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em média) foram de certa forma responsáveis pelo clima de cordialidade que

caracterizou o conclave, encerrado na noite de 17 de julho com um jantar de


confraternização.
A nova diretoria da Sociedade Internacional de Rorschach ficou assim cons-
tituída: Ora. Nina Rausch de Traubenberg (presidente), Dr. John E. Exner
(primeiro vice-presidente), Ora. Latife Yazigi (segundo vice-presidente), Ingrid
Rouselle (secretária).
ISABEL ADRAOOS

História da psicologia no Brasil

o Seminário Nacional História da Psicologia no Brasil, organizado no Rio de


Janeiro pelos professores Hannes Stubbe e Miriam Langenbach, do Departa-
mento de Psicologia da PUC/RI, foi o primeiro evento do gênero na América
Latina, integrando uma série de comemorações realizadas por historiadores da
psicologia no Brasil e na Europa em 1987.
Sobre a história da psicologia, há muito o que dizer. Para iniciar, citaremos
G. T. Fechner (1816-87), graças a quem foi introduzido o método experimental
(juntamente com Weber), a psicofísica (1860), a estética experimental, a psico-
logia das plantas (1848) e o panpsiquismo (que encontramos também nos índios
brasileiros) .
Há 100 anos nasceram Wolfgang Koehler (1887-967) e Waclaw Radecki
0887-953). Koehler fundou a escola berlinense da psicologia da gestalt, tornan-
do-se célebre ainda por seus experimentos com chimpanzés em Tenerife (1913-
20). Em meados de agosto de 1930, ele visitou o Rio de Janeiro e São Paulo
(ver O Estado de São Paulo, 26 e 27 ago. 1930, p. 5), fazendo algumas confe-
rências e apresentando filmes. Para o livro Psychologia da vida affectiva, de
Nilton Campos (1930), escreveu um prefácio em língua espanhola e no segundo
volume do Boletim do Instituto de Psicologia fez um comentário interessante em
relação à contribuição de Nilton Campos ao Congresso Brasileiro de Psicologia.
W. Radecki, que tem suas origens na escola funcionalista de Claparede,
iniciou suas atividades em psicologia experimental no Brasil em 1923. Ele não
apenas organizou o mais moderno laboratório de psicologia experimental daquela
época na América Latina (no Engenho de Dentro, Rio de Janeiro), como coor-
denou em 1950 o I Congresso Latino-Americano de Psicologi!\, em Montevidéu.
Provavelmente foi ele o editor da primeira revista de psicologia brasileira
(Annaes da Colonia de Psychopathas no Engenho de Dentro, 1928). Pode ser
reconhecido ainda como o primeiro psicólogo clínico da América Latina.
Há 50 anos morreu A. Adler (1870-937), o fundador da psicologia indivi-
dual, da teoria do complexo de inferioridade, da teoria da compensação e da
psicologia do poder. Apesar de em sua obra se encontrar uma análise psicológica
relativa a muitos problemas tipicamente brasileiros, suas idéias não encontraram
receptividade na psicologia brasileira.
A história da psicologia experimental no Brasil tem certamente 87 anos.
Em 1900, Henrique Roxo escreveu sua tese de doutoramento sobre a duração
dos atos psíquicos elementares, que se baseia sobre um instrumento de medição
de reação de Buccola. Em 1906 e 1907 foram fundados os primeiros laboratórios
de psicologia no Rio de Janeiro. Em 1912 apareceu a primeira história da psico-

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logia, de Farias Brito, e em 1923 começaram as atividades experimentais de
Radecki no Brasil.
Podemos citar vários psicólogos significativos no Brasil: Lourenço Filho,
Plínio Olinto, Mira y López, Robert Mange, Betti Katzenstein, Helena Antipoff,
Nilton Campos, Pe. Benko, etc. Estes nomes foram citados na historiografia
brasileira de Cabral, Lourenço Filho, Penna, Pessott, pfromm Netto, Veloso
e Rosas.
Há 50 anos começou a psicologia acadêmica no Brasil. A regulamentação
da profissão ocorreu há 25 anos. Deste modo, o seminário inseriu-se num mo-
mento histórico significativo. Participaram 180 profissionais e estudantes de vá-
rios pontos do país, que trabalharam em 10 mesas-redondas com atividades para-
lelas, tendo sido apresentados 36 trabalhos.
As mesas-redondas se concentraram nos seguintes temas:
1. 25 anos de regulamentação da profissão no Brasil, um balanço crítico;
2. História da psicologia no Brasil;
3. História da psicologia no Mundo;
4. A psicologia nos regimes totalitários;
5. A psicologia e a realidade brasileira;
6. Psicologia clínica;
7. Psicologia comunitária;
8. Psicologia da educação;
9. Psicologia e justiça;
10. Psicologia do trabalho.

Atenção especial foi dada aos temas 1, 2, 5 e 6. Discutiu-se muito, para


que os alunos - presentes em número considerável - pudessem ter uma com-
preensão da ampla problemática da psicologia no Brasil.
O seminário abriu com a mesa-redonda sobre os 25 anos de regulamentação
da profissão. Como se desenvolveu a psicologia neste intervalo? Sobre o tema
falaram C. Bori, E. Velloso, F. Lo Presti Seminério e Pe. Benko (Áustria).
Elisa Velloso, figura fundamental na obtenção da regulamentação, deu seu
depoimento sobre as lutas ocorridas na época. Todo o empenho de uma década
por esta legislação ainda não foi suficientemente estudado pela historiografia
brasileira. Sobre este tema deveriam ser elaboradas teses de mestrado e douto-
rado, que para tal poderiam se valer da história oral, assim como da documen-
tação existente.
Foi mencionado o antigo conflito entre a psicologia acadêmica e a psicologia
aplicada, personalizado na época pelas desavenças entre Nilton Campos e Mira
y López. Será que a massificação da psicologia reduz sua qualidade no ensino
e pesquisa? Será que há o perigo de exercício da psicologia tendo apenas em
vista a perspectiva de usufruir um florescente mercado psi?
Pe. Benko, também um pioneiro na concretização da formação e regula-
mentação profissional (ou, como definimos brincando, "um arquivo vivo da

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psicologia brasileira") fez observações significativas relativas àquela época. A
ele a PUC/RJ deve a criação do curso de psicologia.
Bori fez um pungente questionamento do ritualismo fechado das instituições
de formação e de pesquisa que não lhes permite uma influência mais decisiva
e vital sobre a realidade brasileira. Neste contexto, a regulamentação também
poderá eventualmente representar um reforço em direção ao corporativismo.
Seminério (lSOP/FGV), ao destacar o Brasil como primeiro país do mundo
a obter a regulamentação, chamou a atenção para algumas tendências que se
verificaram nestes últimos anos, ligadas à progressiva expansão do mercado de
trabalho e às crescentes exigências de formação, freqüentemente incompleta a
nível de graduação para fins profissionais.
Durante a mesa-redonda História da psicologia no Brasil, M. Massimi
(Fapesp) demonstrou, com perfeição metodológica e profundo conhecimento, a
presença de idéias psicológicas durante o período colonial. A. G. Penna (UFRJ)
voltou-se para a descrição de figuras significativas para a psicologia no começo
do século XX. A. C. Figueiredo (USU/RJ) caracterizou brilhantemente a difusão
da psicanálise no Rio de Janeiro e M. Langenbach (PUC/RJ) trouxe dados
polêmicos em relação às mais recentes características do profissional psi. Aliás,
não seria muito importante desenvolver maior número de estudos relativos a
profissionalização do psicólogo? Será que a profissionalização e a história da
psicologia no Brasil não deveriam constar do currículo como cadeiras obriga-
tórias? Questões relativas ao desenvolvimento de uma prática em consultório e
problemas éticos, jurídicos e organizacionais dela decorrentes são geralmente
experimentadas de modo doloroso e solitário pela maioria dos psicólogos.
A discussão em relação ao papel da psicologia durante o nazismo só come-
çou recentemente. U. Geuter (Berlim), que publicou vários trabalhos sobre este
capítulo trágico da história da ciência, fez uma exposição completa durante a
mesa-redonda A psicologia nos sistemas totalitários. A psicologia contribuiu para
o sistema totalitário? O nazismo estimulou ou reprimiu a psicologia? De qual-
quer modo, ficou claro que a profissionalização avançou rapidamente durante
este período na Alemanha. As testemunhas oculares Cecília Coimbra (UFF) e
Israel V. Marazina (Argentina) deram depoimentos tão emocionantes, com aspec-
tos ainda desconhecidos em relação ao tema, que recomendamos a leitura dos
anais, a serem publicados em breve.
Em A história da psicologia no mundo, U. Geuter, Pe. Benko e H. Stubbe
traçaram um panorama da evolução da ciência psicológica respectivamente na
Alemanha, Áustria e China.
No segundo dia do seminário a questão era: qual é a realidade brasileira,
e como a psicologia lida com ela? Em relação a este tema foi muito impressio-
nante a exposição de Ana Lucia Schliemann (UFPE), relatando seus estudos
empíricos sobre a capacidade de raciocínio matemático, examinado através de
situações cotidianas e escolares com meninos de rua e bicheiros em Recife. Estes
trabalhos deveriam ser reproduzidos em outros estados do país. Será que os
pedagogos e psicólogos escolares brasileiros não deveriam se basear em estudos
deste tipo em vez de referirem-se continuamente a acontecimentos americanos e
europeus? Se a psicologia no Brasil quiser se desenvolver, terá de se voltar de
modo mais sistemático para sua realidade e cultura.
C. Garcia (UFMG) deu uma interessante esquematização da história da
psicologia mais recente, que. conforme a discussão posterior evidenciou, não
pode ser generalizada. Ele relatou um lapsus linguae significativo para historia-

Noticiário 115
dores de psicologia: a citação de um líder estudantil alemão da revolução de
68, "Geschichte ist machbar, Herr Nachbar" (a história dá para fazer, senhor
vizinho), transformou-se em "Geschichte ist Machtbar" (a história é poderosa),
o que significa que a história pode ser uma peteca na mão dos poderosos (ver
história oficial) ou, pelo menos, constitui um fator de poder, isto é, representa
uma dimensão essencial de nossa consciência humana.
HaIa Puga (PUC/RS) apresentou a reformulação de um departamento de
psicologia e seus desdobramentos. A discussão subseqüente evidenciou que a
realidade brasileira ainda é uma desconhecida no ensino e na pesquisa brasileiros.
O que a psicologia tem a dizer em relação à rápida urbanização, à explosão
demográfica, aos meninos de rua, à inflação (de que modo ela influencia a
vivência e o comportamento do brasileiro), às rápidas mudanças sociais e aos
subseqüentes problemas organizacionais, aos conflitos culturais, às crises ecoló-
gicas (só para citar alguns aspectos)?
As demais mesas-redondas voltaram-se para temas específicos da psicologia.
Será que a reduzida audiência na mesa-redonda Psicologia e justiça reflete a
situação profissional? Questões em debate: como se explica a presença super-
marcante de negros nos presídios brasileiros? - a violência dos policiais pode
ser explicada pela sua socialização militar? - quais são os mais freqüentes
delitos dos meninos de rua? - não deveria haver maior presença de psicólogos
no sistema judiciário e na polícia? Os debatedores foram Raquel O'Donnell (RJ),
Eliezer Schneider (Uerj) e Marlene Guiraudo (USP).
As diferentes possibilidades da psicologia comunitária foram apresentadas
por Ventura (Fundação Leão XIII) e M. A. Negreiros (PUC/RJ). Deve-se deixar
uma pessoa gravemente ferida à beira da estrada sem socorro, com o argumento
de que ela é pobre e que devemos aguardar uma revolução social? O psicólogo
pode realizar trabalhos importantes com grupos marginalizados? Devem ser in-
troduzidos mais estágios para os estudantes nesta área? Deve ser dada maior
atenção a estes grupos nos currículos? Muitas questões deste tipo foram acalo-
radamente discutidas sob a coordenação experiente de T. C. Negreiros (PUC/RJ).
Na mesa-redonda Psicologia e trabalho, a partir do questionamento da pró-
pria nomenclatura (psicologia industrial, psicologia do trabalho), C. Novaes
(PUC/RJ) mostrou os grandes impasses vividos nesta especialidade desde a
universidade. Seminério apresentou um histórico da psicologia do trabalho no
Brasil e C. Malvezzi (PUC/SP) trouxe sua experiência dentro da realidade pau-
lista. A tecnicização crescente como vai incidir sobre o trabalho, e sobre as
atividades do próprio psicólogo? O papel da ergonomia como área relativamente
nova e de crescente interesse, no sentido da melhoria das condicões de trabalho
da população? A desqualificação que acompanha a especialidade, a defasagem
que esta vive com experiências feitas em outros países, foram alguns dos pontos
levantados.
Na mesa-redonda Psicologia e educação, M. H. Novaes fez um rico histórico
da psicologia educacional!escolar no Brasil, sinalizando evolução favorável na
atuação do psicólogo nesta área. Já A. Fernandes (UFF) fez uma análise crítica,
apontando as questões e dificuldades a serem pensadas e teorizadas. A. Baeta
(FGV /RJ) colocou em discussão a formação do psicólogo nesta especialidade,
discutindo questões relativas a linhas de pesquisa e capacitação docente.
Na mesa-redonda Psicologia clínica, T. Lins (RJ) trouxe um depoimento
pessoal de sua trajetória; B. Lamosa (lncor/SP) abordou a prática clínica desen-
volvida num dos centros hospitalares mais avançados do Brasil; Mures (CRP-V)

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relatou sua experiência clínica em diferentes espaços profissionais; finalmente,
Lima e Silva (PUC/RJ) fez uma análise histórica das relações entre a psicanálise
e a psicologia.
Os anais deste seminário serão publicados em breve. Pelo que expusemos
anteriormente, fica claro que o evento foi um dos marcos importantes da histo-
riografia da psicologia brasileira, do qual esperamos, como fruto, uma atenção
mais contínua à história da psicologia no país.

HANNES STUBBE

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