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Sumário

Apresentação
.....................................................................................
5

Capítulo
1 - Fonética
...........................................................................
7

Capítulo
2 - Fonética
versusfonologia 36

Capítulo
3 - Traçosdistintos 47

Capítulo
4 - Regras
e processos
fonológicos 59

Capítulo
5 - Fonética
.........................................................................
70

Recapitulando..................................................................................
83
Referências
.......................................................................................
85

Informações
sobreosautores 86
Fonologia, variação e ensino

PALAVRADOS
AUTORES
Apresentação AopensarmosFonologia,Variaçãoe Ensinocomoumadasdisciplinas
obrigatóriasda matrizcurriculardo MestradoProfissionalemLetras

(ProfLetras),vislumbramosa possibilidadede ofereceraos alunos-


-professoreselementoscapazesde embasarseu trabalhoem sala
de aula,considerandoa variaçãodialetale a aquisiçãoda linguagem
orale escrita.Paratanto,nossapropostaé reveros conceitosfunda-
mentaispara os estudos fonético-fonológicosdo português.Este
materialvisa,portanto,abordarsubsídiosteóricos,alémde oferecer
atividadesquepossibilitema fixaçãodoconteúdodemaneiraprática
e efetiva.

A Linguísticapodeserdefinidacomoo estudocientíficodaestrutura
dalíngua.Elareúneestudosemdiversoscampos,dentreelesaMorfo-

logia,a
maioresdaSintaxe,a Semântica,
língua(palavra, que se preocupamcom
frase,relaçõesde as unidades
sentidoetc.),e a Fono-
logia,a qualsevoltaparaasunidadesmenores(fonemas).Osestudos

fonéticose fonológicostêmsua origemem momentosdistintos.Os


primeirosforamalvodepreocupaçãodosestudiososdalínguamuito
antesdo séculoXX;já a Fonologiatemsuaorigemcomos estudosdo
Círculode Praga,no início do séculoXX.Emboratenhamobjetosde
estudodiferenciados,essesdois camposde estudosão interdepen-
dentes.Issoé o queveremosaoexplicitarume outro.

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Este e-bookestá organizadoem 5 capítulos.No capítulo1,Fonética,
focalizaremos,
demododetalhado,afonéticaarticulatória,descreven-

do todosos componentesdo aparelhofonador,bemcomoos órgãos


envolvidosnaproduçãodossonsdafalapara,nasequência,apresen-
tara classificaçãodossonsconsonantaise vocálicos.

No capítulo2, FonéticaversusFonologia, retomaremosa gênesedos


estudosfonológicoscomseusprincipaisprecursorese as diferentes
realidadesqueo fonemarepresenta.
No capítulo3,Traçosdistintivos, apresentaremos
comoas caracterís-

ticasarticulatóriase acústicasdossonsfuncionamnasváriaslínguas
e como essas propriedadesrepresentamas atividadessimultâneas
queocorremno tratovocal,quandose dáa produçãodeumsom.

Nocapítulo4,Regraseprocessosfonológicos, destacaremos
osproce-
dimentosbásicosparaa formalizaçãode umaregra,seguindocoma

apresentaçãodosprocessosfonológicosmaisatuantesno português
brasileiro.

Parafinalizar,no
sílabanoportuguêscapítulo5, Aesuaestrutura
brasileiro sílaba, apresentaremos a descriçãoda
interna,combaseemum
modelode representaçãoarbórea.Por fim,trataremosdos ditongos,

quesãoumaformadereorganizaçãodasvogaisno interiordasílaba.

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Capítulo 1

FONÉTICA
Introdução A Fonéticaé o estudosistemáticodos sons da fala,isto é, trabalha
com os sons propriamenteditos, levandoem consideraçãoo modo
comoelessão produzidos,percebidose quaisaspectosfísicos estão

envolvidosna sua produção.Trataremos,nestecapítulo,do primeiro


aspecto,ou seja,a fonéticaarticulatória,abordandoa descriçãodo
aparelhofonadore a classificaçãodossonsconsonantaise vocálicos.

Domíniosda Osestudosdefonéticaabordamtrêscamposdistintos,a saber:o arti-


fonética culatório,o acústicoe o auditivo,conformedetalhadosa seguir.

Fonéticaarticulatória:
estudaos sons do pontode vistafisiológico,
descrevendoe classificando-os.
Assim,ao descrevermosa realizaçãode um som, por exemplo[p],

podemosafirmarquenasuaarticulaçãoquasenãohouvevibraçãodas
cordasvocais,por isso ele é não-vozeado;queo fluxodo ar seguiuo
caminhodotratovocal,nãodasfossasnasais,caracterizando-ocomo
oral;e quehouveobstruçãopelosdoislábios,porisso eleé oclusivoe
bilabial.Esteé o papeldaFonéticaArticulatória.

Fonéticaacústica:leva em conta as propriedadesfísicas do som,


explicandocomoos sonsdafalachegamaoaparelhoauditivo.

CapítuloI - Fonética 7
A análisedesse som e sua propagação,realizadacom o auxíliode programase softwares
específicos,sua amplitude,duração,frequênciafundamental,etc. estáno foco da Fonética

Acústica.
Fonéticaauditiva
: centralizaseusestudosnapercepçãodo aparelhoauditivo.

Muitasvezes,nãoconseguimospercebersonssupostamente iguaisdeformaidêntica.Sóuma
análisemaisacuradapermitiráidentificá-los.Esse tipo de estudocabeà Fonéticaauditiva,
campodepesquisamuitopoucoexplorado,principalmente no Brasil.

Essestrêscamposdeestudosnemsempresãoimplementados concomitantementee umdos


motivosparaqueisso nãoocorraé a faltadeespecialização,
principalmenteno queconcerne
aos estudosauditivos.Por isso,vamosnos deterna fonéticaarticulatória,considerandoser
essaa partemaisfácil de ser verificada,já quediz respeitoà produçãodos sons.Valesalien-

tar,entretanto,
que,parafazermosum
temosnecessidade estudomaisdetalhadoda produçãode
de recorrera estudosacústicos.Taisestudos,no algunssons,
passado,necessitavam
de aparelhosbemsofisticados,e, muitasvezes,de difícil acesso.Hoje,comum computador

bemequipadoe com“softwares”específicos,podemosrealizarexcelentesanálisesacústicas.
Considerandoas dificuldadesapontadas,aqui nos deteremosna articulaçãodos sons, ou

seja,na Fonéticaarticulatória,
a produçãodos sons,levandoemaquelaque,comoafirmamos anteriormente,
contaseu modode articulação, estávoltadapara
seu pontode articulação,
seucarátervozeadoou nãovozeadoe aindasuaconfiguraçãonasalou oral.

CapítuloI - Fonética 8
Aparelhofonador O ser humanonão possui um órgão ou um
sistemaque tenha como função primáriaa

produçãodos sons da fala. Para falar,ele se


utiliza de partes do corpo, como pulmões,
traqueia,laringe(epiglote,cordasvocais,etc.),
faringe,palatoduro (ou céu da boca),palato
mole(ou véu palatino),língua,dentes,
mandí-
bula,lábiose cavidadesnasal,cujas funções
primáriassãoalimentação, respiraçãoeprote-
ção de viasáreasinferiores,ou seja,vitaisao

serhumano.

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Vídeo1– Aparelhofonador.

CapítuloI - Fonética 9
Comose realizam Pararespondermosa essapergunta,temosqueentender
os sonsda fala? o caminhoque o fluxode ar seguena respiração.Impor-
tantelembrarmosque os sons,geralmente,não se reali-
zamno momentoda “inspiração”,masda “expiração”.O
oxigênio,vitalaoserhumano,chegaatéos pulmõespelos
brônquios.Emseu caminhode volta,aindaar,ele sofre a
primeiradeformaçãoao chegarà laringe.Todosos sons
dafalahumana– sejamvogais,consoantesousemivogais
(tambémdenominadasde glides) – são produzidosno
tratovocal.Essepodeserconsideradocomoumaparelho

constituídode câmaras,tubos e válvulas,cuja função é


pôro ar emmovimentoe controlarseufluxo.

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Vídeo2 – Fluxodo ar narespiração.

CapítuloI - Fonética 10
Sonssurdose O ar expelidopelospulmõeschegaà laringee atravessa
sonoros a glote,quefica na alturado chamadopomo-de-adãoou

gogó.O ar,então,chegaà aberturaentreas duaspregas


muscularesdas paredessuperioresda laringe,conhe-
cidas pelo nome de cordas vocais. O fluxo de ar pode
encontrá-lasfechadasou abertas,emvirtudede estarem
aproximadasou afastadas.Caso estejamfechadas,o ar
forçasuapassagem,fazendo-asvibrare produziros sons
chamadosde vozeadosou sonoros. No segundo caso,
quandorelaxadas,o ar escapa,comvibraçãomínimadas

cordas,produzindosons chamadosde não-vozeadosou


surdos.

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Vídeo3 – Cordasvocaisemmovimento.

CapítuloI - Fonética 11
Toque para ouvir

A distinçãoentresonssonorose surdospode
Observação ser claramentepercebidana pronúncia de

paresdeconsoantescomo:

Todasessas palavrasse opõemapenaspela


vibraçãoou não das cordasvocais.Enquanto
são classificadascomosurdos,
porteremmínimavibraçãodascordasvocais,
[ sãoclassificadascomosonoros,
porteremmaiorvibraçãodascordasvocais.

CapítuloI - Fonética 12
Atividade

1- Tape seus ouvidos com as mãos e reali-


ze os sons mencionadosno quadro anterior.

Identifique-oscomoSURDOS(SU)ou SONOROS
(SO).

SURDOS SONOROS

cato selo bato chato vaca dado


faca zelo jato tato pato gato

CapítuloI - Fonética 13
Atividade

2- Encontreno quadropalavrascujo primeiro


somsejasurdoou sonoro.Emseguida,reescre-

va-asconformea classificação:

S H P F Y D V E R D A D E W L

U D C S E N L A W V A F I B L

H E B H U P A M T I A B M U I

A T T E P O W D R N U Y W N E

A I O E M N A A A P R M L O O

E C F U P R T M W D A S U Y T

H T R N U A C I A B O U N W M

H F O F L U T P G H O R D V O

B A C E P A S U N N L A B K L

G O U I V L H J C H I F R E E

P F I U M B H U T C N J J G Z

P L W P A N E L A A A O I M A

chifre
lataria
lhama
moleza
nadador
panela
rua
sapeca
CapítuloI - Fonética 14

tapete
verdade
Atividade

3- Nomeieos órgãosenvolvidosna fonação.A


seguir,cliqueemcadaumparaconferirarespos-

ta correta.

Epiglote Cordas Vocais Palato Mole Úvula

Maxilar Inferior Faringe Fossas nasais Arcada Alveolar


Abertura
Dentes Pulmões Palato Duro
Velofaringal
Diafragma Língua Lábios Laringe

CapítuloI - Fonética 15
Aindaa produção Vamosseguiro fluxo de ar depoisde passar
dos sons da fala: pelaglote,queé ondeficamas cordasvocais,

definidorasda sonoridadeou não dos sons.


Quandosai da laringe,o ar vaiparaa faringe.
Aí o fluxo de ar,podetomarduasdireções:o
tratovocalou o nasal.Entreessesdoiscanais
ficaaúvula,órgãodotadodemobilidadecapaz
de obstruir,ou não,a passagemdo ar na cavi-
dadenasale, consequentemente, determinar
a naturezaoralou nasaldeumsom.

Quandolevantada,a úvulaimpedequeo fluxo


de ar saia pelas fossas nasais, resultando,

assim,na produçãode
de [p]“pato” sons
, [t]“teto” orais,a
, [∫]“lixo”. exemplo

Quandoa úvulaestáabaixada,temosas reali-


zaçõesde sonsnasais,isso porqueo ar passa
agora apenas pelas fossas nasais. É o que
Como estamos tratando de Fonética, veja
acontece
taiscomocoma realização desonsconsonan-
que os sons mencionados são sempre [m]“mato” , [n]“neto”, [ɲ]“linho”
.
transcritos entre colchetes [ ]. Quando
No português,além das consoantes ante-
estivermos tratando de Fonologia, a
transcriçãoseráfeita entre barras / /. riormentemencionadas,há os sons que são
produzidoscoma úvulaapenasparcialmente

levantada,o nariz
boca e pelo que permiteque o ar saia
ao mesmotempo,a pela
exem-
plodasvogaisnasalizadas,comonaspalavras

“lindo”[ĩ], “lenda”[e], “manta”


[ã], “onda”
[õ], “mundo” [ũ].

CapítuloI - Fonética 16
Na figuraa seguir,podemosverificarcomose realizamos sons orais,
nasaise nasalizados.

Figura1– Sonsorais,nasaise nasalizados.

CapítuloI - Fonética 17
Atividade

Destaque,no trecho a seguir,palavrasque conte-


nhamsonsnasaise nasalizados:

Na minha escola tem


biblioteca, cantina, banheiro,
sala de professores e muitas
outras coisas. O que eu mais
gosto em minha escola é a
hora da leitura. Gosto
também dos colegas, das
professoras e da minha
namorada.

Quando considerar que terminou a atividade,


clique no botão abaixo:
Finalizar Exercício

CapítuloI - Fonética 18
O tratovocal Depoisdafaringe,localondeofluxodoarvaidefinirsonsoraisenasais,
passemosagoraao tratovocal,ondese situamos articuladoresdos

sonsdafala,quepodemserclassificadoscomoativosou passivos.
Sãoarticuladoresativoso lábioinferior,a línguae o maxilarinferior.Para

aproduçãodossons,essessemovimentam nadireçãodosarticuladores
passivos,quesãoo palatomole,a úvulae os dentesincisivossuperiores.

Figura2 – Articuladoresativose passivos.

Articuladores são partes móveis ou


ativas do aparelho fonador, as quais se
aproximam dos articuladores imóveis
ou passivos (pontos de articulação) ou
tocam neles, reduzindo ou impedindo a
passagem do ar, influenciando, assim,

na forma do canal fonador.

CapítuloI - Fonética 19
Atividade
Indiqueos articuladoresenvolvidosnaproduçãodossonsa seguir:

Lábio inferior Alvéolos Alvéolos Lábio inferior


Dentes
Palato mole Língua (ponta) Dentes
superiores
Palato duro Língua (corpo) Língua (ponta) Lábio superior

Língua (raiz) Língua (corpo) Palato duro Língua (corpo)

CapítuloI - Fonética 20
Ossonsdafalapodemaindaserclassificadosquantoaomododearti-
culaçãoe quantoaopontodearticulação.Tomandocomobaseapenas

sonsproduzidosnaLínguaPortuguesa,vejamoscomoisso ocorre.

Modode Omododearticulaçãoserefereà formacomoos sonssãoproduzidos,


articulação observando-seo fluxodo ar aolongodo aparelhofonador.

a)oclusivos:
paraa produçãodesonsoclusivos,o fluxodearquevem
dospulmõesé interrompidototalmenteemalgumpontodo tratooral,

sejapelofechamento dos lábios,sejapelapressãoda


da dentária,nos alvéolosou línguana arca-
no palatomole,paraser imediatamente
liberado,emitindoumsomsemelhantea umaexplosão.Sãooclusivos

sonscomo[p]“pato” ; [b]“bato”
; [t]“tatu”
; [d]“dado”
; [k]“cachor-
ro”, “queijo”
; [g]“gato”,“guerra” .

b)fricativos:paraa produçãode sons fricativos,o ar é pressionado


pelosórgãosfonadoresdurantesuapassagem,o queresultaemuma
espéciede chiadoou fricção. São fricativosos sons: [f] “faca”; [v]
“vaca”
; [s]“sapo”,“cebola”,
“caça”,“osso”,“exceto”,
“nascer”
;

[z]“zebra”, “exame”
“rato”,[x]~[h] ;,[ʃ]“chave”,
“carta” ; [ʒ]“jaca”,“gente”
“xícara” ; [x]
[ɣ]~[ɦ]“carga”
.

c) africados:na realizaçãodessessons,ocorreumarápidaoclusão
seguidadefricção,comose fossea somadeumsomoclusivocomum
somfricativo.
São africados os sons:[tʃ]“tia”, [dʒ]“dia”.

d)nasais:naproduçãodessessons,o aré bloqueadoemalgumponto


dotratovocal,demodoquesuasaídaocorrapelasfossasnasais,como

em[m]“mata”
, [n]“nata”
, [ɲ]“nhoque”, .
“linha”

CapítuloI - Fonética 21
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Comessasdescriçõesarticulatórias,podemosclassificaros sons da
falaemgeral.Paraunificarastranscriçõesdossons,umavezquesuas
realizaçõespodemvariarde umalínguaparaoutra,foi criadoo Alfa-
beto FonéticoInternacional(InternationalPhoneticAlphabet– IPA).
A seguir,no Quadro1,o quadrodas consoantesdo AlfabetoFonético
Internacionalemsuaversãode2005.

Quadro1– AlfabetoFonéticoInternacional:consoantes.

Quandoos símbolosaparecemem pares,o da direita


representaum som sonoroe o da esquerdarepresenta
um somsurdo.Áreasescurecidasdenotamarticulações
julgadasimpossíveis.
Fonte:Adaptadode<http://upload.wikimedia.org/wikipe-
dia/en/8/8f/IPA_chart_%28C%292005.pdf>.Acesso em:
15jun.2015.

Essesistema,aoserutilizadonatranscriçãofonética,tambémpermi-
te quequalquerfalanteconhecedorde seussímbolosrealizesons de
qualquerlíngua.

CapítuloI - Fonética 25
Atéaquitemosdescritocomose realizamas consoantes,segmentos
produzidoscomalgumainterrupção– parcial,intermitenteoutotal– na

saídado ar.Passemosagoraàs vogais.Dopontodevistaarticulatório,


as vogaissãoproduzidassemnenhumaobstruçãonasaídado ar pelo
tratovocal,de modoqueumavogalse diferenciada outra,conforme
a configuraçãodos lábios,a alturae o avanço/recuoda línguano ato
da produçãodos sons. Ademais,enquantouma classe de consoan-
tes se distingue,emrelaçãoà vibraçãodas pregasvocais,emsurdas
e sonoras,essa distinçãonão se aplicaaos sons vocálicos,umavez
queas vogaissãosempresonoras.Já do pontodevistadesuafunção

no sistemada LínguaPortuguesa,somenteas vogaispodemocupar


o pico silábico,enquantoas consoantesocupamsempreas margens
das sílabas,conformese constataa partir dos seguintesexemplos:
“mar.ca”,“ár.vo.re”,
“cra.vo”,“pos.te”,“po.e.ta”.
Seguindo,pois, os parâmetrosarticulatóriosanteriormentemencio-

nados,e retomadosa seguir,é queas vogaisserãoclassificadas.

Posiçãovertical Vogaisaltas:são aquelasproduzidascoma elevaçãoda língua,seja


da língua:vogais paraaparteanterior,sejapararegiãoposteriordotratovocal.Vejamos
algunsexemplosde vogaisaltasemquea línguase elevapraa região
altas,médiase
baixas frontal:

“ilha”,“apito”,
“caqui”

“leve”,“moleque”,
“pente”

Nota-sequea vogalalta ocorreemposiçõesmaisfracas,comona


sílabaátonaemfinaldepalavras“e”.

CapítuloI - Fonética 26
Assimcomoasconsoantes,asvogaisetodasassuaspossíveisrealiza-
çõestambémestãorepresentadasno IPA.Dispostasemumtrapézio,

é possívelidentificartodasas classificaçõesdessessegmentos.Veja-
mos,a seguir,a disposiçãodos sons vocálicosno AlfabetoFonético
Internacional:

Figura3 – AlfabetoFonéticoInternacional:vogais.
Fonte:Adaptadode <http://upload.wikimedia.org/
wikipedia/en/8/8f/IPA_chart_%28C%292005.pdf>.
Acessoem:15jun.2015.

Deve-seobservar,ainda,quequantomaisaltasas vogais,maisfecha-
das serão;e quantomaisbaixas,maisabertas.Isso permiteas esses
sonstambéma classificaçãoa seguir:

Vogaisfechadas=vogaisaltas

Vogaismeiofechadas=vogaismédiasaltas

Vogaismeioabertas=vogaismédiasbaixas

Vogaisbaixas=vogaisabertas

CapítuloI - Fonética 30
Finalmente,é possívelqueas vogaisrecebaminterferênciade algum
som nasal vizinho,tornando-senasalizadasem oposiçãoàs vogais

orais,comonosexemplosa seguir:

Vogaisorais:pato,lata,gelo,fita,pote

Vogaisnasalizadas:pano,lama,gema,fina,ponte

CapítuloI - Fonética 31
Atividade
1-Entreas palavrasa seguir,indiqueaquelasemquehácorrespondência
entrea letradestacadae o somqueelarepresenta:

panela, quiabo, sapato, guerra, tigre, sábado,


divino, telefone, vida, casa, xadrez, cajado.

CapítuloI - Fonética 32
Transcrição Paraanalisarmosa línguaoralutilizadaporumfalantesob o pontode
fonética vistafonético,é necessárioque façamossua transcrição.Para isso,
umapossibilidadeé lançarmosmãodossímbolosfonéticosquecons-
tituemo IPA.Essatranscrição,algumasvezes,podevariar,dependen-
do do sistemafonéticoqueestásendoutilizado.

Temosdois tipos de transcriçãofonética:um maisamploe um mais


restrito.Notipoamplo,nãolevamosemcontaaquelesaspectosconsi-
deradossecundáriosna produçãodos sons,a exemploda palataliza-
ção,davelarização,bem como os detalhespercebidosnavariação
dafala.Emgeral,é essetipodetranscriçãoquemaisutilizamosnodia
a dia da salade aulaou em pesquisasde caráterdialetal.O Alfabeto
FonéticoInternacionalforneceoutrossímbolosparatranscriçãodos

sons da fala. Vejamosa seguir o IPA completo,com a pronúnciade


cadasomemseparado:

<http://web.uvic.ca/ling/resources/ipa/charts/IPAlab/IPAlab.
htm>. Acesso em: 15 jun. 2015.

CapítuloI - Fonética 33
Atividade
Atualmente,existemdisponíveisna internetbancosde dadosde falade
diferentesregiõesbrasileiras,organizadosa partirdecoletasrealizadas.

Aseguir,elencamososlinksparaacessoaessesdados.Extraiaumtrecho
decadabancoe façaa transcriçãofonética:

Projeto VALPB:<http://projetovalpb.com.br/projetovalpb/>.
Acesso em:
15jun.2015.

Projeto Iboruna:<http://www.iboruna.ibilce.unesp.br/>.
Acesso em: 15
jun.2015.

Projeto NURC: <http://www.letras.ufrj.br/nurc-rj/>.


Acesso em: 15 jun.
2015.

ProjetoVarsul:<http://www.varsul.org.br/?modulo=secao&id=1>.
Acesso
em:15jun.2015.

CapítuloI - Fonética 34
Leia Mais

CALLOU,D.;LEITE,Y. Iniciaçãoà fonéticae à fonologia


. Rio de Janeiro:
Zahar,1990.

FONÉTICA& FONOLOGIA:Sonoridade
em Artes,Saúdee Tecnologia
.
UFMG.2008.Disponívelem: <www.fonologia.org>.
Acessoem: 15 jun.
2015.

SEARA,I.; NUNES,V. G.;LAZZAROTTO-VOLCÃO,


C. Fonéticae fonologia
do portuguêsbrasileiro.UFSC. 2011.Disponívelem: <http://goo.gl/
tQy90q>. Acessoem:15jun.2015.

SILVA,T.C.Dicionário
defonéticaefonologia
. SãoPaulo:Contexto,2011.

SILVA,T.C. Fonética
deexercícios. e fonologiaportuguês:
2003. roteirodeestudose guia
SãoPaulo:Contexto,

WEISS,H. Fonéticaarticulatória:
guiadeexercícios
. Brasília:Sil.1980.

CapítuloI - Fonética 35
Capítulo 2
FONÉTICA
VERSUS
FONOLOGIA
Introdução A estruturada línguase organizaem diferentesníveis,tais como o
fonológico,o morfológico,o sintático,o semântico,o lexicaletc.,todos

elesresponsáveisporaquiloqueenunciamosno nossocotidiano.
Há,comosabemos,dois ramosda linguísticaqueestãovoltadospara

o estudodos sons: a fonologiae a fonética


. Ambosos termostêm
origemnapalavragregaquesignifica“som”.Valelembrar,entretanto,
queo primeirose voltamaisparaaspectosfuncionais,comportamen-
taiseorganizacionaisdossons,enquantoo segundosevoltamaispara
os aspectosfísicos e fisiológicos,como vimosno capítuloanterior.
Separaressesdoisramosfoi umaformaencontradaparamelhoriden-
tificá-los,mas é necessárioapontarque eles são interdependentes.
É difícil,porexemplo,estudara funçãodos sonssemfazerreferência

àssuaspropriedades
articulatóriase/ouacústicas,
podemosestudarossonssemumareferência comotambémnão
àsuafunçãolinguística.

Nestecapítulo,retomaremos a gênesedosestudosfonológicoscomseus
principaisprecursorese,deformamaisespecífica,o conceitodefonema
e a realidadequeelerepresenta,semperderde vista,contudo,queé no

nívelfonéticoquea fonologiase
elementosfonológicosestivessemrealizade modoconcreto.É
armazenados comose
emnossamente– os
ouno
campogeral,socialda linguagem– e a formafonéticaestivessedo lado

externo,permitindoaemissãoconcretae audíveldaqueleselementos.

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 36
Gênesedos Atéo finaldoséculoXIX,a diferençaentrefonéticae fonologiaerauma
estudos discussãode pouco interesse,pois os estudosda épocapreocupa-

fonológicos vam-seessencialmente comamudançalinguística,portanto,voltados


paraasalteraçõesfonéticas.Osestudosfonológicosganhamforçano
iníciodo séculoXX,como Estruturalismo,
quasecontemporaneamen-
te ao coroamentoda Linguísticacomociênciacom objetoe método
próprio,paraculminarnasegundametadedessemesmoséculocomo
Gerativismo,quandoas análisesfonológicasganhamgrandeadequa-
ção descritivae passama interagircom outrasdisciplinase áreas.
Essasduascorrentesda linguísticateóricado séculoXX– Estrutura-

lismoe Gerativismo– sãoaindahojenorteadorasdamaioriadosestu-


dos fonológicos,ao proporemconceitosquepossibilitamdescriçãoe
análisesdosmaisdiversosfenômenosdaslínguasdo mundo.

Línguae fala FerdinandSaussure,consideradoo paidalinguísticamoderna,estabe-


leceudistinçõesclarasentre“langue”(língua)e “parole”(fala);a língua
comosendoo conhecimentode naturezasocialquepermiteao indiví-
duosercapazdefalareentenderosoutros;afalacomoo meioutilizado

pelo falanteparaexpressaresse
que,ao conhecimento.
descrevero sistemalinguístico, Disso,depreende-se
o pesquisadordevese preocu-
parcomos elementosrelativosà língua,nãoà fala.

ParaSaussure,nalíngua,o sistemafônicoconstitui-sedeumconjun-
to de significantes,e a funçãodos elementosquecompõema estru-

turafônicaé distingui-lade outrossignos.O


concepçãoé essaindividualidade maisimportantenessa
entreos signos.

Saussureenfatizouo status de uma descriçãode enunciadosque


indicassetodase apenasas propriedadesquedistinguiriamumsigno
do outro.Suaênfaseno caráterpuramentenegativodo signo,entre-

tanto,deixoualgo obscurona relaçãoentrea realidadefonéticada


falae o papeldistintivodo signono sistemada língua.O autoresteve
poucopreocupadocomos problemaspráticosda descriçãosincrôni-

ca;tampoucoháevidênciadequeestivessepreocupadocomo desen-
volvimentode umanoçãode representaçãofonéticaou fonêmicano
sentidoposteriormente
postuladopelosgerativistas.

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 37
A Escolade Praga No início do SéculoXX,váriosestudiosostrabalharamparaelaboraras
ideiasseminaisde Saussure.O grupoque,talvez,maisse destacoufoi

aquelecompostopelosrepresentantesdaEscoladePraga,incluindoNico-
layTrubetzkoye RomanJakobson.Elestentaramcombinarapreocupação
coma metodologiadescritivacomumaconsciênciasofisticadadasques-
tõesteóricaslevantadasporSaussuree outros.É no livrode Trubetzkoy,
PrincípiosdeFonologia,quepodemosencontrarumasíntesedessasideias.

Trubetzkoyentendeser necessáriodistinguirentreo estudodos sons


dafala,quecorrespondemà ‘parole’saussuriana,doestudodossonsda
fala,quecompõemos significantesdos signosda língua.Aosprimeiros
caberiao estudopelafonética;aosúltimos,o estudopelafonologia.

AsdefiniçõesdefonologiaefonéticapelosestudiososdePragamostram
umatentativadevê-lasdiferentemente: a primeiracomoumadisciplina
funcionale a últimacomoumadisciplinaauxiliardalinguística,reconhe-
cendo,portanto,umaantítesequeSaussurenegou.TantoparaSaussure
comoparaa escoladePraga,asduasdisciplinastinhamdeestarsepara-
das.Issorepresentouumgrandeproblema:tentarestabelecerumalinha

deseparaçãoentreo que,pornatureza,pareceserindivisível.

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 38
Representação Umdos maisimportantesaspectosda concepçãode Trubetzkoyfoi a
fonêmicae “naturalidade”
da relaçãoentreas representaçõesfonêmicae fonéti-

representação ca de umenunciado.O fonemaé vistocomoumaentidadeidealcom


fonética característicasreais e identificáveis.Os traços que identificamum
fonematambémpodemser identificadosna representaçãofonética.
Vistoqueas propriedadesdistintivasde umfonemaespecíficoestão,
paraTrubetzkoy,presentesno som,a condiçãode naturalidadefixao
conjuntodepropriedadessubjacentesaosistemafonêmicoe também
a relaçãoentreas duasrepresentações– a fonéticae a fonêmica.

Trubetzkoyadmiteque a fonéticaé o primeiropassoparafonologia,


e,se é assim,a fonéticadeveserparteessencialdafonologia.Osdois
aspectosdo estudodos sons da fala são complementares e interde-

pendentes;elesrepresentamgraussucessivosdeabstração.
Deformaampla,podemosdizerquea fonologiase voltaparaos sons
da língua,nãoparaos sons da fala,o queseriaobjetoda fonética.De
formamaisrestrita,a fonologiase voltaparaa função,parao compor-
tamentoe paraa organizaçãodossonsenquantoitenslinguísticos.

A análiseestrutural,se aplicadaaosistemafônico,prevêquea substi-


tuiçãodeumelementoopõeumsignoa outro.Se pensarmosemuma
transcriçãofonética,elaapresentadetalhesimportantes,maselanão
é funcional,ou seja,o contrasteentreos signosnãofica patente.

Em resumo,fonéticae fonologiaestudamos sons, de modo que a


primeiraestávoltadaparaaprodução,a distinçãoeadescriçãodesses
sons, voltando-separa o processoda fala; sua unidademínimaé o
fone.Já a fonologiavolta-separaa funçãodessessons numadeter-
minadalínguae suaunidademínimaé o fonema,elementodotadode
propriedadesdistintivas,conformeveremosa seguir.

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 39
Umadasprincipaiscaracterísticasdofonemaé o fatodeeleservaziode
Fonema
significado,ouseja,umsegmentocomo/p/ ou/b/ nadasignificam.Outra

característicadofonemaé que,apesardenadasignificar,eleé aunidade


mínimacapazdedistinguirumapalavradaoutra.Assim,/p/ e /b/ sãoos
elementosresponsáveispordiferenciaros signos‘pata’e ‘bata’.

LarryHyman,emseu livroPhonology:theoryandanalysis, apresenta


trêsvisõesparao fonema:

(i)comorealidadefonética;

(ii)comorealidadefonológica;

(iii)comorealidadepsicológica.

O fonema Soba primeiraperspectiva,entende-sequeo fonemarepresentauma


comorealidade realidadefísicafonética,ouseja:sonsquepertencemaomesmofone-
fonética macompartilhampropriedadesfonéticasimportantes.Imaginemoso
fonema/s/ do Português.A ele podemosligar as seguintesunidades
fonéticas:[s],[s],[z],[z],[x]etc.

Cabeaofonólogodeterminarquaissãoossonsquepertencemàmesma
classe.Para alcançartal objetivo,ele deveexaminaras distribuições

dossons,verificandose os sonssimilaresocorremno mesmocontexto


fonéticoe se a substituiçãodeumporoutroimplicaalteraçãodesenti-
do.Acontecendoisso,podemosdizerquetemosdoisfonemasdistintos,
docontrário,teremosapenasdoisfonesparaummesmofonema.
Umaformabemusualparaobservarmosisso é pormeioda utilização

dosparesmínimos,doisitenslexicaisquese opõemapenaspeladife-
rençade um som.Nos itens ‘ca/s/a e ca/z/a’ (‘caça’ e ‘casa’)temos
um par mínimo.Podemosobservarque a substituiçãode /s/ por /z/
alterouo significadodositens,logo,estamosdiantededoisfonemas.

Tambémpodemosdizerestarmosdiantedeparesmínimosnosseguin-

tesexemplos:
/p/atax /b/ata /ʃ/á x /ʒ/á

/s/elox /z/elo colh/e/r x colh/ɛ/r

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 40
Fica claroquepodemosdistinguircadaum dessesparespor apenas
um segmento.Se a distinçãose der por mais de um segmento,não

teremosumparmínimo.Essessegmentosquetornamos signosdife-
rentessãodenominadosdefonemas.

A validaçãode fonemaspor pares mínimossoa necessáriaapenas


em casosde sons foneticamentesemelhantes,ou seja,aquelescom
diferençasmínimasquantoàs característicasfonéticas,umavezque
segmentosmuitodistantesdo pontodevistafonéticoseriam,a priori,
fonemasda língua.A seguir,algunsexemplosde sons foneticamente
próximos,ou semelhantes:
• segmentoscomoposiçãoapenasquanto à vibração das cordas
[p]e [b],[s]e [z], [k]e [g]etc.
vocais (surdo e sonoro):

• segmentoscom
ção:[p]e [t], [b]eoposiçãoapenasquantoao
[d], [t]e [k], etc. pontode articula-
• segmentoscomoposiçãoapenasquantoaomododearticulação:

[p]e [f], [t]e [s], [d]e [z], etc.


• vogaismédiasanteriores[e]e [ɛ];

Umaoutrapossibilidade
fonemaé verificandose deavaliarmosseestamos
os sonsestãoou ounãodiantedeum
nãoemdistribuiçãocomple-
mentar,ou seja,no lugaremqueum podeestaro outronãopode.No

falarmineiro,por exemplo,o som/t/, comoem ‘tatu’,se realizacomo


africada[tʃ]diantede [i], comoem[tʃ]ia ‘tia’,´ó[tʃ]imo‘ótimo’,e como[t]
nos demaisambientescomoem [t]aco,[t]e[t]o, [t]rem.Então,podemos
dizerque[t]e [tʃ]estãoemdistribuiçãocomplementar,e,dessemodo,
estamosdedoisfonesquerrepresentam foneticamente
o mesmofone-
ma/t/

Tantoa ativaçãodeparesmínimosquantoa distribuiçãocomplemen-


tarsãoestratégiasquenospermitemconcluirsobrea funçãofonêmi-
ca dedeterminadossegmentos.

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 41
Variação Nestemomento,é necessáriauma reflexãosobre pelo menosduas
formasde realizaçãodos fonemas:umaem variaçãocondicionadae

outraemvariaçãolivre.Vejamoscadaumaemseparado.
Variação
condicionada

Comecemosporobservaros seguintesexemplos:

- de[stʃ]
e >de[zdʒ]
e (deste>desde)

- dua[sk]amisas
>dua[zb]lusas (duascamisas>duasblusas)

- dua[sp]eras>dua[zu]vas (duasperas>duasuvas)

Por querazãoo somsurdo[s], nos exemplosda primeiracoluna,torna-

-se
issosonoro[z]nosdadosqueaparecemnasegunda
nãoocorrepelasimplesvontadedo coluna?Certamente,
falante,maspelocondiciona-
mentoprovocadopelosomsonoro[d,b,u]quesegueo [s]. A sonoridade

dessessegmentosespraia-separaosomanterior,condicionando-o
aser
tambémrealizadocomosonoro,emumprocessodevariaçãocondicio-
nadaa quechamamosassimilação.Emresumo,o segmentosurdoassi-
milaa sonoridadedosegmentoseguinte,tornando-setambémsonoro.
Variação
livre

Observemosos exemplosa seguir:

- p[e]queno~p[i]queno~p[ɛ]queno

- p[o]mada~p[u]mada~p[ɔ]mada

- cu[s]to~cu[ʃ]to

- me[z]mo~me[ʒ]mo~me[h]mo~memo

- ga[x]fo~ga[ɽ]fo~ga[r]fo~ga[w]fo~ga[h]fo~ga[χ]fo~gafo
- esma[w]te~esma[r]te~esma[ɫ]te

O conceitode variaçãolivrenãoé bemvistoentreos sociolinguistas,


os quaisdefendemque todavariaçãoé condicionada,podendoesse
condicionamento serresultadodeumarestriçãolinguísticaou social.
Seguindo esse raciocínio,mesmo que o condicionamentopara a

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 42
variaçãonãoestejapresentenasformaslinguísticas– fonológicas,sintá-
ticas,morfológicaetc. –, ele poderáestarem fatoresextralinguísticos,

comoa faixaetária,o graudeescolaridade,


o gruposocialdo falante,ou
aindaregiãogeográficaondeelevive,entreoutrosmuitosfatores.

O fonema Navisãocaracterísticada Escolade Praga,podemosdefiniro fonema


comorealidade como“asomadaspropriedadesdeumsomfonologicamente relevan-
te”.Ou seja,os fonemassão definidosemtermosde suasoposições
fonológica
dentrodo sistema.Com isso, surge o entendimentodo fonemaem
umaperspectivanotadamentefuncional,qualsejaa deempreendera

distinçãodesignificadoentreos signos.
Atreladaa essavisãoestáa noçãode neutralização,conceitofunda-

mental paraafonologia
conceito,recorremosaestruturalista.
Paracompreendermos
umexemplobastante bemesse
comumnoPortuguêsdo
Brasilnoquerespeitao sistemavocálico.Claramente,
naposiçãotôni-

ca,temosum quadrode 7 vogaisdistintivase, portanto,de natureza


fonológica.Essequadrose reduza 5 vogaisna sílabapretônicae a 3
nasílabaátona.Mascomoisso acontece?

Comecemoscomos fatosda sílabapretônica.Nessaposição,ocorrea


neutralizaçãoentreasvogaismédiasempares,a saber[e]e [ɛ]; [o]e [ɔ].

Issodedáporqueaoposiçãoentre[e]e [ɛ]seperde,dandolugarapenas
a umdossegmentos.O mesmoprocedimentose verificaentre[o]e [ɔ].

Contudo,a formacomoesseprocessoocorrenão
as regiõesdo éitenscomo‘pesada’
Brasil.Parailustrar,podemosobservar uniformeem todas
e ‘porrada’.Há regiõesem que o resultadoda neutralizaçãofavorecea

presençade[e]e de[o], respectivamente,


comono Sudeste;e outrasque
favorecemapresençado[ɛ]edo[ɔ],comoemboapartedoNordeste.Assim,
o sistemapretônico,devidoàneutralização,
ficareduzidoa5 fonemas.

Na posiçãode sílabaátonafinal,o mesmoprocessoocorreexcluin-


do, dessavez,todasas vogaismédias,de modoque o sistemafique

reduzidoa apenas3 vogais.Isso se justificapelofato de a distinção


entre[e]e [i]e entre[o]e [u]desaparecere,comoresultado,as vogais
médias[e]e [o]dãolugara vogaisaltas[i]e [u], respectivamente,
como
noscasosdeval[e]>val[i], e lix[o]>lix[u].

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 43
Esquematicamente, podemosvisualizartodoesseprocessodeneutra-
lizaçãovocálicaa partirdo quadroseguinte,considerandoa fala da

regiãoSudestecomoexemplo:
Sílabapretônica: Sílabaátonafinal:
Sílabatônica:7 vogais
5 vogais 3 vogais
[i]pi.co [i]pi.ca.do

[e]pe.lo [e]pe.la.do [i]pe.le, va.le, pi.que

[ɛ]ve.la [e]ve.la.do

[a]sa.ca [a]sa.ca.da [a]mo.la

[ɔ]co.co [o]co.ca.da
[o]fo.rro [o]fo.rra.do [u]fo.co, mu.ro, so.co

[u]mu.ro [u]mu.ra.do

Quadro2 – AdaptadodeBisol e Magalhães (2014), disponível em


Fonte: https://revistas.ufpr.br/abralin/article/view/52673,

O fonema último acesso em 23/04/2020.


Sob a perspectivapsicológica,o fonemapodeser definidocomouma
comorealidade realidademental,comoa intençãodofalanteoua impressãodoouvinte,
psicológica ouambos.Essavisãofoiseveramente atacadapelosdefensoresdasduas
perspectivasanteriores.Umadas justificativasfoi a de que processos
linguísticosmentaiseramnãoobserváveis,
o quedemonstrariao caráter
deinacessibilidade.ParaTrubetzkoy,fazerreferênciaà psicologiadeve-
ria ser evitadona definiçãodo fonema,umavezqueeleé um conceito
linguístico,nãoumconceitopsicológico.Eleaindaafirmaqueo fonema
é umacaracterísticadosistemalinguístico,e nãodamentedosfalantes.

O conceitode fonemae suas múltiplasvisõesforam fundamentais


para estudosposteriores,servindopara impulsionarpropostasque
desencadeariaminúmerosestudos.Dasuaconcepçãocomoumaenti-
dadeindivisível,no início do séculoXX,passa,com Jakobson,a ser
vistocomum“feixedetraços”.Assim,nãoé maispossívelpensarmos
queo fonemasejaadquiridocomoumaunidade,comoalgoindivisível,

masqueeleé adquiridoporpartes,ou seja,pelostraçosqueo consti-


tuem:os traçosdistintivos.

CapítuloII - Fonéticaversusfonologia 44
Atividade

1)Os exemplosa seguirsão casosde variaçãocondicionada.Expliqueo


quemotivouessetipodevariação.

a- boa[zm]vindas “duasmedidas”;

b- ca a “carga”
[ɣg]

c- ma[ɾa]
berto “maraberto”

2) Apresentecinco exemplosque demonstremcasos de variaçãolivre,


envolvendovogaise/ouconsoantes.

CápituloII - Fonéticaversusfonologia 45
Leia Mais
BISOL,L.(Org.).Introduçãoa estudosdefonologia
doportuguês
brasi-
leiro.5. ed.PortoAlegre:Edicupcs,2010.

BISOL,L.; BRESCANCINI,C. R. (Org.).Fonologia


e variação
: recortesdo
portuguêsbrasileiro.PortoAlegre:EDPUCRS,2002.

CAGLIARI,L. C. Alfabetização
e linguística
. SãoPaulo:Scipione,1989.

CAGLIARI,L. C. Análisefonológica:
introduçãoà teoriae à prática,com
especialdestaqueparao modelofonêmico.Campinas,SP: Mercadode
Letras,2002.(ColeçãoIdéiassobrea linguagem)

CALLOU,D.;LEITE,Y. Iniciaçãoà fonéticae à fonologia


. Rio de Janeiro:
Zahar,1990.

CAMARAJR, J. M. Estruturada línguaportuguesa.


1970. Petrópolis:Vozes,

LEMLE,M. Guiateóricodoalfabetizador.
SãoPaulo:Ática.2000.

SILVA,T.C.Fonética
efonologia doportuguês:
roteirodeestudose guia
deexercícios.SãoPaulo:Contexto,2003.

BISOL, L. e MAGALHÃES, J. A redução vocálica no português


brasileiro: avaliação via restrições. Revista da ABRALIN, vol. III,

no. 1 e 2, p. 195-2016, julho e dezembro de 2004.

CápituloII - Fonéticaversusfonologia 46
Capítulo 3

TRAÇOS
DISTINTIVOS
Introdução No primeirocapítulodeste livro,foram elencadasas propriedades
fonéticas dos segmentos.Aqui, ao tratarmosda fonologia,nosso

interessenaspropriedadesfonéticasestáemavaliarcomoas carac-
terísticasarticulatóriase acústicasdos sons funcionamnas várias
línguas.Essaspropriedadesrepresentamas atividadessimultâneas
queocorremno tratovocal,quandose dá a produçãode umsom,ou
seja,os traçosdistintivos.

Ocontínuo Imaginemoso som[p]: eleé o resultadodeumconjuntodemovimentos


sonoro queincluiobstruçãodoslábiosesolturadoarcomexplosão(bilabialoclu-

sivo);levantamentodo véupalatinonaparteposteriore saídado arpela


boca(oral);e nãovibraçãodascordasvocais(surdo).Portanto,a identi-
dadearticulatóriadessesomé bilabial,oclusivo,oral,surdo.Cadauma
dessascaracterísticasé fundamentalparaa realizaçãodessesom,bem
comoparao entendimento dosprocessosfonológicosqueo envolvem.

Os processosfonológicosqueenvolvemalgumacaracterísticade [p],
porexemplo,o traçolabial,podemenvolvertodosos demaissegmen-
tos quecontenhamessemesmotraço,como[p,b, m].É o queocorre
comumaconsoantenasalantesde[p]e [b], queserátambémsempre
labial,comonosexemplosa seguir:

- ca[mp]
o,ta[mp]
a,te[mp]
o cf.*ca[mt]
o

- to o,sa a,li o cf.*o a


[mb] [mb] [mb] [md]
CapítuloIII - TraçosDistintivos 47
Comopodemosver,é importantequeentendamosas propriedadesde
cadasegmento,
ouseja,queconheçamos
ostraçosqueo constituem,pois

uma sequênciade segmentosformaum contínuosonoro.Tal conheci-


mentopermitirávermosquesonspodemseragrupadosdeacordocom
suaspropriedades.Comisso,podemosconcluirqueos traçosdistinti-
vosconstituemumaparteessencialdasdescriçõesfonológicas.

Omodelo Aspropriedades
articulatórias
e acústicasdossegmentos
deramorigem
detraços a um importantemodeloteórico em linguísticadenominadoTeoria
de Traçosde Distintivos,implementadopor Chomsky& Halle(1968),
distintivos
emsuaobraTheSoundPatternoof English(SPE).Paraessesautores,
os traços distintivospossuem,basicamente,duas funções,a saber:
(a) capturaros contrastesfonológicosdas línguase (b) descrevero
conteúdofonéticodos segmentosderivadospor regrasfonológicas,
comotambémos segmentossubjacentes.

Na proposiçãoda teoriade traços distintivos,tambémchamadade


FonologiaLinear,procuramosrelacionarcada segmento a umacadeia
de traçoslinearmenterepresentada.Assim,os traçosdistintivossão
organizadosem uma matrizque,dispostade formalinear,equivale
bijetivamente
a umsegmento.Damesmaforma,cadasegmento equivale
aumamatrizdetraçoscom valoresdefinidosbinariamente,
comonos
exemplosa seguir:

CapítuloIII - TraçosDistintivos 48
Classificação Vejamos,então,comosão apresentadosos traçosdistintivosno SPE,
dostraços dando destaqueapenasàquelesnecessáriospara a distinção dos

segmentosdo portuguêsbrasileiro.

Os traçosde classeprincipalsão consonantal,silábicoe soante.Tais


Traçosde classe
traços estãoinseridosnas três classesprincipaisde sons, as quais
principal
englobamconsoantes,vogaise os glides(ousemivogais).

Consonantal : o traço[+cons]
refere-seatodosossonsproduzidospelo
contatoentreum articuladore um pontode articulação– a exemplo
de /p,b,t,d,k,g/ – oucomumgraudeobstruçãoquepoderesultarem
umafricção– comoem/f, v,s,z/. Essetraçodistingueconsoantesde
vogaise glides.Portanto,no portuguêsbrasileiro,todosos fonemas

consonantais,e somente
sição,as vogaise eles,possuemo
os glidesrecebem traço[+cons]
o traço .
[-cons] ; emcontrapo-

Silábico
: [+sil]são todos os segmentoslicenciadosparaocuparemo
núcleodasílaba.Emalgumaslínguas,certasconsoantespodemocupar
a posiçãode pico de umasílaba,comoé o casodas nasaisemInglês,

comoem“rhythm” . (ritmo).
berãoo traço[+sil] Nessecaso,essasconsoantes
NoPortuguês, tambémrece-
contudo,apenasasvogaispodemser
núcleodesílaba,portanto,somenteelastêmo traço[+silábico].

Soante: [+soa]
são todosos segmentosquese caracterizampor apre-
sentaremsonoridadeespontânea.Dessaforma,nãoexisteumacontra-

partesurdaparaas soantes.No casodo Português,vogais/i, e,ɛ,a,ɔ,


o,u/, glides/j, w/, líquidas/l, ʎ,r,x/ e nasais/m,n,ɲ/ sãocaracterizadas
como[+soa] . Oclusivas/p,t,k,b,d,g/, fricativas/f,v,s,z,ʃ,ʒ/ e africadas/

tʃ,dʒ/, porapresentarem oposiçãoemsonoridade,serãosempre[-soa].


Otraço[+obstruinte]se contrapõea [+soante]
.

CapítuloIII - TraçosDistintivos 49
Traçosde ponto Em relaçãoàs consoantes,temosos traçosde pontocoronal,ante-
de articulação rior,labiale distribuído
, necessáriospara distinguiras principais

posiçõesdearticulação.
Coronal
: [+cor]
caracterizaos sonsquese realizamcomo levantamento

da lâminada línguaparaobstruirtotalou parcialmentea passagemdo


ar. É o queacontecenarealizaçãodossegmentosdo português/t, d,
s,z,ʃ,ʒ,l,ʎ,r,n,ɲ/, masnãoacontecenarealizaçãode /p,b,f,v,m,k,g,x/.
Tambémsãocoronaisasvogais/i, e,/ɛ/.
Anterior
: [+ant]sãotodosos sonsrealizadoscomalgumaobstrução

(totalou parcial)napartefrontaldo tratovocal,isto é,antesdo palato


duro.Assim,as consoanteslabiais/p,b,f, v, m/ e as alveolares/t, d,s,
z,l,n,r/ sãotodas[+ant]
, diferentedaquelasquesãorealizadasa partir
da regiãopalato-alveolaraté a partemaisposteriordo tratovocal/ʃ,
ʒ, ʎ,ɲ,k,g,x/. Peladefiniçãodessetraço,todasas vogaissão redun-
dantemente[-anterior],umavezqueessessegmentossãoproduzidos
semnenhumaobstrução,sejaparcialou total.

Labial
: [+lab]caracterizaas consoantesque apresentamum estrei-
tamentofeito com os lábios.São labiaisas consoantes/p, b, m,f, v/.
Tambémsãolabiaisas vogais/u, o,ɔ/

Distribuído
: [+dist]caracterizaos sons quesão realizadoscomuma
obstruçãoque se estendesobreumaconsideráveláreaao longo da
linhaquedivideo tratooral.Essetraçonãoé necessárioparadistin-
guir fonemasno Português,os traçosde ponto[coronal] e [labial]são
suficientesparadiferenciarasfricativasalveolares/s,z/,quesão[+dist]
dasfricativaslabiais/f,v/, quesão [-dist]
.

CapítuloIII - TraçosDistintivos 50
Traçode modo Os traçosque distinguemos segmentos,considerando-seo modode
de articulação articulação,ouseja,aformacomoosarticuladoressemovimentampara

produziros sons,são:Contínuo,Nasal,Laterale MetáteseRetardada.


Contínuo
: [+cont]caracterizaossonsqueserealizamseminterrupção

nasaídado ar:todasas consoantesfricativas/f, v,s,z,ʃ,ʒ/, as líquidas


/l, ʎ,r,x/, bemcomotodasas vogais,são portadorasdo traço[+cont] .

Nasal: [+nas]
sãoaquelessonsemqueo ar, ou parte dele, segue
seucaminhopelasfossasnasais.Sãocaracterizadas
comotraço[+nas]
as consoantes/m,n,ɲ/ e as vogaisnasalizadas.

Lateral
: [+lat]caracterizaas consoantesque, na sua articulação,
encontraobstruçãona partecentralda boca provocadapela frente
dalíngua,obrigandoo ara sairpeloslados.Assim,as consoantes/l, ʎ/
sãocaracterizadascomessetraço.

Metástase
retardada
: [+met.
ret.]caracterizaas consoantesquetêm
umasolturadepoisde umaobstruçãototal.É o traçoquecaracteriza,
por exemplo,as africadas[tʃ]e [dʒ], umavez que,na sua realização,
primeirotemosa obstruçãoe, em seguida,a fricção.Esse não é um
traço distintivono portuguêsbrasileiro,já que essas africadassão
apenasalofonesdosfonemas/t/ e /d/, respectivamente.

Traçolaringal Aliteratura,emgeral,apresentatrêstraçoslaringais,caracterizando
o esta-
dodaglote(gloteespraiada,gloteconstrita,vozeamento). ParaoPortuguês,

interessa-nos,principalmente,
o traçodevozeamento: .
[vozeado]
Vozeado
: [+voz]
esse traço opõe consoantesque,na sua realização,

apresentamvibraçãonas cordasvocais,em relaçãoàquelasquenão


apresentam.Equivaleaotraço[+sonoro]
emoposiçãoao [-sonoro]
.

Vejamos, pois, algumas matrizes de traços representativasde


segmentosconsonantais,observando,em negrito,os traçosdistinti-
vosresponsáveispordiferenciarumaconsoantedaoutra:

CapítuloIII - TraçosDistintivos 51
CapítuloIII - TraçosDistintivos 52
Para identificaros pontosdas vogaisno PortuguêsBrasileiro,serão
Traçosde ponto
necessáriosos traços:Alto,Baixo,Posterior,
Arredondado, Tenso .
dasvogais
Alto: [+alto]
caracterizaa posiçãodalínguaemsuaelevaçãomaisalta
a partirde umpontoneutro.No Português,as vogais/i, u/ são consi-
deradasas maisaltase,portanto,portadorasdo traço .
[+alto]
Baixo: [+baixo]
caracterizaa posiçãomaisbaixaem relaçãoao ponto
neutro.No Português,a vogal/a/ é a únicaportadorado traço[+baixo]
.

Para caracterizarmosas vogaismédiase diferenciá-lasdas altas e


baixas,será necessáriaa especificaçãodos dois traços anteriores.
Dessemodo,as vogaismédias/e, ɛ,o,ɔ/ serãoportadorasdos traços
[-alto]e [-baixo].Contudo,paradistinguiras médiasbaixas/e, ɛ/ das
médiasaltas /o, ɔ/, de formaa identificaro sistemade quatroalturas
vocálicasdo portuguêsbrasileiro,é necessárioatribuiroutro traço
, definidoa seguir.
[tenso]

Tenso : [+tenso]
caracterizaas vogais que são produzidascom um
esforçomaiorno avançodo corpoda línguaou de sua raiz do que o
encontradonas vogaisrelaxadas.Tem-sesubstituídoesse traçopor
outroquediz respetirodiretamenteaoavançoou à retraçãodalíngua
na producãodas vogais.Esse traço é o chamado[+ATR] (Advanced

TongueRoot,ou “RaizdaLínguaAvançada”) quecaracterizaas vogais


médiasaltas/e,o/, bemcomoas demaisaltas/i,u/. Emcontrapartida,
o traço[-ATR](ouRTR:RectractedTongueRoot,“RaizdaLínguaRetra-

ída”)caracterizaas vogaismédiasbaixas/ɛ,ɔ/.
Posterior
: [+post]
diz respeitoàquelessons que têm sua realização

coma retraçãoda línguaa partirde seu pontoneutro.No Português,


são [+post]
as vogais/u, o,ɔ/.

Arredondado
: [+arred]
é o traçoque caracterizaas vogaiscom arre-
dondamentodoslábiosnasuaarticulação,a exemplode /u, o,ɔ/.

CapítuloIII - TraçosDistintivos 53
Vejamos,agora,a representação
dealgumasvogaisa partirdasmatri-
zesdetraços:

Traços Quandofalamosde vogais,semivogaise consoantes,estamosfalan-


prosódicos do de segmentos.Há,porém,algumaspropriedadesfonéticasquese

sobrepõemaos segmentos,ou seja,são traços suprassegmentaise


envolvemacento,pitche tom.Essestraçosestãono níveldaprosódia
e constituemo quedenominamosde traçosprosódicos.Aquitratare-
mosapenasdo acentoe do pitch.

Acento
: [-ac]o acentonaslínguasnemsempreocupaa mesmaposição
na palavra.No Português,por exemplo,a tendênciaé que ele caia na
penúltimasílaba,e por isso dizemosqueesseé o padrãocanônicode
acentoparaoPortuguês.Omesmo,porém,nãoacontececomo Francês,
quetemseu padrãocanônicona últimasílaba.Às vogaisacentuadas,
atribuímoso traço[+ac]
; e às nãoacentuadas,o traço[-ac].

Pitch: refereà frequênciada vibraçãodas cordasvocais.Assim,ao


falarmos,o pitchvariade momentoa momento.Suavariaçãoé usada
paradistinguirpalavrase tambémparamarcardiferençasno signifi-
cado dos enunciados.No primeirocaso,estamosfalandodo tom,e,
no último,da entonação.As línguasque usamo tom paradistinguir

palavrassão denominadas
indígenasqueapresentam de línguas tonais. No Brasil, há línguas
essacaracterística.

Conheceros traçosdistintivospermite-noscaracterizarnão apenasos


segmentosindividualmente,
masreuni-losnoquedenominamos declasses

CapítuloIII - TraçosDistintivos 54
Classes naturais,que,porsuavez,estãosujeitasasofreremprocessosfonológicos.
naturais
Uma classe naturalé um grupo de segmentosque compartilhamos
mesmosvaloresdos traços distintivos.Com isso, podemosdizer,por
exemplo,quetodasasconsoantespertencema umaclassenatural,pois

elascompartilhamo traço[+cons] . Podemosdizero mesmodas vogais


que compartilhamo traço [+sil]
. Se pensarmosnas consoantesobser-
vando-seapenasasobstruintes,podemosdizerqueelastambémfazem
partedeumaclassenatural,poiscompartilham
os traços[+cons]
e [-soa]
.
Sequiséssemosespecificarumaclassenaturaldasplosivasdentaise

alveolares,precisaríamosdosseguintestraços:
[+cons]

[-soa]
[+cor]

[+ant]

[-cont]

Importanteobservarque quanto menor for o númerode segmen-


tos que umaclassenaturalabranger,maiorseráo númerode traços

necessáriosparadescrevê-la.Essacorrelaçãoinversa,decertaforma,
explicariaporqueos processosfonológicos,emgeral,envolvemmais
classesnaturaisdo quesegmentosisolados.

Aoespecificarmosos valoresdetraçosparaumaclassenaturalou para


umsegmento,nemsempreé necessárioespecificarmostodosostraços.

Comisso, estamosquerendodizer que se o valorde um determinado


traçoimplicaum determinadovalorparaoutro,seriaredundanteespe-
cificaros dois.Valoresredundantesdetraçossãoaquelescujapresença
ouausênciapodeserinferidapelapresençaouausênciadeoutrotraço.

Isso significadizerque se um segmentoé [+nas]


ele é [-lat], pois não

existenasalquesejalateral.Seumsegmentoé [+nas],elenãoprecisa
ser especificadocomo traço[+voz], pois todanasalé vozeada.Então,
paracaracterizaras nasais,precisaríamosapenasdo traço[+nas].

CapítuloIII - TraçosDistintivos 55
Atividade

1)Identifiqueas classesnaturais,a seguir,pelo


traçodistintivoqueas caracteriza.

[+soante] [+obstruinte] [+labial] [+anterior]


[coronal]

[+soante] [+obstruinte] [+labial] [+anterior]


[coronal]

[+soante] [+obstruinte] [+labial] [+anterior]


[coronal]

[+soante] [+obstruinte] [+labial] [+anterior]


[coronal]

[+soante] [+obstruinte] [+labial] [+anterior]


[coronal]

2)Selecioneos segmentosquepossuemo traço


indicado:

/a t k w s l r v ɔ /
/p g y l z ʎ z i t s /
/v t o a p k d l r f /

/i a k x g b p s t o /

/l k u w y s z n r a /

CapítuloIII - TraçosDistintivos 55
Atividade

3)Paracadasegmentoaseguir,altereovalordotraçoentrecolcheteseidentifi-
queosegmentoresultante:

Segmentooriginal Traçoa seralterado Segmentoresultante

/k/ [-sonoro] /f/ /ŋ/ /g/ /o/ /ɛ/


/e/ [+ATR] /f/ /ŋ/ /g/ /o/ /ɛ/
/p/ [-continuo] /f/ /ŋ/ /g/ /o/ /ɛ/
/ɔ/ [-ATR] /f/ /ŋ/ /g/ /o/ /ɛ/
/n/ [-anterior] /f/ /ŋ/ /g/ /o/ /ɛ/

4) Em cada um dos grupos de segmentoselencadosa seguir,indique

aquelequenãocompartilhadamesmaclassenaturalqueos demais.

(classe: obstruintes)/ t k f s n p b g /
(classe: vogais médias)/ e ɛ o ɔ a /
(classe: obstruintes)/ p b t d k g l ʃ ʒ /
(classe: não contínuas)/ d g v b k /
(classe: consoantes contínuas)/ f v s z p /
(classe: soantes)/ l r m n g ʎ ɲ /

CapítuloIII - TraçosDistintivos 56
Leia Mais

BISOL,L.(Org.).Introdução a estudosdefonologia
doportuguês
brasi-
leiro. PortoAlegre:Edipucrs,2005.

HAYES,B. Introductory
phonology
. Malden,MA:Willey-Blacwell,
2009.

ODDEN,D.Introducing
phonology
. London:CambridgeUniversityPress,
2015.

CapítuloIII - TraçosDistintivos 58
Capítulo 4
REGRASE
PROCESSOS
FONOLÓGICOS
Introdução Deacordocomosprincípiosdafonologiagerativa,conformedelineadano
SPE,o queexistenonívelfonéticoéo resultadodeaplicaçãoderegrasque

operamemumnívelinterno,denominado EstruturaProfundaouSubjacen-
te.Seguindoesseraciocínio,é comoseoindivíduodominasseumconjunto
finitoe bemdefinidode regrasfonológicasemsuamente,de modoque,
a partirda atuaçãodessasregras,fossemsendogeradasas represen-
taçõesno nívelda fala,o queincluia fonéticae possíveisvariações,por
exemplo.Portanto,umacriança,ao adquirirsua línguaou seu sistema
fonológico,estaria,naverdade,aprendendoumconjuntoderegrasecomo
operacionalizá-las.

Paraa compreensãoe a descriçãode comoas regrasatuam,muitos


mecanismosformaisforamintroduzidosà teoria.Essesmecanismos

seriamcapazes,por exemplo,
a criança,ao ser expostaa umdconjuntode
e fornecerumaavaliaçãosobrecomo
dados,constróia fonolo-
gia de sualíngua.Deummodogeral,as regrasfonológicasdevemter

formalizaçãosimplesparaa descriçãoe a explicaçãodos fenômenos


linguísticos,assimcomodos inúmerosprocessosfonológicospossí-
veis nas línguas,conformeilustraremosno decorrerdestecapítulo.
Para tanto,as regrassão escritasde tal formaque se deveevitara
repetiçãodesnecessáriade determinadosvaloresde traços. Neste
capítulo,portanto,serádadaênfaseaos processosfonológicosmais
atuantesnoportuguêsbrasileiro,antecedidaporumabreveretomada

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 59


Formalização acercadaformalizaçãodeumaregrafonológica.
daregra
A títulodeilustração,vejamoscomopoderíamosformalizarumaregra
quetratassedo processode palatalizaçãodas oclusivasdentaisque
ocorreemmuitasregiõesdo Brasil,isto é,a transformaçãode /t/ e /d/

em[tʃ]e [dʒ], respectivamente,


antesde/i/.

A leitura da regra formalizada


poderia ser a seguinte: uma
consoante [+cor,+ant,-cont]
torna-se [+cor,-ant, -cont]
antes de uma vogal [+alta,
-post], ou seja, [t,d]torna-se

[tʃ,dʒ], antes de [i].

Essesformalismossãovariadose,pormeiodeles,podemosrepresen-
taros diferentesprocessosfonológicos.

Processos As diferenteslínguasdo mundotêm sistemasdiferenciados,o que


fonológicos significadizerquenuncavamosencontrarduaslínguasquetenhamo

mesmoinventáriodefonemascomos mesmosalofones. Porém,temos


evidênciaspara afirmarque há semelhançasentreas línguas.Uma
delasdiz respeitoaostraçosdistintivosqueelasusamna construção
de seus sistemasfonológicos;outra,aos processosfonológicosque
sãocompartilhadospordiferenteslínguas.

Osprocessosfonológicos,normalmente,
envolvemamudançaouo preen-
chimentodetraços.Noprimeirocaso,umsegmentocostumasofreralte-
raçãoemseustraçosemfunçãodostraçosdeumsegmentovizinho.No
segundocaso, um segmento,ainda não completamenteespecificado,
passaa terseustraçostotalmentepreenchidosporalgumaregrafonoló-

gica.Outrosprocessosaindapodemocorrerde
porexemplo:mudançadeposiçãodeumsegmento diferentesmodos,como,
napalavra
(metátese);

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 60


junçãodecaracterísticas
dedoissegmentosformandoumterceiro(coales-
cência);apagamentode umasílabana junturade palavras(haplologia);

junturasintervocabulares
envolvendo
vogais– sândiexterno– (digontação,
elisão,degeminação);
inserçãodesegmentos(epêntese); apagamentode
segmentos,entremuitosoutros.Nãoé propósitodestecapítuloesgotar
os processosfonológicos,massimdardemonstraçãodealgunsdaqueles
quesãomuitocomunsnalíngua.É necessárioapontarquemuitosdesses
processosenvolvemníveisacimadafonologia,comoapalavraeafrase.

A seguir,elencaremosalguns processosque podemser encontra-


dos no portuguêsbrasileiro.Muitosdessesprocessos,contudo,não
contêmapenasinformaçõesfonológicas,mas valem-setambémde
outrosníveiscomoa morfologiae a sintaxe.Faremosalusãoa esses

diferentesníveisquandonecessário.

Assimilação A assimilaçãoé umdosprocessosfonológicosmaiscomunsnaslínguas


do mundo.Podemosdefini-lacomoa modificaçãode umsom,a fim de
torná-lomaissemelhanteaalgumoutropresenteemseuambientefono-

lógico.Paraqueesseprocessoocorra,semprehaveráum gatilhoe um
alvo.Dogatilhoemanarãoostraçosrumoaoalvoquepodeestaràdireita
ouà esquerdadaquele.Assim,umpontoimportantea serdestacadonos

processosassimilatóriosé adirecionalidade
doprocesso,quepodegerar
assimilaçãoregressiva– maiscomum– ouprogressiva,menoscomum.

Naassimilaçãoprogressiva,
do alvo,enquanto o gatilhodaregraestarásempre
naassimilação àesquerda
regressivaocorreo inverso.
Portanto,
no primeirocaso,o elementoseguintese tornarámaissemelhanteao

queo precede;jánosegundocaso,o elementoprecedenteé quepassa-


ráa assemelhar-seaoqueo sucede.Passemos,pois,aosexemplos:

i) Assimilaçãoregressiva
– alvoà esquerda
dogatilho
- de[st]
e >de[zd]
e

- dua[sk]amisas>dua[zb]lusas
Note-se que, nos dois exemplosanteriores,a consoante[+sonora]

espraiaessetraçoparaa fricativa[-sonora]à sua esquerda,de modo


queos doissegmentosadjacentespassama compartilharaqueletraço.

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 61


ii) Assimilação
progressiva
– alvoà diretadogatilho

- o o >o o
[jt] [tʃ]
- [muj]to>[mũj ̃
to]

No casodapalavra‘oito’,quese realizacomo[otʃU], emalgunsfalares


do portuguêsbrasileiro,podemosdizer que estamosdiantede uma
assimilaçãoprogressiva,emqueo [t] assimilao traço [+cont]
do glide
paratornar-seumaconsoantepalato-alveolar. Observeque,logoapós
provocara assimilação,o glidecai.Já em/mui/to quepassaa [mũjto]
̃ ,o
traço[+nasal]
daconsoante/m/ espraia-seà direitaparao ditongo[uj],
tornando-otambémnasalizado.

Esses dois tipos de assimilaçãopodemser subcategorizadoscomo


parciale total.Osexemplosanterioressãocasosdeassimilaçãoparcial,
umavezqueo segmentoalterouapenasumououtrotraço.Nocasoda
assimilaçãototal,o segmentoqueassimilatorna-seigualàqueleque
foi assimilado.Um exemplodesseprocessoé o que acontececom a
palavra‘irreal’,resultadode‘in+real’.Aqui,a consoantenasal[n]assi-

milatotalmentea consoanteseguintee torna-seiguala ela.


Podemosevidenciarinúmeroscasosdeassimilaçãoemoutrosproces-
sos queenvolvemvogaise consoantes.

iii) Palatalização

A palatalizaçãodasconsoantesoclusivasdentais/t/ e /d/ é umprocesso


muitocomumno portuguêsbrasileiro,principalmente nasregiõesSul e
Sudeste.Esseprocessovaitornarumaconsoantedental,dotipo/t,d/,em
umapalato-alveolar,
respectivamente[ʧ]e [ʤ], semprequevierantesde
/i/ .Issoaconteceempalavrascomo‘tia,dia,tiro’etc.Muitasvezes,a vogal

seguinteé a média/e/ que,ao elevar-se,desencadeiaa palatalização.


Assim,se tivermosa palavra‘leite’,precisamos,primeiro,elevara última
vogal/e/, tornando-a/i/ , paraquedepoistenhamosa palatalização,do

contrário,o talprocessonãoacontecerá.Dizemos,então,quea regrade


elevaçãoaplicadaprimeiroalimentaa aplicaçãodasegunda.

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 62


Aindaemsetratandodapalatalização, podemospensaremassimilações
diferenciadas.Nocasode‘tia,dia,tiro’,elaé regressiva,poiso segmento

queaprovocouestálheseguindoeo processoédadireitaparaaesquer-
da.Se pensarmosemcasoscomo‘oito,jeito’,que,emalgumascidades
do Nordeste,se realizamcomo[oʧo], [jeʧo]
, dizemosquea assimilaçãoé
progressiva,poiso sentidoé daesquerdaparaa direita.

iv) Nasalização

Esse processo,bastantecomumno portuguêsbrasileiro,implicaa


nasalizaçãode vogaisem contextode consoantesnasais.Em pala-
vrascomo‘canto’,‘ponto’,‘acento’,é a presençada consoantenasal
subsequenteà vogalquefaz comqueelasejanasalizada.Importante

observarqueesseprocessoacontecede formasdiferentes,
vênosexemplosa,be c a seguir.Ema)a vogal, comose
nasílabatônica,sempre
assimilaráo traço[+nasal]
daconsoanteadjacente;emb)a vogalocor-

re em sílabaátona,de modoque a assimilaçãoé opcional;já em c)


diantedeconsoantepalatal,a nasalizaçãoé categórica.

a f[ĩ]no, t[ẽ]ma,c[ã]ma,s[õ]no,pr[ũ]mo
b f[i]nal/f[ĩ]nal;t[e]mático/t
[ẽ]mático;c[a]mada/c
[ã]mada;s[o]
nolento/s[õ] n olento;aprumado/apr m
[ũ] ado

c s[õ]nho/s[õ]nhador; n[ĩ]nho/n[ĩ]nhada; b[ã]nho/b[ã]nheira;


l[ẽ]nha/l[ẽ]nhador;e ainda:punhado, cunhado,
vinhedo.

v) Assimilação
dopontodearticulação
pelaconsoante
nasal

Emportuguês,comoemmuitasoutraslínguas,umsegundoprocessoque
envolveanasalidadedizrespeitoàassimilaçãodopontodearticulaçãoda
consoanteseguintepelanasalquea antecede.Empalavrascomo‘campo,

tombo,ponte,onde’,observarmosquea consoantenasaltemsempreo
traçodepontodaconsoanteseguinte.Dessaforma,seaconsoanteseguin-
te é umalabial,umadental/alveolar
ou umavelar,a consoantenasalque

antecedeserásemprelabial,dental/alveolar
ouvelar,respectivamente.
- ca[n]to,o[n]da

- ca[m]po,to[m]bo
Esse mesmo processo acontecerá quando as consoantes que seguem as nasais

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 63


forem labiodentais /f/ e /v/ ou velares /k/ e /g/.
Nota-se, contudo, que, nesses casos, a mesma
letra “n” representará, na escrita, as consoantes
nasais.
Ex: ta[ŋ]que “tanque”; ro[ŋ]co “ronco”; ma[ŋ]
ga “manga”, sa[ŋ]gue “sangue”

vi) Assimilação
vocálica:harmonia

A assimilaçãodo traço de alturada vogal,normalmente,resultana


harmoniavocálica.Esse processovariávelocorrequandoumavogal
altapresentenasílabatônicaespraiaseustraçosdealturaparaavogal

médiapretônica,comonosexemplosseguintes:
perigo > p[i]rigo

fortuna > f[u]rtuna


menino > m[i]nino

coruja > c[u]ruja

Dissimilação Nem todos os processos caminham na direção da assimilação.


Há aquelesemqueumsegmentoprocuraseguiro caminhoopostoao
daqueleque está em sua vizinhança,distanciando-seem termosde
traços.Esseprocessoemqueos segmentostornam-semaisdistintosé
denominadodissimilação.Umexemplodedissimilaçãopodeserencon-

tradoem palavrascomo‘leste’e
muitopoucoprodutiva ‘desde’,no
a palatalização falarparaibano,
das oclusivas já que é
/t, d/ nessefalar.
Empalavrascomoasexemplificadas a seguir,o falante,emvezdereali-

zar a fricativa[s]como[+anterior]
, mesmacaracterísticadas oclusivas,
realiza-acomo[ʃ]e [ʒ], respectivamente,
ou seja,[-anterior].Comisso,
temosumprocessodissimilatório,o queimpedequeas consoantesno
mesmoambientefonológicosejamrealizadascomos mesmostraços.

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 64


de[st]
e ([+anterior]
e[+anterior]) > de[ʃt]
e (([-anterior]e
[+anterior])

de[zd]
e([([+anterior]
e[+anterior])
> de[ʒd]
e ([- anterior] e
[+anterior])

le[st]
e ([([+anterior]
e [+anterior]) > le[ʃt]
e ([- anterior]e
[+anterior])

Metátese A metáteseé a transposiçãode sons;é umamudançaemquealgum


somtrocadeposiçãocomoutrodentrodapalavra,comoacontecenos
exemplosa seguir:

iogurte > iorgute

estupro > estrupo

lagarto > largato

ferver > frever

tábua > tauba

Haplologia A haplologiaé umfenômenoqueenvolveo pagamentode umasílaba


emfronteiradepalavras,devidoaocompartilhamento
dealgumtraço
dasílabaseguinte.

caldodecana > ‘caldecana’


cursodeletras > ‘cursdeletras’

dentrodasala > ‘dendasala’

Sândivocálico i)Degeminação:
junçãodeduasvogaisidênticasemfronteiradepalavras:
externo:
camisaamarela > ‘camis[a]marela’
degeminação,
elisãoe peleescura > ‘pel[i]scura’

casacousado > ‘casac[u]sado’

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 65


ii)Elisão: fusãodeduasvogaisdiferentesemjunturadepalavras:

casaescura > ‘cas[i]scura’

meninaesperta > ‘menin[i]sperta’

camisausada > ‘camis[u]sada’

iii) Ditongação:
nesse caso, a união das duas vogaispresentesna
fronteiradaspalavrasresultaemumditongo.

casaescura > ‘cas[aj]scura

meninaesperta > ‘menin[aj]sperta’

camisausada > ‘camis[aw]sada’


Até aqui,acreditamoster visto umapequenapartedo que constitui
a TeoriaFonológica.Os estudosacercados traços,das regrase das
representaçõesnãopararamcomo SPE.Depoisdele,muitaspropos-
tas foram implementadas.Há muito para ser visto e ser aprendido

acercada língua.E o
seuscomponentes: isso porqueestamosfalandoapenasde
fonológico.No um dos
próximocapítulo,trataremosda
sílabano portuguêsbrasileiro.

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 66


Atividade

1)Apontetodosos traçosquemudaramemcada
umadasseguintesregras:

a)/d/ → [n] [-alta] → [+alta]

b)/i/ → [j] [-anterior] → [+anterior]

[+anterior] → [- anterior]
c) /p/ → [f]

[-sonora] → [+sonora]
d)/o/ → [u]

e)/k/ → [g] [+silábico, -consonantal] → [-


silábico]

f) /t/ → [tʃ]
[-contínuo] → [+contínuo]

g) /ʒ/ → [z]
[-contínua] → [+contínua]

h)/l/ → [ʎ]
[-nasal] → [+nasal]

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 67


Atividade

2) Identifique os processos fonológicos presentes nos segmentos


sublinhados:

a)O[z]aluno[ø]dedicado[ø]conseguemapr[ɔ]vação.

b)Elamesmaf[ej]z a tarefado [dʒ]ia.

c) A gentesab[I]muitopoucodosba[ʃ]tidoresdo p[u]der.

[z] ditongação

[ø] alçamento

abaixamento
[ɔ]

alçamento
[ej]

palatalização
[dʒ]

palatalização
[I]

apagamento
[ʃ]

assimilação
[u]

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 68


Leia Mais

ABAURRE,M. B. (Org.).A construção


dapalavrafonológica
. SãoPaulo:
Contexto,2013.

BISOL,L.(Org.).Introdução a estudosdefonologia
doportuguês
brasi-
leiro. PortoAlegre:Edipucrs,2005.

BISOL,L. ‘Osândie a ressilabação’.LetrasdeHoje, PortoAlegre,v.31,n.


2,p. 159-168,jun.1996.

HAYES,B. Introductory
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. Malden,MA:Willey-Blacwell,
2009.
KENSTOWICZ,
M. Phonology
in generative
grammar
. Oxford:Blackwell

Publications,1994.
ODDEN,D.Introducingphonology
. London:CambridgeUniversityPress,

2015.

CapítuloIV - Regrase processosfonológicos 69


Capítulo 5

A SÍLABA
Introdução A sílabafigura,entreas entidadesfonológicas,como de fácil reco-
nhecimentoporpartedo falante.Nãose estranha,portanto,o fatode

umfalantenativo,emgeral,saberalgosobrea estruturasilábicadas
palavrasemsualíngua,sendocapazdeidentificaremseparadoa síla-
basdeumapalavra,o que,poroutrolado,podenãoacontecercomos
fonemas.Issolevaa crerqueo indivíduojátenhaumconhecimentoda
representaçãosilábicanamente,emborainconscientemente.

Nas últimas décadas,muitos pesquisadorestêm se dedicadonão


apenasao estudode fenômenoslinguísticosque fazemreferênciaà
silaba,comotambémaumamelhorformaderepresentaressedomínio.
Dessaforma,nestecapítulo,apresentaremos a descriçãodasílabano
portuguêsbrasileiroe suaestruturainterna,combaseemummodelo

de representaçãoarbórea.Na sequência,trataremosdos
quesãoumaformadereorganização ditongos,
dasvogaisno interiordasílaba.

CapítuloV - A sílaba 70
Asílaba Dopontodevistadadescriçãolinguística,a sílabaéumdomínioneces-
esua sário para explicarinúmerosfenômenos.Vejamosa seguir alguns

descrição exemplosdeprocessosquefazemreferênciaà sílaba:


a) Harmoniavocálica:a vogalda sílabatônicaespraiaseus traços

paraa vogaldasílabapretônica.
col[ɛ]ga > c[ɔ]l[ɛ]ga pet[ɛ]ca > p[ɛ]t[ɛ]ca

per[i]go > p[i]r[i]go cor[u]ja > c[u]r[u]já

b) Assimilaçãodevozeamento:a consoanteemfinaldesílabaassi-
milao traçodevozeamentodaconsoanteseguinte.

de[s].te > de[z].de cf. de[ʃ].te > de[ʒ].de


ca[x].ta > ca[ɣ].ga

Todosos estudosatéentãorealizadossãounânimesaocompreende-
remquea sílabarepresentaumaescalade forçaentreos segmentos
que a compõemde modoa concluirque todasílabatemum pico de
sonoridade,ou seja,umelementomaissonoroe maisproeminente
auditivo que seus vizinhos. Seguindo esse raciocínio,
retomamos a descrição dos segmentosapresentadosnos
capítulosanterioresparademonstrarque uns são maissonorosque

os outrose
o pico que,portanto,
de sonoridade nemtodosestãoqualificadosparaocupar
da sílaba.Chamamosessa diferençade Escala
Sequênciade Sonoridade,conformeClements(1990),e atribuiremos

númerosde0 a 3,conformeo graudesonoridade:


Obstruintes
: 0 (/p,t, k,b,d,g,f,v,s,z,ʃ,ʒ/)

Nasais
: 1(/m,n,ɲ/)

Líquidas
: 2 (/l, ʎ,r,R/)

Glides
: 3 ([j,w])

Vogais
: 4 (/i, e,ɛ,a,ɔ,o,u/)

CapítuloV - A sílaba 71
A escala de sonoridade proposta por Clements (1990) é universal; portanto, refe-
re-se a todas as línguas do mundo. Há, contudo, variação, entre as línguas, no
comportamento que os segmentos assumem na sílaba. Por exemplo, no português
brasileiro, as vogais adjacentes ao núcleo dentro da mesa sílaba transformam-se
em glides, ocupando, assim, um grau de sonoridade menor do que as vogais que se
situam no núcleo.
O N L G V
[silábico] - - - - +
- - - + +
[vocoide]
[aproximante] - - + + +

[sonorante] - + + + +
Valordesonoridade 0 1 2 3 4

Quadro3 – Escaladesonoridade.
Fonte:

Portanto,entendendoquea sílabasempreteráum pico de sonorida-


de,essepicoserámelhorocupadoporumavogal,já queas vogaissão

segmentosdemaiorsonoridade.Outraslínguas,comoo inglês,podem
ter segmentosmenossonorosque as vogaisno pico da sílaba.No
portuguêsbrasileiro,contudo,somenteumavogalpodeocuparessa
posição.Vejamos,pois,a seguir,comose configurao moldesilábico
emnossalíngua,emqueV equivalea vogal;C equivalea consoantee
o ponto(.)delimitaa fronteiraentreas sílabas:

a)SílabaV: a.ve,po.e.ta,cu.ri.ó

b)SílabaCV: ca.sa,pa.li.to,po.le.ga.da
c) SílabaVC: ar,al.to,as.ma

d)SílabaCVC: cor,por.tal,fer.vor

CapítuloV - A sílaba 72
e)SílabaCCV: flo.res.ta,cra.te.ra,la.cre

f) SílabaVCC: abs.tra.to,obs.tá.cu.lo

g) SílabaCCVC: flor, a.trás,clan.des.tino

h)SílabaCVCC: subs.tan.ti.vo,pers.pi.caz
i) SílabaCCVCC: trans.pa.ren.te,claus.tro

Comosevê,então,nessesexemplosdoportuguês,asvogaissãoineren-
tementemaissonorasdoqueasconsoantesesóelasconstituemo pico
silábico.Outrofatoimportantesobrea sílabadoportuguêsdiz respeito
àsvogaisaltas/i/ e /u/ que,quandoaparecemnamesmasílaba,aolado
deoutravogal,perderãopartedesuasonoridadee nãofigurarãocomo
núcleo silábico.Nesses casos, elas se transformamem semivogais,
tambémdenominadasglides,formandoumditongo.É o queocorre,por

exemplo,na palavra‘claus.tro’acimae em inúmerasoutraspalavras


como:/seita/>[sej.ta]
“seita”;/louku/>[low.ku]
“louco”etc.

A sílaba,comoum constituintebásicodentroda hierarquiaprosódi-


A estrutura
ca da língua,possui o que chamamosde estruturainterna,ou seja,
internada
elementosquese inter-relacionam
internamentea essedomíniopara
sílaba quea sílabase constitua.

Hádiferentespropostassobrecomodarcontada
çãofonológica dasílaba.Aquiseráadotadaapenasmelhorrepresenta-
propostadeSelkirk
(1982),a partirda qualBisol (1999)traçouumestudoda sílabae seus

constituintesno portuguêsbrasileiro.
DeacordocomomodelopropostoporSelkirk,a sílabaérepresentada
numa

estruturaemformadeárvore
principalobedecem emqueosgalhosqueemanam
a umahierarquia. deumtronco
Nessaárvore,há cincoelementos,
a saber:o nóprincipal“σ”,queequivaleà própriasílaba;a Rima,

deondeemanao Núcleo“N”.
Essessãoos elementosobrigatóriosnasílaba.Há
aindao Ataque“A”,queequivaleao segmentoqueantecedeo Núcleoe
estádiretamente
ligadoaonódasílaba,e aCoda“Co”,quecorrespondeao
segmentoquesucedeo núcleo.

CapítuloV - A sílaba 73
O diagramaarbóreoa seguirrepresentaessahierarquia.Observemos
queos nósqueestãoentreparênteses(Ataquee Coda)sãoopcionais,

ouseja,hásílabasquenãopossuemesseselementos.Exemplosserão
apresentadosadiante.

Figura4 – Estruturaarbóreadasílaba.

Vejamos,detalhadamente,
a representaçãoda sílabano portuguêsa
partirdessaestrutura:

i) Núcleo
: comomencionadoantes,correspondeao pico da sílaba,ou
seja,a partedemaiorsonoridadenaestrutura.O núcleoestáanexadoà
Rimae,noportuguês,serásemprepreenchidoporumadassetevogais.

ii) Rima: é o nó intermediárioentreo Núcleoe nó da Sílaba.O termo


Rimaadvémda poesia,pois nas rimaspoéticassão os elementosdo
Núcleoem dianteque rimamuns com os outros.A Rimapode ser,
opcionalmente,preenchidatambémcoma Coda,comoveremosmais
adiante.Antes,vejamosumexemploda representaçãode umasílaba

constituídaapenasdenúcleo,como“.e.”napalavra“mo.e.da”.

Figura5 – Representação
deumasílabaconstituídaapenasdenúcleo.

CapítuloV - A sílaba 74
iii) Ataque
: correspondeao elementoque antecedeo núcleo,tendo,
portanto,menorsonoridadequeasvogais.Emboraamaioriadassílabas

do portuguêsrequeiraAtaque,muitasdelasnãoo possuem.Háoutras,
contudo,quepossuemataquesramificados,ou seja,comduasconso-
antes;nessecaso,a consoantedaesquerdadeveráserdemenorsono-
ridadequeaconsoantedadireita,umavezque,rumoaonúcleo,a escala
desonoridadedeverásersempreascendente.Vejamosumexemplode
sílabaportadoradeAtaquecomplexo,comonapalavra“cru”.Figura6 –
Representação deumasílabaportadoradeAtaquecomplexo.

iv) Coda: correspondeao elementoque sucedeo Núcleo,podendoser,


também,opcional,já quemuitassílabasnãoa possuem.Poroutrolado,é
possívelquealgumassílabaspossuamCodaramificada,isto é,comdois
elementos.Nessecaso,o elementodaesquerdadeveráserdemaiorsono-
ridadequeoelementodadireita,poisapartirdonúcleoatéofinaldasílaba,
a sonoridadedeversersempredescendente.Issoocorre,porexemplo,na
sílaba“pers.”dapalavra“perspectiva”,
conformerepresentadoa seguir:

Figura7 – Representação
desílabaportadoradeCodacomplexa.

CapítuloV - A sílaba 75
A sílabanoportuguêsbrasileiroobedecea condiçõespróprias,umavez
quenemtodasas consoantesestãolicenciadasna línguaparaocupar

certasposições.Damesmaformaqueasconsoantesnãopodemocupar
aposiçãodeNúcleo,hárestriçõessobrequaisconsoantespodempreen-
cheras posiçõesde Ataquee Coda;ou aindaquaisconsoantespodem
ocuparasegundaposiçãodoAtaqueedaCoda,casosejamramificados.
Vejamos,a seguir,algumascondiçõesespecíficasdoportuguês:

CondiçãodoAtaque : noportuguêsbrasileiro,o Ataqueé formadopor,


no máximo,doiselementos,a saber:Obstruintesnãocontínuas(/p, b,
t, d,k,g/) ou contínualabial(/f, v/) combinadascomlíquida– vibrante
simples/r/ ou lateral/l/ – excluídosos grupos/dl/ e /vl/:

pr – prato pl – placa fl- floco

br – brinco bl- bloco fr- fraco

tr – trigo tl- atleta vr- palavra

dr- drama kl- clamor

kr- crista gl- glória


gr- gruta

CondiçãodeCoda: a Codano PB podeser preenchidapor qualquer


soantee tambémpor/S/.

mar car.ta po.mar

mel rel.va mó.vel

tom fen.da hí.fen

mês fes.ta lá.pis

CapítuloV - A sílaba 76
a) Ataques complexos formados pelas sequências ‘vl’ e ‘dl’
costumam aparecer no português brasileiro apenas em
nomes próprios, como “Vladimir” e “Adler”, consistindo,
pois, em ocorrências excepcionais.
b) Em palavras como “apto, psicologia, advogado, pneu”,
a estrutura silábica da língua será recuperada pela epên-
tese de uma vogal: ap[i]to, p[i]sicologia, ad[i]vogado/ad[e]
vogado , p[i]neu/p[e]neu.

Ditongos A noçãode ‘ditongo’é apresentadadesdeas sériesiniciaisno ensino


de LínguaPortuguesa.Essetermoé comumenteutilizadoparadesig-

nar um encontrovocálicoem umamesmasílaba.A GramáticaTradi-


cionalclassificaos ditongosemcrescente(quandoháumasemivogal,
seguidade umavogal)e decrescente(quandoa vogalvemantesda
semivogal),comoem“água”e “touro”,respectivamente.
As semivogaissãovogaisassilábicas,ou seja,elasocupama margem

dasílaba,poisnãoapresentamproeminênciaacentualparasero pico
doconstituinte.O portuguêsbrasileiroapresentadoissegmentosque
se caracterizamcomosemivogal:o [j], que,muitasvezes,é represen-
tadopelo[y], e o [w].

(1) le[j]te / le[y]te

bo[j]/ bo[y]

pa[w]ta

me[w]

CapítuloV - A sílaba 77
Existe uma discussão em torno dessa questão: os glides devem ser considerados segmentos
vocálicos ou segmentos consonantais? Assumindo aqui a explicação de Câmara Jr., em seu
livro Estrutura da Língua Portuguesa, que usa como argumento o comportamento do ‘r’ na
palavra, consideramos o glide como um segmento vocálico, uma vez que, em fronteira silá-
bica, o ‘r’ é realizado como brando depois de vogal (ex.: mora) e forte depois de consoante
(ex.: honra). Nos casos de ‘r’ depois de um ditongo, este é realizado como brando (exe.:

europeu), o que justifica o status vocálico do glide.


Sendo assim, os ditongos definem-se pela presença de uma vogal mais um glide numa sequ-
ência. Vale salientar que esses dois segmentos fazem parte da mesma sílaba, diferindo,
portanto, do que se conhece por hiato, que são duas vogais em sequência, mas que mantêm
a sua qualidade (ou seja, nenhuma das duas é ‘semivogal’) e estão em sílabas distintas (ex.:
pais [‘pajs] x país [pa‘is]).

Há também uma discussão sobre a existência e a classificação dos ditongos na Língua Portu-
guesa. Muitos linguistas (dentre eles Camara Jr., Leda Bisol) consideram que os verdadei-
ros ditongos são os decrescentes (formados por vogal + semivogal); eles defendem que os

ditongos crescentescom
variar livremente (semivogal
o hiato + vogal)
(ex.: não~existem
[swar] na Há,
[su.ar]). mente
nodo falante e, somente
português, portanto,um
podem
tipo
de ditongo crescente que não alterna com hiato: aquele tipo formado após as consoantes
oclusivas ou mais a semivogal , seguida de ou (ex.: “qual”;
[k] [g] [w] [a] [o] [kwaw] [igwaw]

CapítuloV - A sílaba 78
SegundoCâmaraJr., os ditongos existentesna Língua Portuguesa
classificam-seassim:

i)Ditongos
decrescentes:

[aj] “pai” [iw] “riu” [ow] “vou”

“pau” “mói” “sol”


[aw] [ɔj] [ɔw]
[ɛj] “papéis” [oj] “boi” [uj] “fui”

[ej] “lei”

ii) Ditongoscrescentes:[kw]e [gw]seguidosdevogais

a[kwa]
tico “aquático”

a[gw]enta “aguenta”

tran[kwi]lo “tranquilo”
ling[gwi]ça “linguiça”

Algunsditongosdecrescentessofremvariaçãoe podemserrealizados
comoumaúnicavogalna fala,situaçãoemqueocorreo processoda
monotongação,isto é, quandoa semivogalda sequênciaé apagada.
Podemoschamá-losdefalsosditongos:

E x . :
c[aj]
xa ~ c[a]xa
f[ej]
ra ~ f[e]ra

c[ow]
ro ~ c[o]ro

qu[ei]
jo ~ qu[e]jo

CapítuloV - A sílaba 79
O processode monotongação,contudo,não ocorreem casos como
os exemplificadosa seguir,aos quais podemoschamarde ditongos

verdadeiros,emoposiçãoàquelesvistosanteriormente
e quechama-
mosdeditongosfalsos.

Ex.: b[aj]rro ~ *b[a]rro


r[aj]va ~ *r[a]va

p[ej]to ~ *p[e]to
m[ej]ga ~ *m[e]ga

Para compreendermos
a sistematizaçãoda língua,é imprescindível
quelevemosemconsideraçãoo seurealfuncionamento. Nessesenti-
do,verificamosqueas pesquisasnaáreadaSociolinguísticaVariacio-
nista têm dadoumagrandecontribuiçãoparaos estudosda Língua
Portuguesano Brasil, revelandoo verdadeirocomportamentoda
língua(gem)usadaefetivamentepelaspessoasemcontextoconcreto.

CapítuloV - A sílaba 80
Atividade

1-Indique,pormeiodealgarismos,o graudesono-
ridadede cadaumdos segmentosquecompõem

as sílabasapresentadasa seguir(0 =obstruintes;


1=Nasais;2=Líquidas;3=glides;4=vogais):

a) pra.to
b) fal.ta
c) cau.le
d) re.ló.gio
e) pris.ma
f) es.col.ta
g) po.mar
h) car.ta
i) brin.co
j) cas.ta
k) e.di.fí.cio
l) mes.mo

CapítuloV - A sílaba 81
Leia Mais

ABAURRE,M. B. (Org.).A construção


dapalavrafonológica
. SãoPaulo:
Contexto,2013.

BISOL,L.(Org.).Introdução a estudosdefonologia
doportuguês
brasi-
leiro. PortoAlegre:Edipucrs,2005.

BISOL,L. ‘Osândie a ressilabação’.LetrasdeHoje, PortoAlegre,v.31,n.


2,p. 159-168,jun.1996.

CAGLIARI,L. C. Análisefonológica
. Campinas:MercadodeLetras,1997.

CapítuloV - A sílaba 82
RECAPITU
L ANDO
A distinçãoentre Fonéticae Fonologiadata do início do século XX,
principalmenteapósFerdinandde Saussureestabelecera dicotomia

‘langue’x ‘parole’.É, entretanto,com os estudosdesenvolvidospor


Trubetzkoye Jakobson que a Fonologiapassaa ocuparum lugarde
destaqueentreos ramosda Linguística.Fundamentalparao desen-
volvimentodaspropostassubsequentesfoi abuscapelacompreensão
doqueseriaa menorunidadedeanálise– o fonema– que,inicialmen-
te, era visto comoindivisível,desencadeando,
depois,reflexõesque
levaramà concepçãodesseelementocomo um conjuntode traços.
É essadiscussãosobreos traçosquevailevarà formulaçãoda teoria

dostraçosdistintivos.Nãodevemosesquecer,porém,queTrubetzkoy,
já na sua obra Principlesof Phonology,apresentaum conjuntode
oposiçõesque caracterizamos diferentesfonemas.As propostasde
Jakobsone seuscolaboradoresdãocontinuidadeaocaráteropositivo
presentenaobrade Trubetzkoy,procurandoassociarà suataxonomia
paraos traçoso aspectomaisacústicodo queo articulatório,estando
esteúltimoaspectopresentena propostade Chomskye Halle(1968).
Coma propostagerativistadessesúltimosautores,a Fonologiaassu-

menovopapeldentroda Linguística.Agora,os traçosé


zadosparaformalizaçãodasregrasfonológicas, demodoaquesão utili-
descrever
os inúmerosprocessosfonológicospresentesnas diferenteslínguas

do mundo.A teoria fonológica,portanto,usandotodo aparatoque


lhe é disponível,tembuscadoexplicaro comportamentodas línguas

Recaptulando 83
do mundono que concerneaos sons e suas interfaces.Nessarela-
çãoentreos sons,surgemnovosmodelosde análiseparalidarcomo

modocomoelesse agrupamemconstituintes,comoé o casoda síla-


ba.No casodo portuguêsbrasileiro,o constituintesílabaterásempre
umavogalcomopico e,seguindoa propostada escalade sonoridade
de Clements(1990)aplicadaao modeloarbóreode Selkirk(1982),o
núcleoserásemprecircundadopor elementosde menorsonoridade
no Ataquee na Coda.Tambémparatratarda sílaba,existemoutros
modelosdeanálisesquenãoforamabordadasnestelivro,já quefugi-
riamdos objetivosa que este se propôs.Para finalizar,enfatizamos

queo propósitodo conteúdoaquitratadofoi o defornecersuporteao


trabalhodo professor,emsalade aula,no queconcerneao ensinoda
línguaorale escrita.

Recaptulando 84
Referências BISOL,L. Introduçãoa estudosdefonologiadoPortuguês
Brasileiro
.
6. ed.PortoAlegre:EDIPURS,2010.

CAMARAJR, J. M. Estruturada línguaportuguesa


. Petrópolis:Vozes,
ANO.

CHOMSKY,N.;HALLE,M.Thesoundpatterns
ofenglish
. NewYork:Harper
andRow,1968.

CLEMENTS,G. N. “Therole of tre sonoritycycle in core syllabification”


In: KINGSTON,J.; BECKMAN,M. (Org.).Papersin Laboratory phonology
Cambridge : CambridgeUniversityPress,1990.

HYMAN,L. M. Phonology:
theoryand analysis.NewYork:Holt,Rinehart
andWinston,1975.

SELKIRK,E. TheSyllable.In: HULST;SMITH.(Ed.).Thestructurephono-


logicalrepresentations (PartII). Dordrecht-Holland:
ForisPublications,

1982.p. 337-383.
TRUBETZKOY,
N. S. Principlesof phonology.Berkley,Los Angeles:Univer-

sityof CaliforniaPress,1969[1939]
.

Recaptulando 85
INFORMAÇÕES DERMEVAL DAHORA : foi ProfessorTitularda UniversidadeFederalda
SOBREOS Paraíba;é ProfessorVisitanteda UniversidadeFederaldo Pará;possui

AUTORES doutorado em Linguística pela Pontifícia UniversidadeCatólica do


Rio Grandedo Sul e estágio pós-doutorale estágio sênior pela Vrije
Universiteitde Amsterdã.É bolsista produtividade1B do CNPq desde
1993.Atuana áreade Sociolinguísticae Fonologia.Coordenao Projeto
VariaçãoLinguísticanoEstadodaParaíba(VAPB),explorandotemascomo
estilo, percepção, atitude e acomodação.Coordenou a disciplina
Fonologia,Variaçãoe Ensinodo ProfLetrasdesdesua implantaçãoaté
2019.

JOSÉ MAGALHÃES: ProfessorAssociadoIV da UniversidadeFederalde


Uberlândia(UFU).Doutorem Letraspela PontifíciaUniversidadeCató-

lica doestágiode
Bisol; Rio Grandedo Sul (PUCRS),sob
doutoradona orientaçãoda Profa.
TilburgUniversity(Holanda),
sobDr. Leda
super-
visãodo Prof. PhD Ben Hermans.Atuano Programade Pós-Graduação

em EstudosLinguísticosda UFU,com pesquisae orientaçãona áreade


Fonologia– teoriae análisede dados-, VariaçãoFonológica;Fonologiae
Variaçãoaplicadasaoensinobásico.Coordena,nacionalmente,
a linhade
Fonologia,Variaçãoe Ensinono Programade Pós-GraduaçãoemRede-
MestradoProfissionalemLetras(ProfLetras).ÉlíderdoGrupodePesquisa
GEFONO– EstudosFonológicos(CNPq)– ecoordenadoProjetodePesqui-
sa“Modelosfonológicos,variaçãoe ensino- revelaçõesdaoralidadee da
escrita”.Atualmente,
exercea funçãodeCoordenadorAdjuntodaÁreade

Linguísticae Literaturajuntoà CAPES(2018-2022).

Recaptulando 86

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