Você está na página 1de 13

Qual é o melhor sítio anatômico para se

obter um acesso venoso central?


3.1 INTRODUÇÃO
Em 1952, durante a Guerra da Coreia, foi descrito pela primeira vez o uso de
cateteres intravenosos centrais, introduzidos por meio de punção percutânea da
veia subclávia. O sistema de acessos venosos com cateteres favorece a
administração de drogas intravenosas e a aplicação de soluções cristaloides e
soluções nutricionais. Além disso, pode favorecer a coleta de amostras de exames
laboratoriais, a infusão de quimioterápicos antineoplásicos e a transfusão de
hemoderivados.

3.2 CATETERES VENOSOS CENTRAIS


Os cateteres venosos centrais são cateteres inseridos no sistema venoso central,
normalmente por punção percutânea, pela técnica de Seldinger, com anestesia local
ou anestesia geral e em ambiente cirúrgico. São locados sob visão indireta por
intermédio da radioscopia (radiografia dinâmica) para a sua locação exata. Em alguns
casos, é feita a tunelização do cateter no plano subcutâneo, longe do ponto de
punção inicial (cateteres totalmente implantáveis – port-a-cath). Outros tipos são
utilizados para pacientes com problemas renais e que necessitem de hemofiltração
por meio de um cateter central específico (cateter de Shilley – Figura 3.1).
Figura 3.1 - Cateter de Shilley para hemodiálise

Legenda: (A) duplo; (B) triplo lúmen.

3.2.1 Indicações

• Indicações dos cateteres:

• Acesso venoso a pacientes com impossibilidade de acesso venoso periférico;


• Obtenção de medidas das pressões venosas centrais;
• Administração de agentes esclerosantes, como quimioterápicos e soluções
nutricionais (hiperconcentradas);
• Alternativa a situações de punções venosas de repetição;
• Locação de cateteres na veia pulmonar;
• Locação de marca-passos definitivos;
• Hemofiltração ou plasmaférese.

3.2.2 Contraindicações

Não há contraindicação absoluta. A maioria das contraindicações é relativa e,


sempre que possível, deve ser resolvida antes da punção.

• Contraindicações relativas:

• Infecção no local da punção;


• Alterações anatômicas locais;
• Suspeita de trauma torácico com fratura ou lesão da veia cava superior (síndrome
da veia cava superior, por exemplo);
• Discrasias sanguíneas ou anticoagulação oral;
• Pneumotórax ou hemotórax do lado contralateral;
• Pacientes agitados;
• Pacientes incapazes de tolerar a posição de Trendelenburg;
• Lesão prévia naquela veia – escolher uma veia de outra região;
• Obesidade mórbida;
• Mastectomia planejada no mesmo lado;
• Pacientes em suporte ventilatório mecânico com altas pressões expiratórias (neste
caso, reduzir as pressões temporariamente);
• Pacientes em ressuscitação cardiorrespiratória cerebral;
• Crianças menores de 2 anos (altas taxas de complicações);
• Fraturas suspeitas de costelas do mesmo lado ou da clavícula.

3.3 TÉCNICA GERAL PARA TODOS OS ACESSOS


O paciente deve ser posicionado de forma adequada, evitando posições em declive
por tempo prolongado. Durante a anestesia local, é possível verificar a posição da
veia antes da introdução do material de acesso venoso (Figura 3.2). O uso da
ultrassonografia com Doppler pode auxiliar durante o procedimento a localizar a veia
e evitar iatrogenias durante a punção.

Figura 3.2 - Exemplo de kit para acesso venoso central


Legenda: (A) cateter mono-lúmen; (B) fio-guia; (C) lâmina de bisturi; (D) dilatador; (E) agulha de
punção; (F) seringa.

Figura 3.3 - Técnica de Seldinger

Fonte: elaborado pelo autor.

Lembrar que, antes de se iniciar o procedimento, devem-se realizar a antissepsia e a


assepsia do paciente, bem como anestesia local do sítio a ser puncionado.

Figura 3.4 - Técnica de Seldinger


Legenda: (A) punção venosa; (B) passagem do fio-guia; (C) retirada da agulha de punção; (D)
passagem do dilatador; (E) passagem do cateter e retirada do fio-guia; (F) fixação do cateter.

3.4 COMPLICAÇÕES POTENCIAIS


Quadro 3.1 - Complicações do acesso venoso central
3.5 PROBLEMAS DURANTE O PROCEDIMENTO
Quadro 3.2 - Conduta diante de complicações
3.6 PONTOS ANATÔMICOS
3.6.1 Veia subclávia

O paciente deve estar em posição de decúbito dorsal, com ambos os braços ao


longo do corpo e a mesa em posição de Trendelenburg discreta para favorecer a
distensão das veias centrais e impedir a embolia aérea. Vira-se a cabeça para o lado
contralateral à punção (exceto na suspeita de lesão cervical) e coloca-se um coxim
interescapular, de modo a tornar a clavícula mais proeminente, sem acentuar
demasiadamente tal posição – isso faria que a clavícula se aproximasse muito da
primeira costela, tornando a cateterização mais difícil. A punção deve ser feita
inferiormente à clavícula em sua junção do terço médio com o terço lateral, em
direção à fúrcula esternal (Figura 3.5).

#importante
O pneumotórax é a complicação mais comum desse
acesso venoso, seguida da punção inadvertida da
artéria subclávia.
Figura 3.5 - Ponto anatômico para a punção da veia subclávia (em direção ao manúbrio
esternal)

Fonte: acervo Medcel.

#importante
A punção subclávia – no que diz respeito a outros
posicionamentos de punção venosa profunda – está
relacionada a menores taxas de complicações
infecciosas. Dessa maneira, a punção subclávia se
associa a maiores possibilidades de lesões
pleuropulmonares e menores possibilidades de
complicações infecciosas.
3.6.2 Veia jugular interna

O posicionamento é o mesmo já descrito. Posiciona-se à cabeça do paciente e


localizam-se as duas “cabeças” do músculo esternocleidomastóideo (ECM). É
possível verificar as “cabeças” da porção clavicular e esternal. Uma vez visualizado o
“triângulo” formado por esses músculos, desliza-se o dedo em direção ao ápice do
triângulo – esse é o ponto da punção percutânea da veia. A punção deve ser feita
com agulha a 30°, em direção ao mamilo ipsilateral. A veia dista em 2 a 3 cm da pele,
portanto não se deve introduzir a agulha excessivamente. Se a veia não for
encontrada, direciona-se a agulha mais para a lateral. Quando disponível, pode-se
usar ultrassonografia para auxiliar na punção.

Figura 3.6 - Ponto anatômico para a inserção da agulha – ápice do triângulo

As principais complicações inerentes ao acesso da veia jugular interna são punção


da carótida, punção do ducto torácico à esquerda e, muito raramente, pneumotórax.
Como é uma área de intensa mobilização, cateteres de inserção cervical podem ser
facilmente tracionados e retirados.
3.6.3 Veia jugular externa

O acesso venoso dessa veia externa é muito útil em situações de urgência para
rápidas administrações de fluidos. Nas paradas cardíacas em que não se palpam os
pulsos carotídeos, é uma punção de menor risco. Como se liga à veia cava superior,
há chance de 10 a 20% de o cateter não ultrapassar esse ponto anatômico. O
paciente deve permanecer à posição de decúbito dorsal, com a cabeça reta, e deve-
se identificar a veia jugular externa no local onde ela cruza com o músculo ECM,
normalmente em posição posterior a este (Figura 3.7). Se essa veia não for palpável
nem visível, deverá ser escolhida uma alternativa de acesso venoso. Insere-se a
agulha alinhada com o eixo da veia e introduz-se o cateter venoso ou o fio-guia.

Figura 3.7 - Relações anatômicas da veia jugular externa

Fonte: acervo Medcel.

3.6.4 Veia femoral

Com o paciente em posição supina, localiza-se inicialmente a artéria femoral pela


palpação abaixo da prega inguinal. A veia está situada em posição imediatamente
medial à artéria femoral (Figura 3.8). Um dedo deve ser mantido sobre a artéria para
facilitar o reconhecimento da anatomia e evitar a introdução iatrogênica do cateter
nela. As principais complicações desse acesso são trombose venosa profunda, lesão
arterial ou neurológica, infecção e fístulas arteriovenosas.
Figura 3.8 - Ponto anatômico para punção femoral

Fonte: Claudio Van Erven Ripinskas.

#memorize
A punção da veia femoral, apesar de comportar
maiores possibilidades de trombose venosa em relação
a subclávia e jugular interna, pode ser utilizada por
diversos motivos. O ponto de referência ao realizar a
punção é a palpação da artéria e a introdução
medialmente a ela. A dica para memorizar a
localização da punção é: Artéria é lAteral e vEia é
mEdial, ou seja: A com A e E com E.
Quadro 3.3 - Principais diferenças entre os acessos venosos centrais

Qual é o melhor sítio anatômico para se


obter um acesso venoso central?
Não existe um lugar que seja considerado o melhor. Cada topografia
apresenta características anatômicas e complicações em potencial. O
responsável pelo procedimento deve realizar a técnica no sítio que
tenha mais prática, desde que não haja nenhuma contraindicação
específica.

Você também pode gostar