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(disponível em:
<https://congressoemfoco.uol.com.br/blogs-e-opiniao/colunistas/entenda-o-que-e-comunista
-e-outros-termos-importantes-da-politica/> acesso em 10/04/2020.
Opinião
Comunista, por sua vez, foi um termo que designou parte dos movimentos de trabalhadores
nos séculos 19 e 20, um subgrupo da linha política popular citada no parágrafo anterior.
A grande base comunista derivou do trabalho de Karl Marx e seu colega Friedrich Engels
em meados do séc. 19. A par do desejo de uma vida melhor para as classes populares,
Marx e Engels aportaram uma perspectiva científica ao estudo da sociedade. Em sua
construção, que traz elementos importantes do Iluminismo, da crença na evolução e na
sociedade dirigindo-se a um futuro melhor, entendiam que a sociedade se movimenta,
sobretudo, baseada na luta de classes. Grupos com condições de vida e objetivos distintos
seriam antagonistas, pois conscientes de uma relação de exploração entre eles. O fulcro
dos problemas seria a propriedade privada, e o futuro, de forma inexorável e predita pela
ciência marxista, produziria uma sociedade sem propriedade privada, sem classes e sem
dominação: o mundo comunista (sobre o qual, justiça seja feita, Marx pouco escreveu).
Por outro lado, alguns grupos conformaram-se a mudanças possíveis dentro do jogo de
poder capitalista, abrindo mão de transformações radicais e utilizando estrategicamente da
democracia liberal. Buscavam-se melhores salários, serviços públicos de qualidade,
possibilidades de ascensão social. Aqui surgiu a social democracia (que ganhou impulso no
pós II Guerra na Europa), e, em algumas variantes de nomenclatura, definiram-se os grupos
socialistas (brandos) em oposição aos comunistas (radicais).
Por outro lado, toda sociedade, a forma da economia, os valores culturais são criações
humanas. É a forma de pensar e agir de mulheres e homens que determinam se temos
propriedade privada, o nível da desigualdade, a aceitação de determinados hábitos
como monogamia, homossexualidade, discriminação racial. As Ciências Sociais
debruçam-se sobre esses fenômenos.
O grande contraste e desconforto que há deriva da diferença de visões entre aqueles que
compreendem tais fenômenos (sociais) como criações humanas e assim passíveis de
mudança e aqueles que os entendem como derivados de outras fontes, seja a tradição
intocável, seja o mandamento divino (via religião), ou mesmo uma imposição da natureza
sobre o homem.
Devido a esta razão o mundo das Ciências Sociais recebe mais cotidianamente a
marca de “esquerdista” e coisas do gênero pois a perspectiva crítica é nelas central,
e em muitos casos esta crítica aponta para uma mudança do mundo em que vivemos.
É impossível fazer Ciências Sociais sem a crítica à sociedade, faz parte da atividade.
Podemos dizer que essa crítica é “essencial”.
Não podemos esquecer, contudo, que, ao contrário, há uma enorme massa de fenômenos
sociais que mesmo criticados recebem o apoio para sua manutenção, pois não se vê, por
exemplo, que a crítica social procure abolir a ideia de educação para todos, da prevalência
do Direito, da importância da liberdade, da igualdade. De fato, o que as Ciências Sociais
não podem abrir mão é da crítica. Se ela se transforma em pedido de mudança, isso
ocorre em alguns casos, em franjas ideológicas, em tendências.
Em suma, o que define as Ciências Sociais é a crítica ao mundo humano. Aos que a
valorizam, isso é sua riqueza; aos que são contrários a determinadas mudanças, trata-se da
perversão da ciência. Veja curiosamente que um conservador ocidental, se levado a outras
culturas distintas, poderia lutar pelo fim da mutilação do clitóris, sendo totalmente crítico à
sociedade local. Talvez lá ele fosse taxado de “esquerdista”.
Desta forma, o grande culpado da sociedade não atingir os fins que deseja precisa ser
encontrado, e essa figura está disponível desde sempre, o establishment. O establishment
consiste na ordem impessoal que rege a sociedade ou se refere ao grupo que
controla a sociedade, mesmo que tais controles sejam parciais e limitados. À medida
em que as pessoas desejam um mundo diferente mas não encontram forma de acesso a
ele, o establishment torna-se alvo.
Por fim, essa discussão dos termos faz-nos também pensar se, à luz de seu significado
histórico, os movimentos e atores que hoje se dizem de esquerda realmente o são. A
experiência do PT e sua aliança no governo por mais de uma década questiona se
aqueles ideais de mudança social profunda realmente devem ser relacionados ao
grupo.
Assim, vê-se que o uso hoje dos termos esquerda e correlatos ganhou curso muito
particular. Por um lado serve para atacar o establishment, por outro questiona as
perspectivas de mudança. Por fim, é ainda uma bandeira já sem brilho.