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século XVII.
The plague and the death in its representation into the largest plague
outbreak at 17th Recife.
RESUMO: O presente artigo procura analisar o episódio da peste conhecida como Males que
afetou o Recife e sua região metropolitana no ano de 1685, não apenas como narrativa do fato
ocorrido, mas com a intenção de interpretar a representação da morte e de como para a
população estar empesteado era sinônimo de estar morto.
Palavras-chave:Representação. Peste.Morte.
ABSTRACT: The present article seeks to analyze the episode of pests knew as Males which
damaged Recife City and all its metropolitan area in 1685, not as a silly narrative of the past,
but as interpretation quest of death representation and how the people who were infected has
the certain of death.
Key-words:Representation. Plague.Death.
1. INTRODUÇÃO
1
Professora Doutora em História e Arqueologia, docente da Universidade Federal Rural de Pernambuco.
2
Mestrando em História pela Universidade Federal Rural de Pernambuco.
2
OLIVEIRA, Ana Lúcia do Nascimento. A peste e a representação da morte no maior surto
pestilencial do Recife no século XVII.
houve mais de 600 mortes. Sendo o total de vítimas 2.000 pessoas, em uma população que,
segundo o autor, demoraria pelo menos quinze anos para chegar ao número de 10.000
habitantes. (ANDRADE, 1976, p. 189). Todavia em documentação do acervo Ultramarino de
Pernambuco, em carta escrita em 31 de maio de 1687, pelo Secretário do Estado Pedro
Sanches Farinha, informa o seguinte: “As doenças que na cidade de Olinda e Recife se
padecerão este anno, e ainda continuão, passando ja de tres mil oz mortos”(...). 3 Podemos
então estimar que o número de vítimas pode ter alcançado proporções maiores do que as já
evidenciadas até este momento, alastrando o pânico entre a população. Este período da
História pernambucana correspondeu à chamada Restauração portuguesa, quando os
holandeses foram expulsos da capitania e os portugueses deram início à restauração de seu
poder colonial e da produção econômica em Recife e Olinda.
Segundo informações coletadas por Pereira da Costa, em sua obra Anais Pernambucanos
(1985),
A peste entrou no porto do Recife no mês de novembro de 1685 por meio de barris
cheios de carne em estado de putrefação. [...]. Abrindo-se alguns dêsses barris,
estava a carne já em tal estado de adiantada putrefação, que às suas exalações
mefíticas imediatamente caíram por terra o tanoeiro e mais quatro ou cinco pessoas
de serviço, que dentro de poucas horas pereceram. (COSTA, 1985. p.36).
Assim também descreveu Rosa “os moribundos deste achaque costumam colocar
pela bocca (vômitos de atrabilis, também conhecidos como vômitos pretos) um humor negro,
da mesma cor da ferrugem de chaminé”. (Idem). Os pestilenciados caminhavam pelas ruas
ardendo em febre, seminus completamente descontrolados pelos delírios e vomitando uma
substância preta. Assim é a descrição que se encontram nos documentos da época.
Tal visão não deve ter despertado nenhum sentimento de apatia, se levarmos em
conta a aceitação e normalidade que se encontrava diante de determinadas doenças como as
3
Documento número 1418. Cd 02 pasta 018 subpasta 003 arquivo 0541, linhas 3,4 e 5. Pertencente
ao Acervo do LAPEH/UFPE.
3
OLIVEIRA, Ana Lúcia do Nascimento. A peste e a representação da morte no maior surto
pestilencial do Recife no século XVII.
Dessa forma este artigo busca entender como a descrição de uma doença
aparentemente banal, levariam o secretário da Província e o Governador da mesma a pedirem
com urgência o envio de médicos e medicamentos ao socorro desta freguesia que estava a
perecer tão rapidamente?
As únicas obras escritas por médicos e cirurgiões da época são o Tatado único da
constituição pestilencial escrito pelo Dr. João Ferreira da Rosa e um relatório escrito às
pressas pelo Dr. Antônio Brebon, cirurgião que teria encontrado a causa da pestilência no
estômago de uma vítima. O Dr. Brebon afirmou serem as lombrigas as causadoras de tamanha
catástrofe que levou o Recife a uma situação miserável de não haver quem fizessem as
sepulturas nem quem carregasse o Santíssimo Sacramento, como a firmou o Dr. Ferreira da
Rosa.
Um fato que não pode passar sem ser percebido é que o próprio Dr. Ferreira
utilizou no prefácio de seu livro o documento do Dr. Brebon, como para em primeira instância
provar a falsidade e leviandade do mesmo em querer reduzir uma doença tão complexa a um
surto de lombrigas.
Como pode no mesmo dito livro o Dr. Ferreira explicar que uma vez tendo controlado as
condições astrais de desequilíbrio do ar e com alimentação adequada teria livrado a muitos da
morte, quando o próprio doutor veio a falecer do mesmo mal em 1696? Episódio que levou ao
desespero dos dirigentes.
Assim dizendo o Governador João da Cunha Souto Maior: “ficando-se sem quem
aplicasse remédios, nem quem curasse com acerto os achaques”. (COSTA, 1985. p. 268).
Não havendo mais espaço na proximidade e nem dentro das Igrejas, muitas
famílias, temendo o contágio passaram a abandonar os mortos em frente à Igreja da Madre de
Deus. E de acordo com esta Instituição de pesquisa e preservação do patrimônio, muitos dos
padres acabaram por perecer do mesmo mal enquanto enterravam os mortos. (IPHAN, 2007.
p. 56). Ferreira Costa confirma em suas pesquisas nos Anais Pernambucanos a precariedade
dos túmulos e de que em muitos eram sepultados cinco ou mais de uma única vez. (COSTA,
1985. p.268-270).
Vejamos a seguir uma representação posterior ao surto, mas que revela o temor da
população através da expressão artística (Fonte: Silva, 2002):
6
OLIVEIRA, Ana Lúcia do Nascimento. A peste e a representação da morte no maior surto
pestilencial do Recife no século XVII.
Vemos neste ex-voto a representação da morte (esqueletos com foices) ceifando a cidade de
Olinda e a vila do Recife. Sendo esta tela de 1729 e a peste tendo seu início em 1685 podemos
perceber a continuidade das sequelas e marcas da peste no sentimento e pensamento popular.
Como nos explica Robert Darnton, a atmosfera da Idade Moderna era cheia de
muitas superstições e crenças, muitas delas vindas da Idade Média. (DARNTON, 1986.
p.125).
No próprio livro do Dr. Ferreyra fica clara a influência dos astros e mesmo da ira
divina para justificar estes males:
Por mais científica que pudesse apresentar-se a medicina portuguesa ainda era
mais filosofia e crendice do que ciência. Como o próprio doutor explicou, as causas da
pestilência residiam principalmente na corrupção das qualidades do ar. Seguindo os conceitos
da proto-medicina da Grécia Antiga, onde se identificavam as qualidades contraditórias do ser
em quatro partes: seco, úmido, quente e frio; toda e qualquer perturbação seria espalhada por
um meio comum, no caso, o ar. Assim de acordo com o doutor, cadáveres mal sepultados, a
ação dos astros, águas estagnadas, alimentos apodrecidos, etc eram as causas da pestilência.
A partir daqui já temos mais elementos que tornam mais inteligíveis a aura de terror da época.
MARCO TEÓRICO
Não é a simples leitura dos documentos oficiais que nos dará as respostas
esperadas, mas antes buscar em suas entrelinhas, nos que nos é “opaco” o entendimento e
assim encontraremos as pistas da realidade da qual buscamos a compreensão. Vendo as
representações do evento em cada uma das fontes utilizadas nos foi possível algumas
conclusões.
dos fatos sobre os quais as fontes históricas documentais estão desencontradas. Como vimos
neste artigo, a representação iconográfica pôde auxiliar na construção da visão catastrófica
que os contemporâneos do surto epidêmico tiveram durante este referido período. Se também
observarmos as condições de sepultamento da época, levando em conta que mesmo não sendo
o Pilar um sítio arqueológico pertencente ao período desta dita doença, mas já possibilita
perceber que se antes já não havia espaço o suficiente para novos sepultamentos, após o
contágio menos ainda haveriam devido à grande quantidade de vitimados. Como citado
anteriormente, de acordo com o relato da carta que fora enviada a Portugal em 1685, “já
passavam de três mil mortos” (CARTA AHU. Doc. 0541).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Gilberto Osório de; Origem da Febre Amarela urbana na América do Sul. Recife,
1976. Artigo.
COSTA, Francisco Augusto Pereira da. Anais Pernambucanos, 1834 -1850. Recife: Fundarpe, 1985.
Cartas que chegaram a Portugal, vindas de Pernambuco, referentes as epidemias que por lá se
alastravam. E informando sobre a quantidade de óbitos e das possíveis causas. (Fonte: AHU –
Documentos 0541 e 0542. Caixa 1418 – Lapeh.)
DARNTON, Robert. O grade massacre de gatos, e outros episódios da história cultural francesa.
Rio de Janeiro, Graal, 1986.
MOURÃO, ROSA E PIMENTA; Notícia dos três primeiros livros em Vernáculo sobre a medicina
no Brasil. In: ANDRADE, Gilberto Osório de; Origem da Febre Amarela urbana na América do Sul.
Recife, 1976. Artigo.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. Os sete pecados da capital. São Paulo, Hucitec, 2008.
formado pela Universidade de Coimbra, & dos de estipendio Real na ditta Universidade, assistente
no Recife de Pernambuco por mandado de Sua Majestade que Deos guarde, Lisboa: na Officina de
Miguel Manescal, impressor do Príncipe Nosso Senhor, 1694.
SILVA, Karina Vanderlei. A peste e a morte no imaginário açucareiro colonial: a tela de Ação de
Graças aos Santos Cosme e Damião pela proteção da Vila de Igarassu contra a peste em 1685.VI
Simpósio Nacional de História Cultural. UFPI. Terezina. Artigo. 2012.