes l/ongord


Sobre essa explicação, B. F. Skinner diria que foi ignorado o processo pelo qual se
chegou a esse produto. No caso, o que aconteceu e qual o tempo necessário “antes" que o
enólogo chegasse ao refinado comportamento final agora observado? Certamente ele
passou por uma experiôncia na qual se expôs a contingências arranjadas por ele mesmo
ou por outra pessoa, (ou mesmo fortuitas) nas quais teve que identificar vinhos, tendo como
pista apenas o seu sabor (suas propriedades gustativas). Provavelmente tenha começado
provando vinhos com diferenças mais acentuadas. No inicio errava muito, mas na medida
em que aumentava o número de tentativas, o número do erros diminuía; após não errar
mais na identificação das propriedades mais acentuadas passou a fazer tentativas para
identificar outras propriedades mais sutis. Suas tentativas corretas devem ter sido reforçadas
de algum modo, pois vivia em região produtora de vinhos. Até que, após vários anos, pôde
ser visto seu admirável desempenho atual. Esta ó uma tênue ilustração (descrição) do que
vem a ser o processo de evolução de um comportamento, relativamente simples. O leitor
poderá ficar surpreso e pensar: mas isto é só um processo de modefagemf Mas é isto quo
B. F. Skinner vem tentando dizer - que alguns dos processos mentais podem ser
apropriadamente explicados por processos comportamentais, ató certo ponto, simples.
Apesar de relativamente simples, olhar para esses processos traz várias implicações quo
ainda é preciso considerar, mas o faremos após mais alguns exemplos.
Abstração e formação de conceitos - Cognitivistas têm recorrido á "abstração",
entendida como uma capacidade cognitiva, para explicar a formação de conceitos.
Assim, uma criança pode demonstrar que tem o conceito apontando ou nomeando
apropriadamente um objeto; caso não consiga fazê-lo, supõe-se que ela ainda não
possui o conceito, nào compreendeu a essência daquele objeto. É isso que ocorre
quando se diz que uma criança já tem o conceito de objetos como árvores, cadeiras,
ou nuvens, por exemplo. Desse modo, os cognitivistas inferem diferentos processos
cognitivos aos quais eles atribuem o corriportamento apropriado
; caso não consiga fazê-lo, supõe-se que ela ainda não possui o conceito, não
compreendeu a essência daquele objeto. É isso que ocorre quando se diz que uma
criança já tem o conceito de objetos como árvores, cadeiras, ou nuvens, por exemplo.
Desse modo, os cognitivistas inferem diferentes processos cognitivos aos quais eles
atribuem o comportamento apropriado: formação de conceito, abstração, aquisição de
significado e representação. Novamente, até aqui só se olhou para o produto. Mas e o
processo? O que ocorreu “antes" que a criança pudesse apontar ou nomear corretamente
"cadeira", só para ficar com um exemplo? Ela deve ter sido exposta a contingências
sociais nas quais foi reforçada sempre que o comportamento em relação a cadeiras foi
apropriado e, punida ou corrigida, a cada vez que o mesmo comportamento foi
inapropriado. O comportamento que demonstra o conceito de cadeiras pode assumir
inúmeras formas - sentar-se, levar uma cadeira para alguém, nomear ou apontar cadeiras
e tantos mais. As contingências apropriadas devem ter incluído uma enorme variação
de cadeiras com diferentes cores, tamanhos, texturas e designers. Inicialmente seu
comportamento pode ter sido reforçado por diferenciar apenas os lugares nos quais se
pode sentar, mas ainda confundir cadeira com sofá e com cama. Porém, com o tempo,
e com as contingências apropriadas de reforço diferencial, após um longo processo de
discriminação, ela pôde passar a responder apropriadamente aos inúmeros designers
de cadeiras hoje disponíveis. Esta é a descrição, certamente muito sumariada, do
processo de produção responsável pelo comportamento apropriado (produto), com o
qual se pôde inferir a "abstração”, a “formação de conceito" ou o “significado".
Outras variações de abstração e formação de conceitos podem ser mais
complexas e com isso dar a impressão de que se tratam mesmo de uma entidade

Sobre Compoitimonto c CoRniçüo 273


mental que não pode ser reduzida a processo comportamental, como nos exemplos
acima. É o caso do conceito de cor e de conceitos relacionais tais como - maior/menor,
longe/porto, em cima/embaixo e tantos outros, para os quais não há um objeto concreto
para ser nomeado ou identificado. Eles sáo, por isso, considerados conceitos abstratos.
Mesmo nesses casos Skinner (1957) demonstra que o processo pelo qual alguóm
passa a apresentar o comportamento apropriado (produto) ó semelhante ao descrito
para o conceito de cadeira, ou seja, de objetos concretos. Por exemplo, para aprender "o
conceito" de "cor verde" a criança ó exposta a diferentes objetos (bola, cubo, copo,) de
cor verde e tambóm aos mesmos objetos de outras cores. Seu comportamento é
reforçado até que diferencie o copo verde do azul; a bola verde da vermelha; o cubo verde
do amarelo e assim por diante. Os arranjos envolvidos com esse tipo do aprendizagem,
sejam eles programados ou naturalmente dispostos no ambiente social, nâo diferem
dos procedimentos típicos de discriminação de estímulos. O estimulo no caso, é uma
das propriedades dos objetos; a cor verde. Para os conceitos "relacionais" que foram
mencionados, os processos de modelagem são semelhantes.
Poderíamos apresentar aqui muitas outras demonstrações do processos
comportamentais que responderiam perguntas relativas a cada um dos produtos
considerados nos estudos e nas práticas da ciência cognitiva. Considerando, por
exemplo, "crenças", "percepção", "identidade” e “avaliação" poderíamos responder a
questões mais ou menos assim; Porque uma pessoa acredita em certas coisas e não
em outras? Porque percebe umas coisas e não outras, ou porque percebe certas
possoas de uma maneira e outras pessoas de outras maneiras? Porque se vê ou se
avalia de um certo modo? Ou, nos termos de Beck (1976) - Por que faz avaliações tão
distorcidas ou negativas da realidade (das pessoas, do mundo, do futuro)? A resposta
a cada uma delas envolveria certas particularidades, mas seria possível, segundo
Skinner (1974; 1977; 1987; 1989) demonstrar, para cada caso, a relação entre os produtos
o os processos comportamentais envolvidos.
Com esses exemplos podemos recuperar diversas análises skinnerianas. Na
primeira delas Skinner (1977; 1987) afirma que cognitivistas não conseguem enxergar
o processo de produção do comportamento porque nâo têm qualquer visão histórica do
comportamento. Processo refere-se ao que ocorre em um período relativamonte longo
de tempo. Como a análise cognitiva se prende ao que ocorre apenas no presente, ela
cobre somente parte do que seria o episódio comportamental total, ou seja, perde a
parte histórica na qual se deu o processo de evolução do comportamento. Tendo em
conta que o comportamento é um processo continuo de relação da pessoa com o
ambiente, e que tal relação se encontra em constante transformação, ó preciso observar
amostras ou períodos consideravelmente longos de episódios comportamentais, antes
que se entenda um pouco mais o que seja o comportamento.
Assim, mais do quo tenha talvez argumentado o próprio Skinner (1974, 1977,
1987), o ponto do qual parece originar a maior parte dos problemas dos modelos
cognitivistas ó que eles não consideram a seleção por conseqüências como um modo
causal. Dizendo de outra maneira, eles não levam em conta o papel do ambiente na
seleção do comportamento. Há variáveis ambientais controladoras do comportamento
mais facilmente identificáveis no tempo, como quando se observa o reflexo, onde o
estímulo eliciador está presente imediatamente antes da ocorrência da resposta. Em
se tratando do comportamento operante, no entanto, por ser selecionado historicamente
e muito lentamente, as variáveis ambientais que o controlam não estão facilmente
acessíveis. Por isso, ele parece ocorrer de forma muito natural ou fortuita, ocasião
propícia a que se atribua sua origem a um agente interno, próximo no tempo e no

274 Rodrigo C ruvincl S«ilfl<tdo, M uur.i Alves Nunes C/onnor.i


espaço como requer o pensamento mecanicista (Skinner, 1987). Sem a visão histórica
do comportamento, sem considerar como agem as contingências operantes ao longo
do tempo e olhando apenas para o quo ocorre no presente, resta ao cognitivista uma
visão estreita do que seja o comportamento - apenas o que B. F. Skinner chamou de
produto, Mas Skinner (1977; 1987) tenta mostrar que comportamento também ó processo,
urna vez quo não ó algo completamente definido ou acabado, mas uma relação que se
encontra em constante mudança.
Continuando o debato, B, F. Skinner argumenta que ao reconhecer somente o
produto, e não enxergando os processos seletivos que ocorrem na relação
comportamento-ambiente, o que cognitivistas acabam por fazer é substituir as
contingências soletivas, responsáveis pela construção do comportamento, pelas
cognições. Assim, tudo o que poderia ser explicado pelos processos seletivos os quais
são de domínio público (os exemplos mostram isso), passa a ser explicado por
processos cognitivos internos (ocultos) e por essa condição, precariamente definidos.
Por vezes, aiém de tomarem o lugar das contingências ambientais, as cognições ou
sistemas cognitivos tomam também o lugar do próprio comportamonto, no caso, do
comportamento encoberto. Isto ocorre especialmente com o comportamento verbal,
que ocorre facilmente de modo encoberto, conforme já demonstrado anteriormente. Ao
fazer isto, os cognitivistas pressupõem, então, que as pessoas fazem e sentem coisas
por causa do que elas pensam ou por causa do que elas imaginam. Dessa maneira,
eles chegam a um ponto critico e delicado do seu sistema teórico, no qual comportamonto
oxplicti comportamento.
Finalmente, os exemplos ilustram um dos pontos mais importantes que B. F.
Skinner tenta demonstrar no debate com o cognitivismo. Primeiro, como já deve estar
claro, que são os processos comportamentais e não os processos cognitivos os mais
apropriados para explicar os comportamentos alvo das explicações cognitivas. Em
segundo lugar, e este ó o ponto: os processos comportamentais, descritos nos
exemplos, demonstram o modo como esses comportamentos são colocados sob o
controle por estímulos* Ou seja, aqueles processos envolvem em grando escala a
discriminação de estímulos e o comportamento passa a ser mantido por causa do
controle de aspectos muito sutis do ambiente.
Caracterizar os processos seletivos como processos discriminativos, implica
entender que no Behaviorismo Radical a concepção de ambiente é relacionah considera-
se ambiente para uma pessoa aquelas partes do mundo que passaram a controlar seu
comportamento como produto de sua história particular de reforço. Esta ó uma concepção
contextuai de ambiente, muito diferente da visão cognitiva que tende a ver o ambiente
pela ótica do senso comum, ou seja, pela ótica do realismo. Portanto, essas concepções
distintas conduzem a interpretações completamente diferentes dos processos
envolvidos em comportamentos mais complexos tais como os sugeridos por: percepção
de pessoas, formação de identidade, avaliação da realidade ou constituição de um
complexo sistema de crenças.

Sobre o cognitivism o neuroclentifico


Já pontuamos que para o cognitivismo neurocientlfico, a mente não é concebida
em quaisquer termos conceituais, mas identificada diretamente com o que ocorre no
cérebro. No entanto, o apego ao objeto de estudo da neurociência provavelmente não
seja o suficiente para explicar, de modo satisfatório, as questões referentes ao
comportamento e à mente. Como questionou Araújo (2003, p, 16): “Do que estamos
falando quando empregamos os termos "crença”, “desejo", "medo", em nossas teorias

Sobre Comport.tmcnlo e (_'on»ÍÇilo 275


psicológicas? Estaríamos nos referindo a propriedades cerebrais ou apenas a ficções
teóricas?”
Ao buscarem as causas do comportamento no cérebro, as chamadas teorias
reais-neurofisiológicas, ao fim de contas, reduzem o comportamento ao evento fisiológico
(Abib, 1997). Ainda que dispondo de métodos e técnicas incrivelmente refinados,
enganar-se-ão os que pensam que esta ciência poderá explicar tudo o que for referente
ao comportamento. Por mais profundo e minucioso que seja o estudo fisiológico do
cérebro, as conclusões estarão incompletas. Com esta ciência, talvez seja possivel
dizer o que o ambiente faz ao corpo, mas dificilmente se dirá o que o corpo faz ao
ambiente. Em outros termos, o efeito da contingência sobre o organismo poderá
eventualmente ser descrito em termos fisico-qulmicos perfeitamente localizáveis no
cérebro, embora a previsão de como o organismo responderá a estas contingências
ficará a cargo do uma ciência do comportamento independente. O avanço no campo da
ciência do cérebro é promissor, mas torná-lo a única alternativa para se explicar a mente
é ignorar totalmente o modo como o ambiente controla as ações do individuo (Skinner,
1974). Uma das reivindicações do Behaviorismo Radical é por um delineamento preciso
entre campos de estudo:
A explicação bohaviorista também se aproxima à da Fisiologia. Ela ostabelece a
tarefa para o flsiôlogo. O mentalismo, porém, prestou um grande desserviço ao
conduzir os fisiólogos para pistas falsas, levando-os a experiências nas quais
procuraram os correlatos neurais de Imagens, lembranças, consciência, etc.
(Skinner, 1974, p. 211, truducào nossü).

No exemplo das teorias cognitivistas neurocientificas, diria B. F. Skinner, está-


se fazendo Neurologia e nào Psicologia. É como se não houvesse um objeto de estudo
claro para psicólogos dessa orientação e eles tivessem que recorrer à outra disciplina
para salvar a sua. Não se explicará, por exemplo, porque determinados homens podem
se apaixonar por mulheres tão parecidas com suas mães. Este será sempre o campo
de estudo da Psicologia.

Conhecer e comportar-se
Nos contrapontos skinnerianos com a ciência cognitiva não poderia faltar um último
tema: como as "regras" participam da explicação comportamental e da explicação cognitiva?
Há quem diga que ambas as explicações "dizem a mesma coisa". Veja, na Ciência Cognitiva
a explicação do comportamento se inicia com a descrição dos conteúdos da consciência,
em especial, as cognições que são sinônimas de conhecimento. Nela, além disso, o
conhecimento (comportamento verbal) explica diretamente o comportamento e o sentimento,
e, neste sentido, o conhecimento dirige as ações e tambóm os sentimentos. Em outras
palavras, as cognições orientam as pessoas para se comportarem de uma ou de outra
maneira, atuando como regras. A análise comportamental também reconhece o controle do
comportamonto por regras, consideradas um tipo especial de comportamento verbal. Para
o Behaviorismo Radical, regras sâo as descrições das contingências, ou seja, são descrições
do modo como as coisas em geral se relacionam. As regras sobre comportamento
descrevem como as pessoas agem e as variáveis que controlam sua açáo. Entre outras
coisas, as regras podem funcionar como instruções. Comparando o sentido de regra nas
duas posições, poder-se-ia dizer que o sentido comportamental o cognitivo é semelhante,
dirigir a ação. Mas a pergunta inicial não era relativa ao sentido do que sejam as regras,
mas, como elas participam da explicação do comportamento. Assim, Skinner (1957; 1987;

n 6 Rodriflo Cruvmel M.iur.i Alves Nunes l/onjjor.i


1989) diria quo as duas posições dizem coisas completamente diferentes, não quanto ao
sentido do que sejam as rogras, mas quanto à sua própria origem e a origem do
comportamonto em geral. Portanto, a discordância é rdativa ao sistoma oxplicativo.
Ainda que, em ambos os casos, haja alguma direção das regras sobro a ação, a
grande diferença ó que. para a Ciôncia Cognitiva, rogras constituom o ponto inicial da
explicação do comportamento. Na analiso comportamental, ao contrário, sondo parte do
comportamonto verbal, o funcionamento das rogras só pode ser compreendido se ampliado
o foco do análise, ató o ponto do descrovor tambóm como se adquire e se mantóm o
roportório verbal, neste caso, o repertório do regras. Feito isso, o quo se encontra são as
contingôncias vorbais públicas modelando o sistoma de rogras com as quais as pessoas
se orientam. É novamento lá, no ambiento social o vorbal público, quo se oncontra o inicio
da explicação do comportamento, conforme o Bohaviorismo Radical. Estamos novamente
fronto á diforonça entro processo o produto.
Na análiso do comportamento vorbal que conhecemos como "pensamento",
geralmente usado com sentido próximo ao de regras, crenças, idéias, oxpectativas o
"cognições”, ó muito fácil confundir processo e produto, por tratar-se de análiso de “conteúdo".
Mas, o conteúdo tanto da fala quanto do pensamento (fala encoberta) é produto, e engana-
se quem entender que o behaviorista radical não deva analisar conteúdo de fala ou de
pensamento só porque ele não ó cognitivista Pelo contrário, para entender o comportamento
na sua totalidade, ele deverá entender o conteúdo do pensamento, mas, só poderá faze-lo
compreendendo o processo que o gerou e que o mantóm (Skinner 1987). A compreensão
do processo de manutenção dos conteúdos será ainda mais importante se houver interesse
em modificá-los. Por exemplo, ao terapeuta não basta apenas entender o conteúdo da fala
ou do pensamento do cliente tais como falsas expectativas ou idéias negativas"; ele deverá
ser mais eficaz se for mais além, ató compreender como elas foram construídas e,
especialmente, como elas se mantêm.
Outra distinção skinneriana ontro as ciuas posições rolaciona-se às diferenças entro
controlo do comportamento por regrns o por contingôncias, dois processos comportamontais
básicos, mas considerados distintos na Análiso do Comportamonto. Na Ciôncia Cognitiva, as
rogras ou o conhocimento possuem exclusividado na explicação da origom do comportamento,
e esta ó a única maneira de explicá-lo. Na análiso comportamental, porém, considora-se quo
o comportamento, om principio, tem origom nas contingôncias por modolagom direta, ou
soja, nào se inicia com o conhecimento. As pessoas nào precisam conhecer ou sabor descrovor
uma situação para depois se comportar. Uma vez expostas aos diforontos ambiontes, elas
simplesmente so comportam do modo apropriado porque passam a responder, dirotamonto,
sob o controlo de estímulos sutis do ambiento.
Considera-se quo primeiro as pessoas aprondom cortos comportamontos e dopois
aprondern a descrovô los, mas fazom isto aponas na modida om quo as suas comunidades
vorbais apresentem demandas e arranjem as contingôncias necessárias Exemplificando a
diferença entre os dois processos; um cozinheiro que prepara os mais saborosos jantares
não nocossariamonte será capaz do descrever as minuciosas etapas quo percorre ató finalizar
um prato. Esto ó o caso de cozinheiros quo apronderam a cozinhar sozinhos, sem seguir
receitas, aponas no contato direto com a cozinha. Esto comportamento, mesmo que
considerado uma cadeia complexa, construída ao longo do tempo, deve estar agora sob
controle direto do ambiente atual relacionado ao cozinhar. Contudo, ele poderá vir a descrever
toda a cadeia comportamental de cozinhar, caso haja demandas sociais e as contingôncias
verbais sejam favoráveis, por exemplo, caso lhe peçam receitas de seus pratos.
Há, poróm, outra maneira de se aprender a cozinhar: alguóm quo nunca entrou em
uma cozinha poderá preparar um prato seguindo receita (comportamento de rospondor a

Sobre Comportamento c ('ognlfilo 177


rogras). Portanto, responder a contingências do ambiente por modelagem direta, o responder
a regras são comportamontos diferentes, porque sob controle de variáveis diferentes. Por
vezes, as instruções verbais são de grande ajuda para onsinar comportamentos complexos,
mas não substituem as contingências. O cozinheiro quo aprendeu por receita, inicialmonto
não terá o mesmo desempenho do que aprendeu poi modelagem direta, mas certamente
irá aporfeiçoar seus pratos, na medida om que passar a responder também sob controle
das contingências diretamente envolvidas com o cozinhar.
O exposto até aqui já nos permite responder à pergunta inicial: As explicações
cognitivas e comportamentais, a respeito de rogras dizem a mesma coisa? Esperamos ter
dornonstrado, om linhas gorais, que na visão skinneriana as duas ciências, absolutamente,
"não dizem a mesma coisa”. A grande diforença ó que na ciência cognitiva as rogras iniciam a
oxplicaçáo do comportamento e como tal elas nâo procisam ser explicadas. Não há nesta
ciência um modo sistemático de demonstrar como sáo construídas as regras No Behaviorismo
Radical as rogras participam do controle do comportamonto na medida om que adquirem
função de estímulo discriminativo. O que não quer dizer, de forma alguma, que elas iniciam a
explicação do comportamonto, pois fica faltando oxplicar, ainda, como elas adquiriram a
função discriminativa. A Análise do Comportamonto tem uma teoria que dá conta de oxplicar o
processo do construção de regras: a teoria oporanto do comportamonto verbal.

Considerações Finais
Este ensaio pretendeu oferecer subsídios para a compreensão de alguns dos
principais argumentos do Behaviorismo Radical, quando om contraponto à Psicanálise
freudiana e á Ciência Cognitiva. Essas pontuações caracterizaram-se como uma
roloitura do que diversos textos de B. F. Skinner já mostraram. Pretendeu-se, com isso,
tornar claras importantes questões com as quais o behaviorista contemporâneo se vê
envolvido, e que estão para além do laboratório de análise experimental do
comportamonto.
Como visto, observam-se certos pontos de contato entro Behaviorismo Radical e
Psicanálise freudiana, levando-se om conta a inovação psicanalítica quo, embora
mentalista, admite relações entre ocorrências ambientais o problemas de comportamento
humano. Sua posição a esse respeito evidencia-se nas consideraçõos sobre as causas
inconscientes para explicar o comportamento e os afetos. Ficou patente, ontrotanto, que a
interprotação behaviorista de processos inconscientes sugere maior vantagem, pelas
razõos apontadas ao longo do texto. A incompatibilidade entro os modelos, contudo,
aumenta á medida que o aparelho psíquico, como um constructo hipotético, ganha
importância om detrimento da possibilidade de uma acurada descrição ontre ovontos do
ambionto e comportamento (Skinner, 1972). Corn relação ao Cognitivismo, podo-so dizer
que os contrapontos skinnerianos não deixam espaços para confluências. Dentre os
problemas apontados, encontra-se a fragilidade teórica do modelo: por manter-se muito
próximo da linguagem o das explicações do senso comum, ele não trouxe avanços para
a Psicologia. Além disso, uma contundente critica de Skinner (1987) é que, a Ciência
Cognitiva não dá nonhum passo sistemático na direção de qualquer forma de
roconhecimento dos processos ambientais seletivos do comportamento.
Na apresentação dos contrapontos skinnorianos aos outros sistomas teóricos,
procurou-se demonstrar como o Behaviorismo Radical se articula e se distingue desses
sistemas em suas posições epistemológicas. A amplitude do assunto não pormitiu,
naturalmonto, tratá-lo em profundidade. Contudo, espora-se que a argumentação
apresentada tenha produzido razões suficientes para que o loitor continuo no ostudo
desse modo particular de havor-se com os assuntos humanos - o Behaviorismo Radical.

278 Kmlrltio (,'riivlncl S.iIr.uIo, M.iur.i Alvo* Nunes C/on*?or.i


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*»obro (.'omportiimcnto t Cofliilv*!« 2 7 9


Capítulo 22
O Show de Truman - A escolha por um
"controle mais livre" 1
M ichela Rodrigues Ribeiro'

O orisina de conceitos da Análise do Comportamonto ou dos princípios da


filosofia bohaviorista radical podo se tornar uma tarefa árida para o professor, tondo em
vista quo se trata do propostas bastante divorgontes das teorias internalistas e tambóm
da visão de determinação dos comportamentos de um indivíduo oferecida por nossa
sociodado. O recurso do ensino comumente utilizado nos cursos de psicologia é o
laboratório didático. Dessa forma, são realizadas demonstrações e experimentações
com participantes infra-humanos ou humanos, em situações nas quais ó claramente
possível verificar a ocorrência de determinados fenómenos, como o condicionamento
operante, a modelagem, o controle de estímulos, os esquemas de reforçamento, dentre
outros. Em contextos como esse é comum, entretanto, observar uma dificuldade dos
alunos em encontrar situações da vida diária nas quais tais conceitos possam ser
aplicados. Exemplos de situações cotidianas, observações o aplicações práticas dos
conceitos em atividades mais próximas da realidade do aluno, exercícios de análises
de vídeos ou filmes, além do outros recursos didáticos, poderiam facilitar a compreensão,
a utilidade e a importância da aplicação dos conceitos da área. O presonte trabalho se
propõe a analisar o filme "O Show de Truman - O Show da Vida” sob o enfoquo analítico*
comportamental.
“O Show de Truman - O Show da Vida” foi lançado em 1998, pela Paramount
Pictures®, sob diroção de Peter Weir, e conta a história de Truman Burbank (interpretado
por Jim Carroy), quo foi adotado por uma empresa de TV e quo ó a estrola de um reality
show, no qual sua vida vem sendo apresentada desde seu nascimento, 24 horas por
dia. Ele vive numa cidade cenográfica ondo todos os habitantes são atores, inclusive
sua esposa e sua mâe. Tudo o que acontece nessa cidade gira om torno da presença
de Truman e ole, aos 30 anos, nào porcebou que todas as situações que ele viveu foram
planejadas. O idoalizador desse gigantesco projeto ó Christof, o diretor do programa
(interpretado por Ed Harris), que tem a tarefa de controlar todo um conjunto amplo de
ações e possoas para atuar diante do astro principal. O diretor controlava o tempo, a fala
0 o momento que os atores dovoriam interagir com Truman, as possoas quo dovoriam
oxorcor algum papel importante na vida do Truman, as noticias do jornal, rádio e TV que
Truman poderia ter acesso, as propagandas dos produtos patrocinadoros, entre outros.
Esse controlo, contudo, não era ilimitado nem onipresente, o corno mostra o filmo, as

1 TmtMttioN{inMM«rtari»n<> XIV Encontro Branllnlrodo PskoW h|Mr n Moduiim Coin|K>(ttimentHl. rcHllíHdooni ngo*l<> de 20OT om CumpinH»-
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280 Mlchel.i RíHlrífluc* Kiheiro


falhas nesse controle foram decisivas para a descoberta de Truman sobre a verdade.
Este filme ó bastante rico para analisar com os alunos. Diversos conceitos
podem ser ensinados a partir dele, tais como reforçamento diferencial, condicionamento
operante, condicionamento respondente, ótica, responsabilidade de agências
controladoras, controlo comportamental, multideterminação do comportamento,
contracontrole e liberdade. Estes quatro últimos conceitos serâo mais enfatizados nesse
trabalho.
Skinner (1974/1993) afirmou que a noção behaviorista radical do controlo
comportamental ó bastante delicada e controversa. Segundo ele, "(...) nenhum outro
aspecto da posição behaviorista suscitou objeções mais violentas" (p. 163). As reações
violentas se referem à constatação de que o ser humano não é o grande senhor de seu
destino, de que sua vida não está simplesmente a mercê de seu livre-arbltrio ou de sua
iniciativa criadora. A filosofia behaviorista radical entende que qualquer comportamento
está sob controle de algumas variáveis e, estas estão em interação com o indivíduo quo
se comporta. Nesse sentido, nenhum comportamento acontece de forma indoterminada.
Sempre haverá pelo menos uma variável e, na maior parte das vezes um conjunto
delas, determinando (ou controlando) a ocorrência de um comportamento. E, ainda nas
palavras de Skinner, "Não podemos escolher um gênero de vida no qual não haja
controle. Podemos tão-só mudar as condições controladoras" (p. 163).
Um dos pressupostos da filosofia bohaviorista radical, portanto, ó o
determinismo, que indica que todo e qualquer comportamento será determinado por
variáveis genéticas e/ou ambiontais, atuais e/ou históricas (Baum, 1999, Skinner, 1953/
1993; 1971/1977; 1974/1993). O determinismo se opõe ao libertarismo, no qual um
indivíduo pode se comportar de forma absolutamente livre, de forma a escapar da
ocorrência de qualquer tipo de controle, exercendo apenas seu livre-arbítrio. Mas é
preciso ficar claro que, para o Behaviorismo Radical, o controle exercido sobre o
comportamento do indivíduo não implica na presença de um agente controlador, ou de
um controle intencional. Esse controle ó exercido, como descrito acima, por variáveis
genéticas e ambientais. Como o ambiente ó multiplamente constituído, tanto por
aspectos físicos quanto sociais, algumas vezes o controle pode ser exercido por
algum(ns) membro(s) social(is) do ambiente, e outras vezes esse controle será
meramente exercido por aspectos físicos. É importante lembrar também que a interação
entre diversas variáveis controladoras pode ocorrer e este aspecto será discutido mais
adiante.
"Subestimamos amiúde o fato de que o comportamento humano ó também
uma forma de controle. (...) Uma pessoa age sobre o melo e aquilo que obtém é
essencial para a sua sobrevivência e para a sobrevivência da espécie. (...) A
compreensão, a previsão e a explicação, bem como as aplicações tecnológicas,
exemplificam o controle da natureza. Elas não expressam uma 'atitude de dominação'
ou ‘uma filosofia de controle’. São os resultados inevitáveis de certos processos de
comportamento” (Skinner, 1974/1993, p. 163). O controle exercido sobre o comportamento,
então, não é, necessariamente, fruto do um processo intencional, no qual haverá um
agente controlador que se beneficiará em detrimento do indivíduo que está sendo
controlado (Skinner, 1971/1977). Por vezes, isto realmente pode acontecer, como no
caso do diretor do programa de Truman, quo decidia por uma série de acontecimentos,
de modo a aumentar o interesse pela história e, consequentemente, ampliar a audiência.
Há, porém, situações nas quais o controle sobre o comportamento acontece
independentemente de qualquer agente controlador ou intenção. Como ocorreu quando
Truman escapou dos "olhos" de todos e fugiu pelo mar.

Sobrr C"omport.imcnlo c CoRnlçào 281


O termo controle pode ser facilmente substituído pelo termo influência,
especialmente quando se trata de comportamento operante. A definição de
comportamento operante pressupõe a emissão de uma determinada resposta de acordo
com sua probabilidade de ocorrência aumentada ou diminuída por algumas
conseqüências no passado. Conseqüências reforçadoras aumontarão a probabilidade
de ocorrência de uma resposta no futuro e conseqüências avorsivas diminuirão essa
probabilidade. Nesse sentido, se as condições presentes em uma determinada situação
indicarem chance de reforçamento ou de punição, tais condições poderão exercer
influência sobre a ocorrência ou não da resposta. No caso do Truman, ficar de manhã
no banheiro conversando com o espelho eram respostas de alta probabilidade de
ocorrência o que efetivamente aconteciam com freqüência. Contudo, entrar em um
barco para atravessar o mar era resposta de baixa probabilidade de ocorrência e que
ele realmente nào emitiu, mesmo tendo que deixar uma tarefa de seu trabalho pendente.
Note que a probabilidade de ocorrência de uma rosposta pode ser inferida a partir das
condições presentes e passadas quo influenciam a resposta, mas que será melhor
definida a posteriori, de acordo com a freqüência da resposta.
Nos dois exemplos mencionados acima, o conceito de probabilidade de
ocorrência da resposta pode auxiliar na compreensão de qual comportamento é mais
provável de acontecer Mas esse conceito também inclui a noção de que outros
comportamentos, apesar de apresentarem baixa probabilidade de ocorrência naquela
determinada situação, ainda assim são possíveis de serem emitidos Essa possibilidade
ó definida pela presença de um contexto complexo e múltiplo de controle comportamental.
O ser humano vive om um ambiente complexo e tem uma história passada também
complexa. São inumeráveis as variáveis presentes e históricas que podem exercer
alguma influência sobre o comportamento de um indivíduo. Esse fenômeno é
denominado de multideterminação do comportamento. A multiplicidade de variáveis
pode interagir de uma maneira em determinada situação e de uma maneira diferente
em outra. Veja o caso, por exemplo, da decisão de Truman em fugir polo mar. Truman
tinha medo do mar porque havia perdido seu pai em um acidente no mar. Essa foi uma
solução dada pelo programa para evitar seu interesse pelo mar e impedir sua salda da
cidade cenográfica. Periodicamente ele era exposto a alguma situação na qual era
solicitado a entrar em um barco e ele não conseguia. Nessas situações Truman era
tomado por uma sensação de medo e as lembranças da morte de seu pai tornavam-se
vívidas. Houve, porém, uma situação na qual o comportamento que tinha baixa
probabilidade de ocorrência foi emitido e Truman pegou um barco para fugir da cidade.
Diante da desconfiança de que tudo girava em torno de si e da impossibilidade de sair
da cidade por outros meios (não havia vaga em vôos, o ônibus estragou, ole foi impedido
de fugir com seu carro), Truman viu no barco a única alternativa possível de fuga. Uma
condição que era aversiva se tornou reforçadora dadas as variáveis situacionais daquele
momento. Podemos incluir tambóm duas variáveis importantes nessa análise: primeiro,
o enfraquecimento do condicionamento respondente do medo, uma vez que o
emparelhamento do mar com a morte do pai ocorreu no passado e não estava mais
presente e, sogundo, a volta do pai vivo, indicando ao Truman que aquele sofrimento já
não tinha razão de acontecer.
Sobre a noção de determinismo, é interessante notar adicionalmente que até
mesmo quando há um agente controlador, com a real intenção do se beneficiar a partir
do comportamento do outro, este agente também terá seus comportamentos controlados.
Segundo Skinner (1953/1993) "o ambiente determina o indivíduo mesmo quando este
altera o ambiente" (p. 419). Quando o diretor do programa tomou decisões sobre a vida

JÊtílÊ M k IicI.i Rodrigues Ribeiro


de Truman, suas decisões não foram completamente arbitrárias ou livres, mas foram
determinadas por variáveis como as exigências dos patrocinadores do show, a audiência,
a reforçadora sensação de poder, entre outras.
As situações nas quais pessoas ou agências controladoras (como o governo,
a religião, os sistemas econômicos, etc.) exercem controle sobre os indivíduos, estes
podem reagir contra tal controle, especialmente se houver a presença de condições
aversivas. Essa reação ê denominada de contracontrole (Sidman, 1989/1995; Skinner,
1953/1993; 1974/1993). Um indivíduo pode, por exemplo, organizar um grupo
revolucionário para lutar contra um governo autoritário, ou pode apresentar um
contracheque falso à igreja que o obriga a pagar o dizimo, ou ainda procurar estratégias
para diminuir a mordida do leão na declaração do imposto de renda. Quando o controle
ô oxercido por aponas uma pessoa, um indivíduo pode exercer contracontrole ao não
atender ao telefone quando provavelmente ó aquele amigo chato que está ligando ou a
criança pode ligar o chuveiro, mas não entrar, o passar um perfume, enquanto a mãe
imagina quo ela está tomando banho.
Até os 30 anos de idade, Truman viveu naquela cidade som desconfiar que
tudo era planejado e que sua vida era apresentada em um show de TV. Nos anos
anteriores ocorreram episódios nos quais alguém tontava atrapalhar o andamento do
show e mostrar a elo que tudo nào passava do uma grande mentira. Esses episódios,
entretanto, não foram suficientes para Truman conhecer a vordade. Nos dias que
antecederam sua fuga, contudo, ocorreu uma série de situações que funcionaram como
evidências para quo ele se percebesse a real situação e exercesse contracontrole.
Essas situações foram: (a) caiu uma luminária do "céu"; (b) caiu uma chuva repentina
somente em cima dele; (c) Truman encontrou seu pai na rua vestido como um mendigo
e rapidamente várias pessoas o retiraram de sua frente; (d) Truman encontrou um
elevador falso em um prédio que não costumava entrar; (e) sua esposa apresentou
comportamentos estranhos ao insistir em falar como se estivesse fazendo propagandas
de produtos; (f) alguns eventos se repetiram em sua rua, entre outros. Para exercer
contracontrole, Truman deveria se comportar de formas diferentes daquelas as quais
estava habituado. Uma vez que ele apresentasse variação comportamental, haveria a
possibilidade de encontrar situações nào planejadas pelo programa. Ele próprio disse
ao seu amigo "quando fico imprevisível, eles não sabem o que fazer". A direção do
programa, obviamente, tentou manter o controle punindo qualquer tentativa de
contracontrole, Dessa forma, mandou o amigo dizer que tudo não passava de uma
ilusão, a agência de viagens tinha cartazes indicando que era perigoso voar e não tinha
passagens, o ônibus não funcionou, a esposa falou sobre a responsabilidade com as
contas e a vontade de ter um bebê e mais uma série de tentativas.
Em situações nas quais pessoas ou agências controladoras exercem um
controle positivo, em geral, o contracontrole não existe. O sentimento de liberdade está
associado a estas situações. A visão analltica-comportamental propõe uma definição
para liberdade que se apóia não na ausência total de controle, mas na presença de um
controle positivo, no qual o indivíduo nào sente a urgência ou necessidade de se livrar
de alguma condição aversiva.
"O fato de o reforço positivo não produzir contracontrole não passou despercebido
dos supostos controladores, os quais simplesmonte mudaram para os meios positivos.
Eis um exemplo: um governo tem de levantar fundos. Se o fizer por meio de taxação,
seus cidadãos deverão pagar ou ser punidos, e eles poderão escapar deste controle
aversivo colocando outro partido no poder nas eleiçõos vindouras. Como uma alternativa,
o governo organiza uma loteria e, em vez de ser obrigado a pagar taxas, o cidadão

Nobre Comportamento e Co^ni^Ao 283


voluntariamente compra bilhetes. O resultados ó o mesmo: os cidadãos dão dinheiro
ao governo, mas sentem-se livres e, neste segundo caso, não protestam. Não obstante,
estão sendo controlados, tão poderosamente quanto o seriam por uma ameaça de
punição" (Skinner, 1974/1993, p. 170). Nesse caso, os indivíduos alóm de não exercerem
contracontrole, muitas vezes podom oferecer ao governo muito mais dinheiro do que
seria esporado arrecadar e ainda se sentem livres porque podem escolher entre jogar
e não jogar ou escolher entre jogar uma quantia maior ou menor de dinheiro. Em
relação ao filme, Truman se sentia mais livre na presença de seu amigo do que na
presença de sua esposa. Seu amigo estava associado a momentos de diversão e
prazer (reforçamento positivo) o Truman podia confiar a eíe todos os seus segredos. Já
sua esposa cobrava dele responsabilidade e uma postura de conformismo perante àa
condições adversas (reforçamento negativo e punição) e Truman, por diversas vezes,
se comportava de forma a evitar o controle aversivo imposto por ela.
A possibilidade de escolha também está presente na definição do liberdade da
Análise do Comportamento. Um maior grau do liberdade está associado a um maior
número de alternativas de escolha para um indivíduo. Escolher um curso superior diante
das diversas possibilidades que uma universidade oferece ó considerado como mais
livre do que fazer determinado curso somente porque aquele ó o único quo você pode
pagar. Essa liberdade não pode, entretanto, ser confundida com livre-arbítrio, segunde
o qual o indívíduo pode escolher tudo aquilo que desejar. Cabe aqui uma questão
importante: o que determina o desejo de alguém? Uma visão que se baseia na noção
de determinismo considera que até mesmo o desejo está sob controle de variáveis que
podem ser identificadas. Esse desejo não surge do nada. Truman, por exemplo, tinha
um desejo de viajar para Fiji. Antes de conhecer Sylvia esse desejo jamais havia se
"manifestado". Somente depois do contato com ela, de viver momentos prazerosos ao
seu lado e de ser informado que ela iria para Fiji, esta ilha se tornou importante e
possivelmente reforçadora. O desejo de viajar para Fiji, então, estava sob controle dessas
variáveis históricas. Truman, porém, não tinha acesso a alternativa de escolha de
satisfazer seu desejo porque o contexto no qual vivia o restringia àquela cidade
cenogròfica. Nesse sentido, Truman não tinha liberdade, tanto porque não tinha
alternativas de escolha, quanto porque vivia em um ambiente planejado por uma agência
controladora, a produção do programa de TV e, quando ele tomou consciência de sua
condição, todo esse controle se tornou aversivo.
As alternativas de escolha podem variar dependendo da situação e tambóm do
indivíduo que escolhe. Se dentre as alternativas oferecidas por uma agência controladora
existe uma alternativa que não pode ser escolhida pelo indivíduo, ou porque ele não tem
acesso direto àquela alternativa ou porque não tem o repertório necessário para se
engajar naquela alternativa, esta opção acaba não sendo real. Por exemplo, Truman
poderia descobrir toda a verdade se pudesse assistir na própria TV o seu programa ou
ver pela internet informações sobre o show. Entretanto, a TV de sua casa só passava
programas definidos pelo diretor e ele nào tinha acesso à internet. Essas alternativas,
portanto, não oram reais dentro da roalidado quo ole vivia.
Ao final do filme, Truman se vê diante de um dilema: É preciso escolher entre (a)
viver em um ambiento protogido, conhecido e aparentemente seguro, porém artificial e
planejado pela produção do programa ou (b) viver em um ambiente natural o produzido
por uma sociedade, porém desprotegido, desconhecido e imprevisível. Apesar de nunca
ter vivido fora daquela situação e, portanto, não conhecer claramente a segunda
alternativa, Truman optou por ela e foi embora. O título desse trabalho aponta para uma
escolha de um “controle mais livre", Isto quer dizer que Truman não poderia escolher

284 Mídiel.i Rodrltfucs Ribeiro


por uma vida isenta de controlo, mas escolheu por uma situação na qual ele tambóm
poderia participar do controle. Nosso sentido, ele se livrou da agôncia controladora do
sua vida e se permitiu sor controlado por novas agências, mas tambóm por fazer parte
do algumas outras. Para Skinner (1953/1993) "todos nós controlamos e somos
controlados" (p. 410).

Referências

Baum, W M (1999) Compreender o bohaviorismo - Ciência, comportamento e cultura Porto


Alegre' Artmed
Sldman, M (1989/1995) Coerção e suas implicações São Paulo: Editorial Psy
Skinner, B F (1953/1993). Ciência e comportamento humano São Paulo: Martins Fontes
Skinner, B F (1971/1977) O mito da liberdade Rio de Janeiro: Edições Bloch
Skinner, B F. (1974/1993) Sobre o behaviorismo São Paulo1Cultrix

Sol>n* Comport.unento o Coflnlç.lo 285


Capítulo 23
Imobilidade no Teste do Nado Forçado:
depressão ou estratégia de
sobrevivência?

M onica C/craUli Valentim1


Kiitsumrisii I loshino'

A despeito da ampla utilização dos modelos experimentais para estudo de


transtornos psicológicos, muitas criticas e objeçõos sáo aprosontadas com certa
freqüência. Alguns autoros consideram que esses modolos promovem uma
antropomorfização dos sujeitos experimentais, atribuindo-lhes características que
consideram ser oxclusivas da espécie humana, o que conduziria a uma suposta
generalização excessiva dos resultados. Outros questionam se esses modelos
roalmento seriam capazes de reproduzir as doenças humanas com fidedignidade
(Rupniak, 2003). Um traço é comum entre aqueles que fazem esse tipo de critica: a
considoração de que a espécie humana seria de uma natureza totalmente distinta das
outras ospócies animais e, portanto, deveria ser estudada de maneira exclusiva. Contudo,
para o bohaviorismo radical, a espécie humana não ostá apartada do processo evolutivo.
Baum (1999) esclarece esse ponto de maneira magistral:
A espécie humana é única - toda espécie ó única - nâo por causa do uma
característica especial, mas por causa de uma combinação única de
características. Por definição, nenhuma outra espécie podo compartilhar toda a
constelação de características quo faz de nós seres humanos, mas qualquer uma
dessas características pode ser partilhada com outra espécie. Da perspectiva da
teoria da evolução, os seres humanos sáo apenas uma espécie entre muitas (e
nào necessariamente superior a qualquer outra), o não so acham separados dos
‘animais' por uma barreira insuperável A ênfase da análise do comportamento se
afasta de distinções baseadas no fato de se pertencer a esta ou aquela espécie, e
se volta para distinções baseadas nas relações entre comportamento e ambiente
(...) (P 133)
Visto dessa forma, os modelos oxporimentais tôrn sido de grande contribuição
para a ciôncia. Além disso, limites óticos impodem a avaliação do novos tratamentos em
sujeitos humanos, justificando também a importância de sua utilização A similaridade
das manifestações em animais infra-humanos ofereço uma oportunidade exclusiva para
responder a diversas questões através de modelos animais.

1- Mnnlrn eim Pfticoloyiii Ex|Mimm>nU«l (xilo IP-USP, doiilornridH um Podinlrin ptila Faculdado do MoükJtm de Buhtcrttu (SP) ProtoMora dai
tliKcIfiltrwM TIP 1(ComimrtMMinnUtl) n P»k:riogln OnnfXHlMmrailnl n Stipravinom (to (íRlAgxi diuloo (xxnfxjrtarrwwital rw l>ito»rfcid»#d*i do Sacado
CornçAo - Bwiini (SP) Ooriülto mn miUmliniigilniimiil ixmi
2 - ProliiMWjr lilulrir dii Fm.oldntki do ModkJrw d* Bolucalu (SP) ti da Fitcukiadfi do CMocInh da UNESP Bauru (SP) - Curvo» do Pnk:ologla fl
BlokKJki Conluio tinshinniijlf.. muimi lir

286 M i) n k .i OerdUli V .ilc n tim , K.ilsuin.is.i I loshino


À parte das criticas sofridas, os modelos experimentais têm desempenhado um
papel fundamental na investigação da etiologia de diversas patologias, bem como na
busca dos mecanismos fisiológicos responsáveis pelos ofeitos terapêuticos do diversas
drogas, representando pontes fundamentais entre a pesquisa básica e o desenvolvimento
de tratamentos clínicos. Esta importância tem sido froqüontomonte enfatizada na literatura
roconte (Lipska, 2004; Viggiano et al., 2004; Cryan et al., 2002).
Existom, basicamonto, trôs critérios para avaliação do validado do um modelo
exporimental: validade de face, de proditividade o de constructo (Willner & Mitchell, 2002).
Um modolo experimental é considerado adequado a partir do critério de validade de taco
quando apresonta grande somolhança com os aspectos do transtorno observado em
humanos. A validado de proditividade diz respeito à qualidade prognóstica do modelo:
quanto mais o modelo permite previsões acorca da rosposta gonoralizada a tratamentos
específicos, melhor está concoituado dentro desse critério. Por fim, a validado do construto
ó avaliada om função da adoquação dos fundamentos teóricos do modelo proposto.
Podo-se encontrar na literatura, ao menos, dezoito modelos animais de
depressão. Alguns dosses modelos tôm sido bastanto utilizados para teste de
modicamontos antidepressivos com bastante precisão (Capolari, 2002). Um subgrupo
dos modolos experimentais seria o daqueles baseados nas evidências do que o estresse
tornaria o indivíduo mais vulnerável à depressão. Entre esses, pode-se dostacar o modolo
do desamparo aprendido, do nado forçado, do estresse crônico médio imprevisível e
estresse crônico, o o teste de suspensão da cauda (Sandrin, 2002).
Um dos modelos animais de depressão mais populares é o Teste do Nado Forçado
(TNF), também conhecido como Desespero Comportamental (bohaviouml despair) pela
semelhança encontrada entro o comportamonto de imobilidade aprosontado polo rato e a
atitudo de resignação observada em humanos com transtornos depressivos. Porsolt et al
(1977) projetou o teste, inicialmente, para uma avaliação primária de drogas antidepressivas.
O procodimento requer equipamento simplos o envolve forçar camundongos ou ratos a
nadar om um cilindro de água do qual não pode escapar, Após um poriodo do tentativas
vigorosas para escapar, o animal adota uma postura imóvel, que podo sor evitada com
administração prévia de drogas antidepressivas ou choquo oletroconvulsivo. Por outro lado,
ansiollticos e drogas antipsicóticas não reduzem a imobilidade.
O Teste do Nado Forçado é realizado, om geral, em duas sessões. No primeiro
dia, o rato ó doixado por quinze minutos dentro do cilindro. Após 24 horas, nova sessão ó
roalizada por cinco minutos, que serão comparados com os primoiros cinco minutos da
sessão anterior. Pela simplicidade e possibilidade do realização om larga escala, o TNF
tem sido um dos testos mais amplamente utilizados para tostar a eficácia do drogas
antidepressivas om estudos pré-clínicos.
Não obstante sua ampla utilização, o TNF tem sido alvo de muitas criticas. Por so
tratar de um tosto de natureza aguda, o nado forçado não reproduz o curso temporal da
doprossão, como ocorre, por exomplo, com os animais submetidos ao procedimento do
Desamparo Aprondido (Delitti, 2000). Realmonte, o Desamparo Aprondido ó considerado
um modolo ótimo no que refere ao critério de validade de faco (Sandrin, 2002). Por conta
de sua simplicidade e por ser um toste razoavolmonte antigo, o TNF pode parecer arcaico,
pouco sofisticado e incongruente com a era do gonoma. No entanto, os paradigmas do
estresse crônico, quo seriam considerados modolos de doprossão superiores nos
quesitos credibilidade e sofisticação, oferecem restrições om sua utilização para a
descoborta de novas drogas: são mais difíceis de serem realizados, onvolvendo excesso
de tempo o trabalho, inviabilizando a realização de experimentos om quantidade suficiente
para resultados confiáveis. Os resultados desses tostes em diferentes laboratórios podem

Sobre ("omport.mienfo c ('oflnivdo m


variar muito e seu uso ainda nâo foi adaptado para animais gcnoticamonto modificados.
Além dessas razõos, uma questão mais crucial envolve os paradigmas de estresse
crônico: por se tratarem de procedimentos mais deletérios, devoriam ser limitados a
situações ern que outros procedimentos não pudessem ser utilizados ou fossem
inadequados (Rupniak, 2003).
Pelos motivos apresentados, o TNF continua a ser uma opção de modolo
exporimental utilizada por diversos laboratórios no mundo inteiro. Principalmente quando
a questão crucial ó prever a oficácia de antidoprossivos, função à qual o tosto correspondo
com bastante exatidão, sondo responsável pela avaliação de 90% dos antidoprossivos
clinicamonte ativos (Willnor & Mitchel, 2002).
So o TNF ó bom avaliado no critério do proditividade, um dos argumentos mais
contundentes contra sua utilização soria com rolação ao critério do validado do faco: o
argumento de seus críticos fundamenta-se no fato de que, depois de certo período de
imobilidade, o rato volta a se engajar em tentativas de onfrontamonto. Assim, argumentam
que o comportamonto apresontado seria uma simples estratégia de sobrevivência, e não
uma manifestação de depressão. Essa estratégia teria como função principal poupar
onergia e ovitar desgastos desnecessários diante de uma situação inescapável.
So considerarmos, no entanto, o paradigma de soleção por consoqüèncias, as
duas interprotações para a imobilidade do rato durante o teste do nado forçado não
parecem ser necessariamente antagônicas A distinção entre normal o patológico não é
tão nítida, tampouco necossária. em uma análise comportamental, pois a princípio todo
comportamento é adaptativo dentro das contingências que estão em operação. Entonder
que um comportamento é selecionado por suas conseqüências torna pouco provávol que
um comportamento seja encontrado sistematicamente sem ter função alguma. Mas,
afinal, que função teria a imobilidade diante do determinadas contingências?
Tomemos como exemplo um pequeno animal que estivesse na florosta, junto
com outro da mesma ospócio. Se um prodador se aproxima sorrateiramontn e caça um
deles, o outro teria como alternativa enfrentar o predadot ou esconder-se o permanecer
quieto ató que o perigo estivesse afastado. Pode-se imaginar quo animais quo optaram
por se esconder tiveram duas vantagens adaptativas evidontos: primeiro, ao permanecer
imóveis, aumentaram sou tempo de sobrevivência pela redução do gasto energético
excessivo: em segundo lugar, diminuíram suas chances do também ser predados.
É claro que a extrapolação dessa análise para a depressão humana carroga
certos riscos. Skinner (1975) já ressaltava os problemas difíceis quo podoríamos oncontrar,
polo fato de termos sempre mais conhecimento sobre as contingências ontogonóticas:
"As contingências responsáveis polo comportamento não~aprondido agiram há muito
tempo. A seloçào natural de uma determinada forma de comportamento, não importa
quão plausivelmente argumentada, continua sendo uma inferência" (p. 64)
Mesmo assim, a idéia de que os comportamentos aparontemente disfuncionais
- usualmonte tidos como anormalidades quo devem ser combatidas a todo custo o com
a maior rapidez possíveis - possam ser estratégias selocionadas pela filogênese devido
ao sou valor adaptativo, tem fundamento e valor heurístico. Por oxomplo, a literatura
aponta uma incidência alta de transtornos depressivos em adolescentes (Bahls, 2004;
Scivoletto & Tarolho, 2002; Parker & Roy, 2001) que poderia ser atribuída a uma
vulnerabilidade aumentada nessa fase da vida. Os dados experimentais por nós coletados
para avaliar a existência desse aumento na vulnerabilidade mostram, ontrotanto, que os
ratos om idade juvenil têm, ao contrário, uma resistência aumentada ás manifestações
depressivas induzidas polo teste do nado forçado, conformo mostra a figura 1 Essa

m i MtlMít.i C/or.iMVrtlenfim, I fosfiino


resistência maior á depressão na adolescência é compatível com a necessidade de uma
variabilidade comportamental aumentada que permita a seleção de habilidades adaptadas
ao ambiente que se transforma progressivamente. Tal constatação leva à dedução de
que a alta incidência de manifestações depressivas em adolescentes decorre, não de
sua vulnerabilidade, mas dos níveis elevados de estresse que o ambiente impõe. O
reconhecimento de que as crianças e adolescentes dos países desenvolvidos ou em
desenvolvimento estão sendo cada vez mais precocemente exigidas para terem alto
desempenho em todas as obrigações impostas para aquisição de habilidades úteis na
alta competição profissional futura, como mostram diferentes veículos da mídia, ó admitir
que houve nas últimas décadas um aumento adicional de estresse nesta faixa etária.
Não é de se estranhar, portanto, que haja uma correlação significante entre baixo
desempenho escolar e depressão em crianças e adolescente, como mostram DelCAglio
e Hutz (2004). Os estudos em andamento de nosso grupo (Valentim & Hoshino, dados
não publicados) mostram que os níveis de estresse dos adolescentes atuais estão
significantemente correlacionados aos níveis de ansiedade e estes à falta de sono que,
por sua vez, mostra correlação com comportamentos de preguiça quando os escores de
depressão estão aumentados. Essa indicação do que quadros depressivos com
sentimentos de tristeza, anedonia, desânimo e outras manifestações que levam a uma
redução acentuada de operantes se instalam em decorrência de estresse mostra a
similaridade com a imobilidade observada na situação de nado forçado. Em ambas as
situações a suspensão de operantes é adaptativa por economizar energia e garantir a
espera de mudanças favoráveis no ambiente Em tal perspectiva, a emissão esporádica
de comportamentos após a instalação da imobilidade do nado forçado ó, sem dúvida, um
onsaio para a avaliação da mudança das condições ambientais.

II ■ ■ ■ I
II ■ ■ ■ ■
37-38 51-52 67-68 83-84 165-166
dias dias dias dias dias

Figura 1: comparação das módias de teste e reteste pnra grupos de ratos de diferentes
faixas etárias. A MANOVA apontou aumento de imobilidade significante somente para os
dois grupos mais velhos (p< 0,05 e p< 0,01 respectivamente).

A interprotação das manifestações depressivas como contingências selecionadas


e preservadas ao longo da evolução devido ao seu valor adaptativo parece ser obscurecida,
nos dias de hoje, por uma classificação maniqueísta de certos encobertos: alegria é bom,
tristeza é ruim. Atualmente qualquer alteração de humor tem sido classificada como
depressão. Além disso, com o advento de drogas que conseguiram bons resultados na
maioria da população, criou-se uma panacéia em busca de tratamentos milagrosos para
que ninguém mais fique triste. Esquece-se que é natural que experimentemos sensações
agradáveis e desagradáveis ao longo de nossa vida, desde que não nos privemos de

Nobrr Comport.imcnlo t* CogniçAo 289


viverl Até drogas anestésicas, como a procaina, tôm sido apresentadas em programas de
televisão, através de profissionais que preconizam sua utilização com a finalidade de
"apagar memórias ruins". Pessoas empolgadas contam, satisfeitas, os resultados que
obtiveram com esse tratamento aparentemente pouco ortodoxo. Diante desse quadro,
não ó de se admirar que os clientes que não conseguem evitar os tais sentimentos
"ruins" experimentem altas doses do Insatisfação e, mesmo, culpa. A ansiedade por
encontrar soluções rápidas contamina clientes e terapeutas, que buscando os tratamentos
convencionais, anseiam por ver seus clientes exibindo estratégias de enfrentamento o
quanto antes. A concepção dos quadros depressivos derivada da análise funcional leva a
questionar se não há situações em que uma redução comportamental seria não apenas
justificável, mas talvez necessária.
Há contingências que são realmente imutáveis. A morto de um ente quorido, por
exemplo, é um tipo de contingência que não permite nenhuma ação que possa reverter
a situação vivida. É claro que não seria favorável entregar-se à dor e deixar de viver para
sempre, mas talvez o terapeuta possa expressar uma compreensão sobre essa dor, de
tal forma que possa ajudar o cliente a não sentir tanta culpa por não fazer nada ou por
não sentir forças naquele momento. Talvez seja hora de se recolher e guardar energias
para voltar a operar quando as contingências estiverem um pouco mais favoráveis. Mas,
quando seria, então, o momento do voltar a operar?
Segundo Ferster (1972 apud Guilhardi, 2004):
Comporta/mentalmente, um estímulo aversivo pode desmantelar um repertório
Inteiro ou pode aumentar a frequência (através de reforçamento negativo) de algum
desempenho que o elimine (...). Por outro lado, parece possível que um repertório
discriminativo (acurada percepção do ambiente funcional) seja um prô-requlsito
necessário para a ação efetiva. Sem controle diferencial pelos elementos aversivos
do meio (sem notar elementos do ambiente), só pode haver uma reação emocional
difusa ou um afastamento da situaçào total. A delicada interação com o ambiente
total - evitando ou escapando de elementos aversivos e, ao mesmo tempo, agindo
sobre os elementos positivos - há de requerer, certamente, um repertório
discriminativo abrangente (p. 5).
A afirmação desse autor, acrescentada à aceitação das manifestações
depressivas como tendo função, sugere que o terapeuta pode ajudar melhor o cliente a
extinguir a insatisfação e culpa que acompanham os processos depressivos, auxiliando-
o a discriminar as contingências que estão produzindo a redução de operantes e o
excesso de respondentes. Assim, antes de investir na ampliação de repertório
comportamontal que volto a produzir reforços, seria interessante trabalhar na ampliação
do repertório discriminativo do cliente, que além de compreender melhor a relação dos
evontos ambientais com os encobertos e abertos que vem apresentando, pode também
discriminar ocasiões melhores para emissão de novas respostas.

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Sobre Comport.imenlo c CoflniçJo 291


Capítulo 24
Psicoterapia Comportamental: Análise
de questões teóricas relevantes
ao desenvolvimento da
tecnologia1
Naicne dos Santos Pimcnlcl"

Introdução
O objetivo do presente trabalho ó avaliar como a compreensão do duas
questões teóricas na obra de Skinner pode ser útil ao desenvolvimento de uma tecnologia
comportamental mais eficaz no contexto clínico. A primeira delas diz respeito ao próprio
conceito de tecnologia comportamontal, que ó apresentado polo autor em contraposição
às teorias mentalistas tradicionais, principalmente no que diz respeito ao objeto de
estudo considerado. A segunda questão ó acerca do conceito de estado, que nos textos
analisados pode ser identificado com o conceito de probabilidade de respostas.

Tecnologia Comportamontal
Ao longo de sua obra, fica claro o objetivo de B. F. Skinner em rejeitar teorias
mentalistas de explicação do comportamento. Ao rejoitar essas teorias, ele enfatiza a
impossibilidade de os estados mentais serem diretamente manipulados, impossibilitando
conseqüentemente o controle eficaz do comportamento. Temos então que para Skinner a
possibilidade de previsão e controle ó crucial ao desenvolvimento de uma tecnologia do
comportamento. O autor contrapõe, então, a ineficácia prática das teorias mentalistas aos
avanços alcançados pela Análise Experimental do Comportamento. Ao propor um modelo
eficaz de intervenção baseado na análise e manipulação das contingôncias de reforço e
aplicável a diversos contextos, a Análise Experimental do Comportamonto tom domonstrado
que uma tecnologia do comportamento deve desenvolver-se com o objetivo de adquirir um
maior grau de controle sobre o comportamonto humano.
Um primeiro passo a ser tomado para desenvolver a tecnologia comportamental
é reconhecer o comportamento como o objeto de estudo a ser investigado pela Ciôncia
do comportamento. Como as teorias mentalistas consideram o comportamento um
sintoma de processos mentais subjacentes, esses processos são tomados como
objeto de ostudo e o comportamento, conseqüentemente, é negligenciado. Disso
decorre que as condições ambientais das quais o comportamento ó função não são
consideradas e a investigação acerca das causas do comportamento encerra-se no
nível mental (Skinner, 1971).

' Agradeço ao Hnif Dr JuHo César Coalho da Noa« pala leitura cukJaòoaa a colaboraçAo na radaçAo da vormftn Anal do texto
1Doutoranda em F-Hosofla - Unlvernklado Federal de Sâo Cario« e-mal nalene plmentaltfftj com br

292 N.ncnc dos Sdnto* 1’imrntcl


Qual foi, entâo o caminho percorrido pela psicologia para sanar esse problema?
A primoira questão que se coloca é por que as circunstâncias ambientais forain
negligenciadas por tanto tempo. Skinnor considera que provavolmonte isso tenha
ocorrido porque o efeito do ambionte sobro o comportamonto pormanecou obscuro por
muito tompo. Com o desenvolvimento do conceito do rofloxo, o papel do ambiente sobre
o comportamento começou a sor mais Investigado. A ação eliciadora do ambiente passou
a ser denominada estimulo, o sou efeito sobro o organismo, resposta. Posteriormente,
quando Pavlov domonstrou que novos reflexos poderiam surgir através de
condicionamento, todos os comportamentos passaram a ser considerados, na
psicologia estlmulo-rosposta, reações a estímulos. No entanto, a psicologia ostímulo-
rosposta domonstrou-se insuficiente para explicar comportamentos complexos, fazendo
com quo fossem inventados processos internos que ocorreriam entre a apresentação
do ostímulo e a eliciação da rosposta.
Skinnor (1971) contesta o papol do ambionte descrito na psicologia estimulo-
resposta, pois considera que o ambiento nüo apenas elicia o comportamento mas
também o solociona através de suas consoqüôncias. Ou seja, a explicação do
comportamonto não dove considerar apenas o quo acontece antes da resposta, pois
sâo as consoqüôncias quo modolarn o mantém o comportamonto.
Essa formulação gora duas consoqüôncias importantes. A primeira delas ó
que, considerando quo o comportamento que opora no meio gera conseqüências,
podemos estudá-lo arranjando ambientes om que conseqüências específicas sejam
contingentes a ele. A segunda conseqüência, de caráter mais prático, é que o ambiente
podo ser diretamente manipulado e os efeitos das mudanças produzidas por essa
manipulação podem acontecer imediatamente (Skinner, 1971). É a partir dessas
formulações que passamos a concobor, portanto, uma tecnologia do comportamento.

Psicoterapia Comportamental e o conceito de estado


Uma das áreas do atuação da psicologia nas quais a tocnologia comportamental
pode ser aplicada é a psicoterapia. No presente trabalho, focalizaremos aponas as
colocações de Skinner acerca do toma, para compreender como o estudo conceituai
dos textos do autor pode favorecer o dosonvolvimonto da tecnologia.
Ao propor a fundamentação da psicoterapia om princípios do Behaviorismo
Radical, Skinnor (1953, 1954/1972) inicia sua análise criticando abordagens tradicionais
quo atribuem o comportamonto a processos mentais. Ou soja, a análiso é semelhante
á dosonvolvida pelo autor acerca da tecnologia como um todo, porém considerando
tomas o conceitos específicos ou comuns na psicoterapia.
Skinnor (1954/1972) formula a critica aos conceitos e teorias psicanalíticas que
buscam explicar a construção e o funcionamento do aparato montai. Inicialmente, questiona
se Froud acoitava o aparato mental como real ou como um construto teórico, considerando
que as duas possibilidades acarretam problemas ao estudo do comportamento. A
conseqüência do so considerar o aparato mental como real é a do postular osso aparato
como objoto do estudo da Ciência do Comportamonto. Por outro lado, considorá-lo um
construto teórico ou uma metáfora acarreta problemas somelhantes, como a negligência
em so buscar as causas ambientais do comportamonto e a dificuldade do se estudar o
comportamento como uma variável dependonto.
A alternativa proposta por Skinner (1956/1972) ó considorar quo a probabilidade de
omissão do comportamonto ó o aspecto mais importante a sor analisado cm pesquisas
que enfatizam a previsão o o controlo do comportamento. Experimentalmente, a probabilidade

Sobre Comporf.imcnto e 293


o considerada com base na freqüência com quo o organismo se comporta do determinada
forrna sob circunstâncias ospocíficas Para omproondor tal estudo, sob o ponto do vista do
rnótodo científico, assumimos que o comportamento ó a variável dependente a sor explicada
em função do certas condições ambientais externas Com baso nas relações funcionais
entre o comportamonto e as condições ambientais, ó possível prodizer, controlar e gerar
comportamontos, considerando quo as variávois indopondontos estojam sob nosso controlo.
Tarnbôrn ó possivol interpretar certas instâncias do comportamonto, inforindo variávois
plausíveis das quais nào dispomos de informações diretas
Mais espocificamonte acerca da terapia comportamental Skinnor (1989) afirma
quo o rápido desenvolvimento da Análise Experimental do Comportamonto tem
possibilitado quo a terapia comportamontal ganho autoridado. Como os sontimontos, a
ansiodado, a raiva, e outros estados são focos das terapias om geral, um primeiro
passo om direção à torapia comportamental foi dado quando so assumiu quo o quo
sentimos são estados do nosso corpo e não causas de nossos comportamentos.
Nossa perspectiva, Skinnor (1989) define o objetivo da torapia comportamontal:
"Voltar-se aos antecedentes ambientais para oxplicar o quo alguém faz e, ao
mosmo tompo, o que alguém sento onquanto o faz. Para cada estado sentido e designado
pelo nome de um sentimento há, presumivolmonto, um evento ambiental do qual ele ó
produto" (p. 74).
Portanto, os terapeutas comportamentais consideram o quo é foito e o que ó
sentido resultados de conseqüências solotivas da seleção natural (comportamento
inato) e do reforçamonto operante (comportamento aprendido). Conseqüentomonto,
deve-so considorar a emoção, por exemplo, da perspectiva do condicionamento reflexo
- respostas das glândulas e dos músculos lisos - e da perspectiva do condicionamento
operante - probabilidado do emissão de determinados comportamentos. O estado
corporal rosultanto do condicionamento reflexo ó geralmente chamado do sentimento e
o estado resultante do condicionamento operante, observado através da introspecção,
ó geralmente chamado de estado da mente (Skinner, 1974).
É nesse ponto que a terapia comportamental se diferencia das torapias
fundamentadas om concepções mentalistas tradicionais. Na perspectiva
comportamental, o comportamonto não é atribuído ao estado da monte. Por exemplo,
deve-se considerar que quando dizemos “ostou com vontade de fazor algo", estamos
relatando um estado corporal (observado através da introspecção) que é resultado das
conseqüências reforçadoras que o comportamento em questão teve no passado.
Para ilustrar a sua proposta, Skinner (1953) analisa alguns subprodutos do
controlo avorsivo exercido sobre o indivíduo. Por oxemplo, dianto de um controlo avorsivo
excessivo, o indivíduo podo fugir do controlador isolando-se dele fisicamento. Podo
também rovoltar-so contra o controlador através do contra-ataque, ou seja, omitindo
comportamentos que causam dano ao controlador. Ou, ainda, pode apresentar uma
rosistência passiva, simplesmente não se comportando em conformidado com as
práticas controladoras. Os subprodutos do controlo, sejam oles emocionais ou relativos
ao comportamento oporanto, que muitas vozes são perigosos para o indivíduo ou para
o grupo, constituem o campo da psicoferapia.
Um subproduto emocional do controle avorsivo, analisado por Skinner (1953),
é o modo. As rospostas rofloxas eliciadas pelos estimulos avorsivos utilizados na punição
também ficam sob controle do qualquor estimulo que tenha ocorrido ao mosmo tompo
Consoqüontomonte, pode ocorrer uma mudança nos comportamentos operantes que
possibilitem a fuga do todos esses estímulos. Por exomplo, um indivíduo que teve o
comportamonto sexual severamente punido, pode vir a temor indevidamente qualquei
situação relacionada com sexo.

294 Niiiono dos S.intos 1’imcntol


Corri base nesse exemplo citado por Skinner, percebemos a ônfase dada á
alteração da probabilidade de comportamontos operantes em função de estímulos
avorsivos de situações passadas. É nesse ponto que podemos pensar em termos de
estodos. A situação aversiva nào apenas oiicia respostas retloxas (ou estados corporais)
mas também altera a probabilidado do emissão de comportamentos operantes (estado
de força das resposta) quo no passado possibilitaram a fuga da situação. Nosso sentido,
ao ostabolecer novas contingôncias no contexto clínico (no caso do modo, não punitivas)
ou chamar a atenção do indivíduo para a discrepância entre contingôncias passadas e
as atuais (análise funcional), o torapouta ago no sentido de criar um estado mais favorável
ao dosonvolvimonto de comportamontos altornativos á fuga/esquiva, ou seja, aumentar
a probabilidade de comportamontos mais adoquados às contingôncias atuais.
Skinnor (1989) chama a atenção para a possibilidade de sucesso da
psicotorapia. Em gorai, o indivíduo passa apenas uma poquona parto de sua vida na
presença do terapeuta. Consoqüontomonto, poucas contingôncias ofotivas podom ser
arranjadas no ambionto clínico, uma vez que as contingôncias da vida cotidiana do
indivíduo podem ser muito diferentes. Em função disso, a maioria dos terapoutas atua
dando conselhos. Esses conselhos podom funcionar como ordens ("faça isto", "pare
de fazer aquilo") ou como descrição de contingôncias ("fazer isto provavelmente acarreta
uma conseqüência reforçadora"). No entanto, mesmo descrevendo contingôncias, os
conselhos podem falhar, seja porque o terapeuta não tem acesso ao cotidiano do
indivíduo - e, conseqüentemente, pode doscrovor as contingências de forma incompleta
- seja porque as contingências podom ter mudado rapidamente. Diante disso, Skinnor
aponta a necessidade de os terapeutas comportamentais irem mais além. A tarofa
seria a do ensinar o indivíduo a construir suas próprias regras, ou seja, ensinar-lhe um
pouco do análise de comportamento.
Uma análise complomentar à proposta de Skinner também podo ser buscada na
noção de estado. Ensinar o indivíduo a construir suas próprias rogras implica
instrumentalizá-lo a analisar funcionalmente o seu comportamonto o o comportamento
dos outros, uma vez que, apenas através desse tipo de análise, ele será capaz de formular
rogras eficazes Nesse sentido, a tarefa do psicotorapeuta seria a de criar, no contexto
clinico, uma alta probabilidade de quo o indivíduo, om seus contextos cotidianos, aplique
a análise funcional como forma de compreendor sous comportamentos e sentimentos e,
om função disso, se comportar do manoira adoquada às contingências vigontes. Dossa
forma, o psicoterapeuta atua não aponas com o objetivo de modificar momentaneamente
o chamado "comportamonto-probloma", mas. principalmente, estabelecendo o
descrevendo contingôncias que criem, no indivíduo, um estado, ou usando os tormos do
Skinner, uma alta probabilidade de análise funcional fora do contexto clínico.
Dessas colocações, podomos então concluir quo o torapouta comportamontal
devo atuar om duas frentos principais e complementares. A primeira ó a do criar
contingôncias no contoxto clínico que possibilitem a emissão do comportamontos
alternativos aos chamados "comportamontos-probloma", ou soja, aumentar a
probabilidado ou estado do força desses comportamentos. A segunda é a de
instrumentalizar o cliente a, fora do contexto clinico, ser capaz de realizar análises
funcionais eficazes para a omissão do comportamontos adoquados.
Podemos ainda ampliar essa análise para ponsar na atuação do psicotorapeuta
em termos de modificação social, uma vez que o modolo clínico de psicoterapia individual
tom sido alvo do críticas quanto ao seu alcance social Acreditamos quo intervenções
muis amplas, como as ompreondidas por analistas do comportamonto no campo da
educação e da psicologia social, apresentam maior alcance do que aquelas

Sobrv ("omporl.tmenlo c 295


desenvolvidas por psicotorapeutas em seus consultórios. No entanto, isso não invalida
a possibilidade de o terapeuta, ao instrumentalizar sou clionte a analisar funcionalmente
os diversos contextos om que se insere, contribuir no sentido de facilitar a programação
do práticas sociais fundamentadas em análises do contingências. Ou seja, a
psicotorapia comportamental se configura como mais um campo tecnológico capaz do
difundir o sedimontar, ainda que do forma mais restrita do que a educação, por oxomplo,
as técnicas comportamentais e, principalmente, a análise do cornportamentQS
fundamentada om princípios bohavioristas radicais.
"Ao rojoitar sentimentos e estados da monte como as causas do comportamonto,
o voltar-se às condições ambiontais responsáveis tanto pelo que as pessoas fazom
como pelo quo sontom enquanto o fazom, os analistas do comportamonto, o com oles
os torapeutas do comportamento, podem abordar os problemas mais amplos do
comportamento humano de forma muito mais efetiva (...) Um problema do uma
importância muito maior resta ser resolvido. Ao invés do construir um mundo om que
todos dovomos viver felizes, precisamos parar de construir um em quo sorá totalmente
imposslvol viver. Essa questão é inteiramento um probloma de comportamento humano”
(Skinnor, 1989, p. 84, meus grifos).

Conclusão
Com base nos textos utilizados é possível concluir que Skinner considera
que, ao assumir o comportamento como o objeto de estudo a ser investigado, a
tecnologia comportamental deu um grande passo em direção ao desenvolvimento
de técnicas eficazes de previsào e controle do comportamento humano. No contexto
clínico o dado fundamental a ser explorado é o estado ou probabilidade de
comportamentos. Através da análise funcional é possível inferir a probabilidade de
emissão de comportamentos do cliente. A partir disso, manipulando adequadamente
as contingências no contexto clínico, torna-se possível aumentar o alcance da
psicoterapia, uma vez que novos comportamentos poderão surgir em outros
contextos. Ou seja, cria-se um estado mais favorável ao desenvolvimento de
comportamentos alternativos ao chamado "comportamento-problema”.

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Skinner, B F (1989). Recent issues in the analysis of behavior Columbus' Merrill Publishing Company.

296 Niiicnr dot Sdntoi Pimentel


Capítulo 25
Estresse Ocupacional
Nancy Julieta Inocente
USr, Unitau (SP)
Clara Odilia Inocente
Janine lulieta Inocente
USP - Universidade de Hordeaux
Rubens Reimão
usr

A saúde da força do trabalho é uma das discussões mais importantes no


tempo atual. A saúde ocupacional, refere-se ao conjunto de questões que afetam o bem
estar emocional e físico dos funcionários em seu trabalho (Muchinsky, 2004).
Uma organização sadia define-so como aquela que apresenta taxas baixas de
enfermidade, lesões e invalidez em seus trabalhadores e também é competitiva no
mercado. As investigações desenvolvidas pelo NIOSH (2006) tôm identificado algumas
características organizacionais associadas com o trabalho sadio com baixo estresse e
com níveis altos de produtividade. Algumas características incluem;
a) O reconhecimento dos trabalhadores por desempenho adequado no trabalho;
b) Oportunidades para o desenvolvimento da carreira;
c) Uma cultura organizacional que valoriza o trabalhador individualmente;;
c) Ações dos gestores que concordam com os valores organizacionais.

O estresse causado pelo trabalho representa una ameaça para a saúda dos
trabalhadores e, como conseqüência, a saúde das organizações (NIOSH).
O estresse no trabalho ó definido como um conjunto do reações emocionais,
cognitivas, fisiológicas e comportamentais a certos aspectos adversos ou nocivos,
relacionados as condições e as organizações do trabalho (MONCADA, LLORENS E
SÁNCHES, 2006).
Trata-se de um estado que se caracteriza por altos níveis de tensão, com a
freqüente sensação de não poder fazer nada frente a situação, Diante de certas
circunstâncias e da intensidade, freqüência e duração de estímulos negativos, o
estresse pode ser precursor de diversas enfermidades, principalmente as
cardiovasculares (Niedhammer e Siegrist, 1998; SIEGRIST, 2003).
Nos últimos anos, os efeitos dos fatores psicossociais do trabalho na saúde,
especialmente na saúde cardiovascular, têm causado um interesse crescente em
estudos epidemiológicos.
O estresse ocupacional resulta da interação do trabalhador e as condições de
trabalho. As opiniões diferem sobre a importância das características do trabalhador
frente as condições do trabalho como a causa primeira do estresse no trabalho. No
entanto, estas opiniões distintas são importantes porque sugerem modelos diferentes
de prevenir o estresse no trabalho.

Sobre l'ompor1.imcnto e Cojjniçilo 297


Modelo Demanda Controle
O modelo de estresse ocupacional desenvolvido por Robert Karasek,
denominado Modelo Demanda/Controle recorta dimensões do ambiente do trabalho,
consideradas estressores.

Modelo Demanda/Controle
No Modelo Demanda/Controlo o estresse ó desenvolvido em ambientes de
trabalho nos quais estão presentes estressores crônicos. O modelo mede trôs fatores:
demanda psicológica, tomada de decisão e apoio social no trabalho.
As demandas psicológicas do trabalho, constiiiiom om: trabalho em ritmo rápido:
quantidade excessiva; imposição de prazos; ordens contraditórias; intorrupções; conflitos
pessoais, modo de perder o emprego; receio de ficar desatualizado.
A latitude ou tomada de decisões possui dois componentes:
a) Controle ou autonomia de decisão: consiste na possibilidade de controle e
participação no trabalho do trabalho;
b) Uso de competências: possibilidade de utilizar suas competências e
qualificações no desenvolvimento das atividades.
O apoio social no trabalho, refere-se ao apoio e reconhecimento dos colegas e
superiores hierárquicos. O apoio social tende a diminuir a tensào psicológica, quando
existe a integração sócio-emocional e uma relação de confiança entre os colegas de
trabalho o supervisores.
A hipótese de Karasek (1998) consiste na combinação de urna forte demanda,
de um baixo controle e uma falta de apoio, tornando o trabalhador vulnerável à doenças.
O Modelo Demanda/Controle classificam algumas profissões em:
a) Trabalhos ativos (alta demanda e alto controle), contigencia controle sobre o trabalho.
Os efeitos sobre o comportamonto são a aprendizagem e o crescimento. Exemplos:
advogados, juizes, módicos, professores, engenheiros, executivos;
b) Trabalhos passivos (baixa demanda e baixo controle), contigencia um ambiente de
trabalho pouco motivador e passivo. O trabalhador desenvolve uma aprendizagem
negativa ou uma perda gradual de capacidade adquirida e perda de iniciativa. Exemplos:
trabalhadores administrativos, operacionais, burocráticos e porteiros;
c) Trabalhos de alta tensão (alta demanda e baixo controle), produzem reações
psicológicas negativas como fadiga, ansiedade, depressão e doença fisica. Exemplos:
oporários de fábrica, trabalhador da linha de montagem, funcionário do restaurante,
camareiros, cozinheiros, telefonistas;
d) Trabalhos de pouca tensão (baixa demanda e alto controlo) como: vendedores,
eletrecistas, profissionais autônomos).

Prevenção do Estresse Ocupacional


As evidências discriminadas pelos estudos desenvolvidos com o modelo
Demanda/Controle apontam que, as condições de alto esforço e baixa recompensa no
trabalho são fatores de risco para a saúde. A exposição a fatores de risco psicossociais
podem resultar em prejuízos a saúde do trabalhador. Medidas preventivas são
necessárias no ambiente de trabalho, tais como:

298 N .in c y luliet.i Inocente, CKir.i CXtilí.i Inocente, )<inine lulieta Inocente,Rubens Reinnlo
a) Mudar a organização para prevenir o estresse no trabalho;
b) Assegurar que o volume de trabalho seja coordenado com as habilidades e os
recursos dos trabalhadores;
c)Desenhar os trabalhos para prover significado, estimulo e oportunidades para que os
trabalhadores usem suas habilidades;
d) Definir claramento os papéis e responsabilidades dos trabalhadores;
e) Oferecer oportunidades aos trabalhadores de participar nas decislões e ações que
afetam seus trabalhos;
f) Melhorar as comunicações na organização;
g) Reduzir a incerteza sobre o desenvolvimento de carreira e as possibilidades de
trabalho no futuro;
h) Prover oportunidades para a interação social entro os trabalhadores;
i) Estabelecer os calendários de trabalho que sejam compatíveis com as demandas e
responsabilidades fora do âmbito do trabalho.

Referências
Karasok, R. El modelo de demandas/control: enfoque social, emocional y fisiológico dei rlesgo de
estrós y desarollo de comportamientos activos. In: Organizaciôn dei Trabajo. Enciclopédia
de Salud y Sequndad en el Trabajo. Genebra: OIT, vol. 2, 1998.
Moncada, S.; Llores, C.; Sanches, E. Factores psicosociales: la importância de la organizaciôn dei
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Muchinsky, RM. Psicologia Organizacional. 7ed. Sflo Paulo: Thonson, 2004.
National Instituto for Occupatlonal Safoty and Health. Stress at work, 2006.
Nledhammer, I.; Siegrist, J. Facteurs psychosoclaux au travail et maladles cardio-vasculares: 1'apport
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Siegrist, J. Épidamtologie et determinants soclaux des Inegalités de santé. Revue d' Êpidemtologie et
de Santé Publique, vol.51, 4, 2003.

Sobro Comportamonto c C'o«niv*lo 299


Capítulo 26
Formação de classes de estímulos
equivalentes e as operações de
soma e subtração
Rafaella Doniní'
Daniel Del Key'
N il/a Michclctto
Pontifícia Universidade Católica dc S»lo Paulo

O estabelecimento de habilidades acadêmicas básicas, tais como leitura, escrita


e habilidades matemáticas elementares, tem sido objetivo dos educadores nos primeiros
anos escolares. O insucesso na aquisição destas habilidades dificulta a realização da
maioria das atividades desenvolvidas durante o ensino de qualquer disciplina que tem
estas como habilidades pré-requisito. Diversos fatores têm sido indicados como
determinantes deste insucesso, desde explicações que atribuem ao aluno as causas
deste fracasso até as que identificam na escola, nos vários aspectos que a constituem,
tais determinantes. As sucessivas reprovações têm sido responsáveis pela evasão de
muitas crianças da escola ou, em situações em que a reprovação foi abolida, a simples
permanência na escola não tem permitido ou levado os professores a gerarem condições
de ensino que permitam que estas habilidades sejam desenvolvidas.
As várias tecnologias que a análise do comportamento gerou no campo da
educação - instrução programada e máquinas de ensinar (Skinner, 1972; Vargas & Vargas,
1992), ensino programado individualizado (Keller, 1982,1983; Lloyd & Lloyd, 1992), ensino
de precisão (Linsley, 1992; West & Voung, 1992), entre outras - têm permitido identificar os
procedimentos inadequados de ensino como condições importantes relacionadas ao
fracasso dos agentes do ensino em desenvolver habilidades dos alunos.
A aplicação de qualquer uma destas tecnologias supõe um conjunto de condições
que tom sido amplamente discutido pelos analistas do comportamento. Entre tais
condições envolvidas no planejamento e implementação do programas de ensino, estão:
a divisão do conteúdo a ser ensinado em pequenos passos, de forma que o nlvel de
complexidade aumente gradualmente entre esses passos e que o estudante, cujo
repertório precisa ser conhecido, somente passe para o passo seguinte após ter dominado
completamonte o passo anterior, o que aumenta as chances de que tenha sucesso ao
longo do processo e reduz as chances de que ocorram erros e os efeitos colaterais
gerados pelos mesmos, tais como a fuga; essa condição implica uma outra: a de que
deve ser conhecido o repertório o repertório do estudante e que ele progrida no seu
próprio ritmo na consecução do programa de ensino; e a liberação polo professor de
conseqüências reforçadoras positivas imediatamente após as respostas corretas emitidas
pelo aluno (Skinner, 1972; Keller, 1983; West e Young, 1992; Rose, 1999).

' O trntiiillK) to) realUado quaiKk) da vigência do botta da Mostrado da CAPES


’ HoliiisUi do Iniciação Cientifica PIBIC-CNPq quando roal/uu o trabalho

300 Kalaell.i Poninl, Daniel Del Rey, Nil/.i Michelelto


Na perspectiva da análise do comportamonto, muitos problemas do inicio do
processo de ensino (fracasso escolar, ovasào da escola, a distorção da faixa etária por
série) poderiam ser minimizados ou mesmo evitados com programas de ensino
adequados. Tais programas deveriam sor constantemente avaliados a partir dos
resultados quo produzem. “Fracassos eventuais deveriam ser atribuídos á inadequação
dos procedimentos e não a características do aluno ou do meio do qual provém." (De
Rose, 2005, p. 31)
Anaíistas do comportamonto tôm se preocupado especialmonte em ostaboíecor
procedimentos de ensino voltados para o estabelecimento de habilidades académicas
básicas, entro elas as habilidades matemáticas.
Atentos á condição de que o conteúdo devo ser apresentado começando pelas
habilidades mais simples até chegar ás mais complexas, autores de vários estudos
planejaram a avaliação e/ ou o ensino das operações aritméticas de adição e subtração
somente depois do ensino do habilidades onvolvendo o conceito de número (Resnick,
Wang e Kaplan., 1973; Ifiesta, 1980; Silva, 1999) ou propusoram que comportamentos
descritos (por Prado e Rose, 1999 e Prado, 2001) como componentes do conceito de
número são pré-requisitos para o ensino de comportamentos mais complexos, incluindo
aqueles de efetuar operações fundamentais (Prado e Carmo, 2004).
Para um aluno efetuar operações fundamentais, é nocossário quo olo rosponda
diferencialmente aos valoros numéricos componentes daquelas operações. E além de
responder diferencialmente aos valoros numéricos, é necessário que o aluno responda
aos sinais que compõem as operações: “+" (de adição), ou (de subtração), ou "X" (de
multiplicação), ou “+" (de divisão) e “=" (sinal de igualdado presente nas diferentes operações),
e que responda diferencialmente às relações arbitrárias entre os valores numéricos e os
sinais. Dossa maneira será possível que a operação venha a controlar a omissão do
respostas pelo aluno que tenham como conseqüência final a resolução da operação.
Portanto, resolver uma operação é um comportamento complexo que envolve uma sério de
discriminações simples. A esso respeito, Ferster e Harnmer, Jr. (1966) afirmam:
Qualquer instância dos comportamentos componentes de um repertório aritmético
envolve essencialmente discriminações multo simples (...). O número de símbolos
que são usados ô muito pequeno, comparado com as maneiras complexas em que
eles podem ser arranjados, e os estímulos adicionais, tais como a posição de
digltos, criticamente determinam qual de várias respostas pode sor reforçada
Assim, na aritmética decimal, 2 ó uma resposta apropriada para 1 + 1, 0 + 2, ou 4
- 2, ou, dados os números 4 e 4, a resposta correta é 16, 0, ou 8, dependendo de
se um 'X\ um ou um v aparece entre eles (p 635).
Muitas das respostas que o aluno emite durante a resolução de uma
oporação são verbais. Por exemplo, om uma operação de adição envolvendo quantidades
do objetos, a criança pode contar os objetos do conjunto que constitui a primeira parcela,
contar os objetos do conjunto que constitui a segunda parcela, juntar os dois conjuntos
o contar quantos objotos existem ao todo, chegando-se ao resultado da operação. Em
cada contagem, são emitidas respostas de tato e de intraverbal, uma vez quo a criança
emito respostas sob controle de cada objoto (ostímulo não-verbal) sendo contado e sob
controlo do número falado antoriormente (estímulo vorbal) que evoca a emissão do
próximo número na seqüência crescente ("1, 2, 3,..."). Assim, do acordo com Skinner
(1972), o onsino da matemática implica colocar respostas verbais sob controle do
divorsos estímulos: "as respostas são todas verbais. Consistem em falar e escrever
cortas palavras, algarismos e sinais que, a grosso modo, so referem aos números o
operações da aritmética" (p. 14).

Sobre Comportamento e Coflnil<H> 301


As rospostas que tenham como conseqüência a resolução do uma oporação não
somonto é trabalhada na oscola, mas também em experiências informais do dia-a-dia,
muitas das quais constituem situações-problema envolvendo números falados, quantidades
e algarismos, sendo posteriormente introduzidos os sinais gráficos das operações.
Analistas do comportamento realizaram ostudos dodicndos
espocificamonto á elaboração do procedimentos para o onsino do oporaçôos fundamentais.
Entre os diferentes procedimentos elaborados, estão os soguintos: a) contagom oral dos
valoros do moedas com o auxílio dos dodos das mãos, resultando em uma soma daqueles
valores (Lowe e Cuvo, 1976); b) uso de figuras e de numerais, sondo que aparece na tola de
um computador o desonho de uma balança com bolinhas om seus pratos, no caso do
adição, ou o dosonho do uma balança com bolinhas e bombinhas que explodem bolinhas,
no caso da subtração; o estudante encontra a resposta do uma adição ou do uma subtração
ao oquilibrar os dois pratos do desenho da balança: ele devo prossionar, no toclado do
computador, o algarismo corrospondonto a quantas bolinhas devo colocar no prato da
balança para que, no final, haja o equilíbrio com o outro prato (lógas, 2002); c) contagem dos
intorvalos entro numorais impressos em uma seqüência crescente disposta linearmente
("linha do númoro") na resolução do adições e subtrações (Resnick e cols., 1973; Fuoyo e
Busholl, Jr., 1998); d) uso de textos com explicações passo - a - passo e com exemplos de
como ofotuar contas armadas com numerais (Figueirodo, 2001). Em cada um dosses
estudos, foi feita uma avaliação do efeito do procedimento de treino empregado sobre o
desomponho de cada estudante, através de um teste composto por tarefas que envolveram
as habilidados previamente treinadas.
Tem se destacado estudos, fundamontados no paradigma de equivalência de
ostímulos, que mostraram que ó possível planojar condições de ensino em que o
estudante venha, a partir do treino de determinadas habilidades, a responder
corretamente nào só em testes posteriores onvolvendo aquelas habilidades treinadas
diretamento, como também em testes envolvendo novas habilidados quo emergem
sem serem ensinadas.
Entro as habilidados matemáticas que foram alvo do posquisas baseadas no
paradigma de equivalência de estímulos, estão aquelas que compõem o concoito de
númoro (Gast, VanBiervIiet e Spradlin, 1979; Prado, 2001; Prado e Rose, 1999), a
subtração (Araújo, 2004), o conceito de fração (Lynch o Cuvo, 1995; Leader e Barnes-
Holmos, 2001) e o manuseio de dinheiro (Stoddard, Bradloy e Mcllvane, 1987; Rossit,
2003) Tais ostudos indicaram a possibilidade do elaborar efetivos procedimentos de
ensino de habilidades com certa economia de tempo, dado que o troino direto de algumas
habilidados pode contribuir para a emorgência no repertório do ostudanto do outras
habilidades relacionadas não diretamente treinadas. Particularmente importantes para
a presente investigação são trabalhos que abordaram habilidados componontes do
concoito de número e componentes de operações fundamentais.
Entro os trabalhos quo focaram o concoito do númoro, ostá aquolo desenvolvido por
Gast, VanBiervIiet e Spradlin (1979). Tais pesquisadores estudaram a rolação ontro número
ditado, algarismo, conjunto do pontos pretos e palavra impressa correspondente ao númoro.
Participaram do estudo seto crianças que já identificavam o algarismo
corrospondonto ao número ditado pelo experimontador, separavam subconjuntos de
conjuntos maiores tanto a partir de números ditados como também a partir do algarismos,
identificavam algarismos correspondentos a quantidades, emitiam respostas textuais a
algarismos o contavam a quantidade de estímulos presentes om conjuntos.
A partir de um procodimonto de oscolha-de-acordo com o modelo, cada criança foi
treinada a idontificar a palavra impressa correspondente ao numoro ditado polo posquisador.

302 Ivoilriflo 1'ruvlnol S.il^ulo, M.iur,i Alvct Nimfs QoiiRor.i


Após o treino foi o tostado o desempenho das crianças na tarefa troinada, assim como ern
outras relações: separar, de um conjunto de pontos, um subconjunto com a quantidade
correspondonte a uma palavra impressa, e identificar o algarismo correspondente à palavra
improssa, identificar a palavra impressa correspondente a um algarismo, identificar a palavra
impressa corrospondento à quantidade de pontos de um conjunto, o omitir resposta toxtual
sob controlo de palavra impressa. De maneira geral, os resultados indicaram um elevado
nlvel do acertos de todos os participantes tanto nas tarefas que envolviam a relação treinada
como naquolas envolvondo as relações emergentes.
Prado o De Rose (1999) também avaliaram respostas de estabelecer rolações
entro número falado, algarismo e quantidade correspondentes de estímulos e a
possibilidade do o treino diroto de algumas dessas rolações contribuir para a omorgôncia
de outras relações. Em 2001, além de Prado fazer uma avaliação inicial do dosemponho
de sete crianças e do idontificar rolações que podoriam sor treinadas diretamente e
rolações que podoriam emergir, esse autor implementou o treino e o toste de desemponhos
omergentes com cada participante. Durante a avaliação inicial, trôs participantes
apresontaram índices de acertos inferioros à 50% em relações envolvendo algarismos o
um deles apresentou semelhante Indice em quase todas as relaçõos. Essas trôs crianças
foram expostas ao treino tanto da nomeação de algarismos e produção de seqüência de
algarismos corno também da relação número ditado - algarismo (AB). Outras relações
foram ainda treinadas, variando entre os participantes. Comparando-se os dados da
avaliação inicial com os dados dos tostes feitos depois da fase de treino, é possível
obsorvar que, para duas crianças, houve um aumento nos Índices de acertos em grande
parto das relações que não tinham sido treinadas diretamente (para uma criança, esse
aumento ocorreu em cinco de seis relações, enquanto que para a outra criança o aumonto
de acertos ocorreu em nove de dez rolações).
A relação entre número ditado e o correspondonte numeral foi abordada por
Rossit (2003) no primoiro de seus quatro estudos desenvolvidos para o ensino de
manuseio do dinheiro. Nessa pesquisa, observa-se a importância da habilidade de
adicionar valores de moedas e / ou de cédulas que, combinados, rosultam om um valor
monetário maior. Stoddard, Brandley o Mallvane (1987) om pesquisa om que ensinam
manuseio de dinheiro analisam osta habilidade que chamam emparolhamento por
componentes (componont matching) e indicam que aparentemente ocorre a resposta a
componentes individuais do ostímulo e então novas equivalôncias são adquiridas pela
combinação para omparolhar com um valor maior. A compreensão desta habilidade
paroce importante quando se invostiga a realização de operações.
Para o presente trabalho, é particularmente interessante o primeiro estudo de
Rossit (2003) porquo nelo são utilizados numerais intercalados pelo sinal de adição (+),
configuração semelhante a uma sentença matomática, o é abordada a relação ontre tal
"sentença" o o numeral resultante dessa soma. Dez pessoas com deficiência mental
foram treinadas a ostabelecer relações entro numeral - numeral número ditado - numeral,
valor monotário ditado - figura de moeda, e numorais intercalados pelo sinal de adição -
numeral / resultado da soma. Após o treino, foram aplicados testes de desempenhos
emergentes e de goneralizaçào, avaliando se cada participante identificava o numoral
correspondonte ao valor do uma figura do moeda apresentada como estimulo-modolo, e
vice-versa, identificava a "sentença" composta por numerais intercalados poios sinais de
adição e cujo resultado era o numeral apresentado como ostímulo-modelo; identificava
uma moeda verdadeira equivalente a uma figura de moeda ou equivalente a um valor
monotário ditado: nomeava numerais, figuras de moedas e moedas: identificava um
numoral, não usado previamente no treino, correspondente à soma de numerais

Sobre Comportamento e CognlçAo 303


intercalados polo sinal de adição; e se identificava um numeral usado anteriormente no
treino em correspondência a uma “sentença" diferente. Uma outra quostão investigada
pela autora foi a de so os participantes, tendo sido treinados a estabelecerem a relação
que envolvo a adição de numerais poderiam, em tarefas de teste, selocionar moedas de
um conjunto, somar seus valores e assim construir uma combinação quo tivosse o valor
correspondente a um ostimulo-modolo • valor ditado, figura do moeda, moeda verdadeira
ou preço impresso. Após a realização do treino, a maior parle dos participantes apresentou
alto índice do omorgôncia na maioria das troze novas relações testadas, por outro lado, foi
identificada dificuldade na tarefa quo requeria a seleção de moodas para a construção de
uma rosposta equivalente a um valor.
Enquanto Rossit (2003) utilizou em sou ostudo numerais intorcalados pelo
sinal do adição e treinou a relação entre essa "sentença" o o seu resultado ou soma,
Araújo (2004) analisou habilidades envolvidas na rosolução da subtração. Três
participantes com deficiôncia mental, depois de uma avaliação inicial, participaram de
programa do onsino adaptado às peculiaridados do roportório de cada participante.
Para um dos participantes, foram treinadas as relações entre número falado e
conjunto com quantidade de estímulos o entre sentença falada e sentença com
conjuntos. Outro participante foi submetido ao treino das relações entre nome do sinal
falado o sinal impresso e entre nomo do sinal falado e palavra impressa ("menos").
Posteriormente, foi exposto ao treino da relação entre sentença falada e resultado em
algarismo e da relação entre sentença falada e resultado em conjunto. O torceiro
participante foi exposto ao treino da rolação entre sentença falada e sentença com
conjuntos, alóm do treino entre sentença com conjuntos e resultado em conjunto, com
valores de um a cinco. Ao final do estudo, foi aplicado um teste idôntico à avaliação
inicial, abarcando todas as relações trabalhadas durante o programa de ensino. Dois
participantes apresontaram aumento de respostas corretas para a maioria das relações
tostadas no pós-teste em comparação aos resultados da avaliação inicial, e o outro
participante obteve maior porcentagem de acertos em todas as relações.
O presente trabalho teve o objetivo de construir e testar, junto com crianças
pertencentos a famílias de baixa renda, um procedimento do onsino de habilidades
onvolvidas na solução de adições e subtraçõos, baseando-se no paradigma de
equivalência de ostímulos Para isto, um conjunto de objetivos específicos foi proposto:
a) avaliar se cada criança já apresentava algumas das habilidades que Prado (2001) o
Prado e Rose (1999) conceberam como componentes do conceito de númoro; b) troinar
a criança a responder diferencialmente aos sinais onvolvidos nas operações de adição
o subtração, om sentenças matemáticas; segundo Silva (1999), um dos pró-roquisitos
para uma criança responder a equações é o estabelecimonto de controlo discriminativo
prévio dos sinais gráficos e “="; c) treinar diretamente a habilidade do idontificar o
conjunto do figuras quo era o resultado de uma operação apresentada sob a forma de
sentença impressa em forma de conjuntos de figuras e observar se, após osso troino,
ocorroria a omergôncia da habilidade de identificar o algarismo que ora o rosultado da
sontença; o d) tostar a generalização da habilidade diretamente treinada, analisando se
a criança identificaria o conjunto de figuras que era o resultado de cada nova oporação
usada no teste A formulação desse teste foi baseada om um daqueles tostes aplicados
por Rossit (2003). Cada sentença foi constituída por um conjunto do figuras, seguido
pelo sinal gráfico de operação "+" ou um outro conjunto do figuras e o sinal de
igualdade “=". Tal estímulo foi adaptado da conta armada composta por conjuntos de
bolinhas, estímulo esse usado por Ifíosta (1980).
Foram empregados, como estímulos, números de um a nove falados pelo
experimentador à criança, conjuntos com essas diferentes quantidades de figuras

304 R.ifiicll.i Donini, D.inirl Pd Rcy, Nil/.i Míibclctto


impressas, os algarismos impressos correspondentes, sinais gráficos de operações
(“+" e e sentenças matemáticas.
A decisão de introduzir o ensino de operações com as sentenças compostas
por conjuntos de figuras teve o objetivo de permitir que a criança enfrentasse dificuldades
gradualmente escalonadas. Foi baseada: nos trabalhos de Resnick e cols. (1973) e
Irtesta (1980), nos quais foi proposto que o ensino da resolução de adição ou de
subtração começasse com a apresentação de quantidades de objetos e/ou de figuras
e que somente depois fossem introduzidas tarefas de operações com algarismos; na
suposição de Capovilla, César, Capovilla e Haydu (1997) de que o desempenho de
crianças em exercícios simples do adição e subtração melhora quando tais exercícios
são ilustrados por meio de figuras concretas: e pela suposição de que sentenças
compostas por figuras estariam mais próximas das experiências cotidianas vividas
pelas crianças de “juntar e tirar coisas" e seriam menos arbitrárias do que sentenças
compostas por algarismos.
Com a exceção das habilidades de nomeação, tanto as habilidades treinadas
como aquelas cuja emergência foi testada foram apresentadas às crianças em tarefas
de emparelhamento de acordo com o modolo (matching -lo - sample). O material foi
construído a de forma a permitir que a criança caminhasse no seu próprio ritmo,
progredindo segundo seus acertos o tendo a oportunidade de sanar suas dificuldades;
apresentasse respostas ativas e recebesse conseqüências imediatas.

MÉTODO

Participantes
Foram avaliadas vinte e três crianças de baixa renda, moradoras de um conjunto
Singapura ou uma favela, com idades variando entre sete e doze anos, que estudavam
em escolas públicas o que estavam cursando entre a primeira e a quarta séries do
ensino fundamental. As crianças foram selecionadas como participantes da pesquisa
por apresentarem erros na avaliação inicial de habilidades de resolução de adições e
subtrações e por mostrarem interesse em participar das atividades. O número de
participantes variou de fase para fase.

Local
Esta investigação foi conduzida em um ateliê de ensino, no qual ocorrem
atividades variadas, tais como: marcenaria, culinária, pintura, capoeira, teatro e atividades
de leitura, escrita ou relativas a habilidades matemáticas básicas. As crianças
permanecem no ateliê durante o turno oposto àquele que freqüentam a escola, e podem
escolher a atividade da qual irão participar. As atividades de matemática conduzidas
pelo experimentador na biblioteca do ateliê foram, portanto, uma das atividades entre as
quais as crianças poderiam escolher para fazer.

Material
Foram empregadas folhas sulfite brancas de tamanho A4, nas quais foram
impressos conjuntos de figuras, algarismos, sinais gráficos de operações “+", e
sentenças impressas de adição e de subtração em forma de conjuntos e sentenças
impressas em forma de algarismos. Ao longo das fases, foram usadas diferentes
figuras, tais como as de carrinhos, piões, etc. Nas tarefas de nomeação, o estimulo a
ser nomeado pela criança foi impresso no centro da folha. Já nas tarefas de

Sobre Comportamento c CotfniçAo 305


emparelhamento de acordo com o modelo, quando o estímulo-modelo foi visual/
impresso, foi apresentado na parte superior da folha, e quando o estímulo-modelo foi
auditivo/falado pelo experimentador, a parte superior da folha ficou vazia; os trôs
estímulos-comparação foram sempre apresentados na parte inferior da folha Foram
tambóm usados adesivos nas tarefas de emparelhamento de acordo com o modelo e
que envolveram habilidades treinadas diretamente, sendo que um adesivo foi colado
no verso da folha, na parte de trás de cada estímulo-comparação correto. A quantidade
de figuras e os numerais falados ou impressos variaram entre um e nove.

Procedimento
As atividades propostas foram conduzidas individualmonte com cada criança,
em sessões quo tiveram a duração de cerca de uma hora e foram feitas semanalmente
com cada participante.
Em cada tentativa de teste e de treino, após a apresentação do estimulo modelo
(quando falado este era apresentado pelo experimentador) a criança passava o dedo
embaixo do estímulo-modelo e dos estímulos-comparação, como uma resposta de
observação.
A seguir, são descritas características de cada fase.

Fase 1. Avaliação inicial e seleção de participantes


Essa fase consistiu em pedir para que as crianças resolvessom seis operações
do adição e seis de subtração, apresentadas sob a forma de sentenças impressas om
forma de algarismos em uma folha de papel. Tal avaliação foi planojada visando
selecionar crianças que não conseguissem resolver tais operações. Foram
selecionadas como participantes do estudo aquelas crianças que aprosentaram erros
de resolução destas operações.
Foi também realizada uma avaliação das habilidades que Prado (2001) e Prado
e Rose (1999) conceberam como componentes do conceito de número. As habilidades
testadas foram nomear a quantidade de figuras de um conjunto; nomear o algarismo;
identificar o conjunto que tivesse a quantidade de figuras correspondente ao número
falado previamente pelo experimentador; identificar o algarismo correspondente ao
número falado pelo experimontador; identificar o algarismo correspondente à quantidade
de figuras de um conjunto e vlve-versa. As respostas nesta fase não foram
consequenciadas.

Fase 2. Avaliação e treino da discriminação dos sinais M+" e


Para essa fase, foi planejada a avaliação do desempenho das crianças e, se
necessário, o treino da discriminação entre os sinais de adição e subtração. A habilidade
testada e treinada foi a de identificar, diante de uma sentença impressa composta por
figuras sem o sinal de operação e diante do estímulo auditivo fornocido pelo
experimentador, qual dos sinais impressos abaixo - o de adição ou o de subtração -
completaria corretamente aquela sentença e seria correspondente ao estimulo auditivo.
A escolha do estímulo-comparação era seguida pela apresentação de elogio
juntamente com a apresentação de um adesivo (smile) que a criança encontrava no
verso da página, atrás do estimulo comparação correto. Cada resposta incorreta foi
seguida imediatamente por modelo da resposta, fornecido pelo experimentador, naquela
mesma tentativa. O experimentador apontada para o estímulo-comparação correto, e

306 K»ifiU’llit Ponini, P.tniel Del Koy, Nil/.i Mirhclctlo


descrevia “este ô o sinal de mais /menos”. Em seguida, o participante era solicitado a
responder a uma nova tentativa sem dica. Após seis tentativas consecutivas sem dicas
e nas quais ocorressem somente acertos, a criança passava para o pós-teste envolvendo
essa habilidade.

Fase 3, Treino e teste de habilidades/relações envolvendo sentenças impressas de


adição e de subtração

Nesta fase, foi inicialmente aplicado o pré-teste das habilidades de: emparelhar
o conjunto de figuras que era o resultado de uma sentença impressa em forma de
conjuntos de figuras (GC): identificar a sentença impressa em forma de conjuntos de
figuras cujo resultado era a quantidade de figuras apresentada no conjunto modelo
(CG), idontificar o algarismo que era o resultado de uma sentença impressa em forma
do conjuntos (GB), o identificar a sentença impressa em forma de conjuntos cujo
resultado era o algarismo apresentado como ostlmulo-modelo (BG). As crianças que
apresentaram erros durante esse toste passaram para o treino direto da habilidade do
identificar o conjunto do figuras que era o resultado de uma sentença impressa em
forma de conjuntos (GC). A Figura 1 apresenta as relações que foram treinadas e testadas
durante esta fase.

Figura 1: Relações envolvendo adiçào e subtração que foram treinadas e testadas. As linhas
pontilhadas Indicam relações que foram testadas. As linhas contínuas indicam relações que foram,
além de testadas, treinadas. A ordem do treino está Indicada pelos numerais 1e 2. Cada flecha
aponta do estlmulo-modelo em direção ao estímulo-comparaçáo

O treino teve duas etapas, sendo que o procedimento nas duas foi idêntico: o
experimentador indicava à criança que ela poderia contar recitando os números ou
poderia riscar as figuras dos conjuntos, antes de indicar com o dedo o resultado correto.
Foram treinadas doze sentenças, divididas em quatro blocos. Os blocos foram
organizados por nível de dificuldade. Nos dois primeiros blocos, o segundo termo de
cada sentença foi um; o primeiro bloco abarcou apenas os valores de um a cinco; o a
partir do segundo bloco foram incluídos valores de seis a nove. As trôs sentenças
componentes de cada bloco foram randomizadas. Quando uma criança acertava as
trôs tentativas consecutivas envolvendo as trôs sentenças diferentes, ela passava para
o próximo bloco. Quando uma criança errava, o experimentador aplicava a tentativa de
retreino, que consistia na reapresentação da sentença e no fornecimento de um modelo
de resolução dado pelo pesquisador. A diferença entre as duas etapas do treino foi a de
que, na primeira, havia uma seta apontando para o estimulo comparação correto,
enquanto que, na segunda etapa, essa dica não foi apresentada.

Sobre Comportamento c CogniçAo 307


Depois do treino, foi feito o pós-teste da habilidade treinada, o teste de
generalização dessa habilidade com operações diferentes, e o teste de emergência
das outras habilidades previamente avaliadas durante o pró-teste. Depois de todas as
etapas descritas acima terem sido aplicadas com operações de adição, elas foram
aplicadas com oporações de subtração.
A seguir, as crianças foram treinadas a identificar a sentença de subtração
impressa em forma de conjuntos cujo resultado era a quantidado de figuras apresentada
no conjunto/estimulo-modelo (CG*). Essa habilidade foi treinada diretamente após terem
ocorrido erros em sou toste de emergência. Depois do treino e do pós-teste, foi feito um
teste de generalização envolvendo a mesma habilidade, e foi realizado o toste de
emergência da habilidade de identificar a sentença de subtração impressa em forma do
conjuntos cujo resultado era o algarismo apresentado como estlmulo-modelo (BG-).

Resultados
Vinte e três crianças participaram da primeira fase, na qual foram propostas
atividades para avaliar as habilidades de realizar operações do soma e subtração e
habilidades de estabelecer relações que Prado e de Rose (1999) conceberam como
componentes do conceito de número.
Na Figura 2, é apresentado o número de acertos nas tarefas de adição e
subtração aplicadas durante a avaliação inicial do repertório de crianças froqúentadoras
n r lm r t l i ''! o n i n r t l p / i f l n r

Adição

Subtração

IfiJ
I ff títíí! Í I II 2 11 I I I ts 6 g s
Parttclpantai
Figura l\ Numero de acertos nas operaçoes ae aaiçao e suotraçao, durante a avaliação
inicial, dos participantes de primeira a quarta séries do ensino fundamental.
Como é possível observar nas Figuras 2, o maior número de erros ocorreu com

308 R.iMI.1 Ponini, P.inirl Del Rcy, Nil/.i Mirhrlctlo


os participantes de primeira, segunda, e terceira séries. Dos doz participantes de quarta
série, apenas dois apresentaram erros, om operações de subtração. Todos os
participantes das outras séries apresentaram erros exceto dois da segunda série. A
maioria das crianças emitiu respostas corretas em todas as tarefas de adição. Dos
treze participantes que emitiram respostas incorretas durante essa avaliação inicial,
onzo comotorarn inversão do procedimento em tarefas de alguma operação: enquanto
que um participante resolveu adições usando procedimento de subtrair, os outros dez
solucionaram subtrações aplicando o procedimento de adicionar.
Buscando identificar se os erros emitidos por algumas crianças ao roalizar as
oporações propostas poderiam estar relacionados à necessidade de instalar um
repertório relacionado a habilidados onvolvidas no conceito do número (Rosnick e cols.,
1973; Irïesta, 1980; Silva, 1999; Prado o Rose, 1999 o Prado, 2001) tais habilidades
foram avaliadas. Todos os participantes emitiram respostas corrotas em todas as
tentativas que avaliavam estas habilidados testadas, não sendo necossário treiná-las.
Aponas trôs crianças que participaram da avaliação inicial emitiram respostas
incorretas durante o pré-toste de sinais o, portanto, foram submetidas ao treino dos
sinais (P1., P5 e P9). Durante o treino, nenhuma dessas crianças necessitou de mais
de trôs tentativas em que foi dado modelo da rosposta corrota para alcançar o critério do
término do treino ou nocessitou do mais do quo doze tentativas ao todo.
Das treze crianças que não resolveram corretamente as oporações propostas
na avaliação inicial, oito participaram dos testes que envolviam relações entre sentenças
improssas de adição e de subtração om forma de conjunto de figuras e de numerais,
conjunto de figuras e numerais._Quatro participantes de diferentes séries emitiram
somente rospostas corretas durante o pré-teste em que deveriam emparelhar sentenças
em quo oporações de soma o subtração eram apresentadas em forma de conjunto
com conjunto de figuras que ora resultado destas operações. Portanto não foram
oxpostos ao treino destas habilidades. Quatro outros participantes emitiram respostas
incorretas duranto o pré-toste: um desses participantes era aluno da primeira série,
dois oram alunos da segunda e um era aluno da terceira série.
Durante o pré-teste foram avaliadas tanto as relações que teriam sua emergência
posteriormente testada como também a relação que seria treinada entre sentença
impressa em forma de conjuntos e o resultado dessa operação apresentado sob a
forma de conjunto de figuras (GC) posteriormente ensinada. Nosta relação, uma
participante (P1) apresentou respostas incorretas em tentativas de adição; o uma (P5)
emitiu respostas incorretas em tentativas de subtração; dois (P6 e P9) apresentaram
rospostas incorretas om ambas.
Estes participantes foram, então, submetidos ao treino da habilidade do
identificar o conjunto de figuras que era o resultado de uma sentença impressa em
forma de conjuntos (GC). As quatro crianças emitiram respostas corretas em todas as
tentativas de adição e de subtração no pós-teste e no teste de generalização dessa
mesma habilidade.
Depois do treino da habilidade do idontificar o conjunto de figuras quo era o
resultado de uma sentença impressa em forma de conjuntos (GC), foi obsorvada a
eventual emergôncia de outras habilidades Nosse teste, voltaram apenas a ocorror
erros otn tentativas de subtração das habilidados do identificar a sentença impressa
em forma de conjuntos quo tinha como resultado a quantidade de figuras aprosontada
(CG) e identificar a sentença impressa em forma de conjuntos que tinha como resultado
o algarismo apresentado (BG). Por outro lado, foi possível observar uma melhora no

Sobre C omportiimcnto e 1‘oflniç.lo 309


desempenho de todas as outras habilidades testadas em cujas tentativas as crianças
apresentaram pelo menos um erro no pró-toste dessa fase e em cujas tentativas somente
ocorreram acertos no pós-teste. O número do acertos de cada criança nas relações
testadas no prè-teste e no pós-teste pode ser observado nas Figuras 3.

nn

n n

♦ GC- i;n * C!G- M i* (.'(}• DO* DO-

Figura 3: Númoro de acertos dos participantes nas relações de adição e de subtração


testadas antes o depois do treino da habilidade de identificar o conjunto do figuras que
ora o resultado do uma sentença impressa em forma de conjuntos (GC)

310 R<if«u*ll.i iHminí, D.micl Del Rey, Nil/.i Mtcbclcfto


Dado que, em comparação ao pró-teste, o número de erros apresentados
pelas quatro crianças permaneceu igual ou aumentou nas tarefas relativas ás
habilidades de identificar a sentonça de subtração impressa em forma de conjuntos
que tinha como resultado ou a quantidado de figuras ou o algarismo apresentado como
estlmulo-modelo (CG- e BG-), elas foram submetidas ao treino da relação entre conjunto
de figuras o operação de subtração apresentada em uma sentença improssa em forma
de conjunto (CG-)
Os quatro participantes emitiram respostas incorretas em duas das três
tentativas do pré-teste relativa à habilidade de identificar a sentença de subtração
impressa em forma de conjunto que tinha como resultado a quantidado do figuras
apresentada no conjunto/estimulo-modelo (CG-). Foi observado acerto na quase
totalidade dos testes de generalização envolvendo a mesma habilidade, mas com
operações diferentes daquelas usadas no treino, para três participantes..
Após o treino desta habilidade, os participantes foram expostos ao teste de
generalização envolvendo a mesma habilidade, mas com operações diferentes daquolas
usadas no treino, sondo que, para três crianças, foi observado acorto na quase totalidade
das tentativas. Posteriormente, foi aplicado o testo de emergência da habilidade do
identificar a sentença de subtração impressa em forma de conjunto que tinha como
resultado o algarismo aprosontado como estimulo-modelo (BG-) Nesto teste, dois dos
participantes acertaram todas as tentativas (P1 e P5) o dois orraram apenas uma das
seis tontativas avaliadas (P6 e P9). Deve destacar que, para o participanto 1, não somente
nas tentativas de treino corno também nas de teste posterior ao treino, foi dada a
instrução do que ele devêria fazer as continhas de "menos" tirando os piões que estavam
em um conjunto do outro conjunto, o que pode ter interferido nos rosultados.

DISCUSSÃO

O presente trabalho teve o objetivo de construir o tostar, junto com crianças


portoncentes a familias de baixa renda, urn procedimento do onsino do habilidades
envolvidas na solução de adições e subtraçõos, basoando-se no paradigma de
oquivalôncia de estímulos. Inicialmente buscou-se conhecer o repertório dos
participantos por meio da avaliação da habilidade de realizar operações de soma e
subtração. A maior ocorrência de erros observada em operações de subtração do que
em adição observada ó um dado que parece estar relacionado a uma maior
complexidade da subtração em comparação à adição; a suposição de essas duas
oporações terem diferentes graus de complexidade presumivelmente levou Resnick e
cols. (1973) e Silva (1999) a planejarem a aplicação de tarefas de adição antes de
tarefas semelhantes de subtração.
Esta avaliação se estendeu para outras habilidades pré-requisitos a estas
oporações. Entro as habilidades que são pré-requisitos para o ensino das habilidades
comploxas de adicionar o de subtrair, estão aquelas envolvendo o conceito de número
(Prado o Carmo, 2004) o a do responder diferencialmente aos sinais das oporações
(Silva, 1999). Tais habilidados, entretanto, não são suficientes, uma vez quo crianças
apresentaram erros de resolução das operações durante a avaliação inicial embora
elas tivessem domínio sobro as habilidados onvolvondo o conceito do número e embora
algumas delas tivessem domínio sobro a habilidade envolvendo os sinais.
É provável que, entre as outras habilidades que são pré-requisitos para o ensino
de adicionar e subtrair, existam mais algumas envolvendo a rolação entre os valores

SoUro Comportamento e Corçnivilo 311


numéricos o os sinais componentes da operação. No presente estudo, foi avaliada e,
quando necessário, treinada a habilidade de identificar o sinal correspondente a uma
palavra falada ("mais" ou "menos"); mesmo que em cada tentativa onvolvendo essa
habilidade tenha sido impressa uma sentença quo o sinal completaria, tal sentença
possivelmente não teve efeito sobre o comportamonto das crianças; os olomentos que
provavelmente exerceram controle sobre o comportamonto foram a palavra falada (“mais"
e "menos") e o sinal impresso isoladamente.
O troino da habilidade de identificar o conjunto do figuras que era o resultado de
uma sentença impressa em forma de conjuntos (GC) para então testar a omorgôncia
do novas habilidades sem treino diroto mostrou-se efetivo, uma vez quo as crianças não
apresentaram mais erros no pós-teste da habilidado treinada. Pareceu que se ostabelece
o controle descrito por Stoddard e colaboradoros (1987) " omparelhar estímulos com
baso em componentes individuais o então tratá-los como um todo unico" (p. 148). Foi
também observado um avanço no desempenho relativo a muitas habilidados cuja
emergência foi testada, o quo romote à vantagem identificada por autores do so obter
uma oconomia do tempo no ensino usando-se o paradigma do oquivalência de
estímulos (Araújo, 2004; Cuvo o Lynch, 1995; Gast, VanBiervIiet e Spradlin, 1979; Leader
e Barnes-Holmes, 2001; Prado, 2001; Prado e Rose, 1999; Rossit, 2003; Stoddard,
Bradley o Mcllvane, 1987).
Tendo ensinado a relacionar operações de soma e subtração na forma de
sentenças construídas com figuras com os correspondentes resultados dossas
operações também apresentados sob a forma de conjuntos do figuras, todos os
participantes responderam corretamente á relação em que o resultado/estímulo*
comparação foi um numeral, sem que isto tenha sido diretamento ensinado. Isto ocorreu
para ambas as operações. Cabe destacar que em todos os tostos antorioros ao treino
as respostas dos participantes foram, na maioria das tentativas, incorretas. Observou-
se, também, que eles responderam corretamente nas operações de soma quando a
relação se inverteu, ou seja, quando o modelo era o numeral o os ostimulos comparação
oram as sentenças compostas de conjuntos de figuras. Entretanto, rosponder a tentativas
do subtração em quo esta relação foi invertida não emergiu sem treino, o quo lovou a
propor um troino em que mais uma relação foi treinada e então a outra foi testada.
As respostas incorretas emitidas pelas quatro crianças no pós-teste das
habilidades de identificar a sentença de subtração impressa em forma de conjunto que
tinha como resultado a quantidade de figuras apresentada no conjunto/estímulo-modelo
(CG-) e identificar a sentença de subtração improssa om forma do conjunto que tinha
como resultado o algarismo apresentado como estímulo-modelo (BG>) podem ser
parcialmente justificadas pelo maior grau de dificuldado onvolvido nas tarefas om questão,
quando comparado ao grau de dificuldade das outras tarefas. Nas tarofas relativas a
essas duas habilidades om que continuaram ocorrendo orros durante o pós-teste, além
da maior complexidade da subtração comparativamente à subtração, houve
prosumivolmonte uma dificuldado adicional: a criança poderia tor quo rosolvor de uma a
trôs oporações aprosentadas como ostimulos-comparação, até chogar àquola cujo
resultado fosse o conjunto ou algarismo aprosontado como estimulo-modolo; a domanda
de rosolvor mais de uma operação aumentou a cadeia do respostas, quando comparado
àquela cadoia exigida nas tarofas om quo nocessariamente apenas uma operação toria
que ser resolvida, isto é, aquela operaçào apresentada como estímulo-modelo.
Após o troino direto da habilidade de identificar a sentença de subtração
improssa om forma do conjunto quo tinha como resultado a quantidade do figuras
apresentada no conjunto/ostimulo-modelo (CG-), houvo aumento número de acertos

312 Ucif.iell.i Poiiinl, P.inlcl Prl Rey. Nil/.i Michrlrttn


no teste emergente para trôs crianças. Os resultados indicam a maior necessidade de
treino para o estabelecimento destas relações.
Os resultados obtidos com estes participantes indicam a necessidade de ampliar
estudos que investigam os controles de estímulos que se estabelecem na realização de
operações matemáticas. Como indicam Ferster e Hammer, Jr. (1966), apesar dos
comportamentos componentes de um repertório aritmético envolverem um número
pequeno de símbolos, as maneiras complexas em que eles podem ser arranjados, e os
estímulos adicionais, tais como a posição de dígitos [entre outros], determinam as
respostas que serão reforçadas. Investigações quo identifiquem e descrevam as diferentes
possibilidades destes controles podem dar condições a educadores de planejar condições
de ensino adequadas às necessidades de cada aprendiz.

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314 R.ifiiclla Ponini, Punicl Pci Rcy, NHai Micliclctto


Capítulo 27
O desenvolvimento sócio-emocional nos
primeiros anos de vida e as
contingências em operação na
interação pais-criança
Patrícia Alvarcnfld
Universidade Federal da Hahia

Na perspectiva da Análise do Comportamento, a compreensão das mudanças


que ocorrem ao longo do desenvolvimonto de um indivíduo requer o exame das
contingências filogenéticas, ontogenéticas e culturais que operaram na sua história.
Abordar o desenvolvimento sócio-emocional, portanto, significa tratar da aquisição e
das modificações em repertórios comportamentals ligados à interação do indivíduo
com o seu ambiente social e com ele mesmo, como a assertividade, afetividade, empatia,
cooperação, auto-regulação e auto-conhecimento, entre outros. Este trabalho discute
algumas idéias relacionadas à socialização infantil que ocorre no contexto familiar,
enfatizando as contribuições do modelo de seleção por conseqüências para a
compreensão desse processo.
According to Behavior Analysis perspective, comprehension about the changes
that occur through the development of an individual requires the study of phylogenic,
ontogenetic and cultural contingencies on his own history. Approaching to social and
emotional development, therefore, means to understand the acquisition and modification
in behavior repertories related to the interaction of the individual with his social environment
and with himself, such as assertiveness, affection, empathy, cooperation, self-regulation
and self-conscience, among others. This paper discusses some ideas related to child
socialization that occurs In the family environment, emphasizing contributions of the
selection by consequences model to the comprehension of this process.
O desenvolvimento sócio-emocional na primeira infância tem recebido atenção
de teóricos e pesquisadores de diferentes abordagens na Psicologia por suas
importantes implicações no funcionamento do indivíduo em diversos contextos. Na
perspectiva da Análise do Comportamento, a compreensão das mudanças que ocorrem
ao longo do desenvolvimento de um indivíduo requer o exame das contingências
filogenéticas, ontogenéticas e culturais que operaram na sua história. A proposta da
Análise do Comportamento para a compreensão do desenvolvimento humano, portanto,
não descreve estágios ou fases. Para o Behaviorismo, o que se desenvolve junto com
o organismo biologicamente constituído, e respeitando esses limites, é um repertório
comportamental, produto da interação do organismo com seu ambiente. Nas palavras

Sobro Comport.imcnto c CoRniç.lo 315


de Skinner (1974/1993, p.60) "Diz-se que o comportamento de uma pessoa ou cultura
passa por vários estágios até atingir a maturidade (...)• Conforme sugerem esses
exemplos, diz-se que aquilo que cresce ó algo que pertence à mente, como em Piaget,
ou à personalidade, como em Freud. Mas se uma criança não se comporta mais como
se comportava no ano anterior, não ó só porque cresceu, mas também porque teve
tempo de adquirir um repertório bem mais amplo à mercô da exposição a novas
contingências de reforço e, particularmente, porque as contingências que afetam as
crianças em diferentes idades são diversas. O mundo infantil se "desenvolve" também".
Assim, na perspectiva da Análise do Comportamento, abordar o desenvolvimento
sóciO‘ emoclonal significa tratar da aquisição e das modificações em repertórios
comportamentais ligados á interação do indivíduo com o seu ambiente social e com ele
mesmo (ver Catania 1999; Skinner 1974/1993; Skinner, 1991). Desta forma, estaremos
tratando de repertórios comportamentais relacionados à assertividade, afetividade,
empatia, cooperação, auto-regulação e auto-conhecimento, entre outros.
A assertividade permitirá á criança negociar sua independência no contexto das
expectativas e exigências do mundo social. Ela pode ser definida como a habilidade de
atingir os próprios objetivos, sem violar a integridade dos objetivos do outro (Crockenberg
& Litman, 1990). É a capacidade de defender os próprios direitos o de expressar
pensamentos, sentimentos e crenças de forma honesta, direta e apropriada, sem violar
os direitos da outra pessoa (Falcone, 2001). Em termos operacionais a assertividade
se expressa quando a criança, por meio de gestos ou palavras, revela sentimentos,
preferências ou pontos de vista, sem demonstrar hostilidade, comportamento agressivo
ou desafiador. Por exemplo, a criança diz o que deseja fazer, ou responde dizendo "não"
ou "eu não quero", a um comando, pedido ou sugestão de outra pessoa, ou ainda
quando a criança tenta negociar o comando ou pedido em questão. É em torno dos 2
anos de idade que a criança começa a desenvolver o comportamento assertivo e uma
das aquisições mais importantes para o desenvolvimento desta habilidade é a
capacidade de dizer "não".
A empatia pode ser definida como a capacidade de compreender e de expressar
compreensão acurada sobre a perspectiva e sentimentos de outra pessoa, além de
experimentar sentimentos de compaixão e de interesse pelo seu bem estar (Falcone,
2001). Nesse sentido, a empatia expressa uma resposta emocional à situação da outra
pessoa. Assim, quando uma criança sente-se triste quando outra está triste, ou alegre
quando outra está alegre, ela está manifestando empatia, e pode então, ter ações que
envolvem prestar auxilio ou demonstrar compreensão ao outro (Schaffer, 1996). A empatia
requer discriminações de propriedades do comportamento dos outros indivíduos (Catania,
1999) e respostas especificas de auxilio, proteção ou cuidado. Segundo Hay (1994),
indícios desses aspectos da conduta são visíveis a partir do segundo ano de vida.
Outro indicador importante do desenvolvimento social na infância é a obediência,
considerada um preditor de cooperação em etapas posteriores do desenvolvimento. O
comportamento da criança é considerado obediente quando se segue e é congruente a
um pedido ou ordem (Crockenberg & Litman, 1990). Maccoby (1966) enfatizou a
necessidade da aquisição da obediência como o primeiro passo no processo de
socialização. Ela argumentou que crianças que não tinham habilidade de obedecer
estavam em desvantagem para aprender as habilidades sociais essenciais para o sucesso
na escola e para a construção de relações com os pares. Para Patterson, Reid e Dishion
(1992), não atingir um nlvel adequado de obediência coloca a criança em risco de
desenvolver déficits de competência social, bem como de apresentar condutas anti-sociais.
A obediência é considerada um sinal de maturidade crescente e é um dos objetivos da

316 P.itilcia Alv.ireiitf.i


socialização durante a infância (Crockenborg & Litman. 1990). No ontanto, ó importante
diferenciar a obediência que é produto da compreensão e concordância com o que é
solicitado, da obediência baseada no medo e na coerção (Kochanska, 2002).
A auto-regulação e o auto-conhecimento estão bastante relacionados e envolvem
o desenvolvimento de repertórios semelhantes. O auto-conhecimento, sogundo Skinner
(1974/1993; 1991), está relacionado à capacidade de descrover contingências que
envolvem o próprio comportamento. Nesse sentido, o auto-conhecimento está
rolacionado ao comportamonto verbal e tem origem social. A auto-regulação foi definida
por Kopp (1982) como a habilidade de iniciar ou cessar atividades de acordo com
exigências situacionais; de modular a intensidade, freqüência o duração de atos verbais
o motoros em contoxtos sociais e educacionais; de adiar objetivos e desejos conforme
necessidados impostas e do gorar comportamento socialmente aprovado na ausência
do monitoramento externo. A relação entre os dois tipos de repertório pode ser
compreendida a partir desta afirmação do Skinner (1974/1993, p.31): "O
autoconhecimento ó de origem social. Só quando o mundo privado de uma pessoa se
torna importante para as demais é que elo se torna importante para ela própria (...) Mas
o autoconhocimento tem uma valor especial para o próprio indivíduo. Uma pessoa que
se "tornou consciente de si mesma" por meio de perguntas que lho foram feitas está em
melhor posição de prever e controlar seu próprio comportamento". Assim, o auto-
conhecimento seria uma importante aquisição para a capacidade de auto-regulação ou
auto-controle (Skinner, 1953/1994). Na medida em que a criança é capaz de descrever
as relações entre os contextos, suas respostas (sejam elas sentimentos, pensamentos
ou ações) e as conseqüências que elas produzem, ela poderá ficar sob controle dessas
descrições, e assim, regular seu próprio comportamento com maior autonomia.
Além desses indicadores específicos, alguns autores argumentam que a
habilidade da criança de engajar-se em interações sociais de forma positiva com os
pais, incluindo gestos, vocalizações, olhares e demonstrações de afeto positivo, são
importantes sinalizadores de um desenvolvimento social apropriado. Para Landry, Smith,
Swank, Assei e Vellot (2001), esses comportamentos podem ser observados a partir
dos 6 meses de vida e utilizados como indicadores do desenvolvimento social da criança.
Como se pode perceber pelos conceitos discutidos até aqui, boa parte do
repertório comportamental que indica um desenvolvimento sócio-emocional pleno nos
primeiros anos da infância está relacionado a responder adequadamente a demandas
dos contextos sociais. Contudo, o desenvolvimento sócio-emocional não deve ser
considerado como a mora adequação do comportamento da criança a normas e
expectativas sociais. Ao se comportar de forma assertiva, afetiva, empática ou cooperativa,
a criança deve estar gerando conseqüências positivamente reforçadoras (e
conseqüentemente sentimentos positivos) não só para os outros, mas também para si
própria. Do mesmo modo, em determinados contoxtos, comportamentos considerados
socialmente inadequados podem estar desempenhando uma função importante na
interação da criança com seu ambiente, e dosse modo, não deveriam ser punidos ou
colocados em oxtinção. Muitas vezes, nesse tipo de situação, é mais importante reforçar
o comportamento, no sentido de deixar que ele ocorra, compreender sua função, e
esperar o momento certo de exigir uma conduta mais adequada da criança. Um exemplo
típico dosso tipo de situação é a ocorrência de comportamentos chamados "regressivos"
durante um período de hospitalização (ex. a criança quer ficar o tempo todo no colo,
chora ou choraminga com muita freqüência e solicita a presença o o contato físico com
os pais constantomente). Diante do caráter extremamente aversivo da situação, os
comportamentos "regressivos" da criança devem ser positivamente reforçados pelos

Sobre Comportamento e C ormí(<1o 317


pais, com carinho, apoio o suporto físico o emocional. Não se deve esperar a ocorrência
de comportamentos supostamente mais adoquados que pudessem ser reforçados
em tal contexto. Outro exemplo desse tipo de situação ó ilustrado pelo caso abaixo:
Caso 1
Os pais de Diego haviam se separado rocentomonte. O pai do monino havia
esquecido na casa uma touca do lã que usava para andar do moto nos dias frios (um
tipo do touca que cobro todo o rosto, e que possui aberturas aponas nos olhos e no
nariz). Em um dia quente do verão Diego queria ir brincar no play com a touca. Sua mãe
explicou-lho que estava muito quente para usar uma touca de lã, que os outros meninos
iam achar estranho, mas Diego insistia em ficar com ela
Mãe: "Eu sabia quo elo ia sentir calor, que as mãos o as crianças no play iam
estranhar, iam ponsar 'que mãe louca que deixa a criança sair desse jeito’. Mas ou entondi
que elo tava sentindo a falta do pai o que naquele momento era importante olo podor ficar
com a touca. Então dei bastante água pra ele ficar hidratado e deixei elo brincar assim
mesmo. Eu via o suor escorrer pelo pescoço dele, mas acho que eu fiz o quo era molhor."
O rolato da mão demonstra a sua sensibilidade ao reconhecer a função do
comportamonto do monino om um contexto de perda e privação. Nesse contexto, ao deixar
que a criança brincasse utilizando a touca do pai, a mãe mostra ao filho que compreende o
que ele está sentindo, e quo ele pode sentir saudades do pai, ou soja, suas rospostas não
serão punidas em favor de convenções sociais do tipo "não so usa touca om dias quentes".
Outro aspecto a ser lembrado na análise do desenvolvimento sócio-emocional
infantil ó a necessidade de evitar explicações mentalistas ou intemalistas, como "ele bate e
morde os amigos porque tem o mesmo temperamento agressivo do pai". Ao tentarmos
compreender o quo torna uma criança amável, alegre e espontânea, ou o que a torna
excessivamente retraída ou timida, devemos buscar as variáveis explicativas exclusivamente
em sua história genética e ambiental. Nesse sentido, o modelo de seleção por
conseqüências nos oferece o reforencial conceituai e metodológico necessário.
Em se tratando do desenvolvimento sócio-emocional na primeira infância, torna-
se particularmente importante compreender as relações da criança com seus pais ou
cuidadores. Inicialmente devemos considerar algumas importantes implicações da
filogênese para esta interação. Para a Análise do Comportamonto, o organismo ao
nascer já traz um repertório comportamental inato, formado por uma série de
rospondentes e padrões fixos de ação (Baum, 1999; Catania, 1999; Skinner, 1974/
1993), assim como operantes e respondentes condicionados, quo já teriam sido
adquiridos durante a história de reforçamento no periodo pré-natal (Porosa, 2001).
Assim, é possível falar em uma “fonte primária de respostas, uma matéria prima
relativamente amorfa, pronta para receber seus traços característicos ao entrar em
contato com o efeito selecionador do ambiente" (Carvalho Neto & Tourinho, 1999, p.50).
Além disso, para a criança, o sorriso dos pais, sua voz, cheiro e contato físico são
roforçadores primários poderosos. Inúmeras investigações têm demonstrado que bebês
recém-nascidos reconhecem e proferem a voz matema (Porosa, 2001). Além de serem
reforçadoros primários, a voz o sorriso o o contato físico são reforçadores de liberação
rápida e saciação lenta, características que aumentam o seu potencial como estímulos
reforçadores. Para Baum (1999) uma das razões para que esses reforçadores tenham
so estabelecido filogenoticamente, é a possibilidade de os filhos aprenderem com os
pais, e isso representar um adicional em termos de aptidão.
Por outro lado, o choro e o sorriso do bebê, bem como as vocalizações que ele
é capaz de emitir, constituem poderosos reforçadoros primários, filogeneticamente
estabelecidos, para o comportamento dos pais. Segundo Baum (1999) não há

318 Piilrki.i Alv.ircnflii


considoraçõos sobre saúde individual dos pais ou sobre sua sobrevivência que oxplique
porque o sorriso ou o choro dos filhos deveriam afetá-los tão intensamente. No entanto,
o comportamento de cuidar de um filho, está diretamente relacionado com a
sobrevivência de genes, e um pacote de genes que inclua a tendência a produzir esse
ofeito goralmento prosperaria.
Essas noções nos permitem afirmar que as características sócio-emocionais
de um indivíduo, no nivel da ontogônese, começam a ser modeladas precocemonte Por
exemplo, um bebê ao nascer apresenta uma ampla variabilidade comportamontal: elo se
movimonta, vocaliza, chora, olha, agarra, suga, boceja, sorri, orienta a cabeça em direção
a ostimulos visuais e sonoros, se aconchega no colo, etc. Suponhamos que esse bebo
tonha uma mãe deprimida, quo discrimine apenas os sinais mais extremos do desconforto
do bebê, como por exemplo, o choro. Esta mãe não responde (não reforça) ás vocalizações,
os sorrisos, nem os olhares do seu filho. Ela só apresenta respostas do cuidar, embalar
ou falar com o bebê, quando ele está chorando. A partir deste padrão de interação nos
primeiros meses de vida, seria possívol prover uma gradual redução na freqüência dos
comportamentos do vocalizar, sorrir e olhar para a mão, por exemplo, o paralelamente,
um aumento gradual na freqüência do choro. Se essas fossem as principais contingências
no ambiente da criança em seus primeiros anos de vida, ela provavelmente seria descrita
como uma criança "chorona", mal-humorada, irritada ou insegura.
Nesse sentido, alguns estudos indicam que o nivel de rosponsividado dos pais ao
comportamonto dos seus bebês nos primeiros meses do vida, soria um forte preditor não
só do tipo e da eficácia das práticas de criação que seriam empregadas no futuro, mas
também das características comportamentais da criança. Pais menos hábeis e com menos
disponibilidade emocional para perceber os sinais de seus bebês e responder
adequadamente a eles, tenderiam a apresentar maior dificuldade de regular o
comportamento de seus filhos no futuro, empregando com maior freqüência práticas
coercitivas, severas o pouco eficazes. Esse tipo de manejo reforçaria os comportamentos
inadequados ou aversivos da criança e exigiria dos pais práticas progressivamente mais
coercitivas e severas, configurando um padrão coercitivo de interação familiar, que a literatura
demonstra estar relacionado, por exemplo, ao comportamento agressivo, oposicionista e
dosafiador. Por outro lado, pais mais sensíveis ao comportamonto de seus bebês, tenderiam
a ser mais hábeis na regulação do comportamento dos filhos em etapas posteriores do
desenvolvimento, revelando maior capacidado do utilizar estratégias assertivas, contingentes
o roforçadoras. Esse padrão, por sua vez, favoreceria o desenvolvimento sócio-emocional
(Patterson & cols., 1992; Patterson, De Garmo & Knutson, 2000).
Por fim, junto às contingências filogenóticas e ontogenóticas, a interação pais-
criança também sofre a ação de contingências culturais. Considerando o controle por
regras, é importante destacar o papol das crenças sobre a criação de filhos,
compartilhadas pelo grupo social, como importantes antecedentes para o
comportamento parental (ex. "para educar uma criança é preciso dar umas palmadas
do vez em quando"; "criança não tem vontade, não tem quererj’, etc.). No nivel operante,
pais quo se comportam de acordo com tais regras, tendem a ser reforçados pelo grupo
social e evitar punições.
A seguir alguns casos são apresentados para ilustrar contingências nas quais
os pais estão modelando nos filhos comportamentos relacionados à assertividade,
agrossividade, medo, entre outros.
O caso descrito a seguir ilustra o impacto dos reforçadores provenientes do
comportamonto parental no desenvolvimento infantil:

Sobic l omporfiimcnlo c (.'oflnM» 319


Caso 2
A mãe de Tiago, 5 anos, que participava de um grupo de pais de crianças com
problemas de externalização (agressividade, comportamonto desafiador e oposicionista,
dificuldade com regras, etc.), havia assinalado no Inventário de Comportamentos da
Infância e da Adolescência (CBCL), que o filho ouvia vozos que não existiam com muita
freqüência. Quando solicitada a descrever melhor a situação, a mãe disso à terapeuta:
Mãe: Eu não chamei elo nem nada, e ele chega e diz: “mãe, você mo chamou?"
Durante as sessões do grupo, a mãe de Tiago expressava muita raiva e revolta ao falar
do filho e da sua condição de mãe jovem e solteira, com tantas responsabilidades, "presa em
casa". A raiva quo ela demonstrava no grupo, era um indicio de como ela se comportava diante
do filho. A mãe confirmou ainda quo quando estava em casa interagia muito pouco com Tiago e
quo "tinha vontade de sumir'1. Ela morava no interior do Rio Grande do Sul e pensava em mudar-
se para Porto Alegre. Se fizesse Isso, efa deixaria os filhos no interior com a avó.
A análise funcional dessas informações nos permite compreender que Tiago
estava vivendo em um contexto de privação da atenção, afeto e cuidados maternos.
Além disso, a mãe lhe fornecia uma série de estímulos aversivos condicionados que
sinalizavam um possivel abandono (ex. "não agüento mais essa vida", “eu queria sumir").
A resposta de Tiago, de ouvir o chamado materno, na ausência do comportamento da
mãe, obviamente não se tratava de uma alucinação auditiva. Seu comportamento parece
uma tentativa de buscar o reforço que não estava disponível. O menino fornecia um
estimulo discriminativo verbal para que a mãe se comportasse em relação a ele. No
entanto, suas tentativas não eram reforçadas. Como a mãe não era capaz de compreender
a função deste comportamento do filho, bem como não dispunha de suporte emocional
e apoio para se comportar de forma mais afetiva e sensivel em relação ao menino, sua
resposta à pergunta de Tiago costumava ser: “eu não te chamei". Após a análise funcional
desta situação no grupo, a màe conseguiu abraçar o filho o dizer a ele quo embora às
vezes dissesse que queria mudar-se para Porto Alogre, ela não faria isso, e que só dizia
aquilo porque às vezes sentia-se cansada ou triste.
O próximo exemplo também envolve uma diade que participava do grupo de
pais e mostra como as mudanças no comportamento da criança podem ser explicadas
pelas noções de controle de estímulos, embora pela mãe fossem atribuidas a variáveis
internas, como a "instabilidade de humor" e o temperamento:

Caso 3
Lucas tem 8 anos. Sua mãe o descreve como um menino temperamental, de
personalidade forte, birrento e agressivo. Ela queixa-se que todo dia quando ela chega
em casa do trabalho é a mesma cena: "Emburrado, sai batendo porta, e diz que não
agüenta mais essa casa."
Terapeuta: Quando você chega em casa, o que costuma fazer? Como é a rotina
de vocês nesse horário?
Mãe: Mas eu não faço nada. Eu chego e elo já tá assim, de mal com a vida. Ai eu
nem chego perto.
A mãe trabalhava o dia todo. Ao chegar em casa, fazia tarefas domésticas, para
as quais solicitava a ajuda do menino (ex. comprar pão) e cobrava a lição de casa
(contexto aversívo para o menino). Lucas costumava reagir com resmungos e palavrões
ou ficando emburrado ou irritado (fuga). A mãe, então, optava por fazer as tarofas sozinha
o susponder as cobranças sobro a oscola (roforçamonto nogativo). A oxposição a osso
tipo de contingência diariamente, fez com que Lucas desenvolvesse respostas de

320 P.ilrlci.i Alv.ircnfl.i


esquiva, ou seja, ele evitava as solicitações e cobranças da mãe, tendo a "crise" no
momento de sua chegada (estimulo aversivo condicionado). As respostas de esquiva
também eram reforçadas negativamente pela mãe: "Eu nem chego perto".
As trôs situações descritas a seguir ocorreram durante a filmagem de um almoço
realizada na residôncia de famílias*que participaram de um estudo longitudinal intitulado
“Estudo Longitudinal de Porto Alegre: Da Gestação à Escola" (Piccinini, Tudgo, Lopes &
Sperb, 1998; ver Alvarenga, 2004 e Alvarenga & Piccinini, 2006). O contexto de alimentação
ó bastante rico para a análise do desenvolvimento sócio-emocional infantil e da interação
pais-criança, pois nesse contexto conflitos maiores ou menores costumam acontecer,
e ó possível analisar tanto os comportamentos da criança, como os comportamentos
dos pais ao lidarem com essas situações.

Caso 4
Gabriela tom 2 anos e meio. Está sentada à mesa o sua mãe serve o seu
prato:
Gabriela: "Bota batata, bota carne. Não quero beterraba."
Mãe: "Então escolhe cenoura ou alface..."
Gabriela: “A cenoura tá estragada. Me dá alface."
Mãe: (sorve alface)
Gabriela se comporta de forma assertiva ao dizer à mãe o que quer o o que não
quor comer. A máe reforça o comportamento assortivo, oferecondo à filha outras alternativas.
Gabriela entáo escolhe a alface (novo comportamento assertivo) e novamente ó reforçada
pela mãe. Au reforçar as respostas de escolher os alimentos, a mãe de Gabriela não está
fortalecendo apenas essas respostas específicas, ela está fortalecendo uma classe do
respostas: escolher, decidir, expressar suas preferências e opiniões.

Caso 5
Pedro tem 2 anos e meio. Está sentado à mosa e sua mão servo seu prato.
Pedro: "Não quero salada!"
Mãe (colocando a salada no prato): Tem que comer, (em tom hostil)
Pedro (empurra o prato com força): Não vou comer." (em tom agressivo)
Mãe: "Então vai pro teu quarto."
Pedro apresenta um comportamento assertivo ao dizer que não quer salada. A
mãe não reforça o comportamento assertivo, ela pune positivamente o comportamento da
criança. Diante da situação aversiva, Pedro emite uma resposta agressiva de fuga, e ó
reforçado negativamente pela mãe. Ao punir a resposta assertiva e reforçar negativamente
a resposta agressiva de Pedro, a mãe não está fortalecendo apenas essa resposta específica,
ela está fortalecendo uma classe de respostas: agredir para evitar situações aversivas.
A literatura mostra que este tipo de contingência, em que um comportamonto
assertivo da criança ó conseqüenciado pelos pais com punição ou colocado em extinção,
costuma ser seguido por um comportamento desafiador ou oposicionista da criança.
De acordo com Crockenberg e Littman (1990) o comportamento desafiador da criança
fica relacionado ao uso de comandos ou outras estratégias maternas assertivas de
controle quando estas ocorrem após uma recusa assertiva da criança (ex. dizer não a
uma solicitação materna). Por exemplo, a mãe insiste em um comando direto ("tem que
comer"), mesmo após a criança ter manifestado assertivamente a sua recusa em

Sobre C'om|H)r1.imento e CojjniçJo 321


comportar-se da forma solicitada. Nesse contexto, a criança estaria menos propensa a
obedecer ou cooperar e mais propensa a demonstrar comportamento desafiador, porque
a mãe estaria sinalizando sua não disponibilidade para negociar, explicar a situação ou
compreender o ponto de vista do filho. Assim, ó provável que nesse tipo de situação a
criança opte por repetir a recusa, ignorar a solicitação da mãe ou desafiá-la.

Caso 6
Os pais de Rodrigo conversam entusiasmados durante o almoço. A mãe conta
ao marido uma história engraçada. Os dois falam, dão risadas, se olham. Rodrigo, que
tambóm está sentado á mesa, conhece a história que a mãe está contando e tenta contar
o que ele viu. Os pais parecem não ouvir o menino. Continuam conversando. Após trôs ou
quatro tentativas de participar da conversa. Rodrigo começa a puxar a blusa para cima,
depois morde as mangas, faz barulhos, mexe nos objetos que estão sobre a mesa, se
sacode na cadeira, e finalmente derruba um copo com suco. Nesse momento os pais
intorrompem a conversa e repreendem o menino, perguntam por que ele fez aquilo, etc.
Nesta situação, as tentativas de Rodrigo de participar assertivamonte da interação foram
colocadas em extinção pelos pais. A variabilidade comportamental do menino, que
provavelmente já deveria ter sido exposta a contingências semelhantes, permitiu quo ole
emitisse respostas alternativas, no caso, comportamentos inadequados. Alguns deles
não foram reforçados, mas quando ele finalmente sujou a toalha, conseguiu obter reforço.
O próximo exemplo traz o relato de uma observação da Interação mãe-pai-
criança, realizada em um laboratório mobiliado com duas cadeiras um tapete, almofadas
o alguns brinquedos. Os pais eram solicitados a brincar com a criança da forma como
costumavam fazer em seu cotidiano. Este procedimento também fez parte do estudo
longitudinal anteriormente mencionado (Piccinini, Tudge, Lopes & Sperb, 1998).

Caso 7
Julia ó descrita por sua mãe como uma criança medrosa,
Mãe: “Ela tem medo de tudo. Não quer ficar sozinha. Fica agarrada com a gente
em qualquer lugar. A noite quer dormir na cama conosco"
Durante a interação foi possível notar que diante de vários comportamentos
exploratórios de Julia (mexer nos objetos, tentar subir na cadeira), os pais verbalizavam:
"Olha que a Malvina Cruela vai te pegar." (Malvina Cruela ó a vilà do filme infantil “Os
Dálmatas"). Diante da verbalização dos pais, Julia corria em direção a eles, que abraçavam
e afagavam a menina. Para os pais, o comportamento da menina de se afastar e
explorar o ambiente era aversivo (possivelmente por estar associado a perigo). As
respostas de fuga-esquiva dos pais, de assustá-la, eram reforçadas negativamento por
seu retorno. A menina era reforçada, tanto negativamente por evitar um suposto perigo,
como positivamente, pela reação calorosa dos pais. Nesta situação Julia não está
apenas aprendendo a correr para os pais quando “a Malvina Cruela está por perto". Ela
está aprendendo que o mundo é ameaçador e cruel, e que apenas perto de seus pais
ela estará em segurança.
O último caso relatado a seguir mostra uma situação extrema, de uma criança
que estava apresentando comportamentos auto-lesivos:

Caso 8
A mãe rolata não compreender a conduta do filho, Fabio, de cinco anos, com graves
problemas de externalização, que segundo a mãe, além das travessuras habituais,

3 n Patrício Alviircntfii
ultimamente vinha se envolvendo em situações perigosas (mexer na tomada, jogar-se na
fronte de um carro em movimento e tomar um vidro de remédio). A observação da interação
da mãe com a criança durante o brinquedo livre e em uma situação estruturada, e os dados
de entrevistas com a mãe, deram indícios de que ela costumava ignorar os comportamentos
adequados do menino (extinção) e eventualmente reforçar seus comportamentos
Inadequados. É importante salientar que a avaliação do quoeficiente intelectual da criança
através do teste WPPSI nâo revelou nenhum comprometimento cognitivo.
Mãe: Ele perdeu os dois dedos (mexendo na tomada). Mexeu, que ele perdeu
os dois dedos na tomada. Ai esses dias, faz pouco isso aí. Acho que não faz nem um
môs, ele mexeu de novo na tomada, E até se queimou aqui na ponta da mão.
Entrevistadora: E o que você fez quando isso aconteceu?
Mãe: Fiquei desesperada (...). Saí correndo desesperada com ele no colo (...).
Dei umas palmadas, nó (...). Porque ele tem 5 anos, ele entende.
A privação do reforço em que a criança se encontrava habitualmente, já que a
mãe não costuma ser responsiva, fez com que as repreensões e castigos fossem,
possivelmente, reforçadores para os comportamentos inadequados. Poderíamos então,
levantar a hipótese de que em alguma dessas travessuras a criança tenha
acidentalmente se machucado ou se arriscado de alguma forma e quo, em função
disso, tenha recebido da mãe não só a atenção usual na forma de repreensões ou
castigos, mas também consolo, carinho, preocupação. Isso explicaria o aumento na
freqüência de comportamentos de envolver-se em situações perigosas ou ferir-so.
Os casos descritos ilustram a importância das contingências em operação na
intoração pais-criança para o desenvolvimento sócio-emocional dos filhos. Em situações
simples e sutis do cotidiano das famílias, as crianças estão se comportando e sofrendo a
açáo das conseqüências produzidas polo seu comportamento, no comportamento dos
seus pais ou cuidadores (babás, avós, etc.). Da mesma forma, as estratégias utilizadas
pelos pais para lidar com conflitos do dia-a-dia estão ao mesmo tempo ensinando às
crianças, e sondo modeladas pelas conseqüências geradas no comportamento dos filhos.
Assim, é fundamental que sejam desenvolvidas estratégias de intervenção
direcionadas para o desenvolvimento do repertório parental para compreender e lidar
com o comportamento dos filhos nesses contextos do cotidiano. A base dessas
estratégias deve ser a análise funcional, que junto a outras tócnicas e procedimentos
terapêuticos, deverá tornar os pais mais sensíveis aos estímulos discriminativos
fornecidos pelo comportamento dos filhos que indicam necessidade de mais carinho e
atenção, medo, fantasias ou conflitos típicos da infância; tornar os pais mais sensíveis
a comportamentos dos filhos indicadores de assertividade, empatia, cooperação, etc. e
da importância de reforçar esses comportamentos; ampliar o repertório de práticas
parentais para lidar com situações de conflito do dia-a-dia; apontar vantagens e
desvantagens de diferentes tipos de práticas educativas; estimular a descrição de
contingências naturais para as crianças, favorecendo assim, a auto-regulação; resgatar
as trocas afetivas e a importância de momentos de prazer e diversão com os filhos; e
ampliar o conhecimento dos pais sobre o desenvolvimento infantil.

Referências
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do temperamento infantil da responsividade e das práticas educativas maternas. Tese de
doutorado não-publlcada, Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento,
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Sobre Comportiimcnto c CogniçAo 323


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Martins Fontes. (Original publicado em 1954)

324 í\ilrlci.i Aívtirrntfii


Capítulo 28
Imagem Corporal e Transtornos
Alimentares
Palrfcia C/uillon Ribeiro
(Universidade do Conlcstado-SC)*
Fliane Padilha da Silva
(Universidade luiuti do Paraná)
Qlauce Cosia
(Universidade luiuti do Paraná)
Dcnise Cerqueira Leile I leller
(Universidade luiuti do Paraná)

A preocupação com o corpo ou com a aparência física não é um assunto dos


mais recentes. Desde os tempos mais remotos, as comunidades se utilizam de padrões
de estética para se diferenciarem ou para determinarem graus de status entre os membros
da própria sociedade.É comum a observação de que as regras de beleza se modificam
conforme as épocas e acompanham o padrão de comportamento predominante naquele
período.
A forma como as possoas se vestem ou lidam com seu corpo vem sendo estudada
por cientistas das mais variadas áreas como historiadoros, sociólogos, antropólogos,
psicólogos, ontro outros. Alóm disso, a relação que as diferentes comunidades e gerações
estabelecem com a própria imagem e com os atributos corporais valorizados pode ser
observada, inclusive, om obras primas de pintores clássicos que retratavam mulheres de
suas épocas como aquelas que foram produzidas por volta do século XV que retratavam
homens e mulheres com formas mais arredondadas (Castilho, 2001).
Conforme Castilho (2001), o padrão de beleza nunca foi estático. O padrão de
beleza valorizado pelas comunidades atuais, diferente de outras épocas, vorri
determinando a necessidade do corpos cada vez mais perfeitos, o quo implica, atualmonto,
om formas cada vez mais enxutas, cada vez mais magras, livros do qualquor saliôncia
que possa indicar oxcesso de peso ou gordura. Vô-se na mídia atual, com muita froqüôncia,
mulheres excessivamente magras sendo valorizadas como símbolos de beleza o sucesso
pessoal e profissional. Entretanto, a busca pela perfeição estética não ó uma caractorística
apenas feminina. Com algumas diferenças nos padrões comportamentais, os homens
tambóm têm buscado alcançar o ideal do corpo perfeito: "Preocupações mórbidas com a
imagem corporal eram tidas ató recentemente como problomas eminentomonto femininos.

T.miMfiçoiwmxxrtfflfXHKiAnrtM Riw Pndro FM#1, !6V701CCi*t>rHlCo() fl00.15250Ci»UII>»t PRUil (41 )33fl2830:i EmiiH |mW>l\N>g((}ynlKX> com ti

Sobro Comporl.imenlo o ('oflnlv*lo 325


Atualmente, estas preocupações também têm sido encontradas no sexo
masculino".(Assunção, 2002)
Observando os dados a respoito do crescinionto do número de academias do
ginástica om todo o mundo, ó possívol constatar a realidade da busca polo corpo ideal.
Nos Estados Unidos, estima-so que oxistom cerca do 20.249 academias froqüontadas
por quase 40 milhõos de americanos Outros palses como Inglatorra, Alomanha, Japão e
França também tôm um número grande do acadomias e de investidores que apostam no
crescimento desse mercado. No Brasil, ainda não se tom um número exato de pessoas
que froqüentam essos ambientes e nem a quantidade desses ostabolocimontos, mas
estima-se que existam cerca do 7.000 academias com, mais ou monos, 3 milhões de
alunos em todo o país (Bergallo, 2004).
Outro dado importante que reflete a ansiedade da comunidado na busca pela
estética perfeita ô a quantidade de cirurgias plásticas que tôm sido roalizadas,
principalmente no Brasil. Conforme os dados da Sociedado Brasileira do Cirurgia Plástica,
om 2004, foram realizadas no pais cerca de 617 mil cirurgias plásticas sendo que dessas,
60% com finalidade estética. De acordo com a entidade, 15% da população que se
submeteu à intervenção cirúrgica para fins estéticos, foram do adolescontos o quo aponta
para o sofrimento precoce diante da pressão pela beleza padronizada (Diniz, 2006)
Contudo, a tentativa de alcançar corpos cada vez mais próximos da porfoição,
vem gerando graves conseqüências: "(...) a rolação do cada um com o seu
corpo,especialmente suas crenças, percepções, pensamentos, sentimentos e ações,
pode necessitar sor revista o fortalecida."(Castilho, 2004 p.32) Conforme Castilho (2004),
a dificuldade em aceitar a própria aparência pode indicar dificuldades em acoitar-se como
pessoa. Esse fato envolvo uma das relações mais antigas: a do homem com a sua
imagem corporal

Imagem corporal
A percepção de quo o homem estabelece uma relação própria com a sua
Imagem Corporal vom desde a Antigüidade, quando um módico francês, Ambroise
Paré, obsorvou a existência do mombro fantasma em seus paciontes vítimas de
amputação do membros. Desde então, a relação do homom com o próprio corpo o
como essa relação pode interferir em seu comportamento, vem sendo observada por
diferentos pesquisadoros (Barros, 2005).
A construção da Imagem Corporal envolve a interação entre fatores emocionais,
atitudes e percepções na relação que o indivíduo estabelece com a sua aparência
física:"(...) não se podo deixar de levar em consideração os aspectos socioculturais que
podem influir no desenvolvimento da auto-imagem corporal e dos transtornos a ela
associados" (Almeida, Santos, Pasian e Loureiro, 2005). A insatisfação das pessoas
com o próprio corpo tem sido vinculada à distorção da porcepção corporal o ao desejo
do alcançar um detorminado tamanho e peso que aumentem a possibilidade de obter
a aprovação social.
O desenvolvimento da Imagem Corporal aconteco do forma gradual desde a
infância. Desde muito pequenos, quando o corpo comoça a ganhar caractorísticas
próprias do cada indivíduo, a criança começa a perceber a forma como ola mesma e os
outros porcobem a sua aparência. “A imagem corporal ó como uma impressão digital,
ou seja, cada indivíduo possui uma experiência corporal que é única (...) (Castilhos,
2004 p. 35). As crianças aprondom como a sociodado porcobo o valoriza determinadas
características físicas e como desqualifica e rejoita outras. Elas aprondom a discriminar

326 P.itrki.i O tilHon Ribeiro, lli.in c |\u lilh ,i il.i Silv.i, l/l.u iie C o*t.i, Ponki* tYri|ik-ir,i I dto I (cllor
os sinais emitidos pelo ambionte e buscam adequar sua aparôncia corporal ao modelo
que lhes é transmitido (Castilhos, 2004).
Conformo Briggs (2000), a construção da imagem corporal, bom como da auto-
estirna, se dá através da forma como a criança interage como ser social om sua família
e com o moio à sua volta. A partir dessas intoraçõos, ola adquire intormaçõos a sou
rospoito e constrói, aos poucos, a porcepção de si mosma. Antos do aprendizado da
linguagem, a criança aprendo a linguagem corporal transmitida pelos outros, através
dela, a criança capta o rogistra impressões sobro si mosmo e o mundo a partir da
maneira como é tratada. É o outro quo a principio vai aprovar ou não a atitude ou o
comportamento omitido, e só então poderá ser construída uma relação de respeito
consigo mosmo. Nesse processo, o meio social em que a criança está insorida
transmite constantomonto informações a respeito dela mesma, ou soja, à medida quo
a criança desenvolve uma vida social ela vai adquirindo mais informaçõos a sou respeito.
Do acordo com Briggs (2000) a imagem corporal quo cada pessoa tom do si
mosma tem a ver com o que a pessoa selocionou durante sua vida intoira a rospoito
daquilo que falaram sobro sou corpo. É durante os anos pró-oscolaros que a criança
desenvolve de forma acentuada o seu conceito a respeito da imagem corporal Com um
pensamonto o uma linguagom mais abrangentes, começa a reconhecer quo a aparência
das pessoas pode sor mais ou monos desejável. Ela aprende a respeito do significado
das palavras "bonito” e "feio" e reflete a opinião que os outros têm quanto à sua aparôncia.
A auto-estima não ó um conceito de caráter definitivo, assim como os
autoconceitos, que a formam, são aprendidos e não hordados. A visão que a criança
tem de si mesma geralmente muda com o sou crescimento e com suas novas
exporiõncias. O processo de formação da auto-imagem se faz da seguinte maneira: um
novo reflexo uma nova experiência, ou o crescimento, leva a um novo êxito ou fracasso,
que por sua voz leva a uma nova concepção de si mesmo. Dessa maneira, o autoconceito
de cada pessoa evolui, em geral, durante toda a sua vida. Conforme Castilhos (2004) as
concepções e atitudes relacionadas com os concoitos de ostótica e beleza, influenciam
de maneira determinante a forma como as pessoas se caracterizam e se relacionam
com seus pares.
Uma das grandes dificuldades percebidas por aqueles que nâo se julgam
atraentes fisicamente, é o receio de serem rejeitados no meio social As pessoas têm a
tondôncia a acreditar que pessoas esteticamente bonitas têm status socialmente olovado
o uma probabilidade maior de alcançarem o sucesso em qualquer projeto que so
engajem. Essas pessoas têm a tendência de “(...) se preocuparem mais com a
aparência, bem como se auto-avaliam em função da mesma" (Castilhos, 2004 p. 19).
Em um estudo roalizado com mulheres, Almeida e col. (2005) identificaram quo
a maioria dessas participantes do estudo relacionou o tamanho e a forma corporal com
figuras quo roprosentavam baixo peso. Quando as mesmas foram solicitadas a indicar
o tamanho quo gostariam de ter, observou-se que grande parte do grupo apontou para
figuras do baixo peso corporal. De acordo com Almeida e col (2005), a exigência de
corpos magros é grando ontro ossas mulheros o quo aponta om direção ao "(...)
estereotipo que associa o corpo magro da mulhor a atributos positivos, à normalidado,
e à capacidade de se tornarom atraontos o bonitas" (Almeida o col., 2005).
Em pesquisa recente, Marques (no prelo) verificou que om um grupo de
universitárias, aquelas quo aprosontaram prodisposiçâo ao distúrbio da imagem corporal,
indicaram a presença de comportamentos como preocupação excessiva em chamar a
atenção e com a aparência do forma excessiva, patológica. Conforme Castilhos (2004),

^obrc l omport.imenlo o C*of*niv<1o 327


urtia das conseqüências da imagem corporal negativa ó a associação freqüente desse
padrão de comportamonto com transtornos alimentares como a anoroxia o a bulimia.

Transtornos alimentares
Os transtornos alimentares costumam afetar mulhoros jovens o tor um curso
crônico, apresentando alto grau do morbidade e mortalidade (Pinzon & Noguoira, 2004).
Caracterizam-se por severas perturbações no comportamento alimentar.
A anorexia norvosa é mais comum em mulheres que em homens, o do inicio
mais freqüonte entre 13 e 18 anos e mulheres após os 40 anos. De acordo com o CID
- 10, a anoroxia nervosa ó um transtorno caracterizado por perda de peso intencional,
induzida e mantida pelo paciento. O transtorno ocorre comumente em mulheres
adolescentes ou jovens, mas pode igualmente ocorrer num homem adolescente ou
jovem, como numa criança próxima à puberdade ou numa mulher de mais idade ató na
menopausa. A doonça está associada a uma psicopatologia ospoclfica, compreendendo
um medo de engordar e de ter uma silhueta arredondada, intrusão porsistente de uma
idóia supervalorizada. Os paciontes se impõem um baixo peso como determinante de
sucesso. Existe comumente desnutrição de grau variável quo se acompanha de
modificações ondócrinas e metabólicas socundárias e de perturbações das funçõos
fisiológicas. Os sintomas compreendem uma restrição das escolhas alimentares, a
prática excessiva do oxorcícios físicos, vômitos provocados o a utilização de laxantes,
anorexígoros e de diuréticos. O DSM IV(2000) complomonta: a) recusa em manter o
peso no minimo normal adequado à idade e à altura, ou acima deste. Por exemplo,
perda de poso lovando à manutenção do poso corporal num nlvel menor que 85% do
esperado; ou fracasso em ter o ganho do peso esperado durante o periodo de
crescimento, levando a um peso corporal menor do que 85% do esperado; b) medo
intenso do ganho de peso ou de se tornar gordo, mesmo com peso inferior; c) perturbação
no modo de vivenciar o poso corporal, tamanho ou forma.
O peso ou formato corporal exercem influência indevida na auto-avaliação ou
há negação da seriedade do baixo peso corrente; d) nas mulheres pós menarca, a
amenorréia, isto ó, a ausência de pelo menos três ciclos mentruais consecutivos, quanto
ó esperado ocorrer o contrário. Há um distúrbio da imagem corporal, sendo assim se
vêem mais gordos do que realmente são e permanecem insatisfeitos com seu corpo
mesmo estando extremamente magros.
Segundo Hollor (2003), a anorética apresonta auto-ostima rebaixada,
porfoccionisrno, falta do habilidado social, repertório comportamental limitado e tendência
a se auto-avaliar a partir da opinião dos outros. Nas diferentes áreas de sua vida, tende
a atribuir sou insucesso ao seu corpo, sendo incapaz de discriminar seu limitado
repertório om habilidado sociais Apresonta falta de controle de sua vida e o controle do
comer parece sor o único possível, sendo, portanto muito reforçador para ela.
A bulimia de acordo com o CID-10 (1993), uma preocupação excessiva com
rolação ao controle do poso corporal conduzindo a uma alternância ontre hiporfagia e
vômitos ou uso do purgativos. Este transtorno partilha diversas características
psicológicas com a anorexia nervosa, dentre as quais uma preocupação oxagerada
com a forma o poso corporal. Conforme os critérios descritos do DSM IV (2000), a
bulimia norvosa caracteriza-se por: a) opisódios de bingo-oating recorrentes, b) empenho
recorrente om comportamento compensatórios inadequados a fim do provonir o ganho
de peso, tais como: vômitos auto-induzidos, uso inadequado de laxantes, diuróticos
enomas ou outros medicamentos, dieta restritiva, jejum ou exercícios excessivos; c)os

328 P.ilrki.i (./iiilloi) Ribeiro, lli<inc I\hIiIIm il.i Sj|v«i, C/I<iui'c tosl.i, l>euise (.'erquelrii l.elle I leller
episódios de binge-eating e comportamentos compensatórios inadequados devem
ambos ocorrer, em média, pelo menos duas vezes por semana durante trôs meses; d)
a auto avaliação ó inadequadamente influenciada pelo peso e formato corporal; e) o
distúrbio não ocorre exclusivamente durante episódios de anorexia nervosa.
Um episódio de binge-eating caracteriza-se por: comer em um período limitado
de tompo, uma quantidade do alimento que ó claramente maior do que a maioria das
pessoas comeria durante um período de tempo semelhante, em circunstâncias
semelhantes, e também, sentimento de falta de controlo sobre o comportamento
alimontar durante tais episódios.

O estudo
O estudo a ser apresentado a seguir teve por objetivo verificar a relação entre o
transtorno de imagem corporal e os transtornos alimentares entre 100 alunas de uma
Universidade particular de Curitiba, na faixa etária entre 18 e 25 anos. Para tanto, foram
utilizados dois instrumentos, o Body Shape Questinaire - BSQ (Cooper in Pietro, 2002)
e o BITE (Henderson & Freeman, 1987) a fim de observar o padrão de comportamento
das alunas quanto à imagem corporal própria e identificar a incidência de transtornos
alimentares entro as mesmas. O BITE ó indicado para identificação do quadro de bulimia
nervosa (ainda em discussão) e/ou classificação dos transtornos afetivos alimentares
da alimontação (o que inclui obesidade e a anorexia).
A partir da avaliação dos resultados obtidos, observou-se que 53% das
universitárias entrevistadas responderam quo possuem uma incontrolável vontnde de
comer sem parar, 57% indicaram consumir grandes quantidades de comida muito
rapidamente e 72% responderam que apresentam episódios exagerados de
alimentação. Com relação às conseqüências do padrão alimentar; 83% se apavoram
ao pensar em tornar-se gorda; 59% em episódios de super alimontação sentem-se
mal e sentem-se culpadas ao comer demais Situações que desencadeiam uma super
alimontação, as trôs respostas que tiveram maior freqüência: 43% apresentam
momentos em quo só conseguem pensar em comida; 79% ao sentirem-se ansiosas,
tendem a comer muito e 47% voltam-se para a comida buscando aliviar algum tipo de
desconforto. Os presentes resultados apontam para a possibilidade da influência de
fatores emocionais como desencadeadores do comportamento alimentar alterado.
Relacionando os resultados do BITE e da avaliação da Imagem corporal,
observou-se que: 17 pessoas não apresentaram dados que apontassem para a
possibilidade de transtorno alimentar e transtorno de Imagem corporal; 13 pessoas
apresentaram possível comportamento alimentar não usual e sem transtorno de imagom
corporal; 5 pessoas apresentaram respostas indicativas de possibilidade de
comportamento alimentar não usual com transtorno de imagem corporal leve e 8
pessoas com possível comportamento alimentar não usual e transtorno de imagem
corporal moderado. Ainda em relação aos resultados do BITE, 28 alunas apresentaram
forte possibilidade do transtorno alimentar, sem transtorno de imagem corporal e 13
obtiveram forte possibilidade do transtorno alimentar com o de imagem corporal
moderado, Aquelas pessoas que apresentaram respostas relacionadas ao
comportamento alimentar compulsivo, tiveram associado o transtorno de imagem, sendo
5, transtorno leve, 1 moderado e 3 grave.
Ao se fazer referência à imagem que uma pessoa tem de si mesma, nem
sempre se refere a uma imagem real e objetiva. Esta pode estar deformada por uma
confusão com relação à realidade psíquica do indivíduo, de modo que este estado

Sobre t omport.imcnlo e CogniçAo 329


mental pode levar a uma doença. Isto se deve ao fato de que a construção da identidade
do sujeito está extremamente relacionada com sua imagem corporal. A auto-imagem é
um conceito construído a respeito de como o indivíduo ó fisicamente, o que aparenta e
como os outros o vêem. Para um adulto emocionalmente sadio, a auto-imagem corporal
ó estável e geralmente satisfatória, no sentido de auto-aceitação. Já na puberdade, a
estruturação do esquema corporal é uma sucessão de elaborar e re-elaborar; estruturar
e reestruturar.
Observa-se que todas os participantes que apresentaram algum transtorno de
imagem corporal, não apresentaram um comportamento alimentar normal, A ausência
de comportamento alimentar adequado associado à busca da imagem corporal perfeita
são fortes indicativos para o desenvolvimento de transtornos alimentares. Embora,
sejam quadros freqüentes entras as mulheres e muito se tenha escrito a respeito
desse assunto, ó importante que os profissionais da saúde e a sociedade se mobilizem
a fim de buscar formas de prevenção primária para os transtornos alimentares. "O
prejuízo pessoal o social de indivíduos caracteristicamente jovens, o curso longo e
variável e o prognóstico reservado requerem planejamento terapêutico mais eficaz e
alocação adequada de recursos humanos e financeiros"( Pinzon & Nogueira, 2004).

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24
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Pinzon, V. e Nogueira, F.C (2004) Epidemiologia, curso e evolução dos transtornos alimentares
Revista da Psiquiatria Clinica v.31141 São Paulo, SP

330 1’atrlua tyulllon Ribeiro, Lliane 1’adilha tia Silva, Glauco Corta, Penisc Cerqueira I cito I Id ler
Capítulo 29
A prática do analista do comportamento:
contribuições passadas e
recentes para a educação.

Paulo André Barbosa Panetta


M aria Auxiliadora de Lima W ang
Lígia Valladares O da Kurokawa
Roberto Alves Banaco

PUC SP

O objetivo desto artigo é fazer um panorama sobre as principais contribuições


g práticas do analista do comportamento a educação, estabelecendo uma breve
introdução, apontando o desenvolvimento de algumas técnicas de ensino, além de
críticas de alguns autores e possíveis futuras metas a serem alcançadas.
No livro Science and Human Behavior, Skinner (1953) descreve a educação
como a ocasião onde são estabelecidos comportamentos que serão futuramente
vantajosos para o indivíduo o outros através do condicionamento operante: os reforços
são dispostos pela agôncia educacional para condicionar o comportamento futuro do
aprendiz. Onde outras agências controladoras (igrejas, governos, industrias) visam à
manutenção do comportamento, as agências relacionadas ao controle educacional
(escolas, fundações, institutos, universidades) visam à aquisição de comportamento.
Ou seja, agências educativas têm como objetivo a produção de novas respostas pelos
seus alunos a situações futuras, pois:
“O reforço educacional simplesmente faz certas formas prováveis (de respostas)
em determinadas circunstâncias. Ao preparara o indivíduo para situações que ainda
nào ocorreram, os operantes discriminativos sào colocados sob o controle de
estímulos que provavelmente ocorrerão nessas situações" ( Skinner, 1953. p. 439).
Mas, a educação não ocorre apenas em escolas. A prova maior disto é que as
pessoas têm sido educadas muito antes do surgimento destas agências controladoras.
As educações familiares, profissionais e militares controlam a manutenção do
comportamento e fá-lo através da apresentação de reforçadores condicionados ou, como
ocorre em muitos casos, a utilização da punição ou da ameaça de punição. As técnicas
das agências educacionais, para a emissão de respostas noviças pelos aprendizes, não
são muito diferentes. As instituições educativas também utilizam (poucos) reforçadores
condicionados e (muitos) estímulos punitivos. A diferença reside na preparação do indivíduo
para novos ambientes futuros: eis a função básica do controle educacional.

Sobre Comportamento c CofitiivAo 331


Muitos dos reforçadores utilizados pelas instituições educacionais são
conhecidos: notas, aceitações, diplomas, graus, medalhas... Assim como são muito
conhecidos os estímulos punitivos utilizados pelas mesmas instituições (alguns já em
desuso): palmatórias, retenção, reprovação, expulsão. Não ó difícil explicar o uso da
punição. Um professor, em sala de aula, poderá arranjar, com extroma facilidade,
contingências aversivas para o controle comportamental dos seus alunos. O controle
aversivo do comportamento envolve reforçamento nogativo (fuga, esquiva) e punição.
Como um dos efeitos da punição é imediato (suspensão do comportamento indesejável)
e amparado pelas práticas culturais, sua utilização ó totalmente dilundida nas instituições
educacionais. Decorre, então, um dos problemas na educação escolar: as
apresentações de estimuladores aversivos, pois se tais apresentações visam o controle
comportamental imediato, não há lugar para seu uso em um planejamento do ensino
de comportamentos cujas ocorrências serão em ambientes futuros. Mais do que em
qualquer outra área de controle comportamental, o uso da punição tem produzido efeitos
colaterais tão evidentes e crônicos.
Um dos efeitos colaterais mais evidentes do uso da punição na educação é a
evasão escolar. O professor dispõe de um arsenal de estímulos aversivos que são,
freqüentemente, apresentados ao aluno. Como resultados ó possível observarmos
uma menor freqüência dos alunos, em sala de aula. Ou seja, um aumento de
comportamentos de esquiva (evasão), além de violência com os próprios professores
(ameaças, insultos) e com a instituição escolar (destruição de carteiras, pichaçôes,
roubo do material escolar). A educação tem sistematicamente reproduzido tócnicas
aversivas da cultura em sala de aula. Mas tais tócnicas não dever ser copiadas. Devem
ser superadas.
É evidente que a aprendizagem ocorrida com o uso do controlo aversivo é
limitada; o aluno apreende a se esquivar do efeito da estimulação aversiva e quase
nada mais ó aprendido. Não há muito espaço para a aquisição de outras novas
respostas e o repertório adquirido em sala de aula, neste sentido, ó estrito. Mas, haveria
os professores utilizarem outras tócnicas nào punitivas? Os conhecimentos de
pedagogia que os professores díspõom são suficientes para um ensino efetivo? Os
professores iniciantes recebem uma preparação adequada? Segundo Skinner (1972),
a resposta para essas perguntas ó nào:
“O professor principiante não recebe preparação profissional. Geralmente começa
ensinando simplesmente como foi ensinado e, se melhora, è apenas graças a sua
própria e desamparada experiência. Algumas receitas do oficio e regras práticas
sâo passadas adiantes, mas a experiência própria do jovem professor continua a
ser a principal fonte de melhora. E mesmo esta modesta tentativa de treinamento
de professores tem sido atacada (...) qualquer conhecimento especial da pedagogia
como ciência básica è tido como desnecessário." (pp. 90-91).
Uma pedagogia do ensino efetiva dever-se-ia preocupar em como o ensino
ocorre e não somente com o que está sendo ensinado. É deveras importante, para o
aluno, saber determinadas matérias e assuntos (como, por exemplo, saber ler, escrever,
fazer contas matemáticas, fatos históricos, etc...) obtendo assim uma melhor preparação
para ambientes futuros, onde o repertório adquirido, em sala de aula, lhe ajudará.
Porôm, mais Importante do que ele aprender, ó como ocorrerá sua aprendizagem e isso
envolve o planejamento do ensino. O planejamento de escolas, equipamento, textos e
práticas em sala de aula, que são algumas das contribuições da análise do
comportamento a educação, que auxiliam o professor no ensino de qualquer matéria,
sem a necessidade do uso de técnicas aversivas. Ajudam tambóm ao aluno a controlar
sua aprendizagem, A seguir serão comentadas algumas destas contribuições.

332 l\iulo Andrí P.inotl.i, M.irl.i AuxiImiIomdo Iim.i W.in#, l.iglii V.ill.ul.irrs Od.i Kumk.iwd
RoIhtIo Alvos R.i » iKO
A lg u m a s c o n trib u iç õ e s da a n á lise do c o m p o rta m e n to no
planejamento do ensino.
Um dos grandes problemas da educação escolar é o fato do que os roforçadoros
positivos serem muito remotos. Aquilo quo é ensinado em sala de aula não é
imediatamente roforçado. Quaso sempro um aluno aprendo através de descrições de
contingôncias, raramente seu aprendizado ó modelado por contingôncias do reforço
planejadas. Um queixa, bastante difundida entre os alunos, ó quo a educação, om
gorai, ó difícil do sor obtida e irrelevante para a vida prática. Quostionamontos quanto à
dificuldade e relevância da educação ó um dos ofeitos da aprendizagem por descrições
do contingôncias com entrega atrasada o intermitonto do reforçadores. Mas, afinal, qual
ó a relovância e os objetivos da educação?
Os objetivos da educação são de mudanças comportamontais obsorváveis, ou
dito de outra forma, aquisição de novas rospostas polo aluno (Skinner, 1972). A relevância
desta aquisição resido no aumento do repertório comportamontal do aluno. Porém, manter
esta aquisição do novas rospostas não ó uma tarefa fácil. Um dos principais problemas
enfrentados pelos profissionais da educação são as notas o concoitos, utilizados como
reforçadores condicionados, em todos os níveis da oducação, para a aquisição de
respostas noviças pelos alunos. Obviamente, assim como dinhoiro, prêmios e promoções,
notas são roforçadoros arbitrários que, se apresentados contingonto ao comportamento
desejável emitido pelo aluno, poderão manter a aprendizagem do mosmo. É sabido que
alunos quo rocobem notas excelentes, de um modo gorai, estudam mais do que aqueles
quo recobem notas menores. Mas, por causa do esquoma de reforçamento intermitonto
utilizado, a manutenção do hábito de estudo pelos alunos quo demonstram um
dosompenho académico eficiente poderá tornar-se difícil o ingrato. Muitos, incfusive, acabam
desmotivados. Com os profissionais da educação, o processo também não é muito
diferente. Skinner (1972) afirma que são muitos os professores que: Iperdem de vista o
significado do que estão ensinando e, para os que mantêm a educação, perdem contato
com o que está sendo realmente ensinado." (p. 219). As causas desso processo são
conhecidas. Devem-se ás contingências de reforço que, mal planejadas, não se
relacionam com as vantagens imediatas da profissão: ensinar outros como aprender.
Para obtermos um ensino e profissão eficiente é necessário um molhor planejamento do
ambiente modelador do comportamento, com um maior controle o ontroga do roforçadores
positivos imediatos. A prática do analista do comportamonto envolve o planejamento do
ambiente de ensino com a apresentação de reforçadores contingontos ao comportamento
desejável do aluno o do profossor. Skinner (1972) comenta quo ensinar urri aluno a
ostudar ó: lensinar-lhe técnicas de auto-governo que aumentem a probabilidade daquilo
o que foi visto ou ouvido seja lembrado" (p. 122). Com a passagem do tempo, o aluno
deveria ficar menos sob o controle da descrição fornecida: o comportamento aprendido
deve sor modelado pelas contingências de roforço às quais foi programado. Porém, om
muitos momentos, na prática, a modelação é inexistente.
Descrições de contingências sem relação direta com comportamentos futuros
onde tais contingências ostarão om ação ó um problema global Ernest Vargas (1996),
descrevendo um possívol novo modelo para as universidades amoricanas. aponta que o
paradigma tradicional da educação, neste país, está baseado na percepção do aluno. O
modelo assumido nas instituições americanas ó caracterizado pela apresentação do
instruções, ao aluno, com a finalidade de melhoria no desemponho deste, onde ó assumido
quo a instrução é igual para todos o todos estão motivados a apronder e onde o aluno não
controla o que ó apresentado para ele, assim como não controla o ritmo do quo é ensinado.
Como consoqüôncia, temos uma padronização de instruções e de ambientes do ensino,

Sobre Comportamento e l ogmvilo 333


que não permite variações no repertório dos alunos ou tão pouco no repertório dos
professores e cujas avaliações são totalmonto inadoquadas. Para o autor, as soluções
possibilitadas, que seriam as melhorias nas habilidades acadêmicas (mais trabalho
aos professores e alunos), melhorias nas ferramontas acadêmicas (molhores
computadores), ou no morcado acadêmico (provão) não são ofotivas, pois não modificam
as contingências modeladoras do comportamento de ensino e aprondizagom
Um possivol oxemplo do planojamento do ambiente modelador ó fornecido por
Whaloy o Malott (1971) quo, om um curso do introdução a Psicologia para cerca do mil
alunos, delinearam algumas mudanças no esquoma do avaliação dos mesmos. Ao
invês do avaliações esporádicas, com longos textos para sorem ostudados, foi introduzido
vorificaçõos do leituras diárias com uma quantidade requerida poquona do toxtos a serem
lidas. O esquema não só facilitou o desempenho acadêmico dos alunos, como tambóm:
"Os estudantes deixaram de esporar ató a véspera do examo para passar a noite
estudando a grande quantidade de material exigida. Estudar um material de leitura
curto, para um breve tese, nào è a mosma coisa quo ostudar para uma prova com
duração de três horas, cobhndo um material de dois ou três monos. “ ( p. 220)
Ocorreram outras mudanças no ambiente de ensino. Foi desenvolvido um matorial
didático com instruções detalhadas sobre exercicios de laboratório, modolos do rolatórios
para servir de amostra aos alunos, oportunidades de recuperação para aqueles quo orrararn
algumas respostas duranto a verificação do leitura, foodback imodiato acerca do
desempenho obtido em sala de aula o controlo de froqüência do aluno. Para a aprovação do
aluno era exigido um domínio completo do assunto abordado (ou seja, 100% de acerto nas
verificações de leituras ocorridas), havendo uma análise do orros na elaboração das
questões feitas por parto dos profissionais o avaliação, do aluno o do professor, por parte de
seus colegas acadêmicos. Para reduzir a proporção aluno-professor, foi também
implementado um programa do monitoria e tutoros, assistontes de professor e aprendizes.
No inicio do curso, foi necessário que os professores responsáveis despendessem uma
grande parcela de tempo, mas, com o desenrolar e funcionamento regular do curso: "a
soma dos esforços deles é menor ou equivalente ao desempenho de um único professor
em tempo parcial." (p. 227). Como resultados dos procedimentos adotados, não só o
número de alunos reprovados decaiu muito, como também uma grande variedade de
atividades foi colocada à disposição deles como conseqüência de um molhor planojamonto
profissional dos professores e com um custo financeiro relativamente monor, pois ostas
oxporiôncias oducativas foram oferecidas por um conjunto do profissionais cujas horas no
trabalho e salários equivalem, om conjunto, ao de um professor-doutor om tompo integral,
a do um professor assistonto o instrutor de onsino, ambos om tompo parcial.
Como no exemplo do estudo de Whaley e Malott (1971), o planejamento do
onsino visa sempre o desenvolvimento de técnicas de mudança comportamental. Mas,
tal mudança não deverá ser restrita somente aos alunos e aos professores. Outros
indivíduos, que participam da cultura educacional tambóm deverão ser inclusos. Sogundo
Luna (2001), são estes: (1) os que se ocupam da pesquisa educacional e (2) os quo
ostabolocom uma política educacional. Os comportamentos dos mombros do dois
grupos são mantidos por causas das contingências de reforçamonto, que são, (assim
como para professores e alunos), mal planejadas. É nocossário, ontão, quo o
planojamonto do ensino, basoada om contingências de roforçamonto positivas, norteiam
a política e pesquisa educacional. A cultura educacional que melhor planejar as
contingências de reforços atuantes nos ambiento dos indivíduos participantes será a
cultura quo poderá prndizor, com maior exatidão, os problemas por ola enfrentando e
suas possíveis soluções através do uso de uma tecnologia do ensino.

334 l\iulo Amlró R.irl)o*«i P.mdt.i, M.iri.i Auxiliadora de Iim.i W.mq, Iífll.i Valladarv* Oda Kumkawa
Rolicrto Alves Hanaio
Uma política educacional proocupa-se com três questões básicas: quem devo
ser ensinado, quanto e a respeito de que? Deverá ser ensinado todos os membros
participantes de uma cultura, com um quantidade de ensino que amplifique o reportório
comportamontal do indivíduo. Já as conseqüências de àquilo que ó ensinado, (e quo
diferencia o conteúdo do ensino) dopondem da área em quo ocorro o ensino, mas, de
qualquer forma, poucas vezes sâo especificadas estas conseqüências. Grando parte
do onsino atual nâo decorro de uma política explícita e acabam fracassando por que
repetem erros cometidos no passado. Segundo Skinnor (1972):
"Os formuladores de uma política educacional empenham-se em criar estudantes
à sua própria imagem ou, na melhor das hipóteses, a trabalharem na direção de
arquòtlpos generalizados pelo conjunto de homens bem-sucedidos no passado.
Mas uma cultura, como uma espécie, nào evolui de uma simples réplica dos
sucessos anteriores Os homens distintos do passado foram produzidos em grande
parto por contingências acidentais, o nào nos dão nenhuma indicação a respeito
do quo pode ser feito do homem com um plano mais hábil." (p. 226)
Para produzir um homem mais hábil é necessária uma política educacional que
favoreça a divorsidade e variabilidade de seus membros. Skinner (1972) aponta quo: "uma
política concebida para maximizar a força de uma cultura deverá encorajar a novidade e a
diversidade, "(p. 224) É somente com o uso conjunto de um planejamento o do uma tecnologia
do onsino eficaz que poderemos abordar e solucionar os problomas da educação quanto as
suas políticas. Infelizmente, estas soluções estâo muito longos do serem lealizadas.

Uma Tecnologia do Ensino


Em Tecnologia do Ensino, Skinnor (1972) defende que, para atender à demanda
crescente por educação, não basta construir mais escolas e investir na formação de mais
professores, ou ainda selecionar apenas os molhores professores e melhores alunos.
Ele acredita quo a inoficiência da educação só podo ser resolvida com auxilio de uma
tecnologia de onsino, nascida dos laboratórios da análiso experimental do comportamento:
"Não ò possível melhorar a educação pelo simples aumento de recursos a ela
atribuídos, pela modificação da política educacional, ou pela reorganização do
sistema Ê preciso melhorar o próprio ensino Nada que nâo preencha as condições
de uma tecnologia do ensino resolverá o problema “ (p. 246)
Skinner (1972) descreve dois dos produtos dessa tecnologia, já conhecidos do
público da ópoca; a instrução programada e as máquinas de onsino.

I - Instrução programada
Para falar sobro a Instrução programada proposta por Skinnor, voltemo-nos
para a definição sobro o ensinar: "um arranjo de contingências de reforço, sob as quais
o aluno aprende" (p. 4). Essas contingências devem ser planejadas considerando-se a
ocasião om que o comportamento ocorre, o comportamento em si e suas conseqüências.
O seguinte trecho ilustra as idóias de Skinnor a esse respeito:
“Entregue a si mesmo, em um dado ambiento, um estudante aprenderá, mas nem por
isso terá sido ensinado A escola da vida náo é bem uma escola, não porque ninguém
nela aprende, mas porque ninguém ensina. Ensinar é um ato de facilitara aprendizagem,
quem é ensinado aprende mais rapidamente do que quem não é." (p 4)
A programação do ensino proposta por Skinner pode ser assim caracterizada:
1) Os objetivos finais da aprendizagom dovom ser claramonte ospocificados;

Sobre Comport.imcnto c ( ' o r p h <1o 3 3 5


2) O estudante deve participar ativamente durante o procosso do ensino e ser roforçado
imediatamente;
3) O conteúdo a ser ensinado devorá ser dividido em pequonas unidades, para quo o
estudante avance gradualmente e no próprio ritmo;
4) O comportamonto deverá ser colocado sobe controle do diforentos estímulos e
mantido com reforço pouco froqüente.

II - Maquinas de ensino
Skinnor (1972) rolata quo a criação das primeiras máquinas de onsino ó atribuída
a Sidney Pressoy quo, na década de 20, projetou equipamontos buscando especialmente
facilitar tostes educacionais. Mais tardo, Prossey observou quo o aluno aprendia onquanto
roalizava os testes, pois rocebia feedback imediato. Ou soja, segundo o autor, o aluno sabia
so suas rospostas estavam cortas ou erradas. O reforço imodiato das respostas, fornecido
por meio da máquina, oferecia vantagens adicionais comparando-se à prática tradicional
do corrigir exames e devolvô-los uma semana ou até mais tempo depois de eles tor sido
roalizados. Outra vantagem da máquina de ensino era a possibilidade de cada aluno participar
ativamente do processo e seguir o programa do estudos no próprio ritmo. Aposar dessas
vantagens, as máquinas de ensino não obtiveram a esperada popularidado quo Pressey
vislumbrava. Para Skinner (1972), polo menos dois motivos contribuíram para o fracasso
das máquinas de onsino propostas por Pressey; falta de uma real comproonsão do processo
de ensino-aprondizagem e a inércia cultural. Sogundo Skinner (1972):
Pressiív trabiilhavd contra um sedimonto da teoria psicológica. aue ainda nào
tinha c/waadü uma concifíacâo com o processo de aprendizagem. Ü estuda da
aprendizagem humana era dominado pelos ‘tambores de momóri*" e artefatos
sinularas originalmente cpncebidas para estudar o osaueamenlo. Observava-se
o ritmo da aprendizagem, mas quüsq nada era feito oura m udá-lo(p 30)
Levando-se em conta o conceito de ensino, de Skinnor, para que haja aprendizagem,
è necessário ao aluno algo mais do que simplesmento comportar-se ativamente e saber
se suas respostas estão cortas ou erradas. Por isso, ornbora Skinner reconhoça as
contribuições de Pressoy para muitas das concepções que lovaram ao aprimoramento dos
equipamentos de onsino, reserva o termo "máquinas de onsino" para aquolas aporfoiçoadas
a partir das descobertas da análise experimental do comportamento Ele acreditava que a
aplicação das descobertas da análise do comportamento na oducação exige
necessariamente algum tipo de equipamonto. Porque se contingôncias do roforço que
modificam o comportamento de organismos inferiores não podem ser arranjadas
manualmente, muito menos contingôncias que modificam o organismo humano podem
sor arranjadas sem o planejamento que onvolvem instrumentos desenvolvidos para tal.
Note-se quo por máquina de ensino, Skinner (1972) ontondia: "qualquer artefato
que disponha contingôncias de reforço.” (p.63). O papol da máquina era o de dispor
conteúdo para o aluno, de forma a oferecer retorno imediato sobre o desempenho do
estudante. Com isso, o professor toria mais tempo para o atendimento individual o para
atividades interativas gorais com o aluno. As máquinas de onsino, assim como a
programação do conteúdo, devem ter garantir requisitos como:
a) O aluno dove compor a resposta - em vez de escolhô-la entre alternativas.
b) O conteúdo deve ser apresentado om pequenos passos. Cada passo dove ser dado
sem grandes esforços, o, ao mesmo tempo, ao avançar, o estudante se aproxime cada
voz mais do comportarriento-alvo.

336 Paulo Amlró H.irbos.i l\mclt.i, M.iri.i AuxIIi.kIomde Iim.i W.mfl, Il«i.i Vtill.id.irvs Od.i KumkdWii
Koberto Alves R.in.uo
c) As possibilidades de erros devem ser reduzidas ao mínimo possível.
d) O material a ser apresentado pela máquina deve estar de acordo com a análise dos
processos comportamentais verbais e nào-verbais, considerando-se que formas
especificas do comportamento devem ser evocadas e, por meio do reforço diferencial,
ser colocadas sob o controle de diferentes estímulos.
e) O material deve ser programado de forma a oferecer feedback imediato, a fim do
modelar e fortalecer o comportamento na direção do comportamento-alvo.
Para Skinner (1953), com a instrução programada o máquinas de ensino, seria
possível ensinar duas vezes mais do que se ensina com o sistema tradicional,
dispensado o mesmo tempo e esforço. Outro fator importante destacado tanto por
Skinner (1972), quanto por Sidman (2003), ó que a programação do ensino efetiva
possibilita a aprendizagem sem erro, ou pelos menos com o mínimo de erros possível.

III - Sistema de ensino personalizado (PSI)


No início da década de 60, a proposta de instrução programada de Skinner começa
a ser adotada em sala de aula, por meio do Sistema de ensino personalizado (PSI). Essa
é considerada uma das primeiras tentativas de aplicar o trabalho de Skinner, realizado em
laboratório com espécies não-humanas, em comportamentos complexos de estudantes.
O PSI resultou do trabalho conjunto envolvendo Keller, Shorman, Rodolpho Azzi e Carolina
Bori (Koller, 1968).Foi aplicado em curso de psicologia na Universidade de Brasília (UNB),
em 1964. Paralelamente à iniciativa de brasileira, Koller e Sherman iniciaram aplicações
do PSI - em um formato ligeiramente diferente do adotado em Brasília - na Universidade
do Estado do Arizona (Koller, 1968).
A exemplo do modelo de instrução programada de Skinner, o Sistema de ensino
personalizado foi concebido para garantir que nenhuma parte da tríplice contingência
seja deixada ao acaso (Sherman,1992) A semelhança ontro ambas as propostas pode
ser verificada no trecho abaixo, em que Keller (1968) descreve, para alunos dele, algumas
das características do PSI:
“Este é um curso em que você pode avançar, do começou ao fim, em seu próprio
ritmo. Vocô nào será segurado por outros estudantes ou forçado a avançar antes
de estar pronto. No melhor caso, vocè pode concluir as exigências do curso em
um semestre; no pior, pode nào concluir o trabalho dentro desse prazo. Como você
avançará, vai depender de você." (p. 112)
No Brasil, o método tornou-se conhecido especialmente pelos trabalhos da
professora Carolina Bori, que não apenas o divulgou, como o aperfeiçoou. Sua contribuição
para a expansão do PSI no Pais é destacada na seguinte declaração de Nale (1988):
“Seja como orientadora de trabalhos científicos, como professora de cursos de
programação de ensino, como consultora, assessora, ou seja, finalmente, como
administradora, Carolina exerceu uma enorme Influencia sobre tudo o que se fez
e continua a fazer em programação do ensino no Brasil.“ (p. 281).
Para Nale, (1988) a concepção de quo a tarefa mais importante para o
programador do ensino é descobrir quais os comportamentos Importantes a serem
postos como objetivos, foi uma das contribuições mais óbvias de Carolina para o PSI.
Elo relata que o conceito de objetivo comportamental de ensino e a necessidade de
defini-lo antes de qualquer outra etapa da programação, era um dos aspectos em que
Carolina mais insistia com seus alunos. Nale (1988) acredita que Carolina: "queria
deixar claro que o objetivo deve representar uma classe de comportamentos que faça
sentido na vida do indivíduo, seja como profissional, como cidadão, e nâo desempenhos

Sobre Comportamento e CoRiilyao 337


isolados, típicos de situações de ensino-aprendizagem",. (p.279). O autor afirma que
essa idéia está ausente ató dos trabalhos publicados nos Estados Unidos, incluindo-
se os deKeller (1968) e Sherman (1992). Segundo Nale (1998), fora do Brasil, as
contribuições de Mechner são que mais se aproximam das de Carolina Bori, pois:
"Carotina provavelmente foi a primeira pesquisadora a reconhecer que o
fundamental era, partindo da análise dos objetivos propostos, planejar atividades
como recurso para o ensino de habilidade, conhecimentos, mótodos etc. e planejar
contingências e procedimentos para o ensino dessas habilidades. “ (p. 286)

IV - Ensino Preciso
O ensino preciso, ou ensino de precisão (Erecision teaching - PT) ó considerado
uma variante do ensino programado. Sua criação ó atribuída a Ogden Lindsley, como
resultado de pesquisas realizadas por ele e Skinner na Universidade de Harvard, na
década de 50. Fundamenta-se no modelo operante livre e tem por objetivo tornar o estudante
exímio na habilidade que estiver sendo ensinada. O método dispensa exposições em
sala de aula. As decisões educacionais baseiam-se nas mudanças contínuas de
freqüência de desempenho, que são automonitoradas e registradas em um quadro
padronizado, no qual o progresso do estudante é avaliado diariamente. O seguinte trecho
de Lindsley (1992) dá uma idéia de como ó uma classe operando com onsino preciso:
"O único adulto na classe parece estar matando o tempo. Ela se move ao longo da
classe, de estudante para estudante, respondendo a questões com um sussurro
aqui, oferecendo uma sugestão silenciosa ali, ajudando uma decisão sobre o
gráfico aqui, dando uma taplnha e um sorriso de apreciação lá. Agora o depois ela
convoca a classe para um minuto de prática. Os estudantes estào ocupados em
suas carteiras, em equipe de dois, pulando para pegar o quadro na parede ou para
colocar mais dados nele. Os estudantes sâo barulhentos em suas carteiras,
gritando respostas corretas tão rápido o quanto podem a 200 palavras por minuto,
vários gritos ao mesmo tempo nas carteiras vizinhas. Parece mais um coquetel
numa festa de adultos, ou um recesso escolar do que uma sala de aula Não è uma
classe ordenada como aqueles estudantes que a professora foi ensinada a
administrar, com um do 30 estudantes respondendo de cada vez, e apenas quando
foi chamado a fazô-lo.“ (p. 51).
As primeiras aplicações de ensino preciso em sala de aula, de acordo com o autor,
ocorrem no Canadá e foram feitas com crianças excepcionais. Ele relata um caso de aplicação
das tócnicas de PT, combinadas com PSI, na Academia Morningside (em Seatle, E.U.A.). A
instituição se propôs a reembolsar o dinheiro pago pelos estudantes se o nivel de escolaridade
deles não aumentasse pelo menos dois graus ao ano. Por sete anos os alunos nunca foram
reembolsados e evoluíram, em uma média, dois a três graus por ano. (p.55).

Críticas as práticas do analista do comportamento na educação:


No início da década de 70, Winett e Winkler (1972) publicaram um artigo com
críticas contundentes ao papel dos modificadores do comportamento na educação. Os
autores reportaram suas críticas ao resultado de uma análise, feita por eles, sobre
estudos relativos à modificação do comportamento na educação, publicados no JABA
entre 1968 e 1970. Parecem, no entanto, fortemente influenciados polo livro Crisis in thQ
classroom, de Charles Silberman (1970).
Segundo Winett e Winkler, (1972) Silberman (1970) descreve as escolas públicas
americanas como um lugar “desagradável, deprimente, com rígida preocupação com a
ordem e o controíe\ (p. 499). Winett e Winkler (1972) parecem concordar com eíe,

338 Piiulo Antlré P.incll.i, Miirwi AuxiIi.hIomdo Iima Wiin#, I.íhi.i V.ill.uJ.ucs Oil.i Kurok.iw<i
Kobcrto Alvos H.m.ico
afirmando que: "a modificação do comportamento, como prática corrente, fez muito pouco
para mudar o deplorável estado das escolas e aparentemente tem sido apenas um
instrumento para manter o status qud'_. (p. 499). E mais: acusam os modificadores do
comportamento do subserviência, de não questionar "um sistema que prospera sobre um
insignificante reino da lei e da ordem, em detrimento do processo educacional" (p. 501).
Para Winett e Winkler, (1972) uma classe quieta, controlada, obediente, além
de ser desnecessária, pode ser destrutiva. Eles supõem que a aprendizagem pode ser
mais efetiva se for acompanhada por canto, risada, assobio, como ocorre no ensino
informal, em que a criança pode escolher o quo estudar, quando estudar e por quanto
tempo. Os autores relatam que ao contrário disso, quase todos os estudos analisados
por eles indicam o silôncio, a quietude e obediência como comportamentos-alvo em
classe. Dizem que: “não foram bem-sucedidos em encontrar estudos (exceto um) que
de alguma forma se desviou da norma silôncio e falta de movimento ou que tenha
ousado questionar o currículo” (p.501),
Winett e Winkler (1972) observam ainda que os modificadores do comportamento
não controlam as próprias escolas, portanto, não poderiam discordar dos objetivos e
valores das práticas correntes, pois, divergir deles implicaria a perda de oportunidade
para realizar pesquisas. Ou seja, eles alertam para o fato de que as contingências do
sistoma também controlam os pesquisadores, como fica claro nesta declaração:
Nflo è surpreendente, portanto, que os modificadores do comportamento tenham
usado seus processos a serviço dos objetivos e valores do sistema escolar existente
Se o sistema escolar existente tiver objetivos e valores adequados, isso seria
admirável, mas se ds criticas citadas acima forem pelo menos parcialmente
corretas, então os modificadores do comportamento estao prestando considerável
desserviço à educação' (p 501)
As criticas de Winett e Winkler (1972) foram rebatidas por Oleary (1972), que
os acusou de fazer uma incorreta supergeneralizaçáo dos estudos avaliados. Entre
as limitações do estudo de Winett e Winkler (1972), O’Leary (1972) aponta:
• “Considera incorreta e supergeneralizada a afirmação de quo "a modificação no
comportamento fez muito pouco para mudar o deplorável estado da educação".
•Indica que Winett e Winkler (1972) basearam-se principalmente no livro de Silberman
(1970), que O'Leary (1972) classifica como provocativo.
•Observa que os autores não mencionam estudos que utilizam processos da
modificação do comportamento para mudar classes complexas - do ensino elementar
ao nlvel médio.
•Alega que, embora os autores restrinjam a análise a classes ditas normais, extrapolam
a avaliação para todas as classes", (p.506)
O'Leary (1972) acredita que ficar quieto, em silôncio, é uma habilidade importante,
não apenas para algumas atividades em classe, como também para o ambiente
profissional Ele diz duvidar que essa habilidade possa ser ensinada em uma classe
informal, onde a criança é autorizada a trabalhar em material da própria escolha, durante
o tempo que desejar. O autor descreve alguns avanços da modificação do comportamento
na educação nâo mencionados pelos autores, como por exemplo, o Sistema Personalizado
de Ensino, desenvolvido por Keller e seus colaboradores no inicio dos anos 60, Defende

1HoHarxl (19/0) levantou (JteamaAo aemeltiaiite ao ((ueattunar aa n im f* * entre oa anaMaa do aomporUmooto e m ui empreutidortm Pondwou
quo roprosontantim dai liwtKulçOM que empregam oa anabatai do comportamento, aaaim como oa próprio* anaUitai, podem <xx»klor«r o
controle (|ue propõe benevoletrte Aaaeguram que o contrata de GunNnuAndaa de rwkryo *ar* tavortvel paia o contrulado, maa, rnuKa» vwea nâo
eapedflcam quem mhé o mator benefldedo: oa repreaenlantea daa InatttirtçAe« (a indiretamente o anatata do comportamento) ou o mdlvlduo

Sobre Comporttimciito e Cot?niv<1o 339


que modificação do comportamento contribuiu, sim, para as melhorias das práticas
educacionais, independentemente de serem elas novas ou tradicionais, de lidar com
crianças normais ou com problemas de aprendizagem. 0'Leary (1972), afirma:
Psicólogas e educadores de diversos backarounds tâm advoaado um ambiente
estruturado oam crianca com problema especial: ó questionável ate aua. dada a
Uberdade descrita por Silborman. essas crianca.« fariam progressos académicos
tào rápida o auanto em um programa mais estruturada. (p.bOB)
Apesar dessas 0 de outras criticas ao trabalho de Winett e Winkler (1972),
0 ’Leary (1972) diz concordar com os autores em alguns pontos, tais como:
• Na sugestão de ampliar o diálogo entre os modificadores do comportamento para
identificar os comportamentos e valores a ser instalados e reforçados nas crianças.
• No apelo por mais pesquisas avaliando as vantagens, de longo prazo, da escola
informal.
• Quando sugerem que os modificadores do comportamento questionem seriamente
se a mudança de comportamento que lhe foi solicitada deve ser feita e a quem beneficiará.
0 ’Leary (1972) supõe que a: “sala de aula e as metas educacionais futuras
podem ser muito diferentes das classes e metas educacionais dos anos 70, mas os
princípios da modificação do comportamento já conhecidos continuarão sendo aplicados
para mudar comportamentos”, (p. 509) E observa que essa abordagem dispõe de um
arranjo bem definido de processos para mudar comportamentos, mas esses processos
não apontam quais são os objetivos ou comportamontos a ser ensinados ou mudados.
Quanto a educação atual, Luna (2001) traçou um panorama desolador das
contribuições de um analista do comportamento à educação brasileira. Em seu artigo, o autor
relata nào acreditar que o analista do comportamento esteja préparado para enfrentar os
problemas que a cultura apontam e pior, sem perspectiva de cogitação ou preparo para
sequer ensaiar uma resposta. Toda a energia e tempo do trabalho do analista do
comportamento na pesquisa educacional, por exemplo, ó gasto com; "0 desenvolvimento de
sofisticados argumentos teórico-metodológicos no interior de uma comunidade preparada
para cobrá-los"(p. 287), ao invés da identificação e desenvolvimento de técnicas para solucionar
os problemas da cultura. A universidade que, por excelência, é o contro de produção de
conhecimento que possibilita tecnologias capazes de responder às condições e necessidades
da educação, não tem sido capaz de produzir pesquisas de relevância social que modifiquem
as contingências de reforço deficitárias atuantes. O autor comenta que as contribuições da
análise do comportamento, no campo do ensino superior nacional, resumem-se a
contribuições individuais e nào institucionais, reduzindo não só a instituição como centro
regulador de projetos, mas também a própria comunidade acadêmica quanto à inferência
destes projetos. E se a universidade, como instituição, não têm implementado projetos, tão
pouco poderá avaliá-los, ficando a encargo de sociedades profissionais e outros fóruns de
discussões o treinamento de professores e avaliação deste processo, onde são repetidos
alguns conceitos teóricos (como "receitas" ou "formulas”) sem relações com os possíveis
problemas práticos a serem enfrentados pelos futuros professores. Ainda segundo Luna
(2001), a lentidão da análise do comportamento em apontar e solucionar os problemas da
educação é particularmente refletida no descompromisso profissional observado, do forma
mais nítida, durante os grupos de troinamento e formação de professores:
“O que os responsáveis diretos pelo ensino devem conhecer ô quais sâo os
princípios conceituais de uma teoria e de que forma eles podem se reverter em
procedimentos aplicáveis. O que tèm sido passado (aos futuros professores) è 0
resumo da teoria ou, pior, procedimentos dela derivados sob a forma de receitas,

340 P<»ulo A m J if JliiboM P jn e tU Auxill<itlor<i iJr I )m<i W .w # , I írj.j V<iJI<«J<trrs Od«i KurokàWâ
Roberto Alvos Kan.ico
que acabam virando fetiches. A questão è que, para corrigir esta distorção, ò
necessário nâo apenas conhecer bem a teoria, como ter uma visào ciara do que
ensinar, como ensinar e para quem ensinar" (p 289).
Se uma ciência do comportamonto e a tecnologia dela derivada se propõem a
resolver os problomas da cultura através do planojamento e identificação dos problemas,
apontando quais comportamontos humanos contribuirão para tais soluções o quais
tócnicas manterão estes comportamentos, então, a análise do comportamento e os
cientistas pertencentes á comunidade têm fracassado om seus objetivos mais básicos
por quo sequer consegue apontar os problemas. As possíveis soluções, então,
imaginem, quanta distância!

Por que a programação de ensino não se generalizou?


Sendo a programação do onsino um modelo onde o aluno controla sua
aprondizagom, oconomicamente vantajosa por roduzir os gastos financeiros o por objetivar
as motas da aprondizagem, por que tal modelo não se gonoralizou e suplantou os mótodos
tradicionais? Para Skinner (1991), ombora a instrução programada tonha fracassado na
escola, continua vigorosa nas empresas, onde os objetivos com a instrução são mais
claros o especificados. O autor atribui tambóm o fracasso do ensino programado ao
movimento cognitivo quo "pareceu legitimar as teorias tradicionais sobre o ensino e a
aprendizagem" (p. 128) em detrimento das novas propostas. Ele acredita que esse
movimento foi impulsionado pelas disputas entro os Estados Unidos e a Rússia, em
razão do lançamonto do satélite russo Sputnik, no início dos anos 50. O evento, como
observa Skinnor, fez os dirigentes americanos quostionar por que não foram eles [os
americanos], os primeiros a fazô-lo e concluíram que a falha foi da oducação. Resolveram,
então investir pesado no sistoma educacional e a psicologia cognitiva despontava como
a solução mais viávol para promover as melhorias necessárias. (Skinnor, 1991).
O casal Ernest e Julie Vargas (1991) acreditam que, embora o termo instrução
programada não esteja mais em voga, sua tecnologia continua sendo fundamental
para o planejamento da boa instrução. Para elos, ó possível que os princípios da
programação de ensino estejam sendo empregados para fins muito além daqueles
para os quais foram criados, quer o programador esteja ciente ou não da origem do tal
tecnologia. Já Shorman (1992) atribui a falta de generalização do ensino programado á
inórcia do sistema educacional. Ele pondera quo o establishment ó enorme, as
contingências quo o mantóm são múltiplas, diversas e com intoresses conflitantes.
Shorman (1992) rosume assim a situação:
“As barreiras para a reforma educacional sào colossais e até inspiram tenior. O pcxier,
o dinheiro, o investimento em manter as coisas como estão podem se tomar impossíveis
de serem superadas Recomendações até podem ser aceitas apenas se elas nâo
mudarem muito as coisas. Melhorar a instrução ô a meta, mas apenas no contexto de
não mudar nadn que seja importante para quaisquer dos vastos interesses, "(p. 61)
Em uma de suas declarações sobre o tema, Lindsley (1992b) lamentou o fato
de: "ter investido 25 anos do sua vida para desenvolver métodos que poderiam ajudar
sua nação, e descobrir que tais mótodos se tornam inexpressivos". (p. 43) Sugere que a
oducação pública seja privatizada e a aprendizagem comissionada. Propõe a promoção
do medidas mais efetivas para mensurar os resultados educacionais, bem como a
transferência das tecnologias educacionais para a indústria. Ou seja, transformar a
oducação um produto industrializado, de forma que os dirigentes governamentais
possam assegurar os resultados do ensino por moio de ações legislativas.

Sobre (.'omport.imcnlo e Coftnivilo 341


Pennypacker e uma visão selecionista do fu tu ro da Análise do
Comportamento na educação
Para entendermos alguns caminhos da Análise do comportamento na
oducação, om acordo com Pennypacker (1994), é necessário a consideração de alguns
aspoctos das contingôncias envolvidas nos processos educacionais: a rolação custo -
bonoficio, variação o seleção em educação
Em relação às contingências institucionais, Pennypacker (1994) considera dois
tipos de organizações: aquelas que agem para manutenção do comportamento
(organizações tipo S - estáticas), nas quais a variação comportamontal ó muitas vezes
desencorajada, não havendo investimento em solução de eventuais problomas, pois
solucioná-los implica no próprio fim da organização.
Outro tipo de organização (organizações do tipo F - funcionais), as quais
oncorajam o roforçam variações comportamentais e tondem a desaparecer quando
não sâo mais necessárias. Segundo o autor, a história cultural da educação pode ser
vista como um intercâmbio dinâmico entre essas duas formas de organizações.
Considerando a relação custo - beneficio, quando um prática ocorre om alta
freqüência, isso indica a sua adoção por um cultura. A freqüência está rolacionada com as
contingôncias em oporação e quando as contingências mudam, a froqüência de
ocorrências também muda. Mesmo que uma prática ocorra em alta froqüência e so o sou
custo - bonoficio diminui, diminui a sua probabilidade de ser adotada por uma cultura. Da
mesma forma, se uma nova prática ocorre om baixa freqüência e seu custo - bonoficio ó
alto, tal prática deve ser gradualmente extinta, (não sendo mais adotada) por uma cultura
A variação e seleção em oducação estão também relacionados ao custo -
beneficio. Desta forma quando a relação de custo - beneficio não ó satisfatória, há
possibilidade de sublevação, existindo também a necessidade de ajustes nesta relação.
Em busca de benefícios, o governo dos Estados Unidos lançou um programa
(1970) do avaliação do variações em intervenções educacionais, dentro às quais se
destacaram na obtenção de ganhos em habilidades básicas, do solução de problemas
e de autoconceito: modelo de instrução direta (Universidade de Oregon) o o modelo de
Análise do Comportamento (Universidade do Kansas). Porém, os rosultados foram
além do inesporados, contra as expectativas de uma tendência de "sabedoria invontada"
(invented wisdom) em vigor na época.
Do acordo com Pennypacker (1994), o maior instrumento para a mudança nas
práticas educacionais nos Estados Unidos não é a suposta falta de alternativas, mas
as contingôncias institucionais. Provavelmente, uma grande mudança ocorrorá quando
as conseqüências econômicas e políticas das práticas antoriores se tornarem aversivas
Mas, os (poucos) trabalhos aceitos pelas instituições dos analistas do comportamento,
como máquinas de ensino, instrução programada, instrução dirota o ensino do precisão,
possibilitaram melhoras nas práticas de ensino e permitiram uma melhor atuação dos
alunos. O que nós deixa uma pergunta: por que a cultura não dosoja acoitar essas
tecnologias do ensino desenvolvidas pela análise do comportamento?
Pennypacker (1994), aponta que poderíamos considerar que a modida de
bonoficio é diferente para o aproveitamento do aluno e para a instituição, visto que a
ultima se preocupa com a quantidade do mudanças do comportamento por unidade do
tempo, (entenda-se: dinheiro). Inicialmente, as tecnologias de onsino dosonvolvidas
pola Análise do Comportamento podem ser mais custosas devidas às necessidades
de treinamento. Porém, ao longo prazo, tais tecnologias podem ser vantajosas por
pormitir que a relação da quantidade do modificaçõos do comportamento dos alunos,
por unidados de tompo, sojam positivas. Assim, o autor comonta quo oxistom ambientes

342 P.iulo Aiuiro K.irbosii P.mell.i, M.irlii AuxIII.iiIomtle Iim.i W.m#, IItfi.i V.ill.ul.irvs Od<i Kurx>k<iw<i
Roberto Alves H.in.uo
nos quais a mudança do comportamento é válidosa, o ambientes nos quais as
mudanças náo são bem vindas. Mas, se a freqüência de mudanças decorridas de
técnicas oducacionais, baseados em princípios da Análise do Comportamento, forem
decorrências do uso de tais técnicas pelas instituições, ontão a seleção será favorável
para as práticas do analista do comportamonto. Infolizmente, não ó isto que ocorre e as
atuais contribuições ao futuro da educação por ostes profissionais tom sido poucas.

Como um analista do comportamento pode contribuir para o futuro


da educação?
Em um artigo intitulado Agindo para salvar nossas escolast Groor (1996) comonta
como quo as práticas desenvolvidas por analistas do comportamonto têm contribuído para
o futuro da educação. Sogundo o autor, as possíveis contribuições podem ser categorizadas
om: (1) resultados do pesquisas (táticas, estratégias e teorias): (2) progressos na
mensuração pedagógica, (talvez a principal contribuição da análise do comportamonto)
incluindo uma possível convorgôncia, da análise do comportamento, com outras ciências
oducacionais preocupadas com o comportamento de grupo, introduzido a mensuração da
oportunidade de resposta; (3) mudanças conceituais científicas (mudanças opistemológicas,
novas ciências educacionais relacionadas á analiso do comportamento) e (4) expansão de
aplicações da análise do comportamento nas escolas.
Outro ponto levantado pelo autor foi o desenvolvimonto da unidade do aprendizagem,
(ou loarn unit, em inglês). Loarn unit inclui a oportunidade de resposta, a resposta do
ostudanto, além dos estímulos antecedentes e conseqüentes das respostas do professor
o do aluno: "uma inter-relaçào conlingencial entre o comportamento do professor e do
aluno, além de possibilitar uma mensuração imediata das respostas omitidas e do processo
Institucional” (p. 141).
O autor conclui que, mesmo com o desenvolvimento de técnicas de ensino, o
analista do comportamonto não poderá salvar todas as escolas, mas sim, quem sabe,
algumas. Fazendo isso, talvez haja mais espaço para a prática do analista do
comportamento. Groer (1996) finaliza seu artigo com uma provocação: acusa o analista
do comportamonto do pouca atuação profissional, (lontidão na resolução dos problemas
oducacionais) exatamente como Luna (2001) onfatizaria, cinco anos depois.
E. Vargas (1996) aponta, como solução para os problemas da oducação, (om
particular a educação superior) a possibilidade de um modelo para as universidades,
enfatizando as contribuições da análise do comportamento. Em primeiro lugar, a substituição
do modelo de percepção do aluno pelo modelo de contingências de reforço, onde a
variabilidade do ações o seleção ambiental de tais ações (respostas) a partir das
consoqüôncias contingentes que modificam e modelam o comportamento do aluno. Em
sogundo lugar, ao invés da seleção acumulativa (utilizada no paradigma tradicional da
oducação) a modelagem acumulativa dos comportamontos do professor e do aluno e, em
torceiro lugar, utilizar uma variabilidade de instruções (e de professores), enfocando a
variabilidado do comportamentos dos alunos om sala do aula, pois ocorrom diforonças,
ontro alunos, na resolução do problemas, no dosomponho acadêmico e nos repertórios
comportamontais dos mesmos. Já Dunno (2002) acredita que, diante do péssimo atual
cenário, resta aos analistas do comportamonto aponas continuar a dosonvolver, ostudar o
executar estratégias efetivas de educação, que funcionem para várias pessoas, numa
grande variodade do cenários e, osperar, como Skinnor já havia sugerido, quo as condições
forcem a sociodado a tomar molhoros decisões sobro como ensinar sous alunos.
Ou talvez, como salienta Holland (1978), o futuro da prática do analista do
comportamento na educação seja mesmo á margem do establishment. Dito em outras

Sobre Comporl.imrnto c ('oflnlçilo 343


palavras: enquanto prevalecerem práticas de ensino que não rolevarom os métodos e
pesquisas da analise do comportamento, o futuro e as contribuições de uma ciência do
comportamento, na educação, será mosmo ínfima,

Referências

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344 r.iulo Amiri H.irlxK.i r.mctt.i, Miiri.i Auxili.nlor.i tic Ilin.i W.int?, l itfld V.illiidiirvs Od.i Kumk«iw<i
Ivohcrlo Alves H.iiiiito
Capítulo 30
Comportamento criativo & Análise do
Comportamento I: Insight'
Paulo Flicis C/otardelo Delage
Marcus Bentes de Carvalho Neto
Universidade Federal do Pará

Parte 1: Graduallstas Versus Emergentlstas na História da Psicologia


da Aprendizagem
Debates sobre se a aquisição de um novo comportamonto se daria do forma
gradual ou súbita remontam aos primórdios da Psicologia da Aprendizagem.
Historicamente duas formas extremas de se abordar o assunto foram forjadas uma
encabeçada pelos associacionistas, ou gradualistas, que defendiam que a
aprendizagem seria um processo lento, gradual e cumulativo; e outra defendida pelos
gestaltistas, ou emergentistas, para quem a aprendizagem seria, se não em todos,
pelo menos em alguns casos, um processo súbito, que fugiria ao modelo explicativo
apresentado pelos associacionistas.
Dentre os principais representantes do associacionismo estariam I. P. Pavlov
(1849-1936) e E. L. Thorndike (1874-1949). Pavlov defendia que a aprendizagem seria
um processo eminentemente fisiológico, mecânico e lento. Thorndike, por sua vez,
descrevia a aprendizagem como um processo gradual e fruto da associação mecânica
de várias situações com as respostas apropriadas, em um ajusto continuo ao ambiente.
Já sob uma perspectiva gestaltista, um dos seus maiores defensores foi Wolfgang
Köhler (1887-1967). Este autor, em seu clássico livro The Mentalily of Apes (Köhler, 1917/
1957), descreveu uma sórie de experimentos realizados por ele usando chimpanzés como
sujeitos. Estes experimentos sobre aprendizagem em um contexto de resolução de
problemas envolviam um tipo de resolução chamada pelo autor de insight. No presente
caso, o termo pode ser entendido como a súbita compreensão do procedimento a ser
adotado para se chegar à solução de um problema. Essa "iluminação cognitiva" seria fruto
da apreensão visual da tarefa como um todo. A atividade motora final registrada, a resposta
súbita correta, seria apenas o último elo de um processamento interno de ordem perceptual.
Alguns desses experimentos incluíam, por exemplo, deixar o animal preso e colocar
um pedaço de fruta fora da jaula longe do alcance dele (ver Figura 1). Depois eram entregues
a este sujeito duas varetas que poderiam ser usadas para alcançar a fruta. No entanto, as
varetas eram demasiadamente curtas para alcançarem a fruta diretamente. Para solucionar
o problema era necessário, então, que o animal encaixasse as duas varetas e formasse
uma haste longa o suficiente para chegar ao objetivo. Um dos animais, chamado Sultão,
conseguiu resolver o problema sem que nenhum treino direto e explícito fosse feito.
' Tritt***) purcuilmuntt) (IrwnttaOo peto CNPq atrav*« da hotaa d« MmlraJo (uuncodkla ao prtrwtro atfor) e do tdKal Umvenwl 2006, ProuMao No.
47623^04-8 O» huUxwi agradocain as í/nnrrrm m • anrtquacadmw a » **» */» » <k» prutaaniM Etann HarnaMkJ, Paulo Prado a Afcw Bockmann

Sobre Comportamento c Coftniçáo 345


Em outro experimento, os
animais eram postos em uma jaula em
cujo teto havia sido preso um pedaço
do fruta que os animais não podiam
alcançar diretamente do solo (ver Figura
2). Dentro desta jaula, eram
disponibilizadas algumas caixas que
poderiam ser empilhadas sob a fruta,
tornando-a acessivel deste modo.
Köhler (1917/1957) discute os
resultados positivos dos sujeitos neste
experimento defendendo que, ao
resolverem este problema dessa forma,
os sujeitos estariam dando indícios de
que um processo do aprendizagem "por
insight' ostivesso em curso, uma vez
que não havia sido dado nenhum treino
direto e explicito de empilhamento de
caixas sob um objetivo com estes
Figura 1: Resolução de problema através do encaixe sujeitos e a resposta corrota ocorreria
de duas varetas em um dos su|ertc» de K o tter (Fonte' repentina e velozmente em sua forma
http://www.pigeon psy tufts edu/psych26/ definitiva, sem um aparente vinculo com
kohlerhtm). as tentativas anteriores.

Nos dois trabalhos mencionados


a resposta final correta não seria construida
gradualmente por modelagem direta. O
desempenho típico envolveria a seguinte
seqüência; (a) as respostas motoras
observadas nâo levariam à solução do
problema ou a uma aproximação da sua
solução; (b) respostas emocionais
ocorreriam e também não levariam à
solução do problema; (c) ocorreria uma
parada na emissão de respostas motoras
relacionadas ao problema; (d) uma
resposta correta seria emitida de maneira
completa pela primeira vez. Köhler (1917/
1957) concluiu que as respostas súbitas
corretas do item “d” não caberiam em um
modelo de tentativa e erro, pois não
ocorreria a construção mecânica gradual
dessas respostas através de uma série
de variações e seleções. Para ele, a
explicação para a solução repentina e
acabada deste tipo de problema só poderia Figura. 2: Resolução de problema através do
ser achada em uma capacidade do sujeito empilhamento de caixas em um dos sujeitos de
de compreender, prévia e internamente, a Köhler (Fonte: http://www.plgeon.psy.tufts.edu/
tarefa como um todo, o que aconteceria psych26/kohler.htm),

346 P.iulo Mias C/otdrdelo Peldgc, M.ircus Rentes de Cdrvdllio Neto


como conseqüência de uma apreensão visual completa do problema após uma
exposição a ele. Isto caracterizaria para Köhler um outro tipo distinto de aprendizagem:
o insight. Essa forma mais avançada de aprendizagem seria a mais comum em animais
superiores, como homens e chimpanzés.

Parte 2: Algum as Lim itações M etodológicas e Interpretativas no


Trabalho de Köhler
Apesar dos resultados obtidos por Köhler (1917/1957) parecerem, a principio,
oxigir um novo mecanismo explicativo para a aprendizagom súbita, seria preciso
considerar antes alguns aspectos de seu trabalho que podem permitir uma leitura
diferonto dos resultados apresentados.
Em primeiro lugar ele não dispunha de um controle da história prévia dostos
animais. A maior parto dos sujeitos com os quais trabalhou já pertoncia à estação de
pesquisas o já havia participado de vários experimentos antes da sua chegada.
O registro da história daqueles animais na própria estação de pesquisa era
parcial. Além disso, ele desconsiderava que as atividades rotineiras dos animais
pudessem influenciar positivamente os resultados dos testes. Tais atividades poderiam
fornecer, em alguma medida, uma espócie de treino informal e não planejado das
habilidades necessárias à resolução da tarefa.
Como problema adicional, o próprio Köhler (1917/1957) admitia dar algum tipo
de treino prévio no manuseio de elementos presentes nas situações de teste. Ele nào
considerava, entretanto, que tais treinos pudessem influonciar nos rosultados dos testes,
uma vez que a apreensão visual da tarefa de treino e de teste seria distinta.
Um outro problema com as conclusões de Köhler (1917/1957) está no fato de
ele não levar em consideração que a própria seqüência em que as tarefas eram
apresentadas aos animais poderia servir como treino e que algumas tarefas complexas
oram, na verdade, combinações de tarefas mais simples prévia e separadamente
aprendidas. Por exemplo, Sultão foi bem sucedido em um experimento no qual um
pedaço de fruta era deixado fora da jaula do animal. Para alcançar o objetivo os animais
deveriam pegar um bastão preso ao teto da jaula, o qual só poderia ser alcançado
arrastando-se uma caixa (cheia de pedras) presente na jaula. Para ser solucionada a
tarefa exigia que quatro respostas fossem emitidas de forma encadeada: esvaziar a
caixa: empurrar a caixa: pegar o bastão; e por fim, alcançar a fruta. Contudo, ao se fazer
um mapeamento das tarefas pelas quais Sultão havia passado antes do inicio do
experimento verifica-se que ele já havia obtido sucesso em realizar cada uma destas
tarefas separadamente em experimentos prévios. Informações dessa natureza ficam
mascaradas na obra de Köhler uma vez que ele não apresenta os experimentos em
ordem cronológica. Assim, ao descrever um experimento complexo, como o anterior,
antes de mencionar as atividades relacionadas a este experimento pelas quais o sujeito
teria passado, ele torna realmente tentadora a explicação de que a solução do problema
soria devida a uma capacidade inerente ao sujeito, desvinculada de qualquer
aprendizagem, mesmo que indireta, anterior.
Justamente para tentar preencher essas lacunas, Birch (1948) replicou um dos
experimentos realizados por Köhler (1917/1957), mantendo um controlo sistemático da
história dos chimpanzés antes da realização do experimento. Uma fruta era posta fora do
alcance do sujeito e uma vareta em forma de "T" era deixada disponível (ver Figura 3). Em
uma primeira situação, antes que qualquer treino fosse dado, quase todos' mostraram-se

Sobre Comportamento e Coflniç.lo 347


incapazes de resolver o problema. Depois dessa primeira fase, os animais foram levados
de volta às suas gaiolas viveiro e foram disponibilizados alguns bastões, aos quais eles
tiveram acesso por três dias. Após esse período uma nova sessão de teste, idêntica à
primeira, foi realizada. Desta feita, todos os animais prontamente resolveram a tarefa.

Figura 3: llustraçáo da situação-problema do experimento com "bastões T" em Birch (1948). O sujeito
deveria puxar o bastão em forma de T e assim arrastar para si o pedaço de comida.

Assim, Birch (1948) concluiu que apesar de algumas soluções não poderem
ser explicadas de maneira direta e simples pelo paradigma da "tentativa e erro", elas
não estariam desvinculadas da história prévia dos sujeitos. O fenômeno do insight não
ocorreria na ausência de certos comportamentos pré-requisitos. A resolução súbita de
alguma forma dependeria da existência, no repertório dos sujeitos, das habilidades
que comporiam a resposta final nova. Sem tais componentes o fenômeno não ocorreria
Cerca de 40 anos após a publicação do trabalho de Birch (1948), Epstein (1985a,
1987) e Epstein, Kirshnit & Lanza (1984) deram um passo adicional ao demonstrarem
em detalhes que padrões comportamentais do tipo insight poderiam ser explicados
como uma interconexão espontânea de repertórios previamente aprendidos. No primeiro
trabalho abordando o tema, Epstein, Kirshnit & Lanza (1984) replicaram um dos
experimentos do Kõhler (1917/1957) sobre resolução de problemas, mas utilizaram
pombos ao invés de chimpanzés como sujeitos. O experimento em questão envolvia o
empurrar um caixote, que serviria como plataforma, para se alcançar um pedaço de
fruta que estava fora do alcance direto do animal.
Nesse estudo, os pombos eram treinados em dois repertórios distintos
separada mento: (a) empurrar uma caixa em direção a um spot projetado nas paredes
do uma câmara oxperimental e (b) subir em uma caixa e bicar uma réplica de uma
banana feita de plástico1. Após passar por cada uma dessas etapas, os animais oram
submetidos a uma situação na qual a "banana" ficava fora do seu alcance e nenhuma
caixa estava presente, sendo que nesta ocasião nenhuma resposta era reforçada. Essas
sessões, chamadas de extinção das respostas de força bruta, tinham como objetivo
eliminar respostas de alcançar diretamente a réplica por meio de saltos e vôos.
* A* uitiut» oxcoçflo» foram um« fftmea, quo |A havtu ckxnonstrado mk capaz (ia uHuar um baotâo #tn contaxto» rtAn oxpoflmental» 0 um
macho, qua rosolvou o prubloma a partir do movírnwitoi exploratório* mtUaM a rio uao ria uma habNdada functonalmanta «Imitar prevlamantt
aprondkla pagar objato» com uma corda Noa doU cato» oa reaultadoa powttvo* poriam *m atribuído» i exiatónda do corto» ixíHoqutolto»
comportamantata nâo controlado» ou/o pravMo» paio axpatlmontador
1Foi utiluwla uma rrtpllt» do uma tianana como forma da MMra ao» trabalho» rio Kòhlor

348 Paulo flid t Qotardelo Prldftr, M.ircus Rentes de Carv.tllio Neto


Foram definidos cinco grupos experimentais: um que passaria por todas as
etapas (GE); três que não passariam por uma das etapas descritas acima e um que
passaria pelo treino de empurrar, sem que houvesse um spot presente (CG 1, 2, 3 e 4).
Uma voz troinados nas habilidados programadas para seus rospectivos grupos
os animais foram expostos à situação de toste. Nesta ocasião a “banana” ora pendurada
fora do alcance e a caixa de papolão deixada disponível em um dos cantos, de modo
quo poderia ser livremente empurrada até o ponto sob a banana, servindo de plataforma
o permitindo que o operando fosse bicado, acionando o comedouro.
Os sujeitos quo haviam passado por todas as etapas resolveram rapidamente
a tarofa: inicialmento elos apresontaram um padrão chamado de ''confusão", olhando
da caixa para a "banana" e da "banana" para a caixa. Depois se dirigiram para a "banana",
que tontavam alcançar se esticando. Como isso se mostrou ineficaz, voltaram-se para
a caixa, quando ontão passaram a ompurrà-la diretamonte para a réplica, muitas vozes
até mesmo corrigindo a posição da caixa. Após chegarem com a caixa em algum ponto
abaixo próximo do onde a 'banana" ficava pendurada, eles prontamente paravam de
ompurrar, subiam na caixa o bicavam a réplica (ver Figura 4).
Nos outros grupos, os únicos sujeitos que resolverom o problema no tompo
estabelecido pelos experimentadores foram os que só não haviam passado pelas
sessões do extinção das respostas de força bruta. Ao serem colocados na situação
experimental, esses animais primeiro apresontaram uma sério de rospostas de alcançar
diretamente a réplica da banana (o que não era reforçado), o só ontão se voltaram para
a caixa, quando então a empurraram até a "banana" e rosolveram o problema. Os
sujeitos que haviam aprendido apenas uma das duas habilidados necessárias, não
foram capazes de resolver a tarofa. Os animais que não aprenderam a empurrar a caixa
de maneira dirigida (sob controle discriminativo do spot), igualmonto falharam no teste
e empurraram a ferramenta a esmo.

Flcjura 4' SeqüAncia resumida do teste no qual um pombo soluciona o problema "por insight' em
Epstein, Klrshnlt & Lan/a (1984) (Fonte http //www pigeon psy tufts edu/psych26/epstein.htm).

Sohrc ('omportiimcnto c (.'oflnivilo 349


Epstein, Kirshnit & Lanza (1984) analisaram os resultados dos sujoitos do GE da
seguinte forma: (1) a confusão inicial seria na verdade urna concorrência de repertórios
(subir ou empurrar), inicialmonte com iguais probabilidades de ocorrência naquele contexto:
(2) o fato do o animal ter se voltado para a caixa depois do tontar alcançar a réplica da
banana seria fruto do processo chamado rossurgôncia: a oxtinção produziria uma
variabilidado do respostas, contudo ossa variação não soria intoiramonto aloatória. As
rospostas que no passado foram efetivas naquele contexto (produziram roforçamento)
ressurgiriam (para mais informações, ver Bõas, Murayama & Tomanari, 2005; Cleland,
Guerin, Fostor & Templo, 2001; Epstoin, 1983; 1985b); (3) o mocanismo comportamental
que explicaria porquo o animal empurrou a caixa na direção da banana pendurada quando
ele havia aprendido diretamente a empurrá-la apenas na direção do spot seria
supostamente a generalização funcional. Em tese, a replica poderia ter adquirido a mesma
função de reforçador condicionado que o spot, uma vez quo ambos haviam sido paroados
com a apresentação de comida. Desse modo, na ausência do estimulo discriminativo
original (spot), a "banana” assumiu essa função por aprosentar uma equivalência funcional
com aquele estimulo graças a uma história comum de reforçamento (para mais detalhes,
ver Epstoin, 1996, capítulos 2 e 3); (4) por fim, o animal teria parado do empurrar abaixo da
"banana", subido na caixa e bicado a réplica graças à existência de um encadeamento
automático: uma vez que a caixa estava abaixo da banana, o estimulo discriminativo para
a próxima resposta estava prosente o o subir na caixa e bicar a banana era altamente
provávol (para mais detalhes, ver Epstein. 1996, capítulos 2 e 3).
Ao domonstrarem que aponas os animais que passaram por todas as etapas
do treino foram capazes de rosolver o problema, Epstein, Kirshnit & Lanza (1984) não só
confirmaram os dados obtidos previamente por Birch (1948), como identificaram ponto
a ponto os pré-requisitos funcionais necessários à emergência do insight. Adicionalmonte,
por terem usados pombos, os dados não poderiam ser atribuídos a supostos procossos
superiores típicos de animais neurologicamente mais complexos, como humanos e
chimpanzés. A explicação se volta, então, para as contingências ontogenéticas,
acessíveis e manipuláveis, responsáveis pela ocorrência do fonômeno.

Parte 3: Considerações Finais


Posteriormente, Epstein (1985a, 1987), ainda usando pombos, ampliou o
númoro do repertórios pré-requisitos, de dois para três e depois para quatro,
respectivamente, observando como se daria a recombinação espontânea (ou não
dirotamente ensinada) desses componentes em um contexto de resolução de
problemas. Mais rocentemento, Epstein (1996) olaborou uma teoria comportamental
para o insight om particular e para o fenômeno da criatividado em geral.
Apesar da análise do comportamento ter sido provida nas últimas décadas
com instrumentos importantes para lidar com um fenômeno aparentemente espontâneo
o rofratário às contingências de reforçamento, ainda oxistem lacunas a sorem
proenchidas. Três exemplos servirão como ilustração: (a) os resultados obtidos por
Epstoin com mais de dois reportórios pré-requisitos não foram tão claros; (b) não há
demonstração do recombinação espontânea em contextos aversivos, o que limita a
genoralização do fenômeno; (c) ainda não foram empiricamente domonstrados os
papéis da ressurgência, do oncadoamento automático o da generalização funcional no
contexto do insight. Os pré-requisitos para a ocorrência do insight já foram bem
documentados, mas, em contraste, os processos envolvidos na junção “espontânea"

350 r.iulo lli.is 1/otiiuli'lo IM.ifle. M.irtus Hentos de C'.irv.ill>o Neto


desses pré-roquisitos ainda são. em grande medida, desconhecidos. Há, portanto,
uma linha de pesquisa intoira a ser explorada.
No contexto histórico e toórico, o fenómeno do insight foi realmento importante
para mostrar um tipo diferente do aprendizagem, que não poderia ser explicada pola
construção direta o gradual cie um repertório final solucionador de problemas. Um
repertório complexo final pode ser construído indirotamente pela rocombinação de
repertórios pró-requisitos em uma situação problemática. O que não significa, de maneira
simplista, dar ganho de causa ao emergentismo da Gestalt, pois os pró-requisitos
comportamontais do insight ató aqui descritos foram produzidos por reforçamento positivo
direto, em um tradicional modelo de tontativa e erro. Além disso, paroco existir no contexto
de junção “espontânoa" desses pró-roquisitos um papel crucial da função discriminativa
dos estímulos em jogo, o quo, se demonstrado, reduziria sensivelmonto o apelo aos
mecanismos mentais inferidos o manteria toda a explicação no nívol do relações
funcionais externas entre organismo o ambionte.
As duas posições extremistas originais, gradualistas e emergontistas, estavam
igualmento equivocadas em relação ao fenômeno do insight. Ambas, em suas formas
iniciais, eram insuficientes para explicá-lo. O fenómeno comportamental mais uma vez
mostrou-se mais complexo do quo qualquer simplificação dualista para classificá-lo.

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originalmente em 1917

*»obrc C o m p o rta m e n to e Cori)ív<1o 351


Capítulo 31
Urgência e emergência com crianças em
l/T l N EO N A TAL:
Contingências atuais e futuras. É
possível uma intervenção?
Queila Pierre Fernandes*
PWC-Ciimpiiws
Diana Tosei lo Laloni**
IVC-Campinas

Discutir urgências e emergências com crianças em uma Unidade de Terapia


Intensiva Neonatal (UT!NEO\ ê considerar as contingências envolvidas tanto na situação
de gravidez do recém-nascido (RN) em questão, como também analisar as contingências
do parto e do puerpério, observadas durante a hospitalização e internação do bebê.
Durante os meses de gravidez, os pais e as pessoas próximas dos gonitoros
criam expectativas quanto ao nascimento de uma criança saudável, e que esta ao
nascer, fique junto com a máo, por quem deverá ser cuidada e amamentada. E embora
esta expectativa geralmente seja positiva, a maioria das mulheres grávidas pensam na
possibilidade de vir a ter um filho com problemas, o que não significa que estejam
preparadas para tal intercorrôncia (Baptista, 2003).
Quando ocorrem problemas do saúde envolvendo o recém nascido, estando o RN
com risco de vida, configura-se uma urgência ou emergência, ocorre a separação imediata
do bebê de sua mãe para que ele receba cuidados especializados em uma UTINEO.
A internação/hospitalização do RN em uma UTI Neonatal ó uma contingência
aversiva que, frustra os genitores, promovendo a não satisfação das expectativas das
pessoas onvolvidas. Essa condição favorece a elevada freqüência da emissão de
comportamentos emocionais.
A UTI Neonatal, não é como um berçário comum; é o local em quo os Recém
Nascidos não ficam em berços comuns, eles são acomodados em incubadoras, as
quais são capazes de filtrar o ar captado de fora, conservando o calor e a umidade nos
berços, diminuindo dessa forma a agressão do meio ambiente natural sobro oles.
Nas UTI s Neonatal os bebês, durante 24 horas, rocobem cuidados especializados
no controlo do sou quadro clínico e do seus sinais vitais. Para isso ostam ligados a aparelhos
com tubos o fios, com luzes e alarmes que tocam a cada intervalo de tempo determinado,
‘ PkicóUkj* Clink:« - Conlm do Pulcologla o FonomidWogm. Inalltulo Prrt-Gfulro do Campina* n HouplUI MHtmnlditdo CoIbo PlorrtVPUC-
Omnp(nm
**Prof«i»nora do Cunwi do Pikotoytu dH PUCCHmptnatt Docanln do Programa dn P6» (VitdtiaçAo om Pmmloyia. Ctonda » PioIUrAo da
PlJCCampIrut*

352 Q u e il.i Pierrc f crnam lev I >i.in.i liw llo I «iloni


sinalizando as condições físicas e fisiológicas de saúde, como tambóm estào ligados aos
monitores cardiorrespiratórios, ventiladores mecânicos, oxímetros, e fototorapia.
O encaminhamento de Recóm Nascido para uma UTI de Neonatologia pode
ser determinado pela prematuridade (idade gestacional), pelo baixo peso em relação a
idade gestacional, podendo também ter outras indicações, como malformações
congénitas; doenças respiratórias, infecciosas; problemas cardiovasculares,
neurológicos, hematológicos, metabólicos, além de indicação para cirurgias.
Essa decisão ó realizada por módicos especializados em bebôs recém-
nascidos (até as quatro primeiras semanas de vida), chamados de neonatologistas, os
quais após o nascimento avaliam os bebôs em relação ao seu peso e idade gestacional,
essa classificação reflete a suficiência do seu desenvolvimento intra-uterino, podendo
prever a possível morbidade (outras doenças associadas) e mortalidade (probabilidade
de óbito) (Almeida e Kopelmam, 1994).
Segundo Baptista, (2003) os diagnósticos módicos mais freqüentes em uma
UTINEO são: prematuridade, membrana hialina, slndrome de aspiração de mecônio,
anoxia neonatal, hidrocefalia, mielomeningoceles, hipoglicemia, icterícia fisiológica e
doença hemolítica do RN por incompatibilidade do sangue. Contudo, faz-se necessário
salientar que os diagnósticos mais freqüentes, podem ser diferenciados de acordo
com algumas variáveis e/ou características da instituição hospitalar, como por exemplo;
população atendida, recursos tócnicos o humanos disponíveis, localização goográfica
e modelos da organização hospitalar (Laloni, 1997)
A UTI de Neonatologia tem como objetivo a atenção aos problemas de saúde
do R N, deste modo o paciente da equipe, na UTINEO, é o bebê recém-nascido
Entretendo para o psicólogo, analista do comportamento, que seleciona como o objetivo
da intervenção, a descrição e análise do comportamento quo se insere no contexto
hospitalar, a proposta de intervenção está relacionada á modificação das circunstancias
hospitalares em que o cliente responde desajustadamente. Os pacientes alvos da
intervenção são os cuidadores dos recém-nascidos, sejam olos os genitores (pais
biológicos); pais adotivos; os avós; ou outros familiares responsáveis. Assim delermina-
se o objetivo do trabalho de assistência psicológica junto à UTINEO.
Promove-se a avaliação e intervenção nas contingências que podem estar
relacionadas ao nascimento o à hospitalização do bebê com algum comprometimento de
saúde. Observam-se em especial as contingências que estão envolvidas com o
conhecimento dos genitores e responsáveis pela doença do RN, pela sua evolução,
pelos cuidados necessários e pelas expectativas quanto ao desenvolvimento da criança.
Interfe-se diretamente com o favorecimento da vinculação do bebê com o cuidador, o bom
contato entre os membros da equipe de saúdo e destes com os pais ou responsáveis.
Oferece-se um Modelo de Assistência Psicológica om UTINEO, baseada nos
princípios da Análise do Comportamento São descritas as ações realizadas por
psicólogos do Serviço de Psicologia de um hospital escola.
1. Em primeiro lugar os psicólogos responsáveis pela UTI Neonatal passam visitas
pelas salas da unidade para verificar quem são os bebês internados, porque estão
internados e qual o prognóstico da internação.
2. Após a primeira triagem que é feita pelos psicólogos, segue-se uma discussão dos
casos com a equipe de saúde, que inclue os módicos e a enfermagem, com o objetivo
de identificação de: nascimento de novos RNs; informação do diagnóstico atual e
prognóstico dos RNs (evolução módica dos pacientes - se houve modificação na
quantidade de aparelhagem de monitoração dos bebês já atendidos); percepções da

Sobrr (.'omportamrnto c Cogniv<1o 353


equipe em relação ao estado psicológico dos pais (ex.: se houve interesse dos pais em
saber o diagnóstico/prognóstico, se mostraram desejo para contatar com o bebô).
3. Em seguida faz-se a leitura do prontuário do RN, para compreensão do diagnóstico
médico e avaliação das possfveis conseqüências desse diagnóstico sobre os pais.
4. Uma fichn de registro dos dados psicológicos ó colocada no prontuário da criança. Essa
ficha contém dados de identificação dos pais do RN, história gestacional atual e anterior,
dados do parto atual, diagnóstico e tratamento do RN, comportamentos observados dos pais
o outros familiares em relação ao diagnóstico e dos comportamontos de interação dos
familiares com a criança e com a equipe.
5. O contato com os pais (e/ou responsável) do RN hospitalizado é efetuado por melo de
entrevista semi-estruturada, inicialmente com objetivo de apresentação do Psicólogo e do
Serviço de Psicologia, como parte do atendimento interdisciplinar da UTINEO. Em seguida
coleta de dados complementares; informação e orientaçãosobre a rotina; avaliação sobre a
compreensão dos pais em relação ao motivo de internação (diagnóstico o prognóstico) do
RN; e avaliação das reações psicológicas dos pais frente a hospitalização do RN, ex.: sono,
alimentação, comunicação, apoio familiar, choro, humor deprimido, apatia, irritabilidade, medos,
ansiedade, expectativas positivas e negativas.
6. O acompanhamento dos pais durante a permanência do RN na UTINEO tpm o objetivo de:
Avaliar comportamentos de vinculação como olhar, tocar e falar do RN e com o RN,
realização da amamentação e/ou ordenha; estimular na mão (o/ou no pai) comportamentos
do contato com o bebê visitando-o, e acompanhando a evolução por meio de discriminação
das contingências de hospitalização e interação com a equipe módica (discriminação das
contingências de hospitalização) e treinar/modelar comportamentos adequados dos
cuidadores promovendo a participação destes nas práticas hospitalares e/ou através do
informações que esclareçam a natureza dos sintomas dos bebês e as condições biológicas
do recòm-nascldo, a fim de que após a alia hospitalar a criança osteja assistida (discriminação
das contingências de cuidado da criança).
7.0 contato com a equipe compreende a discussão dos casos com a oquipe do saúde e o
Serviço Social, visando o parecer psicológico, com o objetivo de fornecer modelo de como
lidar com os pais e familiares do RN e prover aspectos referentes ás necessidades
psicossociais, tais como falta de recursos financeiros da familia para transporto impossibilitando
visitas regulares ao RN, dificuldade de outros recursos como alimentação, moradia e
manutenção medicamentosa do RN.
A triagem psicológica é a entrevista inicial que tem como objetivo o estabelecimento
de critérios de identificação das prioridades de atendimento psicológico, a partir dos dados
coletados junto à equipo e por meio da leitura do prontuário. 0 objetivo principal ó a identificação
das contingências de saúde e doença sobre o comportamento dos familiares da criança e
sobre a equipe de saúde, sempre atento aos comportamontos nas circunstancias da
hospitalização, sobre o diagnóstico e sobre o tratamento.
É por meio da triagem psicológica a definição das emergências e urgências
psicológicas da UTINEO; pois uma vez que nos casos em questão, existe um risco
biológico (a análise das contingências da enfermidade), a triagem psicológica busca a
identificação dos fatores de risco psicológico, ou seja, a análise das contingências
envolvidas na gestação, no parto e no puerpério. Por exemplo, o comportamento de
vinculação dos pais ao bebê, a presença de pensamentos de perda do bebê, sentimentos
de tristeza, desânimo e desesperança, desestruturação familiar, mães menores de idade,
usuárias de álcool ou droga, entre outros.

354 Queil.i ricrrr frrn.imlcs, Pi.m.i foscllo l .iloni


A literatura indica uma diversidade de variáveis que no período neonatal podem
favorecer o desenvolvimento de comportamentos de risco psicológico, e a experiência
clínica tem demonstrado que a avaliação desses fatores é importante, pois são fatores
que podem ser considerados preditivos para comportamentos desadaptativos dos pais.
Esses fatores podem ser indicados como a ausência de exames pré-natais, ausência de
planejamento da gravidez e falta de apoios psicossociais, primigestação (primeira gestação
da mãe), condições educacional,profissional e econômica, desfavoráveis, rede de apoio
social insuficiente ou ineficiente.

Caso Clinico:
Apresenta-se a seguir o relato de um caso clínico para exemplificar o
atendimento.
Inicialmente houve uma solicitação da equipo módica e de enfermagem de
acompanhamento psicológico para o caso com as seguintes queixas da equipe:
• "A mãe de RN (LH) tem alguns vícios (cigarro e bebida) os quais são incompatíveis
com a necessidade do RN sor amamentado. E precisamos iniciar a amamentação o
quanto antes, para que ele comece a ganho de peso, mas ainda não foi discutido isso
com a mãe..." (queixa da equipe médica).
• "A mãe do RN ó alcoólatra e tem vindo visitá-lo embriagada!!" (queixa da equipe de
enfermagem).

Dados do prontuário:
Identificação do RN'
• sexo feminino
• 3 dias de vida
• Nascido de Parto Normal
• Idade Gestacional; 36s3d
• Peso: 1550g

Hipótese Diagnóstica Médica:


• RN Pró-Termo (RNPT)
• Pequeno para Idade Gestacional (PIG)
• Baixo Peso (BP)
"• Infecção ovular

Conduta Médica:
• Avaliação clínica e Tratamento clínico-medicamentoso
Alguns Antecedentes Maternos importantes (fatores de risco):
• Um dos filhos falecido aos 4 meses do gravidez, em acidente (atropelamento ??)
• Gravidez não-planejada: resultado de relações com companheiro, em visita intima no
presídio, onde se encontra detido.
• Mãe - tabagista e etilista

Sobre Comport.imcnlo c Cognliita 355


1a. entrevista/atendimento com a mãe de RN:
No dia da solicitação da equipe pelo atendimento psicológico, a mãe de RN
(LH) não compareceu ao hospital, durante o período em que a psicóloga estava presente.
No dia seguinte LH estava junto á incubadora da filha quando foi entrevistada pela
psicóloga pola primeira vez. A psicóloga apresentou-se e ofereceu o atendimento, sendo
imediatamente aceito. Inicialmente foram realizadas intervenções de orientações acerca
da rotina da UTINEO, buscando estimular na mãe de RN comportamentos de contato
com o bebé, por meio de visitas regulares, para iniciação da amamentação.
Quando questionada acerca da informação de ser tabagista e etilista, LH referiu
já ter fumado (cigarro) durante muitos anos, mas que durante a gravidez suspendeu o
hábito. Mencionou fazer consumo de álcool há alguns anos, mas não soube especificar
o tempo. Disse que desde a descoberta da gravidez bebia apenas cerveja em situações
sociais aos finais de semana, e referiu que nas gestações anteriores também consumiu
álcool e os filhos não ficaram internados em UTINEO, tendo recebido alta junto com ela,
após 2 ou 3 dias após o parlo.
Foi feita a orientação sobre a necessidade de interrupção do consumo de álcool
e fumo (cigarro) para iniciação da amamentação (aleitamento e ordenha) a fim de
garantir melhor efetividade no ganho de peso de RN
Quando perguntado sobre o motivo da internação da sua filha na UTINEO, LH
disse que não sabia o motivo, domonstrando não compreender o diagnóstico nem o
tratamento proposto. Foi estimulada pefa psicóloga para ter comportamentos de interação
com a equipe médica para saber da evolução do estado de saúde da sua filha e esclarecer
suas dúvidas acerca do quadro clinico dela. Nesse momento, pediu licença para
ausentar-se, devido a necessidade de realização da ordenha, retirando-se da unidade.

2a. entrevista/atendimento com a mãe de RN:


Dois dias após esse encontro foi efetuada a segunda entrevista, tambóm junto
ao leito da filha,onde LH se encontrava
Inicialmente a intervenção teve o objetivo de reforçamento dos comportamentos
de contato da mãe com o bebê, resaltou-se a importância da visita, da realização da
ordenha e da interação com a equipe médica para acompanhamento da evolução do
bebê. Em seguida decidiu-se pela continuidade da coleta de dados complementares.
Quando questionada acerca das informações sobre composição familiar LH
relatou que tinha os seguintes filhos: um do sexo masculino com 16 anos; outra do sexo
feminino com 12 anos; mais um do sexo masculino com 5 anos; uma gestação
interrompida aos 4 meses por envolvimento num acidente e a filha que está na UTI.
Referiu ainda residir apenas com o filho de 5 anos, na casa de uma irmã, e que
os dois filhos mais velhos residem com a família de um irmão seu e uma cunhada.
Quanto ao pai das crianças informou que os dois primeiros filhos têm o mesmo pai que
se encontrava detido em um presídio no interior do estado. Que o terceiro filho o a quarta
gestação são de outro homem que foi assassinado.
As intervenções anteriores foram mantidas no sentido de fortalecer as
orientações sobre a necessidade de interrupção do consumo de álcool e de fumo
(cigarro) para iniciação da amamentação (aleitamento) a fim de garantir melhor
efetividade no ganho de peso de RN. LH continuou negando o uso de álcool, o fumo e o
poss/vel consumo de drogas.

356 Oucll.i Plerrr fcm,imJes, Di.in.» Foscllo Liloni


Por três dias consecutivos, após a sogunda entrevista, a mãe de RN não compareceu
ao Hospital, sendo que no quarto dia, que foi num final de semana apareceu para a visita. A
equipe de enfermagem relatou que novamente estava embriagada e foi proibida de visitar sua
filha. Diante disso a psicóloga orientou o Serviço Social para que acompanhasse o caso e
tontasse manter LH om acompanhamonto psicossocial. Contudo, a mâo não atendeu a
convocação, o não comparocou novamente por mais 3 dias consecutivos.
Realizou-se a convocação da avó materna do RN para seu comparecimonto no
Hospital. No dia seguinte ela chogou acompanhada pela nora, cunhada de LH, com
quom moram os dois irmãos mais velhos da RN.
O atondimento da avó da criança internada na UTI foi iniciado com a apresentação
da psicóloga e da assistente social. Em seguida foram informadas que o Hospital mantém
ossos atondimontos para avaliar e acompanhar as condiçõos de alta dos RN's.
A partir desse momonto foi roalizada uma entrovista do confirmação dos dados
até então coletados com a mão do RN e a realização de orientações acerca da rotina da
UTINEO, e da necessidade de comportamontos de contato da mãe com o bebô, por
meio de visitas regulares, para iniciação da amamontação, bem como interação com a
equipe módica para acompanhamonto da ovolução do RN e esclarecimento das dúvidas
acerca do quadro clínico de RN.
Quando questionadas acerca do tabagismo o otilismo do LH, foram
comunicadas do comparecimento da mesma em estado do embriaguez. A avó da RN
confirmou a dependência alcóolica da filha e referiu a incapacidade da mesma para
com os cuidados nocossários à RN.
A cunhada de LH rolatou que os dois filhos mais velhos que estão sob seus
cuidados e guarda estariam em acompanhamento psicológico por problemas
emocionais e de comportamento resultantes do 'abandono' da mãe. Essa informação
foi confirmada pelo próprio irmão de RN (16 anos) que diz que a mãe não teria capacidade
para cuidar do bobê, visto as inúmoras situações de sofrimento emocional às quais foi
exposto, por causa da dependência alcoólica da mãe.
Após a análise das alternativas sobre a responsabilização do um familiar sobro
o caso o dianto da indisponibilidade dos membros da família foi efetuada a oriontação
dos familiaros para buscar ajuda junto ao Conselho Tutelar.
No dia seguinto à ontrevista com os familiares, LH compareceu ao Hospital dizendo
ter sido comunicada pelos familiares do oncaminhamonto para avaliação junto ao Conselho
Tutelar. No atondimento psicossocial comoçou a chorar o rolatou dificuldade om autocontrole
no consumo do álcool e cigarro, disso sentir-se ‘envergonhada pela fraqueza emocional',
manifestou sofrimonto e referiu problemas financoiros devido aos vícios.
As intervenções sobre a necessidade de isenção de consumo álcool o cigarro
para iniciação da amamontação a fim de garantir melhor efetividade no ganho do poso do
RN foram mantidas o iniciou-se a análise das contingências do manutonçâo dos
comportamentos de dependência alcóolica da mãe de RN. Foi aprosontada a ela a
possibilidade do ajuda em instituição competente para o tratamonto do alcoolismo, foi
também orientada a busca por atendimento de apoio no Centro do Saúdo, por moio do
acompanhamonto domiciliar. Também foi comunicada da indisponibilidade dos membros
da família para rosponsabilizar-se pelos cuidados de RN, e conseqüente necessidade
do oncaminhamonto do caso para avaliação do caso junto ao Conselho Tutelar.
Após essas intervenções passou a froqüontar regularmente o tratamonto
especializado para alcoolistas, o acompanhamento psicossocial o as consultas

Sobre Comportamento r ('oRniç.lo 357


recomendadas no Centro de Saúde. Compareceu regularmente ao Hospital por dez
dias consocutivos para as visitas e amamentação de sua filha. Durante este período o
RN ganhou o peso necessário, atingindo os índicos necessários para a alta hospitalar,
que aconteceu sob a responsabilidade da mãe de RN, supervisionada pela avó e tia,
conforme avaliação e indicação do Conselho Tutelar.

Referências

Almeida, M F. B ; Kopelmam, D I (1994). Rotinas médicas - Disciplina de Pediatria Noonatai da


Escola Paulista de Medicina.mSâo Paulo: Editora Ateneu
Baptista, A. S D., Furqulm, P M (2003) Enfermaria de Obstetrícia In BaptlBta, M N e Dias, R R.
(Org ) Psicologia Hospitalar, teoria, aplicações e casos clínicos Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan, p 11-33
Baptista, A S. D., Agostinho, V B. M., Baptista. M N e Dias, R R., (2003) Atuação Psicológica em
Unidade de Terapia Intensiva Neonatal - UTI-Neo In1 Baptista, M N e Dias, R R (Org.).
Psicologia Hospitalar, teoria, aplicações e casos clínicos. Rio de Janeiro- Guanabara Koogan,
p 35-52
Laloni, D T (1997), O papel do psicólogo na Instituição hospitalar diante das políticas Institucionais
In: D. R. Zamignani Sobre comportamento e cogniçào (volume 3). Santo André: Arbytes.

358 Qucll.i IVrrc I muimlc«, |)i<in.i Ioscilo I .iloni


Capítulo 31
Controle e autocontrole, seu papel na
cooperação social.*
Rdchcl Rodrigues Kerbauy**
USP

Analisar fatos, publicados om órgãos do divulgação é ostarrocedor, mas tambóm


fasdnanto. No jornal Estado de São Paulo do 5 \ feira, 4 do agosto de 2005, publicaram uma
noticia sobre casinhas do madeira, para meninos de rua. Foram colocadas om terTono publico
ao lado do shopping. Abrigavam cinco garotos de rua e modiam pouco mais de 1,5 motros.
Funcionários da subprofoitura da Mooca estavam retirando as casas, doadas por uma
Associação, com denominação que incluía as palavras casa da criança. Na noticia havia também,
uma critica a solução do profoito, e promessa de oncontrar lugar para as crianças morarem.
No dia seguinte, no jornal, apareceu lista de reivindicações de dez moradores de
rua, rounidos pela pastoral do povo de Rua de São Paulo. Participaram da elaboração do
documento, varias entidades, segundo o padre Lancelloti. Acrescentou que solicitariam
audiência, com o prefeito, moradia imediata para as crianças, ampliação do programa
bolsa aluguel, da prefeitura, pelo quais as famílias cadastradas recebem subsídios em
dinheiro, para complementaçào do aluguel.
As quostões suscitadas, por essas noticiam independonte de seu desenrolar,
são inúmeras o nem todas politicamente corrotas. Arriscarei algumas: As associaçõos
envolvidas perguntaram se o que estavam fazendo, bonoficiaría de algum*» forma as
possoas ou a sociedade? Dar um teto, alimentar famintos, vostir, são atos curativos o
caritativos com todas as limitações das palavras aqui empregadas. Provavelmonto um
psicólogo perguntaria: por que essas crianças estão na rua? Vamos procurar suas famílias
e verificar seus relatos, bem como os das crianças. Quais os comportamontos de
convivência que estão faltando para ambos, pais e crianças. Como ó possível intormodiar
as relações e mostrar alternativas para ambos, e como administrar conflitos, ospocialmento
os identificados, Os país, estão trabalhando e as crianças freqüentando escolas? Como
fazer para manter condições possíveis, para as crianças ató tornarem-se índopondentos?
Quais são as razões efetivas para eles comportarem-se, ou seja, quais são as
contingências efetivas do reforçamonto? Aqueles que se propõem a ajudar so quostionam:
quero bonoficiar as pessoas para assemolhar-so a mim, passar uma monsagom roligiosa
ou poiitica ou realmonto verificar o quo ó ajuda, naquolas condições om que vivom.
Fatos como esses, suscitam questões quo tem relação com a suscetibilidade a
reforçadoros e põe om discussão o que ó cooperação social.

Suscetibilidade aos reforçadores


Os valores de sobrovivência e a conseqüente sensibilidado aos reforçadores
mudam quando as condições mudam. Por exemplo, quando as pessoas têm que se

* ConfiKtHicta imilnrldH iih ABPMC. 2005 e «IiuiILíík Ih


‘ ‘ ProlHusofd Tllulnr d« USP. PilcôtoyM clinica *

Sobre Comportamento i* Cojjniv.lo 359


defender do predadores,ou ató de outra pessoa, é importante atontar para os sinais do
porigo e dofender-so. Esse comportamonto de dofonder-se, o o reforço conseqüente, tôm
menos importância, em relação às mudanças, que o próprio defondor-se propicia. Por
oxomplo, os velórios, com noito velando o corpo o quo variam, nas diferentes culturas, estão
sendo altorados nos grandos centros, aqui no Brasil, polo medo de assalto. Fecha-se o
volório há corta hora o rotoma-so no dia soguinte iKrfa manhã. Outro exom|>lo: sair a noito,
ostá sondo roalizado com táxis, por muitas pessoas entro elas pessoas idosas ou por
aquolos quo irão ingerir bebidas alcoólicas. Sáo mudanças do sobrevivência e quo diminuem
o valor de outros roforçadoros envolvidos como o prazer do ir e vir o oxibir o carro próprio.
A cultura tem como função, corrigir disposições inatas, o propor técnicas de
autocontrole que diminuem o efeito de certos roforçadoros, pormitindo mudanças.
Verificamos osso processo, através dos tampos. Rocentemorite, assistimos
modificações no comportamonto sexual: nos anos sessonta, com a liberação sexual,
dovido à p/lula e novos concoitos e nos anos noventa, devido o aparecimento da AIDS,
estamos percebondo a necessidade de alterar a suscetibilidade ao roforçamonto sexual,
incorporar sexo seguro, com omprego do camisinha, o começamos a vivor o fato de que
soxo sem um planejamento familiar cuidadoso podo significar superpopulação. Há
mudança na susceptibilidade ao reforçador, mas há também o estabolecimonto de
novas regras o aprendizagem de seqüências comportamentais. Ambos são dificeis de
instalar, pois implicam em fazer as contingências atrasadas influenciarem o
comportamento e tornarem-se eficazes.

Autocontrole e cooperação social


Autocontrole é então comportamento básico. Sua definição, proposta por Skinner
em 1953 , deixa claro que “ o individuo vem controlar parte do sou comportamento quando
uma resposta tem conseqüências que provocam conflitos- quando lova tanto a reforço
positivo quanto negativo."p.134. Um auto governo é invocado, pois "o organismo pode tornar
a resposta punida menos provável alterando as variaveis das quais ó função. Qualquer
comportamonto que consiga fazer isso será automaticamonte reforçado. Denominamos
autocontrole ostes comportamentos.”p. 135. Skinner arrolou técnicas do autocontrole que
são também aplicadas ao comportamonto de outras pessoas o que torminaram por explicar
o processo do autocontrole.
Convém salientar quo esse capitulo foi o primeiro capitulo do livro sobro o assunto
na psicologia, sendo importante por tirar as pessoas do desamparo, e do doixar a mereô
das forças externas. No autocontrole a possoa podo identificar o comportamonto a ser
controlado. Dessa forma a quostão prática de como conseqüências tardias podem ser
oficazos é respondida e são planejadas práticas ou técnicas oficazos. Mas sempre está
embutida a noção de quo a cultura precisa ensinar como altorar o ambionto.
Autocontrolo consiste em optar entro agir impulsivamonto, usufruindo do reforço iinodiato
e monor o autrxxjntrolar-s© e obter reforço tardio, goralmento »naior. Por isso é considerada por
Baum (1994/1999) uma contingência - armadilha. No ontanto é necessário salientar que o
comportamonto que altora as variáveis é automaticamente reforçado, como Skinner salientou
As alternativas dispostas pela comunidade podom parecor autenticas, mas os
organismos cooporam quando as suas ações são reforçadas e competem quando somente
o comportamento do um, pode ser reforçado, om determinada situação. Esses dois processos
estão bastante relacionados. Toohcamento a cooperação è produtiva, o as cousas não poderiam
tor acontocido durante a história humana, sem ela. No entanto, embora a competição fomoça
consoqüências aversivas, para as pessoas, ela podo ser responsávol por comportamentos
quo ponnitom invenções e descobertas, estudar e implementar as altomativas comportamentais.

360 li.irlicl Rmlrlqui*« Ki*rb,iuy


Keller e Schoenfeldd, 1950, descrevem o comportamento social como aquele
para o qual estímulos reforçadores ou discriminativos são, ou foram, mediados pelo
comportamento de outro organismo. p.271.Por mediado entendem conexão com. Portanto.a
cooperação incluem vários tipos de situações e respostas.Esses autores definem
cooperação como o caso no qual o comportamento combinado de dois ou mais organismos
é necessário para obter reforço positivo, ou remover negativo, ou remover o negativo, para
um ou outro. Dois organismos podem desempenhar o mesmo ato. Para esses autores a
cooperação supõe duas coisas; 1) cada ação do organismo deve ser discriminativa para o
desempenho do outro; e 2) cada organismo deve ser reforçado na parte que desempenha
no esquema cooperativo.p.375. Como eram usuais nos primórdios, 1950, os exemplos
eram experimentos com ratos. Os animais para obter alimento precisavam trocar o tempo
entre alimentar-se, que só um poderia fazer e impedir o choque, que os dois receberiam.
Trocavam de função o um sinalizava ao outro que estava na hora de trocar, através de
oslimulos aversivos de mordiscar o rabo do rato que comia, até este lhe dar "a vez".
Os homens vivem em comunidades que são parte importante de seu meio. Desde
recém nascido a cultura começa a fazer um produto que ela aceite e faz isso treinando.
Diferencia respostas ou cadeia de respostas, condiciona reações emocionais a estímulos
e ensina a pessoa o que pode ou não fazer. Mostra comportamentos sociais permitidos e
proibidos, ensina até mesmo uma linguagem. A cultura ensinaria as regras e sanções e os
reforçadores possíveis.
Nesse sentido, “A cultura é um espaço experimental para estudar comportamento".
E'um conjunto de contingências de reforçamento ... A tecnologia do comportamento que
emerge ó eticamente neutra, mas quando aplicada ao planejamento e a sobrevivência da
cultura, funciona como um valor. Aqueles que são induzidos a trabalhar para sua cultura
precisam acreditar que alguns problemas serão solucionados, mas muitos fatos da cultura
são relevantes para sua sobrevivência “p. 182, Skinner, 1971".
De fato, pessoas que trabalham para o grupo devem ter claro para si quais os
benefícios que usufruem nessa relação pessoa-grupo. Também conhecer o poder que
exercerá e o grau de controle sobre as pessoas, pois se faz promessas e não as cumpre
pode ser desmascarada e substituída. O sistema de eleições seria uma maneira de liberar
conseqüências e fazer a pessoa trabalhar ou ceder à vez. Provavelmente a aceitação da
democracia é não somente pela felicidade e liberdade que oferece, mas pela possibilidade
de exercer contra controle, pelo menos nas urnas.
No século XXI, com a disseminação da internet, verificamos que a forma de fazer
contracontrole está mudando. Os representantes do governo e políticos em geral estão
sendo Inundados por e-mails com diversas cobranças e opiniões. Pode ser que o movimento
de rua, forte nos anos anteriores, seja a etapa seguinte, ou não. Um exemplo atual é a
discussão sobre impeachment. A sociedade exige provas irrefutáveis de algo ilícito para
considerá-lo. ((A permanência do presidente no Planalto até o final do mandato é considerada
importante: a) pela política econômica (retirando juros altos e carga tributária exagerada); b)
pela humilhação dos pais, pois mesmo os que não tinham ilusões sobre o preparo do
presidente para as funções, se orgulhavam da singularidade da condição brasileira na
América latina. O poder político, econômico e social, passou a ser de todo o território nacional
e mostrava a robustez da democracia em 20 anos. c) também a trajetória pessoal, mostrava
que, apesar das desigualdades e pobreza há mobilidade vertical da população. Por isso a
alternativa seria o presidente terminar o mandato cercado por um ministério capaz.
Tentei fazer uma pesquisa, para esta conferência de agosto de 2005, perguntando
as pessoas e anotando sua primeira resposta: o que você acha de tudo que está por aí, de
toda essa situação?(as CPI dramáticas estavam em curso, até meados de agosto) Parei na
décima segunda pessoa. O desanimo e a desesperança e a aceitação da "sujeira na política",

Sobre Comportiimcnfü c CoRnivdo 3 6 1


me incomodaram. Acrescente a isso a corrupção, a mentira, bem como a luta pelo poder sem
pensar no bem do pais, no bem comum. Quatro pessoas preferiam não ver mais noticias.
Somente uma lamentou o fracasso da esquerda e ninguém nomeava claramente o dinheiro
publico para comprar as pessoas. Parece que foi exatamente isto que chocou, e evitavam
falar; verificar que legisladores podiam ser comprados, além da formação de quadrilhas,
lavagem de dinheiro, destruição do provas e as barganhas. A visível corrupção do setor público,
a origem do dinheiro e saber se os culpados serão punidos, o a expectativa de que tudo acabe
sem apuração e punição dos culpados, parece estar presente, como comportamento
encoberto, para essas pessoas de nivel universitário que entrevistei.
Considero que parece não existir clareza, ou preferem não nomear, que a corrupção
coroe as instituiçóos políticas do país, além das pessoas. Não ó apenas o dinheiro em caixa dói
para campanha política, mas suborno de deputados pelo governo, comercialização do processo
democrático. Rompeu-se a independência entre os Poderes quando o executivo passou a
comprar com dinheiro vivo o apoio parlamentar. Teoricamente, e o esperado pela população,
seria que um parlamentar em seu cargo exercesse a cooperação social, o comportamento
conjunto de várias pessoas para obter vantagens e condições para o bem comum.
Embora nas CPI as pessoas se alternem, colunistas, jornalistas e pessoas em
geral, estão impressionadas com a mentira. Um dos entrevistados, por mim, disse: "veja a
CPI, que diversão!" O mentir é um comportamento operante ligado a respostas reflexas.
Quando uma criança mente e recebe uma punição há alteração do ritmo cardíaco, do tipo de
respiração, da resistência da pele, da pressão sanguínea, da secreção dos hormônios, entre
outros. Com a continuação do mentir acompanhado de punição verbal ou outra, o mentir
assume as propriedades dos estímulos condicionados eliciadores da resposta que ó punida
Ê dessa maneira que as contingências mantém um comportamento considerado relevante.
De fato, temos critérios para saber quando alguém está contando mentira. Indaga-
se qual a conseqüência por falar; se há reforço pra o comportamento de mentir, seja evitando
punição , seja obtendo recompensa. Outro critério é verificar a inconsistência do relato; relatou
o evento, mudou o relato, mostrou-se amedrontado ou com comportamentos aparentemente
treinados, ensaiados. Também o relato sendo incongruente, pode ser chamado de mentira
Descobre-se isto através de varias inquirições. Portanto, saber sobre um assunto e relatar é
uma resposta diante de estímulos discriminativos. No entanto, sabemos que quando
apanhadas diante de um “ato vergonhoso" as pessoas inventam desculpas como" minha
infância..." em geral, colocam as causas do comportamento, no ambiente não relatam seu
processo de decidir entre alternativas. Essas circunstancias relatadas, geralmente são
atenuantes que despertam compaixão, e diminuem punições eventuais.
Existe hoje, no Brasil, e em outros paises, a diminuição de pena para a delação
premiada. Teoricamente ela tornaria conhecidos fatos que de outra forma seriam
acobertados. Esse processo se incluiria em uma forma de cooperação social, pois permitiria
sanar problemas que prejudicam o grupo.
No entanto, mentir, sendo tambóm um comportamento de esquiva, ó utilizada para
evitar punições. Observa^e até quase um consenso, uma aceitação da malandragem, de
que todo mundo faz o ninguém precisa pagar. A lei não ó usada e as cousas continuam. No
caso do Brasil, que parece aceitar esses conceitos, mentira não é um comportamento
punido consistentemente e, portanto o autocontrole malogra quando a pessoa encontra
maneiras de evitar a estimulação aversiva.
Nas CPI, e no cotidiano, verificamos que ao mentir as pessoas falam com ênfase,
com laivos de sinceridade afirmam: "não é verdade, isso é mentira". Mesmo diante de
provas, como videos, essas frases são repetidas Esquecem que mentir é antidemocrático
e tratam as pessoas como meias para atingir fins, em geral escusos. Considero, que além
de desrespeitar as pessoas, desrespeita tambóm o 4o. mandamento Honrar pai e mãe,

362 Ktichel Rodrigues Kerbauy


que não os educou... É como se essas pessoas tivessem passado por um programa para
resistir a interrogatórios ou driblar detectores de mentira que registram os comportamentos
respondentes. Foram treinados a não delatar e assim fazem em boneficlo de amigos.
Nessa situação, os jornalistas e o publico aprenderam discriminações sutis de
expressões faciais: um sorriso desdenhoso que elevava o canto esquerdo do lábio superior,
choro falso e até, examinando o DVD, voz fina em certas respostas. Com essos sinais
desvenda-se o teatro ou o mentir.
Seis meses após esta conferencia, na ABPMC e as propostas abaixo, verificam que
a situação ó a mesma e até piorou. Vemos o mentir como forma de convencer, a delação
premiada mostrando a corrupção, o nome dos corrompidos, e a maneira de retirar dinheiro
público. As suposições viraram certezas, sem conseqüências. Pessoas reconhecidamente
do esquema são apontadas como candidatos desejáveis nas eleições por pessoas e pelo
partido político. Também, o poder dos criminosos organizados aumentou e transforma-se em
ameaça e amedronta a população.
Um ponto positivo desses acontecimentos é mostrar que mereceria que nós
psicólogos investigássemos quais são as práticas educativas empregadas nos lares e
nas escolas para ensinar não mentir, e ensinar, também, não se expor em situações ou ser
temerário. Seria identificar o conteúdo dos ensinamentos. Por exemplo,o ensino dos
provérbios com as redações sobre eles, ainda existem? “A mentira tem pemas curtas" que
justifica perguntas de pessoas: como, eles pensavam que não iriam descobrir e quo os
envolvidos não iriam falar?”Exemplifiquei com os provérbios, pois geralmente descrevem
consoqüôncias e advertências o são oportunidade para mostrar as contingôncias culturais
sintetizadas e as mudanças que ocorrem"
A metodologia de pesquisa para os psicólogos seria com questões abertas, para
análise do comportamento verbal. Seriam no máximo seis questões, feitas com mães,
professores e crianças, e que permitisse saber o que é mentir, quais os assuntos que
provocam mais mentiras e quais as conseqüências para os mentirosos. Se as
conseqüências , quando aversivas, são mantidas com consistência. Quais as conseqüências
para falar a verdade. Também, relatar um exemplo de fato recente sobre mentira ou verdade,
a descoberta e o que aconteceu (qual será o fato que as pessoas escolherão contar?).
Após essa primeira fase, de coleta de dados e análise com classificação das
respostas, preferencialmente analisando o comportamento e a conseqüência, e os
resultados descritos, inicia-se a segunda fase: elaboração de um programa de ensino e
aplicação em classes de escolas diferentes e em lares. Registrar os resultados e analisar.
Verificar se a noção de responsabilidade e cooperação social estava clara no programa
aplicado e o que o resultado indica, para continuar o trabalho, refazer ou passar para
próxima etapa.. Claro que analisar o dado e escrever é produzir conhecimento e ter bases
sólidas para continuar. Esses programas precisam ser baseados em compreensão do
conteúdo o reforço explicitado, regras e autocontrole pra garantir comportamentos controlados
por conseqüências tardias. Os trabalhos práticos, como a leitura de noticias e comentários
ou observar comportamentos, seriam para formar pensamento critico, necessário ao cidadão.
A pergunta ampla é quanto à sociedade sobreviveria e por quanto tempo, se as
pessoas ignorassem ou falseassem fatos relevantes. Exemplos recentes e antigos podem
ser enumerados. Segundo alguns articulistas de jornais, exame de documentos, depoimentos,
e artigos de jornal sobre a segunda guerra, não circularam. Sabe-se hoje, que muitas cidades
destruídas eram habitadas, em sua maior parte, por crianças, mulheres e idosos. Parece que
se iniciava nessa guerra o terrorismo, com a finalidade de aterrorizar a população.
Uma outra pesquisa, com participantes adultos, seria sobre corrupção. O que é
corrupção. Quais os pensamentos e sentimentos sobre corrupção e quais conseqüências

Sobre Comportamento c CuRntçSo 363


são esperadas para quem for descoberto. O que se espera da Justiça. O participante
poderia escolher exemplos que conhece e relatar um. Temos assistido fatos como
apartamentos serem vendidos, sendo mal construídos e apresentar problemas, dinheiro
economizado para comprá-los, ser desviado, aumentos indevidos antes de passar escritura.
Os processos, de muitos anos, não ressarcem as pessoas, pelos prejuízos materiais e
morais. Sabemos tambóm de condôminos que nâo pagam condomínio, incluída nele a
água e luz que usufruem e processos que se arrastam e os condôminos arcando com
despesas dessas parasitas, que continuam com seu padrão usual de vida. Também
sabemos de firmas que não pagam a previdência social e no final sâo perdoados, sem falar
naquelas que só empregam autônomos...com firmas jurídicas e assim livram-se de taxas.
E'melhor não mencionar os salários congelados e os prédios e aumento de capital das
firmas ou as novas incorporações que fazem. .Como será o padrào de vida dessos donos?
Qual seria a forma de fazer contracontrole, sem prejudicar-se? Quais os riscos? Existem
comportamentos uteis nesses casos? As punições são aplicadas a quem?
No caso da política, poderiam ser introduzidas contas na internet, e o povo conhecer
sobre o dinheiro que entra e sai e para que. Protestar contra absurdos via internet, comentar
com pessoas, se for político. Impedir a candidatura do político, através de cassação, ou o
partido punido porque os abrigou e endossou. Não conheço pesquisas sobre corrupção.
Existem varias por vadiar no trabalho, que apresentam como controle, as pessoas que
trabalham serem identificadas, avaliadas por elas e pelos outros, No caso dessa avaliação,
há necessidade de critérios objetivos, comparação com grupos, fatores adicionais como os
componentes criativos, complexidade do comportamento e impedir inveja e perseguição.
A possibilidade de revoltar-se contra a exploração depende do comportamento
verbal das pessoas naquela sociedade. Mesmo fazendo comparação entre participantes
de dois grupos sabemos que os rosultados mostrarão a variação nas épocas e depende
da história de reforço das pessoas. O contra controle é outra parte desse processo, de
alterar as condições existentes, como veremos Esses assuntos e outros nos levam a
questionar a possibilidade real ou teórica do contra controle.

Contra controle
As relações coercitivas ou exploradoras sâo condições para desencadear a
busca de relações melhores. Ameaças de greve, de revolução, de divorcio podem coagir
o parceiro que ofende. Promessas e ameaças podem mudar a relação. O controlador
infringir dor ou perda de recursos, são instrumentos de coerção, mas podem induzir
agressão e ressentimentos, tornando as pessoas infelizes. Ainda é lembrado com
freqüência aqui no Brasil, que Collor confiscou a poupança, tirou a fonte de renda,
guardada com sacrificios para comprar algo ou melhorar a aposentadoria. Isto após a
ministra Zélia dizer na TV que a poupança não seria alterada. Pessoas acreditaram e
depositaram nela suas economias. Os efeitos respondentes permanecem para muitas
pessoas, ainda, apesar do dinheiro ter sido devolvido após processos de requisição.
Portanto, o autocontrole, que chamei de comportamento básico é fundamental
para o contracontrole e cooperação social. É através desse comportamento que trocamos
os reforçadores e esperamos por conseqüências tardias. Ter autocontrole é fazer opções
entre alternativas conhecidas É possível escolher e analisar se aquele comportamento
de contracontrole trará benefícios ou se a perda resultante dele será maior A cooperação
social implica nos dois comportamentos, pois há sempre escolhas, analise da situação
e perdas que precisam ser dimensionadas. Teoricamente na cooperação social cada
um tem um papel a desempenhar e pode até precisar aprender a ceder a vez ou examinar
em detalhes os benefícios para um maior numero de pessoas.
Como já foi salientando, essa conferência apresentada na ABPMC, em 2005,
ao ser revista para publicação, mostrou-se atual. Os fatos políticos se destacam no

364 R»kI)cI Rodrigues Kcrbauy


noticiário bem corno o negar e o mentir. Supõe-se quo o mentir convença ingênuos ou
dosinformados, enquanto se propaga à idéia “que sempre foi assim...". Parece quo
divulgam uma idéia de esquerda transvertida em populismo, e esquecem de dizer que
o roubo antoriormonto existente é pessoal, escondido para não ser doscoberto o não a
montagem do uma maquina de corrupção e compra o patrimônio publico.
O fato mais novo é a história deturpada, em quo acordos soculares so
transformam om roubo o acordos comerciais inoxistem. Com nomo de globalização ou
proteção de outros corroligionários políticos, o Brasil perde seu carater e padrões culturais
o proteção do próprio povo. De fato as diversas culturas interagom om niveis do mercado,
mas proservam as diferenças e direitos, prosorvar sua cultura. Compreendor a cultura o
os problemas vividos no passado por esse povo. nâo obriga a osquecer acordos atuais.
Essa noticia nos remetem ao ensino, pois provavelmente a maioria da população
não aprendeu muito do história da América Latina. E possivolmente não discutiu o bom
publico e o privado o a ética do exercício do poder. Essos conhecimentos estão faltando
para o exercício do contra controle, que exigo escolhas com conhecimento de
consoqüôncias. Exige também o conhecimento dos fatos discutidos.
A universidade está passando por um teste difícil com a discussão sobro cotas.
É aceitar um "politicamente correto" de beneficiarem nogros e estudantes de curso
medio publico e esquecer que a universidade é solotiva. Ela supõe a produção do
conhecimonto o exige niveis de excelência que se abaixarem colocarão o ensino
universitário nas mesmas condições injustas do ensino elemontar. Outras soluções
menos populistas são urgentes.
Fato antigo, agora mais veiculado é à força das organizações criminosas, o do
poder economico e politico que tem. O julgamento moral da população é bloqueado
pela impunidade e por conceitos de direito que precisam ser melhor conhecidos.
Novamente base para contra controle e claro autocontrole, pois expor-se pode ser
temerário. Também, quando os ideais são traídos, há desmoralização e desanimo.
Observa-se que há questões inadiáveis que são “resolvidas” com promessas
sem um plano integrado a longo prazo. Como exemplo, sabemos que há necessidado de
escolas que ensinem, mas tambóm do oportunidades do trabalho para os formandos.
Nesse caso, a palavra ética, tão empregada, precisaria traduzir-se em escolas que
beneficiem o maior numero de pessoas para que possam tor uma vida digna. Caso
contrário nos resta cantar e refletir sobro as palavras da musica Vozes da seca, de Luiz
Gonzaga e Zé Dantas: “uma esmola a um homem quo é são ou lhe mata de vorgonha ou
vicia o cidadão".

Referências

Qaum, (1994/ 1999) Compreender o behaviorismo Trad. Teresa Araújo e Silva, M.Amélia matos,
Gerson Y. Tomanari © Emanuel Z Tourinho) Porto Alegre Artmed
Keller F S e Schoenfeld. (1950/1966) Princípios de Psicologia, Trad (Carolina M Bori e Rodolpho
Azzi) São Paulo: Editora herder
Gonzaga L. e Zé Dantas. (1981) Vozes da Seca. CD A viagem de Gon/agão e Gonzagulnha
Sklnner< B F (1953/) Ciência e comportamento humano Trad (João Cláudio Todorov e Rodolpho
Azzi) Brasília' Editora Universidade de Brasília
Skinner, B,F. (1971/1972) O mito da liberdade, (Tradução de Leonardo e Maria Lucia Goular1)Rlo de
janeiro: Edições Block.

Sobre t*ompor1iimrnU> c C o r u í^ Io 365


Capítulo 32
Registros esparsos de uma supervisora
para terapeutas em formação:
intervenção sobre fatores de
estresse na terapia.
Ucgina Chrislina Wielenska*

Estressores, no presente contexto, serão entendidos corno as possíveis


incidências de estimulação aversiva sobre o terapeuta e/ou sou cliente no desenrolar
da consulta.
O inicio da terapia ó terreno propício para nos interrogarmos sobre o tema da
aversividade. Quais fatores conduziram o cliente a buscar ajuda? Vamos imaginar dois
clientes: Pedro e João.
João chega ao consultório sob controle da regra de que “terapia ó algo que
pode lhe ajudar a lidar com os problemas que ocorrem om sua vida". Sob a ótica do
terapeuta, ele está em ligeira vantagem se comparado a Podro, o quaí "não acha que
tem problemas, não acredita em terapia, e veio só porque a família insistiu muito, fez
chantagem, ameaças".
João enfrenta, em sua vida, problemas que, om um momento futuro, serão
extensivamente caracterizados polo terapeuta. A busca da terapia pode sor vista como
uma resposta de fuga/esquiva da estimulação avorsiva gerada fora da sessão. João
aprendeu que o terapeuta ó alguém capaz de ajudar a pessoa quando sua vida "não
anda bem". Neste caso hipotético, João sofre ao intoragir com seus familiares, amigos
e colegas de trabalho por não dispor, em seu repertório, de comportamentos assertivos.
O torapeuta auxiliaria na instalação de repertório adequado.
Podro, por outro lado, também está exposto à aversividade ern sua vida. Ele
usa álcool o cocaína "socialmente" o muitos o condenam por este modo de agir. Ser
criticado é a estimulação aversiva primária o sou repertório de brigas, montiras e
afastamento social foi modelado socialmente como solução do curo prazo. Na opinião
cio Podro, submeter-se á terapia seria outra fonto do estimulação avorsiva, já que ele
não vô problemas em ser usuário freqüente das substâncias de abuso o não "tem
vontade alguma de falar sobre sua vida com quom não o conhece". Podro concordou
om marcar consulta estritamente como fuga da estimulação aversiva gorada pela
pressão de que elo "deveria se tratar": os outros acham que ele onfronta mal seus
problemas e lhe obrigaram a fazer terapia.
Rosumindo: para um cliente, terapia podo sor parte da solução, o para o outro ela é
parto dos problemas... Ambos precisam do ajuda, e acreditamos ser possívol intervir

coimulttato pHrllciilHi

366 Rctfin.i (.'hristin.i Wielcnsk.i


adoquadamonto. Comparando-so a João, ó provávol que Pedro colabore menos com o
torapouta e aprosonto baixa tolerância fronte a qualquor aversividade na intoração terapêutica.
Considerando haver um controlo comjxxtamental reciproco entro os participantes da relação
terapêutica e, com base na diferença aqui descnta, Pedro tem mais chance de tomar-se um
estímulo aversivo para o terapeuta do que João. O clionto reforçador tonde a expressar intoresse
nas falas do terapeuta, discute as idéias apresentadas, froquontemento segue as instruções,
apresenta uma classe de rospostas que denominamos de postura colaborativa. É tato quo
isto não basta para assegurar mudanças clinicamonte rolevantos na rolaçào entre o clionto e
o mundo quo o corca, mas configura-se como um primoiro passo para favorecer a adesão ao
tratamento o manter o terapouta indinado a dedicar-so ao cliente.
Uma ostratógia possivol para prevenir que a estimulação aversiva afete a relação
entro Podro e seu torapouta seria, logo de inicio, estabelecer, por exemplo, um contrato
nos seguintes termos:
"Pedro, mnguèm agüenta terapia sem ver motivo para isso. Vocô está corto em
reclamar Garanto que fazer terapia só por obrigação nem funciona Quanto aos
problemas que os outros acham que vocô tem, sô posso dizer que não tenho a
menor idéia do assunto sem conhecer um pouco de vocô, de suas opiniões, do teu
mundo e das situações que os outras acham que são problemas. Se você quiser,
podemos marcar duas ou trôs sessões avulsas, apenas para entendermos de quo
jeito anda tua vida. Ai eu posso dar uma opinião mais embasada, dizer com franqueza
se hô alguma justificativa, um motivo "técnico", para quo eu recomende terapia a
vocô A decisão fínal é sempre sua Quem sabe pensamos om jeitos de delimitar
com sua famflia onde começam os seus direitos e acabam os deles. O que v. acha?”.
Com esta proposta, espera-se que Podro veja o terapouta como alguém
gonuinamente preocupado em lhe auxiliar, não apenas interossado em satisfazer à
família a qualquer preço. A congruência entre a proposta definida no contrato e os
comportamentos subseqüentos do terapeuta vai, parcialmente, detorrninar a adesão
ao tratamento e a confiança, admiração e respeito que o cliente desenvolverá pelo
profissional. Se nossa intervenção hipotética for bom sucedida, ocorrorá rodução da
aversividade na sessão para ambos os participantes o a terapia do Pedro poderá se
voltar para outras questões ainda mais prementes.
Agora procisaremos voltar ao caso de João. Suas sessões caminhavam do
modo satisfatório, o algumas vezes olo fornoceu, de modo casual, informações como
“rompou amizade com a possoa tal", "saiu do omprogo x porque o clima ficou insustentável".
Os dados que surgiam referiam-se a situações nas quais o cliente concordava em fazer
coisas que proferiria ter recusado: impossibilitado para dizer não, submetia-se ao pedido
do torceiros e via a si próprio como "covarde, modroso imbecil”. O terapeuta se perguntava
se tamanha insatisfação alguma vez resultou em briga. Mas João, cuja história do vida
familiar incluiu o fortalecimonto precisamente de comportamentos obediontos o não-
questionadoros ("pessoa correta é quem está sempre disponívol, se sacrifica pelos outros,
obodoce aos mais velhos, acata as autoridades..."), não mencionava que 'pordou as
estribeiras", meteu-so em brigas. Como o terapeuta foi treinado a prover quo possoas
inassortivas podem explodir após uma sucessão de episódios nos quais se sintam
"usadas o abusadas, incapazes do dofesa", lho ocorrou sor esta uma possibilidade a
investigar no caso atual. Uma pergunta direta talvoz deixasse o clionte constrangido, visto
que ele evita decepcionar ou desagradar possoas. Se estivesse proocupado om agradar
o terapouta, seria improvável relatar quo pordou o controle e foi agrossivo com algumas
possoas. Se perguntado diretamente, o clionto podoria esquivar-se, e talvoz rocorresse a
uma mentira o negasse as explosões de raiva. A mentira ou omissão do João dificultaria
a instalar um repertório social que lhe permitisse roconstruir seus relacionamentos com

Sobre Comportei mento o CoruIv-Io 367


os outros significativos, reatar amizades, otc. Para roduzir a avorsividade, o terapeuta
poderia, por exemplo, comontar que;
"A possoa multo inassertiva tende a explodir após passar por vários episódios nos
quais ongoliu sapos. Para quem sentiu na pele que foi desrespeitada, uma coisa
aparentemente pequena foi a gota que faltava para transbordar o copo. Aos olhoa
dos oulros, quem desabafa e estoura passa por in/usta e grosseira, alguém que
faz tempestade num copo d'água. £ muito natural que a explosão ocorra, por mais
que o estouro traga constrangimentos, culpa o vergonha nào havia jeito de reagir
diferente Engole-se tanto sapo quo aquilo vira um brejo, dá para entendor este
sofrimento se prestarmos atençào na história inteira o nâo só naquele dia da
explosào. O bom ó quo na terapia dá para aprender um meio termo, equilibrar o
logo, viver com mais liberdade"
Após uma explicação assim, o cliente talvez formule a regra do que Mo terapeuta,
ao contrário dos outros, entende quo estourar ó humano, nâo vai me julgar mal” e sinta-
se mais disposto a descrever os aspectos hostis da sua interação social, o quo facilitaria,
em parte, a intervenção do terapeuta. Em suma, os dois participantes da relação
terapêutica ganham imensamente se ao cliente forem fornecidas pistas verbais de que,
na sossào, o relato (ao terapeuta) das inadequações do comportamento não será
seguido por punições. A questão é que o terapeuta precisaria antecipar-so a uma eventual
ocasião na qual mentiras e omissões seriam as únicas respostas que o cliente suportaria
emitir na interação com o terapeuta.
Passando para outra fonte de problemas, não se pode esquecer que a terapia
ó particularmente estressante para o terapeuta quando elo precisa atender dois ou
mais casos graves ao mosmo tempo. Por exemplo, portadores do transtorno bordorline
de personalidade tendem a exigir cuidados extras do terapeuta, envolvem-se em
situações de risco, apresentam uma diversidade sintomatológica que desvia a atenção
do quo ó clinicamente relevante (ou seja, o padrão sistematicamente aversivo de
relacionamento interpessoal), idolatram as pessoas ao redor (isto inclui o terapeuta),
rapidamente se decepcionam com elas (o que vai ocorrer com o terapeuta) e nào
suportam viver o que entenderam ser uma rejeição, abandono. Al emitem
comportamentos de auto-lesâo ou do risco para si e terceiros (cortar-se, ingerir
substâncias om excesso, dirigir velozmente sem rumo, destruir objetos e propriedades,
otc.). Indivíduos bipolares em fase maníaca podem tumultuar a rotina da família,
descansam pouco, brigam, gastam fortunas, apresentam comportamentos de risco,
submetem-se a constrangimentos por indiscrições verbais e hiporsexualidade. Quando
deprimidos, há o risco de suicídio. Jogadores patológicos podem cometer furtos para
obter recursos para apostas, e chegam a desviar o pagamento do terapeuta para quitar
dívidas de jogo. Estes são apenas alguns exemplos do quanto o comportamonto do
cliente pode exigir tempo e considerável esforço extra do terapeuta para atender
chamadas por telofone em horas e dias não necessariamente convonientes, comunicar-
se com outros profissionais também responsáveis pelo caso, orientar familiares, fazer
mais de uma consulta por semana com aquele cliente, etc. Casos assim são ricos em
improvistos, rompem a rotina de consultório e interferem na vida pessoal do terapeuta.
Primeiro, rocomenda-so quo o terapeuta evite acoitar muitos casos com este perfil ao
mesmo tempo. Uma segunda recomendação é que o terapeuta defina com clareza
quais suas possibilidades e limites para a relação de ajuda. Fazer com cliente e familiares
um contrato terapêutico claro, ainda que floxiveí e sujeito a eventuais transformações ó
outra estratégia útil. Também ó necessário dividir rosponsabilidados o delimitar papéis
com cada membro da equipe (geralmento, psiquiatra o acompanhantos terapêuticos).
E depois explicar esta divisão ao cliente e seus responsáveis. Quase nunca casoi

368 Koflih.i ('hristin.i Wicícnskii


extremamente complexos podem ser tratados apenas por um terapeuta. Trabalhar em
uma equipe orquestrada costuma diminuir a estimulação aversiva gerada pela
imprevisibilidade das demandas do caso.
Falar em honorários é assunto raro nas aulas de Psicologia Clínica e nas
supervisões de caso. Entretanto, dinheiro é onipresente no mundo atual o não se pode
osquecer que a discussão de honorários precisa permear a maior partes das relações
terapêuticas em contextos privados, ao menos no Brasil. A terapia precisa ser remunerada
a um valor justo para ambas as partes, terapeuta e cliente. Dofinir honorários deponde
dos valores cobrados na localidado do atendimento (uma mistura dos custos da rogião e
dos valores de mercado para serviços de terapia oferecidos por psicólogos), e tambóm
da formação, titulação e experiência do profissional. O cliente precisa ser informado dos
valores ao inicio do tratamento. Se o valor cobrado estiver fora das possibilidade financeiras
do cliente, faculta-se ao terapeuta encaminhar o cliente a um profissional com honorários
mais compatíveis (talvez uma clínica-escola, em alguns casos) ou abrir uma brecha para
discutir oventual redução de valores. Esta última alternativa ó bastante delicada: quais
critérios justificam a decisão e permitem definir o valor a reduzir? Se o terapeuta considera
que o valor original é justo e retrata seu perfil profissional, não deveria oferecer desconto
como quem liquida mercadoria em fim de estação. A dificuldade financeira ó do cliente,
logo ó ele quem precisa deixar claro o quanto pode honestamente despendor ao mês.
Caberia ao terapeuta aceitar ou não oste valor. Em caso de concordar, deixaria claro por
quanto tempo o acordo ó válido e para quantas horas mensais de trabalho. Se a situação
do cliente permanecer eternamente crítica e não comportar aumento de honorários por
todo o tompo da terapia o terapeuta está disposto a aceitar? Estão provistas sessões
extras nesie valor fixo, telefonemas de emergência são cobrados, etc.?
Parece interessante ilustrar o tema com o relato de um episódio enfrentado pela
autora há cerca do quinze anos: o cliente pediu redução de honorários logo ao inicio do
tratamento, a terapeuta concordou com os motivos arrolados, chegou-se a um valor adequado
e deu-se prosseguimento ao processo terapêutico. Após meses, surgiram nas sessões
relatos de viagens especiais de lazer custeadas pelo cliente, ele comentou ter comprado
supérfluos como um óculos de sol de grife e mais moderno do que o sou, mencionou os
planos de troca de carro. Neste momento a terapeuta começou a sentir-se lesada por ter
aceito o acordo alguns meses antes e expôs ao cliente o problema. Explicou não haver
coerência entre o pedido de desconto e o estilo de vida do cliente, falou acerca da reciprocidade
do respeito na terapia e nas relações em geral. A discussão foi delicada: exigiu da terapeuta a
clara afirmação de seus direitos, sem transformar o confronto num inquérito policial ou num
julgamento sem direito a defesa. O cliente reconheceu que havia se recuperado financeiramente,
sem a devida reavaliação do pagamento das consultas. Novo acordo foi feito, válido para os
seis meses seguintes. E o tema foi retomado numa ocasião posterior, para exemplificar uma
das classes de respostas do cliente que configuravam seus problemas fora do consultório
(problemas relacionados a queixas da esposa e familiares de que ole não levava o outro om
conta, era comum ser acusado de insensibilidade, etc.).
Um terapeuta está potencialmente sujeito às mesmas contingências que seus
clientes, seu casamento pode entrar em crise ou acabar, familiares adoecem
gravemente, cólicas renais nos incapacitam, dorme-se mal, temos depressão, esto rol
não termina. Compatibilizar as demandas do exercício da terapia aos eventos aversivos
da vida pessoal, mas que concorrem com o trabalho, é arte e ciência especiais. Um
clinico precisa ser capaz de relacionar-se afetiva, ética e tecnicamente bem com o
cliente, sentir-se fisicamente disposto para trabalhar, ser capaz de sustentar a atenção,
memória e capacidade de análise por periodos longos de interação e discernir

Sobrr L'om|K>rt<tmrnlo c CoflniçAo 369


alternativas de ação em tempo real. Então chegamos ao último tópico deste artigo,
informal na estrutura, porém sério na discussão: cuidar-se é tão relevante quanto cuidar
do cliente. Fazer terapia, supervisão e estudar são posturas de vida, buscar reforçadores
oriundos de fontes outras que não o cliente, zelar pelo bem estar físico, desenvolver
repertório para situações variadas, rever seu modo de funcionamento pessoal,
questionando regras e valores, são cuidados tão freqüentomente esquecidos enquanto
nos dedicamos a ganhar o pão nas relações de ajuda. Como supervisora, que partilhou
um segmento de sua experiência profissional com os leitores, serei reforçada se
descobrir que o presente artigo auxiliou na prevenção ou manejo de alguns dos
estressores que usualmente nos atingem na terapia.

370 .1
Ri’Hin ClirisMnu Widensk«!
Capítulo 33
Proposta de práticas clínicas: um estudo
exploratório
Roberto Alves Banaco
PUC-SP, Núcleo Paradigma
Luciana Robcrta Donola Cardoso PUC-SP
Daniel Carvalho de Matos PUC-SP
M ariana Selo ihiag o Me/erra de Mene/es PUC-SP, ITCR
M ariana Ribeiro de Sou/a PUC-SP
Renata I luallem Pasijuinelli PUC-SP

A História da Psicologia Comportamontal ó marcada, desde seu principio, por


uma ruptura com os modelos psicológicos e médicos, vigentes até entào. Modolos estes
que estudavam o homem a partir de conceitos que supunham seus comportamentos
como produzidos por causas internas, “mente ou psique", ou mesmo gerados por
distúrbios orgânicos, abandonando a relação entre estos comportamentos e o ambiento.
John Broadus Watson, em 1913, fundou a abordagem behaviorista que viria
contrapor-se ao funcionalismo introspeccionista da época. Para a teoria watsoniana, a
psicologia deveria abandonar os estados de consciência e estudar o homem como um
organismo vivo reagindo ao seu meio fisico e social.
Influenciado pelos avanços das ciências biológicas da época, Watson dedicou-
se a estudar o comportamento humano da mesma forma quo os cientistas naturais
estudavam os outros animais. Neste período, o ciontista Ivan Pavlov havia dado um salto
no estudo dos comportamentos animais, trazendo para a ciência a possibilidade de
estudar o comportamento reflexo e demais alterações comportamontais om sujeitos
intactos. Seu modelo exporimental ficou conhecido como condicionamento clássico (a
apresentação de um estimulo Sn, anteriormente neutro, emparelhado com um estimulo
S1 eliciador produz uma resposta R. O mesmo estimulo Sn, posteriormente, elicia a
mesma resposta) e seu experimento mais conhecido foi o estudo da salivação om cães.
Com o advento do condicionamento clássico, Watson desonvolve seus estudos do
comportamento humano através deste modelo estimulo-resposta. Segundo Nolasco (2002),
os estudos desenvolvidos por Watson constituíram os chamados princípios da aprendizagem,
que tiveram sua primeira aplicação com o estudo do caso do poquono Albert.
De acordo com Kazdin (1978), as práticas dos princípios da aprendizagem,
tradicionalmente, estariam pautadas na aplicação dos conceitos desenvolvidos em
laboratório e ajudaram a difundir a proposta de modificação de comportamento em
humanos. Na África do Sul, com Wolpe, por volta de 1952, a "Inibição Reciproca”, evoluiu
para a técnica de Dessensibilização Sistemática; na Inglaterra, a introdução do termo
Psicologia Comportamental proposto por Hans, Eysenck e Shaplro, no período de 1949
a 1952, e na África o mesmo se deu através de Lazarus, na década de 60.
A partir da década de 30, com os estudos de B. F. Skinner, o behaviorismo deu um
salto enquanto filosofia de uma dênda do comportamento e abriu possíveis caminhos para

Sobre Comporl.imenlo t CogniçAo 371


uma prática comportamental. Esta nova proposta mantove o foco no estudo do comportamento
através da experimentação. Contudo, diferentemente do behaviorismo watsoniano, que
rostringia o comportamento aos eventos públicos e à conseqüente exclusão do estudo de
eventos privados, Skinner propõe que não haja distinção quanto à natureza de eventos públicos
e privados, tomando possível o estudo de ambos regidos pelas mesmas leis.
Skinner foi além das relações contidas no conceito de comportamento respondente,
descrevendo as relações operantes, mudando, assim, o foco de análise de respostas
eliciada por um estímulo antecedente para uma classe de respostas quo modifica o ambiente
e, por sua vez, ó modificada por ele. A descrição das relações contidas nestes dois tipos de
comportamentos, respondente e operante, permitiu a construção de uma prática De acordo
com Nolasco (2002), a atuação dos analistas do comportamento, om um primoiro momento,
se deu em ambientes mais controlados, como os trabalhos em instituições educacionais,
de saúde e correcionais, com crianças com comportamentos anti-sociais, com crianças
retardadas, com clientes psiquiátricos, prisioneiros, drogaditos entre outros.
Por volta da década de 1960, os modelos módicos o psicanallticos aos quais a
psicologia experimental, desde sou principio, se opôs, foram quostionados pela comunidade
cientifica, criando assim um movimento mundial de divulgação da terapia comportamental
(Nolasco, 2002).
A partir do então, foram desenvolvidas diversas práticas clinicas que se baseavam
na aprondizagem, no rigor metodológico o nas descrições de rotações funcionais. De
acordo com Kerbauy (2001), é interessante supor que
"as várias concepções clinicas possam ser agrupadas em categorias, embora
nõo mutuamente exclusivas. Se refletitmos sobre a preocupação de integração e
sobre a busca de conceitos e formas de atuação comuns, ficaremos fascinados
com essa união, apesar das diferenças.H(p.2).
Com isto, aqui serão discutidas quatro propostas terapêuticas baseadas na análise
do comportamento: análise funcional, terapia por contingências de reforçamento, psicoterapia
analítica funcional (FAP) e a terapia da aceitação e compromisso (ACT). A principio as quatro
propostas serão apresentadas brevemente, seguindo uma discussão dos aspectos
passíveis de comparação.
A escolha primeira para a apresentação da proposta terapêutica da análise funcional
tem origem em ela constituir principio que rege a compreensão do comportamento operante
proposta por Skinner, e ainda por estar fundamentada enquanto ponto básico para
diagnóstico e terapia do analista do comportamento. Segundo Kerbauy (2001) e Meyer
(2001), esta análise, imprescindívelmente, deve envolver uma contingência de três termos.
A interação entre um organismo e seu ambiente deve especificar os elementos de uma
contingência comportamental: a ocasião em que a resposta ocorre, a própria resposta e as
conseqüências produzidas por ela. A interação desses trôs elementos é a contingência de
reforço. Quando tratamos de operantes complexos, as contingôncias são múltiplas e operam
em diforontes combinações, simultânea ou sucessivamente.
O objetivo de descrever e analisar funcionalmente uma contingência envolve a
inferência das variáveis que operaram no passado, através do relato verbal do cliente e/ou
observação direta dos comportamentos. Segundo Delitti (2001), o terapeuta pode se utilizar
ainda outros recursos como relato de sonhos, fantasias, ou a utilização de poemas ou
músicas que tenham a função de estímulos discriminativos capazes de evocar as
contingências quo operaram no passado.
Além disso, deve-se arranjar contingôncias com intuito de Instalar
comportamentos desejados e diminuir ou extinguir comportamentos indesejáveis. Na
clínica, estes objetivos são realizados om conjunto com o cliente. Assim, a tarefa do

372 Roberto A. R.in.ico, Iucl.in.i R. P. C.irdoso, P.inicl C de M.itos , M.m.m.i S<lo Ihi.iflo Hcwr.i df
Memves, M.iriitn.i R. tio Sou/.t , Rrn.il.i I I.P.isquinelii
terapeuta é promover mudanças no comportamento através de mudanças nas
contingências, tornando a análise funcional essencial corno um meio de obter predição
o controlo do comportamento (Kerbauy, 2001; Meyer, 2001).
Na relação do terapeuta com sou cliente, o primeiro devo se comportar como
uma audiência não punitiva, como lembra Skinnor "a audiência não punitiva cria condições
para quo o comportamento outrora punido volto a aparecer no roportório do cliente"
(Skinner, 2000, p. 403). E assim, ser considerado no procosso terapêutico.
Apesar da análise funcional ser o meio para uma descrição efetiva do
comportamento, algumas dificuldades são enfrentadas em sua roalização no trabalho
clinico. Como apontado por Meyer (2001), as dificuldades se concentram om identificar a
unidade de análise ou em definir uma classe do respostas, visto que o comportamento nào
podo ser isolado para observação, nem tampouco uma resposta do um organismo sorá
igual a outra. A própria definição de resposta operante ameniza, em parte, esta dificuldade;
já que uma classe de respostas operantes não soria limitada em termos do quantidade,
mas á sensibilidade das respostas da classe a um reforçador especifico. Entretanto, não
há, na prática clinica, instrumentação, a priori, que forneça uma classe de respostas com a
qual trabalhar. Do contrário, ‘‘o principal instrumento para isto é a inferência e verificação das
rogularidados quo surgem nas relações entre respostas e o ambionto, o que ó obtido tanto
através de relatos do cliente quanto pela observação direta" (Moyor, 2001, p,31).
De maneira semelhante à definição de classe do respostas, uma outra
dificuldade diz respeito á definição de uma classe de eventos antecedentes e de evontos
conseqüentes. Isto porque, no ambiente natural, diferentes conseqüências ou eventos
antecedentes podem estar seguindo uma mesma rosposta, sendo necessário verificar
quais eventos estabolecem o controle sobre ela.
Mesmo que tudo isso seja feito, ainda assim não ó suficionto para abranger
todas as informações necessárias para o terapeuta que pretende predição e controle
do comportamento do seu cliente. Nestes casos, o foco de análise deve envolver a
história de reforçamento do indivíduo. Em contrapartida, não existe, na descrição da
contingência, um lugar para o papel dessa historia de aprendizagem, enquanto
influenciadora do comportamento atual. Isto também se dá quando tratamos das
condições sócio-econômicas e dos estados fisiológicos.
Longe de desprezar a importância da análise funcional como caracterizadora
da especificidade do olhar do terapeuta comportamental, é possível reivindicar a
necessidade de desenvolver modelos mais satisfatórios que se aproximem das
situações fora do laboratório, como no caso da prática clinica.
Na tentativa de buscar respostas a essas dificuldades e de criar um repertório
para o terapeuta comportamental, diferentes práticas clinicas são construídas, ainda
que todas tenham como instrumento básico a análise funcional do comportamento.
Nesta direção a FAP tom como base a análise funcional proposta por Skinnor, e
de acordo com seus autores suas técnicas são concordantos com as expectativas dos
clientes, que buscam vivenciar um processo terapêutico profundo o intenso. Além disto,
elas também são dirigidas àqueles que não atingiram resultados satisfatórios com
torapias comportamentais convencionais, a clientes com dificuldades em estabelecer
relações do intimidado e com problemas interpessoais difusos, pervasivos.
O profissional que atua a partir das técnicas da FAP está sempro om busca de
uma observação direta do comportamonto, como um método do rounir dados relevantes
para o estabelecimento de uma rolação entre o comportamento o as variávois do controlo
- declaração de uma relação funcional - , e como uma tontativa sistemática do descrever

Sobre Comporl.imcnto e Cor»Içílo 3 7 3


relações funcionais - análise funcional do comportamonto. O interesse ostá
principalmente no comportamento verbal controlado por eventos diretamente observados.
Os autores revelam que a FAP, cm sua preocupação com os progressos do
cliente, tem a sua base na investigação de como o reforçamento, a especificação de
comportamentos clinicamonte relovantes o a generalização podom ser obtidos, dentro
das limitações de uma situação típica de tratamento om consultório.
Esta abordagem terapêutica utiliza o reforçamento como base central do
tratamonto, através da modelagem direta e do fortalecim ento do repertórios
comportamontais mais adaptados.
O inicio do tratamonto se dá através do uma avaliação inicial, em quo ó solicitado
ao clionte quo relato seus problemas o outros aspectos do sua vida. Os instrumentos
podem sor questionários, gravações, registros, auto-relatos o entrevistas, para então
se dofinir o problema, e gerar hipóteses sobre variáveis de controlo o acompanhamento
do progresso do cliente. A partir do que foi identificado nesta etapa procura-se observar
se os comportamentos identificados ocorrem durante a sessão.
A FAP, sempre recorre à pergunta: “Isto está ocorrendo agora?". A vantagem de
se avaliar o comportamento enquanto ele está ocorrondo, é quo o profissional pode
observar diretamente o comportamento rolatado pelo cliente, permitindo uma avaliação
mais confiável e uma forma de contar e registrar respostas, bom como uma oportunidade
de avaliar a correlação entre rolatos verbais e o comportamonto ao qual ele so refere.
Outra vantagem de se trabalhar com comportamentos que ocorrem na sessão
ó a característica do reforçamento, que revela que quanto mais próximo elo ocorrer
contingente a uma resposta maior será seu efeito. Isto torna mais provávol que os
efeitos do tratamento sejam mais significativos se os comportamentos-problema e as
melhoras ocorrerem durante a sessão.
Esta busca da FAP, em reforçar imediatamente melhoras no comportamento do
clionte, pode gerar problemas, pois a própria tentativa de aplicar o reforçamento de
maneira imediata e contingento pode também, inadvertidamente, torná-lo ineficaz e até
mesmo contraproducente.
Este problema tange a natureza do reforçamento, que pode ser natural ou arbitrário.
O natural se rofore ao roforçamento que ocorre em ambionte natural e o arbitrário ao
roforçamento planejado para uma dada resposta. A dificuldade está no fato do que o
roforçamento arbitrário pode se tornar restrito à presença do terapeuta ou aos momentos
om quo o cliente ostiver interessado no tipo especifico de recompensa oforecida.
Devido aos obstáculos impostos para o mau uso do reforço arbitrário a FAP dá
diretrizes que orientam seu uso. O reforçamento arbitrário devo preferencialmente ser
utilizado quando: a classe de resposta desejada for mais restrita, a resposta não fizer
parto do roportório do clionte. Para sua utilização, o torapeuta dovo se questionar quanto
a: so a pessoa submetida ao reforçamento ó beneficiada com elo, so o reforço
apresentado ó típico no ambiente natural.
A FAP privilegia o reforçamento natural por ele fortalecer uma ampla classe de
respostas, por levar om consideração o ropertório inicial da pessoa, por boneficiar
primariamente a pessoa sendo reforçada ao invés da possoa quo proporciona o reforço,
o sor mais provávol de ocorrer no ambionto natural. Contudo apesar das diferenças
apresentadas, a maior parto das consoqüéncias dadas pelo torapeuta aprosenta
dimensõos do ambos os tipos de reforçamento
Devido ao que foi dostacado quanto à importância da observação direta, do
controle e da proximidade da conseqüência à rosposta, um passo fundamental do

374 Robnlo A. Hiin.ito, Ia r m im R. I) . ('<irilu$o, IXinirl tio Maio* , Maiiana Slo I liíago He/erra dç
M em ves, li tlc S o i/ai , Hcn.il,i i l l\isq tiiiiclll
trabalho da FAP ó a especificação do comportamento clinicamente relevante (CRB), que
inclui tanto os comportamentos "problema" como os comportamentos finais desejados.
Para esta detecção é fundamental o trabalho de observação. No setting
terapêutico ó importante que o comportamento ocorra e que o profissional tenha, em
seu reportório, os comportamentos finais desejados para o cliente. Essas premissas
são imprescindíveis para detectar o comportamento “problema", identificar a emissão
dos comportamontos desejáveis e dispor conseqüências para instalação e manutenção.
Além deste trabalho do dotecção dos CRBs problemas o do consoquenciação dos
CRBs finais desejados, os autores afirmam que a terapia seria ineficaz caso o cliente
molhorasse no ambiento clinico, mas seus avanços não se transferissem para a vida
cotidiana, por isso, a generalização tem sido uma preocupação fundamental para os analistas
do comportamento. A melhor maneira para preparar a generalização é conduzir a terapia no
mesmo ambiente no qual o problema ocorre. Para isto, deveria ser realizada uma análiso
funcional dos ambientes clínicos e cotidianos, com base nos comportamentos que cada
um evoca, e buscar arranjar o ambiente para quo sejam funcionalmento similares.
Na aplicação clinica dos procedimentos da FAP, os comportamontos do cliente
são seus problemas, progressos e interpretações e os comportamontos do terapeuta
são procedimentos de ovocar, notar, reforçar e interpretar o comportamento do cliente.
Durante a sessão, as respostas do terapeuta ao cliente podorn ter trôs funções
de estimulo: 1) discriminativa, 2) eliciadora e 3) reforçadora. Os autores destacam o
papel de cada função:
"Um astimulo discriminativa refere-se às circunstâncias externas nas quais certos
comportamentos foram reforçados e onde, conseqüentemente, tornam-se mais
prováveis de ocorrer. A maior parte de nosso comportamento está sob controle
discriminativo e é usualmente conhecido como comportamento voluntário
(comportamento operante). Um comportamento oliciado (comportamento
respondente) é produzido de modo reflexo e é costumeiramente denominado
involuntário A funcáo rcforcadom refere-se às conseqüências que afetam o
comportamento. Cada ação terapeuta possui um ou mais destes trôs efeitos"
(Kohlenberg e Tsai, 2001, p. 19-20).
Pela afirmação de que o terapeuta só pode atuar com seu cliente através destas
trôs funçõos, e do quo estas funções afetarão o comportamonto do clionte durante esta
intoração, a principal característica do um probloma que poderia ser alvo da FAP ó que
ele ocorra duranto a sessão, sendo que, nesta, os avanços tambóm deverão acontecer
e sorom naturalmente conseqüenciados pelos reforçadores que ocorram no
atendimonto. O mais importante ó que os roforçadores sejam as ações o reações do
torapouta om relação ao clionte.
São três os tipos de comportamontos clinicamonte rolevantes (CRB): o CRB 1
, problemas aprosentados pelo clionte e que devoriam ter sua freqüência reduzida ao
longo do tratamento - tipicamente respostas do osquiva; CRB2, progressos do cliente
que ocorrerem ao longo da sessão; CRB3, intorprotaçõos do comportamento pelo cliente
- podo envolver relações funcionais ostabolocidas pelo clionte entre seus
comportamentos e o ambiento, interprotações e descrições de seus comportamentos,
bem como de equivalência funcional quo indica semolhanças entro o que ocorre na
sossão o na vida diária.
No sentido de melhorar a desomponho do terapeuta, a FAP propõe cinco regras
que na realidade funcionariam como sugestões de trabalho, e que resultariam om
efeitos roforçadores para o profissional quando aplicadas.

Sobre Comportamento c ('oRniç.lo 375


As regras não sorvem como um guia prático de como agir a qualquor momento
da sessão, mas sim, visam a uma melhor utilização e identificação de oportunidades
de intervenção terapêutica, trazendo o foco do profissional para o CRB.
A rogra um consiste em prestar atenção aos CRBs, pois um terapeuta apto om
percebor a ocorrência do tais comportamontos, terá maior probabilidade do roagir
naturalmento, podendo reforçar, extinguir o punir o comportamonto, lovando a um
desenvolvimento de ropertórios mais desejáveis para o cotidiano do clionto.
A regra dois seria a do evocar CRB 1, pois para a FAP um rolacionamento idoal
ontro o terapouta e o cliente evocaria um comportamonto problomático, e criaria as
condições para o desenvolvimento de comportamontos desejáveis para o cliente, sendo
que a satisfação deste processo deponde da natureza dos problemas da vida cotidiana
do cliente.
A regra trôs 6 reforçar os comportamentos desejáveis. Esta rogra podo sor
difícil do sor posta om prática, pois os únicos reforçadores naturais disponíveis na
sessão são as reações entre terapouta e cliente.
Para osto fim, há a definição de duas abordagons para se prover reforçamento
natural: direta e indirota. As abordagens diretas se referem à possibilidade do atuação do
terapeuta no momento em quo so roquer um reforçador; contudo podem contor um maior
risco de produzirem reforçamento arbitrário. Já as abordagons indiretas possibilitam o
reforçamento natural através da manipulação de variáveis próximas daquelas prosontes
no ambiente natural, diminuindo a chance do reforçamento parocer arbitrário.
Sondo assim, na abordagem direta, ó aconselhável evitar procedimentos
determinados proviamonto e que podem nao ter relação com o ocorrido na sessão, ou
com a história entre o clionto o o terapeuta. O profissional deve buscar reforçar uma
classe ampla de respostas, pois assim aumentaria a probabilidade de generalização. O
terapeuta também deve buscar sintonizar suas expectativas com o repertório presento no
clionto, para não correr o risco de olovar om demasia a exigência do que seria desejávol.
O terapeuta dove buscar amplificar seus sentimentos para torná-los mais salientes, deve
também se questionar a todo o momento o que seria melhor para o cliente. Além disto, se
houvor a necessidade do usar reforçadores atípicos, quo estos sejam por um tempo
limitado e apenas como forma de transição. Outro cuidado importante é evitar o uso de
punição, devido aos sous efoitos colaterais, devendo sor utilizada somente quando
procedimentos com roforçamonto positivo se mostrarem ineficazes. Para uma melhor
eficácia de uma abordagem direta, o terapeuta deve procurar roagir do forma consoante
com sou roportório, onquanto membro de uma comunidade vorbal, e buscar suas reações
espontâneas logo após a ação do cliente, com a ressalva que isto deve ser feito dentro
dos limites impostos pela relação terapêutica.
Diforontemonte, as abordagens indiretas procuram ajudar na manipulação, no
ambionto natural, do varávois quo podem influenciar a conseqüência quo ó dada logo após
a detecção do CRB. Para isto o terapeuta devo buscar: vor os comportamontos do cliento
como um progresso clínico, sempre rever nos pormenores as intoraçõos terapêuticas, so
engajar em comportamentos em quo os beneficiados são os outros e por fim devem
solecionar clientes que sejam apropriados para a FAP, ou soja, clientes que tonbam
problemas que ocorram durante a sessão e que sejam afetados polas reações do torapouta.
A quarta rogra proposta so refere a observar os efeitos potenciais dos
reforçadores dados polo torapouta aos comportamontos do clionte. Esta observação
pode levar o terapouta a planejar molhor sua intervenção, o podo gorar importantes
ofeitos no progresso do tratamento.

376 Roberto A. Uandco, P.


I uci<m<i R. (\irtloso, D.micl l . ile Matos , M iiil.m .i s,lo I hiuflo lUvcrm ile
M c in v c í, M.trl.m ,! R. tio Sou/.i , Ren.il.i I l.l\ist]uí»clll
A regra cinco consiste no fornecimento de interpretações dadas pelo terapeuta,
sobre as variáveis que afetam o comportamento do cliente. Esta açáo do terapeuta
poderia auxiliar a produção de regras que fossem mais efetivas, podendo aumentar o
contato com as variáveis de controle do ambiente sobre o comportamento.
Apesar de a FAP trabalhar essencialmente com comportamentos que ocorrem
durante a sessão terapêutica, há uma preocupação em programar contingências que
propiciem a generalização dos comportamentos desejáveis para ambientes além do
setting. Em contraposição, esse não parece ser um objetivo primeiro na prática terapêutica
do aceitação e compromisso (ACT).
A terapia da aceitação e do compromisso é uma prática terapêutica desenvolvida
por Hayes e Wilson (1994), formulada a partir da proposta do distanciamento
compreensivo. Esta visa interromper processos de aprendizagem indesejáveis,
decorrentes do contexto sócio-verbal presente em nossa comunidade.
De acordo com Brandão (1999), a ACT tem por objetivo enfraquecer as esquivas
emocionais desadaptativas e aumentar a capacidade para mudança comportamental,
possibilitando obter contacto com fontes alternativas de reforçamento. A aceitação, por
principio, aumenta o contato com reforçadores antes esquecidos e o potencial para a
ação produtiva e reduz a estimulação aversiva.
Em nossa comunidade aprendemos que os sentimentos são causas dos
comportamentos e que assim, devemos controlá-los Aprendemos, então, a justificar nossos
comportamentos, descrevendo as causas como decorrentes do sentimentos e pensamentos.
De acordo com as autoras, para Hayes (1987) há pelo menos três aspectos do
contexto sócio-verbal que contribuem para a noção de que os eventos privados exercem
controle sobre o comportamento: contexto de literalidade se refere ao significado quo as
palavras passam a ter sobre o comportamento, muitas vezes desvinculado das suas
conseqüências prováveis; contexto de dar razão, em que o indivíduo indica seus
pensamentos e sentimentos como causa dos seus comportamentos públicos; e o
contexto do controle om que o sujeito por meio do treino social aprende que sentimentos
o pensamentos são causas do comportamento, e que o sujeito deve ter controle dos
seus sentimentos e pensamentos para ser reforçado (Conte, 1999; Brandão, 1999).
As estratégias de intervenção da ACT envolvem desamparo criativo, controle
dos eventos privados, discriminação entre o eu e o comportamento, escolha e valorização
de uma direção, abandono da disputa e compromisso com a mudança.
Por desamparo criativo compreende a etapa que tem como objetivo mostrar para
o cliente quo no contexto em que está inserido e a forma como a qual está se comportando
não resolve o problema, possibilitando que o cliente descubra uma forma criativa para
essa resolução, a partir da necessidade de analisar os problemas de outra forma.
O controle de eventos privados busca mostrar ao cliente que aprendemos em
nosso contexto que os eventos privados precisam ser controlados e que a tentativa de
controlá-los constitui o problema.
Discriminação entre o eu e o comportamento visa promover a separação do
sujeito que se comporta e o próprio comportamento, fazendo-o discriminar entre a
pessoa que ele chama do eu e o comportamento que o cliente quer eliminar.
Na etapa de escolha e valorização de uma direção, o objetivo é levar a cliente
escolher, ao invés de controle de sentimento, a modificação da ação. Essa escolha leva
ao abandono da disputa, deixando de lutar contra os sentimento ou pensamentos ruins,
e entrando em contato com as contingências dos sintomas.

Sobre Comportamento e CoRniç«lo 377


Por fim, o compromisso com a mudança leva o indivíduo a comprometer-se em
deixar de justificar os eventos privados como causalidade da não ação.
Por meio dessas estratégias de intervenção, a ACT concentra seu foco de
análise nos comportamentos indesejáveis que são mantidos por meio de fuga e esquiva.
Com uma proposta que não prioriza comportamontos indesejáveis, Guilhardi
(2004a) criou o termo Terapia por Contingências de Reforçamento (TCR\ para se referir
aos procedimentos que utiliza para conduzir o processo terapêutico, em sua busca da
identificação das contingências de reforçamento em operação, na vida do clionto e no
contexto torapêutico, e propõe alterações nessas contingências com o objetivo de produzir
comportamentos o sentimentos compatíveis com as necessidades do cliente. Sua
proposta deriva do Behaviorismo Radical de Skinner e da Ciência do Comportamento.
Outra característica é o fato de que a TCR trabalha com contingências de
reforçamento, embora tenha como interesse final os comportamentos o os sentimentos
do cliente. Este trabalho, na clínica, é realizado por meio do comportamento verbal. O
comportamento verbal é conceituado como tendo a mesma natureza e sendo rogido
pelas mesmas leis que qualquer outro comportamonto, dessa forma, o comportamento
verbal quo ocorre na sessão deve ser analisado como determinado por contingências
de reforçamento da vida da pessoa e pelas contingências operando na relação falante-
ouvinte, que caracteriza a relação terapeuta-cliente. Portanto, mais importante do que
aquilo que se diz é o que determina aquilo quo ó dito. (Guilhardi, 2004a).
Guilhardi (2005) atribui ao comportamento verbal do cliente a função de descrever
as relações comportamentais não observadas diretamente pelo terapeuta. No entanto, o
autor alerta que o terapeuta, não deve ficar sob controle do comportamento verbal, enquanto
um repertório de respostas topográficas do cliente. O verbal pode não descrever a realidade;
ou seja, ele não está, necessariamente, sob controle dos eventos aos quais se refere.
A partir do relato verbal o terapeuta pode compor (ou não) coerentemente as
contingências, o que lhe permite, inclusive, avaliar a consistência do comportamento
verbal do cliente: somente relatos verbais consistentes permitem chegar às
contingências não observadas diretamente (Guilhardi, 2005).
Guilhardi (2004b) destaca a análise (das contingências produtoras de) dos
sentimentos, pois embora estes, do ponto de vista conceituai, sejam produtos colaterais
das contingências, o autor afirma que os sentimentos são extremamente relevantes
para o funcionamento humano harmonioso. Portanto, antes de usar um termo para
nomear um sentimento, a comunidade verbal, em particular o terapeuta, deve ter acesso
às seguintes informações:
a) As contingências de reforçamento em operação. Esta informação ó que permitirá
estabelecer a inter-relação entre os três termos da tríplice contingência (antocedente -
ação - conseqüente).
b) Aos comportamentos operantes públicos omitidos. Assim, por exemplo, respostas
de fuga-esquiva indicam contingôncias aversivas; respostas de aproximação da
conseqüência podem indicar contingôncias reforçadoras positivas;
c) Aos comportamentos respondentes públicos (ruborízação, contração da pupiía,
sudorese, por ex.) que podem ser observados diretamente;
d) Aos comportamontos respondentes e operantes privados, através de inferência a
partir de outras classes comportamentais observadas e da análise da operação de
outras contingências, quando estas sâo acessíveis.
e) Aos comportamentos operantes e respondentes privados, através de questões do
tipo: "O que você está sentindo?"; "O que você está pensando?"; “O que vocô pensou e

37« Kobrrlo A. |{.in<ico, Iucwn.i R. D. Ciuloso, Pumcl C. ile M.ilos , M.iri.m.i S.lo flmi#« lUvcrrddf
Mrmvcs, M.iri.in.t R. ile Sou/.t , Rcn.tl.i I l.P.isquinclli
sentiu naquele determinado momento?" As respostas a tais questões não são
necessariamente confiáveis;
f) Aos comportamentos operantes públicos correlatos, que são igualmente produzidos
pelas contingências de reforçamento e que acompanham comportamentos privados.
Tais comportamentos correlatos podem fornecer informações sobre os comportamentos
ou estados corporais.
Ao relacionar todas essas informações o terapeuta está, então, em condições
do atribuir ao conjunto um tormo - arbitrário, convoncionado pola comunidade verbal -
, qual seja, o "sentimento” da pessoa. Mesmo assim, o nome do sentimento (ansiedade,
angústia, fobia etc.) não acrescenta nenhuma informação adicional que possa ajudar
no processo terapêutico. Talvez a função de usar tais palavras seja a de facilitar a
comunicação entre terapeuta-cliente (desde que fique claro para ambos o que elas
descrevem) e a de manter uma tradição no relacionamento cliente-terapouta, no qual se
fala o tempo todo do sentimentos (mesmo não se tendo claro sobro o que se está
falando). A mudança nessa tradição deve ocorrer, mas gradualmente. O terapeuta deve
ensinar seu cliente a descrever contingências e nào manter as verbalizações com termos
do vernáculo cotidiano dos sentimentos (Guilhardi, 2004b).
Guilhardi (2005) propõe procedimentos que instalam comportamentos no clionte
capazes de reduzir, da forma mais eficaz possivel, sentimentos aversivos. Assim instalar
comportamentos do fuga-esquiva quo removem ou pospõem um ovonto aversivo ó
menos eficaz que instalar um comportamento de contracontrole da agência coercitiva,
que altera tal agência controladora e remove a fonte do controle coercitivo. Não basta
responder às coniingências coercitivas, deve-se procurar eliminá-las.
A TCR utiliza, basicamente, procedimentos verbais para manejar os
comportamontos do clionte, produzindo novos comportamentos governados por rogras
expostas pelo terapeuta e auto-regras desenvolvidas durante o processo terapêutico;
por outro lado, faz uso também de procedimentos de manejo direto das conseqüências
e dos antecedentes dos comportamentos dos clientes, na interação entre terapeuta e
cliente, usando procedimentos de modelagem, "fading”, punição etc, procurando manejar
contingências amenas e priorizando técnicas de mudanças graduais.
A Terapia por Contingências procura tornar o cliente ciente de todas as etapas do
processo terapêutico, de tal maneira que ele saiba descrever as contingências de
roforçamento que estão atuando e saiba alterá-las de forma funcionalmente útil. O cliente
torna-se, assim, sujeito ativo das mudanças nas contingências e torna-se capaz de produzir
alterações no ambiente, que atuarão sobre ele e selecionarão seus comportamentos.
Guilhardi (2004a) propõe que o adequado ajustamento da pessoa está
diretamente ligado à capacidade que ela tem do so comportar e do sentir sob controle
máximo de contingências reforçadoras positivas e minimo de contingências reforçadoras
negativas. Assim sendo, o terapeuta deve levar seu cliente a adquirir repertório
comportamental apto para maximizar conseqüências reforçadoras positivas e minimizar
conseqüências negativas, para si mesmo e para as pessoas que lhe são socialmente
relevantes, a curto e a longo prazo.
A Terapia por Contingências caracteriza-se por trabalhar com contingências
comportamentais, ser tecnológica, produzir resultados socialmente relevantes, ter uma
atuação conceitualmente sistemática, programar a generalização dos seus ganhos
para outras classes comportamentais, outros contextos e no tempo e preocupar-se em
ser analítico, isto é, sempre que possivel demonstrar experimentalmente as relações
funcionais que se propõe estar estudando.

Sobre l'oniport<imcnto c Co#niç<1o 3 7 9


0 mais relevante a se esperar do terapeuta é, diante da intrincada e única teia
de contingências que emerge da interação com o cliente, que seja criativo, dentro dos
limites da adoção do modelo conceituai e experimental e sensível às conseqüências do
seu próprio comportamento advindas do cliente, as quais modelarão procedimentos
torapêuticos apropriados para cada caso. Assim, a atuação terapêutica é sempre única
por ser única também cada combinação de contingências trabalhada pelo terapeuta.
Diante da breve exposição das abordagens clínicas que utilizam a análise do
comportamento em sua base teórica, cabe aqui ampliar a prática da análise funcional para
uma categoria de análise quo se encontra no come de todas as abordagens. Esta afirmação
tem como base o fato de que todas as práticas clinicas atuam a partir da análise funcional.
Apesar deste aspecto em comum, é possível traçar algumas diferenças entre
elas, visto que todas se caracterizam pela proposição de procedimentos que permitam
uma análise funcional e uma intervenção eficiente.
A FAP, na tentativa de identificar a unidade de análise ou em definir uma classe
de respostas a ser trabalhada e definir uma classe de eventos antecedentes e
conseqüentes, propõe a identificação de comportamentos clinicamente relevantes que
ocorram dentro do setting terapêutico como uma forma de tornar a contingência acessível
ao terapeuta no sentido de observá-la enquanto ocorre. Já a ACT busca identificar no
repertório do cliente os comportamentos que têm função do fuga e esquiva. Esta definição
de classo de respostas direciona o trabalho do terapeuta para a investigação do eventos
que controlem tais respostas. A TCR, no sentido de auxiliar o terapeuta nessa tarefa,
propõe a identificação das contingências de reforçamento em operação, através dos
comportamentos operantes públicos emitidos, dos comportamontos respondentes
públicos e dos comportamentos respondentes e operantes privados.
Quanto à preocupação om programar contingências na terapia que possibilitom
a generalização do repertório adquirido tanto no sentido de ampliação da classo de
respostas, quanto para o ambiente natural, a FAP busca reproduzir aspectos relevantes
do ambiente no sentido de estabelecer uma semelhança funcional com o ambiente
natural e a utilização de reforçamento natural para a ampliação do repertório. A ACT, a
partir da revisão aqui realizada, não foi possível identificar procedimentos que programem
generalização. A TCR torna o cliente ativo das mudanças nas contingências e capaz de
produzir alterações no ambiente, além de sair do setting e produzir e testar as
contingências no ambiente natural.
Além dessas diferenças, algumas particularidades são encontradas nas
abordagens. A TCR destaca a análise dos sentimentos como relevantes para o
funcionamento humano, no sentido de contribuir para a homeostase do organismo, e
como medida do bem-estar do cliente.
A ACT, por sua vez, pré-estabelece, em seu procedimento, etapas que guiam a
açáo do terapeuta na intervenção, em contraposição á FAP e á TCR, quo guiam sua
intervenção, levando em conta as idiossincrasias do cliente, estabelecendo, portanto,
um processo que depende do contexto único do cliente e da relação terapêutica.
Desta forma, apesar de suas diferenças, todas essas abordagens têm em sua
origem a proposta teórica skinneriana e, como tal, o seu olhar voltado para a análise
funcional. Em conseqüência disto, se afastam de propostas mentalistas, que vêem os
conteúdos dos sujeitos como foco de seu olhar, e priorizam a relação entre o organismo
e ambiento.

380 Roberto A. Uan.iio, l uci.ma R. I). C«irdoso, l>.iniel de M.ilo* , M.in.m.» S«lo TIiuiro Re/errudc
Mene/es, M.iri.m,i R. de Sou/ii , Rrn.it,i I l.l\m|iiinelli
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Sobre t'omporlcimenlo e l'oflnlç.lo 381


Capítulo 34
Lista de Desempenhos: um possível
primeiro passo para uma
sistematização do ensino da
Análise do Comportamento na
graduação.
Roosevelt R. Starling
VFSJ/USP

Desdo a primeira consolidação do modelo explicativo da Ciência do


Comportamento de orientação skinneriana, a área do ensino/ aprendizagem recebeu
atenção como uma de suas talvez mais promissoras aplicações (Kerbauy, 1983; Skinnor,
1972, Skinner, 1999/ 1959).
Desde então oscilando entre períodos mais ativos e de maior receptividade a
uma psicologia de fundamentação científica focada nos processos básicos da
aprendizagem - ou da educação, se quisermos - àqueles francamente adversos, as
propostas analítico-comportamentais sempre se fizeram presentes na área. Diversos
métodos de ensino incorporando os princípios científicos da aprendizagem foram
desenvolvidos e testados (West & Hamerlynck, 1992; Fraley & Vargas, 1976).
Neste particular, os trabalhos pioneiros de Carolina Bori (1924-2004) o de alguns
dos seus principais (então) estudantes empreenderam notável esforço no estudo,
proposição, investigação e teste de conteúdos disciplinares e curriculares, e na produção
de objotivos comportamentais e planejamento do ensino com base na contingência de
três termos (Nale, 1998). Vale a pena moncionar que boa parte, senão a totalidade
destes esforços pode ser considerada como tendo tido sucesso, senão na extensão e
universalização destes métodos no panorama mais amplo da educação, certamente
na confirmação do acerto do caminho, quanto aos princípios básicos adotados.
Infolizmente, somente alguns deles romperam o circuito acadêmico estrito e se
transformaram em livros editados comercialmonto, tendo assim aumentadas suas
possibilidades de atingir o influenciar um público maior e mais diverso (por exemplo,
Lagoa, 1984; Leite, 1982; Rabelatto & Botomó, 1987; Toixeira, 2006).
Numa área aplicada - a educação - comumente carente do números o de
procodimontos sistematizados quo pudessem permitir uma avaliação empírica da sua

1E*t*fU txmi KictkjMta nnaltt |x>nln tio Iratxilio a dtottJMAo dt) urna <xxn|HfHK!ii*<> analitlco-ctxiifxxljiMMintal do vurtxi "M b «' ou “cofihiMaif", mn
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<|u*i pr<x:urnftMi Inr o toxln original. hhi iiiylA»

382 Roo*cvWf R. Sliirlinfl


produção e, em países com pouca tradição científica, até mesmo algumas vezes
abortamonte avessa a medidas e a quaisquer avaliações da aprendizagem, estes métodos
demonstraram uma possibilidade do avaliação empírica quo, no mínimo, recomendaria
sua adoção num universo ampliado, a fim do testar sua eficácia em contextos educativos
para públicos e situações mais comploxas e diversificadas Entretanto, quando não
abertamente rejeitados, tais métodos e procedimentos continuam rocebondo pouca
atenção fora do contros acadômicos especializados (Richelle, 1981; Nale, 1998).
Em nosso país, é digno de nota quo, exceto em âmbito reduzido e, om boa
parto, como projetos acadêmicos do pós-graduação, os princípios o as aplicações
sistomatizadas da Análise do Comportamento na área do onsino não tonham tambóm
encontrado uma aplicação o disseminações maioros no próprio onsino da Análise do
Comportamento, quo compõe o conteúdo de várias disciplinas do curso de graduação
em psicologia (Nalo, 1998). Baste, para fundamentar o ponto acima, rocordar ao loitor a
sua própria formação em análise do comportamento, caso esta se tenha dado fora de
algumas unidades educacionais nas quais a Análise do Comportamento, provavelmente
por vicissitudes históricas, estava represontada por um grupo especialmente
competente, ativo e atuante.
Nestes últimos anos tem sido visto um maior interesse e esforço de parcela da
comunidade analitico-comportamental em retomar o estudo e aplicação destes métodos
(Hübner & Marinotti, 2004; Toixeira, 2006 b - para um relato com elementos históricos,
Ramalho, 2006).
Nas discussões extra-academia, o habitual é contrar-so a discussão em alguns
dos mótodos do onsino desenvolvidos pela Análise do Comportamento, tais como, por
oxomplo, o PSI, o Precise Teaching, a Aprendizagem Som Erro Mas, como ensinar é
somonte uma parte do problema mais geral da aprendizagom de uma disciplina: mais
básico e antorior ao como existe a questão do o que ensinar.
Do manoira geral, a formação graduada em análise do comportamento não lança
mão destes métodos por ela mesma propostos, sendo as notáveis exceções aquelas quo
confirmarn a regra. Num planojamonto t/pico, o instrutor/ professor seleciona certos textos
aos quais ele foi exposto e cujo contoúdo ele acredita que os alunos terão bonofícios orn
também conhecer. Prepara suas aulas com base neles e procede, eventualmento, avaliaçõos
tradicionais, as quais com maior ou menor fidedignidado avaliarão, no mais das vezes, se
o aluno adquiriu ou não o subrepertório intraverbal especializado - as "informações" - que
se desejou onsinar. A sorom classificados utilizando-se a proposta taxonômica de Bloom, a
virtual totalidado dos conteúdos habitualmente "ensinados" nostos cursos seria considerada
objetivos cognitivos (Bloom, Engelhart, Furst, Hill, & Krathwohl, 1979). Um objetivo cognitivo
pode (quaso) ser traduzido, numa linguagem coloquial, por informações - basicamente,
por um reportório intraverbal - e começamos por comproonder quo as rolaçõos que possam
permitir um controle da ação direta através do rogras e instruções não são simples nem
garantidas (Amorim & Andory, 2002).
Na nossa tradição educativa, "saber” alguma coisa consiste om larga medida na
aquisição o na emissão fluente do repertório intraverbal alinhado com as contingências
de roforço liberadas pelas autoridades roconhocidas naquela ároa do conhocimento'.
Em nosso país e com as conhecidas e notávois exceções, uma amostra da literatura dita
cientifica indicará quo tomos produzido bons artigos, livros e dissertações sobre ciência,
embora não tenhamos aparontomento produzido um número comparável de bons artigos,
J A H) julgar pata aparenta prafarénda <)• parcala do* (ovan» «»ludanta bf«»*lplro» <la Analita (lo CotnixjrUmwnlo p«ilo» lama* flloaôflco» e
uiricelluaki da *rea Arintn aaparnr qua. nu rtifuturo prtW m »«la dMf*tifxjrc*Nialidada M ampKa n itAo m irediwa, como Mrta danajAval para
um« Arnti de iradMko t>xp*inmnnl»K»lfl

Sol)iv ComportiimcMto o (*ogni(i1o 383


livros o dissertações cientificas. Ora, em especial na produção de um conhecimento com
base num modelo explicativo cientifico-naturalista, como o ó o da Análise do
Comportamento, seria desojável que estes dois tipos de produção fossom, no mínimo,
equivalontos em número e qualidado2. Evidentemente, o desempenho esperado do um
futuro analista do comportamento, om ospecial de um futuro analista aplicado do
comportamento, deverá ser omitido sob controle da situação ostimuladora antocodonto
prosonto no contexto "natural" da sua atividade profissional, valo dizer, na presença do
estímulos quo em parto serão não-vorbais, om parte vorbais, mas não se confundindo
com um item dc prova quo lhe apresente um estímulo verbal om rosposta ao qual o
treinamento discriminativo rocebido ocasione um intravorbal somente. O analista do
comportamento não deverá (somente) falar sobre a condição estimuladora, mas sim agir
sobro ola, modificando-a conforme for o caso Colocado nas palavras de Skinner (1992/
1957): “In the practical sciences, a more important effoct may be to ostablish nonverbal
modos of rosponso.”(p. 363). A molhor prática pedagógica recomenda quo as condições
da aprendizagem reproduzam o mais precisamente possível as condições do
desomponho futuro o, neste quesito, boa parte de nós possivelmonto concordaria que
deixam muito a desejar os métodos tradicionais de ensino da Análise do Comportamento,
dos quais habitualmonte fazemos uso (Magor, 1976; Rarnalho e Hannas, 1982).
Contudo, este "método” tradicional não produz, tudo indica, rosultados
necessariamente ou de todo insatisfatórios. Analistas do comportamento de várias partes
do mundo "sabem" mais ou menos as mesmas coisas, no sentido de que falam sobre o
fenômeno do seu interesse com uma terminologia bastante uniforme. Como observam
Maurice, Green & Luce (1996): "In most cases, behavior analysts are very careful to be
consistent with each other when using terms and definitions" (p. 347). Por outro lado a
emissão dos mesmos termos sob condições estimuladoras diferentes ou de termos
diforentes aparentemente ocasionados por condiçõos estimuladoras quo indicam ser da
mesma classe, fortalece a hipótese de que este subrepertório especializado possa ser
em grando parto intravorbal o não, predominantemonto, um sub-reportório do tatos sob
controle discriminativo preciso (Andery, Michelotto & Sério, 2001; Nono, 2003).
Mesmo som oxplorar aqui a naturoza destes sub-repertórios (se intravorbais ou
tatos), pode-se propor uma pergunta cujo tratamento é o objetivo deste capítulo: o que
dever "sabor" uma possoa para quo ola possa ser considorada um/a analista do
comportamento? Sob uma dada condição ostimuladora profissional antocodonto, o
quo ola fará do manoira diferenciada que a caracterizará como um membro desta classe?
Do ponto de vista de quem aceita a responsabilidade de formá-los, esta pergunta pode
sor assim formulada: o que devo ensinar aos meus alunos para que eles possam ser
considerados analistas do comportamento ou, minimamente, considerá-los como
possuidores de um "conhocimonto" deste modelo explicativo?
Estritamente, a porgunta acima permite uma resposta simples o dirota: o
roforçamento incidirá sobro, e solecionará, as respostas quo molhor so conformarem às
práticas reforçadoras da comunidade verbal do intorosso, nesto caso, aquole professor ou
professora. Uma porgunta do intorosse seria, então, que variáveis controlariam estas práticas
reforçadoras? Na ausência do métodos e procedimentos sistematizados e com algum
suporto ompirico, passam a existir razões para se supor que estas variáveis possam provir
pnncipalmonte da história formativa de cada instrutor/ supervisor/ professor, do contingências
profissionais o pessoais que contemporaneamente ganharam algum controle sobre seu
comportamento, do reforçamento social que sua ação profissional vem recebendo e da

' Emboi» o tnrmo Taiik I.IrIh poaim l»r 11111« Irmltiçâo IIIcimI por IIiIn (hi li*l«gnn< df» tnrnfM», o Inrrno IhhiIm Iihii uru u»o Mcnlco rw AnAlinn do
ComfxrtinNHrin. rwMnrio-*« ao proovMu chamado Encadnafnmik) Oponait» (Mdtmi>t>*>ro»r, 2001) NAoltA M huçAo MlguriM d« (jtm ■ nWmmçto)
original daalacoUUngn |t«thu tkto fundamarrtada numa Miáfan dn ürobai (ta«k analyita) mlriüi Eritmlanki mIn (xxMh *nrm iiwiKhk hindwnanU*-*)
puni um wtAIngo dtmlA nahirtti*

384 Roosevdf R. M.irliiifl


modelagem imediata daquela audiência em particular, para citar somente algumas das
variáveis mais óbvias.
A possibilidade de que contingências não-planejadas especificamente para o
desempenho daquela atividade - ensinar Análise do Comportamento - possam estar
governando nossas práticas formativas se torna ainda mais provável quando, deixando
as contingências relativamente bem definidas do laboratório experimental, passamos
a considerar a aquisição deste “saber" em contextos aplicados.
Talvez seja exatamente nestes contextos aplicados que o problema seja mais
urgente e importante, pois comumente a comunidade experimentalista da nossa área
dispõe de práticas formativas bem delineadas, de certa maneira impostas pelo próprio
objeto de estudo e pela metodologia que o modelo explicativo adotado impõe. Além
disso, as interações desta comunidade com o público leigo sâo, habitualmente, reduzidas
e talvez seus praticantes incluir-se-iam, para este público, na categoria mais geral de
"cientistas", alguém que não se compreende mas que se admira à distância.
Tal não ocorre com os analistas aplicados do comportamento. Por força do
próprio exercício da sua prática, esta parcela de praticantes precisa estar em constante
interação com a sociedade maior, precisa que ela compreenda numa certa medida sua
prática e será predominantemente com base no desempenho desta parcela que a
sociedade maior formará o conceito de "analista do comportamento". Ao prestar seus
serviços á sociedade maior, esta comunidade aplicada definirá para ela, a sociedade, o
que caracteriza um analista do comportamento, tanto pela ação coletiva dos seus
membros quanto pela ação individual de cada um deles (Starling, 2000).
Dessa maneira, esforços no sentido de sistematizar e fundamentar o que deverá
fazer um analista do comportamento para que seja como tal considerado - ou, mais
tecnicamente, que propriedades do comportamento de um profissional deseja-se que
controlem a inclusão de um dado repertório nesta classe - atenderá não somente (1) às
necessidade de uma formação profissional de melhor qualidade e definição profissional
como também, e om decorrência, (2) permitirá às sociedade maior estar exposta a um
treinamento discriminativo mais preciso quanto a propriedades diferenciadas desta classe
profissional. Acreditamos, naturalmente, que nosso repertório teria propriedades
diferenciadas que pudesse nos delimitar e distinguir e, sobretudo, que estas propriedades
pudessem oferecer uma abordagem mais eficaz aos problemas práticos que se
apresentarem no nosso campo de interesse profissional.
Respondendo a esta e a outras contingôncias, mais próprias daquele pals, a
comunidade analítico-comportamental norte-americana vem desenvolvendo um sistema
de classificação destas propriedades com base na precisão de um conhecimento tipo
declarativo dos conceitos analltico-comportamentais (Baum, 1999) e, na área aplicada,
do que se supõe sejam ou devessem ser as práticas de um analista aplicado do
comportamento. Este catálogo, denominado de Task Lists-', é o que tem sido utilizado
nos EUA para certificar analistas do comportamento, existindo mesmo uma organização
que se incumbe desta tarefa, o Behavior Analysis Certification Board (BACB), cuja missão,
nas suas próprias palavras, é:
The BACB's mission Is to develop, promote, and Implement a national and
International certification program for behavior analyst practitioners. The BACB
has established uniform content, standards, and criteria for the credentlallng
process that are designed to meet (1) The legal standards established through
state, federal and case law; (2) the accepted standards for national certification
programs; and (3) The “best practice* and ethical standards of the behavior analysis
profession, (texto recuperado na World Wide Web em www.bacb.com).
* Corn uri pouco ma» da IraMho, parta M m podada provavelmente Mr tranekxmada am obfattvo« comportamental« da entlno a formulada ik ji
tormoa da ountlnflAnda da trtNi tarmoa. oomo demandaria o aau matwr uao num referendai anallttcooomportamental (Talxafca. 2000) Contudo,
(Wta (Miiwcti Mr uma larala mais bem talharia para um grupo huer a nto um IndlvkJuo, qualquer que ae|a <*»!• Indivíduo

Sobre Comportamento c CognlçAo 3 8 5


Historicamente, o BACB é o herdeiro e o produto final de diversos programas com
finalidades semelhantes que, ao longo dos anos, foram implantados com os mesmos
objetivos, mas em caráter estadual ou regional. Dentro estes, o Florida Behavior Analysis
Ceríification Program, Há dois anos atrás, procurando uma maneira de dar um direcionamento
mais preciso às disciplinas sobre Análise do Comportamento que ministro para o curso de
graduação da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), estudei as Task Lists
doste programa e também as do BACB e produzi, para meu uso o uso dos meus monitores,
uma tradução ligeiramente modificada da fusão destes dois catálogos. Recentemente revi
o programa atual do BACB e parece que o resultado da tradução e adaptação que fiz em
nada contradiz ou inova a proposição que ole, o BACB, atualmonto faz.
De qualquer forma, os objetivos de uma e de outra são diferentes. Ao produzir a
Lista de Desempenhos apresentada no Apêndice 1 deste capitulo - e a qual espera-se
que o leitor interessado retorne algumas vezes durante o restante desta exposição -
meu objetivo foi tão somente o de utilizá-la para orientar minha atividade docente.
Esta lista contém 163 desempenhos distribuídos por doze Areas de
Competências que constituiriam, então, o conjunto declarativo que um analista do
comportamento deveria ter fluente em seu repertório. Idealmente, boa parte dostes
desempenhos seria composta de habilidades, isto ó, respostas diretas ás contingências
naturais do contexto aplicado e não necessariamente implicando desempenhos verbais
públicos. Contudo, como já pude notar mais acima, os procossos comportamentais
envolvidos na obtenção de coerência entre um conhecimento profissional tipo declarativo
e um repertório de habilidades diretas tem representado um problema parn a área e
sua discussão foge aos objetivos deste capitulo (Hayes, Barlow & Nelson-Gray, 1999;
A morim & Andery, 2002).
Centrando, assim, na função didática planejada para o uso desta Lista de
Desempenhos e mantendo presente algumas das suas limitações, conforme indicado
no parágrafo acima, que benefícios poderia trazer ao ensino graduado da Análise do
Comportamento tal referência, tal ponto de ancoragem das atividades didáticas, se
podemos assim nos expressar?
Uma experiência individual - e que só recentemente começou a ser tratada
com maior rigor metodológico - não poderia dispor, é claro, quaisquer parâmetros que
permitissem uma resposta minimamente precisa á pergunta acima. Dessa maneira, a
narrativa que se segue deve ser compreendida exatamente como tal: a narrativa de um
esforço e um esboço de sistematização de elaboração e utilização individual.
O primeiro e talvez principal resultado que procurava com este novo recurso era,
de alguma forma e precariamente que fosse, controlar em alguma medida as influências
da minha própria história como estudante da Análise do Comportamento na minha
prática docente. Não me agradava ensinar aquilo que minha história indicava fosse o
importante para meu aluno, deixar que tais contingências selecionassem o conteúdo
de minha docência. Afinal, a Ciência do Comportamento já tem mais de meio século,
um quadro conceituai e um corpo de conhecimentos empíricos já bem estabelecidos
pelo resultado do trabalho de centenas de praticantes e estudiosos. Nâo me sentia
confortável nem competente para proceder por mim mosmo a tal seleção e, menos
ainda, confiava em que minhas respostas pudessem estar sob controle preciso dos
estímulos presentes naquele corpo de conhecimentos.
Esta Lista de Desempenhos tinha pelo menos trôs características que a
recomendavam para a finalidade com a qual eu propunha usá-la: (1) na sua maior
parte, suas categorias correspondem a desempenhos públicos, são classes funcionais

386 Rooscvclt R. Sl.iilmjj


e correspondem a conceitos/ processos básicos bem estabelecidos na literatura da
área; (2) os conceitos/ processos básicos listados tôm suporte empírico na Análise
Experimental do Comportamento e (3) seu estado atual reflete o consenso de um grupo
de especialistas da área num processo de seleção de considerável duração.
Embora boa parte destes "desempenhos" sejam de fato desideratos,
declarações de intenção (Mager, 1976), outra parte constitui-se de desempenhos
públicos operacionalizáveis os quais, com relativamente pouco trabalho, podem ser
reformulados como objetivos de ensino, conforme derivados do modelo taxionômlco de
Bloom (Bloom e cols., 1979; Ramalho e Hannas, 1982; Vargas, 1974)*.
O modelo dos objetivos de ensino estabelece uma estrutura básica para sua
formulação que deverá forçosamente especificar: a condição antecedente ao
desempenho, o desempenho e os critérios do desempenho. Nesta terminologia, o
termo condição pode equiparado a estímulo discriminativo ou operação estabelecedora,
desempenho pode ser equiparado a resposta e os critérios às propriedades criticas da
resposta relevantes para a liberação do reforçamento.
Consideremos, nestes termos, o desempenho 2-18 da Área de competências
2 - Filosofia, epistemologia, definição e características da Análise do Comportamento
(Apêndice 1):

2-18 Interpretar artigos da literatura analitico-comportamontal,


a. identificando a variável dependente,
b. identificando a variável independente;
c. identificando a medida da resposta e o intervalo de registro;
d. identificando linha de base e intervenção;
e. identificando comprometimentos da validade interna:
c. determinando se relações funcionais foram estabelecidas/ demonstradas.

Do ponto de vista das características de um objetivo de ensino, este


desempenho:
1. Incide sobre um comportamento do aprendiz, não do professor; é algo que o aprendiz fará.
2. Interpretar é um verbo, uma ação. Funcionalmente, é uma resposta quo o aprendiz emitirá.
3. A resposta pode ser pública. Basta para tal reescrevê-la especificando melhor como
so assegurará esta publicidade: "O aluno escreverá um resumo identificando (a) a
variável dependente, (b) a variável independente, etc.’’.
4. Em situação de aula, a condição estimuladora antecedente pode ser bem estabelecida:
"Dado um texto publicado na Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva,
o aluno escreverá...".
5. Identificar por escrito ó também uma resposta pública: identificar por escrito consiste
om omitir uma resposta verbal textual que, mediante o registro físico da sua ocorrência
ou não na presença da estimulação apropriada, demonstrará sua aquisição no repertório
do aluno.
6. Variável dependente, independente, resposta, intervalo de registro, etc., são conceitos
com propriedades discriminativas bem estabelecidas ria área, cujos controles permitem
determinar a compatibilidade da resposta emitida pelo aluno com os mesmos controles
que fortaleceriam a probabilidade da ocorrência da mesma resposta na comunidade
verbal profissional, selecionando-a ou não para reforçamento.
' Dolonuduir «a condlçAoa impUcadM «n ‘neoawukrtM • «tffldwitM' é axaüimont« a pwlkxilarktiKM qu«, a mau ver, lonioto m (m Inrohi pura um
yiufK)» i)to um indh/iduo

Sobre ('omporkimcnto e Coflniçtlo 387


O BACB acredita que o desempenho acima (2-18) é relevante para um analista
do comportamento e boa parte de nós provavelmente estará de acordo. Aceitando este
desempenho como relevante, temos agora um o que ensinar que estaria livre de
particularidades da história do professor. Temos uma resposta pública que a comunidade
profissional considera relevante e cuja ocorrência e conformidade discriminativa ao
repertório verbal corrente da comunidade profissional pode ser diretamente verificada.
O conjunto dos desempenhos da Lista de Desempenhos emitidos com fluôncia
sob condições estimuladoras precisas constituiria, assim, o conjunto dos desempenhos
necessários e suficientes para que um dado repertório profissional fosse denominado
analltico-comportamental, pelo menos para o BACB e, com pequenas mudanças, para
este professor*1. Em especial, as Areas de Competências 9, 10 e 11 compreenderiam
aqueles desempenhos mais diretamente voltados para a aplícaçfio.
De posse deste instrumento, um segundo passo foi estabelecer repertórios de
entrada e repertórios de saida para as diversas disciplinas lecionadas. O repertório de
entrada lista os desempenhos que devem já estar presentes no repertório do aluno
ingressante para que ole possa ter as melhores chances de adquirir novos itens e o
repertório de saída os desempenhos que ele deverá adquirir durante o curso. Do ponto de
vista do professor, é o o que ensinar, o conteúdo do curso. Por exemplo, para os ingressantes
na disciplina Teorias e Técnicas Psicoterápicas C - Comportamental, reproduzo abaixo um
excerto dos repertórios de entrada e saída, dando como exemplo alguns desempenhos da
Área do Competências 3, Princípios, Conceitos e Processos Básicos :

REPERTÓRIOS DE ENTRADA (ENT) E DE SAÍDA (SAÍ) PARA


TÉORIAS E TÉCNICAS PSICOTERÁPICAS - COMPORTAMENTAL (TETEP C)
CURSO DE PSICOLOGIA - UFSJ
LEGENDA:
N - (NULO) O desempenho não foi treinado anteriormente ®/ou o desempenho não ó pró-
requlslto (nâo faz parte do repertório de entrada) nem requisito (nâo faz parte do repertório
de salda) para disciplina.
P - (PARCIAL) Dado um prompt verbal, o aluno reproduzirá vocalmente/ textualmente as
definições pertinentes, declarando as variáveis críticas relacionadas à sua ocorrência
conforme modeladas e considerando as restrições, limites e condições pertinentes, mas
a habilidade de responder sob controle direto das contingências nào ô requisito e/ou a
ocorrência ocasional do desempenho completo modelado atende ao pró-requlslto
(repertório de entrada) ou requisito (repertório de saída).
C - (COMPLETO) O desempenho ocorrerá conforme modelado em pelo menos 90% das
oportunidades, tanto sob controle de prompts verbais como sob controle direto das
contingências.
ITENS DE DESEMPENHO SOBREADOS: PRÉ-REQUISITOS (COLUNA ENT)

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 3
PRINCÍPIOS, PROCESSOS E CONCEITOS BÁSICOS.
DESEMPENHOS ENT SAI
3-1 Definir a unidade de análise do
comportamento e declarar sua importância para N C
uma ciência natural do comportamento.
3-2 Definir, identificar e dar exemplos de
C C
estímulos.
3-3 Definir, identificar e dar exemplos de
C C
respostas.
3-4 Definir, identificar e dar exemplos de
C C
ambiente.

388 Roosrvrll R. Starlinfi


3-6 Definir, identificar e dar exomplos de
C c
cla9se9 de respo9tas e classes de estímulos
3-7 Definir, identificar e dar exemplos de
C c
repertório comportamental.
3-8 Definir, identificar e dar exemplos do
C c
contingência.
3-12 Definir, identificar e relacionar
C c
funcionalmonto US, CS e CR.
3-13 Definir, idontificar o relacionar
funcionalmente os três termos da contingência (S . C c
H -> Sr)
3-14 Definir, idontificar e dar exemplos do
modelo re9pondente de condicionamento, P p
incluindo CEH’s

Nesto exomplo, o desempenho 3-1 nâo havia sido treinado antos o, portanto,
está classificado como N, Nulo, no repertório do ontrada do aluno (ver "Legenda" no
quadro acima) Entretanto, consiste num desemponho que será treinado no curso e
deverá ocorrer de maneira C, Completa, no ropertório de salda. O desempenho 3-13 já
toria sido adquirido anteriormente e de maneira complota. O desempenho 3-14, que
havia sido adquirido parcialmente, não será trabalhado no curso, mantendo, portanto, o
mesmo status nos repertórios de ontrada e de saída. Evidentemente, ao fim de um
período formativo mais especializado, espora-se que um aluno possua todos estes
itens em sou ropertório profissional.
O roportório de entrada estabelecido como necessário ó objoto do avaliação
pró-curso (antes ou logo nas aulas iniciais). Supostamente adquiridos em outras
disciplinas, com outros professores (e não todos eles declarando-se analistas do
comportamento), o professor não supõe que o aluno domina os pró-requisitos: ele
verifica isso. Alunos com deficiência em desempenhos do repertório de entrada são
então encaminhados à monitoria para um estudo de recuperação paralelo ao curso,
pois este domínio ó suposto necessário para a consecução do repertório de saída.
Trabalhando-se com objetivos de ensino, a avaliação é simplos e direta: o
aluno deverá, sob as condições estimuladoras apropriadas, emitir o dosomponho pedido.
Uma "prova", portanto, consiste simplesmente em, do posso da Lista de Desempenhos
e dos parâmetros do repertório de saída, pedir ao aluno que produza o desempenho
provisto, oferecendo-lhe diretamente o estímulo discriminativo para tal ou, no caso de
um desempenho Completo, estabolecondo um contexto estimulador ao qual ele deverá
responder emitindo o desempenho. Ele o fará ou não o fará, ou seja, demonstrará a
ocorrência ou não da aquisição daquele itom de roportório.
Na primeira aula, o aluno recebe uma cópia dos roportórios de ontrada e saída
oxigidos. Dosta maneira ele poderá identificar, por ele mesmo, que dosomponhos ainda
não domina - e, portanto, pode, por si mesmo, buscar suprir o repertório faltante - o
saborá também que desempenhos precisará ainda adquirir para “passar". Em outras
palavras, o aluno poderá ter uma medida precisa do seu roportório presente com relação
ao roportório exigido pelo curso, pois sabe exatamente o que se espera que ele "já
saiba" e o que precisará "saber" para ser bem sucedido no curso.
Uma das vantagens dosta sistematização é que primeiro o profossor detorminará
o que ensinar. Este o que, por sua vez, oriontará depois a seleção dos rocursos para a
aprondizagem: o como ensinar. Um conteúdo, um o que ensinar minimamente
sistematizado o quanfrficável tambórn estabelecem ocasião para estudos mais robustos

Sol»rc t'ompi>r1.imcnlo c CogniçAo 389


sobro variáveis quo podorn ter influência no procosso formativo, o como ensinar, tais
como, por exemplo, diferentes estratégias de ensino/ aprendizagem, características do
professor, características do aluno, ordom de exposição aos conteúdos, influência dos
pró-roquisitos, etc. A possibilidade de que estes estudos possam sor conduzidos em
ambiente "natural’’ e pelos próprios instrutores/ professoros pode sor uma rica fonte de
problumas para a pesquisa básica na área, onde estos achados proliminaros poderão
receber um rofinamento concoitual e um tratamento metodológico mais rigoroso,
Ao ensinar a Análise do Comportamonto nas divorsas disciplinas do curso do
graduação, o intorosse, a criatividade e a habilidade de cada professor poderão encontrar,
por certo, inúmeras outras maneiras de trabalhar melhor esta tentativa de sistematização,
aqui apresentada somente em caráter sugestivo e embrionário. Os instrumentos
concoituais o motodológicos para isso já existem (Nagle, 1998, Teixeira, 2006; Vargas,
1974), Rosta-nos utilizá-los e fazer com que, em casa de ferreiro, o espeto seja de ferro.

Referências

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verbal e comportamento não-verbal Em Gullhardl, H e col (orgs.) Sobre comportamento e
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Andery, M A., Micheletto, N & Sério, T M (2001). Análise Funcional na Análise do Comportamento Em
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Vargas, J S Fomiular objetivos comportamentais úteis Sâo Paulo, EPU, 1974
West, R P & Hamerlynck, L A (1992) Designs for Excellence in Education The Legacy of B F Skinner
Boston: Sopris West

APÊNDICE 1

LISTA DE DESEMPENHOS PARA O TREINAMENTO DE COMPETÊNCIAS EM ANÁLISE DO


COMPORTAMENTO
Roosevolt R Stnrlmg

Elftbomda para fins didáticos a partir ria Iraduçào e adaplaçflo das "Tnsk Lisls"
preparada* pelos FLORID A B FHA VIOH A N A IY S IS C E R TIFIC A TIO N PR OG RA M a
BEHAVIORAL ANALYST C E R TIFIC A TIO N BOARD, IN C. [lexlos originais
recuperados na World W ide W eb em março de 2004]

CADA UM DOS D ES E M P E N H O S A BAIXO D EVE R A O C O R R ER C O N F O R M E M O D ELA DO EM PELO MENOS


90% DAS O P O R TU N ID A D ES, TANTO SOB C O N TRO LE DE PR O M PT S VERB A IS C O M O SOB CONTRO LE
D IR ETO DAS C O N TIN G ÊN C IA S.

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 1
__________________ CONSIDERAÇÕES ÉTICAS_____________
_______________________ DESEMPENHOS___________________
1-1 Somente mobilizar ou por qualquer maneira influenciar o cliente
I através do uso de informações fidedignas e precisas da eficácia da intervenção e
j da competência daquele profissional no emprego da Análise do Comportamento
Aplicada.
1-2 Exercer a prática analitico-comportamental somente nos limites da
própria competência profissional em Análiso do Comportamento Aplicada e
procurar supervisão, interconsulta ou treinamento e/ou fazer encaminhamentos
conforme necessário.__________ ________________ ____________________
1-3 Desenvolver competência através do engajamento ativo em pelo
menos uma atividades profissional de educação continuada a cada ano.
1-4 Obter o consentimento informado escrito do cliente dentro dos limites
dos padrões éticos e legais aplicáveis. Um consontimento informado implica a
presença clara e inequívoca dos seguintes elementos:
a. capacidade, capaadado legal e psicológica para tomar decisões;
b. informação completa, a informação explicita de que (1) a pessoa
tem o direito de recusar qualquer procedimento naquele momento ou em
qualquer momento futuro sem qualquer constrangimento ou punição, (2) a exata
natureza do procedimento envolvido, (3) os benefícios esperados e os riscos
potenciais do procedimento e (4) a relação risco/ benefício do abordagens
altornativas, incluindo nada fazer,
c. aceitacào voluntária: nào houve coerçáo, pressão ou sedução para

Sobre ('omport.imcnto e Coqnlv.lo 391


a obtenção do consentimento,
1-5 Identificar relações funcionais nos limites dos padrões éticos
aplicáveis:
a. o método do avaliação menos mvasivo o de menor risco foi usado
para obter somente as informações necessárias o suficiontes para a formulação
de hipóteses razoáveis;
b. a cada momento, o bem estar do cliente no curto, médio e longo
prazos foi o critério orientador primário das açõesL
1-6 Auxiliar o cliente na seleção do comportamentos-alvo ou estilo de vida
a serem submetidos a mudanças - como também objetivos intermediários e finais
da intervenção - que sejam compatíveis com;
a. as dimensões aplicáveis da Análise do Comportamento Aplicada
(ver Area de Competências # 2, item 2.17),
b. as leis aplicáveis;
c. os padrões óticos e profissionais para o oxercicio da análise do
comportamento conforme estabelecido nos códigos profissionais pertinentes,
neste documento, no Hw Hclmont Report o no documonto "Direitos do Cliente"
publicado pela ABA.________________ _________________________________
1-7 Iniciar, continuar, mudar ou descontinuar serviços analítico-
comportamentais somente quando:
a. existirem evidências documentadas e a concordância dos principais
participantes de que existe a necessidade de mudança do comportamento;
b. a relação risco/ beneficio da açâo pretendida for mais favorávol do
que o risco/ boneficio de ações alternativas,
c. existirem claras e inequívocas evidências de que o ambiente social
e o ambiente físico proverá suporte para a implementação das mudanças
pretendidas ou sua interrupção (ver Área de Competências U 12).________ _
1-8 Identificar e conciliar contingências que possam comprometer a
relação terapeuta-clientejncluindo o cliente e terceiros envolvidos.
1-9 Usar os procedimentos mais eficazes de avaliação funcional, de
avaliação e monitoramento continuado da intervenção e de mudança de
comportamento dentro dos padrões óticos aplicáveis, tendo em consideração a
recomendação de que devem ser selecionados os processos de maior eficácia
provável que apresentem, ao mesmo tempo, a menor restritividade, invasividade
e possibilidade de efeitos indesejáveis para o cliente._____________________
1-10 Proteger a confidencialidade da relação profissional e do cliente
1-11 Explicitar de forma verdadeira e precisa as próprias contribuições e
aquelas de outros na prática, ensino e desenvolvimento profissional da Análise do
Comportamento.____________________________________________________
1-12 Garantir que a dígmdado, saúde o segurança do cliente estejam
proteoidas em todos os momentos.__________________________________
1-13 Dar preferência a métodos de avaliação o intervenção que tenham
validação científica e usar métodos científicos para avaliar aqueles que ainda não
foram validados cientificamente.____________________ _________________
1-14 Utilizar procedimentos de emergência nos limites dos padrões óticos
aplicáveis:
a. procedimentos de emergência só devem ser usados na existência
de evidência documentada ou consensual do seu uso para proteger o cliente,
terceiros ou o ambiente;
b. a proteção da saúde e da segurança da pessoa que receberá a
intervenção emergenclal deve ser o critério prioritário na docisão de qual
procedimento será utilizado;
c. qualquer utilização de procedimentos de emergência doverá
constituir ocasião para uma avaliação das variáveis que determinaram o seu uso
e a identificação de medidas que possam eliminar ou roduzir o seu uso no futuro.

Knotcvrlt R. St.irlhitf
— “ AREA DE COMPETÊNCIAS #“2
FILOSOFIA, EPISTEMOLOGIA, DEFINIÇÃO E
CARACTERÍSTICAS DA a n A l is e DO COMPORTAMENTO
______________ DESEMPENHOS ________ _____ _
2-1 Declarar e comportar-se quando em açâo profissional de acordo com
os pressupostos filosóficos da Análise do Comportamento, tais como o caráter
ordenado do comportamento, exigência de validação empírica, de análise
oxperimental e o princípio da parcimônia.
2-2 Declarar e exemplificar os pressupostos subjacentes das ciências
naturais e da Análise do Comportamento, tais como a natureza verbal do
conhecimento, o princípio da uniformidade, validação empírica, manipulação
experimental, critério de verdade e de certeza, pragmatismo, modelo de
causalidade, etc._____________ _________________________ __________
2-3 Distinguir entre evidências de natureza especulativa, inferenclal e
experimental, declarando suas características definidoras, implicações lógicas e
valor-verdade._________ _________________________ ________________
2-4 Distinguir entre indução e dedução na produção do conhecimento,
declarando suas características definidoras, implicações lógicas e valor-verdado.
2-5 Dtifinir, identificar e exemplificar construtos teóricos (e construtos
hipotéticos) e construtos empíricos (e variáveis intervenientes), declarando suas
características definidoras, implicações lógicas e valor-verdade.
2-6 Identificar a natureza das evidências apresentadas para uma
asserçáo, declarando suas qualificações frente aos critérios de fidedignidade,
validade, generalidade e parcimônia.__________________ _______________
2-7 Definir, identificar e exemplificar os conceitos de mentalismo,
fisicalismo, determinismo, mecaniclsmo, criacionismo, voluntarismo e teorias
homunculares. ________________ ______________________
2-8 Declarar as diferenças entre o dualismo mentalista ou fisicalista com
relação ao monismo naturalista.________ __________
2-9 Distinguir entre explicações mentalistas/ internalistas e ambientais/
externalistas dos fenômenos comportamentais. _____
2-10 Definir, identificar, exemplificar e distinguir entre análises estruturais
e análises funcionais dos fenômenos comportamentais.________________
2-11 Declarar as características e pressupostos definidores e distinguir
entre Behaviorismo Primitivo (S-R), Behaviorismo Mediacional, Behaviorismo
Metodológico, Cognitivismo e Behaviorismo RadicaL
______2-12 Definir e exemplificar selecionismo e contextualismo.
2-13 Definir, identificar instâncias e dar exemplos da relevância das
histórias filogenétlca, cultural e ontogenétíca (história comportamentaf) para uma
explicaçflo selecionista do comportamento.______________ ________________
2-14 Declarar o racional e os propósitos de uma ciência natural do
comportamento._______________ ________________________
2-15 Definir, distinguir e relacionar Behaviorismo Radical, Análise
Experimental do Comportamento, Análise do Comportamento, Análise do
Comportamento Aplicada e Tecnologias Comportamentais.
2-16 Descrever e explicar o comportamento, incluindo eventos privados,
em termos analltico-comportamentais (náo-mentalistas e não-flsicalistas)._______
2-17 Usar as dimensões da Análise do Comportamento Aplicada para
avaliar intervenções a fim de determinar se elas são analftico-comportamentais:
a. Aplicacõo: são aplicados os princípios básicos da Análise do
Comportamento (Área de Competências # 3);
b. Comportamental: está demonstrada a natureza inequivocamente
comportamental das VI e VD consideradas; ____________ _

Sobre Comportamento c Cognição 393


c. Analítica: o foco é a determinação de relações confiáveis entre a
resposta e seus eventos antecedentes e conseqüentes;
d. Tecnolóaica: os Drocedimentos estão definidos de maneira precisa e
completa;
e. Consistência conceituai: os procedimentos estão descritos em
termos dos princípios básicos e estão neles ancorados;
f. Eficácia: as mudanças de comportamento sâo significativas paru os
envolvidos, custo efetivas e eficientes. Procedimentos para assegurar a
manutenção e generalização da mudança comportamental estão contemplados;
g. Generalidade: os analistas do comportamento tentam descobrir
procedimentos que possam ser aplicados eficazmente para muitas pessoas em
muitos contextos.
2-18 Interpretar artigos da literatura analltico-comportamental,
a. identificando a variável dependente,
b. identificando a variável independente;
c. identificando a medida da resposta e o Intervalo de registro.
d. identificando linha de base e intervenção;
e. identificando comprometimentos da validade interna;
c. determinando se relações funcionais foram estabelecidas/
demonstradas.

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 3
p r in c íp io s , p r o c e s s o s e c o n c e it o s b á s ic o s .
DESEMPENHOS
3-1 Definir a unidade de análise do comportamento e declarar sua
importância para uma ciência natural do comportamento.
3JMDeíinir, identificar e dar exemplos de estímulos.
3-3 Definir, identificar e dar exemplos de respostas.
3-4 Definir, identificar e dar exemplos de ambiente.
3-5 Definir, identificar e dar exemplos de comportamento.
3-6 Definir, identificar e dar exemplos de classes de respostas e classes
i
de estímulos.
3-7 Definir, identificar e dar exemplos do repertório comportamental.
3-8 DefinirLidentificar e dar exemplos de contingência^
3-9 Definir, identificar e dar exemplos de relações funcionais.
3-10 Definir, identificar e dar exemplos de análises moleculares e
molares.
3-11 Definir, identificar e dar exemplos de operações e procedimentos de
apresentação de estimulo e de conseqüenciamento de respostas, distinguindo
entre operação, procedimento e resultado.
3-12 Definir, identificar e relacionar funcionalmente US, CS e CR.
3-13 Definir, identificar e relacionar funcionalmente os três termos da
contingência (S . R -> Sr)
3-14 Definir, identificar e dar exemplos do modelo respondente de
condicionamento, incluindo CER’s.
3-15 Definir, identificar e dar exemplos de sombreamento, bloqueio, pré-
condicionamento sensorial e condicionamento de segunda ordem.
3-16 Definir, identificar e dar exemplos do modelo operante de
condicionamento.
3-17 Definir, identificar e dar exemplos de operantes.
3-18 beflnír, identificar e dar exemplos da interação operante-
respondente (emoção), incluindo CER's, supressão condicional e estímulos pré-
aversivos e pré-apetitivos.
3-10 Definir, identificar e dar exemplos de comportamentos encobertos,
incluindo o papel das CER's.

394 Koosrvrlt R. Starling


3-20 Definir, identificar e dar exemplos de reforçadores e punidores
condicionais e incondicionais, incluindo os estímulos sensorlais.____________
3-21 Definir, identificar e dar exemplos de reforçamento positivo e
negativo.__ _______ _________ ______________
______ 3-22 Definir, Identificar e dar exemplos de punição positiva e negativa.
3-23 Definir, Identificar e dar exemplos de extinção.
3-24 Definir, identificar e dar exemplos de operações e procedimentos de
controle de estimulo^ _
3-25 Definir, identificar e dar exemplos de generalização e discriminação.
3-26 Definir, identificar e dar exemplos de discriminação condicional e
classes de ordem superior._______________________________________
3-27 Definir, identificar e dar exemplos de operações estabelecedoras.
3-28 Definir, identificar e dar exemplos de esquemas de reforço
discriminando os seus efeitos diferenciados nas dimensões do responder.
3-29 Definir, identificar o dar exemplos de combinações de esquemas de
reforço, discriminando os seus efeitos diferenciados nas dimensões do
responder.____________ ______________________________________
3-30 Definir, identificar e dar exemplos de comportamento de escolha
relacionando-o à "comparação com o modelo" (matching taW).______________
3-31 Definir, identificar e dar exemplos de relações de equivalôncia de
estímulos._______________________ ____________________________
3-32 Definir, identificar e dar exemplos da unidade de análise do
comportamento verbal. __
3-33 Definir, identificar e dar exemplos de comportamentos de
transcrição, ditndo, textual, ecóico e imitativo. ______________
3-34 Definir^ identificar e dar exemplos de mandos. __
3-35 Definir, identificar e dar exemplos de tatos.
3-36 Definir, identificar e dar exemplos de intraverbais.______________
3-37 Definir, identificar e dar exemplos de autocllticos.
3-38 Definir, identificar e dar exemplos de comportamento modelado
pelas contingências e comportamento verbalmente governado (regras)._______
3-39 Identificar e dar exemplos das relações e interações entre a
aprendizagem verbal e não-verbal. _______________
3-40 Definir, identificar e dar exemplos do comportamento de resolução
do problemas, distinguindo tomada de decisão de situação problema e
declarando a funçflo dos pré-correntes.______________________________
3-41 Discriminar as relações entre os princípios, processos e conceitos
básicos explicitando os seus mecanismos de açflo e interações na análise
funcional de episódios comportamentals reais ou modelares._______________
3-42 Listar pelo menos trôs áreas da Análise do Comportamento sob
controvérsia nos últimos quatro anos, conforme publicações nos JEAB/ JABA/
TAVB, declarando as principais teses defendidas pelos autores envolvidos, a
natureza da evidência oferecida e a que teses se opõem.__________________

Sobre Comportamento e CoRniçilo 395


~ X rè a de COMPETÊNCIAS # 4
AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO
[CARACTERÍSTICAS E RACIONAL]
DESEMPENHOS_________________ _
______ 4-1 Declarar as características definidoras de uma análise descritiva._________
4-2 Declarar o racional para conduzir uma análise descritiva.
4-3 Declarar as características definidoras do processo de manipulação
sistemática (demonstração de relações funcionais):
a. selecionando e justificando a seleção de vários métodos;
_________ b. utilizando e justificando a utilização de vários métodos._____________
4-4 Declarar o racional para utilizar a manipulação sistemática (demonstração
de relações funcionais) e para a determinar a fidedignidade, validade e genoralidade
das relações tuncionais demonstradas. __________________________

ÂREA DE COMPETÊNCIAS # 5
AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO
_____________ [MÉTODOS DE ANALISE DESCRITIVA]_________
_______________________ DESEMPENHOS___________ ~_______
5-1 Coletar dados descritivos.
a. selecionando e justificando a seleção de vários métodos;
_________ b. utilizando e justificando a utilização de vários métodos._____________
5-2 Utilizar vários métodos para organizar e interpretar dados descritivos,
justificando a utilização. ___________

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 6
AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO
________ [AVALIAÇÃO EXPERIMENTAL DA INTERVENÇÃO!
'___________ DESEMPENHOS _________
6-1 Utilizar várias metodologias para demonstrar relações funcionais e para
determinar a sua fidedignidade e generalidade, através da replicação direta e da
repllcação sistemática, respectivamente. ______________________ ______
6-2 Manipular sistematicamente variáveis independentes para analisar seus
efeitos no tratamento,
a. Utilizando delineamentos A-B, A-B-A ou A-B-A-B, justificando seu uso
fócnlco e ótico e interpretando as evidências obtidas.
6-3 Utilizar delineamentos terapêuticos alternados (multi-elemento, tratamento
simultâneo, esquemas múltiplos ou concorrentes, condições alternadas e ensaio
randômico). ___________ _________ _ _ _ _ _ _
_____ 6-4 Utilizar delineamento de critérios móveis.__________________________
6-5 Utilizar delineamentos de base múltipla.
6-6 Identificar variáveis particulares aos contextos aplicados que precisam ser
gerencjadasjjuando da utilização de manipulações sistemáticas.
6-7 Completar uma análise de componentes.
6-8 Completar uma análjse paramétrica. __

396 Rooscvelt R. Sl.irlin#


, ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 7
AVALIAÇÃO DO COMPORTAMENTO
____________ ÍMENSURAÇÃO DO COMPORTAMENTOl_______
DESEMPENHOS
I_____ 7-1 Definir comportamento em termos observáveis e mensuráveis.__________
I 7-2 Identificar as dimensões mensuráveis do comportamento (por ex.,
freqüência, duração, latència e IKT)
7-3 Dizer as vantagens e desvantagens do uso de procedimentos de
mensuraçâo continua e tócnicas de amostragem (por ex., registro por intervalos
i parciais ou totais, amostragem instantânea, etc.)____________________________
| 7-4 Selecionar o procedimento adequado de mensuraçâo dadas as
dimensões do comportamento e a logística da observação e registra
7-5 Selecionar um esquema de observação e periodos de registro
7-6 Usar e justificar o uso de medidas diretas do comportamento (por ex.,
freqüência, razão, duraçfio, latència, tempo inter-respostas (IRT).________________
7-7 Usar e justificar o uso de medidas indiretas do comportamento (por ox.,
percentual de ocorrência, critério de tentativas, registro de intervalo parcial, registro de
intervalo total, amostragem temporal momentânea).
7-8 Usar vários métodos para avaliar os produtos de procedimentos de
medidas, tab como Indice de concordância inter-observadores, fidodignidade, validade
j e confiabilidade.___________________________________________________

AREA d e COMPETÊNCIAS # 8
APRESENTAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DE DADOS
_____________________DESEMPENHOS___________________
8-1 Selecionar métodos de apresentação de dados que assegurem a
discriminação precisa de relações quantitativas.
8-2 Usar gráficos de intervalo fixo.
a. titulando e calibrando os eixos horizontal e vertical;
b. plotando os dados,
c. mostrando linha de base, mudanças em funçáo de intervenções,
mudanças ambientais potencialmente significativas e interrupções na coleta de
dados,
________d. determinando o nivel, tendência e variação dos dados.___________
_____ 8-3 Usar Celeratlon Chart padrão.______________________________
_____ 8-4 Usar um Registro Cumulativo para apresentar dados_____________
8-5 Usar representações de dados que evidenciem padrões de
comportamento (por ex., gráfico de dispersão)
8-6 Determinar discrepâncias entre o nível atual e padrões de
desempenho, onde aplicável. ______________ _____
8-7 Decidir e justificar a decisão de continuidade/ mudança da intervenção
atual com base em alterações no nível, tendência e variação apresentados._____
8-8 Interpretar dados apresentados em vários formatos de acordo com os
princípios básicos da Análise do Comportamento.________________________
8-9 Fundamentar decisões de ação clinica com base em dados
apresentados em vários formatos.__________________________________ _

Sobre Comport.imenlo e C'o^niv<lo 397


ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 9
SELEÇÃO DE COMPORTAMENTOS-ALVO E
_ DE RESULTADOS INTERMEDIÁRIOS E FINAIS _
^ " _ DESEMPENHOS
9-1 Proceder uma anélise de tarefa (task a n a l y s i s ) . _____________
—= 9-2 Identificar resultados finais paru a pessoa ou puasoas unvolvldas oni
termos observáveis e mensuráveis.
9-3 Identificar resultados intermediários seqüenciais ou concorrentes.
9-4 Fazer recomendações ao cliente com relação aos objetivos-alvos
bnseado em fatores tais como: preferências do cliente, análise de tarefa,
repertórios existentes, suporte ambiental, impedimentos, validade social,
resultados mensuráveis e a melhor evidência cientifica disponível.____________
9-5 Identificar os comportamentos-alvo da intervenção om tormos
observáveis e mensuráveis:
a. incluindo informações específicas que identifiquem claramonte as
modidas específicas e características topográficas e/ou sua definição em tormos
do antecedentes e conseqüentes;
b. Declarando precisamente o padrão de desempenho e critório de
fluência para os comportamentos-alvo.______________________________________
9-6 Fazer recomendações ao cliente com relação a estratégias de
intorvenção baseado em fatores tais como: preferências do cliente, análise de
tarefa, repertórios existentes, suporfe ambiental, impedimentos, validade social,
resultados mensuráveis e a melhor evidência cientifica disponível.______
9-7 Fazer recomendações ao cliente com relação a comportamentos que
precisariam ser implantados, fortalecidos e/ou enfraquecidos para se obter os
resultados declarados da intervenção.
9-8 Ao planojar o enfraquecimento de um comportamento, selecionar um
comportamento alternativo aceitável que possa sor implantado ou fortalecido.
9-9 Estabelecer repertórios que facilitem relações intrapessoais e
interpessoais positivamente reforçadoras usando procedimentos de modificação
do comportamonto._______________________________________________________
9-10 Discriminar e conduzir mudanças ambientais que reduzam a
necessidade de «ervlços analitico-comportamentais. ______________
9-11 Identificar as contingências que atuam e/ou passarão a atuar sobre o
comportamento daqueles responsáveis por conduzir procedimontos de mudança
de comportamento e planejar as intervenções de acordo com esta identificação.

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 10
PROCEDIMENTOS DE MUDANÇA DE COMPORTAMENTO
___ DESEMPENHOS ___
10-1 Definir, identificar, exemplificar e utilizar intervenções baseadas em
operações do apresentação de estímulo, tais como variávei9 contextuais ou
ecológicas, operações estabelecedoras e estímulos discnminativos,_____________
10-2 Definir funcionalmente, identificar, exemplificar e utilizar reforçamento
positivo e negativo:
a. Identificando e utilizando reforçadores,
b. Usando modelos apropriados e osquemas de reforçamento,
c. Usando procedimentos de privação de resposta (por ex., principio
de Premack);
d. Discriminando possíveis efeitos indesojáveis do uso do
reforçamento o preparando planos contingnnciais para manejar esta
possibilidade._________________________________________________ _
10-3 Definir funcionalmente, identificar, exemplificar o utilizar punição
positiva e negativa;

398 kooscvcll lv St,irlinn


a. Identificando e utilizando punidores,
b. Usando modelos apropriados e esquemas de punição,
c. Discriminando possivois efeitos indesejáveis do uso da punição o
preparando planos contingentais para manejar esta possibilidade._______ _____
10-4 Definir funcionalmente, identificar, exemplificar e utilizar a extinção;
a. Identificando possíveis reforçadores mantendo o comportamento e
usar a extinção,
b. Discriminando possíveis efeitos indesejáveis do uso da extinção o
preparando planos contingentais para manejar esta possibilidade.
10-5 Distinguir, identificar e dar exemplos de dóficits e excessos
comportamentais sob controle respondente e utilizar as intervenções indicadas.
10-6 Distinguir, identificar e dar exemplos de dóficits e excessos
comportamentais sob controle operante e utilizar as intervenções indicadas._____
10-7 Definir, identificar, exemplificar e utilizar esquemas de reforçamento.
______10-8 Definir, identificar, exemplificar e utilizar reforçamonto diferencial.
10-9 Definir, identificar, exemplificar e utilizar procedimentos do treino em
d is c r im in a ç ã o .___________________________ ______________________
10-10 Definir, identificar, exemplificar e utilizar prompts e procedimentos
de osvanecimento de prompts._________________________________________
10-11 Definir, identificar, exemplificar e utilizar instruções e regras.
_______10-12 Definir, identificar, exemplificar e utilizar modelação e imitação._____
_______10-13 Definir, identificar, exemplificar e utilizar modelagem._____________
_______10-14 Definir, identificar, exemplificar e utilizar encadeamentos._________
10-15 Definir, identificar, exemplificar e utilizar procedimentos de
esvanecimento (fade in e fade oufi. ________________________________
10-16 Definir, Identificar, exemplificar e utilizar técnicas de Treinamento
Incidental. _____ _______
10-17 Definir, identificar, exemplificar e utilizar Instrução Direta, Précision
Teaching e PSI (Personalized System of Instruction)._______________________
10-18 Definir, identificar, exemplificar e utilizar o principio de Premack.
_______10-19 Definir, identificar, exemplificar e utili/ar tentativas discretas.________
10-20 Ooftnir, identificar, exemplificar e utilizar Contrato de Contingências.
10-21 Definir, identificar, exemplificar e utilizar economia simbólica,
incluindo sistemas de níveis.
10-22 Definir, identificar, exemplificar e utilizar agrupamento do
contingôncias independentes, interdependentes e dependentes._______ _______
10-23 Preparar e utilizar planos contingentais para manejar efeitos de
contraste comportemental e de extinction bursts._____________
10-24 Definir, identificar, exemplificar e utilizar conjuntos técnicos para;
a. aumentar o valor dos parâmetros da resposta;
b. diminuir o valor dos parâmetros da resposta,
c. coniuntos mistos (aumentar e diminuir o valor dos parâmetros da
resposta).__________________________________________________________
10-25Definir, identificar, exemplificar e utilizar Programas
Comportamentais.__________________________________ ___ _____
_____ 10-26 Definir, identificar, exemplificar e utilizar momento comporia mental._
10-27 Definir, identificar, exemplificar e utilizar "comparação com o
modelo" (matching law) e discriminar variáveis influenciando escolhas.
10-28 Definir, identificar, exemplificar e utilizar programas do aquisição de
linguagem que utilizem a taxonomia da análise do comportamento verbal de
Skinnor (por ex., ecóicos, mandos, tatos, intraverbais).______________________
10-29 Definir, identificar, exemplificar e utilizar procedimentos para
treinamento de aquisição/ ampliação do comportamento verbal._______________
10-30 Definir, identificar, exemplificar e utilizar estratégias para
desenvolver repertório de autocontrole.

Sobre Comportamento e Co^niçAo 399


10-31 Definir, identificar, exemplificar e utilizar procedimentos do mudança
de comportamento para facilitar a generalização das classes de estímulos e de
respostas,
a. selecionando comportamentos-alvo que farão contato com as
contingências naturais;
h. desenhando p ro c o d im e n to s de m udança quo fu cillto m a
m a n u te n c flo d o n o v o re p e rtó rio o u ito m d « re p e rtó rio ._______________
10-32 Definir, identificar e utilizar estratégias do equivalência de estímulos.
10-33 Definir, identificar, exemplificar e implantar repertórios de apoio.
10-34 Definir, identificar, exemplificar e utilizar sistemas molares (eslàgios
ou nlvois).__________________________________________________________
10-35 Definir, identificar, exemplificar e utilizar manejos para intorvir nos
comportamentos encobertos (incluindo comportamento emocional).__________ _
10-36 Definir, identificar, exemplificar e fazer uso clinico dos operantos
vorbais.
10-37 Completar uma Avaliação Funcional do Comportamento para uso
clinico,__________________________________ _______________________ __
10-38 Listar os erros mais freqüentes na implementação de um programa
de intervenção clínica analltico-comportamental, discriminar suas variávois
criticas, implementar planos do monitoração continuada para a sua detecção
precoce e implementar ações corretivas para cada um deles._______

ÁREA DE COMPETÊNCIAS # 11
MANEJO DE EMERGÊNCIAS
________ DESEMPENHOS................................. ...........
11-1 Definir situação de emergência.
11-2 Declarar o papel e a função dos procedimentos do emergência.
11-3 Declarar os componentes essenciais e as precauções para o
manejo de procedimentos de emergência e implementar um plano de ação
eficaz.

~~ÃREÃ DE COMPETÊNCIAS # 12
DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS DE APOIO _
_____ _________________ DESEMPENHOS___________
12-1 Selecionar, desenvolver e utilizar programas de tremamonto de
competências para pessoas que seiam responsáveis por conduzir avaliação
funcional e procedimentos de mudança de comportamento.
12-2 Selecionar, desenvolver e utilizar sistemas eficazes de monitoração
de desempenho (performance appraiaal) e sistemas de reforçamento._________
12-3 Selecionar, desenvolver e utütsar sistemas para monitorar a
integridade dos procedimentos.____________________________________________
12-4 Implantar sistemas de apoio para serviços analltico-
comportamentais com pessoas direta ou Indirelamonte envolvidas com estes
serviços.__________ __________________________ ___________ __________ ____
_

12-5 Assegurar o apoiode outros necessários para identificar,


implementar e manter um complexo de serviços e suporte quo 3 e |a m
necessários para a manutenção dos repertórios comportamonfais do cliente no
sou ambiente natural.
12-6 Prover serviços analítico-comportamentais em colaboração com
outros que apóiem e/ou provenham outros serviços para o seu cliente. ___

400 Rotina Rlfllictlo Pliit, Di.in,i losrllo I .iloni, M.iklllm Nunes H.ipttsl.i
Capítulo 35
l/rgência c emergência com crianças em
UTI Pediátrica: Contingências
de avaliação e intervenção.
Kosana Kighetto Dias*
Diana losello Laloni**
M akitim Nunes Baptista***

A Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) caracterlza-se como um dos locais de


atendimentos médicos de urgência e emergência. Entendem-se como casos do
emergência, aqueles mais graves que necessitam de atendimento imediato ou no
máximo num período de 24 horas, os casos de urgência sâo aqueles que podem ser
atendidos num período de 24 a 48 horas.
As Unidades de Tratamento Intensivo para crianças sáo denominadas de UTI
Pediátrica, são setores de internação para tratamentos e cuidados intensivos, 24 horas
por dia. Atualmente o corpo técnico é composto por médicos, residentes, equipe de
onfermagem e psicólogo clinico. A presença do psicólogo clínico é obrigada por norma
federal para hospitais de grande porte. Desde a entrada desse profissional nessas
unidades médicas, a atenção prestada à criança pode ser alterada pelas contingências
analisadas pelo psicólogo.
Observa-se quo na maioria das vozes a triagem é feita pela enfermeira chefe,
sendo as contingências da enfermidade consideradas prioritariamente. O psicólogo
clínico com olhar de analista de comportamento identifica as contingências sobre o
comportamento e a doença, desde a criança, seus familiares e equipe de atenção. O
conceito de risco psicológico deve ser avaliado, assim como os critérios de urgência e
emergência em Psicologia necessitam de desenvolvimento.
A busca da solução para um problema de saúde considerado exclusivamente
módico, passa a ser tratada como uma questão de ordem psicológica também. Para
tal sugere-se a discussão da ação do psicólogo como analista de contingências na
Unidade de Tratamento Intensivo Pediátrico.

Fundamentação Teórica
Para Wong (1999), a hospitalização infantil representa uma modificação do
estado usual de saúde e da rotina ambiental, pois as crianças possuem um número
limitado de mecanismos de enfrentamento para resolver os eventos que produzem
estresse ou risco psicológico frente às mudanças ambientais. As respostas das crianças

‘ ProfoMora ti Coordenadora do Cureo d* P«kx*>gla do Cantro Untvomttârto Hormlnío Ornatto - Uniaran» Doutora om Saúda da Criança o
do Aríotawcantai - Clpad, Unfcamp
**Prt)h»Mxa do Curvo da Palcotoflta da PUCCampIna», Dooanta do Programa da Póa Graduaçío Strlctu Sanau om P»k:ologia, Clénda o
PrnftaaAnda PUCCampIna«
‘ “ Dooanta do Programa da Póa-GraduaçAo Strlctu Sanau am Psicologia da UnivarakJada 8*0 Frandaoo (USF). Campua Itatlba

Sobre Comportamento c Co^ni^o 401


à hospitalização são influenciadas por suas idades e períodos do desenvolvimento que
remetem à sua capacidade cognitiva de avaliação e compreensão, experiência prévia
com a doença ou hospitalização, habilidade de enfrentamento inatas e aprendidas, a
gravidade do diagnóstico e o sistema de suporte disponível.
De acordo com Gomes e Lunardi Filho (2000), a internação hospitalar do
crianças caracteriza-se como um possível fator do risco para a manifestação do estrosso
e desestruturação familiar. Entondem que as famílias do crianças hospitalizadas como
clientes, que também necessitam de cuidados, especialmente quanto ás suas
discriminações frente ao processo de hospitalização o da doença. Estas variáveis podem
atuar como fatores desorganizadores, com possibilidades de ruptura no processo de
cuidados às crianças e surgimento de transtornos comportamentais, tanto para os
infantes, quanto de seus cuidadores.
Acrescentam Dias, Baptista e Batista (2003), que a prática da assistência
psicológica prestada em contextos do pediatria, nos quais crianças, com doenças diversas,
juntamente com seus familiares, deve estar atenta ao tempo superior de cinco dias do
internação. Nestas situações pode-se prever a tendência destes indivíduos para
desenvolverem transtornos comportamentais e/ou psicológicos. Atontam também para a
relevância de detectar imediatamente após a hospitalização, alterações psicológicas na
criança e em sua família que possam aumentar a probabilidade do desenvolvimento de
comportamentos que possam afetar a boa evolução do quadro clinico.
Por sua vez, Vessey (2003) atesta que se faz igualmente importante, analisar e
intervir nas respostas psicológicas das crianças no momento da hospitalização o como
as mesmas são construídas. Aponta que é necessário avaliar três focos quo envolvem
as crianças: variáveis maturacionais e cognitivas (nível de desenvolvimento, experiências
anteriores e estilos de enfrentamento); variáveis ecológicas (interação entre família e o
hospital) o as variáveis biológicas (fatores patofisiológicos). Propõo que novos ostudos
de intervenção dovem considerar as diferenças individuais de crianças e seus cuidadores
para ajudá-los no manejo dos fatores de risco que ocorrem na hospitalização, para que
sejam discriminadas suas capacidades do enfrentamento na promoção da maturação
emocional e na circunstância de hospitalização
Salienta-se dessa forma, conforme as exposições anteriores quo os contextos
que envolvem a Pediatria cuidam dos problemas de um período do desenvolvimento do
vida e não apenas dos problemas de um órgão, de um aparelho ou sistema Devem-se
considerar ainda fatores de influência, como a idade da criança, a presença constante
de um familiar junto á criança e às possibilidades de diversas doenças que podem
envolver o quadro clinico.
Torna-se um desafio para o psicólogo, desse modo, segundo Dias, Baptista e
Baptista (2003), avaliar e trabalhar em contextos da área de pediatria, com contingências
que evolvam as crianças e os seus familiares, como: dúvidas quanto aos aspectos
legais e burocráticos da estrutura hospitalar (normas e rotinas, constituição da equipe,
seus direitos e deveres); compreensão do processo de saúde-doença de suas crianças
(adoecer, diagnóstico, procedimentos, tratamento, prognóstico); comportamentos de
ansiedade, medo, tristeza, raiva, culpa, insegurança (frente à doença, à hospitalização,
à equipe de saúde, aos procedimentos e tratamento); relações interpessoais com
módicos e equipe multiprofissiona); atitudes quanto ás críticas recebidas (positivas e
negativas); limitações físicas ou pessoais (estresse, nervosismo, cansaço), sociais
(família, rede de apoio etc.) e físicas (adaptação ao contexto hospitalar e seus estímulos).
Caracterizada como a área hospitalar que concentra recursos humanos e
materiais especializados visando à recuperação do paciente grave e de alto risco, a UTI
reúne um conjunto de fatores que a caracterizam como o local mais tenso e traumatizante

402 Ros.mii Ritihctto Di.is, l>i.in.i loscllo I .ilonl, M.ikilim Nunes H.iplisl.i
do hospital (Corrêa, Sales e Soares, 2002). A propósito, ressalta-se que esta localidade
apresenta uma rotina de 24 horas de assistência contínua e de atendimento
praticamente individualizado, porém, cercada de constantes situações de urgências e
emergências que podem trazer toda uma gama de situações ou contingências
ambientais que podem atuar como desestabilizadoras para o equilíbrio psicológico.
Cabe ainda, ressaltar que ao ingressar em uma UTI, o indivíduo ó totalmente deslocado
da própria rotina, de seus hábitos diários e privacidade, além disto, sua autonomia ê
restrita passando a maior parte do tempo no leito. Considerar-se ainda que as suas
solicitações são avaliadas em alguns locais, pela triagem da equipe quanto à
conveniência dos atendimentos destas, para a sua saúde física.
Novaes, Romano e Lage (2000) afirmam ainda que o intensivlsmo corresponde
a uma especialidade voltada completamonte ao paciente critico, que muitas vezes não
está internado somente por um comprometimento específico, mas por um
comprometimento em todo o seu organismo. Diante destes aspectos, a UTI pode
caracterizar-se como:
"(...) um local que abrange diagnósticos de diversas especialidades, como:
politraumas, traumatismos cranianos de níveis leve, moderado e grave, insuficiência
respiratória aguda; mfarto do miocárdio; angina instável, insuficiência renal aguda;
recuperação pós-cirúrgica; sepse (infecção localizada); septicemia (infecção
generalizada), ferimentos por arma de fogo; acidente vascular hemorrágico ou
nào, parada cardiorespiratória, entre outros" (Pregnolatto e Agostinho, 2003, p.93).

Características da Assistência na Psicologia na Saúde


Dentre os caracteres que devem ser considerados na prática psicológica em
contextos de saúde propõem-se: a relaçào entre os fatores de respostas do organismo
e às condições ambientais para as quais está exposto; identificação deste
comportamento com a saúde montai, do ponto de vista do analista do comportamento,
para o qual a análise das contingências existentes, deve ocorrer. Para tanto, as respostas
do indivíduo hospitalizado, no tocante ao comprometimento da relação destas com o
ambiente institucional e a sua saúde, devem ser analisadas por meio das relações
contingenciais existentes e que podem promover fatores de riscos psicológicos ou
mesmo a predisposição para estes.
Por risco, segundo Fletcher, Fletcher e Wagner (1996), compreende-se a
probabilidade de um evento indesejado, sempre associado aos fatores biopsicossociais
como, por exemplo, quaisquer situações que ocorrem fora do padrão de vida cotidiano
do indivíduo, como neste caso, a hospitalização. Como fatores de risco, os autores
referem-se aos eventos que se associam ou podem promover maior risco no
desenvolvimento de uma situação indesejada, propiciando ao indivíduo uma situação
de risco, por exemplo: aspectos relacionados à hereditariedade (maior probabilidade
em desenvolver problemas psiquiátricos), já ter história de perdas (perda de alguém),
mudança na rotina, doenças diversas, contextos ambientais etc.
Desse modo, faz-se necessário observar relações contingenciais diversas quo possam
contribuir para os fatores de risco psicológico ou na apresentação dos comportamentos-problema
dos individuos hospitalizados como demonstra o quadro da página seguinte.
Diante deste panorama, os objetivos da atuação psicológica devem estar voltados
para a análise das relações contigendais da experiência na hospitalização, alóm da compreensão
e discriminação da doença em si pelo paciente; prever e diagnosticar fatores de risco psicológico
que estejam relacionados à apresentação e manutenção de comportamentos-problema e

Sobre Comportamento c CoRniçílo 403


priorizar a análise contextual que norteia a atuaçào psicológica em determinado ambiente
hospitalar. Frente estes objetivos, tanto a avaliação como a intervenção psicológica devem
favorecer uma conduta focal, imediata e resolutiva (características do atendimento psicológico
hospitalar) relacionados aos seguintes critérios junto:
- aos pacientes - implicações frento à adaptação e ao enfrentamonto à rotina hospitalar
e doença;
- atenção aos comportamentos frente às variáveis da hospitalização, associados por
sua voz, aos comprometimentos ontro as relaçõos familiaros e o paciente e no
relacionamento entre a família e a equipe de saúde e,
- discriminação da equipe de saúde diante das reações comportamentais dos pacientes
e seus familiares.
flanada Rim f
EitlmutoiAntoMdaaiM PidraojCflfn^ã Etlm utaa Con—oüantM

Motivo da hospitalização Não adesão ao tratamento Hospitalização prolongada


Hospitalizações anteriores i Grau de autonomia Equipe de saúdo agressiva
(motivos, freqüência etc) ou ignorando as respostas do
paciente
Falta de ou diagnóstico ou i Valor Pessoal Piora do quadro clínico
prognóstico desfavoráveis
Separação das pessoas Sentimentos, pensamentos, I Falta do apoio ou suporto
significativas expoctativas distorcidas familiar.
diversas
História pobro do reportório Depressão, ansiedado I Outros estímulos ambiontais
do enfrentamonto j presentes na hospitalização
etc.
Outros estímulos ambientais i Adaptação ao contexto j
presentes na hospitalização hospitalar e recuperação de
etc, sua saúde etc,
Como sistemática da atuaçào psicológica observa-se a seqüência das condutas
propostas pela figura a seguir (Dias, Baptista e Baptista, 2003).

ContullM no pronluArio do pacMnl«


rumJto do caao ciim u aquip» dn

Encam in ham ento do pncie nto In tervenção PileolòqiC B | I


pwr« rtiilro« «»fvirnn

Este fluxograma caracteriza um modelo de atuação diária do psicólogo em contextos


hospitalares, sendo a triagem psicológica, também denominada de visita psicológica, um
procedimento aplicado, sem necessariamente haver uma solicitação prévia da equipe de saúde
para quaisquer avaliações e/ou intervenções. Esta metodologia objetiva de acordo com os
critérios de influência, para o surgimento e manutenção de fatores de risco psicológicos expostos
anteriormente, prever, discriminar e intervir em comportamentos-problema que possam
comprometer a adaptação do paciente ao contexto hospitalar e ou o seu quadro clinico.

404 Ros.mii Riflhctto Pius, Plan,* To«!lo I aloni, M.ikilim Nunes H.ipIlsUi
Pesquisa na Área e Estudo de Caso
Com o objetivo do invostigar a relação entre a saúdo mental de mâes de crianças
hospitalizadas em UTI o a percepção do suporto familiar, Dias (2005), em sua pesquisa de
doutorado, por meio de estudo longitudinal avaliou ostes aspectos em quatro momentos:
segundo dia de hospitalização, quinto dia ainda de internação na UTI, uma semana (seto
dias) após a alta da UTI e um môs após alta hospitalar da unidade de terapia intensiva. Foram
investigadas 14 mâes em um poriodo de seis meses de cotetas de dados e dentre resultados
encontrados, foram observadas as seguintes ocorrências: não correlação entre o
compromotimonto da saúdo mental das participantes e a percepção do suporte familiar pelas
mesmas, uma vez quo não houve diferença significativa para indicação de alterações desta
última medida nos momentos do avaliação e, observaram-so indicativos do comprometimento
da saúde mental, especialmente nas três medidas do estudo. Estes últimos dados chamaram
a atenção, por corresponderom aos períodos de avaliação, nos quais as participantes
encontravam-se ainda hospitalizadas junto às suas crianças, ocorrendo uma variação
acontuada entre o sogundo e o terceiro momonto, período este que corrospondou à saída do
ambiento da UTI. O Quostionário de Saúde Geral - QSG que discrimina a sovoridado do
distúrbios psiquiátricos, adaptado e validado para a população brasileira por Pasquali et al
(1996) e o Inventário do Percepção de Suporte Familiar - IPSF elaborado por Baptista (2005),
corresponderam aos principais instrumentos de coleta dados utilizados nesta pesquisa.
Do acordo com estes dados parciais, pôdo-se levantar como hipótose, de que
variáveis ambientais prosentes do contexto da UTI Pediátrica puderam contribuir tanto
nos indicativos do compromotimento da saúde mental das mães, assim como para a
não variação da porcepção do suporto familiar percebidos. Dentre estas possibilidades
sugere-se a probabilidade dos escores que indicavam o comprometimento da saúde
mental terem diminuído, em função da discriminação deste momento de crise estar
associada aos outros estímulos estressores relacionados à doença e/ou hospitalização
ou mesmo à ausência ou rodução da gravidade do quadro clínico após a alta do setor.
Deve-se levar ainda atentar para a estimulação aversiva presente na UTI
Pediátrica, como um local restrito para casos críticos, geralmente pautados como riscos
de vida, com aparelhagem diversa, equipada de sons ameaçadores, entre outros,
estivessem também relacionadas aos indicativos no comprometimento da saúde mental.
Estes apontamentos podem ser observados (Youngblut e Shiao, 1993; Baldini et al,
1998; Washington, 2001; Board e Ryan-Wenger, 2003).
No tocante à não variação na percepção do suporte familiar, levantou-se como
hipótese o fato, dentre outras possibilidades, da equipe do saúde, bem avaliada pelas
participantes nos cuidados e atenção para com elas e seus filhos, ter oferecido cuidados
o suporte sociais. Levou-se em consideração para tanto, o alojamento conjunto destas
mães o o tempo longo de hospitalização na UTI (média de dez dias) ou mesmo a
permanência no hospital, após a alta do setor.
Faz-se importante esclarecer, que diante da complexidade desto estudo, objotivou-
se trazer para os leitores alguns dados que propiciassem a reflexão de que sem uma
análise apurada das contingências ambientais oporantes sobro o comportamento dos
indivíduos o destes sobre os contextos que estão inseridos, tem-so pouca possibilidade
de intervenção. Passa-se neste momonto á exposição de um estudo do caso para a
olucídação desta discussão e metodologia comportamental proposta.

Estudo de Caso
C., nove anos, sexo masculino após ser hospitalizado na UTI Pediátrica por um
quadro de infecção gonoralizada, apresentava pouca estabilidado de seu quadro clínico, no
ontanto, som a apresentação de respostas de interação com familiares e equipo de saúdo.
Dontro as queixas apresentadas pela equipe e familiares, a resposta de não falar e cooperar

Sobro CompoMiimenlo c l ’oflniç«lo 405


com os procodimontos diversos, mostravam-so om alta froqüóncia desde a estabilização
de seu quadro critico, pelo qual permaneceu em coma por dez dias e encontrava-se em
estado do consciência há apenas dois dias, no momento da triaqem psicológica. A çjrande
preocupação da equipe de saúde ostava proferida ao risco do retorno da infecção em
grandes proporçõos, com a sintomatologia aparento doprimida de C.
Na primoiru tentativa da psicóloga do contato com o paciontu, após voriticaçtío
do sou prontuário, momento em que tambóm ostavam prosentes a mãe de C. e alguns
membros da equipo, foram observados os seguintes eventos: C. não respondia
verbalmento ás solicitações dos presentes, mostrava-so apático ás estimulações,
inclusivo com a amostra de objetos pessoais, como um do seus brinquedos preferidos,
mas acompanhava com o olhar, os movimentos do um módico rosidente presente no
local nos cuidados com outras crianças.
Ao levantar a história de ocorrência deste comportamento do C. junto aos
familiares o com a equipe de saúde foi constatado quo ostas respostas já vinham
ocorrendo em casa, antos de sua hospitalização, logo após o falocimonto do seu avô
materno, com quem residia e tinha Intimo contato do cuidados e afeto. Junto á equipo
de saúde, quando questionada às respostas de C. frente à sua aproximação, obtivoram-
se como respostas que as únicas verbalizações proferidas pelo paciento foram om
relação aos questionamentos do módico residente, o mesmo para o qual fora observado
os olharos do C, na ocasião da visita psicológica.
Frente estas informaçõos e observações, a psicóloga programou atividades
lúdicas com a participação do módico residente, a princípio o único indivíduo no setor,
para quem possivolmente, como fora observado antoriormonte, C. apresentaria maiores
chancos do se comportar Discutiu-se com o módico rosidente sobre as hipóteses
levantadas das observações já realizadas e levantaram-se dados sobro a funcionalidade
da intoração entre este e o paciente para a intervonção do caso. Objetivou-se com os
atendimentos favorecer a estimulação para que C. discriminasso os motivos da sua
estada na UTI, alterasse seu padrão apático de comportamento e para que tambóm
tivesse a oportunidade, caso fosse possível para referir sobre a porda do avô, motivo
este não comentado pelo mesmo desdo a ocorrência deste evento.
Por meio da análiso funcional realizada e de apenas dois encontros om dias
soguidos ontre a psicóloga, o residonte e C., observou-se maior interação da criança
com a oquipe e com sua mãe, sondo possívol sua transferência para a onformaria o alta
hospitalar após quatro dias desde o início da intervenção psicológica Notou-se pola
fala da mãe que pelo fato do médico rosidente apresentar um padrão do comportamento
parecido om termos do fala, brincadeiras, tom de voz com o avó do C., talvez o efeito da
intervenção tivesse maior impacto nos resultados obtidos. No entanto, notou-se quo
além da possível generalização, deste tipo do operação estabelecedora para o
favorecimonto da mudança das respostas de C., todos os demais membros da equipe
de saúde, inclusive a mãe, após algumas tentativas de contato verbal, desistiam do
fazê-lo, posteriormento a rosposta de apatia de C. O módico residonte, ao contrário,
além do contato verbal, tentava contato físico por moio do brincadeiras, sem afastar-se
de C. na ocorrência da resposta de apatia. Observe-se o quadro da página seguinte
Visualizando a simplicidade na exposição o quadro antorior, devem-se ressalvar
as devidas considerações de que uma análiso funcional provê antes do tudo, como propõe
Moyor (2003), a avaliação e intervenção sobre a funcionalidado das contingências oporantos
na ocasião da ocorrência do padrão do comportamento considerado como problomático;
que esto comportamento padrão, apresenta uma classe de rospostas, possivelmente
encadeadas ou não e que ainda, as situações antecedentes e consoqüontos, geralmente
onvolvom vários estímulos para o controle e manutenção do comj)ortamento-problema.

406 kosiiiiii Kiflhctto Pl.n, Iost-llo I .iloni, M.ikilim Nunes U.iptisl.i


fla Intervenção

£ £
Mãe e enfermeiras CQmpQrtafnentu apático, Mãe e enfermeiras
estimulam por meio de som reauüstaa varbais. desistem do contato.
contato verbal. DQuca. intor acâfl_Yisufll
Após jas.intofvençõos

ãQ S £

Médico residente Apresentarão gradual Maior permanência do


interage por meio de de respostas verbais e módico cl paciente.
brincadeiras, entre outros major inlefaaAü^iaiifll Apresentação do
ostímulos diferenciados. mesmo modelo de
comportamento pela
equipe de saúde e mão.
Melhora do quadro e alta
do setor.

Analisando-se a funcionalidade sobro as hipóteses levantadas após a coleta


do dados, obsorvações feitas o a intervenção das mesmas, puderam-so verificar a
possibilidade de alteração do comportamonto-probloma. Notou-so na avaliação
funcional inicial, que C. diante da forma de apresentação dos ostlmulos omitidos pela
oquipo (com exceção do médico residente) e sua mãe, ao comportar-se apático, ora
roforçado negativamente, à medida que era deixado. Após a intorvonção, domais membros
da oquipo, assim como a mãe de C., ao observarem suas mudanças comportamentais
e discutirem com a psicóloga, quais eram as relações contigenciais que estavam
associadas à mudança o manutenção do comportamonto-alvo, por reforçamonto
positivo, estes indivíduos passaram a alterar seus comportamentos também.
Ressalta-se desta forma, a obtonçáo do comportamonto-alvo, no caso de C.,
como o de maior interação com a equipe de saúde e autonomia de seu comportamento
fronte ao sou quadro clínico, podendo também, por sua vez, operar sobro as
contingências ambientais, às quais estava submetido. Acrescenta-se como também
satisfatória, a discriminação pela mãe de C., de que este padrão de falar pouco sobre
sentimentos em situações de conflito de seu filho, era algo que somente o avô materno
falecido manejava no contexto familiar e que novos repertórios por sua parte deveriam
ser desenvolvidos para relacionar-se com C.

Considerações Finais
Diante das inúmeras situações de hospitalização e doença om contextos do
urgência e emergência como a UTI, torna-se um grande desafio para a atuação do
analista do comportamento:
- manter sua autonomia e poder de decisão frente aos aspectos psicológicos e de
saúde mental envolvidos om cada paciento:
- saber prever (baseado em dados coletados e observações), avaliar comportamontos-
problema que possam comprometer a boa evolução do quadro clinico por meio da
análise funcional das contingências que operam sobre estes comportamontos o
- propor instrumentos e procedimentos eficazes e capazes de identificá-los no ambiente

Sobre Comport.imcnfo e Cotfulv.lo 407


hospitalar. Para isso, a parceria com a equipe do saúde é de extroma importância, uma
vez que o aspecto psicológico muitas vezes supera e impede o físico.

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408 .1
Kos.m Ri#lictto Dm*, Di.m.i losello I .iltirii. M.iklllin Nunes Raplist.i
Capítulo 35
Uma história da História
Comportamental
Carlos Renato Xavier Cançado*
Paulo Querra Soares**
Sórfiio Pias Cirino***
Arnlró l ui/ Freitas Dias****

“Logo, pássaros e morcegos voam movendo suas asas, mas as mesmas condições
ambientais presentes podem afetar seus vôos de forma diferente, devido a suas
diferentes histórias evolucionarias. Similarmente, um dado evento pode ter a função
de reforçador em um momento mas nâo em outro, para o mesmo organismo"
(Donahoe 1993, p. 453; trecho traduzido pelos autores).

Relativamente cedo, considerando-se o processo educativo formal, ensina-se aos


individuos a importância do estudo da História enquanto uma disciplina académica. O
conhecimento dos processos pelos quais passou um dado objeto de estudo teria, como uma
de suas conseqüências, a compreensão mais ampla acerca da configuração atual do mesmo.
A esse respeito, cabe a citação de uma das definições propostas para o vocábulo
"história" num dicionário da língua portuguesa; "Estudo das origens e processos de
uma arte, de uma ciência, ou de um ramo do conhecimento; história da pintura, história
da medicina" (Hollanda, 1981, pág. 729). Para nossos propósitos acrescentaríamos,
aos exemplos dados por esse autor, a história da Análise do Comportamento e, mais
especificamente, a história da História Comportamento
A Análise do Comportamento tem suas possiveis áreas de estudo ora definidas
de forma demasiadamente ampla, ora de forma restritiva - o que tem implicações
diretas sobre a produção de conhecimento das mesmas. Nesse sentido, estudos
históricos sobre a constituição e processos pelos quais passou a Análise do
Comportamento e as áreas de pesquisa que a constituem têm considerável importância.
Tais estudos podem levar a possiveis explicações não apenas sobre “como" se estrutura
uma dada área de saber, mas dos “porquês" de tal estruturação.
O presente trabalho tem como objetivo elencar elementos possiveis para uma
construção da história da História Comportamental, enquanto uma área de pesquisa na
Análise do Comportamento. Cabe apontar, contudo, que a análise histórica da produção
cientifica sobre a História Comportamental ó um estudo sobre os produtos do
comportamento (verbal e não verbal) dos cientistas que contribuíram para a constituição
de tal área de pesquisa.

'Unlver*ld ada Fodeml d« M m * Gerat*, Faculdade da hlosofla • CtAncun Humana», Departamgntu da P*kx>logla, LabAC - Laboratório da
Anàll*« do Comportamento
“ Univeniklaòe F.itadual da l ondrlna; Departamento de Pslcntogla Geral a Anál»e do Comportamanto; Centro da Cténcfai Biológica*
“ ‘ Unlvaraldade FedamI da Mlnaa Geral*, Faculdade de Educoçlo; Departamento da Método* a Técnica* d» Enalno; lAPf-D -laboratóriode
Palcologla da Educaçlo
“ “ Univertldade Federal da Mlnaa Gerala, Faculdade de FKoeoAa e CMnda* Humana*. Departamento de Patcotogla; LabAC - 1aboratório dn
AnúNae do Comportamento
10 termo "I (litórta Compodamentar, ao longo do praaenta artigo, refedr *•-« à érea de paaqulaa aqui anaUsada Em contrapartida,
"hlatórlu comportamental", escrito com letrua mlnúaujUis, refwlr-ae-á ao fenómeno comportamental propriamente dito

Sobrf Comportamento r Cognição 409


1. Constatações iniciais
Uma observação inicial de urna dada área de saber pode informar ao estudioso
qual o tipo de pesquisa que é empreendida, qual o método empregado, bem como
quais as noções conceituais disponíveis acerca do fenômeno analisado. Ao se
empreonder tal observação, tendo como objeto a História Comportamental, obtém-se
informações sobre como se configura, atualmente, essa área de posquisa.
A noção de que o comportamento dos organismos é determinado pela exposição
prévia n contingências e polo contato com contingôncias atuais, podo sor considorada
um consenso entre os analistas de comportamento. Tal noção está presente nas obras
de vários autores, como em Skinner, 1953, Ferster e Skinner, 1957, Sidman, 1960,
Weiner, 1969, Branch, 1987, Wanchison, 1990, Freeman o Lattal, 1992.
No entanto, observa-se uma predominância na Análise do Comportamento de
pesquisas que enfatizam o controle exercido por contingôncias atuais sobre o
comportamento dos organismos (Aló, 2005; Cirino, 1999; Wanchisen, 1990;). Além disso,
não há, entre os autores, um consenso acerca da definição de história comportamental.
Atualmente, são encontradas na literatura trôs propostas de definição deste
fenômeno que, apesar de não serem excludentes, apresentam diferenças significativas:
Wanchisen, 1990, Freeman e Lattal, 1992 e Metzger, 1992. Tais definições serão tratadas
com maior profundidade em parte posterior deste trabalho.
A falta de consenso em relação a uma definição do fenômeno de história
comportamental é corroborada pela alta profusão de termos encontrados na literatura para
descrição dos efeitos de contingências passadas sobre o comportamento atual (Cirino, 2001).
Segundo este autor, o uso de termos como história comportamental. história de esquema,
história latente, história de reforçamento, dentre outros, faz-se de maneira indiscriminada, não
se considerando, muitas vezes, as sutis diferenças que os termos guardam entre si.
Tendo em vista as constatações apresentadas, pode-se questionar de que modo
esse conceito tem sido utilizado ao longo dos anos, bem como de que forma a história
comportamental vem sendo estudada por posquisadores analistas de comportamento.
Para se responder a essas questões, diversos caminhos podem ser trilhados,
cada um deles respondendo a algumas perguntas e levantando outras novas. Podo-se
optar por estudar, por exemplo, a noção de história comportamental, as propostas de
definição do fenômeno, assim como a evolução do conceito ao longo dos anos.
Outro caminho que pode ser percorrido para uma compreensão do tratamento
conceituai dado a esse fenômeno é o estudo dos usos da palavra "história" na literatura
analltico-comportamental, considerando-se, conseqüentemente, os contextos de
ocorrência e os termos vinculados à mesma.
No presente trabalho realizou-se uma revisão da literatura em Análise do
Comportamento, com o objetivo de explicitar pontos críticos no delineamento da História
Comportamental - o que permite, como conseqüência, a análise do refinamento
metodológico e conceituai pelo qual vem passando esta área de pesquisa.

2. A pré-história da História Comportamental


Como o fenômeno história comportamental tem sido estudado por pesquisadores
analistas do comportamento? Pode-se identificar dois momentos distintos no curso da
evolução da História Comportamental: antes e após 1990. O periodo que compreende os
anos anteriores a 1990, será nomeado como a "pré-história" da História Comportamental.
Observa-se, nesse período, a existência de noções do fenômeno e os processos de
delineamento de uma incipiente área de pesquisa em Análise do Comportamento.

410 Ros.in.i Ritfhdlo Pi.is, Di.m.i Foscllo I .iloni, M.iklllm Nunes H.iptisl.i
Em 1990 surge a primeira proposta sistemática de definição de história comportamental
(Wanchisen, 1990). Somente a partir desta data verificam-se outras propostas de definição do
fenômeno e observa-se a consolidação de uma área de pesquisa. O período quo tom inicio no
ano de 1990 será denominado, portanto, "história" da História Comportamental. Nos ateremos,
nessa sessão, a aspectos relativos aos anos anteriores a 1990.
No final da década de 1950, Azrln conduziu alguns experimentos, tendo seres
humanos como participantes, para investigar o desempenho destes organismos sob
controle de esquemas de Fl2. Segundo este autor os padrões comportamentais
observados em sujeitos não-humanos expostos a condições análogas raramente oram
observados em sujeitos humanos3.
No entanto, após a manipulação da variável custo da resposta, Azrln observou
que o "padrão típico" do esquema de Fl poderia ser encontrado em seres humanos. O
autor apontou para a possibilidade de outras variáveis interferirem na obtenção dos
padrões típicos do desempenho de sujeitos humanos em esquemas de reforçamento.
Incentivado pelos resultados obtidos por Azrin, Weiner realizou estudos, no final
da década de 1960, que apontaram para uma outra variável importante na determinação
do padrão de comportamento de seres humanos expostos a esquemas de reforçamento:
a história comportamental*. Em um de seus estudos (Weiner, 1969), grupos de homens
adultos foram submetidos a valores específicos do esquema de FFT ou do esquema de
DRL8 e, numa condição subseqüente, aos mesmos valores do esquema do Fl. Nesta
condição, Weiner observou que os sujeitos anteriormente expostos á contingência de FR
apresentavam uma taxa de resposta alta e constante; da mesma forma, observou, para
os sujeitos expostos anteriormente à contingência de DRL, uma baixa taxa de respostas,
com longas e poucas pausas durante o intervalo. A partir desses resultados, Weiner
aponta para a importância da consideração da variável história comportamental quando
da análise do comportamento dos organismos. Da mesma forma aponta para o fato de
esta variável ser muitas vezes negligenciada quando do estudo do desempenho do sujeitos
humanos e não humanos sob esquemas de reforçamento.
Alguns autores também utilizavam sujeitos não-humanos para tentar verificar
os efeitos de contingências passadas sobre o comportamento atual, como é o caso de
Terrace (1963 a). No estudo deste autor, pombos foram submetidos a procedimentos
de discriminação simples ou sem erro, até que se observasse uma estabilidade no
responder dos sujeitos de ambos os grupos. Na fase de teste os sujeitos foram expostos
a doses de imipramina o_clorpromazina. Em seguida, foi observado o efeito dessas
drogas sobre o responder dos sujeitos, dadas as diferentes manipulações experimentais
prévias. Terrace observou que, para aqueles sujeitos que haviam sido expostos ao

* Fl é • abreviação do inglé* 1lx*1mtervml. ou sofa, Intervalo fixo Num esquema (to 11 u pnmoUH resposlH quo ocorrer dnpom do passado o
Intervalo determinado pelo eequama é retorçada
’ Os padrfrt* *c*Abpe bmkti ãnri-nn) sâo comumente observados qoart<Jo do dneomfHinUi do nu|elt<it» nAo humanou sol) contato da
(xmtlngAncla d» Fl O padrão
arjtopcaracteriza-se por uma puusa pôs reforçamento. seguida por um aumento gradativo <Imfreq06nda do losjxindor tilí) m ptrtxlm«
libar av*11'1° ratorço O pedráo de respostas
brakm wKi ntn caracterUa-se por urna pauta após o responder a pala Identificação da “jorroe" da respostas prôxlnio ao (Vml do Intervalo
4Wafrmr estudou, sistematicamente, oa efeitos da variáveis cai to o custo da resposta, a hmtúria uxnporlamenUil a o aferilo da Instruções *ob o
desempenho de seroe humanoa em esquemaa de reforçamento (Orlno, 1W9)
* f H è a abrevtaçAo am IngMs para fíxml ratto. Mo é. raiâo flxa Nesse esquema do refwçamonto cada roftxçmlof 0 WxhhiJo apôs um dndo
núnwm da respostas wnNklaa polo su|aNoe experimental. Independente do tempo gasto |>ara tanto
* DRl é a abravlaçâo da sigla Inglesa para (tifhtreniutl mlntorcwrmit ofkrw nHm, mto è. reforçamento diferencial de baixas taxas da resposta»
Num esquema de DHL é reforçada a prtmmra reepoata que ocorrer depois da pasaado o intervalo detennirwdo pelo esquema desde que nfto
tenha havkio nenhuma reepoata durante o Intervalo Se ocorrer alguma resposta durante o Intervalo, o mesmo èreiniciado Mats recentemente
o esquema de DHl tem aldo chamado de IRT >t que 6 a sigla mglesa par» nbnm poin* tkm gnmtm th*n f(em português: tetnpo antro
respostas maior do que um tempo I) O termo IR I >t é mala descritivo do que o termo DRl por onfati/ati que nesse esquema de reforçamento
a unidade comportamental reforçada é uma pausa acompanhada de uma reepoata Contudo, optou se |iela uti/açâo do termo DRl., por ser
esse um jargAoque |á é parte da cultua behaviorlsta

Sobre Comporl.imento c CoflniÇilo 411


procedimento de discriminação simples, o número de respostas ao S- foi muito superior
quando comparada ao núrr.ero de respostas ao mesmo estímulo emitidas pelos sujeitos
do grupo de discriminação sem erro. É interessante destacar que a partir dos resultados
desse autor que as drogas administradas aos sujeitos tiveram diferentes efeitos,
considerando-se diferentes manipulações experimentais
Em 1978, Urbain, Polling e Millan, utilizando ratos como sujeitos experimentais,
demonstraram a modificação do efeito do drogas sob o comportamento atual dos mesmos,
após a exposição a diferentes esquemas de reforçamento. Os sujeitos experimentais
foram oxpostos a esquemas de FR ou DRL e, numa fase posterior, ao mosmo valor da
contingência de Fl, até a estabilização do responder. A partir de então, numa fase de teste,
os experimentadores administraram diferentes dosagens de d-anfetamina aos sujeitos
e observaram variados efeitos sob o responder dos mesmos. Para todas as dosagens,
os sujeitos expostos ao esquema de FR tiveram uma diminuição da freqüência de
respostas e, um aumento na mesma foi observado para aqueles expostos ao esquema
de DRL. Este estudo corrobora os resultados de Terrace (1963 a) no que diz respeito aos
efeitos de drogas sobre o responder atual após manipulação experimental especifica.
Wanchisen, Tatham e Mooney (1989) submeteram ratos a diferentes manipulações
de esquemas de reforçamento e observaram o efeito dessa manipulação sobre um
responder em Fl. Os sujeitos experimentais foram divididos em dois grupos: o primeiro foi
exposto a seqüência VR'-FI-VR-FI, sendo que cada um dos esquemas esteve em vigor por
30 sessões, O outro grupo foi exposto a 120 sessões sob controle do esquema de Fl
apenas. Os resultados indicaram uma influência do responder om VR sobre o responder
em Fl para os sujeitos expostos à seqüência VR-FI-VR-FI. No entanto, como apontam os
autores, os efeitos da exposição a VR foram temporários, dado o controle progressivo pela
contingência de Fl. Aqueles sujeitos que foram expostos ao esquema de Fl apenas, tiveram
seu desempenho gradativamente sob o controle desta contingência, sendo observados os
“padrões típicos" de responder não-humano nesse esquema de reforçamento,
De maneira geral, os estudos anteriormente apresentados apontaram
gradativamente para a importância da consideração de variáveis históricas na análise
do comportamento dos organismos. No entanto os estudos realizados nosse período
careciam de uma maior sistematização e, como apontam Tatham e Wanchisen (1998)
os achados sobre os efeitos de história pareciam mais ser efeitos de serendipidade do
que obtidos através de estudos que visassem tal fim.
Uma revisão da literatura desse período sugere, então, que estudos em História
Comportamental configuravam-se como estudos de desempenho de sujeitos humanos
e não humanos sob controle de esquemas de reforçamento, utilizando um delineamento
experimental inter-sujeitos.
Outro fator que cabe ser apontado, e que ó freqüentemente citado em publicações
em Análise do Comportamento que tratam especificamente da história comportamental,
é a suposta "controvérsia" entre pesquisadores que propõem a consideração sistemática
dos efeitos de história e aqueíes que propõem o estudo sistemático das contingências
atuais das quais o comportamento é função. Para a compreensão de uma possível
origem de tal "desavença", recorremos a Sidman (1960).
Esse autor propõe que o estudo de variáveis históricas seja um ponto central
na Análise do Comportamento, dada a determinação do comportamento dos organismos
por experiências passadas assim como pelas condições atuais às quais está exposto.

' VR 6 u utxtivinçflo ckt vn/rnléi mtin patovn» ngloM* para n u lo varMvet Nmm oaquam«, o ratorçad™ AHborado «pôs n wntssAo (tfl um numoro
módk> do roR[xmittn. msmclficmk) polo Mquorna Num a«|<M(na do VR5, pot oxwnpk), 6 r«forçada mn rnódi« n quicilH rosposta a ooormr

412 Rotina Ritfhcllo Pi.is, |>i,inu Tosrllo l .ilonl, M.ikilim Nunrs H.iptisl.i
O controlo do variávois históricas poderia levar a uma maior confiabilidado dos resultados
rolativos á manipulação de variáveis atuais, assim como o estudo sistemático do variáveis
históricas aumontaria o escopo da análise do comportamento dos organismos.
No entanto, embora as considerações do Sidrnan (1960) sejam relativas ao controla
axporimontal num dado delinoamento, elas podem tor dado origem a duas "vortontos" do
ostudo na Analiso do Comportamento: uma que onfatiza o estudo das variávois históricas, outra
quo enfatiza o ostudo de variáveis atuais ás quais um organismo ostá exposto. No primoiro
caso, a história comportamental seria uma variável a ser analisada, sendo, muitas vezes, o
objoto do ostudo do pesquisador. No sogundo, a história comportamontal soria uma variável a
sor controlada, o os efeitos do história poderiam indicar "falhas” no controlo oxporimontal.
Mas ó o próprio Sidrnan quem responde a tal "controvérsia", quando diz que
"controlo por avaliação ó sempre mais efetivo que controlo por exclusão" (1960, pág
387). O ostudo de contingências passadas ou prosentes é uma questão de ônfase, e
in fo rm a ç õ G S sobre a história, assim como sobre as c o n d iç õ e s atuais são
complemontares, não opostas.
Da mesma forma, ao afirmar que a determinarão do comportamento dos
organismos so dá pola exposição a contingências passadas assim como polo contato
com contingências atuais, o analista de comportamonto ostá, necessariamente
considerando a análise histórica do comportamento do um dado organismo.
De maneira geral, a "pré-história" da História Comportamental so refere a um
período de dosonvolvimento assistemático de uma área de estudos. O quo havia, como
rossaltado anteriormente, ora a consideração da noção de determinação do
comportamento por contingências presentes e passadas. No entanto, nenhuma
definição para o fenômeno havia sido proposta ató o ano de 1990.

3. A história da História Comportamental


Corn o advento do propostas do definições de história comportamental, a partir
do ano de 1990, tem inicio o poriodo aqui denominado história da História
Comportamontal A partir de tentativas sistomáticas do definição, um maior rigor
metodológico passa a ser uma preocupação dos autoros que so dedicavam ao estudo
do efeito de variávois históricas. No entanto, cabo destacar que aprimoramentos
metodológicos foram realizados gradativamonte e do maneira não sincrônica, o que
podo sor atestado por meio da análise comparativa das três propostas de definição
atual para a história comportamontal A existência de três diferentes propostas e o não-
consenso entro elas aponta para o fato de que as pesquisas om história comportamental
continuavam carecendo de uma maior sistematização (Tatham e Wanchisen, 1998),
principalmente conceituai.
A definição proposta por Motzgor, afirma que "(...) o fenômeno do história
comportamontal deve ser definido 'em termos do exposições provias a contingências
tanto dentro quanto fora do laboratório"’ (1992, apud Cirino 1999, pág 15). A proposta da
autora, por ser abrangente, perde seu valor heurístico, uma voz quo informações acerca
das contingências fora do laboratório devem sor necessariamente consideradas numa
análise. No ontanto, tais informações podem ser de difícil acesso e o experimontador
podo não ter, sobre elas, controle algum.
Freeman o Lattal, propõom que Refeitos de história’ dá a conotação de controle sobre
o comportamento presente que náo foi eliminado peb refinamento das contingências atuais
e, conseqüentemente, obscurece as relações funacxms estabelecidas entre o responder e as

Sobrr Comporl.imenlo e ('ofti)i(ilo 413


contingôncias presontos" 992,pág 5). A definição dostes autores enfatiza o controlo exercido
polas contingôncias atuais, destacando distúrbios no responder que são determinados pelas
contingôncias passadas. Apesar de uma tentativa de maior sistematização da proposta om
relação à do Motzgor, observa-se ainda uma relativa abrangência.
A proposta do Wanchisen, quo considera história comportamental como sendo
a "oxposição a contingôncias rospondentos e operantes cuidadosamonto controladas
em laboratório, antes da fase de 'teste' desejada" ( 1990,pág. 32). Quando comparada às
propostas do dofinição antoriormente apresentadas, demonstra maior delimitação do
fonômono. Essa proposta surge num contexto de laboratório o, por isso, são enfatizadas
as contingôncias arranjadas no setting experimental às quais o organismo fora exposto
antes de uma fase do toste específica. A proposta do Wanchisen, apesar do suas
limitaçõos, apresenta considerável potencial heurístico.
Algo importante de se ressaltar nesse poriodo é o uso do uma nova motodologia
para estudos de história comportamental: ostudos de desempenho do sujeitos humanos e
não humanos sob controlo de esquemas do reforçamento, utilizando um delineamonto
oxporimontal intra-sujeitos, proposta por Freeman o Lafta), om sou artigo Stimulus Control of
Bohavioral History (1992).
Tal metodologia permito obsorvar os efeitos do divorsas manipulações experimentais
sobro o comportamento do um único sujeito, sendo cada esquema controlado por um ostímub
ospocifico. No ostudo de Freoman e Lattal (1992), os sujeitos oxperimentais (pombos) foram
oxpostos a um esquema de FR o a um esquema do DRL na Fase 1 (Exporimentos 1 o 2; fase de
construção da história), sob diforontes controlos do estímulo. Na Fase 2 do experimento, os
sujeitos foram submetidos a sessões de Fl, no Experimento 1 ou VI8, no Exporimento 2, na
presença dos estímulos anteriormente correlacionados a FR ou a DRL. Nesta fase fòrarrt obtidas,
sistematicamente, taxas mais altas nas sessões nas quais oram apresentados estímulos
anteriormente correlacionados ao esquema de FR e taxas mais baixas nas sessões nas quais
eram apresentados os estímulos antoriormente correlacionados ao esquema de DRL.
O trabalho de Freeman e Lattal (1992) é uma importante reforôncia para as recentes
posquisas em história comportamontal, dada a possibilidade de ostudo dos ofeitos do
oxposição prévia à contingências utilizando-se um delineamento experimental que tenha o
sujoito como seu próprio controle : além de ser o delineamento característico da Análise
Exporimontal do Comportamonto, permito a análise e a comparação de resultados de diforontes
fases de história observando-se o respondor do um mesmo sujoito. Dessa forma, trata-se do
uma vantagom em relação ao delineamonto inter-sujeitos pois, como afirma Cirino (2001),
realizar uma análise histórica com diferontos grupos de sujoitos é analisar, comparativamonte,
diforontes variáveis
Nesso movimento dos pesquisadores em direção a uma maior sistomatização
motocJológica e conceituai para a História Comportamontal, destacam-se as contribuições de
Tatham e Wanchisen (1998), Num artigo intitulado Behavloral History: a définition and some
common findings frvm two areas ofmsearch os autores propõo critérios para a identificação de
estudos do história comportamontal, bem como para a classificação dos mesmos. O primeiro
desses critérios ó que o delineamento experimental do ostudo permita a análise de
manipulaçõos oxporimontais prévias em condições oxperimentais subseqüentes. O sogundo
critério é que os ofoitos de história possam ser temporários ou per manentes.
Por fim, os autores afirmam que um terceiro critério é a possibilidade de
observação dos ofeitos de história: tais efeitos poderiam sor observáveis sobre o

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414 lvos<m.i Rl^bdto |)j,in.i loscllo I .iloni, M.ikilim Nunes K.iptist.i


comportamento atual dos organismos, bom como inobserváveis, ató que condições de
toste especificas fossem arranjadas (tais como a introdução de uma variável intorferente,
como a administração de drogas o o procedimento de alimentação prévia).
Muito se tem dito sobre a história comportamental, dentro e fora do âmbito da
Análise do Comportamento. Tontativas de sistematização conceituai, metodológica e
oxporimontal contribuom para uma maior compreensão de um conjunto comploxo de
fenômenos comportamontais como, por exemplo, o efeito de exposição prévia a
contingências do roforçamento sobre o comportamento atual dos organismos.
Como é o caminho do todo empreendimonto cientifico, o discurso sobre dado
fenômeno natural tende a ser cada vez mais refinado, à medida quo os avanços nas
áreas de sabor assim o permitem. Posto do outra forma, o comportamento vorbal dos
ciontistas tendo a ficar cada vez mais sob controlo das variáveis ambientais
supostamente relevantes para a anàliso o explicação de um dado conjunto de fatos.

4. Possibilidades futuras
As transformações metodológicas o conceituais apresentadas ao longo do
presento trabalho têm implicações diretas sobre a configuração de uma área de
posquisas em Análise do Comportamento: a História Comportamental. Porém é ainda
nocessário um maior esforço por parto dos posquisadores no sontido de buscar um
consenso, tanto no que diz respeito a uma definição do fenômeno, assim como em
relação a um delineamento experimental ospecífico para seu estudo.
lendo em vista que a noção de determinação do comportamento dos
organismos por contingências presentes e passadas é um consenso entre
pesquisadores analistas de comportamento, as variáveis históricas não podem sor
negligenciadas num estudo analítico-comportamental. A esse respeito podo-se recorrer
a Skinnor (1974), quando afirma que uma análise do comportamento deve ser,
nocessariamente, histórica.
Uma alternativa válida para ovitar tal "nogligência", ou seja, o enfoque nos
determinantes atuais do comportamento em detrimento do estudo dos efeitos de
contingências passadas sobre o comportamento atual, pode ser o intercâmbio dos
resultados obtidos pela História Comportamontal com outras áreas de pesquisa em
Análise do Comportamento. Santos (2005) reitera essa questão quando trata da
semelhança entre as áreas da História Comportamental, da Sensibilidade
Comportamontal e Resistência a Mudanças. Para esse autor, "embora a nomenclatura
soja diferonte, essas três ároas compartilham do um mesmo interesse: a persistência
de padrões de comportamento antoriormento reforçados quando mudanças nas
contingências são realizadas” (2005, pág 71).
Da mesma forma, pesquisas nas áreas de Desamparo Aprendido, Variabilidade
Comportamontal, Correspondência entre Comportamento Vorbal e Não-Verbal,
Comportamento Governado por Regras, bom como outras áreas de pesquisa aplicada
(como a clinica) poderiam tor seus rosultados integrados àqueles produzidos por
posquisadores interessados no estudo sistemático dos ofoitos de variáveis históricas.
A Análise do Comportamento, enquanto uma disciplina histórica, não podo abrir
mão de tal integração, uma vez que a explicação para as ações dos organismos
fundamenta-se em três histórias de variação e seloção: filoçjenétíca, ontogenética e
cultural (Skinnor, 1981; Donahoe, 1993).

Sobro Comportamento i* Cofjniçílo 4 1 5


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416 K»s.in,i Rl«hcllo Di.i«, Piiin.i losello I .iloni, M.ikillm Nunes H.iptlsl.i
Capítulo 36
Queixas.......e queixas! Como focalizá-las
na Terapia Comportamental
Sõnia ilos S. Castanheira'
U FM O

O tema deste trabalho foi-me sugerido por uma colega de faculdade*, hoje
voltada para o estudo de planejamento ambiental, após leitura de um texto sobre
"felicidade", na Internet. Dizia-me ola: As pessoas se queixam tanto que bem daria
para se fazer uma análise funcional deste comportamento".
Resolvi aceitar o desafio e procurar descobrir o que determina e mantém o
comportamento de queixar-se - tão freqüente em algumas pessoas - e qual seria papel
da queixa na manutenção de alguns reforçadores, na prática clínica comportamental e
fora dela.
Tenho uma amiga que há muitos anos, responde assim ao meu cumprimento
sobre sua saúde: "- Se quer uma" resposta social'’, vou bem, obrigada; se prefere uma
resposta verdadeira, estou péssima!; quero que o mundo pare para eu descer. "
Para Rocha (2004), queixar-se deveria ser apenas a "expressão de um mal
estar, ou de uma dor, ou de um sofrimento, ou de uma reivindicação justa. A todo momento
nos deparamos com acontecimentos inesperados e situações novas que temos que
enfrentar com criatividade e esta queixa deveria constituir-se em oportunidade para
questionamento de nossos problemas, medos, frustrações e dificuldades".
Infelizmente, inúmeras pessoas não se sentem bem a maior parte do tempo e
reclamam ató de suas realizações. Não são capazes de comunicar sua felicidade, não
pulam de alegria quando vencem e
"escondem o sucesso como se quisessem se proteger da Inveja alheia. Desistem
facilmente e acreditam que a causa dos maus eventos em seu ambiente sâo
permanentes - os problemas vieram para ficar e vão estar sempre ali para afetar
sua vida. Com suas queixas, parecem sinalizar vontade de culpar alguém por
suas dificuldades, uma certa preguiça de viver e crenças arraigadas de que as
circunstâncias da vida sâo irreversíveis e nada pode mudar" (Rocha, 2004).
Felizmente, na clínica, o terapeuta entra também em contato com alguns
indivíduos que possuem uma forma de comportar-se positiva, traduzida por bom humor
e alegria, que se mantém estável pela vida toda. Skinner (1991) afirma que
"Estes indivíduos estão bem consiao mesmos, se sentem átimos a maior
parta do tamoo. oomue sentem o corno positivamente reforçado. Os reforçadores
positivos (as coisas boas da vida) lhas dão multo prazer e aleana. mesmo guando
acidentais. Esta "estadomparece ser uma forte probabilidade de acào e da se estar
' Pmcôkifl« clinica,Mmtru om P*k;oloyi«i • ProfoMora da UFMO • a-mai: •onJac«»©»«™ oom br
1Agradoço 6 dra Adrtlin Maria dot Santo* Toixotra pala sugmlio d<Mt« lama inatiganta

Sobre Comportamento e Co#nlçJo 417


livre de estímulos »versivos. Para eles, as causas dos maus eventos sào
temporárias. nào tôm gueixas, üoruue uueixu é uma espécie de comportamento
negativamente reforçado e não h.i reforcadores neaativosm
ÍD.114).

Queixa - natureza - definições


Segundo o Dicionário Houaiss da Lingua Portuguesa (2001), queixa è definida
como: (1) ação ou efeito de queixar-se; (2) lamentação, gemido, expressão de dor, de
sofrimento, queixume; (3) sentimento de mágoa que se guarda de ofensa, injúria, agravo;
(4) desprazer, descontentamento.
E como verbo, queixar-se é definido como: (1) soltar lamúrias de afliçào;
demonstrar pesar; gemer; (2) demonstrar descontentamento, desgosto, lamentar-se (da
sorte); (3) mostrar-se ofendido; (4) denunciar a ofensa que recebeu; (5) descrever
sofrimentos e agravos.
Ambos, queixa e queixar-se, serõo aqui tratados e descritos como o
"comportamento de queixa", um relato ou operante verbal, com propriedades de tato. 0
tato (relato verbal) tem uma particular importância para o ouvinte (torapeuta) quando o
falante (cliente) está em contato com um “estado de coisas" (contingôncias ambientais)
que não ó conhecido por ele (terapeuta/ouvinte).
Então, a alteração da probabilidade futura de ocorrência do comportamento do
falante (cliente ou não) está relacionada ao comportamento do ouvinte (terapeuta ou
não), membro da mesma comunidade verbal do falante Mesmo som acesso direto
aos eventos relatados pelo cliente, o terapeuta entende que ele está sob controlo de
alguns estímulos (como tatos, por ex.).
Existem diferentes definições e algumas dúvidas sobre a verdadoira natureza
da queixa. Segundo Zaro e cols, (1980), a queixa parece ter dois componentes:
disposicional e situacional.
O primeiro é aquele que faz com que diferentes pessoas apresentem diferentes
graus e freqüências de episódios de queixas, quando expostas à mesma situação
ambiental/problema. O segundo é aquele que faz com que o mesmo indivíduo apresente
diferentes graus/freqüência de queixar-se em diferentes situações.
A queixa é considerada generalizada, quando dirigida a todas as pessoas e
específica, quando o individuo seleciona o ouvinte.
Seligman (2004), afirma que o queixar-se pode ainda ser tônico, quando
expressado várias vezes por dia ou fásico quando, um único episódio de queixa no
decorrer da vida do Indivíduo, é suficiente para demonstrar dor, sofrimento, medo,
ansiedade, etc.
Apenas a queixa de origem disposicional pode ser considerada normal,
plauslvol e até benéfica quando sua magnitude está dentro da faixa do comportamento
de queixar-se da maior parte da população e não prejudica o desempenho profissional,
a saúde e o relacionamento social da pessoa.
Neste trabalho, faremos distinção entre a queixa disposicional ou espontânea,
que denominaremos queixa relevante, da queixa situacional, tônica ou sistemática que
chamaremos de queixa habituai
A primeira (relevante) ó a expressão ou descrição (tato) genuína das
contingências que controlam o comportamento do indivíduo; a segunda (habitual), é a
queixa que se tornou um hábito, uma mania, um costume, uma maneira permanente,
regular ou esperada, de comportar-se.

418 Nônlu dos S. Cdílanliciiu


Quelxfc-Qperantft- yerbal.
Como bem nos lembra de Rose (1997), "o relato verbal ó, além de uma fonte de
dados, um comportamento verbal, omitido supostamente sob controle de um estado de
coisas, que funciona como estímulo d is c rim in a tiv o Skinner (1957/1978) define o
comportamento verbal “como comportamento reforçado pela mediação de outras
pessoas. A intermediação do outro especifica um comportamento que ó aprendido,
mantido e modificado por conseqüências mediadas".
Numa análise behaviorlsta-skinneriana, as queixas relatam o que é sentido e
observado introspectivamente e constituem-se SD’s ou pistas (1) para o comportamento
passado e as condições que o afetaram, (2) para o comportamento atual e as condições
que o afetam, e (3) para as condições relacionadas com o comportamento futuro.
Para o behaviorista-radical, todo comportamento verbal, não importa quão privado
ou público pareça ser o seu conteúdo, tem suas origens e sua forma no ambiente,
modeladas pela comunidade verbal.
Então, uma vez que consideramos o comportamento de queixar-se um oporante
vorbal, faz-se necessária a referência a alguns dos operantes verbais sugeridos por
Skinner (1957/1978). Segundo este autor,
* um tato oode ser definido como um operante verbal, no uual uma rasoosta ó
evocada (ou ao menos farta/acida) oor um abieto ou avento particular, ou imr uma
propriedade de um obieto ou evento" loa. 81 82).

"a manda. uoma uin om antu yúcüüI nu audl a rosuosid á


reforçada oor uma conseqüência característica e estú. portanto, sob controle
funcional da condicões relevantes de onvacao ou estimulação avorsiva (ou.3b 36)
“....o mandu permite ao uuvinle inferir aluuma coisa a respeito das
condicões do falante. Independentemente das condicões externas, enquanto o
Uito oannM, d ele intm.ãlaa..d,[QSQQílQ.úas circunstâncias, indauanduatomunta
üâs cündtcúes da falante:, (nu. 83)
" Para estabelecer um repertório de tato, a comunidade verbal
reforça uma rasoosta varbal. na oresenca de um estimulo, com muitos ceforcadores
diferentes ou com um reforcador generalizado, enfraquecendo a relacào com
condicões de DrivacÃo ou estimulação aversiva especificas. No ooerante do tioo
mando, as variúvaia de controle estâo relacionadas a condicões de onvacào ou
estimulação aversiva. especificando a consequência reforcadora" (Sadi. 2002.
0 0 .2 ).

Mas, na prática clínica, ó bastante difícil saber o que está controlando a queixa
(tato/relato-verbal) do cliente: se são, pura e simplesmente, "os eventos antecedentes e o
cliente está emitindo um tato preciso e verdadeiro quando se queixa ou, se existem outras
fontes de controle as quais estão levando a uma não-correspondôncia entre determinados
comportamentos e sentimentos e a maneira com que são relatados" (Pergher, 2002).
Sob a perspectiva da Análise do Comportamento, o que uma pessoa fala não
condiz, necessariamente, com os eventos que (supostamente) estão sendo descritos,
isto ó, pode ou não ser coerente com os referidos eventos (Pergher e Sadi, 2003). Então,
como o controle de estímulos sobre o comportamento verbal não é sempre perfeito, o
relato de uma queixa pode também ou ser exagerado ou os sujeitos modificarem suas
queixas, dependendo do reforçarnento que tôm da audiência (mesmo quando estes
relatos não revelam o que de fato ocorreu).

Sobre Comport.imcnlo c Cognição 419


Medeiros (2002) lembra a relevância dos mandos disfarçados e dos tatos
distorcidos, que podem vir a se constituir em algumas das várias manipulações do
comportamento verbal do cliente que se queixa e que foi, antes, exposto a uma audiência
bem mais punitiva que a da terapia.
“Quando tonto me expressar, sou criticada. Se pudesse mo oxpressar moia, acho
que seria bem melhor do que sou"
Existem tatos com autocliticos qualificadores, isto ó, arranjos que o falante faz
de sua própria fala. Skinner (1957/1978) exemplifica dizendo que o falante ó “um ser
ativo que organiza e arranja o modo de dizer, explicitando os controles sobre o seu
próprio comportamento". Neste sentido, os autocliticos são parte do relato verbal (tato)
pois modificam a outra parte que os acompanha, embora qualifiquem a queixa de um
modo negativo, dando ao ouvinte pistas sobre o vaior punitivo do evento descrito no tato.
“Nào consigo fazer nada. Só de entrar no cano, sinto tanta ansiedade que, às vezes,
meus braços ficam amortecidos ou duros e nào consigo mudar as marchas..."
Mesmo se tratando de um comportamento e, na maioria das vezes, indesejável,
a queixa ó um relato vorbal de alguém sobre si. É “uma importante fonte de dados porque
nos diz sobre o que o individuo fez, o que está fazendo, o que fará e porquê - além deste
comportamento ser suscetível à imitação, reforçamento, modelagem, instrução e tão
controlado pela audiência como qualquer outro comportamento verbal" (Hübnor, 2003).
Uma solução encontrada pelo terapeuta comportamental para fidar com este
tipo de resposta é tomar o relato verbal como uma forramenta, como um meio para se
chegar às contingências, o principal objeto de investigação do clinico.
" Ê importante deixar ciaro que, num processo terapêutico o terapouta (...) se
interessa pelo comportamento verbal, bem como pelos demais comportamontos
do ciiente (...) observados na sessão, mas de fato, trabalha diretamente com as
contingências de reforçamento em operaçào, estas sim, sâo instrumentos capazes
de produzir análise e de habilitar o terapeuta (...) para atuar na sessão (...) e o
cliente para modificar sua vida. Os comportamentos observados (verbais ou nào)
são unidades importantes para compor o emaranhado de contingências de
reforçamento em funcionamento e nào são, portanto, o objeto de estudo em si, mas
unidades de dados essenciais para se chegar ao objeto de Interesse fundamental“
(Guilhardi e Cesar,2001- p. 270).

Queixa: comportamento adaptativo ou problema?


Como o terapeuta ou o analista do comportamento se posicionam diante deste
tipo do relato verbal? Estão de acordo com a concepção de que é um comportamento
adaptativo ou inadequado e negativo?
O Behaviorismo Radical "explica a ação humana em termos de comportamento
ao invés de entidades dentro do cérebro ou de fora do comportamento em si mesmo,
tais como impulso, desejo, expectativa...." (Kohlenberg; Tsai, 2001). Então, uma explicação
mais adequada do comportamento de queixar-se estaria centrada nas variáveis que
afetam este comportamento e não em entidades mentais. Ou seja, o significado de
uma queixa deve ser buscado nas condições quo controlam sua emissão.
Analisado sob este ponto de vista, o comportamento de queixar-se não deve ser
considerado como inadequado ou anti-social e sim, "como uma resposta que permite ao
indivíduo o acesso a conseqüências reforçadoras para ele: conseqüências sociais, ganhos de
bens tangíveis e conseqüências como a esquiva de eventos desagradáveis” (Matos, 1999).

420 SAnLi dos S. C\ist<inhclM


Se partirem deste referencial analítico-comportamental, podem concordar com
ambas as concepções, uma vez que todo comportamento é adaptado ao seu contexto,
ó funcional de alguma maneira e possui um valor do sobrevivência para o indivíduo
(Matos, 1999). Entretanto, mesmo quando considerado fenômeno adaptativo, se traz
algum prejuízo ao indivíduo e/ou às pessoas com as quais estabelece relações, pode
vir a constituir-se um comportamonto-problema e ser alvo de intervenção.
Se um cliente procura ajuda clinica, cabe ao terapeuta levá-lo a reconhecer que
sua queixa tem muitas causas, mas sua característica mais consistente ó a ausência
de comportamentos adaptativos e que suas reclamações sâo "fruto do contingências e
não de “culpa" ou "responsabilidade" pessoal. Se há algo responsável por estes
comportamentos são as contingências e ó sobre elas que devem ser dirigidos os
esforços do mudança e não sobro a possoa" (Guilhardi, 2002).
Deve-se lembrar que fazer ciência è buscar as causas do comportamento o as
condições ou fatores que afetam este comportamento. Causa, aqui, passa a significar
"condições ou fatores constituintes do comportamonto do queixar-se e quer dizer que,
sem tais condições ou fatores, a queixa (o fenômeno) nào existiria
A analise comportamental de relatos de eventos encobertos, ou seja, de corno o
cliente se sente diante das situações que lhe causam dificuldades - como as que relata
na queixa *, é foita de forma similar á que acontece com eventos que ocorrem publicamente
(Haydu,2001). E na perspectiva bohaviorista radical, o comportamonto de queixar-se não
pode ser analisado som se observar sua relação com os eventos ambiontais.
Ao dofinirem comportamentok Andery e Sório (2001), afirmam que:
“os fatores aaitiientais sâo, u o r sua vqí. ooaitiQSlQio or 3grandes s u b c m u n to s ;
ü oe racü es. d a a lt m e â a . Q Beracóes d a L o n u a g ü e n a ia câ o e ü o n tin a â n u tã s de
raforcamanto“. Assim, oara estas autoras. "guando identificamos (a) um estimulo
e t o a d o r incondidonado nu rnndmnnado. (b) um estímulo reforcador ou um estimulo
d ia a im in a ttn , ou, ainda, um a intôrraJatJQ onYokandQ astím utoantecsdente íoúUígq.
orivado - físico, social) - raaoosta (manifesta, encoberta - simules, comolaxaJ -
estimulo conamaüente (reforcnrtnr ounidar). nada mais fizemos do aue identificar
fatores oue comoAam. constituem a mlacÃo aue chamamos comportamentalo. 160)
E sobre eventos ambientais, Matos (1997) acentua que "o behaviorista radical
não trabalha propriamente com o comportamento; ele estuda o trabalha com as
contingências, Isto ó, com o comportamonto dentro de contextos".
Na análise do comportamento, contingência ó um termo que enfatiza
"como a umbabilidade de um avento oode ser afetada ou causada uor
outrna aventas. Ê um instrumento conceituai aue ô utilizado na análise das mteracòes
um<intsmo-amhlante e aue esnecifica trás termos. /1) uma situacâo presunto ou
antecedente aue nada sar desnnta em termos da estímulos chamados discnminativos
pela fu n d o controladora aue exercem sobre o comportamento: (2) alaum
mmnortammnta do aulaito aue sh amitxin na nmaanca dmtais esiimiilns diamminativns
tem como conamaüànda (3) alauma alteracAo no ambiente aue nào ocorrena (a) se
tal Gomoortamanto fosse emitido na ausóncia ttas rafendos estímulos dmnminaíiYos,
uu (Ll se o GonmUunum não oamasaa" {Cataria. 1331 Todorov. 133Í

Quando a queixa faz procurar ajuda


Quando procura ajuda terapêutica, geralmente, o cliente comoça contando sobre
algum aspecto do suas dificuldados. Ao analisar a verbalização de um episódio de queixa do
seu cliente, o terapeuta começa a identificar ali "pistas que indicam que ole está sob controle
de contingôncias coercitivas; que olo não possui repertoho de esquiva de tais contingôncias
o/ou quo está sob perda do roforçadores" (Olivoira, 2001).

Sobre l ompoitimento e CogniçAo 421


O terapeuta pode ajudar o cliente com modelos e instruções verbais, a se
comportar de forma a obter reforçadores positivos. Isto é o mesmo que se esquivar dos
sintomas (se não estão presentes) e fugir deles (quando estão se manifestando-
Guilhardi.2004)
Indivíduos que apresentam com freqüência comportamontos de queixa estão
experimentando períodos oscilantes de melancolia ou tristoza. A tristeza ó uma emoção
ou sentimento humano normal e acontece em resposta a uma perda, a um
desapontamento ou fracasso - isto ó, após a apresentação do um estímulo aversivo, a
remoção de reforçadores positivos, o impedimento da resposta ou o não-surgimento
de reforçamento usual. Mas não compromete nosso desempenho ou raciocínio e diminui
ou desaparece sem necessidade de ajuda especial.
Por outro lado, queixas do tipo:
“ A vida não tem sentido, eu quero morrer
" Eu nào consigo lidar com meus problemas",
" Inútil tentar, nào tenho nada de interessante para os outros
“Eu quer/a poder cair num buraco em algum lugar e morrer'';
" Eu nào tenho mais sentimentos, fiquei insensível',
expressam um exagero acentuado de algumas dificuldades interpessoais do
indivíduo e, ao mesmo tempo, subestimam suas habilidades de enfrentamento.
Parecem indicar que sua autoconfiança e sua capacidade de lidar com as situações
estão desgastadas e minadas.
Pessoas em sofrimento psicológico, tal como as que sofrem de d fii física,
costumam buscar alívio contando aos outros sobre este sofrimento. Não raro, a atenção
social que conseguem pode intensificar este relato e ele se tornar uma queixa, embora
esta atenção não seja a causa da tristeza. Queixar-se produz um sentimento de alívio
quase imediato no indivíduo mas este ó o único aspecto benéfico que o reforçamento
negativo lhe proporciona.
Existem queixas que ilustram sensações físicas:
“..foi tão horrível que só pensava: vou morrer,..vou cair...turvou minha vista.Jul
carregado Fiquei sem sair de casa ..parei de dirigir".
Ou sintomas corporais:
"...meu corpo nào me obedece mais";
"...sinto que nào vou para frente";
"...meu braço formiga; meu coração dispara";
"...sinto tontura. Tenho a sensação que vou desmaiar'
A atenção que o indivíduo recebe às suas queixas orgânicas, dos sintomas,
fortalece o repertório de ficar sob controle de reações do organismo e não sob controle
de outros eventos que o cercam, incompatíveis com estes sintomas desagradáveis; ex:
amigos, atividades de lazer, sociais (Guilhardi, 2004).
E queixas que assinalam supressão de comportamento operante, ou um déficit
comportamental:
“„.não consigo trabalhar";
"...nào saio mais de casa. Parei de dirigir ";

422 Sônlu do* S. Cuíldoltciru


“...nào me interesso m ais por mulheres";
"...não tenho vontade de sair com os amigos. Nào consigo fazer nada, só dormir".
Kohlonborg e Tsai (2001) afirmam que a terapia funciona melhor quando o
terapeuta detecta comportamentos clinicamente relevantes e, segundo a definição que
dão aos CRB's, a queixa, mesmo considerada uma resposta inapropriada, podo ser
considerada um bom CRB3 - pois ela ó um relato que o cliente faz de sua dificuldade, o
que poderia causá-la, suas interpretações e razões. Tudo isto envolve a observação e
interpretação da própria quoixa e dos estímulos reforçadores, discriminativos e olicladoros
associados a ela.
Ferster (1972) argumenta que os problemas comportamentais detectados no
cliente que busca a terapia são muito mais abrangentes que a queixa especifica e
restrita trazida por ele: “ o desconforto que traz o paciente para a terapia vem,
predominantemente, de comportamentos não-verbals (ele fica em casa e falta ao
trabalho, nào fala com as pessoas quando as vê, etc)."
Mesmo que seja com a queixa inicial do cliente que se dê a partida "para o
estabelecimento de metas na terapia e de um plano para rearranjar as condições que
estão mantendo suas dificuldades" (Lé Sónéchal-Machado, 2001), Ferster (1972) acredita
que o terapeuta deve lidar com o repertório geral de comportamentos do cliente e não
atentar, prioritariamente, para a queixa especifica apresentada por ele.
Geralmente, “a queixa apenas descreve os comportamentos do próprio cliente e
de pessoas a ele relacionadas no seu cotidiano. Para identificar a crise "real" que vem lhe
causando sofrimento, a queixa inicial deve ser continuamente redefinida, ressignificada,
reavaliada e recontingenciada polo terapeuta, agora faciíitador da aprendizagem, com
propostas de generalização dos novos comportamentos (então aprendidos) para outras
situações ou contextos mais amplos." (Lé Sónéchal-Machado, 2001).
Segundo Guilhardi (2004), cabe ao terapeuta comportamental ampliar o alcance
da investigação, abrangendo o repertório mais extenso do comportamentos do cliente,
bem como as relações desse repertório com os eventos reforçadores e punitivos
disponíveis no ambiente (dificuldades sociais, profissionais, por ex.)".
Ferster (1972) continua.* antes do terapeuta propor quafquer ação terapêutica,
ele deve ficar sob controle dos excessos, dos déficits e das reservas comportamontais
do cliente e não sob controlo exclusivo da queixa. Ou seja, a ênfase deve ser dirigida à
ampliação dos repertórios deficitários e não dos comportamentos de fuga e esquiva,
comuns quando há falta de repertório adequado.
Existem outros padrões de condicionamento - além da simpatia recebida e do
reforçarnento negativo obtido através da fuga/esquiva - que fortalecem o comportamento
de quoixa tão ou mais fortemente do que a aversividade dos estímulos condicionados
em que se transformam estas reclamações.
Por ex., a pessoa aprende a ser "autocritica e autopunitiva" porque estes
comportamentos muitas vezes reduzem a probabilidade de que outras pessoas a punam.
Com queixas deste tipo, o indivíduo aprende a escapar da punição social, punindo-se
antes:
’eu sou uma pessoa abominável, sou preguiçosa e eoocôntnca. nâo ma Importo
com ninguém além de mim mesma":

•eu &au uim matiunüa. uma uiranha...su me suiía cama a a&üúria da hunmiúaúa'.
“sou Infantil uma droaa. Todas as pessoas sabem sbrelacionar e eu não“.

Sobre Comportamento c Cogniçdo 423


Queixas do tipo "caluniar-se a si mesmo" merecem uma atenção ospedal. Geralmente,
elas fa/em com que o terapeuta permita ao clionto explorar mais pnofundarnonte seus sentimentos
o pensamentos, ao invés de assegurar-lhe de imediato quo o que diz nào ó vordade, e isto pode
ser percebido como um poderoso reforço social (Kohlenberg: Tsai, 2001).
Além do fato de qualquer dos padrões de reforçamento acima permitirem que
uma pessoa comece a se queixar mais, este comportamento do auto-atormentaçào
(queixa encoberta) pode ser ainda reforçado por um poderoso roforçador primário, a
estimulação sonsorial.
Skinnor (1991) faz um comentário interessante sobre uma falha, que o
condicionamento operante do todo comportamento produz em si mesmo. Segundo ele,
"Muitos problomas que exigem terapia têm origem numa falha de condicionamento
operante em sl mesmo. O processo se desenvolve porque o comportamento
(...)"aprender a queixar-se com alta freqüência, foi fortalecido quando tinha
importantes conseqüências para o indivíduo (...) Entretanto,o processo não poderia
levar em conta a maneira como o comportamento produziu suas conseqüências.
Era suficiente que as conseqüências se seguissem, mesmo apesar de ser
produzidas por várias e diferentes coisas realizadas. O condicionamento operante
ocorre quando as conseqüências reforçadoras se seguem por alguma razáo,
qualquer que seja ela“ (p. 107).
O papel dos reforçadores generalizados (sociais), que o indivíduo mantém no
seu ambiente, o mantém falando dos sintomas e modelam repertórios cada vez mais
sofisticados de se queixar (Guilhardi, 2004).
Algumas queixas, atribuídas ao desamparo ou ao dosespero, poderiam ser
aliviadas "através do restabelecimento de reforçadores perdidos ou da eliminação de
conseqüências aversivas, especialmente as que estão nas mãos de outras pessoas,
sem ignorar os fatores genéticos" (Skinner, 1991).
HEu sempre serei infeliz"; “Ninguém me dá atenção, por isso nào tenho
amigos"; “Tenho me sentido muito mal, sempre*
“Sinto um vazio dentro do peito, nada mais na vida tem sentido para mim“
"Acho que sou a responsável por todos os problemas de meus filhos".

Quando a queixa dói


Sabe-se que muitas dores são funcionais (e não de naturoza física) o a
manipulação do próprio relato verbal elimina eficazmente a dor. É possível ató a dor
"roar ser manipulada através da mudança do relato verbal, uma vez que reduz o grau
om que a pessoa presta atenção à ela. Por ex., uma dor de dentes bastante real pode
não desaparecer realmento quando so está temporariamente absorvido numa atividade
agradável mas, a queixa e a atenção à dor durante aquele tempo pode desaparecer,
para voltar apenas quando a absorção termina (Rimm; Master,1983).
Embora a dor que o indivíduo diz sentir seja obviamente mais do que apenas o
relato verbal da queixa, já que é um fenômeno Interno, ola pode sor examinada e tratada
através do uso de algum índice externo, como os outros relatos do cliente. Para ontender
o que o cliente quer dizer com sua queixa, o terapeuta deve procurar as causas fisicas,
no seu corpo e ambientais, na sua história passada.
"eu me sinto péssimo o tempo todo";
“eu nào consigo suportar me sentir assim a vida toda".

424 Sòni.i ilos S. Ciisl.inltclr.i


Em situações como estas, o terapeuta tenta traduzir ou reformular a queixa
ouvida, indagando sobre sentimentos, pensamentos ou comportamentos do cliente
para clarificar como a queixa se relaciona com o padrão comportamental que ambos
procuram modificar. Em muitos dos casos, identificam-se características e as
decorrentes dificuldades pessoais do indivíduo. Não raro, ele cria falsas regras, faz
discriminações e generalizações Incorretas e conseqüentemente, tira conclusões sobre
si e os outros, tambóm incorretas:
"ninguém gosto de mim porque sou gorda";
"eu nâo sou uma pessoa atraente. Apenas as pessoas magras tèm sucesso na vida";
"o valor das pessoas está associado à magreza".
"os homens não gostam de mulheres Intelectuais; fico pósslma, porque estudo".
Normalmente, nestes exemplos de queixas, o cliente fica sob controle de
comportamentos e estados corporais e não consegue relacioná-los com a atuação de
contingências coercitivas, produtoras de operantes de fuga e esquiva e, ao mesmo
tempo, eliciadoras de reações respondentes. Depois de eliminados os
comprometimentos orgânicos, qual é a função da queixa e que significado o queixoso
dá por sentir-se cuidado e ouvido?
Fazer algo em relação à sua queixa exige que a pessoa mude as circunstâncias
aversivas responsáveis pelo que está sentindo. Se o indivíduo não consegue discriminar
entre os eventos ambientais que controlam suas mudanças comportamentais e os
estados corporais sentidos, “cabe ao terapeuta ensiná-lo a identificar e descrever as
relações funcionais entre os comportamentos e as variáveis ambientais que os
determinam e capacitá-lo para alterá-las na direção que lhe for mais apropriada. Ou
seja, deve alterar possíveis descrições incompletas ou imprecisas e instalar um novo
repertório que gere descrições mais acuradas das contingências relevantes ao
comportamento de queixa a ser modificado". (Guilhardi,2004).

Focalizando a queixa na terapia comportamental


A experiência clínica nos diz que o terapeuta nâo deveria ficar apenas sob controle
do relato verbal da queixa porque a forma deste comportamento não diz muita coisa. O
que o comportamento diz não é o fundamental e sim, porque ele diz: o ponto crítico é
função e não estrutura (Skinner, 1991).
Guilhardi (2004) enfatiza que nenhuma queixa pode ser avaliada fora do contexto
em que ocorre, já que o comportamento não ô função do organismo, nâo ô função do
ambiente, é interação entre ambos. O modelo que explica o processo comportamental
ó o da seleção do comportamento pelas conseqüências que produz. Neste sentido, o
comportamento de queixar-se é determinado por uma rede de contingências de
reforçamento que o influenciaram e das quais a própria queixa ó integrante.
Para o terapeuta comportamental, o que define uma queixa não é o evento
antecedente que a instiga, mas a inabilidade (déficit comportamental) do Indivíduo para
enfrentar situações aversivas, inesperadas ou não.
Guilhardi (2002) assinala que o foco de análise, para todo terapeuta ou
estudioso do comportamento "interessados em entender e alterar ações e sentimentos,
deve estar voltado para as contingências de reforçamento em operação, das quais os
comportamentos e sentimentos são função". Quando o cliente relata uma queixa ele
apenas discrimina que sofre; mas não, que sofre porque vive num contexto escasso de
contingências reforçadoras positivas, ou abundante em contingências aversivas.

Sobre Comportamento e C‘o(?niçío 4 2 5


Naturalmente que diferentes histórias de contato com contingências de
reforçarnento vão produzir diferentes repertórios comportamentais, que permitem
entender e explicar as reações dos clientes na manutenção de suas queixas, ao processo
terapêutico e às mudanças.
Como Skinner (1991) ressalta que queixa é uma espécie de resposta
negativamente reforçada e um sub-produto do controle aversivo, é importante o terapeuta
estar atento se o cliente ficou exposto ou nâo, a contingências aversivas (punição e
reforçarnento negativo) ou a contingências reforçadoras (reforçarnento continuo ou
parcial, reforçamonto não-contingente ou contingências vagamente definidas).
Quando o conseqüente não ô um evento aversivo, não há necessidade do
individuo emitir nenhum comportamento de fuga/esquiva, O ambiente pode, no entanto,
sinalizar se haverá conseqüências aversivas e então, o individuo poderá esquivar-se ou
não, dessa conseqüência.
"Eu nâo consigo gostar de mais ninguém e ninguém gostará de mim";
“ Sempre faço coisas que nâo dão certo, me sinto mal e faço os
outros sofrerem"
"Eu me sinto insegura e com medo da vida".
Com muita freqüência, o cliente relata eventos internos como causa de seus
problemas:
... meu problema è na cabeça",
acho que meu problema è hereditário"
“ acho que sou pouco inteligente, por isto nâo saio desta depressãd'.
e até a solução para suas dificuldades:
antào. vou tomar um mmédio oara deprossuo..."
“ ....6 muito fácil ficar Pãtudü. Eu imo me incomodd'.

Queixa e sentimentos
Sentimentos como medo, ansiedade, culpa e raiva indicam a presença de
contingências aversivas na história de vida atual ou passada do cliente e suas
dificuldades para lidar com elas.
Guilhardi (2004) afirma que as contingências de reforçarnento positivo,
fundamentais para promover sentimentos de auto-estima, autoconfiança o facilitar a
auto-observação, também aparecem nas queixas mas, são escassas nas relações do
individuo com seu ambiente. Geralmente, quando aparecem, estão nos relatos de
sentimentos de angústia ou depressão, sugerindo diminuição ou perda de reforçadores
positivos (punição negativa) ou extinção.
Para o analista comportamental, isso parece dizer que as pessoas que se queixam
"olham somente para um dos aspectos das contingências, para dentro delas mesmas mas,
enquanto isso, as contingências continuam operando e o individuo permanece passivo,
caminhando sem saber para onde está sendo conduzido" (Oliveira, 2001). Segundo este
autor, isto é produto de uma cultura intemalista, e pode produzir uma pessoa individualista
e preocupada apenas com o que ocorre em seu interior (tristeza, pânico, depressão),
alienada, passiva, paralisada e sob controle de contingências coercitivas - doente.

426 Sôni.i ilos S. CdsljnluMr.i


A intervenção terapêutica comportamental procura ir além destas fronteiras
internas, que são um obstáculo para o desenvolvimento comportamental do cliente e
tenta alcançar as suas relações com o ambiente * as contingências. Através de uma
análise funcional procura-se descobrir porque esta queixa se instalou e como se mantém.
Naturalmente que não basta o terapeuta apenas fazer análises funcionais dos
episódios de queixa de seu cliente e acreditar que está tudo resolvido. Elas ajudam a
entender sobre o comportamento mas, seguramente, há outras variáveis diretamente
ligadas à história de vida do indivíduo e que ajudam-no a ser visto como uma pessoa e
não como um repertório de comportamentos inadequados.
Buscar as causas do comportamento no passado e no presente do indivíduo,
em vez de no futuro, é um avanço na análise comportamental.
A história passada de uma pessoa é essencial para a compreensão de sua
queixa atual. Meyer (1997) chama a atenção para o fato de que a especificação dos três
termos da contingência, numa análise funcional de comportamento, não inclui um
espaço explícito para o papel desempenhado pela história de vida do indivíduo, tão
importante para explicar alguns tipos de episódios de queixa.
Indivíduos que descrevem uma história de vida com muitos reforçadores
positivos, na sua maioria não-contingentes às suas ações, e hoje têm suas queixas
reforçadas socialmente num esquema de razão variável, são os que mais apresentam
queixas do tipo habitual. Sabe-se que certos esquemas de reforçamento rio
condicionamento operante criam uma dependência única.
Em se tratando de comportamentos inadequados como a “mania de se queixar ",
o esquema de razão variável ó essencialmente causador de problemas. É um esquema
poderoso e útil que cria resistência á extinção, apesar dos reforçadores serem ocasionais
e imprevisíveis como é o caso da atenção social.
Sob este ponto de vista, na análise das queixas relevantes de um cliente,
recomenda-se que o terapeuta deva enfocar principalmente o controle de contingências
ambientais antecedentes, além do ropertório comportamental inapropriado para lidar
com elas, claro; e para as queixas habituais, o foco deveria se dirigir principalmente
para seus conseqüentes (reforçadores positivos /negativos), além da inabilidade para
respostas adequadas.

Queixa suicida
"Quero morrer, sinto um vazio dentro do peito; nada mais na vida tom sentido para mim''
"Como sou lésbica e negra, sinto que nào tenho direito de existir; è como se eu nào
devesse viver, comigo tudo dá problema";
"Tenho certeza que se morrer ninguém sentirá minha falta, porque nào valho nada
mesmo".
"...estou sem qualquer motivação para viver"',
Nos casos extremos, uma pessoa literalmente desiste da vida. Suicídio é a
fuga última de uma vida dominada por reforçamento negativo e punição. Sidman (1995)
pontua que
"a análise do comportamento nâo pode, naturalmente, explicar a autodestruição
de um indivíduo apelando para uma história de reforçamento para o ato: voei só
pode se matar uma vez. Se os elementos finais do ato são reforçadores, isto nào

Sobre l'om|x)rt<imcnlo c Cognição 4 2 7


pode ser determinado, a menos que a pessoa sobreviva. As tentativas de suicídio
mal-sucedidas podem tornar o suicida um objeto de atenção e preocupação, o
recebedor de afeto e simpatia, “(p. 132)

Entretanto, o suicídio é um ato que tem muitos componentes e estes revelam


algumas das condições ambientais antecedentes e/ou atuais, que levam o individuo a
um suicídio: (1) sentimentos de culpa e indignidade insuportáveis; (2) sentimentos de
fracasso; (3) forma de coerção não-intencionada mas freqüentemente deliberada, para
punir aqueles que, na realidade ou imaginação, exerceram coerção insuportável sobre
ele; (4) sentimentos de dependência e desamparo (Sidrnan,1995).
Se formos justos, nenhum terapeuta está, "automaticamente", preparado para
discutir queixas que envolvem deficiências sérias, violência, raiva, sexo, alucinações,
homossexualismo, homicídio e suicídio. São necessários prática e esforço concentrado
para lidar com tais tópicos com tranqüilidade, é importante que o terapeuta leve a queixa
do cliente a sério, avalie o risco e severidade da manifestação/plano suicida e ofereça
disponibilidade para o desenvolvimento de alternativas mais construtivas.
O comportamento verbal encontrou e adquiriu, na análise do comportamento, o
potencial de poder instruir o não-verbal (Catania,1999). Portanto, mais importante, é
que o terapeuta prolba essas ações prejudiciais, nào apenas dando uma ordem
verbalmente, mas ajudando-o a separar sentimentos de ações (a conexão entre pensar
sobre suicídio, sentir-se suicida e possuir comportamento-suicida, é aquela da relação
comportamento-comportamento, onde um não leva necessariamente ao outro) e
explorando com ele as conseqüências destas ações. (Sidrnan, 1995; Zaro e cols, 1980).
Como a relação terapêutica é menos punitiva que as relações estabelecidas
fora do consultório, o terapeuta se torna um agente reforçador para o cliente, a quem
não julga nem atribui culpa por seus comportamentos inadequados (Zamignani, 2000).
Se estas declarações forem na realidade "mandos" disfarçados como "tatos" (ou seja,
ameaçar suicidar-se para obter uma maior atenção por parte do terapeuta), então o
cliente deve ser confrontado e ensinado a pedir diretamente pelo que quer, sem
comportamontos nocivamente ameaçadores.

Considerações finais
Pelo exposto e como bem o afirmou Cesar (2001), há uma longa cadeia de
respostas, desde os relatos iniciais da queixa (relevante ou habitual), até a descrição e
análise das contingências que os mantém.
Infelizmente, estes relatos não definem completamente a problemática do cliente
mas, para o terapeuta, eles são dados Importantes que devem ser relacionados com
outras observações. Como parte do ambiente do cliente, o terapeuta tem condições de
observar suas queixas e contingenciá-las de forma a desenvolver em seu cotidiano
Interações menos aversivas que as pré-existentes nos episódios relatados.
O terapeuta comportamental sabe que a queixa do cliente tem uma função no
ambiente e que só alterando as interações entre conduta e contexto por meio das quais
as leis comportamentals operam, começará a ver um comportamento adequado
substituir a queixa de seu cliente.
O objetivo deste tipo de terapia é mostrar ao cliente que seus problemas podem
ter relação com as contingências de reforçarnento sob as quais vive e levá-lo a discriminar
que, mudando de vida, há possibilidade de sentir-se melhor. Se ele aprende a discriminar

428 Sônld do* S. Cdítdnhfir.i


as contingências que antecedem e mantém suas queixas e testa seu funcionamento,
ou seja, sua eficácia e praticidade, pode começar a manejá-las, interagindo com o
ambiente (com comportamentos alternativos) e observando seus efeitos. E, só as
variações no seu comportamento, no dia a dia, ó que permitirão a alteração destas
contingências (Guilhardi, 1997; Matos,1997).
Finalizando, ó importante desativar a queixa.
Mas, sem se esquecer que, decisões terapêuticas acertadas, dependerão da
análise contextualizada deste comportamento levando-se em consideração o repertório
geral do individuo, suas privações, os eventos privados correntes, sua história de vida e
os estímulos reforçadores e aversivos que incidem sobre ole (Wielonska, 2002).
Skinner (1991) afirmava que "toda e qualquer ação deveria ser mais bem
entendida quando se observa sua relação com o ambiente, especialmente nos efeitos
causados sobre ele. Desta maneira, o ambiente retroage sobre a ação, aumentando ou
diminuindo a probabilidade dela voltar a acontecer
Com a queixa não ó diferente.

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430 Sdtiiii «lus S. ( ‘(ittiinhciru


Capítulo 37
A relação entre comportamento
alimentar, auto-imagem e
personalidade: que variáveis
podem predispor uma pessoa
aos transtornos alimentares?
Talila Lopes Marques
Denise Cerqueira Leite I leller
Universidade luiuli do Paraná

Os Transtornos Alimentares são caracterizados por uma grave perturbação do


comportamento alimentar (preocupação excessiva com a qualidade do alimento ou,
consumo exacerbado ou limitado de alimento) e uma preocupação exacerbada com o
peso e o corpo. São compreendidos pela Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa, Transtorno
do Comor Compulsivo e Ortorexia (Duchesne, 2001; Heller, 2003; Ferreira, 2004). Neste
artigo será tratado apenas da Anorexia e Bulimia em função de seus objetivos.
A década de 60 foi um marco na história dos Transtornos Alimentares, pois
houvo um crescimento do interesse pela Anorexia Nervosa e Bulimia Nervosa por parte
da comunidade cientifica e da sociedade. Isto decorrou da maior divulgação de tais
transtornos pela midia, casos de celebridades sofrendo destas doenças e ao aumento
da valorização da aparência física magra por parte da sociedade. Então, teve início a
apologia da magreza, o anseio pelo corpo "perfeito", a equivalência do termo “beleza" a
"corpo magro" e, conseqüentemente, o aumento vertiginoso dos casos de Transtornos
Alimentares (Duchesne, 2001; Heller, 2003).
Segundo Duchesne (2001), não se pode ter certeza da incidência dos transtornos
alimentares, pois, além de muitos pacientes não se considerarem doontes ou terem
vergonha de mostrar seus sintomas, estudos com este objetivo são realizados, geralmente,
com população estudantil. Mesmo assim, estima-se que 0,5% a 1% da população
adolescente feminina preencha totalmente os critérios do DSM-IV para a Anoroxia Nervosa
e 1% a 3% para a Bulimia Nervosa. Estima-se também que a incidência seja maior para
o sexo feminino (acima de 90%). Entretanto, estudos recentes indicam que a prevalência
destes transtornos tem aumentado no sexo masculino: acomete 50% de heterossexuais
e 50% de homossexuais ou assexuados (Azevedo, 2004). Além disso, a busca por um
corpo extremamente magro ou a busca pelo corpo do tipo atlético, pode fazer com que
homons desenvolvam além dos Transtornos Alimentares, a Vigorexia (Heller, 2003).
Os Transtornos Alimentares tem ocorrido em idades cada vez mais precoce.
Estes pacientes vão formando sua personalidade à luz de um Transtorno Alimentar. Ao

AyrH(lm:!(iM>nto Dr" *" Plínio Mtircn |Ko(en»o» da Unlvoraklnde Tiiliiti do Paraná por Wh rtwIlMdo h hiiANao fmUillitlcH dailo oaludo

Sobre Comporfdrncnlo e ( ’ofliilç.lo 431


chegar ao fim da adolescência, ou seja, quando são jovens adultos, apresentam uma
"forma de pensar, agir e se relacionar muito diferente da média da populaçáo" (Martins
o Sassi Jr, 2004)
Para se diagnosticar a Anorexia Nervosa ó preciso quo a pessoa apresento,
segundo o DSM-IV: recusa em manter o peso minimo normal adequado â idade e à altura,
ou acima doste; modo intenso de ganhar poso ou de se tomar gordo, mesmo apresentando
peso inferior ao normal; perturbação na maneira de vivenciar o poso, o tamanho ou a forma
corporal; nas mulheres pós-menarcas, amenorróia por no minimo 3 ciclos monstruais
consecutivos (Duchesne, 2001; Duchesne E Appolinário, 2001; Hollor, 2003).
A Anorexia Nervosa pode ser de tipo restritivo, onde geralmente a perda de peso
tem início com a restrição de certos alimentos, podendo chegar ao jejum completo; ou
do tipo purgativo, fazendo-se uso abusivo de laxantes, diuréticos, enemas, anorexígenos,
indução de vômito e exercícios físicos om excesso (Heller, 2001; Duchesne, 2001;
Duchesne E Appolinário, 2001; Heller, 2003).
Outras características relevantes da Anorexia Nervosa são: inicia-se entre 13 e 18
anos, a pessoa apresenta preferência pela magreza extrema, o medo intenso de engordar
ocorre como idóia fixa e intrusiva; preocupação excessiva com rogimes e estratégias para
pordor peso; percepção corporal distorcida; rara perda de apetite; distúrbios comportamentais
(Transtorno Obsessivo-compulsivo e depressão são as comorbidades mais freqüentes);
hipotermia; cefaléia; perda do interesse sexual; letargia; cabelos e unhas quebradiços; pele
seca e amarelada recoberta de pelugem; arritmia cardíaca; anemia; tontura; pouca tolerância
ao frio; distúrbios de coagulação - sintomas neurofisiológicos decorrentes do desequilíbrio
nourolítico (Duchesne, 2001; Duchesne E Appolinário, 2Ò01; Heller, 2001, 2003).
DaJgalarrondo (2000) traz que o que caracteriza a Anorexia Nervosa, segundo a
psicopatologia, é o distúrbio da imagem corporal, que faz a pessoa ver seu corpo gordo
por inteiro ou aponas em certas partes, geralmente a barriga, o quadril e as coxas. O pavor
de engordar ó constante, mesmo que a pessoa estoja muito magra ou emagrecendo.
Segundo Hollor (2001, 2003) e Cordás (2000), a pessoa quo sofro de Anorexia
Norvosa apresenta auto-estima rebaixada, perfeccionismo, insegurança, falta de habilidade
social, repertório comportamental limitado, tendência a se auto-avaliar através do julgamento
dos outros, tendência a atribuir os insucessos de sua vida à sua forma corporal, sensação
de falta de controle sobre sua vida, parecendo que a única coisa capaz de ser controlada por
ola é seu comportamento alimentar, o que passa a ser muito reforçador para a anorética.
Para so diagnosticar a Bulimia Nervosa, segundo o DSM-IV, é preciso que a
pessoa apresente as seguintes características: episódios de binge-eating
(superalimentação) recorrentes; freqüentes comportamentos compensatórios
inadequados (vômito auto-induzido, uso abusivo de laxantes, diuréticos, anorexígenos
e prática do exercícios físicos em excesso) para prevenir o ganho de peso; auto-avaliação
inadequada, influenciada pelo peso e formato corporal; episódios de binge-eating e
comportamentos purgativos acontecendo, em média, 2 vezes por semana, por 3 meses
consecutivos. O episódio de binge-eating ou hiperfagia é caracterizado por: comer durante
no máximo 2 horas uma quantidade de alimento que a maioria das pessoas não comeria
se em uma situação semelhante e sentimento de falta de controle sobre o
comportamento alimentar (Duchesne, 2001; Duchesne E Appolinário, 2001).
A Bulimia Norvosa pode ser do tipo purgativo, quando a possoa induz o vômito,
faz uso abusivo de laxantes, diurôticos ou anorexígenos, ou do tipo não-purgativo, quando
a pessoa se submete ao jejum ou a exercícios fisicos om excesso.
Outras características relevantes da Bulimia Nervosa: inicia-se entre 13 e 17 anos; o
episódio de hiperfagia é, normalmente, desencadeado por estados de humor disfóricos e

432 l.ilit.i I opcs Miirquct, DcnUc (. cniuclr.i Ixlfo I icllcr


ansiosos ou fome intensa; distúrbio de imagem corporal, peso dentro do esperado para seus
peso e altura, podendo estar levemente acima ou abaixo do ideal; alterações cardiovasculares,
gastrintestinais, bidroeletrolíticas e metabólicas, causadas pela doença; desgaste do esmalte
dentário, hipertrofia das glândulas salivares e Sinal de Russel (Cordás, 2000) que são as
cicatrizes encontradas no dorso da mâo, ocasionadas pelo contato com os dentes ao provocar
o vômito (Dalgalarrondo, 2000; Duchesne, 2001; Duchesne E Appolinário, 2001).
De acordo com Cordás (2000) a pessoa que sofre de Bulimia Nervosa apresenta
atenção voltada para magreza e dietas, preocupação excessiva com o corpo, evita se
pesar, evita ir a eventos sociais devido à compulsão alimentar e por acreditar que
engordou, passa muito tempo do seu dia lendo revistas sobre corpo, dietas e assistindo
videos de ginástica, o que acabada derivando um isolamento social.
A literatura trás que os Transtornos Alimentaros são multideterminados e
oclodom da interação de fatores biológicos, psicológicos, familiares, sócio-culturais e
acontecimentos estressantes.
Em relação aos fatores biológicos, existem alguns fatores genéticos que
parecem predispor pessoas da mesma familia (parentes em primeiro grau) a Anorexia
e a Bulimia (Duchesne, 2001; Heller, 2003). Micci (2004) corrobora com esta idéia e
acrescenta a presença de familiares com problemas como alcoolismo e depressão.
Martins e Sassi Jr. Afirmam que "a genética de pacientes, implicação de
neurotransmissores envolvidos em comportamentos do busca (busca pela novidade),
esquiva aos perigos (esquiva ao dano), dependência de gratificação e persistência
(Clonninger, 1999) constituirão os traços do temperamento" ( Martins e Sassi, 2004).
Nos fatores psicológicos, fica evidente que, na maioria dos casos, anorôticos o bulfmicos
possuem um padrão de comportamento que evidenda serem muito autocrfticos, perfeccionistas
e sensíveis a críticas (o que os toma vulneráveis às pressões sociais). Apresentam baixa auto-
estima, muita ansiedade interpessoal, se vêem como inadequado em vários aspectos pessoais
e sociais, julgam serem incapazes de resolver problemas de qualquer natureza, o que vem a
dificultar sua conquista da independência, geralmente se avaliam pelo julgamento dos outros;
seus comportamentos são, muitas vezes controlados por outras pessoas, percebem que tem
pouco domínio sobre sua vida então, reduzem a alimentação pois isto lhes proporciona uma
sensação de controle e mestria (Duchesne, 2001).
Para Martins e Sassi Jr. (2004) comorbidades como Transtornos Afetivos (em especial
a depressão), Transtornos Ansiosos (Transtorno Obsessivo-compulslvo), Transtornos de
Personalidade (emocionalmente instável tipo borderline e impulsivo, histriónico e anancástico)
apresentam alta prevalência em pacientes que sofrem de Transtornos Alimentares, além da
maior chance de cronificaçáo. Estes pacientes demandam “maiores períodos de internação,
tentam mais suicídio, automutilam-se e mobilizam a equipe e outras pacientes de forma
maciça, despertando sentimentos variados em seus membros".
Quanto aos fatores familiares, Heller (2001, 2003), descreve que, em geral, a
família dá muita importância ao corpo e ao sucesso, tendendo a atrelar, de forma errada,
estas duas variáveis, fazendo com que o corpo seja visto como uma porta para o sucesso.
Corrobora Duchesne (2001), afirmando que a família quer parecer bem-sucedida o
tempo todo, através de comportamentos como estar sempre na moda, exigir boas
notas dos filhos na escola e ter aparência saudável e atraente, ou seja, "magra". A
família apresenta comunicação disfuncional, com dificuldade de expressão de
sentimentos e incapacidade de estabelecer vinculo afetivo; rigidez, com grau de exigência
bastante elevado, aplicado a todos os membros da família e tendo o sucesso um valor
extremo; os pais são superprotetores, o que dificulta a aquisição da autonomia por

Nobrp Comportamento c Cognição 4 3 3


parte dos filhos; preocupação com a estética corporal, manutenção de peso, podendo
os pais, em geral a mãe, praticar exercícios físicos em demasia, fazer dietas e cirurgias
plásticas (Cordás, 2000; Heller, 2003) além de, segundo Duchesne (2001), pelo menos
um dos pais ser muito exigente e crítico quanto a aparência do filho que sofre de
Transtorno Alimentar. A família tende a evitar perceber a doença, chegando muitas vezes
a elogiar o emagrecimento do filho (no caso de Anorexia Norvosa) e, no caso da Bulimia
Nervosa esperam que o problema se rosolva com o "tempo" (Heller, 2003).
Em relação aos fatores sócio-culturais, em Duchesne (2001), tem-se que "o
contexto cultural influencia os modelos e ideais individuais, criando pressões para quo as
pessoas tentem se adequar a determinados padrões”. A mídia é uma grande responsável
pelo aumento da incidência, pois passa a idéia de que a beleza, felicidade e autovalor
estão diretamente ligados a um corpo magro, então as mulheres buscam se adequar a
este padrão para serem aceitas e respeitadas. Os padrões de beleza vigentes, do formas
"ideais" serem as formas muito esguias, ou então com uma grande definição muscular,
proporcionada pelo trabalho de força realizado em academias de ginástica (Araújo, 2004)
estão muito longo das formas reais da maioria da população. Isto faz aumentar a angústia
em relação a aparência e torna as pessoas, em especial as mulhores, muito inseguras
com seu próprio corpo. Heller (2003) traz exemplos da apologia da magreza que a
sociedade faz de forma direta ou indireta: em um reality show, exibido em horário nobre,
uma bulímica aparecia provocando vômitos, ingerindo laxantes, incentivando outros
participantes a tomarem laxantes e a rede televisiva parece ter achado tais comportamentos
"normais", afinal, a moça continuou no programa, roupas de grife dispõem de numerações
pequenas (até 44); novelas e filmes mostram, em sua maioria, atores magros, sobrando
aos "gordos" papéis "engraçados"; propagandas de remédios para emagrecer fazem
uma propaganda enganosa de um produto que promete emagrecimento rápido e indolor;
a indústria dos produtos light, diet e dos suplementos alimentares vendem corpos magros
e saudáveis; além disso, muitas modelos são anoréticas ; Twiggy (década de 60), Kate
Moss (década de 80); Naomi Campbell (década de 90).
O presente artigo é o estudo piloto de uma pesquisa que abrangerá universidades
particulares da co estado do Paraná. Pretendeu-se identificar e correlacionar o
comportamento alimentar, a autopercepção da imagem corporal e 15 fatores de
necessidades da personalidade que podem vir a predispor jovens universitários a
desenvolverem transtornos alimentares. Participaram desta etapa 50 alunos, 48 do sexo
feminino e 2 do sexo masculino, com idade entre 18 e 25 anos, provenientes do curso de
psicologia de uma universidade particular da cidade de Curitiba - PR.
Para a realização desta pesquisa, foram utilizados instrumentos de auto-aplicaçào,
traduzidos e validados para a população brasileira, os quais apontam a presença ou a
gravidade de sintomas de Transtornos Alimentares e de Distúrbio de Imagem Corporal
(Crowther E Sherwood apud Cordás e Neves, 1999). A saber: Eating Attitudes Test (EAT-
26), Body Shapo Questionnaire (BSQ) e Inventário Fatorial de Personalidade (IFP).
O Eating Attitudes Test, versão resumida - EAT-26 (Gross et al. apud Cordás e
Neves, 1999), traduzida para a língua portuguesa (Nunes et al. apud Cordás e Neves,
1999), tem por objetivo apontar a gravidade de preocupações que caracterizam os
transtornos alimentares, em especial o medo de engordar e o desejo de emagrecer,
através de questões relativas ao comportamento alimentar (Williamson apud Cordás e
Neves, 1999; Oliveira, Bosi e Vieira, 2003). Este instrumento é constituído de 26 itens,
onde as respostas são classificadas conforme a ocorrência (nunca, raramente, às
vezes, freqüentemente, muito freqüentemente e sempre). A correção é feita atribuindo-
se 3 pontos para "sempre", 2 pontos para "muito freqüentemente" e 1 ponto para

434 f.ilil.i topes Miirvjues, Peime Ccrquoir.i I citc f lellor


“freqüentemente", as demais respostas tem valor zero. Há a exceção do item ne 4 onde
deve ser atribuído o valor de 3 pontos para “nunca", 2 pontos para "raramente" e 1 ponto
para “'as vezes". Resultados acima de 20 pontos indicam a propensão que a pessoa
possui a desenvolver anorexia nervosa ou bulimia nervosa.
O Body Shape Questoinnaire - BSQ (Cooper et al apud Cordás e Noves, 1999),
versão em português (Pietro, 2001), aponta a presença ou não de distúrbio de imagem
corporal, bem como o seu grau (grave, moderado e leve), atravós de questões relativas a
preocupações com a forma do corpo, sensação de estar "gordo" e autodepreciaçáo
decorrente da aparência física (Cordás e Neves, 1999; Oliveira, Bosi o Vieira, 2003). Este
instrumento ó constituído de 34 itens, onde, como no EAT-26, as respostas são assinaladas
conforme a ocorrência (nunca, raramente, às vezes, freqüentemente, muito freqüentemente
e sempre). A correção é feita atribuindo 1 ponto para "nunca", 2 pontos para "raramente", 3
pontos para "às vezes", 4 pontos para "freqüentemente", 5 pontos para “muito
freqüentemente" e 6 pontos para "sempre". Interpretando os resultados tem-se quo om
pontuações iguais ou menores que 110 pontos a pessoa possui uma preocupação com
a imagem corporal não patológica, entre 111 e 138 pontos há um leve distúrbio de imagem
corporal, entre 139 e 167 pontos há um moderado distúrbio de imagem corporal o acima
de 168 pontos a pessoa apresenta um grave distúrbio de imagem corporal.
O Inventário Fatoríal de Personalidade - IFP tem como base a teoria das
necessidades básicas proposta por Henry Murray (1938). Podendo ser aplicado em
sujeitos com idade entre 18 e 60 anos, objetiva avaliar o indivíduo normal om 15
necessidades psicológicas. São elas: Assistência, Dominância, Ordem, Denegação,
Intracepção, Dosempenho, Exibição, Heterossexualidado, Afago, Mudança, Persistência,
Agressão, Deferência, Autonomia o Afiliação. O teste apresenta 15b itens sendo que,
cada uma das necessidades dispõe de 9 itens (frases) que devem ser respondidas
conforme o grau de identificação com a situação expressa na frase, utilizado-se de uma
escala composta por 7 pontos (1 = nada característico, 2 = muito pouco característico, 3
= pouco característico, 4 = indiferente, 5 = característico, 6 = muito característico e 7 =
totalmente característico). A correção deste inventário deve ser feita através da soma
dos rosultados em cada necessidade. Em seguida, deve-se converter os escores brutos
em percentílicos, levando em consideração que há uma tabela para o sexo feminino e
outra para o masculino. A interpretação dos resultados deve ser feita de acordo com as
orientações do Manual Técnico de Aplicação (Pasquali et al., 1997).
Este estudo foi realizada nas salas de aula de uma universidade particular de
Curitiba - PR, mediante a permissão do professor, que cedia um período de sua aula
para a aplicação da pesquisa, e mediante a livre participação e autorização do aluno,
através da assinatura do um termo de consentimento.
Os casos descritos neste estudo são os casos válidos, segundo a escala de
validade do teste IFP. Casos inválidos remetem a pessoas que, ou não compreonderam
a tarefa, ou responderam sem a devida atenção, ou ainda, mostra que as pessoas
teriam mentido ao responder ao questionário.
Este mesmo teste ainda aponta outro fator muito importante que é a
desejabilidade social. Neste estudo ocorreram 16 casos onde o participante fez um
grande esforço para "se apresentar do uma maneira que os outros gostariam que ele
fosse visto" (Pasquali, 1997). Desta forma, deve-se atentar para o fato de que a pessoa
podo ter feito uso da mesma estratégia ao responder aos itens das outras necessidades
do teste. Ressalta-se que houve casos assim tanto no grupo que apresentou
comprometimento de imagem corporal e características de comportamento alimentar
inadequado quanto no grupo livre de tais aspectos.

Sobre (.'omport.imcnlo c Cognição 435


Quanto aos resultados, a Análise de Regressão, método Stepwise, indicou
dois modelos preditores do comportamento alimentar para esta amostra. No primeiro
modelo, a imagem corporal prediz o comportamento alimentar com fiP“d'oiilí"<to = o,73 e R2
= 0,53. Já no segundo modelo, a imagem corporal e a intracepção predizem o
comportamento alimentar com R2=0,59, li,=0,73 e íi^O.23. Optou-se por utilizar o
primoiro modelo devido ao coeficiente do determinação (R2 « 0,53).
A literatura traz que as pessoas que sofrem de Transtornos Alimentares, neste
caso a Anorexia Nervosa e a Bulimia Nervosa, apresentam um padrão de comportamento
muito peculiar. Entretanto, para esta população não foi possível constatar tal poculiaridade
nas pessoas que apresontam uma predisposição a tais transtornos, elas não
apresentaram nenhuma singularidade nos resultados do IFP quando comparados aos
participantes livres de tais aspectos. A população predisposta apresentou Distúrbio de
imagem corporal, condição indispensável a quem sofre de tais doenças.
Os resultados mostraram que, para esta população, o que as deixa suscetível
aos distúrbios do comportamento alimentar ó a distorção de imagem corporal. As varáveis
responsáveis por esta distorção são muitas, mas as principais seriam a história de vida
e a pressão social que clama por corpos "porfeitos", entendido como "magros". Parece
que a mídia tende a ser a variável mais influente no desenvolvimento do Distúrbio de
Imagem Corporal, mesmo que a forma como a mídia ó recebida dependa da história de
vida de cada um (Marques e Hellor, 2002).
Ê importante ressaltar também quo o padrão de interação da família da pessoa
comprometida ó muito atípico, o que faz pensar se as características da personalidade
do doente não seriam mera forma de tentar se adequar a esta família disfuncional.
A nocessidade de se pesquisar a população universitária se traduz devido à faixa etária
sor a limite para o aparecimento do primoiro episódio de anoroxia ou bulimia norvosa. Reforça
esta idéia os resultados de uma pesquisa realizada por Heller (2003), em uma universidade
particular de Curitiba, onde 51,52% das estudantes apresentaram comportamento alimentar
nào-usual com comportamento de purga, o que intensifica a necessidade das instituições do
Ensino Superior buscaram medidas de contenção de tais transtornos.
Deve-se atentar também para a importância de se identificar quais são os
maiores preditores dos Transtornos Alimentares para que se torne possível desenvolver
ações preventivas eficazes (mudando o quadro remediativo atual) para estes transtornos
que já são pensados por alguns pesquisadores como a próxima doença não
transmissível que será vista como a obesidade é hoje, um problema de saúde pública.

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Sobro C'omporf.imcnto c C'ofjnlvJo 4 3 7


Capítulo 38
A v a lia ç ão de fonles dc slrcss cm
pacientes esquizofrênicos:
percepção de familiares
Ihciniíi M ello C/omcs de Matos
Clínica C/omes de Maios

0 stross ó um tema muito discutido não só pola psicologia, mas tambóm pola
medicina, oducação e por outras ároas do saber quo se preocupam com o sor humano e
sua qualidade de vida. A palavra stress foi primoiramonto utilizada na área da saúde om
1936 por Hans Selye, médico endocrinologista, quo em um breve artigo doscrove a
"Síndromo Geral de Adaptação”. A partir daí, diversos autores passaram a estudar esto
fonômeno e criaram suas próprias definições.
O concoito de stress, atualmente, tem apresentado uma divorgôncia conceituai,
porque a palavra ó ao mesmo tempo usada referindo-se a uma condição, causa ou
estimulo desencadeante de uma reação do organismo e para doscrovor, tambóm, o seu
efeito (Jewell & Mylandor 1988). Lipp o Malagris (1995) apontam ainda para um outro
problema quanto ao uso do tormo, quo ó o fato da palavra stress ser referonto a qualquer
etapa ou grau de severidade que a reação possa ter. ou seja, diz-se quo uma pessoa está
estressada independontomente da fase em que se encontra. Assim, faz-se necessário
realçar a definição que serviu de sustentação teórica para esto trabalho, que foi a
aprosontada por Lipp o Malagris (1995) que ó a seguinte: o stross ó uma reação
psicofisiológica do organismo, conseqüente de mudanças psicológicas, que ocorrem
quando o indivíduo está frente à uma situação que o irrite, cause modo. o excite, o
confunda, ou quo o deixe, até mesmo, extremamente contonte.
Lipp (2001) divide os agontes causadoros de stress em dois grupos: as fontos
internas e as externas. O primeiro grupo ó composto por todo acontecimento que ocorra
fora do organismo da pessoa e que gere uma ruptura na homoostaso dosto indivíduo.
Estes acontecimentos independem, na maioria das vezos, das características e dos
comportamentos do indivíduo. Desta maneira, como fontes extornas de stross, enquadram-
se, por oxomplo, mudança do chefia, mudanças políticas no país, a morte do alguém,
conflitos familiaros, acidontos, dentre outros. Quanto ao grupo dos fatores internos de
stross ostão aqueles determinados polo próprio indivíduo. Elos roprosontam o modo de
sor da possoa, ou seja, tudo aquilo quo faz parto do mundo intorno, das suas cognições,
sou modo do intorpretar o mundo à sua volta, seu nível do assortividado, suas crenças,
valoros, caractorísticas pessoais, vulnerabilidades, ansiedado o sua forma de lidar com a
vida (Lipp & Malagris, 1995).
Um outro ostrossor consiste na manoira como a possoa interpreta os ovontos do
dia-a-dia. Ellis (1973) menciona que o evento, em si, não torna o indivíduo irritado ou

43B Ilicinifl Mello C/omes tk’ Maio»


tenso, tnas sim o seu pensamento sobre o acontecimento é que causa ou não dificuldades.
Alóm disto, este musmo autor onfatiza que as práticas parentais, quando inadequadas,
podem resultar em mensagens de socialização distorcidas, que se forom fortalecidas
durante a vida, formam crenças irracionais - formas inflexíveis o rígidas de pensar e
interpretar o mundo -, que podem ser causadoras, ou facilitadoras de stress. Lazarus e
Folkman (1984) compartilham desta teoria e assumem que os efoitos de um evento
dopondem de como o indivíduo avalia ou atribui significados a este acontecimento.
"Stress psicológico ó doterminado pela avaliação da possoa junto do encontro desta com
o ambiente; esta avaliação ó lapidada por fatores pessoais como: comportamentos,
vulnorabilidades, crenças, recursos o por fatoros relacionados á situação, como a naturoza
da amoaça, sua iminôncia e assim por dianto” (Lazarus & Folkman, 1984, p. 289).
Desta maneira, Everly e Rosenfeld (1981) sugerem que a grande maioria das
respostas do stress excessivo são autoproduzidas, isto ó. ocorrem devido à interpretação
que o indivíduo dá a estímulos relativamente inócuos, uma voz que o modo de roagir a
estímulos ó produto de aprondizagem.
As abordagens cognitivas ao stress dão ênfase ao papel das diferonças
individuais, na avaliação do situações, e de reações de enfrontamento na determinação
das respostas comportamentais e emocionais, às situações causadoras de stress. As
avaliações da importância do um acontecimento, a disponibilidade e eficiência das roações
de enfrontamento interagem na determinação da natureza das roações ao stress (Beck,
1984).
Quanto aos efeitos do stress, sabe-se que ele é um dos fatoros responsáveis
polo desencadeamento de diversas patologias físicas como a psoriaso, o câncer, a
hiportensão arterial dentre outras. Trabalhos sobre a influência do stress nas doenças
mentais são ainda escassos, principalmente no Brasil.
Há, na literatura internacional, alguns estudos relacionando o stress e doenças
montais, sobretudo a esquizofrenia, kotsiubinskii (2002) discorre sobre o modolo
biopsicossocial da esquizofrenia, partindo do prossuposto de que mecanismos
compensatórios, elementos adaptativos são de suma importância na origem e na
manifestação clínica da esquizofrenia. De acordo com este autor, os mecanismos
adaptativos e compensatórios mantêm um equilíbrio dinâmico e ótimo (homeostase)
entre o organismo e o ambiente através de funções de rogulaçâo. Esto modolo descrito
por Kotsiubinskii corrobora a premissa do modolo "Estresse-Diátese" que compreende a
presença de uma totalidade dinâmica: 1) a vulnerabilidade biológica, que aparece na
forma de uma predisposição genética á esquizofronia; 2) a compreensão clínica dos
detorminantes psicológicos, como uma sensibilidade especial do organismo á estímulos
estressantes, sob os quais a doença se manifesta.
De acordo com Addington, Coldham, Jones, Ko e Addington (2003) um ambiento
familiar estrossante, por oxomplo, é um fator de risco do reincidência do surtos psicóticos.
Kaplan et al. (1997) apontam que alguns estudos sugorom uma correlação entre
esquizofrenia e eventos vitais. Assim, discorrem sobre estudos com pacientes
esquizofrênico, que parecem demonstrar que os eventos estressantes, que ocorrem
imediatamente antes do surto psicótico, podem ser preceptores do aparecimento da
osquizofrenia. De acordo com o ostudo de Midtown Manhattam (apud Kaplan et al, 1997)
60% dos pacientes com esquizofrenia foram sujoitos de eventos confirmáveis, quo
afetaram diretamente a eles ou suas famílias.
Em um estudo prospectivo Malla et al (1990) examinaram a relação entro
recorrência do surtos psicóticos, em um ano, e macro e micro eventos vitais. Os resultados

Sobro Compartimento o CoflnK.lo 439


demonstraram que pacientes quo tiveram recorrência de surtos, haviam exporimuntado
antes do surto micro eventos vitais • tais como dificuldades financeiras, responsabilidades
familiares, problemas de transporto e assim por diante - e macro eventos. Estes autores
perceberam quo ao longo de todo o ano, haviam mais eventos nos momentos quo
antocodoram as crises Em outro ostudo, Malla o Norman (1991) observaram quo
pacio ntn s oaquizofiAnicos tArn rnaioroH Indicos do str«HH hshocíhcI os n micro uvnntns
vitais do quo a macro ovontos. Estes achados, soçjundo os autoros, sugorom quo paciuntos
osquizofrônicos possuem uma forma única o idiossincrática do responderem ao stress.
Na tentativa de suprir a falta de estudos acerca do stress e da esquizofrenia
no Brasil, o trabalho descrito a seguir - dissertação de mestrado (Gomes do Matos,
2005)defendlda na PUC-CampInas, sob a orientação do Ora. Marilda Lipp -, teve como
objetivo principal averiguar a possível relação entre a ocorrência de eventos
estre8santes o o desencadeamento de surtos esquizofrênicos. Além disto, buscou-se
verificar o tipo e a quantidade de estressores que ocorreram na vida do paciente nos
últimos seis meses, segundo sous familiares e seus efeitos entro homens e mulheres.
Antes do so aprosontar o ostudo. faz-se necessário nosto momento, conceituar a
osquizofrenia, do acordo com a Classificação Internacional das doenças, a Cl D-10, que
foi o pressuposto teórico utilizado no diagnóstico dos participantes deste trabalho
A osquizofrenia encontra-se, na CID-10, entre as categorias diagnosticas que
recebom os códigos de F20 a F29 Nesta classificação "os transtornos osquizofrônicos
são caracterizados, em geral, por distorções fundamentais e características do pensamento
e da porcepção e por afoto inadequado ou embotado. A consciência clara o a capacidade
intelectual estão usualmente mantidas, embora certos dóficits cognitivos possam surgir
no curso do tempo. A perturbação envolve as funções mais básicas que dão à possoa
normal um senso de individualidade, unicidade e de direção de si mesmo. Os
ponsamontos e atos mais íntimos são sentidos como conhecidos ou compartilhados por
outros e podem se desenvolver delírios explicativos, a ponto de quo forças naturais ou
sobrenaturais trabalhem do forma a influenciar os pensamentos e as açõos do indivíduo
atingido, de forma, quo são muitas vezes bizarras. O paciente podo vor a si próprio como
o pivô de tudo que acontece".
Para a coleta de dados, deste trabalho, foi feita uma entrovlsta com um familiar
próximo de pacientes esquizofrênicos que tivessem sido internados há menos de uma
semana, numa unidade psiquiátrica, de um hospital escola na cidade de Campinas. A
seleçáo destes pacientes foi feita atravós da análise de sous prontuários. Foram
excluidos aqueles pacientes que tenham tido apresentado mais de cinco surtos
psicóticos ao longo da vida; que tiveram um histórico de abuso de substâncias químicas;
quo fossem portadores do alguma deficiência orgânico cerebral, inclusive epilepsia e
retardo mental; e que tivessem um histórico de episódios de depressão maior ou
transtorno esquizoafetivo.
As ontrevistas feitas com os familiares foram roalizadas na própria enformaria
psiquiátrica. A avaliação das fontes do stress ocorreu através da aplicação da Escala de
Fontos de Stross - instrumonto criado pela pesquisadora no ostudo piloto-, o da anotação
das respostas dadas pelos participantes às perguntas do identificação e conhecimonto
sobro a osquizofrenia.
A amostra consistiu-se de 13 pacientes, 6 do sexo masculino e 7 do sexo feminino,
com idade média de 35,15 anos.
Quanto a escolaridade, 7 participantos tinham ensino fundamontal completo ou
não e 6 tinham onsino médio comploto ou não.

440 Thdnia Mello l/ome» de Maios


Em relação ao estado civil, 5 pessoas são solteiras, 5 casadas, 2 divorciadas e
uma viúva. Nenhum dos participantes mora sozinho, 3 moram com os pais e irmãos, 5
com os filhos, 4 residem com o cônjuge e os filhos e um mora com os irmãos.
Os dados coletados demonstraram que 7 dos pacientes trabalhavam e tinham
uma renda média de 407,14 reais por môs.
Dos 13 participantes, 4 não professavam nenhuma religião, 4 eram católicos e 5
evangélicos.
Os resultados obtidos através da Escala de fontes de stress, demontraram que
dos 27 itens, 19 foram assinalados pelos participantes. Os 27 itens foram divididos em
categorias para facilitar a análise dos dados. As categorias e seus itens estão descritos
a seguir:
Categoria 1: Perdas.
Questões
1. Morte do cônjuge?
2. Morte de um dos pais?
3. Morte de um irmão familiar próximo?
4. Divórcio, separação conjugal ou término de namoro?
12. Perdeu o emprego?
16. Cônjuge/ familiar perdeu o emprego?
Categoria 2: Mudanças.
Questões
13 Mudou de emprego/cargo/função?
22. Mudou de país?
23. Mudou de cidade?
24. Mudou de casa?
25. Mudou de bairro?
26. Mudou de escola?
27. Mudou de religião?
Categoria 3: Ganhos.
Questões
5. Casamento?
6. Inicio de namoro?
7. Nascimento de um filho?
8. Nascimento de um irmão?
9. Gravidez?
11. Foi admitido em um emprego novo?
15. Recebeu herança ou ganhou algum dinheiro extra?
Categoria 4: Ameaça à integridade
Questões
10. Brigas com parentes ou pessoas importantes?
14. Fez novas dívidas?
17. Ficou doente?
18. Sofreu algum acidente?
19. Sofreu algum assalto ou seqüestro?
20. Sofreu abuso Sexual?
21. Cometeu alguma infraçflo à lei?
O número de fontes de stress assinalados por cada participante por categoria
está apresentado na Tabela 1.

Sobre Comportamento c Coflniçdo 441


Tabela 1. Número de estressores por categoria e participante

Categoria 1 Categoria 2 Cat*gor1a 3 Categoria 4 Total


Pardas Mudança« O anhot Amaaça à
Integridade
P iitlu lp a n l* 1
P articipant* 2 1 0 0 1 2
P articipant* 3 1 2 1 1 5
P articipant* 4 1 0 ü 1 2
P articipant* 5 2 1 2 2 7
P articipant* 6 0 0 1 1 2
P articipant* 7 0 0 0 0 0
Participant* 8 0 0 0 3 3
P articipant* 9 0 1 1 0 2
P articipant* 10 0 3 1 2 8
P articipant* 11 0 2 0 0 2
2 1 2 2 7
P articipant* 12
P articipant* 13 0 0 1 1 2
TOTAL 7 10 9 1 5 _________ 41

Esta tabela mostra quo o número total de fontes de stress mencionadas pelos
13 participantes ó 41 e, a módia de fontes de stress por cada participante é de 3,15.
A análise dos dados coletados demonstrou que a categoria 4 - Ameaça à
Integridade - foi a mais freqüente entre homens e mulheres quanto ao número de
respondentes e na quantidade de fontes de stress, mencionadas por categoria.
A categoria 2 - Mudanças - foi a que exibiu o menor número de pacientes e
fontes de stross, sendo maior entre as mulheres do quo nos homens.
A partir destes dados foram feitas, pela autora e a orientadora dotrabalho,
análises estatísticas utilizando-se o teste do Fisher com o nível de significância do 0,05
entre todas as variáveis analisadas, que foi a relação entre:
• Número de homens e mulheres solteiros e não solteiros (p=0,59).
• Número de fontes de stress mencionadas por homens e mulheres solteiros o não
solteiro (p=1,00).
• Número de homens e mulheres com e sem religião (p=0,4432).
• Número de fontes de stress mencionados por homens e mulheres com o sem religião
(p=0,4477).
• Número do homens e mulheres que trabalham e que não trabalham (p=0,5921).
• Número de fontes de stress em homens e mulheres que trabalham e quo não
trabalham (p=0,530).
• Número de homens e mulheres com ensino fundamental e ensino médio (p=1,00).
• Número de fontes de stress entre homens e mulheres com ensino fundamontal e
ensino médio (p=0,4).
Estes resultados indicam que em nenhuma das variáveis houve significância
estatística.
O stress desencadeia diversos quadros psiquiátricos, como a depressão,
transtornos ansiosos e somatoformes, que são relatados espontaneamente pelos

442 Mello t/ome» de M.ito*


pacientes. No caso das psicoses, de um modo geral e, particularmente da esquizofrenia,
as queixas relacionadas aos eventos estressantes, que precedem o inicio da doença,
nem sempre estão presentes, na história subjetiva do paciente. Entretanto, como bem
demonstrou Shirakawa (1989), esses sintomas podem ser detectados por métodos
indiretos - exames de condutância da pele, por exemplo, indicam a presença da
ansiedade, que não se manifesta verbalmente. Isto pode ser explicado pelo fato dos
sintomas produtivos - delírios e alucinações - ganharem a predominância do quadro,
transformando-se no eixo da vida destes sujeitos e a sua preocupação quase exclusiva
(Goas, 1966). Por esta razão, esta pesquisa levou om consideração o relato dos
familiares,
No presente estudo, os eventos estressantes de vida podem estar relacionados
com o desencadeamento de surtos psicóticos esquizofrênicos. Embora nào tonha sido
quantitativamente grande o número de pacientes investigados, 13, os resultados obtidos
foram significativos. Do total da amostra, 12 pacientes apresentaram pelo menos um
evento estressante importante em suas vidas, durante os 6 meses que antecederam o
início da doença, Isto vem ao encontro com a teoria de Selye (1956), de que não importa
o tipo de estressor, mas sim a presença dele para que ocorra uma resposta não
específica.
Apenas em um dos pacientes, o de número 7, o surto não foi precedido por
nenhum fator estressante. Neste caso, o fator desencadeante foi a interrupção da
medicação antipsicótica prescrita
A média do número de eventos estressantos foi da ordem de 3,15, por paciente,
número que demonstra a importância do stress correlato ao surto esquizofrênico.
Cinco participantes apresentaram vulnerabilidade às fontes de stress - Pordas
-, enquadradas dentro da categoria 1, sendo que os participantes de número 5 e 12
tiveram duas perdas significativas em suas vidas. O divórcio apareceu em ambos os
casos. Isto está de bom acordo com a Escala de Classificação do Reajustamento Social
de Holmes (1978), onde o divórcio ocupa uma posição de segundo lugar de importância
(item 2 de uma classificação de outros 43 itens vitais).
Seis participantes tiveram fontes de stress na categoria 2 - Mudanças -
incluindo troca de moradia e emprego. Como se sabe, mudar de emprego requer
adaptação, por parte do indivíduo, que terá de aprender novas funções, conhecer novas
pessoas, adaptar-se a novos horários e locais de trabalho.
De acordo com Lipp e Rocha (1996) um estressor pode ser algo positivo, que
emocione a pessoa de um modo marcante. A categoria 3 - Ganhos - refere-se a
eventos de vida positivos. Dos treze participantes, 7 apresentaram estressores neste
item. O ganho mais freqüente, entre eles, foi o início de namoro. A vida afetiva constitui
um dos quadrantes da qualidade de vida (Lipp e Rocha, 1996). Desta forma, o início de
um relacionamento amoroso pode se tornar um evento estressante, que demande
adaptação para o ser humano.
A categoria 4 - Ameaças à Integridade -fo i a mais relatada entre os participantes,
tanto no número de pessoas, quanto na quantidade de eventos mencionados.
Entretanto, na análise estatística, não se verificou diferença significativa na freqüência
das fontes estressantes deste item. Não foi possivel, por isto, concluir-se que as
ameaças à Integridade tenham sido a fonte mais relevante deste estudo. Porém, os
resultados apontaram que 10, dos 13 participantes, experimentaram algum evento
importante de risco físico ou psicológico, antes do surto.

Sobre Comportamento c Co|?nlí«lo 4 4 3


Os dados deste estudo confirmam também, a teoria de Holmes e Rahe (1967)
que propõem que a incidência de muitos estressores pode reduzir a reserva de energia
adaptativa, proporcionando uma queda no funcionamento físico ou mental. Diante desta
queda do funcionamonto mental, o surto psicótico pode ser desencadeado.
Diversos autoros defendem a idéia de que a esquizofrenia e seus sintomas são
influenciados por eventos de vida ostrossantos (Normam & Mallo, 1993). Um dos fatores
que contribuem, segundo Harrison, Gunnell, Glazebrook, Page e Kwieclnskl (2001), para
o risco do desonvolvimento da esquizofrenia, são os indicadores de desigualdade social
no nascimento. A população que fez parte da amostra, do presente estudo, era
predominantemente de nível sócio-econômico baixo e isto se explica porque a coleta de
dados foi realizada em um hospital da rede pública. A renda média do paciente
esquizofrênico é muito baixa, lembrando-se que apenas 7 indivíduos trabalhavam. Um
dos fatores que podem explicar o fenômono é a baixa escolaridade destes pacientes.
Do fato, 4 participantes da amostra não completaram o ensino fundamental, apenas 7
alcançaram este nível escolar e 6 chegaram a cursá-lo, ombora 2 destes não o concluíram.
Finalmente, nenhum dos pacientes pesquisados tinha curso superior.
Todos os sujeitos da pesquisa residem com alguém. Este dado sugere a
dependência do paciente esquizofrênico, que necessita da presença de outras pessoas
- familiares ou conhecidos - que o auxiliem ou reassegurom.
Comparando-se homens e mulheres, não houve diferença estatisticamente
significativa, no que se refere aos dados sociodemográficas e na quantidade e intensidade do
estressores. Clinicamente, no entanto, é possivel se perceber uma tondência de uma maior
quantidade de estressores de vida, entre as pacientes do sexo feminino. Elas tiveram um total
de 25 fontes de stress, contra apenas 16 dos homens. Isto é, eles apresentaram 1,56 vezes
monos fontes de stress. As mulheres apresentaram as categorias 2 (Mudanças) e 4 (Amoaças
à intogrídade) como as mais freqüentes e os homens a categoria 4.
Os relatos das entrevistas, apresentados acima, trouxeram informações em
comum acerca do quadro de cada paciente. Sete dos 13 entrevistados verbalizaram estar
preocupados com o estado e a doença do familiar internado. Muitos choraram durante a
entrevista e fizeram perguntas acerca do que é a esquizofrenia, se tem cura e se o pacientes
iria ficar bem. De uma forma geral, pode-se dizer que grande parte destes familiares
entrevistados eram os "cuidadores" do paciente internado. Nove dos 13 entrevistados
residiam com o paciente. Talvez isto explique o fato de 6 dos 13 pacientes temerem ou
sentirern-se culpados, em algum aspecto, pela manifestação da doença. Os sintomas
mais freqüentes destes pacientes, segundo o relato destes familiares, eram as
alucinações auditivas atribuídas aos vizinhos - vozes que proferiam calúnias, referências
sobre a moral e a conduta de vida dos pacientes a tristeza, caracterizada por choro e
isolamento, medo de que algo ruim ou alguém pudesse ferir ou matar o próprio paciente
e sua família; comportamentos agressivos e violentos com pessoas estranhas, amigos
ou familiares; e comportamentos auto-lesivos que podem prejudicar ou comprometer a
saúde física do próprio paciente. Devido a este último sintoma, 8 dos 13 pacientes
estavam contidos no leito, no dia quo a entrevista foi realizada. Outro aspecto mencionado,
por três dos entrevistados, é o delírio da punição divina. Tanto eles, quanto seus familiares,
acreditavam que o surto pudesse ser o resultado de um castigo de Deus.
A etiologia da esquizofrenia e a origem de um surto psicótico é assunto de
muita discussão na literatura especializada. Considera-se, hoje, que haja uma
vulnerabilidade familiar herdada, para a doença esquizofrênica. Entretanto, não se sabe
quais são os genes envolvidos neste processo. Admite-se, através da observação clínica,
relatada em diversos estudos, que o ambiente social e familiar influencia e interage
com esta vulnerabilidade biológica (Cannon, McKenzie & Sims, 2003).

444 Th.iniii Mello t/omr* «Ir M.itos


Os dados apresentados neste estudo demonstram que os eventos externos
podem influenciar e, possivelmente, desencadear um surto psicótico. Entretanto, mais
pesquisas, neste sentido, precisam ser realizadas para que estes dados se confirmem.
Para isto, recomenda-se que se estude um número maior de pacientes esquizofrênicos
internados em clinicas ou hospitais psiquiátricos.
Assim, concluimos com este estudo que a influência do ambiente e dos eventos
estressantes de vida, no desencadeamento de doenças mentais, especialmente a
esquizofrenia, ó controversa e incerta na literatura.
Embora os resultados trazidos por esto estudo não tenham sido
estatisticamento significativos, pode-se perceber, na amostra estudada, que eventos
estressantes de vida precederam a maioria dos surtos psicóticos esquizofrênicos.
Os dados indicam que a quebra da homeostase do indivíduo independe do tipo
do estressor a que se está exposto. Basta que haja a presença deste para que ela
ocorra. Esta ruptura, no equilíbrio interno das pessoas, ocorreu da mesma forma entre
homens e mulheres, nesta amostra.
A analise das verbalizações das pessoas, que participaram das entrevistas, mostrou
que a esquizofrenia é uma patologia que causa sofrimento para seus portadores e familiares.
Estes últimos sofrem por não compreenderem a causa e as conseqüências da doença.
O presente estudo demonstra que mais pesquisas, nesta área, com maior
número de pessoas, deveriam ser desenvolvidas, para que possa haver uma melhor
compreonsão dos efeitos de eventos estressores na esquizofrenia e para que se possa
pensar em programas preventivos.

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446 Ihunlt» Mello t/omc* de Mnlo*


Capítulo 39
Teoria do Conhecimento: Epistemologia
e Behaviorismo Radical1
Tiago Alfredo da Silva Ferreira
Faculdades Jorge Amado

“O Behaviorismo nâo ô a ciência do comportamento humano, mas, $im, a filosofia


dessa ciência. Algumas das questões que ele propõe sâo: ó possível tal ciência?
Pode ela explicar cada aspecto do comportamento humano... ?" (Skinner, 1974/1999 7)

Tornar visível um problema epistemológico na obra de um autor é mais do que


discutir o que significa “conhecimento" em seus textos fundamentais ou do que fazer
um levantamento arqueológico de tal conceito em uma análise longitudinal. Não faria
sentido explicar o conhecimento no texto skinneriano sem proporcionar o embato do tal
explicação com as questões atuais da Teoria do Conhecimento ou mesmo sem situar
a solução do autor em meio a outras respostas correntes.
Este estudo ó composto de duas seções fundamentais: a primeira delas ó uma
introdução ao tema epistemológico, bem como uma organização do objetivo deste
estudo e da delimitação do corpus do trabalho. A segunda seção, intitulada "o conhecer",
se propõe a fornecer argumentos para a epistemologia do behaviorismo radical.

Epistemologia
Pensar Epistemologia implica em questionar, dado o conceito de conhecimento
como “uma crença verdadeira justificada" (DAVIDSON, 1991), se é possível conhecer e,
se adotamos uma resposta positiva, quais os fundamentos que justificam essa crença.
A investigação de aspectos do horizonte epistemológico atual, portanto, não ó um esforço
necessariamente histórico, pelo menos não no sentido mais geral da história. É cumprir
tarefas obrigatórias ao epistemólogo fundadas no debate atual, mesmo que este, por
vezes, necessite de um interlocutor que escreveu no sóculo passado.
Como afirma Williams (2001), dentre as tarefas obrigatórias ao epistemólogo
quando discute, em qualquer perspectiva, a natureza do conhecimento - tem-se como
a principal delas o confronto necessário com o cepticismo:
“O cepticismo tem sido o problema epistemológico dominante na idade moderna
nâo porque "refutar o céptico" seja sempre o objectivo da reflexào epistomolôgica
mas porque eliminar a argumentação céptica ó quase invariavelmente uma das
suas tarefas fundamentais“ (Williams, 2001:3)
Tem-se, portanto, o Cético como principal interlocutor que a investigação atual
construirá para o texto skinneriano. Pelo título de cético entende-se uma postura que
apresenta bons motivos para duvidar da possibilidade de existir algo que transcenda as
1Ayrurittcliminloti h Hnlori Co)X)(X) t>Tingo (lo Mmmpalox (ximoiitArio» crlllnoii ao loxio

Sobro l omport.imcnfo c CoflnlçJo 447


crenças e possa ser denominado conhecimento. Não obstante a diversidade do ceticisrnos,
trataremos do que pode ser chamado de ceticismo global ou, em outras palavras, da
dúvida e da apresentação de argumentos que impossibilitem a existência de conhecimento
om qualquer ordem, seja o conhecimento de si mesmo, do outro ou da naturoza.2
Essa nâo ó uma tarefa simples. Entonder a naturoza do conhecimonto em Skinnor é
entondor um tipo ospocial de Behaviorismo, chamado Behaviorismo Radical, quo foi fundado
por este autor em uma tradição naturalista de aproximação da Teoria do Conhocimento com
0 método das ciências naturais. Firmou-se, certamente, como um esforço do "devolver" o
homem à natureza e, para além do óbvio, de mostrar como o conhecimento, assim como as
demais faculdades da mente, são parte integrante do quo o homem faz.
Explicar o Behaviorismo Radical é, também, separá-lo das demais formas de
Behaviorismo - como o Bohaviorismo Intencional/cognitivo - mas principalmente separá-
lo do Behaviorismo Clássico Watsoniano. Essa tambóm não ó uma tarefa simples por
que a difusão da teoria do conhocimento watsoniana tem uma prognância no mundo
intelectual que parece englobar o Behaviorismo Radical. Autores como Abib (2001a) se
esforçam por domonstrar os maloficios derivados da identificação de uma unidade no
pensamento de autores distintos (como Skinner, Watson, Hull, Tolman) que são
agrupados sobre um determinado ismo (nesse caso, o Behaviorismo).
A crítica epistemológica ao Behaviorismo, corno a realizada por Hacker (1993)
no texto sobro "Behaviour and Behaviourism", comumente entende quo o cetismo
watsoniano sobre o conhocimento da própria mente ó um princípio válido para qualquer
modalidade do Behaviorismo. Se Watson afirma que:
"Muy pronto se descubrirá que la autoobservación, además de no ser la manera
más fácil y natural de estudiar psicologia, resulta simplemente imposible. (...) cuando
empezamos a estudiar lo que hace nuestro vecino, advertimos que rápidamente
adquirimos experiencia para clasificar su conducta" (WATSON, 1945:34)
Então Hacker (1993) pode afirmar que o Behaviorismo ó um ceticismo acerca
da própria monte e quo sua metafísica materialista sustenta um objetivismo
©pistomológico em relação ao conhecimento do mundo. Afinal:
"Refinement and sophistication were added to this theory of human conduct by Hull
and Skinner, but lhe splrlt of behaviourism remained essentially the same"
(HACKER, 1993:99).
Mas este pode não ser o caso, e este texto dofende que não é. Conquanto não
seja destinado, aqui, espaço suficiente para uma revisão das críticas a leitura do
Behaviorismo Radical como Metafísica materialista (ABIB, 1982), como objetivismo
epistemológico (ABIB, 2001b; DITTRICH, 2004) e como uma continuidade em relação
ao toxto watsoniano (ABIB, 2005), sorá recorrente o uso do termo Behaviorismo referindo-
se ao behaviorismo radical o, portanto, o objeto de análise será o texto skinneriano.
O objetivo deste ostudo ó, portanto, um trabalho analítico pontual: o de explicar
aspectos fundamentais da Teoria do Conhecimento em Skinner. Para toda empreitada,
diria um engenheiro, é necessário que se faça um levantamento de qual o material
necessário (blocos, cimento, ferramentas) e de qual o procedimento mais adequado
para a construção de um edifício. Parece quo o esforço de um epistemólogo pode ser
ontondido de forma análoga: levantamos o material (textos do autor, comentadores, outros
textos que demonstrem a tradição epistemológica) e a maneira que iremos nos utilizar
desse material. Tais elementos compõem o método epistemológico a ser utilizado.

1 Pnm H[Kofu[i(lHiiwiMk> no toma do oeUdutio, ver SILVA FILHO (2005)

448 íiuflo Alírcilo (l.i Silvd Fcrrcini


Quanto a delimitação do corpus do trabalho para a consecução do objetivo
deste texto, temos uma proposta: a utilização de um único capítulo de um único livro
escrito por Skinner na década de 70 como objeto direto de análise. Esta circunscrição
possui, ao menos, duas justificativas razoáveis: a primeira diz respeito ao espaço
destinado a este texto. O espaço de um artigo não permite o levantamento de toda a
concepção skinneriana a respeito do conhecimento e nem da sua expressão mais
destacada, que é o conhecimento lógico e cientifico. Seria desleal, no espaço de um
artigo, tentar uma síntese do que o autor considera a respeito da natureza, da
possibilidade e das implicações do conhecimento.J
A segunda justificativa diz respeito diretamente à extensão da obra skinneriana.
Skinner escreveu seu primeiro livro om 19384, e finalizou sua produção académica em
1990. Ao longo desses anos obteve mais de cem publicações, o que tornou a sua obra
um rico e extenso, veio de idéias. A conseqüência mais direta de uma obra dessa
magnitude é a divergência entre idéias apresentadas pelo autor em obras distintas. Não
é simples encontrar na crítica séria a Skinner um bom número de artigos que denunciem
estas divergências, no entanto, o próprio Skinner em um texto chamado "Um novo prefácio
para Beyond Freedom and Dignity" (SKINNER, 1989/1995) atesta a existência das
divergências. Outras discrepâncias podem ser encontradas principalmente em uma
análise longitudinal do argumento do autor sobro a tooria da cultura.
Conseguinte, não estaremos falando sobre a concepção skinneriana sobre o
Conhecimento, mas sobre as idéias presentes em um capítulo específico de um livro
específico deste autor. Faz-se desnecessário dizer que as idéias presentes neste texto
devem ser bastante representativas de uma concepção Behaviorista Radical sobre o
Conhecimento, do contrário seria apenas um palavrório infértil, o o leitor poderia gastar
seu tempo lendo algo mais produtivo.1
O livro Sobre o Behaviorismo (SKINNER, 1974/1996) apresenta algumas
idiossincrasias que podem ser uma justificação razoável para sua escolha como objeto
de análise.
A sua proposta explícita é de que seja um livro escrito para leigos no
Behaviorismo, e mais, que seja um livro escrito a partir de críticas. Skinner (idem) inicia
o livro listando vinte críticas comumente feitas ao Behaviorismo e afirma, de antemão:
"creio que são todas falsas" (SKINNER, 1974/1996:7). Em suma, é um texto que reúne
diversas tradições intelectuais sobro os mais diferentes temas sobre o comportamento
humano e, dentre estes temas, podemos encontrar o conhecimento como objeto
submetido a cuidadosa análise.
Em segundo lugar, este é, possivolmente, o livro em que o autor mais explicitamente
se propõe a discutir questões epistemológicas como verdade, conhecimento subjetivo,
consciência do mundo, dentre outros. Estamos, então, em terreno familiar quando o
dispomos para tratar de um tema diretamente vinculado a Epistemologia.
A parte do livro que será submetida a análise neste texto será o nono capítulo,
intitulado “O Conhecer" - cujo título dispensa maiores justificações. A estrutura de
composição desse capítulo funciona como uma miniatura de um tratado: o autor se
empenha em descrever, de forma condensada, com que tradições filosóficas está
dialogando, e a partir dessas descrições desenvolve sua tese.
' Um estudo malit amplo sobre a epl»temnlogla «kjnnwlanrui mIA «ando (k»*envo(vtdo ou pmqutta d« maitrado do autor, asor dofendk)« para
o programa da mettrado em Erwlno. HMAria • FHowifia dai ciéndaa da Unlv*r*tdad* Fadaral <la Bahia
4Moamo ante» do Hvfo "O Comportamento do* OrganUmoe", o autor |à eacrevara artigo» vinculado» a At*áH»n E«portriientul do
CornpurtMmirtfu
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Sobre Comportamento e Cognição 4 4 9


O Conhecer
Há uma grande probabilidade de frustração na leitura de um texto skinneriano
a procura da definição de um conceito. Seguindo uma tradição analítico-filosófica, o
autor normalmente inicia sua análise de um conceito mostrando os usos possíveis de
tal palavra. Qualquer conceito 6, em última instância, uma palavra:
“Uma palavra que é usada tanto nos moios académicos quanto leigos e que possu/
um certo critério de uso em cada comunidade verbal especifica" (FERREIRA, 2004).
Não ó diferente com o Conhecimento. Um cachorro sabe como morder, um rato
sabe pressionar uma barra, uma criança sabe chorar, em um sentido muito mais trivial do
que o utilizado em reflexões epistemológicas sobre o conhecimento. A questão é que a
prova de que alguóm possui um conhecimento específico (morder, pressionar ou chorar)
ó a execução do comportamento especificado, "dizemos que possuem conhecimento e a
prova disso ó que possuem comportamento” (SKINNER, 1974/1996:119).
Inicialmente, para entender como alguóm possui conhecimento, é necessário
questionar o que significa possuir comportamento. Ao afirmar que um sujeito possui o
comportamento de choro, é comum afirmar que tendemos a procurar onde está esse
comportamento, afinal, se possuo um alfinete é porque o tenho em algum lugar e,
provavelmente, posso utilizar-me dele quando necessário. Com o comportamento parece
não acontecer o mesmo e a frase de Skinner "o comportamento só existe enquanto está
sendo executado" (idem) merece algumas explicações.
O sujeito possui um repertório em sentido disposiclonal, de forma análoga a
discutida por Ryle (1949) - De forma análoga, mas não de igual forma. Abib e Lopes
(2003) realizaram um estudo sobre as semelhanças entro as explicações desses dois
autores e demonstraram as possibilidades e os limites de tal analogia. Em Skinner, o
organismo é modificado a partir de sua relação com o mundo:
"Os homens agem sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez, sõo modificados
pelas consequências de sua ação" (SKINNER, 1957/1978:7)
É essa relação de reciprocidade (a contingência) que determina o comportamento
do sujeito. Tal assertiva ganha um significado mais forte quando partimos do princípio
quo, em Skinner, Pensamento é comportamento (FERREIRA, 2004), Sentimento é também
um fenômeno comportamental (ABIB, 1982; SKINNER, 1989/1995) e, conseqüentemente,
a mente é um produto direto da contingência (ABIB, 2001a; 2003).
Defende-se, portanto, que as intenções, os desejos e os pensamentos são
produtos da contingência. A mente não existe como substância, mas como relação direta
do sujeito-que-se-comporta ithe Behavei) com o mundo. É nesta rolação que subsiste a
construção da explicação sobre como a mente conhece e sobre o que ela conhece.
Dito isso, estamos frente a uma mente esvaziada de conteúdo que não seja a ação
do próprio sujeito. Conhecer é agir e conhecimento é ação. O conhecimento do mundo, da
própria monto e da mente dos outros está limitada e construída pela contingência. Não ó
possível então desvelar o real, nem contemplar a natureza, antes construímos o real e agimos
sobre a natureza (ABIB, 2001b) - o realismo watsoniano, então, nem é posto em discussão:
não há nada para des-cobrir através da experimentação por que não há nada coberto.
Não são estas as assertivas tradicionalmente atribuídas ao Behaviorismo radical.
Comumente, associa-se em Skinner um princípio de coerência metafísica entre ontologia
e epistemologia que pode ser assim sumarizada: uma interpretação behaviorista é
ontologicamente realista e epistemologicamente objetivista - a realidade está lá e podemos

450 í i.iho Alfredo da Silva Ferreira


conhece-la. Novamente ancorados em uma continuidade com o texto watsoniano, seria
possível afirmar que conhecemos o mundo, mas 6 impossivel conhecer a própria mente'.
Conhecimento como contemplação é desvelar a realidade, ó tocar o real através
dos sentidos ou da razão. Se, em acordo com o cético cartesiano, não conhecemos
com os sentidos, ao menos podemos desvelar com a razão a realidade, mesmo que
seja apenas a realidade da própria mente. No entanto, a razão em Skinner ó uma
análise de contingências, uma formulação de regras (1974/1996). Uma crença razoável
(dotada de razão) ó uma crença baseada na formulação descritiva de regras sobre uma
dada contingência. Portanto, se o conhecimento ó definido pela crença justificada: ó
comportamento a crença e também o ó a justificação razoável de crenças.
O Eu (self) cognoscente que, reflexivo, conhoce a própria mente é apenas um
sistema organizado de respostas em relação ao repertório mental (SKINNER, 1974/1996).
Não há a possibilidade de fugir de si mesmo, olhar para trás e ter um acesso privilegiado a
mente como ela é. Conhecimento ó ação, ó poder (1974/1996) sujeito as mesmas
contingências que os sentidos. Se os sentidos foram excluídos como fundamentos do
conhecimento, então se segue o mesmo mecanismo para excluir a razão ou a mente.
Estamos, então, em coro com o cético global que afirma “não conhecemos"?
De maneira alguma, o aparente subjetivismo epistemológico em Skinner não sobrevive
a expressões como "há certos estados objetivos do conhecimento" e, menos ainda, a
algumas proposições prescritivas acerca da ciência (DITTR1CH, 2002): "A ossôncia de
um conhecimento cientifico é prever o controlar" (SKINNER, 1953).
A critica ao fundacionalismo epistemológico não é uma relação direta com o
relativismo (SILVA FILHO, 2003), mas uma porta aberta para responder ao cético.
Grosso modo, conhecemos quando agimos eficazmente em situações especificas
ou quando construímos regras para a ação. Conhecemos matemática se podemos resolver
eficazmente problemas matemáticos; conhecemos alguém quando agimos
diferoncialmente em sua presença. Um aluno pode, por exemplo, dizer que para ser bem
sucedido em uma disciplina oscolar, importa prioritariamente conhecer o professor que o
conteúdo da disciplina. Dai segue-se que responder eficazmente a questões acerca do
conteúdo é menos importante que saber o que o professor quer 1er na prova.
Estes exemplos têm algo em comum:
"Todas estas formas de conhecer dependem de uma exposição prévia a
contingências de reforço, mas afirma-se também que possuímos um tipo especial
de conhecimento se pudermos simplesmente formular instruções, orientações,
regras ou leis" (SKINNER, 1974/1996:120).
Poder-se-ia afirmar que, então, existem formas distintas de conhecer. No entanto,
por mais que o autor afirme que "nenhuma das formas (do conhecer) implica a outra"
(idem), os dois processos dizem respeito à mesma realidade. As regras são aprendidas
através das contingências e o seguir regras também é um repertório aprendido na
relação do sujeito com o mundo.
A critica skinneriana ao mentalismo se consolida quando corriqueiramente
transformamos adjetivos e verbos em substantivos: Afirmamos que João fez uma
pergunta inteligente; seguido podemos afirmar que João é inteligente; que João possui
inteligência e, finalmente, que João fez aquela pergunta por causa da sua inteligência.
A inteligência é a causadora da pergunta inteligente de João, assim como o conhecimento

' O que lovarla írlptochK) & TripKxhio (2004) a «flrmurqua ■ FKoaofla da mente behaviorttta é expressa na propoelçAo: "Te conheço". Que
oAo detxa de mmMTMxJmnUtdoru

Sobrr Comportamento c CoflniçAo 451


seria o responsável por uma ação efetiva no mundo. Em Skinner, Conhecer ó comportar-
se, seguindo regras ou não. Conseqüentemente, o comportamento não é a expressão
de um conhecimento, mas o próprio ato de conhecer:
"Nós nâo agimos pondo em uso o conhecimento; nosso conhecimento é açôo, ou
polo menos regras para a açâo. Enquanto tal, è poder, como assinalou Francis
B aco n ao re je ita r a eacoláatlca o nua ê n fa se no nabar p e lo s a b e r" (S K IN N E R ,
1974/1996 121)
Outra consequência dessa definição deve ser destacada. Se a contingência é a
relação sujeito-mundo, então o empirismo estaria correto na afirmação de que o
conhecimento provém da experiência? Explicitamente criticando Locke, o behaviorista
radical não pode aceitar que o contato com o mundo gero conhecimento. Afirmar que
este contato produz conhecimento do mundo não explica por que uma pessoa aprende
com o mundo, ou por que determinadas experiências produzem uma dada ação do
sujeito e outras não. Em resumo, A "experiência" de que o conhecimento deriva consiste
nas contingências completas e a explicação da contingência não está no mero contato
com o mundo, mas em certas estruturas de relação das quais o analista do
comportamento é estudioso.
Ató agora, operamos com conceitos vulgares de conhecimento. O epistemólogo
poderia afirmar, então, que não é desse uso corriqueiro do tormo conhecimento que a
epistemologia trata. No entanto, em Skinner, tais conceitos vulgares são os alicerces
para o entendimento da possibilidade do Conhecimento verdadeiro e justificado que
pormeia a Epistemologia. Em última análise, os diversos tipos de conhecimento, seja
o conhecimento de um cachorro ao latir, o conhecimento de um pescador ao afirmar
"existem peixes no lago” ou o conhecimento de um filósofo ao afirmar "não conhecemos"
são frutos da sua relação com o mundo natural. Ató mesmo a diferença entre o físico e
o social se perde no esforço de devolver o homem a natureza, mas não se perde que
cada um desses casos apresenta especificidades e complexidades diferentes: operam
na mesma realidade, mas de diversos modos. São frutos de contingências, mas de
diferentes tipos de contingências.
São as diferentes qualidades de contingências que operam no indivíduo que
possibilitam que o conhecimento mundano seja diferente do conhecimonto cientifico e,
sobretudo, que a diferença não constitua um valor moral: o conhecimento mundano não
ó melhor que o conhecimento cientifico, ambos fazem parte do escopo do humano, do
natural. Mas o cótico náo poderia deixar de incomodar; "então nào existe conhecimonto
enquanto uma crença verdadeira justificada, só existe a ação do sujeito, fruto de suas
relações pessoais com o mundo - a objetividade se perde". Há a sombra de um
subjetivismo opistemológico em Skinner.
A resposta skinneriana é topograficamente simples, mas excede o quo um
argumento simples pode conter. A ciência não pode escapar do humano ou mesmo
propor algo que nào parta da ação humana. É certo que "Só uma pessoa viva conhece
a Ciência no sentido de agir sobre seu controle em relação a natureza" (SKINNER,
1974/1996: 125), mas a objetividade não depende do ideal platônico“, depende sim da
natureza do que ó essencialmente humano: da linguagem. Segue-se o aparentemente
misterioso trecho skinneriano:
"O conhecimento é subjetivo no sentido trivial de ser o comportamento de um
sujeito, mas o ambiente, presente ou passado, que determina o comportamento,
está fora desse sujeito" (SKINNER, 1974/1996:125).

• Fmlxjfn »<>MMMxtinlhe rnuitn ho Iduol prtjpotitej pof DtirVhetni (2003)

45« (latfo Alfredo il.i Silv.i f erreira


Este trecho apresenta alguma necessidade de reflexão demorada. Sua leitura
descontextualizada informa ao leitor que a resposta behaviorista á sombra subjetivista
ò um apelo a realidade. Em outros termos, subjetividade é trivial porque a estimulação
está lá (no mundo real) o causa o que os sujeitos conhecem, Isso é realismo metafísico,
e é indefensável no texto skinnoriano (ABIB, 2001a). São trechos como este que deixam
clara a dupla rosponsabilidado de um epistemólogo: saber sobre a teoria cientifica que
questiona o sabor sobro o debate epistemológico (ABIB, 1996). Não ó viável uma leitura
ofetiva deste capitulo sem que estes dois fundamentos estejam lançados.
Skinner, neste momento, está em um diálogo claro com a epistemologia
contemporânea e suas questões com o Psicologismo. Não são questionamentos tão
recentes, mas autores Importantes para a epistemologia como Popper e Davidson se
posicionaram firmemente nesta questão. Skinner (1974/1996) segue uma posição
semelhante ao argumonto Davidsoniano:
“aunque la sensación desempefla un papel crucial en el proceso causal que
conecta las creenclas cort el mundo, es un error pensar que desompefia un papel
«pistemológico en la determinaclôn de los conlenidos de dlchas creenclas''
(DAVIDSON, 1992:62)
Preocupar-se com um objetivismo epistemológico a partir da porcepçáo do
sujeito é preocupar-se com o representacionismo. Em Skinnor, como om Davidson,
não há nada para ser representado e é trivial afirmar que qualquer conhecimento ó
produzido a partir do sujeito, do natural. Não ó trivial para a Psicologia, mas Skinnor não
está fazendo Psicologia nessa discussão, está se propondo a uma reflexão
epistemológica e, por essa razão, pode se dar ao contra-intuitivo argumento de rologar
a percepção a outra discussão.
O "ambiento, presente ou passado, que determina o comportamento" (SKINNER,
1974/1996:125) se refere as condições de significação de urna crença sobre algo e não
a um mundo real que justifica empiricamente nossas crenças. No parágrafo seguinte,
Skinner esclarece a natureza do "ambiente" a que se refere:
“Mas se ao analisar o mundo em seu redor, e se, em resultado dessa análise,
estabelecer fatos ou leis que tornem possível a outras pessoas responderem
efetivamente sem terem sido pessoalmente expostas a esse mundo, então o
cientista produz algo em que ole própno nâo está mais envolvido. Quando muitos
outros cientistas chegam aos mesmos fatos ou leis, qualquer contribuição ou
participação pessoal se reduz ao mínimo" (SKINNER, 1974/1996:125)
Não há subjotivismo epistomológico em Skinnor. Epistemologia e Psicologia
dialogam, mas uma nâo se reduz a outra. Há o diálogo, mas não há a redução. A natureza
do comportamento verbal em Skinnor não permito uma intorprotação ropresontacionista
do conhecimento e, conseqüentemente, não permite um subjotivismo fundado om uma
tooria da percepção. As condições de significação da comunidade verbal selecionam" o
conhocimonto o este conhecimento selecionado não podo ser chamado subjetivo, porque
a seleção não ó do indivíduo, e sim das contingências sociais.
A objetividade parte da comunicação. Um filósofo ou cientista isolado om um claustro
ou om um Dopartamonto, ou mesmo em sua própria teoria, não produz conhecimento - o
conhocimonto ó comunicativo, é ação e, como tal, depende da rotroalimontação característica
da contingência. Não é curioso que uma argumentação tão pontual da tooria skinneriana se
rosolva na primoira fraso de um livro escrito em 1957?

• O UmiK) “imlocKHmr" rijoí «wtik mtrxlo uwKtooin mhi Mtntkto *cntoo NAoconio um« m*ivAc> |>nrn um «mpfttgo, pof exempla <ji#>é Intmidorml
d HiKUtmHÜ/rtdii, rim* iniui MitoçAo (xtatt mfuri^KtuH» (V>unM (M a oomunklndo vnrtiwl <tmmm rol»»çAocxxii u miHih* m i (ixftrdck)

Sobre Comportiimcnlo c 1'ofjnlVilo 453


"Os homens agem sobre o mundo, modificam-no e, por sua vez são modificados
petas conseqüências de sua açào" (SKiNNER, 19ò7/1978:1b).
Aceitos os argumentos precedentes, podo-so afirmar que a teoria do
conhecimento em Skinner é uma teoria comunicativa do conhecimonto. A dúvida cética
sugue-se a resposta: existe conhecimento, embora nâo como uma catogoria imutável,
absoluta, mas cortamonto minimizando os problemas da subjetividade a partir da
comunicação. O diálogo permito que os fatos intra'montai8 so tornem inter-mentais e
possam ser bons reguladores de ação para a comunidade que se coloca sob sua égide.
A teoria do conhecimento em Skinner, entâo, parece bastante adoquada ás
necessidados contemporâneas: sào desprezados os modelos absolutistas do
conhecimento e também os modelos relativistas do conhocimento. A critica skinnoriana
indica que nossa ostrutura social nào comporta o absolutismo de certa classe dotontora
do conhecimento e muito menos aqueles que não incorporam a critica social
oscondondo-se com a justificativa de que não há razão em crença alguma. Uma tooria
comunicativa do conhocimento é critica sem ser absolutista e é plural sem ser permissiva.
Este é um argumento inicial para a epistomologia do bohaviorismo radical em
iue so demonstra que Skinnor não é apenas um pensador da filosofia das ciôncias ou
psicologia, mas travou diálogo também com outras disciplinas clássicas, destacando-
so, entro elas, a Epistemologia. Obviamente a contribuição dosto artigo é
predominantomonte provocadora de mais pesquisas sobre o tema e não conclusiva
sobre o texto skínnoríano. Existe muito a ser pesquisado e o bohaviorismo radical ainda
tem muito a oforocor ao debate epistemológico atual.

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454 I itiHo Allrcilo ilti Sllv.i I orrclr.i


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Sobro I'omport.imcnto e 455


Capítulo 40
Novas Diretrizes Curriculares,
Metacontingências e
O Plano Keller
João C láudio rodorov1111"
Ricardo Corrêa M artone"1151
M árcio Moraes Moreiram,íl

Os desafios colocados pelas novas diretrizes curriculares para o curso de


psicologia estabelecem novas oportunidades para mudanças de práticas educacionais,
mudanças essas descritas na sua maioria em termos comportarrientais. Tais mudanças
envolvem, entre outras coisas, definições relativamonte claras do repertórios
comportamentais do aluno que devem estar estabelecidos ao final do curso. A ênfase
da prática didática, então, passa do saber declarativo (saber sobro) para o saber
operacional (sabor como).
O arranjo de contingências inserido no contoxto educacional que leva á produção
do saber sobro não leva, necessariamente, à produção do saber como. Este fato nos
remete á seguinte questão: que contingências devem ser dispostas no contexto
educacional para produzir mais sistematicamente o saber como e otimizar a produção
do saber sobro? Nossa experiência o o relato de cologas têm mostrado que estabelecer
tais contingências, ou mesmo descrevê-las, não é tarofa fácil.
A Análise do Comportamento tem estudado esto tipo de fenômeno, que envolve
o ontrolaçamento de várias contingências, sob o nome de motacontingência. A
transformação da prática didática envolverá, certamonte, a mudança do comportamento
de professores, alunos o dirigentes universitários. Este texto tem como objetivo sinalizar
a relação do concoito de motacontingência com a implementação das novas diretrizes
curriculares e apresentar ser o Sistema Personalizado de Ensino como uma ferramenta
útil para a formação do porfil do aluno explicitado pelas Novas Dirotrizos Curriculares
para os cursos de Psicologia.

As novas diretrizes curriculares para os cursos de Psicologia


A Resolução n° 8, de 7 de maio do 2004 do Conselho Nacional do Educação
(2004) instituiu as Novas Diretrizes Curricularas (NDC) para os cursos do Psicologia. O
Art 2o deste documonto estabelece quo:

Irmtilulo <1* Educação Swpwrtof (tu Brasília (IESB)


"VnlvtinldMdtt CulàHc* rfti Galát
"'IJnlvorwcImk! do UtmhIIIm

456 loilo Cl.iudlo foilorov KJciinlo (.‘orriSi M.irtoDr M.inio Horgr.« Moiwr.i
"As Diretrizes Curriculares para os cursos de graduação em Psicologia constituem
as orientações sobre princípios, fundamentos, condições de oferecimento e
procedimentos para o planejamento, a implementação e a avaliação deste curso"
(PP- 205).
As NDC constituem, portanto, orientações gerais que visam garantir uma formação
mais homogenia para os alunos do Psicologia do pais. A formação do aluno deixa do estar
basoada om um currículo mínimo e passa a ser orientada por habilidades e competências
que devem estar presentes em seu repertório comportamental ao final do curso.
Todos os cursos de Psicologia do pais devem se adequar a estas novas diretrizes.
Tal adequação envolve profundas mudanças relativas aos comportamentos de
administradores, coordenadores, diretores, professores e alunos.
Para o analista do comportamento que participa deste processo de mudança,
seja como professor seja como administrador de um curso de Psicologia, o momento
mostra-se interessante para a compreensão de comportamentos de indivíduos quando
estes se comportam em grupo. É um momento interessante para a análise do surgimonto
e manutenção de metacontingôncias.

Contingências entrelaçadas e metacontingôncias como unidades de


análise
Os fenômenos decorrentes da inter-relação entre os comportamentos do muitos
indivíduos, já há algum tempo, figuram entre os temas estudados pela análiso do
comportamento. Na verdade, desde o instante em que Skinner (1981) estabeloceu
claramente as características de seu modelo causal de seleção pelas conseqüências,
colocou-nos o árduo e gigantesco desafio de observar, identificar e descrever
características do comportamento e do ambiente que váo além do nível de análise do
comportamento individual. Para que possamos compreender as múltiplas e complexas
relações existentes entre o comportamento e o ambiente, além das ferramentas
conceituais disponíveis para a análise do comportamento individual, necessitamos de
extensões importantes desse arcabouço conceituai. Isto náo quer dizer, de forma alguma,
que o recurso ao conceito de contingência tríplice não seja possível, mas sim heurístico,
se considerarmos polo menos duas contingências ao lidarmos com o comportamento
social (Andery, Micheletto & Sério, 2005).
Quando observamos a definição de comportamento social dada por Skinner
(1953): "o comportamento de duas ou mais pessoas, uma em relação á outra ou, em
conjunto, em relação a um ambiente comum" (p.297), estamos diante de contingências
entrelaçadas (Andery, Micheletto & Sério, 2005; Glenn, 1988,1991, Glenn & Malott, 2004;
Skinner, 1953), Na Figura 1, podemos observar o entrelaçamento de duas contingências
em um episódio de cooperação.

Indivíduo 1 Sd - R —►Srl

Indivíduo 2 - R — * S1^

Sobro lomportumcnio c Cognítfo 457


Uma primeira ca ra cte rístic a que cham a nossa atenção no episódio de
cooperação representado na Figura 01 é a reciprocidade entre os comportamentos dos
dois indivíduos. O estimulo reforçador 2 para o Indivíduo 2 somente foi possivel com a
resposta emitida pelo Indivíduo 02, com a participação da resposta emitida pelo Indivíduo
1. O mesmo raciocínio aplica-se para a produção do estimulo reforçador do Indivíduo 1.
Imaginemos, por exemplo, que os dois indivíduos envolvidos na Figura 01 são dois
estudantes universitários de Psicologia. Um deles ó um excelente aluno em
Psicofisiologia (Indivíduo 1), mas apresenta dificuldades em Processos Básicos de
Aprendizagem. O outro aluno (Indivíduo 2) está indo muito mal nas avaliações dificílimas
de Psicofisiologia, mas ó um dos melhores alunos em Processos Básicos de
Aprendizagem. Para recuperarem a nota, ambos resolvem estudar juntos, agendando
durante a semana alguns horários para que um auxilie o outro nas disciplinas deficitárias.
Ao final do período de avaliações tanto um quanto o outro conseguem ótimas notas nas
matérias que estavam tendo problemas.
Imaginemos agora que os alunos em questão, antes de agendarem horários
de estudos semanais, procuraram o professor de Processos Básicos da Aprendizagem
para discutirem estratégias de estudo com o objetivo de enfrentarem o problema. O
professor, além de sugerir efusivamente que estudassem juntos, agendou também
com os alunos um horário durante a semana no qual se colocava à disposição para tirar
dúvidas sobro a disciplina, e também discutir as aplicações dos conceitos psicológicos
na vida cotidiana (partamos do pressuposto que ambos os alunos sempre se engajaram
nesse tipo de discussão em sala de aula, supondo assim uma ação reforçadora desse
tipo de debate). Temos, nesse exemplo, contingências entrelaçadas que sáo mantidas
porque outras contingências vigentes (no caso o comportamento do professor de
Processos Básicos de Aprendizagem) auxiliam na manutenção do comportamento dos
participantes do entrelaçamento, funcionando como uma contingência de suporte
(Andery, Micheletto & Sério, 2005). Na Figura 02, encontramos um esboço dessas
relações que podem nos conduzir para além do entrelaçamento. Andery, Micheletto &
Sério (2005) sugerem que, nesse caso, podemos já estar diante da transição para um
outro nível de análise.

Aluno 1 Sd - R —►Sri

Contingências
entrelaçadas

Aluno 2 S'* -

Contingência
de suporte
Professor:

Poderíamos descrever o comportamento individual de qualquer um dos agentes


envolvidos no fenômeno representado na Figura 02, se o objetivo de nossa análise
fosse explicá-lo, compreendê-lo. Por exemplo, caso o nosso interesse fosse entender

458 ioJo Cliiudio I odorov Rk.inlo Corri.» Marione M.inio Borcos Moreira
as razões que levaram o Indivíduo I a apresentar um melhor desempenho em Processos
Básicos de Aprendizagem, deveríamos ser capazes de descrever: os comportamentos
emitidos por ele responsáveis pela mudança, assim como as variáveis ambientais
relevantes que adquiriram alguma funçôo seletiva sobre seu repertório comportamentai.
Entre as variáveis ambientais que afetaram seu comportamento poderíamos identificar
tanto o comportamento do Indivíduo II como o comportamento do professor, sem
precisarmos fazer menção a um "processo cooperativo".
Entretanto, nossa meta agora é compreender o processo de cooperação entre
os dois indivíduos reprosentados nas Figuras 01 e 02, e o papel fundamental que o
professor desempenha na manutenção do sistema como um todo Neste caso, não
poderíamos explicar o processo cooperativo se nào identificássemos todos os
participantes envolvidos e as formas pelas quais eles se relacionam. Se o processo
cooperativo envolve a troca ou o compartilhamento de respostas e reforços (Hake &
Vukelich, 1972), e, além disso, necessita de contingências que o suportam (Andery,
Micheletto & Sério, 2005), o nosso nível de análise parece ser outro. A identificação do
contingências entrelaçadas, as quais se constituem de contingências tríplices, parece
ser nesse caso, a unidade de análise que melhor descreveria o sistema representado
na Figura 02 (Andery, Micheletto & Sério, 2005; Glenn, 1988, 1991; Glenn & Malott, 2004;
Todorov, Moreira & Moreira, 2005; Vichi, 2005).
Ainda poderíamos adicionar mais alguns elementos ao sistema descrito na
Figura 02. Imaginemos agora que a cooperação entre os dois alunos, reforçada
efusivamente pelo professor por intermédio de incentivos verbais o das reuniões semanais,
foi tão produtiva em termos da recuperação da nota para cada um deles, que o professor,
ao perceber quo estava diante de alunos que trabalhavam muito bom juntos sob sua
supervisão, decidiu propor uma pesquisa de iniciação científica na qual todos pudessem
trabalhar juntos. O grupo permaneceu trabalhando tão bem, de forma tão articulada, que
a pesquisa foi um sucesso. A avaliação da comunidade científica não poderia ter sido
melhor. Os três, então, decidiram continuar trabalhando em conjunto em uma segunda
pesquisa de iniciação científica. A Figura 03 é uma representação das contingências
entrelaçadas observadas nos repetidos episódios de cooperação entre os estudantes e
o professor, um efeito produzido por uma configuração específica de entrelaçamento, e
um sistema receptor. Temos nessa representação uma outra unidade de análise que
parece melhor descrover fenômenos que não poderiam ser descritos somente com a
contingência tríplice, a metacontingência (Andery, Micheletto & Sério, 2005; Glenn, 1988,
1991; Glenn & Malott, 2004; Todorov, Moreira & Moreira, 2005; Vichi, 2005).
A metacontingência descreve uma relação entre um conjunto específico de
contingências comportamentais entrelaçadas e seus ambientes selecionadores (Glenn
& Malott, 2004). Utilizando ainda o exemplo de nosso dedicado professor e seus brilhantes
alunos, o excelente entrelaçamento observado durante o processo de pesquisa (B),
culminou com uma pesquisa (produto do entrelaçamento), avaliada de forma excelente
pela comunidade científica (sistema receptor). Essa avaliação retroagiu às contingências
entrelaçadas (B), selecionando-as. Assim, os estudantes e o professor engajaram-se
numa nova pesquisa de iniciação cientifica, demonstrando um efeito selecionador do
Sistema receptor sobre as contingências comportamentais entrelaçadas.
Devemos ressaltar aqui, no entanto, uma característica fundamental da
motacontingência. Glenn (1986) afirma que: "a metacontingência é a unidade de análise
que descreve a relação funcional entre uma classe de operantes, cada operante
possuindo sua conseqüência imediata e única, e uma conseqüência a longo prazo
comum a todos os operantes que pertencem à metacontingência" (p.02) (Grifo nosso).

Sobre Comportamento c Coftniçáo 459


Ainda no nosso exemplo, os comportamentos de cada um dos envolvidos no processo
de pesquisa é mantido por conseqüências geradas pelo seu próprio comportamento.
As contingências que mantém os comportamentos individuais na metacontingência
são, em grande medida, sociais. Portanto, como representado na Figura 03, no
entrelaçamento observado em (B) as respostas emitidas pelo professor (ornam-se
estímulos discriminativos para os comportamentos dos alunos, ao passo que a
cooperação entre os estudantes, permanece.

4
Al S - R - $

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P: Sd- R —i

O Sistema Personalizado de Ensino


O Sistema Personalizado de Ensino (PSI), de Fred Keller, ó uma poderosa
ferramenta de ensino oriunda da Análise do Comportamento (Keller, 1968; 1972; Moreira,
2004; Todorov, 1996; Nazzaro, Todorov & Nazzaro, 1972). O PSI é uma maneira de ensinar
centrada no IrabaJho do aluno, e não do professor, e em reforço positivo. Sua concepção
básica ó retirar a aversividade da Educação (Moreira, 2004) e fundamenta-se em cinco
características principais: ritmo próprio do aluno, domínio do conteúdo, ênfase na palavra
escrita, aulas expositivas apenas como veiculo de motivação e atendimento
Individualizado ao aluno, realizado com a ajuda de tutores, o que permite feedback
imediato para as iniciativas dos alunos (Fox, 2004; Keller, 1968; Moreira, 2004).

460 JiWio Cláudio todorov Rie.irdo Corrf.i M.irlonc Márcio Borges Morriw
Por sor uma forma de ensinar centrada no trabalho (no comportamento) do
aluno, o PSI parece ser uma estratégia interessante para auxiliar o ensino não só de
conhocimonto doclarativos (saber sobre), mas também para ensinar ao aluno as
habilidades e competências que ele deve possuir ao final do curso. No entanto, mesmo
com vantagens óbvias para o processo educacional (Fox, 2004; Kulik, 1976), nossa
experiência utilizando o PSI em três disciplinas do curso de Psicologia do Instituto de
Educação Suporior de Brasília tem mostrado que a implementação e condução de
uma, ou mais disciplinas, nos moldes do PSI não è algo fácil; ô uma tarefa que envolve
mudança cultural. Neste sentido, uma análise em termos de metacontingências também
podo ajudar a compreonder melhor como essa mudança se dá e, talvez, otimizar o
processo de mudança.

Metacontingências e o Sistema Personalizado de Ensino (PSI)


O PSI constitui-se num sistema do ensino quo sugere mudanças profundas
nos métodos tradicionais disponíveis em educação. As características do PSI, apontadas
antoriormente, trazem um conjunto de descrições comportamontais com o objetivo de
otimizar o ensino, transmitir o conhecimento e fazer do aluno um dos agontos
fundamentais do processo de aprendizagem (Fox, 2004; Koller, 1968; Moreira, 2004;
Todorov, 1972, 1975).
A utilização do conceito de metacontingência como unidade de análise parece
ser de utilidade ímpar, principalmente, quando obsorvamos duas características
intrínsecas ao PSI: a necessidade de avaliação constante da aplicação do método e as
subseqüentes mudanças advindas dossa avaliação. Para que possamos analisar mais
de perto essas duas características devemos, antes, identificar os componentes da
metacontingência que poderiam descrever o PSI.
Uma das primeiras tarefas essenciais em análises que envolvem o
entrelaçamento de comportamentos de um grande número de pessoas é a delimitação
clara das frontoiras do sistema que se quer analisar.

Sobrr (.'omport.imcnlo e 461


Glenn & Malott (2004) enfatizam que se formos capazes de identificar e descrever:
1) os fatores externos à organização (ou sistema) que afetam o seu desempenho; 2) o
número de partes que constituem o sistema (númoro de pessoas envolvidas, os
comportamentos onvolvidos em cada etapa do sistema); e 3) a quantidade de niveis
hiorárquicos; ganharíamos muito em termos do solocionar o que do fato ó fundamental
p im i h c o m p ro o n s flo d o fa n A rn o n n (u m a v o z q u o u n n lis o H cI o b b íi o n v o rq » u lu rn
apresentam uma infinidade de variáveis), consoguindo também uma ruator claroza na
descrição dos comportamentos quo de fato participam da organização,
Na Figura 04 temos uma representação geral dos três pontos necessários
levantados por Glenn & Malott (2004) para se entender o funcionamento de um sistema.
A Figura 04 representa também o esboço de uma descrição do PSI utilizando a
metacontingência como unidade de análise.
Podemos onxergar na Figura 04 a representação dos fatores externos (Glenn &
Malott, 2004) que desempenham um papel fundamental no comportamento do sistoma
o um todo. A lotra (A) ropresonta o quo Skinner (1953) chamou do Agência do Controle
ornamental. A implementação do PSI procisa ostar afinada com as leis oducacionais
intos no país A Agência Governo agroga milhares de indivíduos, oloitos roprosentantes
ia comunidado, os quais, em conjunto, são rosponsáveis pela formulação, aplicação
fiscalização das leis (Skinner, 1953) O ontrelaçamonto comportamontal dos vários
gentes (B,C,D,E,F,G o H) envolvidos na manutonção o sobrovivôncia do sistoma PSI
Jeve estar, por conta da ação da Agência Governo, afinado com as diretrizes educacionais.
0 comportamento da organização como um todo, deve adoquar-so inclusive às flutuações
ou às mudanças nas regras do jogo. Portanto, com o poder do "roforçar o punir" (Skinnor,
1953) delegado à Agência, a sobrevivência da organização dependerá, em grande
medida, do sua atuação'.
Do acordo com a Figura 04, podemos observar também os agentes quo estào
envolvidos no sistema, assim como o entrelaçamento de seus comportamentos (Glenn
& Malott, 2004). Cada um dos agentes do entrelaçamento (B,C,D,E,F,G e H),
representados dentro das poquonas circunferência, indica o conjunto de
comportamentos do pelo menos duas pessoas as quais, juntas, relacionam-se com
os outros agentos. Por oxemplo, a Tutoria (G) agrega todos os indivíduos que
desempenham as mesmas funçõos ou eventualmente, semelhantes. Entretanto, o
comportamento dos tutoros om conjunto terá sempre o mesmo efeito comportamontal
sobro os outros agentes Independentornonto dos q comportamontos encontrados om
cada um dos agentes, o efeito comportamontal sobro os outros agentes será sempre o
rnosmo. Claro que os comportamentos de cada agente poderão sor altorados, e, por
consoqüência, seu efeito sobre o comportamento dos outros agentes também. À medida
que a avaliação do Sistema Roceptor indicar que o sistema precisa ser alterado para
sobrovivor, uma intervenção sobro os comportamontos dos agentes será necessária
(Glonn & Malott, 2004). Uma descrição gorai dos comportamentos de cada agente pode
ser vista na Tabola 01.
É preciso relembrar, entretanto, que na motacontingôncia cada um dos
operantes onvolvidos no entrelaçamento aprosonta suas próprias consoqüências. O
agonto “Corpo discente", por exemplo, agrega todos os comportamontos dos alunos
om rolação ao PSI Algumas conseqüências que se soguom ao comportamento desse
agente são alguns dos pontos chave do PSI: o aluno recebe o rosultado do sou
desempenho imediatamente após sou comportamento (feedback imodiato), o aluno
1 Por Hxmnplu, nn Novh* Dirolrlzn» Curricular«» |h*h a* Cursou ijn P«iailogm iki brn»ll oatAo H«tyn«k) iju«> Uxlo» oh cursou *)u»lom »nu»
proyrwmi» Ati mm» «xigftnclH*

462 loilo (l.iuilio ludorov l\.ic<irilo Corróii M.irlom’ Miirvio Horpc* Moivlni
tom um contato maior com os professores, o atondimento ao aluno o individual. Tabela
01: Descrição geral dos agentes e de seus comportamentos no PSI.

Tabela 01: Descrição geral dos agentes e de seus comportamentos no PSI.


Comportamentos

Direcâü da Instituição Administrar a instituição, fornecer suporte ’político* para o


desenvolvimento do PSI na instituição

Coordenação administrativa Deve adequar o sistema operacional da instituição As mudanças


estabelecidas com a implementação do PSI

Coordenação pedagógica Auxiliar no desenvolvimento e busca por tecnologias mais eficazes


que possam auxiliar os professores na avaliação do PSI,
suporvisionar o trabalho docente
Coordenação do curso Estabelecer o conteúdo programático, supervisionar o trabalho
docente, ser o canal de comunicação com a direçfio.

Corpo docente Estabelecer o conteúdo programático, selecionar/criar o material


didático, treinar os tutores, supervisionar o sistema, avaliar, revisar

Tutorla Auxiliar os professores no planejamento, avaliação o admlnlstraçfto


do PSI É o contato mais próximo com o aluno

Corpo discente É o objetivo principal do PSI Estudar o material, fa/er as questões


de estudo, fazer as unidades, "aprender a aprender"

O ontrelaçamento dos comportamentos descritos na Tabola 01 produzem, no


PSI, o quo chamamos de "aprender a aprender". Esse produto, efoito do entrelaçamento
dos agentes representados na Figura 4 o na Tabela 1, é avaliado constantemente. Essa
avaliação é do importância vital para o sistema, pois è ola que retroage ao entrelaçamento
comportamontal dos agentes envolvidos na metacontingência. A avaliação do produto
das contingências comportamontais entrelaçadas ó o elemento selocionador do próprio
entrelaçamento. É ossa avaliação que permitirá a proposição de mudanças nos
comportamentos dos agentes que participam do entrelaçamento.

Metacontingéncias, o PSI e as Novas Diretrizes Curriculares


Para que os cursos de Psicologia brasiloiros possam produzir alunos com um
perfil profissional somolhante ao estabelocido polas NDC, mudanças significativas na
forma de ensinar devem ocorrer. Uma preocupação dos autores desse texto, o talvez do
muitos colegas, rosido na possibilidade de muitos cursos realizarem "adequações pro-
forma" relativas às NDC: mudam-se nomes de disciplinas, ementas e programas de
curso, mas o que ó feito dentro de sala de aula continuará igual, o que, certamente, não
produzirá diforonças nos repertórios dos alunos formados após a implantação das NDC.
A exposição quo fizemos nesse texto sobro metacontingéncias e o PSI tem corno
objotivo principal apenas fornecer alguma direção para o acompanhamento das mudanças
quo dovem ocorrer nos cursos de Psicologia; bem como sinalizar a oxistencia de uma
tecnologia de ensino (o PSI) quo pode auxiliar a formação do profissionais quo sejam
capazes de resolver problemas práticos, e não apenas discutir sobro os problomas.

Sobre Comportamento e Coftniv<1o 463


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464 lo.li) CI.iihIio loilorov Ric.irdo Corrê.i M.irtoi)c M.írcio Rorftrs Mordr.
Capítulo 41
Comportamento criativo & análise do
comportamento III:
Comportamento Verbal1
Tony Nelson
Universidade Federal do Maranhão

Uma de várias criticas direcionadas ao behaviorismo é a de que este modo de


abordar os eventos psicológicos não explicaria os processos mais complexos, como a
criatividade (Skinner, 1974/1987). Skinner tenta responder a esta critica afirmando que o
fenômeno denominado criatividade teria sim um espaço em uma ciência do
comportamento. Entretanto, para ele, o termo precisaria antes ser examinado com rigor
conceituai, pois muitas vezes seria utilizado como uma pseudo-explicaçflo. Dizer que
uma pessoa agiu criativamente porque é criativa seria equivalente a dizer que "ela é
criativa porque ó criativa”, ou soja, é uma explicação circular (conforme Donahoe &
Palmer, 1994, uma falácia nominal, utilizando o nome do evento para explicar o mesmo).
• A definição do termo criatividade não é simples, pode-se, contudo, considerar
que uma propriedade de um comportamento criativo seja a novidade, embora esta não
seja suficiente para defini-la (Epstein, 1996). A distinção é necessária porque muitos
comportamentos "originais’’ não são considerados criativos: basta observar que muitas
novas obras de literatura são produzidas a cada momento, mas que uma minoria dessa
variação é considerada criativa ou inovadora. Ser diferente em algum aspecto das obras
anteriores não bastaria. Variar pura e simplesmente não seria suficiente. Parece que o
critério para um comportamento novo ser descrito também como criativo seja dado pela
comunidade na qual a pessoa participa. É difícil apontar os critérios utilizados pela
comunidade para definir criatividade. Estes critérios podem mudar de sociedade para
sociedade e de tempo em tempo. Muitas vezes chama-se de criativo simplesmente
aquilo para o qual não se sabe indicar as causas (Epstein, 1980, 1996). Mas,
paradoxalmente, para se explicar um comportamento criativo seria necessário identificar
as variáveis das quais ele é função (Skinner, 1953/1965, 1957/1992). Assim, enquanto
a criatividade é tradicionalmente tratada como avessa ou desprovida de determinações
externas, Skinner propõe-se discuti-la em outra perspectiva, determinista e externallsta,
analisando as relações entre o organismo e o ambiente.
Em uma ótica skinneriana, o comportamento como um todo (verbal ou não,
criativo ou não) seria o produto de trés níveis de variação e seleção: filogênese,
ontogônese e práticas culturais (Skinner, 1984). Grosso modo, isto implica que um
comportamento depende de um organismo selecionado por contingências de

' O píOMfito (*pltuk> é porta do projrto de pMqutea intHutodo "A produgAo d* novo* goniport«m»nlo« vmboi«: Uni» pompectlva analltloo-
(XMnportJKTMMilar, pítx»*#o n* 2517/2004, «provado pai« R»*otuç*o n* 006 - CONSEPE • Uf-MA

Sobre Comportamento e Cogniçdo 4 6 5


sobrevivência, do uma história de exposição a contingências de reforçamento e de
contingências ontogenóticas especiais que compõem as práticas culturais de urna
dada comunidade. Esta multideterminação precisa ser considerada em qualquer
explicação comportamental. Portanto, no âmbito do comportamento verbal criativo haveria
ao menos três niveis do determinação a serem consideradas.
S k in n o r n h o r r in o c o m p o rta m o n to v o rh n l c o m o tim o p n rn n te O» p r in c ip io »
envolvidos seriam os mesmos daqueles envolvidos em comportamentos não-vorbais.
Entretanto, existiriam peculiaridades que sustentariam a distinção entre verbal e não-
vorbaK Assim como Skinner foi criticado por (supostamonto) não abordar a criatividade
geral de uma forma suficiente, isto também ocorreu com o modo de tratar o
comportamento verbal criativo, dizendo-se que Skinner não explicaria o surgimento de
novas respostas verbais (Chomsky, 1959/1967). Skinnor, porém, aborda este assunto e
o objetivo deste texto ó o de apresentar resumidamente o tratamento dado por ele ao
surgimento de novas respostas vorbais.

A Produção de Novos Comportamentos Verbais em uma Perspectiva


Skinneriana.
Skinner aborda o comportamento verbal (assim como o não-verbal) com base
na análise funcional, através da qual identifica várias categorias de operantes verbais
(Skinner, 1957/1992), identificando os estímulos antecedentes, as respostas e os
estímulos conseqüentes. O objetivo deste trabalho não é o do oxpor tais categorias,
mas o de discutir como Skinner trata o surgimento de novos comportamentos verbais a
partir de suas análises das contingências que instalam e mantém o comportamento
verbal. Como Skinner (1957/1992) enfatiza, o que define um comportamento como verbal
não é a sua topografia e sim a sua função. Entretanto, o foco deste texto será
principalmente o comportamento verbal vocal, embora algumas extensões desta
discussão para outras modalidades (escrita, por exemplo) sejam possiveis.
O reforçamento envolve um tipo do seleção de comportamentos o isso está
relacionado ao problema da primeira resposta (Skinner, 1953/1965). O reforçamento só
pode selecionar um comportamento que já esteja de alguma forma presente. Mas
como surge a primeira resposta? Uma diferença básica entre o respondento e o operante
é a função do estímulo antecedente: no primeiro, o estímulo olicia, produz, a resposta;
no segundo, o estímulo (discriminativo - SD) estabelece a ocasião em que uma resposta
produz reforçamento, mas este SD só adquire sua função após o reforçamento. Mas o
que produziu a resposta pela primeira vez? Skinner (1953/1965, 1984) postula a
existência de um conjunto de respostas que, diferentemente do reflexo, não estaria tão
comprometido com a estimulação antecedente, comportamentos que não seriam
eliciados, mas por assim dizer "induzidos”.
A caracterização destes comportamentos induzidos fornece a primeira
dificuldade: o que são? Skinner (1984) postula que os organismos foram selecionados
(1o nível) para exibirem certos comportamentos, reflexos ou de outro tipo. Skinner (1957/
1992) assinala que um bebê apresenta desde cedo uma ampla variedade de sons,
balbucios. Skinner refere-se a um "repertório vocal incondicionado", a "vocalizações
não-padronizadas", a um "comportamento exploratório” e a "respostas não-refinadas"
(em inglês, "raw responses"). A susceptibilidade às conseqüências seria também um
produto deste 1o nível. Assim, vocalizações iniciais de bebês seriam respostas não-

' Uma upru«un(Mv4k> mtrodulònu notxo o (:<*Tt»>art»»iHin»u vtwbaf nto é otofato texto, ma» po<fe m i wHxmft mia « ti Banos (2003)« ocn
Milton (1991), |kx

466 lony Nelson


eliciadas, induzidas por estímulos antecedentes (Skinner, 1957/1992). Estas vocalizações
não seriam inicialmente verbais, mas tornar-se-iam à medida que membros da
comunidade verbal reagem a estes sons, modelando posteriormente respostas mais
complexas. Skinner (1957/1992) indica como exemplo, que, em condições de privação
ou estimulação aversiva, ó comum crianças pequenas emitirem o som m prolongado e
sugere que posteriormente isto poderia ser utilizado como ponto de partida para a
modelagem da palavra “mãe" (ou mother, dependendo da comunidade verbal).
Skinner também indica como a própria reprodução sonora que uma criança faz
dos sons presentes em seu ambiente social (emitidos pelos pais etc.) parecem reforçar
a manutenção de tais sons (reforçamento automático): "A criança pequena, sozinha no
quarto', pode reforçar automaticamente seu próprio comportamento vocal exploratório
quando produz sons que ouviu na fala de outros" (Skinner, 1957/1992, p. 58). Ou seja,
Skinner sugere que existe um repertório comportamental amplo emitido pelo bebê e um
reforçamento intrínseco aos atos que produzissem sons semelhantes àqueles
presentes no ambiente social.
Skinner também postula que haveria o reforçamento social de uma classe
comportamental ampla da criança que envolve "imitar os sons" Fortalecendo esta classe,
isto poderia tornar mais provável a ocorrência de comportamentos ecóicos, que seriam
base para futuras seleções por reforçamento. O som emitido polos pais (ou outras pessoas)
constituiria-se em uma ocasião na qual a reprodução deste geraria reforço social,
ampliando o repertório inicial. Os estímulos presentes tornar-se-iam discriminativos para
determinados operantes verbais. Este tipo de repertório é fundamental para aquisição de
novas respostas. Seria contraproducente se, para cada palavra ensinada, os pais tivessem
que esperar um comportamento ocorrer para a partir de então modelá-lo até chegar a
uma forma final. Com o ropertório imitativo, a criança pode repetir as palavras que ouve e
ter seu comportamento reforçado mais diretamento (freqüentemente é necessário fazer
uma modelagem até chegar a uma resposta mais refinada).
Uma resposta (produção de um som, poi exemplo) poderia ser inicialmente
reforçada pela comunidade e depois haver uma mudança de critérios, modelando a
produção de um som ou a um encadeamento de sons cada vez mais complexo. O
comportamento, segundo Skinner, refere-se a uma classe de respostas. O comportamento
de fumar, por exemplo, é constituído de diversas rospostas, das quais "João fumou um
cigarro hoje pela manhã ás 08h32min" é um exemplo. Conceitos como o de modolagem
exigem a própria noção de classe de respostas e do uma variabilidade intrínseca á
mesma, visto que uma resposta nunca é exatamente idêntica à outra. Assim, quando se
reforça uma resposta, outras respostas também sofrem um fortalecimento.
Ainda em relação á variabilidade comportamental, Skinner (1969) cita um estudo
conduzido por Pryor, Haag & O'Reilly (1969) com dois golfinhos de uma mesma espécie,
Steno bredanensis (golfinho-de-dentes-rugosos), onde se investigou o surgimento de
novas respostas: reforçava-se um comportamento algumas vezes, colocava-se em
extinção este comportamento exigindo-se como critério um comportamento diferente
para ser reforçado: assim, os comportamentos anteriormente reforçados serviriam como
pano de fundo para que outros comportamentos (diferentes) ocorressem. Embora este
estudo tenha sido criticado metodologicamente por não separar o efeito do reforçamento
do de extinção (a extinção operante é conhecida por induzir variabilidade comportamental),
a variabilidade comportamental vem sendo investigada como uma propriedade do
comportamento que poderia ser reforçada4.

* Fm InuMi. "numary" (quarto (tu crwnça, croche), tf*du*klo w)ui kv[*ro*ntn


4Piirii umn expowçâo dklátlca do« enlixk» um v«rinMld*d«t conifXMlaniantal. oonfortr Abrau-Kodrtguo» (2005)

*M)brr Comport.imrnto t t* 0Rniç<l0 467


Mas o que foi visto até aqui seria suficiente para abordar o surgimento de novas
respostas verbais? Aparentemente não. Em relaçào ao comportamento verbal, este
apresentaria características específicas que o distinguiriam do nâo-verbal (Skinner, 1974/
1987). Uma delas é a relativa “independência’’ a determinados estímulos do ambiente.
Segundo Skinner (1957/1992), para omitir determinados comportamentos não-vorbais
hA n noc.GBsidada da prosonça do detorm inadoa o stlm ulos quo sirvam do suporto: cortar
um bolo exige a presença do m esm o, andar de bicicleta ó impossível sem um a bicicleta.
Embora o comportamento verbal também ocorra na presença de certos estímulos, ele
pode ocorrer na ausência de outros: posso falar sobre o bolo sem quo este esteja presente,
posso descrever uma bicicleta sem que esta precise estar à frente. Obviamente, existem
outros estímulos que possibilitam a ocorrência das respostas verbais. Posso, na presença
do prato vazio de bolo, exclamar: "Quem foi quo comeu todo o bolo?", mesmo que este
não exista mais. Existem, portanto, estimulações que servem de suporte para respostas
verbais, mas estas estão bastante livres de certas restrições presentes para as não-
verbais. Isto é uma clara vantagem, na medida em que o verbal prescinde de certas
relações mecânicas. O comportamento verbal produz estimulações diretamente (estímulos
sonoros, estímulos visuais que compõe gestos etc.), mas a principal conseqüência, a
que mantém o comportamento verbal, são aquelas produzidas indiretamente no ambiente
físico e diretamente no ambiente social; são as mudanças geradas a partir da mediação
de membros da comunidade verbal.
As diversas categorias de comportamentos verbais podem ser tão reforçadas
que passam a ocorrer até na ausência de certas estimulações antecedentes importantes.
As relações características do mando, por exemplo. Certas operações estabelecedoras
podem aumentar o valor reforçador de um determinado estímulo, tornado um
comportamento mais provável, mesmo na impossibilidade de obtê-lo: a clássica figura
do homem sedento andando pelo deserto sem ninguém à vista e pedindo água (para
quem?) é um exemplo disto. O baixo custo das respostas verbais é um elemento que
pode favorecer uma maior emissão destas quando há um amplo histórico de
reforçamento das classes verbais. Pedir algo, como para ligar o condicionador de ar,
envolvo um custo menor do que a própria pessoa levantar-se de sua cadeira, dirigir-se
ao interruptor e ligar o aparelho (entretanto, se as conseqüências de pedir forem aversivas
a segunda alternativa pode ser menos custosa).
O amplo reforçamento da classe verbal somado ao seu (em geral) baixo custo
e a classe de estímulos que podem vir a controlar determinadas respostas fornecem
uma excelente condição para a ocorrência de novas respostas verbais. O comportamento
verbal ocorre em situações novas e em alguma medida diferentes daquelas originais
(generalização). As relações envolvidas no tato fornecem bons exemplos.
O tato envolve aqueles comportamentos verbais que são tratados classicamente
como nomear, descrever etc. Mas as semelhanças são superficiais (cf. Skinner, 1957/
1992). O que define o tato sào as conseqüências (reforçadores generalizados) e o tipo de
estímulo discriminativo, que é não-verbal (Skinner, 1957/1992), O tato oferece uma clara
vantagem à comunidade verbal, o que explica o extenso reforçamento dado a esta classe
verbal. Este comportamento pode, por assim dizer, pôr os demais membros da
comunidade em "contato" com estimulações que afetaram apenas o falante. Numa
sociedade de caçadores, seria uma grande vantagem poder informar aos companheiros
ondo estão os animais, sua espécie, o seu número, em que direção se movimentam etc.
O comportamento verbal tato de dizer "casa" é reforçado na presença de alguns
estímulos e não é reforçado (ou ó punido) na presença de outros. Assim, o reforço
estabelece uma função para toda uma classe de estímulos. Não precisamos aprender

468 lony Nclton


a nomear uma casa na presença de cada uma das casas existentes no mundo. A este
caso, Skinner (1957/1992) chama de extensão genérica.
Um outro caso, de acordo com Skinner (1957/1992), seria a extensão metafórica.
Neste tipo de generalização, o comportamento ocorreria na presença de um novo estimulo
que teria "algumas das características relevantes, mas não todas, do estimulo que
controlou a resposta" (Petorson, 1978, p. 99). Segundo o relato de Skinnor (1957/1992),
uma criança, após aprender a reagir verbalmente à dormência no pó (quando a circulação
sangüínea é diminuída) disse, ao tomar um refrigerante, quo este tinha um gosto do
quando o sou pó ostava dormindo. No caso, uma ostimulação privada gerada tanto pela
dormência no pó quanto pelo refrigerante fagulhadas") serviu de estimulo discriminativo
para a nova resposta. O critério utilizado pela comunidade para onsinar a criança a falar
sobre o "pó dormido" não eram as "agulhadas", mas outros critórios (como a dificuldade
da criança se locomover após ficar sentada um certo tempo com as pernas cruzadas).
Um comportamento verbal ó considerado uma extensão metafórica quando ocorre pela
primeira vez, se por acaso o comportamento passa a ser diretamente reforçado ele
deixa de ser considerado uma extensão metafórica.
Ainda outro caso seria a extensão metonimica. Nesta, o comportamento ocorreria
na presença de um estimulo que acompanhou o estímulo na presença da qual houve
reforçamento, mas aquele não teria "nenhuma das características relevantes da classe
de estímulos que controlou previamente a resposta" (Petorson, 1978, p. 103). Um
exemplo, segundo Skinner (1957/1992), de uma extensão metonimica que se
estabeleceu culturalmente ó o de dizer que "A Casa Branca negou o boato" quando
quem negou teria sido o presidente (Skinner, 1957/1992).
Para Skinner (1957/1992), a unidade de análise do comportamento verbal não
ó a palavra e sim o operante. Fragmentos de palavras podem assumir funções
particulares. Uma criança de seis anos de idade, após aprender a palavra inglesa
“Chinese" (chinês/chinesa) e “Japanese" (japonês/japonesa) passou a designar a forma
do olho oriental de "nese". No caso, um estimulo comum aos chineses o japonoses
("olhos puxados") controlou discriminativamente uma resposta comum: tanto um como
o outro era "nese" (Skinner, 1957/1992). Outros exemplos ocorrem com prefixos e sufixos.
Há anos atrás, o então ministro do trabalho Antônio Magri (Governo Collor) utilizou o
neologismo "imoxívor. Esta nova resposta foi formada por recombinações de fragmentos
de respostas que existem de alguma forma. O prefixo V ó utilizado como uma negação
em algumas palavras, como em imóvel (que não so move) ou imortal (não-mortal). O
radical “mex" compõe diferentes palavras (mexer, mexo etc.). O sufixo "ivel" compõe
várias palavras, indicando uma qualidade, como em "removível" (que se pode remover).
Logo, o termo "imexível" torna-se "aquilo que não pode ser mexido".
Segundo Skinner, novas configurações de estímulos para as quais respostas
antigas sojam insuficientes podem tornar novas respostas mais prováveis. A história de
vida de cada um acabaria proporcionando condições para o surgimento de respostas
idiossincráticas. Entretanto, as contingências comuns às diferentes pessoas que
compõem uma comunidade verbal acaba favorecendo uma reação apropriada a muitas
respostas verbais novas: no exemplo anterior, os ouvintes eram capazes de afirmar que
"imexível" seria algo que não se poderia mexer, mesmo ao ouvi-lo pela primeira vez.
Comportamentos verbais que tenham a mesma probabilidade de ocorrer podem
acabar se fundindo (Skinner, 1957/1992). Por exemplo, as palavras inglesas fog (nevoeiro)
e smoke (fumaça) deram origem à palavra smog, que designa uma mistura de nevoeiro
com fumaça, tm uma situação onde nevoeiro e fumaça estavam presentes e se misturavam,

Sobre (/omportimenlo c l oRnlç.lo 469


tanto uma resposta como a outra (fog e smoke) oram fortes o suficiente para ocorrer. A
ocorrência das duas palavras com a mesma probabilidade pode ter gerado esta fusão.
Uma outra questão no surgimento de novas respostas ó a de que o falante
(emissor) produz uma parle do ambiente ao qual ele próprio responde e isto é importanto
na composição. O falante modifica contingências e acaba favorocondo a omissão de
novuM roHpostuH. O ftilwtto uproruio u rungir uo huu próprio comporttimonto vorbul o lato
acaba favorocondo ou descartando certas emissões, gerando um procosso continuo
de composição. Outras vezes o falante favorece novas respostas através de outros
moios. A ingestão de álcool pode diminuir a aversividade do uma situação o
possibilitando que rospostas normalmente mais "fracas" (para aquela situação) ocorram.
Skinnor indica o quo denomina de "estrutura autoclltica" como uma outra forma
do oxplicar novas respostas verbais. Por exemplo, Quando uma pessoa aprendo a
verbalizar "a bicicleta do menino", “a bola do menino", "a casa do monino" e outras
expressões similares, pode simplesmente substituir "bicicleta”, "bola" e "casa" por outro
item qualquer (trocando o artigo correspondente, se for o caso): “a caneta do menino".
Rospostas criativas vorbais podem ocorrer de forma aleatória e posteriormente sofrer
seleção por reforçamento pelo próprio falanto ou demais membros da comunidade verbal,
mas também podo ocorrer por meio do um rearranjo de contingências por parte do falante:
"O papel do acaso por ser assumido ou ampliado pelo planejamento deliberado ,
Por definição nào podemos ensinar comportamento original, visto que não seria
original se fosse ensinado, mas podemos ensinar o estudante a providenciar
ambientes que maximizem a probabilidade de quo respostas originais ocorram
Ele pode não somente tomar vantagem de acidentes ... mas produzi-los. Ele pode
gerar novas idéias, por exemplo, rearranjando arbitrariamente palavras, alterando
proposições estabelecidas de formas mecânicas..., ou substituindo antônimos."
(Skinner, 1968, p. 180)
Desse modo, temos situações onde respostas novas surgem
"espontaneamente" (de forma não-planejada, sem que se conheçam as variáveis de
controle) e outras onde uma pessoa, identificando as variáveis de controlo, desenvolve
estratégias para potencializar o surgimento de novas rospostas mudando o ambiente.
Respondendo a critica inicial sobre a suposta ausência de um tratamento
behaviorista radical para a criatividade, especificamente em relação ao comportamento
vorbal, podemos afirmar que Skinner possui sim uma proposta para lidar com o
surgimento de novas respostas. Embora a interpretação de Skinnor seja baseada om
conceitos testados empiricamente (como reforçamento etc.), há muito o que investigar
acerca de vários fenômenos apresentados (por exemplo, em que condições o como um
repertório comportamontal verbal se combina com outro). A proposta de Skinnor para o
comportamonto vorbal (inclusive o criativo) permanece em grande medida no plano
teórico e necessitaria de maior fundamentação empírica.
Finalmente, em relação á criatividade, talvez haja um paradoxo inevitável:
idontificar as variáveis das quais um comportamonto criativo seja função seria destruir
o mistério que circunda a própria concepção tradicional do criatividade. Se um dia se
puder oxplicar a criatividade, o que restará do conceito original?

Referências
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470 lony Nelson


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1974)
Skinner, B. F. (1992). Verbal behavior. Acton, MA‘ Copley Publishing Group. (Publicado originalmente
em 1957)

Sobre I'omport.imcnto c Coflnivílo 471


Capítulo 42
A tomada de decisões nas intervenções
psicoterápicas: da teoria à
prática

Vera Regina Liguei li Otcro


Clinica ORTkCKibeirèo Preto-SP

l leloisa I lelena Ferreira da Rosa


Clínica particular

"Uma determinada história pessoal produziu um organismo cujo comportamento é


desvantajoso ou perigoso. Em que sentido é desvantajoso ou perigoso, deve ser
especificado em cada caso, notando-se as conseqüências tanto para o próprio
indivíduo quanto para os outros. A tarefa do terapeuta ò completar uma história
pessoal de tal modo que o comportamento jà não tenha essas
características (Skinner, 1953).

A prática psicoterápica, em tempo real, quando terapeuta e paciente oncontram-se


no contexto clinico, tem como objetivo que o cliente seja beneficiado pelas intervenções do
terapeuta. Essas intervenções implicam em freqüentes tomadas de decisões
fundamentadas na sua formação teórico-prática, nas suas características pessoais,
peculiaridades do paciente e da relação que se estabelece entre ambos. As decisões
deverão resultar no alivio do sofrimento que levou aquola pessoa a buscar ajuda.
O analista do comportamento tem como pressuposto que os comportamentos de
sou paciente foram selecionados pelas conseqüências na sua história de vida o do ponto
de vista do mesmo têm funçáo adaptativa. Quando esses comportamentos passam a ser
insatisfatórios o demandam por intervenções clínicas, impõe-se ao terapeuta a tarefa de
selecionar uma sórie de passos que transformarão um estado insatisfatório em novos
comportamentos adaptativos.
O terapeuta analista de comportamento encontra nas publicações especializadas
um vasto leque de tócnicas aplicáveis a um igualmente vasto leque de problemas de
comportamento. Mais que isso, as técnicas disponibilizadas têm suporte experimental, o
que possibilita que seus dados sejam avaliados continuamente e as modificações
necessárias sejam implementadas.
Entrotanto, a utilização de tócnicas comportamentais de forma rígida o osterootipada
tem grande probabilidade de insucesso, a despeito do suporte exporimental. Um trabalho
feito com sensibilidade, criatividade e responsabilidade fará a grande diferença no uso dos
recursos que a análise do comportamento coloca à disposição de seus praticantes.

472 Ver.i Rcfllii.i l.ignclli Otero, Mcloiíii Mcloiiii f-erreir.i d<i Ro*.i
Desse modo as intervenções clínicas são conduzidas sob controle de quatro
variáveis: a) variáveis teóricas; b) variáveis do cliente; c) variáveis do terapeuta; d) variável da
interação terapeuta-cliente.

Variáveis teóricas

A teoria que dá suporte à prática do terapeuta comportamental é o Behaviorismo.


Como aponta Starling (2003) Hno contexto de uma relação de ajuda o terapeuta precisa
fazer alguma coisa e ele certamente não pode fazer teoria, Teoria não ó uma coisa; é
um conjunto abstrato e articulado de idéias e pressupostos, e, por si mesma não pode
ser aplicada a uma pessoa. Teorias não podem, por si mesmas, alterar o mundo físico.
Teorias são declaraçõos sobre o mundo que controlam o comportamento da pessoa
que as pronuncia".
Assim, ó preciso haver uma manoira de traduzir uma teoria ou um principio
teórico numa ação prática. Desse modo o terapeuta comportamental age em função da
teoria que adota buscando obter informações que possibilitem a realização de avaliações
funcionais do comportamento do seu cliente.
Para obter informações claras e objetivas o terapeuta precisa fazer perguntas
claras e objetivas. Durante toda a intervenção, para fazer análises funcionais adequadas,
o terapeuta comportamental busca informações sobre oito categorias, a saber:

a) Problemas de comportamento; uma descrição objetiva das respostas que constituem


um problema (Especificação da queixa)
b) Antecedentes: uma descrição objetiva dos eventos ambientais que precedem o
problema de comportamento, incluindo aspectos do ambiente físico e ações de outras
pessoas.
c) Conseqüências: uma descrição objetiva dos eventos ambientais que sucedem o
problema de comportamonto, incluindo aspectos do ambiente físico e as ações de.
Outras pessoas.
d) Respostas alternativas: informações sobre respostas desejáveis presentes no
repertório da pessoa que podem ser reforçadas para competir eficazmente com o
problema de comportamento.
e) Variáveis motivacionais: informações sobre eventos ambientais e/ou históricos que
possam influenciar a efetividade dos reforçadores e punidores para o problema de
comportamento e para respostas alternativas.
f) Variáveis ecológicas: outros estímulos presentes no ambiente da pessoa que podem
exercer controle sobro a resposta problema.
g) Reforçadores potenciais: informações sobre eventos ambientais, incluindo estímulos
fisicos e ações de outras pessoas que possam ter função reforçadora e serem usados
no tratamento.
h) Tentativas anteriores de solução do problema: informações sobre intervenções
(formais e informais) quo já foram usadas no passado e seus efeitos sobre o problema
de comportamento.

Sobre Comporfjmcnlo c CoRnlçáo 473


Variáveis do terapeuta
Cada terapeuta, independentemente da conceituação teórica que adota, tem
características pessoais que não ficam do lado de fora do consultório e constituem variáveis
importantes na relação com seu cliente e na condução do processo psicoterápico.
Dostncamos como muito importantes uma sólida formaçflo toórlca, experiência
profissional supervisionada, habilidades de empatia, acolhimento e escuta o ainda
equilíbrio entre o saber teórico-técnico e as peculiaridades de cada cliente. Sensibilidade,
parcimônia, criatividade, ótica, respeito pelo sofrimento humano sâo variáveis que, aliadas
ao saber teórico, farão a grande diferença entre um trabalho tecnicamente correto e um
trabalho verdadeiramente terapêutico.

Variáveis do cliente
O caminho a ser percorrido na psicoterapia ó doterminado sobremaneira pelo
quo chamamos de variáveis do cliente. Ao lado de suas características pessoais, histórico
de vida e natureza do problema precisamos considerar como muito importante sua
motivação para mudança e as expectativas em relação á ajuda que está procurando.
Cabe ao terapeuta, numa rolação pautada pela clareza e honestidade, considerar as
variáveis do cliente ao definir direções, técnicas e procedimentos,

Variáveis da interação terapeuta-cliente (relação terapêutica)

A relação que se estabelece entre terapeuta e cliente no contexto clinico é uma


relação especial em que o benefício deve ser do cliente. Desse modo a seleção das
técnicas e procedimentos e os critérios que serão usados para selocioná-Jos è uma
questão que só poderá ser respondida frente a um dado cliente, com um dado problema,
numa dada situação.
O processo de uma intervenção analítico-comportamental eficaz precisa ser
necessariamente dinâmico o flexível numa relação que requer intimidade, cuidado,
respeito, confiança, cumplicidade, sinceridade e aceitação.
Apresentaremos a seguir dois exemplos de atendimentos clínicos em que
mesclaremos com os dados do cliente as reflexões que fizemos na condução do
processo psicoterápico.

Caso clínico 1

Cliente: sexo masculino, 28 anos no início do atendimento, professor universitário,


solteiro,
Na primeira sessão apresentou as seguintes queixas e informações espontâneas:
"Já fiz três anos de terapia de orientação pslcanalltlca e estou parado há seis meses.
Agora resolvi procurar outro tipo de ajuda, mas nem sei se vai dar certo também.
Falaram que é bom esse outro tipo de terapia, sei lá. Tenho muito medo de morrer, sou
ansioso com tudo, deprimido, medroso com tudo, inseguro, sempre dependente de
alguém, desesperado com a opiniào e o julgamento do outro sobre mim, sou pessimista,
incapaz, indeciso. Fiz terapia e nào adiantou nada continuo doente, minha vida não sal
do lugar. Tenho certeza de que tenho alguma coisa física, orgânica e médico nenhum
resolve, náo melhoro. Já fui a muitos médicos e continuo a me sentir mal. Ê um mal
estar físico, você entende? Eu sinto mesmo, eu passo mal".

474 Veni Reflin.i l.ignrlii Otero, I IcIoIsj I Iclcn.i ferreira iti Ros.»
Foi dito claramente que se entendia que ele estava sentindo-se mal,
desesperançado e sofrendo. Segundo seu relato elo sentia um mal estar físico e emocional
que realmente deveriam impedi-lo de viver de uma maneira agradável, com uma boa
qualidade de vida. Foi dito também que para poder ajudá-lo precisaríamos obter e dar-lhe
uma série de informações.
Deveríamos definir melhor cada uma das queixas apresentadas especificando
em detalhes o que acontecia com ele quando se descrevia daquela maneira.
Precisaríamos lovantar o histórico do cada uma das queixas tentando identificar
desde quando aconteciam, em que situações, em quais atividades, na presença de quem,
em quais contextos e o que ocorria dentro e fora dele, (Comportamentos públicos e
encobertos)
Foram explicados, em linguagem leiga, de maneira simples e coloquial, alguns
dos pressupostos da terapia comportamental: aprendemos a ser o que e o como somos;
nossos comportamentos influenciam o 'mundo' e este nos influencia*
Foi informado também que o terapeuta comportamental tom um papol ativo e faz
perguntas freqüentemente, sempre com o objetivo de obtor dados para entender o que se
passa com ele e assim promover mudanças. Ensinamos o cliente a perceber a diferença
ontre ‘descrever’ e ’interpretar’ para que ele aprimore constantemente suas habilidades de
auto-observação e de relatos de fatos.
Essas ponderações do terapeuta devem ser feitas de forma intercalada com as
falas do dionte durante todo o atendimento Aproveitam-se os relatos para exomplificar o
’conceito’ a ser transmitido, com o objetivo de proporcionar meios para que a pessoa possa
tomar consciência do que ocorre com ela. Este conhecimento permite melhorar as auto-
observações e os auto-relatos e, por conseguinte, aceleram o processo psicoterápico.
Desse modo promove-se a reformulação do entendimento que o cliente tem sobre suas
queixas levando-o a engajar-se em comportamentos alternativos.
Desde as primeiras sessões o cliente expressou preocupações e medos, alguns
dos quais serão relatados a seguir:
Preocupação com saúde: pressão alta, dores no peito, dores musculares,
problemas cardíacos e circulatórios, impotência sexual e dificuldade de manter ereção.
Medos: ficar doente e morrer, ser rejeitado ou abandonado, ser incapaz pessoal e
profissionalmente, perder o emprego, alguém brigar com ele, humilhá-lo ou ofendê-lo, não
saber se defender do afirmações inverldicas feitas sobro ele, não conseguir lutar pelo que quer.
Sentimentos negativos constantes de: incapacidade, acomodação, passividade,
submissão, dependência e fragilidade física e emocional.
A história de um processo terapêutico é sempre escrita a quatro mãos: cliente e
terapeuta. Cabe ao terapeuta, usando seu conhecimento teórico e sensibilidade, fazer
escolhas importantes que definirão o desfecho dessa história, Neste caso havia a
possibilidade de usar procedimentos específicos para as queixas do cliente ou optar pela
’reconstrução’ de sua história de vida e análise de como aqueles comportamentos-problema
foram instalados e estavam sendo mantidos.
A opção feita foi prioritariamente ’reconstruir a história de vida’ para levantarmos os
dados e realizar análises funcionais.
O cliente tinha medos difusos e generalizados desde sua infância: separar-se da
mãe, ser repreendido, receber ameaças ou criticas do pai, ser mau aluno, ser rejeitado
pelos pais, desentender-se com colegas, apanhar ou ser agredido verbalmente, sentir
dores físicas, 'passar mal’, vomitar, dentre outros.

Sobre Comportamento e Coflniç.lo 4 7 5


No início do atendimento verificamos que a preocupação preponderante no
momento estava ligada ao medo de ser ou estar doente e como conseqüência morrer logo.
Investigando sua história de 'saúde' informou que até a quarta série, chorava
diariamente com medo de ir à escola e vomitar; sentia fortes dores na barriga, pedia para
não ir à escola, seus pais não permitiam, ele chorava mais ainda e vomitava em casa, no
c o m i n h o o n a q b c o Ih . S o u s p n is p r o c u r a r a m n ju d a d o m ó d ic o s d o d if o r n n t o n o t ip o c in lld n d o s :
pediatras, neurologistas, gastroenterologlstas e de nada adiantou.
Os 'comentários' e ou tentativas de ajudá-lo a parar de vomitar que mais ouvia
nesta época eram: "Por que você vomita? Pare do vomitar. Esse menino tem que ter alguma
coisa. Não é normal sentir tanta dor e vomitar tanto. Ele só pode ser doente. Acho quo não vai
conseguir estudar. Tudo ó muito difícil para ele. Ele é bonzinho, inteligente, mas tem
dificuldade. Se você não vomitar vai ganhar tal brinquodo".
Dados como os acima descritos nos permitiram identificar o esclarecer para o cliente
alguns dos seus autoconceitos, auto-imagem ou auto-avaliação. A freqüência e a intensidade
das queixas fisicas tais como "sou doente, dependente, incapaz" e a busca incessante de
indicação de módicos e realização de consultas sem melhora do quadro nos levou a iniciar as
intervenções por esses aspectos do repertório do cliente. O objetivo das intervenções foi
ensíná-lo a identificar quais eram os seus comportamentos controlados por regras e ajudá-
lo a ficar sob controle das contingências atuais. O cliente foi encaminhado para uma nova
avaliação módica. A escolha do profissional foi feita nas sessões em função de critérios do
paciente e da terapeuta. Essa avaliação confirmou uma condição de saúde fisica excelente.

Programação dos enfrentamentos


A escolha de procedimentos de enfrentamento pode ser foita com segurança. Ao
cliente foi ensinado que ao percebor sensações fisicas de desconforto tais como dores no
pescoço ou no peito, tontura, formigamento no braço, dores no estômago ou náuseas deveria
observar em que situação estava, identificar o que o preocupava, quais eram os comportamentos
com função de fuga ou esquiva. Além disso, era sugerido que náo procurasse médico ou
farmacêutico, não fizesse auto medicação ou telefonasse para alguém da família. Foi
estimulado a lembrar-se de que estava saudável e engajar-se em outra atividade.
Na análise funcional das queixas físicas identificamos que sentir-se doente e
agir como tal levava a diversas conseqüências sociais: disponibilizava uma série de
reforçadores no ambiente familiar, tais como cuidados e atenção especial e tinham
função de esquiva para comportamentos assertivos necessários nas suas relações
afetivas. As conseqüências por sentir-se doente perpetuavam as condições que o
levavam a descrever-se e agir como inseguro, incapaz, frágil, medroso. Era preciso
ajudá-lo a sair dessa armadilha.
A análise dos modelos de relacionamento usuais da sua família, assim como
das principais características de seus pais, levou à hipótese de que ele repetia os
padrões vividos na família de origem, tinha seus comportamentos controlados pelas
regras aprendidas assim como pelas suas auto-regras. No seu relacionamento com a
namorada repetiam-se os esquemas identificados em sua família de origem:
inassertividade, inconsistência na liberação dos reforçadores sociais (o mesmo
comportamento era punido pelo pai e positivamente reforçado pela mãe).

Análise das Interações e programação dos enfrentamentos


Os padrões de interação do cliente com sua família foram comparados com os
que mantinha com sua namorada. Nesta interação ele também não conseguia emitir
opiniões diferentes das dela, pois acreditava que quando pensava diferente ele estava

476 Vem Regina l.ignflli Otcro, I leloiw í ldrn,i f rrrrirti iLi Row
errado. Após algumas análises dos relatos das interações do seu cotidiano fazíamos treinos
de assertividade, 'representando' as situações descritas e considerando outras alternativas
de respostas. Partia-se de simulações mais fáceis e gradativamento aumentava-se o grau
de dificuldade. Dessa forma ele foi aprendendo a nomear e recategorizar as suas atitudes
e dos outros reformulando seus concertos e valores. Exemplo: muitos dos comentários da
namorada que ele inicialmente compreendia como brincadeiras, na verdade eram
desrespeitosos e tinham a função de manté-lo inseguro e dependente.
A opção por essa forma de trabalho atravós da reconstrução da história de vida
possibilitou uma compreensão funcional das queixas e capacitou-o para lidar com
seus dóficits e excessos comportamentais: aprendeu que ó possível se comportar de
outro jeito e produzir novas conseqüências; aprendeu a observar a realidade e fazer
análises funcionais de seu comportamento e dos outros; reavaliou conceitos. Mudou
sua auto imagem, aumentou auto estima e auto-confiança.
Esto caso foi atendido durante trôs anos com uma sessão semanal.

Caso clínico 2

Cliente: sexo feminino, nível universitário, 29 anos.


Queixa: fobia por baratas
A cliente procurou ajuda por iniciativa própria e escolheu um terapeuta
comportamental em função de leituras que havia feito sobre seu problema nas quais
esta maneira de trabalhar era referida como eficiente para a solução desse tipo de
dificuldade.
Na primeira sessão, após as apresentações iniciais, a cliente falou sobre seu
medo de baratas, sua expectativa em relação à terapia e informou que em outras áreas
de sua vida não sentia dificuldades, exceto algumas limitações decorrentes da fobia.
No primeiro contato ficou claro que a busca da cliente era por ajuda para solução
de um problema especifico que começava a afetar sua qualidade de vida. A especificidade
da queixa determinou a maneira de conduzir o atendimento atravós do uso de
procedimentos de exposição.
Fizemos um levantamento do histórico de seu medo de baratas e da condição
atual do mesmo. Ela tinha medo de baratas desde criança, mas sempre havia um
adulto para matá-las. Nos últimos dois anos houve dois episódios em que uma barata
voadora pousou em sua perna provocando uma reação intensa de modo. Passou a
ficar hiper-vigilante para a presença de baratas em qualquer ambiente, deixou de
freqüentar lugares públicos com mesas na calçada, fazer caminhadas, dirigir à noite
com a luz interna do carro apagada, descer na garagem da casa sem antes fazer uma
inspeção para certificar-se da ausência de baratas. Sua casa era mantida com todas as
janelas e portas fechadas o tempo todo. Sentia-se envergonhada e humilhada por ter
esse medo. Sua vida social estava ficando limitada e era alvo freqüente de ironias e
brincadeiras por parte de familiares e amigos, embora relatasse um sofrimento real e
intenso. Não tinha medo de outros insetos.
Foi explicado à cliente como as fobias são adquiridas e mantidas do ponto de
vista da análise do comportamento e como seus medos estavam sendo mantidos
polas esquivas. Analisamos os prejuízos e restrições sociais decorrentes da fobia e a
cliente reafirmou sua disposição para trabalhar seu medo. Discutimos o modelo de
ansiedade, o procedimento do exposição e prevenção de respostas e os possíveis

Sobre Comport.i mento e CojjnlçJo 477


aspectos aversivos dessa proposta terapêutica. Ela foi orientada a ler o livro "Sem medo
de ter medo”, do Tito Paes de Barros.
A hierarquia de exposição foi construída pela própria cliente, sem ajuda da
terapeuta e tinha as seguintes etapas: barata parada na tela do computador; barata em
movimento na tola do computador; figuras impressas de barata espalhadas pela casa
o IochI do trabuiho; figura de barata no b an co do carro; dirigir com a luz inturna do carro
apagada; descer do carro sem inspecionar a garagem; entrar em casa sem inspeção;
observar barata morta dentro de um vidro; caminhar na rua à noite.
A cada sessão avaliávamos as etapas de exposição a que a cliente tinha se
exposto e planejávamos as exposições subseqüentes. Na sexta sessào a cliente relatou
ter superado a fobia e considorava ter um 'medo normal' do baratas. Nessa ocasião
decidimos encerrar o atendimento. Após dez meses foi feito um seguimonto e os ganhos
se mantinham.

Considerações finais

O relato da maneira como foram conduzidos esses dois casos clínicos nos
remete á citação de Skinner colocada no inicio desse texto. A tarefa do terapeuta, de
"completar uma história pessoal" de modo que o comportamento não tenha mais
características "desvantajosas ou perigosas" foi feita de forma diferente pra clientes
com dificuldades diferentes. A condução dos processos terapêuticos e as decisões
tomadas no seu curso foram função de variáveis teóricas, do terapeuta, do cliente e da
relação terapeuta-cliente.
A natureza do problema e o grau de limitações e prejuízos foram determinantes
na escolha dos procedimentos utilizados. Em ambos os casos observamos que a
história de aquisição dos comportamentos-problema teve início na infância, mas a
extensão dos prejuízos na vida adulta era bastante diferente para cada um deles.
No caso 1 os prejuízos decorrentes das dificuldades afetavam sua vida social,
ocupacional, sexual e afetiva. Foi necessário, e isto se mostrou adequado e efetivo,
investir na reconstrução da história de desenvolvimento de seus medos, auto-imagem
e autoconceito e cada situação ser revista e reavaliada passo a passo.
No caso 2 uma fobia especifica trazia prejuízos também específicos, embora
relevantes em sua vida. Uma variável da cliente determinante nas tomadas de docisão
sobre os caminhos a serem percorridos foi a solicitação clara e objetiva de ser ajudada
a superar aquele medo. Ela não tinha queixas em relação a outros aspectos de sua
vida. Neste caso um atendimento direcionado e de curta duração foi suficiente e
satisfatório.
As docisões tomadas nos atendimentos clínicos tornam cada experiência
terapeuta-cliente única e particular. O velho jargão "cada caso ó um caso" confirma-se
no dia-a-dia do fazer terapêutico.

Referências

Sklnner.B F.(1953) Science and human behavior New York: MacMillan


Starling,R.R.(2004) Material nflo publicado apresentado no curso Avaliação funcional.XII encontro
da ABPMC

478 Vera Rcriu.i l.igmrill Otcro, i iclois<i I lelrnd I crrelra dd Row


Capítulo 42
Psicologia do Desenvolvimento, Análise
do Comportamento e a
Clínica Psicológica
Vara Kuperstein Ingberman
V N IC FN P/FFPA R /IFPA C /C FT FC C
Roseli Hauer
FEPAR / CHTECC

A questão do desenvolvimento na psicologia é extremamente importante, ela teve


seu inicio com a tarefa de estabelecer-se como uma disciplina em separado para obter um
espaço reconhecido na ciênda. Distinguiu-se da psicologia e da biologia focando a ‘ psyche”,
e da filosofia, por adotar o método experimental com ênfase na objetividade com o uso da
estatística. Cada um destes caminhos trouxe problemas. O foco na "psyche” entrou em conflito
com a pressão para estudar o comportamento com objetividade. Nas décadas de 40 e 50 a
ênfase na aproximação experimental levou a uma pouca atenção sobre a pessoa no mundo
real e aos experimentos de variáveis únicas. Passou-so a subestimar a importância da
descrição do comportamento da criança. A pouca importância dada à descrição levou à crença
de que a pesquisa devia ser derivada da teoria com poucas e limitadas situações experimentais.
Por outro lado, a pouca ênfase na descrição pode levar aos significados grupais negligenciando
diferenças individuais. Esta visôo retrospectiva leva a rofletir problemas que surgiram como a
fragmentação da psicologia em subdisciplinas, o que possibilitou a psicologia do
desenvolvimento tomar-se um campo em si, sendo parcialmonte separado da psicologia
fisiológica, clínica, da personalidade e da biologia. (Hindo, 1994)
A psicologia do desenvolvimento focou-se, portanto, nas mudanças nas idades
e grupos, compatível com o seu novo caráter científico, tendo ainda que compreender os
indivíduos, o que era, até o momento, objeto a psicologia clinica.
Outra questão importante ao estudar o campo do desenvolvimento humano se
refere os problemas enfrontados para delimitação do conceito de comportamento. O
campo da psicologia do desenvolvimento consiste de várias "mini teorias" cada uma
tentando dar conta de um problema comportamental limitado, domínios específicos,
desenvolvimento cognitivo, perceptual, moral, da linguagem, da personalidade com
períodos em particular. (Schlinger, 1995)
Para este autor, o que precisamos é encontrar, no campo da psicologia do
desenvolvimento, alguns princípios teóricos para explicar as influências do ambiente na
mudança do comportamento. Temos muitas teorias diferentes para a explicação do
desenvolvimento humano e algumas delas “científicas". Não há uma teoria do
desenvolvimento com uma compreensão abrangente.
Hethorington & Parke (1986), afirmam que "Nenhuma teoria é capaz de preencher
todos os aspectos do ser humano" (p.5). Nenhuma das teorias pode ser poderosa o

Sobre Comportamento e Coflnlv'Jo 479


suficiente para propiciar um nlvel de compreensão cientifica, muitas teorias diferentes
são necessárias para explicar os comportamentos aparentemente diferentes que
compõo as subáreas da psicologia do desenvolvimento.
Schlinger (1995) analisa que a conseqüência deste processo é que nonhum livro
um psicologia do desenvolvimento apresenta uma preferência teórica, a maioria dolos
adotü uiiih aproximação coynltivlata yorul. As razOos pura o»tu vuriaçüo oatüo nu vudodudo
dos objetos de estudo, na maneira como os vários psicólogos do desonvolvimento
conceituam o comportamento com abordagens estruturais para sua explicação.
Para o autor, enfoques estruturais são úteis, no entanto, trazem problemas
uma vez que as variáveis funcionais são pouco observadas, como conseqüência, da
pouca observação destas variáveis, aumenta a probabilidade em obter explicações
circulares do comportamonto. O método de posquisa mais comum utilizado nos estudos
estruturais é o correlacionai, no qual a idade é utilizada como uma das variáveis ó um
método válido, mas não substitui o método experimental. Várias das toorias estruturais
apresentam critérios cientificos, mas várias falham consistentemente. A conclusão é de
que a abordagem estrutural não explica os comportamentos.
Schlinger (1995), relata que Skinner pensou quo havia explicação para o
comportamento que era mais fácil de explicar e mais parcimoniosa. Seu programa de
pesquisas havia resultado na descoberta de classes de relações funcionais que foram
formuladas em leis cientificas e quo a teoria emergente destas leis ora suficiente para
explicar alguns fatos sem a inferência de eventos hipotéticos
Zuriff (1985, in Schlinger, 1995), em sua discussão sobre Skinner e o método
cientifico, cita que para este, uma teoria consiste de conceitos quo expressem "relações
funcionais empíricas entre variáveis comportamentais e ambientais".... (p.32). A tooria
skineriana é uma coleção organizada de fatos empíricos (principalmonte relações
funcionais) e inclui a formulação de princípios (leis científicas) derivada indutivamente
destes fatos, utilizando o mínimo número de termos e conceitos.
O autor retoma quo os princípios teóricos de uma ciência fazem mais do que
explicar eventos observados, estes são utilizados para interpretar (compreender) novas
observações empíricas. A análise do comportamento consiste nas leis e princípios (derivadas
da análise experimental de pequenas unidades de comportamento básicas) que descrevem
relações funcionais conhecidas entre o comportamento e o ambiente. A análise do
comportamento inclui as leis do condicionamento respondonto (mas não é limitada por
elas) e as leis operantes do reforçamento (e punição) e controle de estímulos. Em uma
visão analítico comportamontal do desenvolvimento, o termo "desenvolvimento", como
utilizado nos textos de desenvolvimento tradicionais, refore-se a mudanças ordenadas
rolatadas em um período de tempo, descreve quais comportamentos ocorrem, mas não
como ocorrem. As mudanças são correlacionadas com a idade, desenvolveram-se
explicações de quo estruturas biológicas ou cognitivas mudavam. No esforço de encontrar
significado nas mudanças do comportamento, psicólogos emprestaram da biologia estágios
pelos quais o desenvolvimento passaria. As mudanças no comportamento através do tempo
apenas aprosontam pistas sobre mudanças no ambiente. (Schlinger, 1995)
Para Bijou e Baer (1975) "Uma teoria do desonvolvimento psicológico humano
deve incluir uma descrição generalizada dos dados do desenvolvimento e um enunciado
das relações entre estes termos" (p.23). Em uma abordagem comportamontal, por
desonvolvimento psicológico, designam transformações progressivas nas interações
entre o comportamento dos indivíduos e os acontecimentos de seu ambiente. A ênfase
ostá nas modificações das interações, uma dada resposta pode aparecer ou não
dependendo do ambiente (Bijou e Baer, 1980).

480 V.ir.i Kupmtcin Inflbcrm.in, Riwell i l.iuer


Os indivíduos interagem com o ambiente de maneira contínua e infinita. O
comportamento afeta o ambiente e o ambiente afeta o comportamento. O desenvolvimento
são as transformações progressivas nas interações comportamento ambiente que ocorrem
com a passagem dos anos, desde a concepção ató a morte Os pressupostos para esta
afirmação são de que: o organismo é uma unidade de respostas integradas; nem todos os
comportamentos podem ser observados: o número e o tipo de respostas a serem
observadas dependem do objeto de estudo. Na análise psicológica o comportamento é
visto como função de uma situação atual e da história. Em cada comportamento, uma
explicação completa e apropriada das relações de causa e efeito incluirá, com certeza,
todas as classes de estímulo e suas histórias de interação pertinentes. Levar em conta
apenas o evento ambiental dominante leva a explicações incompletas e muito simplificadas
das relações funcionais significativas. (Bijou e Baer, 1975, p.28)
A natureza da teoria do desenvolvimento se especializa no estudo das interações
entre o comportamento e os eventos ambientais. Está interessada nas variáveis
históricas que influenciam o comportamento, isto ó, no efeito das interações passadas
sobre as interações presentes. Para ele, devemos ampliar esta análise para a criança
em desenvolvimento, os eventos no meio em que ocorre o desenvolvimento e a ação
reciproca entre a criança e o meio. Propõe que, para elaborar uma teoria comportamental
do desenvolvimento humano devemos analisar: o comportamento da criança como
uma entidade psicológica; o meio em que ela se desenvolve; a interação continua e
recíproca entre o comportamento da criança e seu ambiente; e os estágios dessas
interações contínuas e recíprocas. Para eles, “a conduta básica da criança é formada:
por comportamento respondente, controlado pelos estímulos que os precedem; por
comportamento operante, controlado principalmente pelos estímulos que os sucedem;
e os estímulos que são produzidos por seu próprio comportamento, que pode afetar
comportamentos subseqüentes”. (Bijou e Baer, 1975, p.33)
O comportamento da criança é considerado como: um conjunto de
comportamentos respondentes e operantes inter-relacionados; fontes de estímulos
que adquirem propriedades funcionais com relação a estas condutas. O comportamento
da criança funciona como estimulação social para outras pessoas e a maior proporção
dos estímulos que a afetam se originam fora de sou campo O meio do dosenvolvímento
é constituído de: estímulos específicos: físicos, químicos, orgânicos e sociais; de eventos
disposicionais: mudanças no ambiente que afetam o comportamento (são mais
complexos do que a presença ou ausôncia de estímulos). É uma interação que alterará
as interações que a sucedem. Ex: ciclos de sono, privação, saciação, instruções verbais
(). é citação literal (Bijou e Baer, 1975, p.38)
A função dos estímulos pode ser: evocadora (SD); de fortalecimento das R; e de
enfraquecimento de R. As maneiras pelas quais os estímulos controlam as respostas e
a classificação dos eventos ambientais em suas funções de estímulo proporcionam uma
organização dos fatores que controlam o desenvolvimento e eliminam a necessidade de
termos menos objetivos É conveniente dividir a cadeia de interações em etapas e investigar:
as interações dentro de cada etapa e as continuidades e descontinuidades de
comportamentos entre as unidades sucessivas. Não temos um modelo de
desenvolvimento que sirva de guia para a segmentação. Isto leva a considerações:
podemos agrupar por idades o que é simples e objetivo mas muito arbitrário para ser útil
se procurarmos mudanças dentro e entre um período e outro ou podemos assinalar o
ponto inicial e final de cada etapa por critérios como: eventos ambientais, mudanças de
maturação biológica, manifestações comportamentais. (Bijou e Baer, 1975, p.37-40).
A questão da divisão em estágios é uma questão importante da psicologia do
desenvolvimento e é discutida por Ruiz e Baer (1996), que vão utilizar como exemplo a

Sobre Comportamento e CoRníçdo 4 8 1


teoria de Piaget e seus três critérios para a constituição dos estágios: 1) que a série de
ações seja constante (independente da idade cronológica); 2)que cada estágio esteja
determinado não só por uma propriedade dominante, mas por uma estrutura total que
chegue a caracterizar a todas as ações posteriores pertencentes a este estádio; 3)que
estas estruturas ofereçam um processo de integração tal, que cada uma delas esteja
propnrada pala procedonto o intograda dentro da quo so soquo O sogundo principio
acerca dos estágios ó aceitável para os analistas do comportamento, pois Piaget nôo
ficava satisfeito com a ação simplesmente, requeria a interação.
Na psicologia moderna o conceito de estágios continua confuso. Refere-se, de
uma forma vaga, a uma estrutura que guia as ações e que se diz ser universal, qualitativa,
mental, cognitiva, moral o, seja lá o que for, necessita do explicação. Para a análise do
comportamento o conceito do estágio não parece essencial nem explicativo, ainda que
seja claramente heurístico (Rulz & Baer, 1996)
Schlinger (1996), por sua voz, também discute a questão dos estágios do
desenvolvimento e avalia a construção dos modelos teóricos como estruturais, baseados
na topografia das respostas e portanto, pouco explicativos dos fonômonos. "Quando o
comportamento ó diferenciado apenas por suas bases estruturais (topograficamonte), é
fácil assumir quo diferentes teorias ou explicações são necessárias para explicar cada
tipo de comportamento. Diferentes formas de comportamento dão assumidas como
qualitativamente diferentes", (p. 18)
O campo da psicologia do desenvolvimento, para as abordagens tradicionais, implica
quo ó um periodo funcionalmente diferente do quo o do adulto, como se os humanos fossem
governados por princípios psicológicos diferentes em diferentes idades. Não é surpreendente
o ecletismo e a necessidade de várias explicações. Com base em propriedades estruturais
são separadas em classes funcionais requerendo explicações diferentes (Schlinger 1996).
As teorias e explicações utilizadas para dar conta do desenvolvimento destes
comportamentos apresentam um erro circular de pensamento. Para cada classe de
respostas é dado um nome; o nome é tratado como se referisse a um objeto concreto;
o nome em si se torna um objeto de estudo; e o nome da classe de comportamentos
observada se torna a explicação do próprio comportamento observado. Exemplo: a
noção de permanência do objeto para Piaget. O que começou com o nome de uma
relação comportamental observada tornou-se uma "coisa” (estrutura ou processo)
localizado "dentro" de uma criança e responsável pelo comportamento observado.
Portanto, do ponto de vista analítico comportamental, temos uma explicação circular
que é aquela na qual a única evidência para a explicação são os comportamentos a
serem explicados. (Schlinger, 1996)
Ruiz & Baer (1996) opõe-se a qualquer teórico que assuma que, em virtude de
uma certa ordenação, os estados finais estejam pré-determinados. O que determina não
ó a ordenação mas o arranjo de contingências que se estabelece, que não se encontram
comprometidos, em princípio, com uma explicação puramente ambientalista da conduta.
Não negam o papel da biologia no desenvolvimento do comportamento, mas se opõe a
uma biologização nào empírica da conduta, a um determinismo biológico dos fenômenos
psicológicos. Defendem que, para a análise do comportamento, o desenvolvimento é um
processo de individualização, o comportamento do sujeito ó explicado polo jogo das
contingências filogenóticas de sobrevivência e pelas contingências ontogenóticas de
reforçamento e punição, entre as quais se encontram as práticas culturais.
No modelo comportamental a aprendizagem de comportamentos se dá por
mudanças progressivas, há pouco mais de 30 anos Bijou e Baer definiram o desenvolvimento
psicológico como "as mudanças progressivas que tem lugar na maneira como um

482 Yu.„ Kupcrstcin ln^brrm<in, Roseli I l.iucr


organismo interage com seu ambiente". (Bijou e Baer, 1875, p. 1). Neste caso, ser progressivo
não foi uma qualificação essencial como em outras aproximações. (Ruiz & Baer, 1996) para
Bijou e Baer (1975,1980) os comportamentos das crianças são importantes em si mesmos,
não são determinados por processos mentais hipotéticos e sim pela maturação biológica
e histórica de interação com um ambiente particular desde o momento da concepção.
Interações reciprocas e contínuas entre a criança e seu ambiente não podem ser analisadas
sem referencia a seu meio, nem ó possível analisar o ambiente som referir-se ’a criança.
"Ambos formam uma unidade inseparável, constituindo um conjunto interligado de variáveis,
ou um campo de interação, que é o objeto de análise."(Bijou e Baer, 1975,p.27-28) A criança
não ó um objeto passivo alguém que espera ser estimulado pelo ambiente, ó tanto um
receptor como um instigador da estimulação, ela ó analisada como um grupamento de
comportamentos funcionais interligados e uma fonto de estímulos funcionais.
Essa interação reciproca constrói a história de aprendizagem tanto de padrões
ajustados quanto desajustados de comportamento.
Cabe retomar aqui que, tanto o comportamento tido como normal quanto aquele
que considerado patológico, estão sujeitos aos mesmos princípios. Assim, a análise
do comportamento compreende que todo comportamento é adaptativo, pois ele se
estabeleceu dentro de um determinado conjunto de contingências e pode estar sendo
mantido. Assim, os comportamentos, considerados adaptados ou não, são sempre
adaptativos, isto ó, tem função para os organismos que os emitem. (Bijou e Baer, 1980).
Esta maneira de compreender o fenômeno do desenvolvimento, como a
aquisição de cadeias comportamentais, vai dar, ao clínico, alternativas de análise e
intervenção bastante específicas dos fenômenos com os quais se Reparam. A
aprendizagem de comportamentos se refere à aprendizagem de um comportamento
completamente novo ou á mudança em comportamentos já apresentados pela criança.
A aprendizagem por contingências ocorre mediante á exposição direta e imediata
do indivíduo ao ambiente que o cerca. Ela aprende por meio da exploração pessoal do
ambiente e do contato direto e imediato com as conseqüências decorrentes de seu
comportamento, que podem ser descritas como relações "se..então".
Estas relações não precisam estar descritas para que estejam em vigor e a
criança sofra seus efeitos. O indivíduo aprende por contingências quando as
conseqüências ao seu comportamento são imediatas, independente do fato de poder
descrevê-las, As contingências podem ser naturais, como bater-se ou levar um choque
ou arbitrárias a reação do cuidador ao comportamento da criança.
Tal relação pressupõe a interação entre: uma situação ambiental antecedente;
o comportamento; e uma situação ambiental conseqüente.
Outra forma pela qual se dá o processo é a aprendizagem por regras, aqui o
comportamento de uma pessoa pode ser influenciado por meio de regras implícitas ou
explicitas em ordens, conselhos, avisos, instruções e leis e são muito comuns em nossa
sociedade. Constantemente seguimos regras ditadas por outras pessoas, regras são “dicas''
faladas ou escritas, implícitas ou explícitas, que orientam a ação dos indivíduos, Já que indicam
uma condição se...então vigente em determinado ambiente ou situação sugerindo uma ação
específica. São muito úteis nas situações em que as conseqüências imediatas das ações
não parecem ser suficientes para estabelecer ou manter a ocorrência de alguns
comportamentos. (Canaan-Oliveira, S., Coelho das Neves, M.E.,Slilva, F.M., Robert, A.M. 2002)
Em geral seguimos regras estabelecidas por outras pessoas no entanto,
também formulamos as nossas próprias regras por meio do contato direto e Imediato
com as contingências. O seguimento de regras não requer a exposição direta às
contingências permitindo um aprendizado mais rápido. Devemos ter em consideração

Sobre Comportamento c Co(jniçilo 4 8 3


ainda as operações de reforçamento positivo, reforçamento negativo, e os esquemas
de reforçamento contínuo e intermitente. Processos presentes na aprendizagem de
comportamentos como fuga e esquiva, modelação, generalização, discriminação e
modelagem. (Canaan-Oliveira et al, 2002)
Pas9aromos agora a onfocar três temas com os quais nos deparamos na
clínica a ansledado, a depressSo e os comportamentos sociais (adequados e
inadequados) pró-sociais e anti-sociais.
Trataremos ainda posquisas sobre os temas baseadas no modelo comportamental
do desenvolvimento de comportamentos a partir da interação da criança com seu ambiente.
O modelo de aquisição de respostas de ansiedade descreve que a ansiedade
ó um estado emocional comum entre as crianças, estudos mostram que, em
comunidades não clinicas, a presença de transtornos de ansiedade é estimado dez por
cento da população.
Em muitas crianças a ansiedade ocorre como uma parte normal de seu
dosenvolvimento, contudo em algumas, as respostas características da ansiedade
tornam-se freqüentes a maior parte do tempo, interferindo com a rotina diária da criança.
Segundo Vasey e Dadds(2001), no condicionamento da ansiedade, o Inicio ou a
intensificação do fenômeno ocorre através de oxperiôncias onde ocorra a punição após
o comportamento ser emitido. Em muitos casos as situações podem se tornar estímulos
discriminativos, sinalizando contingências que envolvam a operação de punição e, como
resultado, a criança passa a evitar tais situações. Estudos na área da psicopatologia
infantil, em particular, no modo como os pais estabelecem a interação com seus filhos,
tem demonstrado que essa interação pode contribuir na etiologia da ansiedade.
(Rapee 1996), considera, na etiologia da ansiedade, aspectos biológicos, para
ele, as crianças ansiosas possuem uma predisposição genética (temperamento) que
facilitaria o desenvolvimento de medos e da ansiedade; os estilos educativos dos pais
podem contribuir para que a criança desenvolva altos níveis de ansiedade. No entanto,
a combinação ou a interação entre as duas hipóteses citadas acima sào fatores
importantes para o desenvolvimento da ansiedade infantil.
Wood, McLeod,, Sigman, Hwang e Chu (2000) categorizaram três práticas educativas
que podem ter relação com o desenvolvimento da ansiedade em crianças através de um
levantamento de pesquisas realizadas nessa área que descrevemos a seguir:
1) aceitação: caracterlza-se por uma interação entre pais e filhos, onde os pais reforçam
positivamente os comportamentos adequados de seus filhos, suas expressões verbais
de sentimentos e emoções. Gottman, Katz e Hooven (1997), relatam que país que
reforçam a expressão de emoções e sentimentos negativos em suas crianças, fazem
com que estas aprendam a tolerar situações estressantes, reduzindo a probabilidade
da criança para desenvolver transtornos de ansiedade.
2) controle: é definido pela literatura como uma excessiva regulação das atividades e
rotinas da criança pelos pais, tomada de decisão autoritária, superproteção ou instruções
de como a criança deve sentir e pensar (Barber, 1996). Os processos comportamentals
freqüentemente observados na definição de controle são identificados como o
reforçamento do comportamentos de dependência das crianças para com seus pais.
Isto que pode contribuir para a formulação de regras pela criança de que ela não possui
controle sobre seu ambiente (Chorpita & Barlow, 1998), e o não reforçamento(extinção)
e/ou punição de comportamentos que promovam a autonomia da criança pelos pais.
3) modelagem de comportamentos ansiosos: pais que freqüentemente modelam
respostas de fuga/esquiva de situações aversivas não tornam suas crianças efetivas

484 V.ir.i Kupcrsicin Inflborm.in, Roseli I kiuci


em emitir comportamentos para enfrentar situações aversivas e elas dificilmente
dosenvolvem comportamentos que podem reduzir a ansiedade. Pais que modelam
freqüentemente comportamontos ansiosos encorajam a criança a ver os problemas de
uma maneira catastrófica, extinguindo ou punindo expressões de enfrentamento e
estratégias de sotuçào de problemas pela criança, Freqüentemente estas crianças
possuom regras de que não há como onfrentar efetivamonto os problemas, acreditando
que não possuem controle sobre seu ambiente.
Quando os pais falham em dar as crianças oportunidade em emitir
comportamentos em direção a independência próprios de sua faixa etária como se vestir
o comor sozinha,não favorecendo esses comportamentos, podem fazer com que a criança
não desenvolva uma percepção de controle e autonomia no mundo que a cerca, fazendo
com que a criança aumente sua dependência para com eles Wood et al (2003).
Entre as crianças que apresentam altos Índices de ansiedade, esta
dependência, e as contingências de reforçamento estabelecidas pelos seus pais podem
rosultar em ansiedade de separação e/ou desamparo aprendido, que está associado
com altos índices de ansiedade (Wood et al, 2003).
Uma excessiva preocupação e uma excessiva responsividade dos pais em
uma situação que inicialmente elicia respostas de ansiedade nas crianças, pode
sensibilizar a criança para a situação fazendo com que ela a evite não se expondo e não
se habituando.
Exemplo: quando os pais permanecem com a criança quando ela começa a
freqüentar a escola e apresenta sinais de ansiedade. Nesta situação os pais estão
reforçando comportamentos ansiosos com atenção e simultaneamente interferindo com
aprendizagem social da criança e a habituação a novos contextos sociais onde ela estará
separada deles e confrontada com a interação social entre seus pares. (Wood et al, 2003)
Pais que encorajam suas crianças a participarem de atividades sociais e retiram
o reforço para comportamentos de inibição, contribuem para que a criança não
desenvolva comportamentos fóbicos em suas interações sociais. (Wood et al, 2003)
Segundo Wood et al (2003), as posquisas que utilizam métodos observacionais
e de relatos dos pais e dos filhos, envolvendo suas interaçõts, contribuem para entender
a etiologia de origem das reações de ansiedade na criança.
Zanoni (2003), em pesquisa realizada com crianças de primeira série em
entrevistas com suas mães encontrou: uma correlação negativa entre autonomia e
controle, indicando quo mães que utilizam controle demonstram menos comportamentos
que levam suas crianças à independência; uma correlação negativa entro controle e
interação verbal simples, que poderia estar indicando que mães que utilizam o controle
estão constantemente dando ordens ou instruções aos seus filhos, sem levar em
consideração as condições de estimulo relevantes para a criança.
A análise das práticas parentais no desenvolvimento de transtornos ansiosos em
crianças estende a teoria sobre o desenvolvimento da ansiedade infantil através da identificação
de comportamontos parentais específicos que podem influenciar em seu desenvolvimento e
manutenção, e como a criança irá regular a ansiodade em situações especificas.
Passemos agora á análise comportamental da depressão na infância.
A etiologia da depressão na infância ó multifatorial, envolvendo fatores genéticos
o ambientais, e, nestes estão as interações pais-filhos, a perspectiva da análise do
comportamento, descreve a depressão como diminuição de comportamentos
positivamente reforçados e aumento de respostas de fuga e esquiva

Sobre (.'omport.imcnlo e C'opniv<1o 485


O padrão de reforçamento estabolecido entre pais e filhos foi analisado por Ferster
(1974) e Ferster e Culberston (1977) em relação à promoção do repertório do indivíduo
deprimido- a depressão representa um aumento de respostas de fuga e esquiva (p. ex.
choro, isolamento); um decréscimo de comportamentos positivamente reforçados (p. ex.
habilidades sociais, comportamonto de aproximação); o esquiva o outras rospostas
(JutormiiKiritm polo controlo hvoisív o impodorn o com portam onto positivHmonto roforçado.
Comportamontos bizarros e/ou eufóricos podem aparecer na ausôncia de
comportamontos mais complexos para serem reforçados.
A passividade do indivíduo deprimido é outra característica importante e
representa uma ação indireta sobre o ambiente a partir de estímulos avorsivos, por
oxemplo, o depressivo tendo ao silêncio nas interações sociais que para ole representam
eventos aversivos.
Para Ferster (1974) e Ferster e Culborston (1977), ao longo do desenvolvimento
de uma criança, as respostas depressivas se desenvolvem principalmente na relação
com seus cuidadores. A baixa freqüência do reforços positivos, o inclusive a falta do
reforçamonto às respostas de aproximação, contribuem para um repertório sôcial
limitado. "Pode haver uma interrupção no reportório de percepção da criança, quando
ocorro uma interferência séria e uma interrupção nos reforçadores que mantêm as
atividades da criança." (p. 711).
Como as atividades normais da criança tôm reforçamento falho, o subproduto
pode ser uma reação emocional em larga escala. Estas manifestações emocionais
primitivas e atávicas - em geral de frustração e irritação - influenciam o ambiente
familiar e vão sondo reforçadas em função da aversividade que provocam no adulto, nao
acontecendo o reforço diferencial para nuances de comportamentos. Assim, a percepção
de mundo e o repertório de comportamentos interpessoais sofrem um retardamento
quanto ao desenvolvimento normal da criança.
Outro esquema de reforçamento na relação pais-filhos suscetível a perdas
comportamentais é aquele que exige um número elovado de desempenhos para produzir
mudanças no meio O efeito ó o enfraquecimento do determinados comportamentos
quo desonvolveriam um ropertório ativo do indivíduo (Ferster e Culberston, 1977).
O controle aversivo também é um padrão freqüente na interação pai-filho que
gera rospostas depressivas. Este controle punitivo reprime as respostas agressivas da
criança e colabora para um repertório social de passividade. "A repressão de
comportamentos que seriam punidos parece constituir um fator potencialmente grave
na produção da depressão porque requer a contribuição de uma parte considerável do
repertório de uma pessoa, que fica comprometida em atividades que não produzem
reforçamento positivo." (Ferster e Culberston, 1977, p. 719).
Portanto,o modolo proposto por Forster sobro as Interações pais-filhos na
depressão inclui: baixo reforçamonto positivo de comportamentos do filho; falta de
reforçamonto diferencial para respostas de aproximação relativas a comportamentos
socialmente adequados; reforçamonto de respostas emocionais intensas da criança;
exigência, sobre a criança, de altas taxas de desempenho para obtenção de reforçamento.
Menegatti (2002) pesquisou as respostas dos pais e mães no dia-a-dia de
suas interações com seus filhos, mesmo sem um diagnóstico estabelecido de depressão
para a criança procurando fatores para a provisão das conseqüências, para a criança a
partir das operações comportamentais envolvidas nas interações com seus pais, que
podom lovar a comportamentos depressivos. Para este estudo desenvolveu questionário

486 v,„. Kiipersleln litgbcrmun, Roseli I l.iucr


com base no corpo teórico acima apresentado, com quinze questões de múltipla escolha
quo permitem detectar cinco classes de comportamento da interação pais-filho que
podem ser condições para a depressão, a saber:
1) Interações com baixa freqüência de reforço positivo:
2) Interações que reforçam reações primitivas e atávicas da criança;
3) Interações com uso de controle aversivo e que inibem a expressão de respostas
agressivas da criança;
4) Interações que não provôm reforçamento diferencial para a discriminação de emoções;
5) Interações que emitem reforço positivo somente a partir de um número muito elevado
de desempenhos da criança.
As questões do questionário desonvolvido especificam contingências para a
emissão de reforçamento entre pais e filhos, buscando as relações afirmativas se,.,
então... "A cláusula "se" pode especificar algum aspecto do comportamento ou do ambiente
o a cláusula "então" especifica o evento ambiental conseqüente” (Souza, 1997, p. 83).
Cada questão apresenta situações da vida diária do convivio entre pais e filhos
para vorificar a conduta dos país diante de determinadas situações e contém três
altornativas de resposta: uma envolvendo emissão de reforçamento positivo ou negativo;
outra envolvendo controle avorsivo (punição); e a terceira apresentando ausência de
reforçamonto (esquemas de extinção).
Os dados quo puderam ser observados nas interações pais—filhos na pesquisa
realizada: confirmam uma relação positiva entro a depressão infantil e as práticas parentais;
nas entrevistas com os pais ficou evidente que o relacionamento destes com seus filhos
implica na diminuição progressiva de reforçamento positivo contingente e suas
conseqüências, especialmente nas relações mãe-filho, em que a baixa disponibilidade
das mães e a baixa solicitação dos filhos para com elas são conseqüências observáveis e
funcionalmente relacionadas; o uso de controle aversivo e seus subprodutos
(comportamentos de fuga e esquiva, respostas emocionais de frustração, por exemplo)
também foram relatados e pode-se pensar que eles apareceram como diferenciais usando-
se somente a entrevista para obtê-los, e que a observação direta poderia ampliar a magnitude
dessas diferenças, uma vez quo o relato podo não sor tão preciso em relação aos fatos,
pois o entrevistado pode dar descrições socialmonte aceitávois. (Monegatti, 2002)
A preocupação do analista do comportamento é com a função que determinado
comportamento tem e não sua causa, conhecendo a dependência e a inseparabilidade
entre os fenômenos (Matos, 1999). Cabe aqui lembrar as observações de Ferstor (1966)
no seu texto HA transição do laboratório animal para a clínica", que, registrando as
interações entre uma terapeuta e uma criança autista, escreveu: “embora tenha visto
aplicações de todos os princípios de comportamento que conhecia, havia aí um conteúdo
que não poderia vir só das experiências de laboratório. Eu podia fazer uma análise
funcional da interação, mas não poderia tê-la planojado" (Fortser, 1966, p.4).
As relações de reforçamento e punição que se estabelecem no contexto familiar
não são lineares, mas sim produtos de influências contínuas e recíprocas, cujos padrões
podem ser conhecidos polo levantamento de hipóteses e execução de análises funcionais.
As conclusões de Menegatti (2002) mostram que nos relatos dos pais e mães
das crianças com indicativos de depressão há comportamentos que indicam: provável
história de baixo reforçamento positivo e suas conseqüências; baixa solicitação dos
filhos para com seus pais e principalmente para com suas mães; mães pouco
disponíveis para solicitações cotidianas de seus filhos.

Sobre Comportamento c CogniçAo 4 8 7


Observa-se ainda: o uso de controle aversivo em relaçào às crianças com
indicativos de depressão; reforçamento de expressões emocionais intensas da criança;
não foi possível confirmar se esses pais e mães exigem de seus filhos altos
desempenhos (esquemas de razão fixa) para que se estabeleça o reforçamento; esses
resultados estão baseados nos relatos verbais do pais e mães, a genoralização das
relações funcionais ora observadas devorá ser confirmada pota observação direta do
comportamento, que ó o passo seguinte da analise funcional.
Passemos ao terceiro exemplo o do comportamento social. Através da análise
do comportamento podemos identificar, definir, analisar os antecedentes e conseqüentes
do comportamento social. Determinadas condições ambientais possibilitam o
dosenvovimento do comportamento identificado como socialmente habilidoso ou pró-
social, assim como do comportamento apontado como anti-social. O comportamento
socialmente habilidoso ó resultado da relação familiar, do contexto cultural e dos padrões
de comunicação, classificados conforme a idade, sexo, classe social, e educação.
Para Skinner (1998) O comportamento social pode ser definido como o
comportamento de duas ou mais pessoas em relação a uma outra ou om conjunto om
relação ao ambiente comum. Estão presentes no comportamento social, de acordo com
Catânia (1999) diferentes tipos de contingências sociais: aprender sobre os outros
(discriminar); aprender com os outros (aprendizagem por observação e por imitação);
comportamento verbal(origens sociais da linguagem-informado sobre as contingências);
aprender sobre si próprio (auto conhecimento, discriminar o nosso próprio comportamento)
Para Argylo (1976) O desenvolvimento do Comportamento Social inicia-se na
infância com as primeiras trocas sociais entre a mãe e o bebê, em seguida a família
exerce seu papel, seguida dos grupos sociais como a escola e a comunidade. Destas
trocas que acontecem, a criança começa a desenvolvor o auto-conhocimento e com
este a auto imagem, a auto estima. Portando, é da historia de aprendizagem e da
interação do individuo com o meio que se desenvolverão comportamentos sociais. As
respostas sociais emitidas são controladas pelas contingências. Estes comportamontos
sâo avaliados pela comunidade como habilidosos ou antisociais.
Na alta habilidade social, as práticas parentais mais determinantes são o
estabelecimento de regras claras, a monitoria positiva e o modelo moral. Na baixa
habilidade social, os pais se caracterizam por humor instável, utilizam estratégias de
punição e supervisão estressante e ainda apresentam comportamento negligente com
relação à criança. (Gomide, 2005)
O processo de socialização depende da intoração da criança com o grupo
social mais amplo, de sua capacidade de aprendizagem, desta forma sente-se atraída
pelo estímulo social, desenvolvendo comportamento pró social no contexto escolar. O
comportamento pró social no contexto escolar implica em habilidades de organização,
cooperação, competição, obter gratificação, ser capaz de desenvolver amizade
(aproximação, agrado), rospeito, assertividade, tolerância, permeabilidade(avaliaçâo
crítica), responsabilidade o liderança. (Duran 1976)
No comportamento anti-social a punição gera emoçõos e predisposição
para fugir, rotrucar e ansiedade, o controlo autoritário ó utilizado na família, nos sistemas
educacionais, religiosos, legais e policiais. (Skinner 1998). Quando ocorre punição e
falta de afeto aparece o comportamento anti-social. Para (Patterson , 1992), Fatoros
genéticos determinam que algumas crianças nascem com predisposição para serem
irritadiças, desenvolvam birras e desobediência. Quando os pais usam reforço e punição
de forma não contingente, o comportamento anti-social se estabolece.

488 Y.ir.i Kuperstcin Infiberm.m, Roseli I liiuer


Para Kazdin(1998), o comportamento anti-social é levado para a escola e vai
implicar em dificuldades académicas e de habilidades sociais tendo como conseqüência
deficiência na aprendizagem de padrões comportamentais e cognitivos que deveriam
ocorrer na família e no grupo social. Quando isto não ocorre pode ser treinado.

Referências

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Sobre lomportdmcnto c Coflnivilo 489


Capítulo 43
Terapia familiar: um enfoque de
vanguarda?
* Yara Kuperstcin Inflbenmm
C FT FC C /IE P A C /U N ICE N P

Este trabalho se propõe a um levantamento do quo vem sendo feito sob o nome de
Terapia Familiar de Abordagem Comportamental, assim como os direcionamentos que
vem sendo dados ao atendimento terapêutico com famílias.
A terapia comportamental de famílias desenvolveu-se da aplicação dos princípios
da teoria da aprendizagem em diferentes grupos de clientes em ambientes diferentes.
(Fallon e Lillie, 1988).
Não se pode dizer que haja uma teoria de terapia familiar, assim como não há uma
de terapia infantil ou de adultos. A intervenção comportamental com famílias está,
historicamente, diretamente ligada com a história da modificação do comportamento. A
visão de como são adquiridos, modificados e mantidos os comportamentos para o
behaviorismo levou à ênfase na importância de envolver os pais, professores e outras
pessoas significativas como mediadores ou agentes de mudanças terapêuticas (Sanders
& Dadds, 1993).
Fallon (1988) cita, como exemplo de proposta inicial de trabalho com famílias no
início da terapia comportamental, intervenções com crianças: Williams (1959), Lovibond
(1963), Boardman (1962), Risley e Wolf (1962): técnicas de terapia conjugal, Liberman
(1970); contrato de contingências, Stuart (1959); terapia sexual Masters e Johnson ( 1958)
; ênfase no treinamento de pais, Becker (1974) os pais também são professores, e Patterson
com (1974).
Atualmento, a maior influência, ó de autores como Jacobson (1985), Patterson
(1992), Sanders e Dadds (1993), Sanders (1996), Webstor-Stratton e Horbert (1994), Mattaini
(1999).
Cita ainda, quo Liberman (1970) considera que as famílias que vem para tratamento
conviveram com o comportamento mal adaptado de um de seus membros respondendo a
ele através dos anos com raiva, reclamações, cuidados, conciliação, irritação ou simpatia.
Estas respostas, mesmo punitivas como parecem superficialmente, tem o efeito de reforçar
o desvio, isto ó, aumentar a freqüência ou a intensidade do comportamento desviante no
futuro. Para ele, em várias famílias com membros desviantes, há pouca interação social e
os membros tendem a levar vidas relativamente isoladas uns dos outros. Por causa desta
lacuna de interação, quando a interação ocorre em resposta ao comportamento anormal de
um membro, este comportamento é poderosamente reforçado. Como proposta de
intervenção o autor, propõe que mudar as contingências pelas quais o paciente obtém
aprovação e cuidado de outros membros de sua família é o princípio básico da aprendizagem
que da base à terapia. O reforçamento social é tornado, na terapia, contingente ao
comportamento desejável (adaptativo), ao invés do indesejável (mal adaptativo). Propunha
técnica em três passos para o terapeuta: criar e manter uma aliança terapêutica positiva;
fazer uma análise comportamental do problema; o diagnóstico se constitui de uma análise

490 Y.im Kuperstcin IriRbermun


funcional dos problemas; implementar os princípios do reforçamento e da modelagem no
contexto das interações interpessoais em ação.
Patterson (1974), afirma quo a modificação de comportamento foi um movimento
social que teve um impacto acumulativo no campo do tratamento da família e que duas
características de seus fundamentos produziram este impacto: a primeira foi seus fundamentos
baseados na obra de Skinner (1953), Ciôncia e Comportamento Humano, quando a proposta
de que mudanças nas contingências de reforçamento formam uma base poderosa para a
modificação do comportamento humano. Aplicá-las parecou relativamente fortalocodor por chegar
diretamente ao ambiente social, o lar ou a sala de aula e alterou-se as contingências em direção
ao comportamento pró-social. Foi uma idéia completamente nova e funcionou. Esta
premissa simples levou ao desenvolvimento de tecnologias para a mudança de comportamento
em familias, instituições, salas de aula e outros.
A segunda foi a combinação de duas idéias diferentes, a de que se deveria entrar
no mundo real e observar quais contingências haviam sido aplicadas antes durante o
depois da intervenção. Isto se seguiu naturalmonte da posição skinneriana combinando-
se com o emergente movimento ecológico do grupo de Roger Barker: com o
desenvolvimento de sistemas e códigos de observação e mais precisamente a descrição
da linha de base, a intervenção e o acompanhamento das mudanças. O dosenvolvimento
de uma tecnologia de observação para medir mudança comportamental continha as
sementes para uma nova Idéia, era possível descrever precisamente seqüências da
interação familiar, e então fundar o trabalho de base para o acúmulo gradual de um sólido
corpo de informações sobre a mudança da família.(Fallon, 1988)
Para Patterson (1974), a terapia familiar se fundamenta na necessidade de continuo
progresso no uso sistemático do método científico. Como resultado, todos os expoentes do
método serão constantemente envolvidos com o processo de refinamento, cada clínico é
um pesquisador, cada membro da família é um sujeito de pesquisa, e cada pesquisador
está contribuindo para o avanço da clinica. (Patterson 1988)
Patterson, Dishion & Reid (1992), organizam o conjunto das pesquisas em uma
formulação teórica. São trabalhos que enfocam diferentes problemáticas de comportamento,
baseadas no uso de técnicas. Tem a preocupação em implementar os princípios do
reforçamento e da modelagem no contexto das interações interpessoais em ação. Não
apresentam, neste início, uma visão de um todo de interações entrelaçadas que ocorrem
nas relações de uma família ou desta com seu entorno. O terapeuta atua como um educador,
usando seu valor como reforçador sociai para instruir a familia em mudar suas formas de
relacionar-se. Uma maneira útil de conceitualizar estas táticas, é vê-las como experimentos
de mudanças comportamentais nos quais o terapeuta e a família juntos re-programam as
contingências de reforçamento.
Caracterizando ainda o trabalho com famílias de crianças em tratamento, Sanders
e Dadds (1993), usam a designação intervenção familiar comportamental como um termo
genérico utilizado para descrever um processo terapêutico que procura efetuar mudanças
no comportamento da criança, e conseqüentemente no seu ajustamento, por mudanças
em aspectos do ambiente familiar que afetam o problema comportamental da criança.
Sanders (1996), expande a idéia afirmando que estas intervenções tem como
objetivo processos interacionais que são aceitos como sendo relacionados à etiologia,
manutenção, exacerbação ou falta de atenção no desenvolvimento de uma criança.
Para ele, o foco das intervenções está em alterar o comportamento dos pais com
relação a seus filhos, mas pode incluir a mudança do outros aspectos do funcionamento
da família como relações conjugais, o comportamento de avós, irmãos, pessoas que
cuidam da criança e o provimento de atividades adequadas à idade em casa.

Sobre (.'omport.imcnlo c (.'oRni^o 491


Sanders (1996), apresenta cinco níveis de opção para intervenções com famílias
descritos na literatura:
Recomendações especificas - instruções breves por escrito ou vídeo
modelagem sobre como resolver problemas específicos, sem contacto com o terapeuta:
Rocomendações especificas com um contacto mínimo com o terapeuta;
instruções por escrito combinadas com breves contatos com o torapouta diretamente
ou ao telefone; recomendações específicas com treino ; combinação de instruções,
modelagem, e feedback focados em ensinar os pais como manejar problemas
específicos.
Treino comportamental intensivo com os pais - métodos de treinamento
similares ao nível dois , no entanto o foco está na interação pais criança o na aplicação
de diversas tarefas do cuidados para uma variedade de problemas. Incluem treinamento
em controlo de estímulos antecedentes em técnicas de manejo de contingências.
Intervenção comportamental familiar - devo envolver todas as anteriores mas,
em adição, outros problemas familiares são abordados como problemas conjugais,
stress, depressão o manejo de raiva.
Todas estas Intervenções atingem a família mas apenas o último nível se
aproxima do quo se descreve como Terapia Familiar. Esta tem como objetivo do trabalho
terapêutico estabelecer novas reações funcionais que levem a uma alteração do
comportamento dos membros da família para alcançar padrões mais adaptatívos de
funcionamento de acordo com a dificuldade que esteja afetando o grupo familiar:
distúrbios de conduta da criança; problemas conjugais; relacionamento pais e filhos;
etc... Não se trata mais de treinar os pais para mudar seus comportamentos para com
isso conseguir alteração do comportamento dos filhos, mas de promover processos do
discriminação e alteração de comportamentos dos membros da família cujo resultado
afeta a todos os membros da família, em direção a uma maior adaptabilidade aos seus
próprios objetivos a aos do grupo familiar.
Tendências nos trabalhos com pais em relatos de alguns terapeutas brasileiros:
Marinho e Silvares (2000) pais de crianças com queixas diversificadas: Os
problemas de comportamento apresentados pelas crianças eram devidos,
principalmente, ao padrão de interação familiar; intervenções desenvolvidas de forma a
produzir mudanças ambientais através de intervenções junto aos pais desenvolvendo
habilidades envolvidas em ensinar e promover comportamentos adaplativos nos filhos;
propõe três modelos de atendimento: psicoterapia parental; orientação parental mais
psicoterapia infantil; e treinamento de pais.
Para Marinho e Silvares (2000), é importante, aprender a observar e valorizar o que o filho
faz de adequado; mudanças na auto-percepção e na percepção de aspectos do próprio ambiente;
ensinar os pais a fazerem análise funcional de seu comportamento e do comportamento da
criança; e adotar estratégias de solução de problemas para situações futuras.
Rocha e Brandão (1997) enfocam a importância do auto-conhecimento dos
pais na análise e modificação de suas interações com os filhos. Ênfase na dinâmica
familiar para o entendimento do comportamento infantil, defendendo a mudança de
atitude por parto dos que trabalham com crianças. Nesta busca, o auto-conhecimento é
importante, Criticam a orientação de pais tradicional com base no conceito de Skinner
(1983), de que a orientação só é efetiva na medida em que o controle é exercido, isto é,
aumenta a probabilidade da ocorrência de um determinado comportamento. Guiadas
por uma visão Skineriana, baseada na auto-observação, para “trazer à consciência"
uma parcela daquilo que é feito e das razões pelas quais as coisas são feitas, propõe
um trabalho com grupo de pais na qual os pais falam sobre os filhos, os pais falam das
interações, os pais falam sobre si mesmos, os pais estabelecem novas contingências.

492 Y.ir.i Kuprrstrin ln#brrro.in


As autoras apontam para a importância do atendimento a pais para o
restabelecimento de uma relação pais e filhos mais adequada.
Regra (1997) propõe a inclusão de entrevista familiar baseada na técnica de
questionamento reflexivo, na avaliação de casos em clinica escola. Na entrevista coloca
questões que tem ao mesmo tempo o objetivo de levantamento de dados de provocar
mudanças. A família conclui, junto com o terapeuta, sobre alternativas de comportamento
mais funcionais do que as que vêm usando, aumentando a probabilidade de mudanças
e de que a orientação seja seguida.
Como podemos observar: o desenvolvimento de alternativas que tom, cada vez
mais, como base a análise do comportamento abandonando a opção do comportamento
controlado por regras emitidas pelo terapeuta que caracterizava as abordagens
tradicionais. Passam a enfocar o trabalho com base no comportamento regido regras e
seguido pela análise das contingências, que podem ser observadas e modificadas
pelo próprio cliente ao apropriar-se da possibilidade de fazer suas próprias análises.
As propostas se diferenciam cada vez menos, com relação à abordagem, o
que se tem chamado de orientação e terapia, no entanto, novos enfoques, abrangendo
todo o grupo familiar, têm sido desenvolvidos.
Mesmo neste texto ainda estamos com uma visão muito centrada na criança e
seus pais. Um enfoque familiar deve ser mais amplo, envolvendo o contexto no qual o
comportamento ocorre. A análise comportamental da familia progrediu das hipóteses
iniciais dos primeiros terapeutas de família às pesquisas interacionistas e deram cada
vez maior suporte aos profissionais. As estratégias de intervenção diferem de acordo
com o padrão de comportamento persistente do cliente.
Webster-Stratton e Herbert (1994) apresentam proposta inovadora no trabalho,
um processo colaborativo voltado ao trabalho com pais de crianças com transtorno
desafiador opositivo. Sua preocupação é com a cooperação dos pais no processo do
tratamento da criança, analisa o problema pela perspectiva dos pais, estudando seus
depoimentos, procurando soluções para quo estes fiquem sob controle de estímulos
naturais para a situação. Trabalham por modelagem e modelação novas alternativas
para pais lidarem com suas crianças.
Os autores defendem que apenas uma posição colaborativa com o terapeuta
pode levar pais a executarem tarefas com custo de resposta tão alto como controlar o
comportamento opositor já fortemente instalado. O objetivo ó aumentar o poder dos pais
(como controladores do comportamento da criança), ensinando-os a lidar mais
efetivamente com suas crianças. Levantam a questão de que simplesmente treinar pais
em habilidades parentais não é suficiente. Estes programas são inadequados para
abranger os problemas múltiplos e complexos que são evidentes nestas famílias e om
engajá-las em um processo de tratamento eficiente. (Webster-Stratton e Herbert, 1994).
Para eles, a descrição de programas para pais não elucidam os mecanismos do
treinamento do pais ou o processo de terapia em andamento. O que fazem exatamento os
terapeutas para modificar comportamentos, atitudes e práticas no treinamento de pais?
Consideram quo muito ainda deve ser feito para responder osta pergunta e se
dispõe a respondê-la através da descrição e análise do processo colaborativo implementado
ontro terapeuta e pais om seu programa na Parenting Clinic at de University of Washington.
School of Nursing. Sua proposta é de que mesmo com seu treino como "behavioural family
therapist" sem oliminar o trabalho, se necessário, com a criança. (Herbert, 1994, p. XVIII)
Mattaini (2001), apresenta o enfoque ecocomportamental na terapia familiar. Leva
em conta a configuração dos eventos nos quais uma familia funciona considerando duas
dimonsões: a horizontal, epistemológica (se refere a como a realidade é percebida e

Sobre (.’ ompodimento e (.'oflniíilo 493


conhecida). Nesta, a maior mudança foi o reconhecimento de que os problemas tinham de
ser interacionais, e que a família é mais que a soma das forças e patologias de seus
membros individuais. Defendem que pensando contextualmente, as conexões de todos os
olomontos om interação no caso (pessoas, eventos e trocas) são reconhecidos; e a vertical
que se rofore à "modalidado" da análise ou da intervonção podondo ser individual, familiar,
ambiontfil Na oriontaçâo eoocomportamontal a intorvonçflo sorá efotivada quando o onda
houvor sentido na leitura do contexto.
Suas abordagens ao problema são baseadas na aceitação. Pensando
contextualmente a tarefa, o torapouta ó construtor, com a família, de uma melhor configuração
de vida, um processo no qual cada um pode contribuir o no qual todos compartilham
responsabilidade.
Não envolve apenas ver todos os membros da família ao mesmo tempo ou não
Para a intorvonção lida com os conceitos básicos da análise do comportamonto
levando em conta o comportamento seja ele motor, vorbal.observacional, ou visceral; as
conseqüências: os comportamentos são setocionados no ambiente atravós das conseqüências
que produzem; os antecedentos; o as ocasiões nas quais o comfxxtamento ocorro.
Para Mattaini (2001) a dinâmica comportamontal da família inclui todas as suas
interações, na família e fora dela.
Portanto, no processo terapêutico não se define que urna abordagem á família
seja uma terapia familiar pola presença de todos os membros da família na sala do terapeuta,
mas pelo enfoque nos processos interacionais da família quo podem ser analisados junto
a um, dois ou mais de seus membros.
A visão é de que um padrão de comportamento que lovo todos os elementos de
uma família ao sofrimento, pode ser a única forma quo esto grupo tem de sobreviver uma
vez que os repertórios mais adaptativos do seus mombros não podem ser efetivados no
momento ou não foram aprendidos.
Neste sentido a Terapia Comportamontal, sempre foi uma terapia de famílias.
Ao considorar a intoração organismo ambiente como base de suas análises, o
terapeuta comportamontal amplia as fronteiras com as abordagens contextuais.
O trabalho com o grupo familiar ou com dois ou mais elementos da família pode ter
vários procedimentos como: discriminação: do próprio comportamento, do comportamonto do
outro e das relações entre estes comportamentos; a modelação através de modelos de interação:
fomocidos por elementos do grupo; fornecidos pelo torapeuta; fornecidos pela observação de
outras pessoas; desenvolvidos em conjunto pelo grupo familiar. (Ingberrnan, 2000)
A análise funcional é realizada em dois níveis: a) molar, quando se está
analisando o contexto amplo em que os comportamentos ocorrem e; b) molecular, da
rolação dos componontes do grupo entre sl e com o terapeuta, que podem sor encaradas
como representando uma amostra do comportamento dos elementos do grupo familiar
em intoração (Ingberrnan, 2000).
O torapouta precisa escolher a qual destes níveis vai dar atenção a cada etapa
do processo, tomando decisões importantes para o desonvolvimento do trabalho. Por
exemplo, fala-se de um fato que permite ao torapeuta ter compreensão acerca da história
de aprendizagem dos comportamentos que a família apresenta, ao mesmo tempo que
se observam padrões mútuos de reforçamento e punição na sessão (Ingborman, 2000).
Trata*se de uma aplicação dos princípios da análise do comportamonto á
intervenção om problemas que se configuram no contexto da família.
Como terapeutas comportamentais não partimos do princípio que uma alteração
om um dos elomentos do sistema familiar provoque alteração om todo o sistema como

494 Viifii Kiiperslein Infllnrrtnan


acontece na abordagem cibernética. O planejamento, na abordagom comportamental,
deve abranger padrões comportamentais a serem modificados em direção a uma
interação entre seus membros que seja mais reforçadora e menos aversiva. Esto
processo não se dá de forma natural pela própria dinâmica do grupo mas deve ser
garantida1, através da possibilidade de sua efotivaçôo ao existir no repertório ou ser
treinada caso não esteja disponível.
Por fim. Terapia Familiar na abordagem comportamental pode ser considerada
um enfoque de vanguarda?
Enquanto analista do comportamento analisando o próprio comportamento
pode ver que não houve mudança na proposição inicial baseada no modelo skineriano.
A variação decorre da extensão da análise feita, dos determinantes incluídos,
das ostratógias para a mudança possíveis e em conseqüência de como se vai
administrar a inclusão ou não de membros da família no processo.
Portanto, enquanto analistas do comportamento, desde as primeiras intervenções,
fazem intervenções no campo hojo delimitado como sendo da Terapia Familiar.

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Sobrc Comportiimenfo c CoRnlç.1o 495


Capítulo 44
Intervenção de acompanhantes
terapêuticos em caso de
transtorno bipolar e
comportamentos evitativos no
trabalho e perante outras
responsabilidades
M aria Zilah da Silva Brandâo,Camila Carmo de Mene/es, Fernanda Marques
Jacovozzi, Jéferson Simomura, Ligia Betencurt, Renata Cristina Alves da Rocha,
M aria Qabriela Santana.
PsicC - Instituto de Psicoterapia e Análise do Comportamento.

A utilização de acompanhamento terapêutico


Segundo Vianna e Sampaio (2003), pode-se definir o acompanhamento terapêutico
como uma forma de intervenção e/ou complemento de um tratamento multidisciplinar, no
qual o acompanhante terapêutico (AT) vai até o ambiente natural do cliente, intervir diretamente
no comportamento problema. "A etimologia da palavra define que "acompanhante" è a
pessoa que dá assistência e "terapêutico" é igual a curativo, medicinal, que provoca
mudança" (BALVEDI, 2003).
Apesar de não haver consenso em relação ao surgimento do AT, pode-se dizer que
o papel de AT surgiu na década de 50, juntamente com os primeiros trabalhos do movimento
antimanicomial, como uma altornativa às condutas terapêuticas hospitalares, principalmente
na Europa e nos Estados Unidos. Porém, a denominação AT ainda não ora designada a
esses acompanhantes.
Segundo Vianna e Sampaio (2003), na década de 60, com as Comunidades
Terapêuticas, os pacientes recebiam um tratamento mais intensivo e individualizado e a
relação afetiva interpossoal assumia uma importância primordial. Surgiram, então, nesse
contexto, os “auxiliares psiquiátricos".
Na década de 70, com o fechamento de Comunidades Terapêuticas, os auxiliares
psiquiátricos foram solicitados para trabalhos particulares, na residência do paciente, como
uma alternativa à internação psiquiátrica. Inicialmente, foram denominados "amigos
qualificados", mas posteriormente, o termo foi substituído por "acompanhante terapêutico".
Embora a abordagem que fundamentava essa atividade fosse a psicanalitica,
também nas décadas de 60 e 70 começaram a difundirem-se as aplicações da Análise do
Comportamento à problemas humanos, ao que se denominava Modificação de
Comportamento. Em meados da década de 80, muitos Analistas do Comportamento
assumiram uma prática terapêutica do consultório. Contudo, no inicio da década de 90,

496 Miiriii /iliih do Silva Rr>it>di)o,C<imilii L\irmo dc Mcnc/cs Icmiirulii Murques J.icovo/71, Jéfcríon
Slmomuru, l lgi.i Hclcncurt, Rcn.it<i Cristmd Alves d.i Roib.i , M.m<i l/.ihrichi .
houve um retorno desses às práticas de acompanhamento terapêutico, devido aos "bons
resultados da aplicação de técnicas comportamentais no tratamento de diversos transtornos"
(Zamignani e Wielenska, 1999, p. 159).
Para Vianna e Sampaio (2003), todo Analista do Comportamento busca acesso
fidedigno às contingências mantenedoras de comportamentos disfuncionais do cliente.
Atravós do relato do cliente, bem como de outros instrumentos, tais como escalas, testes
padronizados e entrevistas com os familiares, obtém-se dados para Análise Funcional, a
qual aponta caminhos para um projeto terapêutico. Porém, nem sempre se obtém na
clinica uma garantia total de que os objetivos definidos entre cliente e terapeuta se concretizem
e o comportamento problema seja modificado.
Algumas dificuldades, como casos graves e crônicos, impossibilidade de lidar
com o conteúdo verbal e dificuldade de acesso à dinâmica familiar do indivíduo, levam os
profissionais a buscarem o AT para concretizar modificações, acelerando o processo
terapêutico e facilitando a manutenção dos ganhos. Segundo Balvodi (2003), diversos
transtornos podem ser acompanhados terapeuticamente: alimentares, do humor,
obsessivos compulsivos, ansiosos e fóbico-ansiosos, somatoformes, etc. Também casos
psiquiátricos e/ou neurológicos, psicoses, autismo, paralisia cerebral, dependências
químicas, dentro outros, podem se beneficiar dessa forma de intervenção.
O trabalho no ambiente natural propicia condições para a conseqüenciação imediata
do comportamento, o que gera um maior poder de controle sobre a situação em questão. O
ambiento natural do cliente oferece uma rica variedade de estímulos que permite maior
variabilidade de comportamentos e, assim, maiores oportunidades do novas rospostas
serem emitidas, reforçadas e generalizadas.
Além disso, o AT serve de elo entre o cliente, a equipe terapêutica responsável e a
família. Segundo Oliveira (2000), o acompanhante terapêutico podo reforçar adequadamente
os esforços tanto do cliente quanto de sua família, orientar o cliente em suas tarefas diárias,
garantindo o exercício das atividades programadas; realizar o levantamento de dados da
relação familiar e de contingências da vida do cliente, atravós da observação participanto;
repassar os dados novos, levantados atravós da observação ao profissional ou equipe
responsável polo caso, para a análise das novas contingências percebidas e assim traçar
novos procedimentos e técnicas cabíveis ao caso.
O acompanhante terapêutico (AT) pode ser um profissional ou um estudante
treinado e supervisionado que acompanha o cliente em suas atividades diárias, enfocando
a queixa/dificuldade do cliente, auxiliando-o a fazer os exercícios e atuando como modelo
reforçador. Para Balvedi (2003), o AT deve ter as seguintes características: interesse e
possibilidade de trabalhar em equipe; maturidade que lhe traga segurança; alto grau de
compromisso, visto que tem responsabilidade sobre seu cliente; iniciativa em tomar
decisões diante de quadros que se apresentem, bem como em situações inesperadas; e
atitudes firmes e flexíveis. "O AT terá de aprender a ajudar sem sofrer e amar sem paixão.
Deverá observar com cuidado, trabalhar com empenho e fazer com que seu cliente aflore de
si mesmo suas potencialidades, jamais tentando molda-lo às suas conveniências" (BALVEDI,
2003, p.298-299).

O co m p o rta m e n to de p ro c ra s tin a r sob a ó tica da A n á lise do


Comportamento
Segundo Hamasaki e Kerbauy (2001), procrastinar ó o comportamento de se
adiar tarefas, de se transferir atividades para “outro dia" que não o atual; deixar de fazer
algo ou - ainda - interromper o que deveria ser concluído dentro de um prazo determinado.
Além disso, procrastinar ó deixar de lado ou atrasar uma tarefa importante que tem um

Sobrr Comporldmento c Coflniç.lo 497


reforçador atrasado, em beneficio de alguma coisa mais rápida e fácil que provoque
menos ansiedade.
Basicamente, o que diferencia a procrastinação da preguiça, é que na última, o
deixar de fazer não gera mal-estar ou ansiedade. Em curto prazo, a preguiça aumenta os
benefícios e diminui os custos para os indivíduos, os quais goralmonte identificam
vagamente quais serão as conseqüências de não fazor a tarefa, mas optam por não agir.
Já no comportamento de procrastinar, ó comum que sentimentos de decepção,
“dor do consciência", insogurança o irritação o acompanhom. Sogundo Korbauy (2000),
a pessoa pode não se sentir mal no momento em que adia a tarefa, contudo, mais tarde
sente-se angustiada, mesmo que não relacione isso diretamente ao adiamento anterior.
A sensação de alivio quando a tarefa ó completada é acompanhada do desconforto pela
qualidade do trabalho, que poderia ser superior se a tarefa não houvesse sido adiada.
Uma pesquisa realizada pela Universidade Carleton (Canadá), mostrou que o
sentimento do culpa é um dos que mais atingem essas pessoas. E o pior é quo elas
sentem culpa não pelo que fizeram, mas pelo que deixaram de fazer. Isso acaba gerando
muito desgaste. As vezes, o indivíduo apresenta um quadro sério de stress, sente-se ansioso,
o que pode gorar dores de cabaça, aumento na pressão arterial e problemas de estômago.
Segundo Kerbauy (2000), são comuns algumas concepções falsas
fundamentarem o comportamento de procrastinar, como por exemplo:
1) Superestimar o tempo para desempenhar a tarefa: "vou precisar de seis horas para
fazer, senão não vai dar";
2) Subestimar o tempo necessário para completar a tarefa: "em uma hora termino, faço
depressa";
3) Superestimar o futuro estado motivacional: "eu estarei mais descansado e capaz de
fazer isso depois";
4) Ênfase na necessidade de conseqüência emocional para fazer a tarefa com sucesso:
"as pessoas deveriam estudar só quando se sentirem dispostas a isto" ou ainda, "não
estou inspirada para fazer isto agora”;
5) A crença de que "trabalhar quando não está a fim é improdutivo".

Realizar tarefas é um comportamento como qualquer outro, passível de


aprendizagem e que não depende de uma força de vontade interior. Para entondormos o
porquê de nos comportamos de determinada forma, precisamos olhar para os resultados
dos nossos comportamentos, ou seja, quais as conseqüências destes.
Basicamente, pode-se ter motivação para realizar algo para evitar conseqüências
ruins, ou então, para ter conseqüências boas. Analisando-se a primeira situação: evitar
conseqüências ruins. Um indivíduo pode realizar algo porque caso não realize, terá conseqüências
negativas: como por exemplo, não receber dinheiro no final do mês e, conseqüentemente, não
pagar suas contas, ou receber criticas e ser desaprovado por seu chefe, ou professor. Assim, ao
concluir uma tarefa nessa situação, provavelmente, se sentirá aliviado.
E se não houver conseqüências ruins? Quando as conseqüências não são tão
ruins, ou não existem, é provável que não se sinta ansioso para terminar uma tarefa, nem se
sinta aliviado quando a executar. Segundo Kerbauy (2004), nesses casos, a probabilidade
de executar a tarefa também é menor do que se as conseqüências forem roalmente ruins.
Agora, vamos analisar a segunda situação: obter conseqüências boas. Pode-se
realizar tarefas porque sempre que se fez isso, houve conseqüências positivas: ser elogiado

498 M«irui Zll.it» il.i Silvu C.irmo ilc Mcnc/e», f cm.mil.i M.irques lacovo/zi, Jóíerson
Slmomur.i, Iír í.i Rctencurt, Rcn.il.i (.'rislm.i Alves <l,i Rwki , Marl.t C/.ibriel.i S.inl.m.i.
por pessoas importantes, receber dinheiro e poder pagar contas, etc. Com o passar do
tempo, começa-se a gostar de executar as tarefas, sentindo-se bem durante sua execução
e também após sua realização, mesmo não sendo sempre elogiado.
Assim, pode-se procrastinar ou por não ter conseqüências positivas quando realiza
a tarefa, ou por não ter conseqüências negativas caso não a reaiize.
Relata-se a seguir análises, procedimentos e resultados, ató o presente momento,
de um caso onde se utilizou essa forma de intervenção.

Relato e discussão do caso:


1. Cliente: sexo feminino, 30 anos, graduada em publicidade e propaganda.
2. Histórico do caso:
A cliente veio para terapia com queixa de transtorno bipolar. Tal diagnóstico deu-
se por um psiquiatra, devido a fases de euforia e de depressão apresentadas pela
cliente. No entanto, relatou para a terapeuta falta de interesse e do vontade em iniciar ou
manter atividades: trabalho, mestrado, cursos de línguas, etc..
Havia feito terapia, por dez anos, em outra abordagom, o que contribuiu para
que a cliente atribuísse causas internas aos seus comportamentos, principalmente, o
não conseguir trabalhar.
3. Descrição e Análise Funcional:
a) Interações da cliente com o trabalho:
Após algum tempo de terapia comportamental, a terapeuta propôs que os ATs
acompanhassem a cliente em seu ambiente de trabalho, a fim de observar a relação da
mesma com as atividades do escritório, bem como as variáveis que mantinham os
comportamontos evitativos no trabalho.
No local de trabalho (escritório), perante vários trabalhos a serem executados,
a cliente apresentava comportamentos de fuga e esquiva, como por exemplo: fazer
trabalhos nào relacionados aos do escritório, leitura de livros nào relacionados a sua
profissão, saldas constantes para buscar café e fumar cigarro, ouvir músicas, conversar
com os ATs, etc. (Segundo Catania (1999), consideram-se comportamentos de fuga
aqueles que interrompem um estímulo aversivo. Comportamento de esquiva seria
aquele que previne, ou evita, um estímulo aversivo).
A cliente apresentava comportamentos típicos de procrastinação. Segundo
Kerbauy (2004), falamos em procrastinação quando há um padrão de comportamento
que prejudica o desempenho, pois as atividades são iniciadas e não terminadas, ou
iniciadas com atraso. Também, outras atividades são exercidas, irrelevantes para a tarefa
necessária, e a pessoa observa-se como não realizando um objetivo definido e se culpa.
A primeira pergunta que surgiu, foi: “Por que ela não trabalha?".
A suposição inicial era que o não trabalhar trazia as mesmas conseqüências
que o trabalhar, ou seja, a cliente recebia um salário independente de seu desempenho
e isso, possivelmente, poderia estar diminuindo sua motivação para o trabalho. Além
disso, a cliente não era punido pelo chefe (no caso, o pai) por não trabalhar, mas, pelo
contrário, recebia atenção do mesmo: o pai ó condescendente com ela, a mantém no
escritório e paga seu salário, mesmo ela não trabalhando ou trabalhando pouco. Assim,
observou-se que não há conseqüências negativas imediatas para o fato da cliente nào
trabalhar, ou seja, existe a apresentação do reforço positivo (salário) não contingente ao
fazer (ao trabalhar). Segundo Catania (1999), pesquisas sobre os efeitos das

Sobrr Comportamento c Cognição 499


contingências mostra o quanto os organismos são sensíveis às conseqüências de seu
próprio comportamento. Assim, o comportamento tem conseqüências e uma
propriedade importante do comportamento é que ele pode ser afetado por suas
conseqüências. Segundo o autor: "Programar conseqüências envolve mais do que
simplesmente apresentar estímulos. Os estímulos devem ocorrer em alguma rolação
com o comportamento O amblonte deve ser programado do tal forma quo a» respostas
farão com que algo aconteça" (Catania,1999,p.81). Ainda, segundo este mosmo autor,
quando são usados reforçadores independentes da resposta, o responder que tinha
sido reforçado diminui. Assim, podemos também supor que o comportamento de
trabalhar diminuía de freqüência mesmo tendo sido reforçado no passado, pois, agora
a conseqüência é independente da resposta de trabalhar.
Então, podemos agora dizer que o termo reforço nomeia uma relação entre o
comportamento e ambiente e esta relação inclui quo as respostas devem ter
conseqüências, sua probabilidade deve aumentar e o aumonto da probabilidade deve
ocorrer porque a resposta tem essa conseqüência o não por outra razão qualquer.
Torna-se oportuno citar que Skinner (1991) salionta ainda dois efeitos do
reforçamento: 1) um imediato, enquanto sensação corporal relacionada com o que se
denomina prazer e que está ligado à filogênese, a qual responde pela suscetibilidade
do reforço; e 2) enquanto modificador da probabilidade do comportamento aparecer no
futuro. Dessa maneira hipotetizamos quo, se tanto o comportamento de trabalhar como
o de não fazer nada são reforçados, e se o segundo comportamento exige um custo de
resposta menor para a cliente, este segundo comportamento estaria ocorrendo com
maior freqüência e produzindo sensações corporais relacionadas com o que se
denomina prazer. Percebeu-se que havia conseqüências positivas, a curto prazo, como
pagamento, atenção, etc; conseqüências negativas, a médio prazo, como perda de
status, respeito e admiração; c conseqüências imediatas do alívio, produzido pela fuga/
esquiva de reações corporais aversivas.
Observou-se que, segundo o relato da cliente, a causa de não trabalhar, ou
melhor, iniciar um trabalho, estava sempre associada a uma causa interna: motivação,
concentração, psicoses, problemas neuro-lingulsticos e até depressão. Isso, para ela,
inviabilizava seu desempenho.
Notamos que ao tentar iniciar um trabalho do escritório, a cliente apresentava
algumas reações fisiológicas, como por exemplo: sudorese, aumento do batimento
cardíaco e andar de um lado para o outro em sua sala, as quais, provavelmente, estariam
associadas a uma história prévia de condicionamento aversivo frente a situações
semelhantes (iniciar trabalhos de escola, fazer algum trabalho do casa, manter
compromissos, fazer outros trabalhos não relacionados à publicidade). Possivelmente,
estas reações fisiológicas, seriam o que ela denominava como causas internas que a
impediam de iniciar o trabalho, pois o estimulo pré-aversivo (pretender trabalhar)
desencadeava sensações corpóreas que atrapalhavam o seu desempenho. Segundo
Guilhardi (2004), estímulo pré-aversivo é aquele que precede seguramente um estimulo
aversivo (trabalhar), podendo assim, ser um estimulo aversivo condicionado. Esses
estímulos podem também reduzir o responder mantido por reforçadores positivos, um
efeito denominado ansiedade (resposta emocional condicionada).
Também pudemos supor que a cliente possuía uma série de auto-regras
relacionadas ao comportamento de não envolvimento com o trabalho. Essas, provavelmente,
foram formuladas a partir de contingências passadas, quando o envolvimento com o trabalho
fazia com que ela entrasse em contato com uma série de estímulos aversivos. Por exemplo,
a cliente pode ter formulado a regra de que não deverá envolver-se demais com trabalho,
pois, possivelmente, não conseguirá terminar e, acabará decepcionando aqueles que lhe

500 M.irui Zil.il) il,i Silv.i Mr.iml.lo,Citmil.i C.irmo dc Mcruves, Icm.irulii Marques |a«>vo//l, lófcrson
Simomur.j, l/fjí.i Retcrnurt, kcn.if.t Cristin.i Alve* <l.i S
confiaram tais tarefas. Outra possível regra formulada por ela, era a de que não conseguia
realizar suas atividades por causa da doença, ou seja, considerava seu desempenho bom,
achava-se capaz de realizar as atividades, no ontanto, o que a impodia, segundo ela, ora a
doença. Assim, quando se expunha à realização das atividades o, conseqüentemente, não
conseguia cumpri-las, atribuía como causa o seu diagnóstico de transtorno bipolar o não
ao seu real desernponho quo ora deficitário, por ter passado por oxporiéncias próvias
mínimas de trabalho ou mesmo por nõo ter passado por multas delas. Dossa forma,
quando a regra era confrontada com a contingência e confirmada, as probabilidades da
cliente se expor a novas contingências, modificar a regra e ter um novo comportamento
mantido por estas novas contingências, eram diminuídas.
Pelo exposto, tentamos responder porquê ela não trabalhava. Como coloca
Skinner (1998), o comportamento é multidetorminado, assim, todas as contingências
atuantes resultam no padrão comportamental apresentado pela cliente, não havendo
apenas uma responsável, ou verdadeira.
Diante de tais constatações, tentamos responder uma outra questão: "Como
fazer para ela trabalhar?".
Primeiramente, precisávamos observar quais eram os comportamentos que
estavam aparecendo com maior freqüência em seu ambiente de trabalho e, para tanto,
foram necessárias observações diárias. Essas confirmaram a hipótese de que a cliento
estava engajada om comportamentos de fuga/esquiva e assim não entrava em contato
com a tarefa proposta, não conseguindo, portanto, interagir de forma diforente com o
meio, para provor a conseqüência natural positiva de ter terminado algum trabalho.
Em um segundo momento, era necessário saber se a cliente sabia o quo fazer,
ou seja, tinha o repertório para desempenhar adequadamento o trabalho. Por meio das
observações e da divisão do trabalho em passos menores (feitas com o auxílio do pai
da cliente), percebeu-se que a cliente sabia como fazer.
No próximo momento, tentou-se criar novos estímulos antecedentes para que
a resposta (trabalhar) aparecesse: tornar o ambiente de trabalho propiciador ou mais
reforçador para o trabalho, não punir os comportamentos de fuga/esquiva da cliente,
reforçar a emissão de respostas relacionadas ao trabalho do escritório, ajudar a cliente
a cumprir um esquema de horários para a realização do trabalho, com intervalos para
descanso e inseri-la no contexto de decisão sobre o trabalho desenvolvido.
Com o esquema de horários, pretendia-se que o comportamento da cliente trabalhar
fosse reforçado em menor intervalo de tempo. Alóm disso, esperava-se reduzir a
probabilidade de a cliente engajar-se em períodos de trabalho muito longos (comportamento
de esquiva às sensações corporais de ansiedade apresentadas a cada início de trabalho),
seguidos de queda abrupta de desempenho (ficar dias sem trabalhar). Segundo Catania
(1999), quando uma razão toma-se muito, a taxa de respostas decresce: isso acontece não
tanto porque a taxa de respostas diminui no seu total, mas muito mais porque a taxa de
rospostas alta e contínua é freqüentemente interrompida por pausas pós-refòrço.
Tambóm foi necessário não conversar com a cliente sobre assuntos não
relacionados ao trabalho, pois a proposta era reforçar positivamente e diferencialmente
todas as aproximações desta com o trabalho e não punir, ou reforçar, qualquer
comportamento seu de protelação. Considerou-se, por meio das observações, que
conversas sobre outros assuntos somente iriam reforçar a esquiva da cliente, diminuindo
a probabilidade deste começar a trabalhar, por isso a necessidade de extingui-las.
Por fim, percebeu-se que a cliente se sentia bem quando ouvia feedback sobre
sou dosomponho o com isso tontava molhorar ainda mais sua rolação com o trabalho.
Então foi inserida tambóm no ambiente de trabalho, no fim de cada dia e tambóm no fim

Sobro Comporfiimcnlo c Co#nlç«lo 501


de toda semana, feedback acompanhados por gráficos referentes à avaliação do seu
desempenho e alternativas de outros comportamentos mais adequados para a cliente.
Os objetivos, então, eram: a estabilidade de respostas de trabalhar, pois se
quoria urna mudança gradual e constante o estabelecer contingências adequadas no
amblonte do trabalho, poia o chefo não o fazia.
A cliente comuçou h liabalhai, no untantu, uma nova vuiiuv«l, nau pi «vista n«s»e
momento, foi inserida; começou a dar aulas em uma Universidade, mesmo frente à não
concordância da terapeuta e dos ATs. Diante do tal situação, uma nova hipótese surgiu:
"introduzir novas variáveis poderia aumentar de forma abrupta o trabalhar, o que poderia
levara uma desistência de um das duas atividades em quostào". (CATANIA, 1999, p. 179).
b) Interações da clionte com o pai no ambiente de trabalho:
Inicialmente, sogundo as observações dos ATs, as rospostas apresentadas
polo pai da cliente resumiam-se à: responder rispidamento às pessoas que lhe
perguntam algo, ignorar algumas perguntas feitas a ole, responder somento o
estritamente necessário às pessoas, não reforçar positivamonto os comportamentos
adequados da filha e mostrar-se, também, pouco paciente no quo se refere ao problema
aprosontado pela cliente (dificuldade em se engajar e terminar trabalhos propostos).
Posteriormente, outras respostas foram apresentadas, entro elas o reforçar
positivamente alguns comportamentos da filha. No entanto, deve-se ressaltar que os
comportamentos ríspidos do pai permaneceram ocasionais em sua relação com a filha
ou com qualquer outro funcionário do escritório.
Primeiramente, hipotetizamos que a cliento apresenta alguns comportamentos
que mantinham os comportamentos punitivos do pai. Por exemplo, em alguns
momentos, a cliente respondia agressivamente ao que o pai lhe perguntava (o que
também podia demonstrar comportamento aprendido pela relação com o pai - imitação).
Depois, consideramos também que o fato do pai disponibilizar alguns reforços para a
filha, como lhe pagar um salário independente do trabalho, viagens (as quais, geralmente,
sem objetivos profissionais) e algum conforto, por exemplo, podia significar que o pai
estava tentando diminuir o máximo possível o custo de sua própria resposta e era
reforçado negativamente pela eliminação de um estimulo aversivo (a filha não trabalhar
e ele não saber como reagir frente a esse problema).
Assim, indopondente do quo a filha fizesse, parecia que o pai preferia se esquivar
do problema a enfrentá-lo, mesmo porque o problema apresentado pela cliente, de
esquivar-se de responsabilidades, era algo que, segundo a própria filha, sempre
incomodou muito o pai e parecia ser muito aversivo a este. Ainda de acordo com o relato
da cliente, o pai a superprotegia, visto que a relação da cliente com a mãe era aversiva
para a mesmo, pois ela cobrava maior responsabilidade da filha, exigindo que ela não
desistisse das atividades que iniciava, e co-responsabilizava a superproteção do pai
pelo fracasso da filha.
Também, podemos dizer quo quando havia uma relação contingente entro as
rospostas da clionte e as conseqüências sociais o afetivas liberadas polo pai, este
último exigia uma taxa muito alta de respostas para a liberação do reforço, o que
incomodava muito a cliente que como conseqüência exporienciava estados corporais
denominados de tristeza e frustração pola falta de reconhecimento do pai, além disso,
a mesmo continuava se esquivando de trabalhos posteriores. Dessa forma, o pai não
estabelecia contingências que poderiam favorecer o desenvolvimento da autoconfiança
da clionte, como o custo da resposta era muito alto a cliente não conseguia realizar as
atividades como o pai esperava. Assim, quando a cliente não conseguia realizar as

502 M.iri.i /ll.ih (l.i Nllv.i lUtimiilo.Ciimilii l .irmo «Ic Mcnc/c», |-rm<iml<i Miirqucs l<icovo//j, jéfcrson
Slmomur.i, I.írI.i Hrlrnuirt, licn.iKi Crktln.i Alves «l.i Rotlm , Miirl.i l/iibriciti Santami.
atividades, o pai, freqüentemente, acabava fazendo ou arrumando alguma alternativa,
para quo a filha não sofresse as conseqüências do não fazer. Por exemplo:
primeiramente, o pai a incentivou a dar aulas na faculdade (mesmo em oposição á
opinião da terapeuta), vendo que a filha nào era capaz do realizar as atividades de dar
aula e trabalhar no escritório ao mesmo tompo, acabou pormitindo quo ola deixosso
suas atividades do escritório para outro funcionário e continuasse rocebondo seu salário.
Segundo Guilhardi (2002), comportamontos de responsabilidade podem ocorror
om conseqüência tanto de contingências coercitivas, bom como por contingências
reforçadoras positivas. A diferença das duas formas de se instalar tal comportamento é
que a primeira está associada a sentimentos de responsabilidade, os quais são
produtos de comportamento fuga/esquiva de prováveis punições que apareceriam por
não se comportar de maneira adequada para o grupo ao qual pertence. Já
comportamentos responsáveis instalados a partir de contingências de reforçamento
positivo geram, da mesma forma, comportamentos responsáveis (adequados para o
grupo), no entanto, esta contingência não está associada a "sentimentos de
responsabilidade”, que são experencíados por comportamento de fuga/esquiva do
contingências, mas sim a sentimentos de satisfação e liberdade.
“Ê fundamental destacar que as contingências coercitivas, sociais e naturais
produzem e mantêm repertórios de comportamentos e sentimentos de
responsabilidade. Os pais como membros de uma comunidade social, empregam
largamente contingências aversivas, como parte das práticas culturais do grupo a
que pertencem" (GUILHARDI, 2002, p 90).
No entanto, o autor propõe que comportamentos chamados responsáveis deveriam
ser instalados não por contingências coercitivas, mas sim por contingências reforçadoras
positivas, já que a esta estão associados os sentimentos de satisfação e liberdade.
Pode-se porceber, desta forma, que, na historia de vida da cliente, o pai não contribuiu
para que comportamentos responsáveis fossem instalados tanto no que se diz respeito a
fazê-lo empregando contingências coercitivas ou por contingências reforçadoras positivas.
De acordo com a cliente, o pai sempre a superprotegia, e ainda hoje o faz. O pai evitou e evita
que a filha sofra as conseqüências de seus comportamentos, impossibilitando desta forma
quo a mesmo desenvolva comportamentos dito responsáveis. Não punia e não reforçava
seus comportamentos adequados de trabalho, independência e resolução de problomas, do
maneira contingencial.
Entretanto, após, aproximadamento, um mês e meio de acompanhamento terapêutico,
a cliente comoçou a apresentar certos comportamontos quo indicavam melhoras, como
quando esta relatou colocar para o pai (do forma não agressiva) aquilo que a incomodava,
como, por oxemplo, o fato do pai não respeitar seu tempo do trabalho e sugerir quo a cliente
trabalhasse ultrapassando o tempo limite estipulado pelo procedimento terapêutico, ou quando
reclamava diretamente ao pai a falta de trabalho suficiente para a semana A quantidade de
trabalho passado pelo pai para a cliente, foi um aspecto importanto, pois como a cliente
realizava trabalhos programados polo pai, ola dependia do mosmo para continuar a trabalhar,
ou seja, o pai passava, por exemplo, um rolatório para a filha fazer, esta o roalizava e ficava
dependente do um horário que o pai pudesse atendê-la para corrigir o rolatório, para assim,
a diento podor dar continuidade ao seu trabalho. Deve-se ressaltar, que esses comportamentos
estavam ocorrendo antes da cliente iniciar suas aulas na faculdade.
A cliente também passou a pedir mais explicações para o pai, quando não entendia
algo que oste lhe pedi? para fazer, evitando dessa forma quo o trabalho se tomasse penoso
por falta de explicações e conseqüentemente diminuindo a probabilidade da cliente esquivar-
se de realizá-lo.

Sobre (. omport.imenlo v fofjnlçiio 503


Vê-se, então, que havia uma dependência da diente com relação ao pai, não só no
que se referia a salário o a elogios, mas também com relação ao seu próprio desempenho no
escritório. Parecia que o pai mantinha (reforçava) essa dependência, pois, concretamente,
ajudava pouco a filho com suas atividades do escritório e na faculdade, mas pagava salário,
inventava desculpas para as faltas da filha, etc, o não incentiva a filha a realizar outras atividades
quo podorium lho proporcionar uma maior Indopondôncia dos phís, como, por oxomplo.
morar fora, casar, etc.
No entanto, após a inserção da cliente no meio acadêmico (ter começado a dar
aulas), pudemos observar que essa dependência era reciproca. Era como se o pai quisesso
manter a filha sempre perlo dele, e para tanto, dava-lhe o quo queria o a apoiava em tudo. Além
disso, o pai não deixava que a filha se responsabilizasse pelas conseqüências de seus
comportamentos. Por exemplo, quando a filha não quis ir dar aulas na faculdade, o pai
conseguiu arrumar uma outra pessoa do escritório para quo fosse no lugar da filha. "A dimonsão
fundamental para dosenvolver autoconfiança é que a pessoa tenha a possibilidade do emitir
um comportamento e, então, produzir conseqüências em sou ambiento que fortaloçam tais
comportamentos" (GUILHARDI, 2002, p.78). O que observamos, nosso caso, é que o pai
impedia que a filha adquirisso autoconfiança, pois agia de forma a impedir que a filha entrasse
em contato com as conseqüências de sou comportamento relacionado a trabalhar (ou a não
trabalhar).
O pai, ainda, criava condições para estabelecer uma auto-estima irreal na filha, ou
seja, mesmo a filha não conseguindo realizar alguns trabalhos, o pai amenizava a situação do
não conseguir, reforçando esses comportamentos inadequados, além disso, oferecia outros
trabalhos à filha, a fim de mostrar quo a mesmo era capaz. Segundo Guilhardi (2002), a auto-
estima é um sentimento que pode ser desenvolvido durante a vida da pessoa, visto que esta
não nasce com auto-estima. E como qualquer outro sentimonto, ela é o produto de
contingências de reforçamento, contingências essas que os pais apresentam para os filhos,
em decorrência de afetividade natural ou quando devidamente orientadas sobre como fazê-to.
No caso em questão, o pai pareda ajudar a desenvolver uma auto-estima irreal: o
pai, como membro da comunidade verbal, reforçava comportamentos incompatíveis com a
melhora: dizia que se a filha quisesse, ela conseguiria terminar qualquer trabalho em um
período curto de tempo, encorajava-a a trabalhar em assuntos que não dominava e a pegar
cada vez mais trabalhos e funções em sua profissão, para as quais não estava preparada em
termos do responsabilidade, o que seria um pré-requisito para ir bem no trabalho, aumentando
a chance da cliente engajar-se em atividades que não conseguia manter e, então, ser punida.
Além disso, a cliente e o pai criavam idéias boas e irreais sobre a clionte impedindo-a de
desenvolver um autoconhedmento mais roalista e assim fazer escolhas mais acortadas om
função de sou repertório passado.
4. Procedimentos
A partir das observações realizadas, alguns procedimentos baseados em reforço
natural, reforço diferencial e modelagem, foram propostos e aplicados. Segundo
Kohlenberg e Tsai (2001), a modelagem direta e o fortalecimento de repertórios
comportamontais mais adaptativos (no caso: o trabalhar) atravós do reforçamonto são
centrais no tratamento analftico-comportamental. Além disso, segundo os mesmos
autores, o reforço natural é diferente do reforço arbitrário por fortalecer uma ampla
classe de respostas, por ter em consideração o nívol de habilidado da pessoa, por
beneficiar primariamente a pessoa sendo reforçada ao invés da possoa que proporciona
o reforço e por ser típico e de ocorrência comum no ambiente natural.
a) 1* Fase:
Nesta primeira fase do procedimento, os ATs tinham como objetivo reforçar

504 M a n a Z ila li il.i Sllv.i Hrandtlo,C amila C'.irmo do M c n c/cs , I crnanda M arq u e* lacovo/7Í, Jflerson
Simoim ir.i, I igi.i R d en iu rt, Renata 1'rú fin a A lv e * da Rocha , M a ria ( '/«ihricla Sanfana.
somente os comportamentos da cliente relacionados ao trabalho publicitário, no
escritório. Esse reforço é dito natural, pois nào era disponibilizado ao clionte prémios,
como doces, cigarros, dinheiro ou outras coisas que, possivelmente, aumentariam a
probabilidade da cliente trabalhar, mas sim elogios ou correspondentes (sorriso, por
oxemplo), que tinham a mesma função, ou soja, fazor com quo so aumentasse a
probabilidade da clionte trabalhar. Esse tipo de roforço utilizado, também, ó dito difoioncial,
pois somente os comportamentos relacionados ao trabalho do escritório eram roforçados
(qualquor outro comportamento não condizonte com esse trabalho, não ora reforçado).
Outro principio, também utilizado o intimamonto relacionado com o roforço ó a
modelagom;
"a modelagem è baseada no roforço diferencial em estágios sucessivos, algumas
respostas sào reforçadas e outras nào Além disso, á medida que o responder se
altera, os critárlos para o reforço diferencial também mudam, cm aproximações
sucessivas da resposta a ser modelada" (CATANIA. 1999,p 131).
No caso da cliente om questão, a modelagem só cotrioçou a ocorror quando o
mesmo apresentou comportamentos de trabalhar, pois segundo Catania (1999), a
propriedade do comportamento que torna a modolagem efetiva é a variabilidade do
comportamento. Cabe, aqui, notificar que, no inicio da intorvonção, a cliento esquivava-
se tanto de trabalhar que não conseguia trabalhar nem 30 minutos por dia.
Diante disso, o procedimento foi dividido, didaticamente, em quatro etapas que
compreendiam, respectivamente a descrição, a obsorvação, execução o a avaliação.
Quando o AT chegava ao escritório, pedia que a cliento descrevesso as atividados
que haviam sido realizadas naquele dia e o quo ela havia programado para fazor duranto
o momento que o AT estivesse lá. Pedia-se, também, que ela descrevosso a sua
programação com os respectivos intervalos de 10 minutos, e até que horas pretendia
trabalhar (lembrando sempre que ela não devia ultrapassar 4 horas de trabalho por dia).
O AT, então, observava o trabalho da cliente: se ela estava cumprindo com a
programação (inicialmente a programação era: trabalhar 20 minutos e parar 10 minutos
para descansar, após algumas semanas, a programação passou a ser de 50 minutos
de trabalho e 10 do descanso), se estava realmente trabalhando ou estava protelando,
se estava se sobrecarregando (trabalhando mais do que o programado - 4 horas por
dia), se estava conseguindo terminar o trabalho no prazo de entrega, se tirava dúvidas
com outras pessoas (pai, irmão, outro funcionário, etc) quando não sabia realizar uma
determinada tarefa o se escutava música enquanto trabalha, etc.
No final do tompo provisto para a permanência do AT no oscritório, esto podia
que a clionte fizesse uma avaliação de seu próprio desempenho; como so sentiu
realizando o trabalho, como foi realizar esse trabalho, como se sentiu seguindo
corretamente a programação, quais eram as dificuldades quo tevo para a realização do
trabalho, etc. Além disso, o AT dava um feodback do quo observou, ou seja, fazia também
uma avaliação do dosempenho da cliente. Para isso, utilizou-se de uma tabela (ver
anexo) quo ora preenchida conjuntamento com a clionte, no final da permanência do AT
(diariamente) no escritório. No final de cada semana era realizada, também, uma
avaliação semanal do desempenho da cliente.
É importante ressaltar que o AT, nesta primeira fase, devia reforçar a cliente toda
vez que este apresentasse comportamentos relativos ao seu trabalho no oscritório, e
que isso devia ser feito independente da etapa (descrição, observação, oxocução ou
avaliação) “Urna das características bem conhecidas do reforçamento é quo quanto
mais próximo das suas conseqüências (no tempo e no espaço) um comportamento

Sobre Comportamento e Coflniy.lo 505


ostiver, maiores serão os efeitos deste processo" (KOHLENBERG e TSAI,2001,p.10).
b) 2* Faso:
Posteriormente, os ATs passaram a generalizar os feedback, ou seja,
reforçavam comportamentos condizentes ao bom desempenho da cliente no trabalho e
tentavam mostrar, som punir, alguns comportamontos quo nAo so roforiarn àquilo quo a
dionto donominava como causa do não trabalhar Por oxomplo: quando a clionto dizia
quo não estava conseguindo trabalhar porque havia brigado com o noivo Os ATs
buscavam, ontão, ovidonciar para a cliente quo o motivo quo gorou o problema no
trabalho (o não trabalhar) era (muitas vezes) diferonto do verbalizado, isto ó, as razões
trazidas pela cliente não eram as reais causas de seu comportamento de não trabalhar
Nesta fase, tambóm, os ATs e a terapeuta trabalharam com a cliente a questão
de receber feedback nogativo, visto quo ola, ao menor indicio de tor sou comportamento
punido, esquivava-se e aprosontava comportamontos como: falar bom do si mesmo,
antes que os ATs falassom algo nogativo sobro ola, ou respondia rispidamente aos ATs,
tambóm como forma de esquivar-se de feedback nogativo.
Os ATs passaram a exorcer outras funções alóm daquelas propostas inicialmento.
Passaram a reforçar: tatos com função de tatos; mandos com função do mandos:
comportamentos de responsabilidade e compromisso; o o sabor ouvir críticas sociais.
Além disso, os ATs começaram a fornecer punição love para classes de comportamontos
verbais ou não-verbais, considerados inadequados, como, por oxomplo: chogar atrasado
ao trabalho e dar uma desculpa qualquer o ongrandecor um comportamento próprio com
frases e expressões que não condiziam com as ações executadas.
c) 3" Fase:
Visto que a cliente conseguiu manter uma constância e estabilidade em seu
comportamento de trabalhar, uma terceira fase foi proposta: aumentar de 4 (quatro)
para 5 (cinco) as horas de trabalho no escritório.
Nesta fase, tambóm, pediu-se quo a cliente fizesse uma atividade do auto-
obsorvação, que correspondia à atribuição de falsas razõos às roais causas de seu
comportamento, para que assim se consoguisse uma melhor análiso de seus
comportamentos em geral.
Concomitanto a isso, uma nova variável foi introduzida pola cliento: comoçou a dar
aulas em uma Faculdade. A terapouta observou que a introdução de novas variáveis podoria
aumentar de forma abrupta o trabalhar, e assim levar a uma desistência de um das duas
atividados em questão. No entanto, dianto da insistência do pai e da decisão da clionto,
constatou-se que um dos bonofícios de dar aula podoria ser o fato da clionto estar sob
controle de contingências diferontos das encontradas na relação da clionto com o pai no
escritório, o seus comportamontos passariam a ter conseqüências contingontos ao
trabalhar, ou soja, receber seria contingento ao dar aulas, ser reconhecida profissionalmonto
soria uma das conseqüências do seu bom dosemponho acadêmico, etc.
Em docorrência dessa nova situação, o procedimento sofreu algumas
modificações. Com essa nova atividade foi estabolecido o seguinte: dentre as 5 horas
em que a clionto estava conseguindo manter trabalhando no escritório, faria tanto as
atividados roforonte à docência quanto ao escritório, utilizando metade do tempo para
cada uma dolas.
Desta forma a cliente conseguiria mantor a estabilidade do trabalhar 5 horas
diárias com acréscimo de 8 horas semanais destinadas a atividado do locionar.

506 Miirid /il.il) (lii Sllvii Krtimliio,C'iimilii (\mm> ile Mene/os, Icm.iinl.i Murqucs liicovorzi, Icfcrsoi)
Simoimir.i, Iírí.i Hetcmurt, Uon.it.i 1'rislln.i Alvos il.i Uoili.i , M.in.i C/.ibriol.i S.inl.tn.i.
5. Resultados e Considerações finais:

D cto m pe nh o apr«*ontado d u ra n t* 32 M m a n a t d * AT

|
?
8

Com base no exposto, conclui-se que o comportamento de trabalhar pôde ser


instalado e mantido por um determinado tompo. No entanto, foi constatado, assim como
previsto, que o aumonto abrupto das atividades levaria a uma diminuição da taxa de
rospostas, tanto do trabalho no escritório como das aulas na faculdade.
Um outro fator que impossibilitou a manutenção dos comportarnontos de melhora
foi à influência do pai no que se refere ao reforçamento não contingente a alguns
comportamentos da filha o ao favorecimento do respostas de esquivas de punições por
comportamentos irresponsáveis: o pai não roforçava comportarnontos adequados, isto é,
comportamentos rosponsáveis e não punia os inadequados (irresponsáveis), pelo
contrário, ajudava a filha a evitar punições que outros administrariam nessas ocasiões.
Constatou-so, com esso estudo, que os comportamentos que diagnosticavam o
caso como transtorno bipolar referiam-se a excesso de otimismo, proveniento do uma auto-
ostima irreal (fase eufórica), seguido de desânimo, conseqüência do seu mau desomponho
(fase depressiva). Se buscarmos explicações para esse padrão comportamontal, podemos
dizor que a cliente comportava-se em um esquema de Razão Variávol (VR), ou seja, o chefe
(no caso, o pai), não era contingente ao que a cliente realizava, ontão, ela, ser saber quando
o roforço viria, sobrecarregava-se de atividades a serem realizadas, no entanto, visto que
não possuía roportório prévio suficiente para conseguir realiza-las, abandonava-as por
"exaustão". Catania diria quo *'a extinção após reforço em VR, em geral, tambóm, produz
transições abruptas do taxas altas do respostas para períodos som rospostas (um padrão
do aceleração do rospostas soguido por uma pausa e novamente por aceleração das
rospostas - broak-and-run)” (CATANIA, 1999, p. 182).
Assim, som ignorar as bases biológicas do transtorno bipolar, o caso em questão
nos mostra que devemos, aposar de qualquer diagnóstico pré-estabelecido que devemos
ser vordadoiros garimpoiros em busca de pedras preciosas e fazer uma análise funcional
fundamentada no maior número possível do dados.

Sobre Comport.imcnto e 507


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508 M.iriii 7il.il) (iii Silv«i Hriim l.lo,t'iim il,i (.\irmo tle Mene/es, l em.inil.i Miirques liiiovo/zi, líforson
SimomuM, l ltfi.i Hctcnairt, Rcm.iI.i t'rj<;lin,i Alves d.i kotl),i , M.in.i 1 /<ihriel<i SiintiiM.i.
Capítulo 44
Comportamento de esquiva
no contexto clínico

Maria Zilah da Silva Brandào,Camila Carmo de Menezes, Fernanda Marques


JacovoMi, Jlferson Simomura, Ligia Bitencourt, Kenata Cristina Alves da Rocha,
M aria Qabriela Santana.
PsicC - Instituto de Psicoiempia e Análise do Comportamento.

"Nenhum ato particular define a esquiva, todos femos muitos fipos de barras para
prevenir diferentes tipos de choques. Ainda assim, algumas formas de esquiva
sâo mais problemáticas que outras, se quisermos entender e, talvez, fazer algo a
respeito da esquiva, primeiro temos que reconhecê la". (Sldman,2003,p. 165)
Inicialmente, para falarmos do comportamento de esquiva dentro do contexto clínico,
faz-se necessário uma definição deste comportamento e diferenciação do comportamento
de fuga.
O comportamento de esquiva pode ser definido, segundo Catânia (1999), como
aquele que previne ou evita um estímulo aversivo pela apresentação de uma resposta. Já o
comportamento de fuga suspende o estímulo aversivo, ou seja. o indivíduo entra em contato
com a contingência aversiva e posteriormente tenta eliminá-la. Este contato não ocorre no
comportamento de esquiva, já que neste, o indivíduo responde no sentido de evitar a
contingência aversiva, desta forma, no momento em que a resposta ocorre o estímulo
aversivo não está presente. Assim, “fugimos de circunstancias aversivas presentes, mas
nos esquivamos de circunstancias potencialmente aversivas que ainda não
ocorreram".(Catânia, 1999, p. 117). Segundo este mesmo autor os procedimentos de fuga/
esquiva sâo exemplos de reforço negativo, já que são reforçados por eliminarem ou evitarem
determinadas situações aversivas. Uma conseqüência importante da resposta de esquiva
é que ela é mantida "porque o organismo está fugindo de algumas propriedades da situação
que acompanharam os estímulos aversivos passados" (Catânia, 1999,p. 123).
Um outro aspecto relevante apontado por Catânia, diz respeito à extinção do
comportamento de esquiva, de acordo com suas pesquisas experimentais, se a história de
esquiva for longa, de modo que a presença dos estímulos aversivos é rara, a ausência
destes, durante a extinção, farão pouca diferença, e o responder continuará por um longo
poríodo.
Segundo Garcia (2004) "o processo de instalação de um comportamento de esquiva
ocorrerá de maneira que um estímulo neutro quando emparelhado a um estimulo aversivo

Sobre Comportamento e Co«nK<U> 509


incondicionado, passa a fazer parte da classe de estímulos aversivos. agora condicionado.
Se ao emitir uma reposta que seja consequenuada como término do estímulo condicionado,
e por fim, prevenir a ocorrência do estímulo aversivo incondicionado, denomina-se esta
resposta de esquiva".
Doscrovoromos um caso clínico de um jovem de 25 anos, o qual chamaremos de
Podro, om quo so podo obsorvar o comportamento do esquiva fronte a sltua^õo» do
compromissos e responsabilidades. Pedro chegou à terapia com queixa de Depressão,
nào saía mais do casa, nào se encontrava com amigos, relatava ter um desânimo grando
e não estava conseguindo realizar nenhum tipo de atividade. A dopressão de Pedro
provavolmonto já ora produto do contingências aversivas, das quais Podro, dovido toda a
sua história do roforçamento, aprendeu a se esquivar.
No primoiro ano do torapía foram trabalhados os comportamontos relativos a sua
vida social. Neste momonto, o enírentamento às situações ovitadas foi realizado com êxito,
e no docorror do processo, Podro passou a sair mais vezos, arrumou uma namorada, saiu
da casa de seus pais e passou a morar em outra cidade com o objetivo de cursar uma
faculdade. No entanto, toda esta mudança na vida de Pedro, das contingências ás quais elo
estava respondendo, fez com que Pedro tivesse que agir com mais responsabilidade o
compromisso, situação da qual Pedro evitava por ser muito avorsiva, provavelmente por não
ter tido uma história de aprendizagem efetiva com este tipo de situação, já que sua mãe
sornpre tomou a frente de suas decisões, e das conseqüências de seus atos.
A terapia, a partir de então, começou a trabalhar a esquiva de Pedro diante destas
situações. Os comportamentos de esquiva quo puderam sor observados eram
funcionalmente semelhantes, já que eram mantidos por evitar qualquer situação na qual
teria que se engajar em alguma responsabilidade, como, por oxomplo, ovitar ter que ir a
faculdade, estudar, trabalhar ou mesmo à terapia quando esta onvolvia algum aspecto do
compromisso. Dessa forma, podemos explicar em termos comportamentais esto caso em
que, um estimulo inicialmente neutro, ir à escola, por exemplo, pode ter sido emparelhado
com um ostimulo aversivo já condicionado, corno o medo em conseqüência da separação
da mãe, e as respostas do cliente para evitarem o contato com a escola podem ser chamadas
de esquiva. Assim, podemos dizer que o ir à escola adquire propriedades aversivas ao
acompanhar um outro estimulo aversivo, no caso respostas de modo dovido sua história de
punição ao se separar de sua mãe.
Kohlenberg e Tsai (2001) apontam que os clientes freqüentemente buscam a
terapia como meio para se livrar de sentimentos associados a estímulos aversivos. Isso
podo ser explicado porque quando nos esquivamos de estímulos avorsivos ovitamos tambóm
o contato com os sentimentos evocados por este tipo do contingências. Assim, a esquiva
pode sor oficaz já que elimina tanto os estimulos aversivos que poderiam estar presentes
na situação como os sentimentos a ela associados. Dessa forma, as pessoas goralmonto
atribuem a causa da esquiva aos sentimentos, mas esta associação é equivocada já que,
tanto o comportamonto do osquiva quanto os sentimentos são evocados pelos mesmos
estímulos avorsivos. No caso de "Pedro" quando ele entrava em contato com situações quo
sinalizavam a prosonça de estímulos aversivos, que como citado acima, ostavam
relacionados com compromissos e responsabilidades, esto oxporionciava sentimontos,
como a ansiedade, dos quais tontava se livrar. Sondo assim, "Pedro" muitas vezes eliminava
os ostímulos pró aversivos, públicos e privados, associados à situação, se esquivando de
situações potencialmente aversivas.
Sogundo Gentil, 1998; Kanfer e Phillips (1970 apud Zamignani e Banaco 2004) as
respostas de ansiedade envolvem excitação biologica ou manifestações autonômicas e
musculares como taquicardia, respostas galvànicas da polo, hiporvontilação, sensações

510 M .irlii 7ll.il) il.i Silv.i Rr.uul.lo,C\imilti C .im io de M cnc/es, I ern.mil.1 M.irqucs l.iiovo/7Í,
Jòforson Simomur.i, I l«U Hltentourl, Ren.it.i t ristin.i A lve * d i Ri k I m , M .irl.i C/iibrlcIu S.uil.in.i,
do afogamento ou sufocamento, sudorese, dores e tremores. Estas respostas, muitas
vezes funcionam como estímulos discriminativos para o comportamento de esquiva, e os
clientes buscam livrar-se destas sensações e utilizá-las como explicações para seu
comportamento. ' Pedro" por oxemplo, relatava nào conseguir realizar um teste devido a sua
ansiodado, sendo assim a situação aversiva do testo ora evitada e sua causa ura atribuída
ao sontimento a ela relacionado. Podomos dizer então que, "Pedro” justificava sua esquiva
utilizando sentimentos (ansiedade) e com isso conseguia obter ganhos secundários que
provavelmente reforçavam sou comportamento de esquiva. Por oxemplo, nâo realizando o
testo proposto na universidade "Pedro" se esquivava tanto de um provável julgamento negativo
por parto do professor quanto das reações de ansiedade associadas a esta situação.
Também, "Pedro" conseguia de seus pais algumas recomponsas materiais e atenção
quando se mostrava ansioso o que possivolmente também mantinha sou comportamento.
Diante do exposto, podemos dizer que, como parto do uma contingência de fuga/
esquiva, a resposta classificada como ansiosa seria mantida pela retirada ou adiamento
da apresentação do evento aversivo (estímulo público ou privado). Desse ponto de vista, as
rospostas ansiosas que compõem diferentes transtornos de ansiedado (fobia social, pânico
e agorofobia, por exomplo) seriam funcionalmente semelhantes, o que permitiria análises
e propostas de intervenção comuns (Zamignani e Banaco,2004).
Além disso, é imprescindível colocar, como relacionou Brandão (1999) as principais
conseqüências da esquiva, quais sejam:
»Perda de contato com reforçadores positivos, acarretando om déficits
comportamentaís. Como "Pedro" passou a restringir o contato com indivíduos que poderiam,
segundo ele, julga-lo negativamente, ole também nâo entrava om contato com contingôncias
positivas e saudáveis destes relacionamentos, não sabendo responder de outra forma a
não ser se esquivando ou fugindo da situaçáo.
»Recorrência do respostas emocionais ou sentimentos negativos. "Pedro" sentia-
se “doprossivo" quando pormanocia om casa, ao invos do onfrontar determinadas situaçõos.
»Falta dos sentimentos positivos decorrentes do contato com novas situações.
Como "Podro" evitava o estudo, todas as sensações que podoriam resultar do uma boa
nota ou aprovação não se fazia prosonte.
»Aumento do potencial aversivo da situaçáo evitada. Quando "Pedro" deixava de
onfrontar sous estudos, por exemplo, ele perdia a oportunidade de permanecer na situação
contracondicionando aspoctos aversivos da mesma e assim poderia extinguir os
sentimentos negativos a ela associados.
»Generalização de respostas emocionais para outras situações, objetos ou
pessoas. Com o tempo, a faculdade e outros tipos do situações de avaliação passaram a
ser evitadas por “Pedro" através da generalização de estímulos, já que todos estavam
associados, om última instância, com compromissos, cobrança, etc.
O comportamonto de esquiva, segundo o Garcia (2004), não pode estar voltado
para o futuro. Suas causas estão no passado e no presente Uma possibilidade de mudança
da rosposta de osquiva pode ser encontrada ao mudarmos a probabilidado dos eventos
ambientais quo passam a ser indicadores de uma situação aversiva.
É necessário colocarmos também a importância da relação terapêutica om casos
em quo o comportamonto de osquiva emocional é visto como um comportamento problema
e ocorre na sessão. A osquiva emocional podo sor observada e sinalizada polo terapeuta
que então coloca o cliento em contato com a situação avorsiva e com o sentimento que ola
produz. É nesse momento então, que se considera de extrema relevância, que o clionte
sem poder so esquivar da situação e do sentimento, possa apronder a tolerar suas próprias

Sobre Comportiimenlo e C'oqniv<lo 511


reações emocionais vivenciando-as. Este processo ó denominado por Kolemberg e Cordova
(1994) de Aceitação, que consiste em “tolerar ou agüentar as emoções associadas com
uma situação aversiva sem fugir, escapar ou atacar, sou estar em contato com estímulos
que evocam sentimentos dolorosos” (Kolemberg e Cordova, 1994, pág 126).
Assim, a estratégia terapêutica utilizada para manejar o comportamonto do esquiva
na clinica envolveria aceitação do» sentimentos poranto a sltuaçtto avoralva. No cm»o (to
Pedro ole foi encorajado a permanecer em contato com situações que oram aversivas o que
evocavam sentimentos chamados por ele de ansiedade. Desta forma aumentava a
probabilidade do Pedro entrar em contato com reforçadores omitidos, desto aprender a
lidar com a situação de forma efetiva sem destrui-la, e conseqüentemente a estimulação
aversiva associada com a situação diminuiria gradativamonte.
No entanto, nos casos em que os comportamentos problema do cliente consistem
em respostas de fuga/esquiva, impossibilitando comportamentos de melhora, ou seja, o
desenvolvimento de um repertório mais efetivo, o terapeuta podo tentar bloquear a esquiva
reaprosentando ao diente o estímulo discriminativo que originalmente ovocou a fuga/esquiva
(Kohlenberg e Tsai, 2001). Por exemplo, no caso de “Pedro" quando a torapouta perguntava
sobre o cumprimento de alguns de seus compromissos ele se justificava ou mudava de
assunto sem responder a pergunta, então a terapeuta poderia reapresentar o ostimulo aversivo,
que no caso era a pergunta, bloqueando a esquiva. Se, no entanto, a terapeuta aceitasse a
justificativa ou concordasse em mudar de assunto ela poderia estar reforçando o
comportamento de esquiva do cliente, impossibilitando o desenvolvimento de um repertório
de enfrentamonto de situações que envolvessem compromisso por parte do diento. Dossa
forma, segundo Kohlenberg e Tsai (2001), a técnica principal para enfraquecer a esquiva soria
introduzir novamente o estímulo aversivo, o que, no caso relatado, oquivale a repetir a pergunta.
Ainda, segundo os mesmos autores citados acima, o conceito de esquiva, do
ponto de vista funcional, freqüentemente tem pouco a ver com o cliente estar consciento do
que ocorre e ó, basicamente um comportamonto modelado pelas contingêndas.
Também, é importante salientar que não se recomenda bloquear todas as respostas
de fuga/esquiva porque o bloqueio funciona como controle aversivo e isso acarrota todos os
efeitos indesejáveis a ele assodados. Dessa forma, deveria sor aplicado com moderação,
em um contexto baseado primordialmento pelo reforço positivo o lovando em consideração o
grau de tolerância do cliente aos estímulos aversivos. Além disso, o reforçamento positivo
resultante do novo comportamento que se desenvolve após a aversividade inidal gerada pelo
bloqueio da esquiva, acaba por fadlitar o aumento da tolerância (Kohlenberg e Tsai 2001).
No caso mais específico do contexto clínico, podemos dizer que o uso de ostímulos
aversivos pode gerar esquiva da terapia, bem como agressividade em geral e substituição
do comportamento produtivo por fuga/esquiva (Kohlenberg e Tsai,2001), Dessa forma, om
conformidade com a proposição do behaviorismo radical, que se opõe ao uso da punição,
os estímulos aversivos somente deveriam ser utilizados quando procedimentos quo
envolvam o reforçamento positivo mostrarem-se ineficazes.
Diante do exposto, Kolemberg e Tsai, apontam que o relacionamento pessoal
entre clionte e terapeuta freqüentemente evoca situações difíceis, podendo promover
oportunidades para desenvolver tolerância emocional. Desta forma muitas emoções
semelhantes a do dia a dia do cliente são evocadas pela relação terapêutica, no caso de
Pedro nas últimas sessões ficou evidente a esquiva frente a situações de cobrança. Como
ele deixou de realizar atividades propostas que envolviam responsabilidades, este passou
a desmarcar sessões do terapia, comparecendo apenas a uma última sessão, na qual
falou todo o tompo sobre sou relacionamento com a mãe, não permitindo que a terapeuta
fizesse nonhuma colocação a respeito do que estava acontecendo.

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Neste caso em especifico quando o bloqueio das esquivas de responsabilidades
e compromissos tomou-se mais freqüente, passando a trabalhar mais com o enfrentamento
das situações, o clionte abandonou, temporariamonto, o processo terapêutico.
Percebe-se, contudo, que as conseqüências da esquiva podem ser muito
prejudiciais na vida de uma pessoa, ao mesmo tempo om que elimina estímulos aversivos.
No entanto, esto comportamento, assim como outro qualquer, tem possibilidades de
mudanças, Sua funcionalidade pode ser alterada na medida em quo se conhece as variáveis
envolvidas no comportamonto de esquiva.

Referências
Banaco, R A A Zamignanl, D R.(2004). Analytical-behavioral panorama on the anxiety disorders In
T C C Grassi (Org ), Contemporary challenges In the behavioral approach. A Brazilian overview.
Santo André, Esetec
Brandão, M Z. S (1999) Terapia Comportamental e Análise Funcional da relação terapêutica:
estratégias clinicas para lidar com o comportamento de esquiva Revista Brasileira de Terapia
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CATANIA, A C. (1999) Aprendizagem: Comportamento, Linguagem e Cognição, Porto Alegre, Artmed
Cordova, J & Kohlenberg, R (1994). Acceptance and the therapeutic relationship. In S Hayes, N
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Kohlenberg, J.R & Tsai, M. (2001). Psicoterapia analitica funcional. Criando relações terapêuticas
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procedimento de bloqueio de esquiva através da análise de uma relação terapêutica (Tese
de Mestrado, Universidade Católica de São Paulo,2001) SN.55.2QQ1.
Sídman, Murray (2003). Coerção e suas implicações. São Paulo, Parma
Skinner, B. F. (1991). Ciência e comportamento humano. São Paulo, Martins Fontes

Sobre Comporl.imenfo o (.'oflnKJo 513


Os capítulos que compõem os volumes 17 e 18 da coleção
Sobre Comportamento e Cognição oferecem uma amostra
representativa dos trabalhos apresentados no XIV Encontro
Anual da ABPMC, realizado em Campinas em 2005. Os artigos de
pesquisa, de aplicação e de conceitos abrangem o que se tem
produzido no Brasil nas áreas de Análise do Comportamento e
Cognitivo-comportamental. Pode-se dizer que ambas mantêm
preocupações e objetivos comuns, mas, com o passar dos anos,
se afastaram quanto aos pressupostos, metodologia e conceitos
que as caracterizam e as definem. Tal afastamento não constitui
uma perda, mas um refinamento de identidades. Há que se louvar
a convivência harmoniosa de áreas teóricas, procedimentos do
ação profissional e metodologia de investigação que não se
fundem , mas coexistem com o a lte rn a tiva s prósperas,
consistentes e eficientes. Os estudiosos de uma ou outra área
encontrarão nos dois volumes textos inovadores, didáticos e
desafiadores para aprofundar e consolidar conhecimentos, que
aumentam de abrangência e se atualizam anualmente, escritos
pelos mais lídimos representantes da área.

ESETec
www.e5elec.com.br

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