Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Elaine Marinho Bastos 1 Marcelo Souza Pinheiro 2 Tereza Cristina Batista de Lima 3
Resumo
A gestão da diversidade nas organizações é tema emergente em estudos organizacionais, apesar de alguns tabus ainda existentes.
Observam-se formas de diversidade em que a invisibilidade é possível e menos estudada que as formas mais visíveis, como gênero
ou etnia. Estudos apontam um crescimento de publicações que analisam a discriminação sofrida por indivíduos de orientação sexual
diversa no ambiente organizacional, embora enfatizem que a diversidade sexual tem sido pouco estudada no Brasil. Ainda existe a
discriminação diante de cargos hierarquicamente mais elevados, evidenciando uso de estereótipos e preconceitos, que comprometem a
autoestima e geram sentimentos de exclusão. Tais aspectos foram evidenciados neste artigo a partir da percepção de inclusão em uma
organização varejista de Fortaleza, Ceará, sob a ótica da orientação sexual dos entrevistados. Dez profissionais masculinos relataram
sobre a percepção da orientação sexual e o sentimento de inclusão na organização em que trabalham. A pesquisa teve foco qualitativo,
descritivo e exploratório, obtendo dados por meio de entrevista. Os principais resultados mostram que os discursos empresariais são
pouco efetivos devido ao preconceito arraigado, a pouca permissividade gerencial e à ausência de senso coletivo de diversidade. Minorias
e não minorias demonstraram preconceito e atitudes discriminatórias entre si, evidenciando dificuldades no respeito às diferenças
Abstract
Diversity management in organizations is an emerging topic in organizational studies, although there are still some taboos. It is observed
some forms of diversity where invisibility is possible and least studied than most of visible forms, such as gender or ethnicity. Studies
point to a growth of publications that analyze discriminations suffered by individuals of different sexual orientation in the organizational
environment, while emphasize that sexual diversity has been little studied in Brazil. There is still discrimination before hierarchically
higher positions, showing the use of stereotypes and prejudices that undermine self-esteem and lead to feelings of exclusion. These
aspects were highlighted in this article from the perception of inclusion in a retail organization in Fortaleza, Ceará, from the perspective
of sexual orientation of the respondents. Ten male professionals reported on the perception of sexual orientation and sense of belonging
in the organization they work for. This research has qualitative, descriptive and exploratory focus, obtaining data through interviews.
Main results show that business speech are ineffective due to ingrained prejudice, poor management permissiveness and lack of
collective sense of diversity. Minorities and non-minorities demonstrated prejudice and discriminative attitudes among themselves,
showing difficulties regarding differences.
1
Professora Universitária, Mestre em Administração, Psicóloga e Assistente Social. Universidade Federal do Ceará. E-mail: psicologia_elaine@hotmail.com
2
Mestrado Profissional em administração e Controladoria, FEAAC-UFC, msouzapinheiro@uol.com.br.
3
Professora, Doutora, FEAAC - Universidade Federal do Ceará, tereza@prograd.ufc.br
sexual; avaliações de desempenho basea- da palavra grega homos que quer dizer “o
das intensamente em um único traço do in- mesmo, igual” e sexus para definir rela-
divíduo, a identidade homossexual, dentre ções afetivas amorosas entre pessoas do
muitas outras formas de preconceito. Com mesmo sexo.
esse cenário, indivíduos homossexuais das
Conforme Naphy (2006) a homosse-
mais variadas profissões tendem a escon-
xualidade perdurou no contexto da perver-
der a orientação sexual, na tentativa de
são sexual durante décadas. Antes de o ter-
evitar a discriminação e o enfraquecimento
mo homossexualidade ser criado, em 1860,
da carreira profissional. Ainda é indicado
pelo médico austro-húngaro Karoly Maria
como consequência do preconceito o isola-
Benkert (1824-1882), o uso de nomencla-
mento, a perda de chances de promoção,
turas diferenciadas variava de acordo com
a exclusão de redes de trabalho profissio-
as épocas, culturas e discursos vigentes:
nais, a intimidação e a violência física, mo-
sodomitas, invertidos, doentes mentais ou
ral ou sexual.
perversos, dentre outros. Benkert definia a
Neste trabalho, foi analisada a per- expressão criada, explicando ser algo além
cepção da importância da orientação se- do impulso sexual normal dos homens
xual, inclusão e sentimento de inclusão e das mulheres, onde a Natureza, do seu
da carreira de profissionais homossexuais modo soberano, dotou à nascença cer-
masculinos em uma organização varejis- tos indivíduos masculinos e femininos do
ta de Fortaleza, Ceará. Foram levantadas impulso homossexual, onde esse impulso
informações a partir do questionamento a criaria, de antemão, uma aversão direta ao
10 (dez) profissionais, sobre a percepção de sexo oposto (Naphy, 2006).
ser homoafetivo e o sentimento de inclusão
A distinção entre heterossexualida-
na organização em que trabalham. No es-
de e homossexualidade foi demarcada na
tudo foi adotada uma pesquisa qualitativa,
qualificação da identidade dos sujeitos
bibliográfica, descritiva e desenvolvida a
em geral após a Segunda Guerra Mundial
partir de um estudo de caráter explorató-
(Bourdieu, 2003). A heteronormatividade
rio, através de entrevista semiestruturada.
foi instituída e legitimada como preceito
Além desta introdução, este artigo regulador das relações sociais por meio da
está estruturado em cinco seções. A segun- difusão de ideias pejorativas de atribuição
da seção aborda a homossexualidade no social acerca das práticas não heteros-
contexto organizacional, seguida da meto- sexuais, que associavam estas às noções
dologia utilizada na execução da pesquisa. de doença e perversão em decorrência do
Por fim, são analisados os discursos dos imaginário coletivo. Em decorrência do es-
entrevistados, e apresentadas as conside- tabelecimento de tal distinção sexual, os
rações finais. sujeitos assumidamente homossexuais
passaram a ser enquadrados em esferas in-
feriores da hierarquia social e a ser alvos de
2 - A HOMOAFETIVIDADE E O CON- discriminações e inferiorizações, realidade
TEXTO ORGANIZACIONAL de opressão invisibilizada como natural às
Para Ceccarelli (2008) a homoafeti- relações de subordinação (Ceccarelli & Sa-
vidade, o sujeito homossexual ou como é les, 2010)
mais comumente denominado na socieda- A heteronormatividade refere-se à
de brasileira, o gay, são “invenções” do sé- crença na superioridade da orientação he-
culo XIX. Surge uma nova categoria social, terossexual e na consequente exclusão,
que viria a ser marcada, estigmatizada e re- proposital ou não, de indivíduos não hete-
conhecida como desvio da norma. Derivada rossexuais, de políticas públicas e organi-
“câncer gay”. Apesar disso, a epidemia da Medeiros (2007) enfatiza que dos três
AIDS, também trouxe à tona novas formas espaços sociais onde as pessoas desenvol-
de organização social do movimento GLBT vem sua vida: familiar, social e profissio-
(Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transexuais) nal; é no profissional que a discriminação
e uma maior visibilidade e discussão des- contra homossexuais se torna mais pre-
te tema pela sociedade brasileira (Pereira, sente, mas nos demais existe a discrimi-
2004). nação velada e que interfere nas questões
profissionais.
Para Fleury (2000), a diversidade se
relaciona ao respeito à individualidade e ao A presença de discriminação no local
seu reconhecimento, a forma pela qual os de trabalho colabora com a existência no
indivíduos se percebem – suas identidades ambiente laboral do que Meyer (1995) de-
visíveis e invisíveis. Pode ser dividida em nominou de “estresse de minorias”. O con-
duas classes: as primárias, inatas, imutá- ceito de “estresse de minorias” surge para
veis e centrais na formação da identidade explicar o estresse psicológico vivenciado
do ser humano; e as secundárias, que, ad- por grupos estigmatizados. Para o autor,
quiridas ao longo da vida, mutáveis, não al- trata-se de um estado interveniente entre
teram o núcleo principal da identidade do agentes estressores antecedentes e viven-
indivíduo. ciados sequencialmente em uma cultura
estigmatizada, que define um determinado
Cox (1993) define diversidade como:
grupo com um status inferior, resultan-
(...) a representação, em um siste- te do preconceito e discriminação social.
ma social, de pessoas com afiliações Uma sobrecarga físico-psicológica a qual
a grupos claramente diferentes em um indivíduo está sujeito quando perten-
termos de significado cultural. A ce a uma minoria, conforme sugerido por
questão da diversidade em um con- Irigaray (2006). Ou seja, estresse de mino-
texto de sistema social é caracteri- ria é o estresse vivenciado por pertencer a
zada por um grupo majoritário e por um grupo minoritário que é marginalizado
grupos minoritários, isto é, aqueles e oprimido. Pode provocar alienação, inter-
grupos com menor quantidade de nalização dos valores sociais negativos e
membros representados no sistema atitude negativa relacionada com determi-
social (Cox, 1993, p. 5-6). nada orientação sexual. Assim, é operacio-
nalizado por meio de três componentes: ho-
mofobia internalizada, estigma percebido e
As práticas homofóbicas e heterocên- atitudes preconceituosas.
ticas impedem que os homoafetivo vivam
plenamente suas vidas afetivo-sexuais, bem A diversidade passou a ser tomada sob
como criam barreiras para que os mesmos um olhar mais pragmático, ou seja, poderia
se insiram e ascendam no mundo organiza- traduzir-se em vantagem competitiva para
cional (Irigaray, 2008; 2007). A rigor, essa as organizações que a adotassem. Segun-
hegemonia masculina sequestra o capital do Fleury (2000), a gestão da diversidade
social das minorias (Bourdieu, 2007). Po- surgiu da constatação de que o contingente
cahy (2007) também defende que a homo- de trabalhadores do sexo masculino e de
fobia e a hierarquização das relações entre cor branca diminuiria, fazendo com que o
homens e mulheres, também denominadas percentual de mulheres, negros e homoa-
de sexismo, são fruto de uma sexualidade fetivos, no mercado de trabalho crescesse.
binária que cria um espaço social sexuali- Desta forma, Ferreira e Siqueira
zado, que atua como sinalizador dos possí- (2007) concluem que homossexuais assu-
veis lugares a serem ocupados. midos são alvo de ações homofóbicas que
criam barreiras para a ascensão profissio- estresse e depressão, dentre outras conse-
nal e que também dificultam o relaciona- quências como: isolamento, baixa autoes-
mento com o restante do grupo. Os pesqui- tima, chegando, em alguns casos, a ocor-
sadores defendem que os gays assumidos rer automutilação e tentativa de suicídio
são mais voltados para a carreira que per- (Guedes, 2003). Constata-se assim, que a
mita expressar a orientação sexual no tra- discriminação por orientação sexual possui
balho, enquanto os gays enrustidos estão dimensões psicológicas e sociológicas.
mais focados para escolhas fundamenta-
Como aponta Ozerene (2013), Cox
das em valores de trabalho mais tradicio-
(1994) e Costa (2007) as principais situa-
nais e relacionados a status, compromisso
ções de preconceito são: discriminação,
e estabilidade, como aponta Ozeren (2013).
inapropriação de profissões para os ho-
Partindo do pressuposto de que a mossexuais, homofobia, estereótipos ne-
homofobia pode alterar negativamente a gativos, estigmas sociais e o medo da AIDS
visibilidade da organização na sociedade, no ambiente de trabalho e a consequente
empresas vêm implementando políticas de exclusão, proposital ou não, de indivíduos
combate à discriminação e estigma ao ho- não heterossexuais das políticas públicas
mossexual. e organizacionais, eventos ou atividades
Estigma é um fenômeno socialmente sociais.
construído, com fortes implicações nega- Como aponta os autores citados aci-
tivas em suas vítimas, dado que se funda ma, caso o indivíduo seja identificado como
numa relação assimétrica, que referenda gay, ele pode absorver todos os impactos
atributos tidos como depreciativos a uma de tal revelação, como a discriminação, a
pessoa ou grupo social (Goffman, 1963). homofobia, o desprezo de colegas, a perda
Definir o preconceito é algo difícil, as- da imagem com que seus colegas o perce-
sim como aponta Devine (1995) pois indica biam. Do outro lado, o sujeito sofrerá sozi-
ser um sentimento negativo relacionado às nho o fato de não se sentir íntegro, ou seja,
pessoas e baseado em associações grupais. da necessidade de estar sempre ocultando
Para Torres e Pérez-Nebra (2004), precon- algo das outras pessoas.
ceito é uma atitude negativa, com grande A sexualidade não é uma área de
carga afetiva, relacionada a um grupo e estudos facilmente relacionada à área
seus integrantes, considerando as diferen- organizacional, fato comprovado pela pouca
ças existentes entre os grupos, podendo ser produção acadêmica com esse tema. Muito
indicados como fraquezas, e a discrimina- embora esteja nela inserida o gênero mas-
ção é definida como o comportamento em si. culino e feminino e sua diversidade, onde
Assim a discriminação pode levar a se inclui os homossexuais, gays, lésbicas,
perda de oportunidades futuras, como afir- transexuais, dentre outras formas de ex-
ma Ozeren (2013), com uma omissão da pressão da sexualidade e diversidade inse-
homossexualidade gerando conflitos psí- rida nas organizações. Ainda hoje se vê uma
quicos pela necessidade de manutenção de imagem inegavelmente preconceituosa, ati-
aparências e imitação de um estilo de vida tudes homofóbicas e de preconceito em rela-
heterossexual. ção aos sujeitos e suas escolhas considera-
Ser alvo de preconceito e estigma ho- das diferentes dos heterossexuais.
mofóbico no trabalho pode predispor ao No âmbito das organizações, a sexua-
desenvolvimento de reações psíquicas com lidade sempre foi cercada de tabus, Góis
sintomas psicossomáticos como: enurese, (2004), deste modo, evitada, mas aqueles
taquicardia, sudorese, ansiedade, insônia, pertencentes a minorias estão inseridos
cada vez mais juntos aos demais. Nos úl- sionais. Não raramente, os homossexuais
timos anos, muito da literatura em admi- masculinos são associados à fragilidade,
nistração tratou do assunto, pois o tema medo e inconsequência (Irigaray, 2007a),
diversidade tem se consolidado na pauta o que confirma a heteronormatividade (He-
empresarial em todo o mundo, principal- rek, 1998) como um dos pilares de nossa
mente em razão das diferenças na força sociedade. Esta crença na superioridade da
de trabalho. A partir da década de 1980, orientação heterossexual reforça a exclu-
segundo Torres e Pérez-Nebra (2004), a di- são de indivíduos não heterossexuais das
versidade emergiu como um dos mais pro- políticas públicas e organizacionais. Por
fícuos temas em estudos organizacionais. não ser explícita, a heteronormatividade
Estas podem ser visíveis (gênero, etnia) ou estigmatiza, nega e denigre manifestações
invisíveis (religião, doenças crônicas). Ape- das minorias.
sar de serem dificilmente mensuradas, as
Para Fleury (2000: 21), a gestão da
identidades sociais invisíveis não são in-
diversidade cultural deve ter como objetivo
comuns.
principal administrar as relações de traba-
Observa-se, no Brasil, que tem ocor- lho, as práticas de emprego e a composição
rido pouco interesse na realização de pes- interna da força de trabalho, a fim de atrair
quisas que analisam a discriminação so- e reter os melhores talentos dentre os cha-
frida por homoafetivos no ambiente orga- mados grupos de minoria. Complementa
nizacional, como reforça Irigaray (2007) a ainda que quanto maior a diversidade da
diversidade sexual ainda tem sido pouco mão-de-obra maior o incentivo a criativi-
estudada nos estudos organizacionais no dade dos empregados, contribuindo para a
Brasil. Com essa limitação do reconheci- melhoria no processo decisório da empre-
mento e da valorização dos estudos so- sa, uma vez que a torna mais flexível e ágil,
bre diversidade nas organizações, a ho- facilitando a troca de informações sobre ex-
mossexualidade tem foco restrito da área periências, valores, atitudes e a apreensão
de estudos, além de ser visto como tema de novas abordagens.
constante de piadas e desprezo na cena
Irigaray (2006) afirma que ser identifi-
organizacional, por consequência de sua
cado como homo ou bissexual no ambiente
exclusão na sociedade e pouco foco aca- de trabalho pode comprometer a ascensão
dêmico. O gay assumido é discriminado profissional de um indivíduo em função de
devido à orientação sexual, principalmen- sua dificuldade em elaborar uma rede de
te para ocupar cargos hierarquicamente contatos.
mais elevados, sendo claramente objeto de
Para Irigaray (2006) a inclusão é um
estereótipos e de preconceitos, o que com-
paradigma que se fundamenta na neces-
promete sua autoestima e gera sentimen-
sidade de tornar as organizações um es-
tos de exclusão.
paço viável de convivência entre pessoas
A heterogeneidade do ambiente de de todos os tipos, assegurando a inserção
trabalho não é um desafio apenas para os e concretização de seus direitos, necessi-
indivíduos, mas para as organizações tam- dades e reconhecimento de possibilidades
bém, como afirmam Herek (1998) e Ozeren e potencialidades, assim a inclusão tem
(2013). Ao contrário dos negros, mulheres, compromisso com as minorias e com a
deficientes e obesos, discriminados e estig- diversidade. As transformações dos sen-
matizados pelas suas características físicas timentos de inclusão são essenciais para
e mentais, os gays o são pela percepção so- construção de uma sociedade mais justa
cial de um desvio de conduta moral, que e mais igualitária. Inclusão é a convicção
comprometeria seus desempenhos profis- de que todos terão os mesmos direitos de
implicações das mesmas diante da teoria além dos conflitos internos por eles viven-
apresentada: i) orientação sexual e carrei- ciados, como a violência, a discriminação e
ra; ii) ser gay na organização; iii) estereóti- o preconceito.
po e experiências negativas e, iv) sentimen-
Entrevista 7 - Somos iguais e dife-
to de inclusão na organização.
rentes. E a empresa percebe isso, mas nem
A discussão dos dados por catego- todos aceitam, daí fica difícil conseguir
rias acompanha alguns trechos de verba- conquistar coisas boas.
lizações dos entrevistados. Serão tratados
apenas os temas mais presentes nos dis-
cursos respeitando a natureza do estudo A gestão da diversidade amplia a va-
qualitativo. riedade de habilidades, competências e de
ideias. A orientação sexual é um conceito
com múltiplas interpretações que devem
I) Orientação sexual e carreira ser absorvidas para uma melhor aceitação
dessas diferenças.
Diante da realidade da inserção do
homossexual nas organizações percebe-se
que na organização pesquisada existe uma
II) Ser gay na organização
aceitação da diversidade, mas com formas
veladas de preconceito, onde a dificuldade Um dos desafios mais importantes e
de ascensão profissional é percebida. abrangentes enfrentados pelas organiza-
ções atualmente é a adaptação e aceitação
Entrevistado 1- O discurso é muito
das diferenças entre as pessoas. O termo
bonitinho, mas não tem nenhum gay ge-
utilizado para descrever esse desafio é di-
rente ou diretor
versidade da força de trabalho. A diversi-
Entrevistado 2 – se for olhar não tem dade é encontrada na organização pesqui-
ninguém que seja bicha, a gente fica aqui sada, pois todos são unânimes em apontar
mesmo, sem chegar ao topo que os gays estão “dominando” a empresa.
Entrevista 3- Nós estamos em todo
Nas falas, é apresentado que o fun- lugar, tem que aceitar
cionário não consegue expor muito de seus Entrevista 4 - Em toda loja tem bicha
conhecimentos e possibilidades de cresci- igual a nós
mento. Um colaborador que possa se ex-
Mas vale ressaltar que o trabalho e
pressar sem medo de represálias terá uma
sexualidade são partes constituintes dos
tendência maior de se sentir psicologica-
sujeitos, mas existem contradições sobre
mente comprometido com a organização.
os discursos adotados por ser um assunto
Em determinadas ocupações a atuação do
arraigado de preconceito. Discurso de acei-
homossexual é tolerada, sendo mais visível
tação de homossexuais inseridos e com-
no setor de atendimento ao público.
portamentos de rejeição e discriminação
Entrevistado 4 – A gente fica aqui surgem nas falas dos entrevistados e foram
atendendo os clientes, tem uns que gos- evidenciados na pesquisa.
tam, outros não. A gente é mais alegre né e
Entrevista 2- Se você for afeminado,
os machistas não gostam.
se tiver trejeitos, ou seja, se a pessoa pos-
sa perceber mais facilmente que a pessoa
Por ser o gay visto como diferente e é gay, com certeza as pessoas riem e, com
anormal, são supostas as limitações no certeza, ela pode ficar esquecida em um
comportamento e a pouca aceitação social, canto para não aparecer muito
São percebidas várias formas de dis- buscando maior produtividade, mas sem
criminação no local de trabalho, direciona- cometer nenhuma discriminação. Segundo
do a funcionários homossexuais masculi- Fleury (2000) a diversidade serve para criar
nos, com mecanismos de exclusão dos in- competitividade, atraindo e desenvolvendo
divíduos que apresentam comportamentos competências.
considerados não desejados, pois há sem-
pre barreiras e dificuldades vivenciadas pe-
los gays em seus ambientes de trabalho. III) Estereótipos e experiências negativas
Homens gays negociam e administram sua O estereótipo limita a capacidade
homossexualidade frente a um contexto técnica e intelectual dos homossexuais. É
heteronormativo, para sobreviver até se ca- demonstrado diante de expressões discri-
lam, escondendo-se sob a impessoalidade minatórias direcionadas a essas categorias
profissional. direta e indiretamente no local de trabalho.
Entrevista 6 – Meu futuro é esse. Vou Entrevista 6 - Brasileiro é machista,
fazer faculdade, mas sei que não vou subir não importa em que empresa ele trabalhe.
muito, nem aqui, nem em nenhuma em- E aqui é assim também. Sou inteligente
presa. Bicha aqui morre no chão, como eu. igual aos outros, mas por ser gay tenho
Percebe-se que há dissonância entre o menos oportunidades e também nem vou
conteúdo das falas e as práticas de diversi- atrás, para que né?
dade na organização. Entrevista 1 - Aqui tem gente que
Entrevista 5 - Se tem preconceito? trata bem, tem outros que não. Tiram brin-
Não sei, acho que não, porque se tiver eu cadeiras e falam coisas sem graça, achando
denuncio, mas vira e mexe a gente ouve que tão abafando
piadinhas sobre gays (...) isso enche o saco. O medo da AIDS aparece no discurso
O que se percebe é que os segmentos diante da realidade de morte de um amigo
ditos “invisíveis” se escondem para conti- de trabalho que havia contraído a doença.
nuar empregados, silenciando sobre as Entrevista 2 - Sabe o (nome do fun-
variadas formas de discriminações que so- cionário), ele morreu né? e a gente sabe que
frem e se excluindo de temas que possam foi da doença que ele pegou. Aqui tem gente
ressaltar as diferenças. Mas eles criam es- que tá com medo por ter ficado com ele.
tratégias de sobrevivência nesse meio con- Que tava perto dele e trabalhou com ele.
siderado inóspito em alguns momentos. Todo mundo sabe que não pega pelo conta-
Brincadeiras e comportamentos de nega- to, mas fica o medo.
ção de certos preconceitos são constantes
no discurso. Nota-se que o gay também é precon-
ceituoso com o gay afeminado, inclusive, e
Entrevista 1- Eu levo na brincadeira, age, em determinadas situações, próximo
acho que quem fala é um homossexual in- ao que age um homofóbico. Mencionou-se
rustido. a analogia que se faz em relação ao gay e
à mulher. Nesse caso, afirma-se que o gay
Entrevista 3 - Fico é curtindo com a
é tão desvalorizado socialmente quanto a
situação, vou ficar com raiva para quê, não
mulher, fruto de um processo social histó-
resolve, tô é acostumada. rico pelo qual se vê a mulher como pessoa
Deve-se mudar a visão das organi- frágil e sensível e o gay, por ser visto roti-
zações e inclusive da área de gestão de neiramente como a pessoa que quer se pas-
pessoas para reconhecer as diferenças e sar por mulher, também sofre preconceito
assegurar a retenção dos funcionários, de gênero.