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CARTA AOS QUE TEMEM O COMUNISMO

Luiz Percival Britto

Esta semana o IPEC – Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica divulgou pesquisa de


opinião em que 31% do entrevistas dizem concordar plenamente com afirmação de que o Brasil
corre o risco de virar um país comunista.
Escrevo para eles; ou melhor, escrevo para você, meu irmão, minha irmã, meu amigo,a, meus e
minhas colegas; escrevo para falar de uma ideia de comunismo.
O medo ao comunismo não é um assunto propriamente novo. Está no ar, pelo menos, desde 1848,
data do lançamento do Manifesto Comunista, de Marx e Engel. Já naquela época distante,
constatavam seus autores que o espectro do comunismo assustava as potências todas da velha
Europa, que se uniam em Santa Aliança para conjurá-lo. Então e agora, opositores eram e são
acusados por seus adversários no poder com a pecha infamante de comunista.
Então e agora, usavam e usam a infâmia como arma de dividir e enganar, enganar e dominar.
Infâmia sem alma, sem espírito, sem humanidade.
Para esse embuste, não importa muito saber que ideia é essa de comunismo, que princípios a
sustentam. Basta, isso sim, causar o medo, disseminar o horror, propagar o fantasma do fim dos
tempos – o Armagedon, o Apocalipse – e, com isso, fazer prevalecer a iniquidade e a miséria
social, política, religiosa, sexual. A miséria reforça o poder pelo ódio.
Os comunistas, dizem, querem tomar de você o pouco que tem, querem invadir sua casa, querem
acabar com sua liberdade, querem destruir a fé e as igrejas!
Pura hipocrisia, astuta ou ingênua.
São os comunistas os responsáveis pela real destruição da natureza, que agora verdadeiramente
ameaça a vida humana no planeta e mata (mata!) em seus cada vez mais comuns eventos
climáticos extremos? Não, não são. Isso é obra desse sistema irracional de produção e consumo
fruto da necessidade irrefreável de lucro e poder.
São os comunistas responsáveis pela existência de bilhões (isso, bilhões) de indivíduos rastejando
de fome e miséria em todo o mundo? Não, não são. É o metabolismo voraz de um mercado que se
locupleta de acumulação e que, quando o sistema falha, tem a garantia dos governos a seu serviço.
São os comunistas a causa do racismo, da homofobia, da xenofobia que causam morte e
sofrimento de milhões de pessoas em todo o mundo? Não, não são. É a ignorância e o ódio que
sustenta essa alucinação nacionalista irracional que divide territórios, crenças, raças e gêneros e
propala a ideia de que uns são mais que outros.
É o comunismo o criador das cruzadas, das jihads, do sionismo, da intolerância contra a fé e o
culto alheio? Não, não são. É a própria intolerância religiosa e a usurpação da fé por oportunistas
que fazem dela negócio e política.
Não, e você sabe disso, embora talvez não queira saber.
“O comunismo não priva ninguém do poder de se apropriar de sua parte dos produtos sociais;
apenas suprime o poder de subjugar o trabalho de outros por meio dessa apropriação”, declaram
os autores do manifesto.
Os comunistas somos – porque me reconheço como um deles – os que querem o equilíbrio da
vida humana possível (porque, sim, somos um nadinha e inevitavelmente seremos pó, donde
viemos), os querem a paz e a harmonia; os querem poder trabalhar e realizar no trabalho; os
querem educação, e casa, e saúde até a hora derradeira.
E isso defendemos sempre e por isso lutamos e lutaremos. E por isso muitos morreram (mesmo
sem dizer-se ou saber-se comunistas), morreram resistindo à opressão nazista, ao império
americano, ao stalinismo opressor, à desordem do capitalismo selvagem globalizado.
Os comunistas queremos – e eu sou um deles – que todos e cada um (não apenas alguns) sonhem
com a lua (mas não em fazer dela mais um lugar de turismo exibicionista), sonhem com a festa no
céu (com todos os bichos, e não só com os porcos), sonhem acordados vivendo em harmonia e
arte o enigma da existência. Sim, uma festa; uma festa de todas as cores, de todas as fés, de todos
os jeitos e trejeitos, de todas as formas de ser e viver e conhecer.
Não se iluda com a o discurso da ganância disfarçada de oportunistas (oportunidades de quê?).
Não repita sem pensar as frases do ódio e da desavença.
Não seja hipócrita.
O hipócrita, já disse o Papa Francisco recentemente, “é a pessoa que finge, lisonjeia e engana,
porque vive com uma máscara no rosto e não tem coragem de enfrentar a verdade. Por isso, não é
capaz de amar verdadeiramente e limita-se a viver de egoísmo”.

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